Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1240/24.2BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/26/2025
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ATO DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO
CITAÇÃO
NULIDADE DA CITAÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário:I – A falta de citação integra uma nulidade absoluta, de conhecimento oficioso e determina a anulação de todo o processado, após a petição inicial (cfr. art.º 187.º, al. a) e art.º 188.º ambos do CPC). A nulidade da citação é considerada uma nulidade secundária e só pode ser invocada pelo demandado (cfr- art. 191º do CPC).
II- A nulidade da citação não impede a interrupção da contagem do prazo de prescrição (cfr. nº 3 do art. 323º do Código Civil) .
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO

Vem a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira apresentar recurso jurisdicional contra a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente procedente a reclamação apresentada por G… nos termos do art. 276º do CPPT, tendo na parte ora recorrida, o tribunal a quo declarado prescritas as dívidas exequendas referentes aos processos de execução fiscal nºs 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191 e 3085201481160283, e, quanto aos processos de execução fiscal nºs 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663 e 3085201701990560 determinou a anulação de todos os atos subsequentes dependentes da citação do Reclamante e contra si praticados.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“A. O presente recurso visa reagir contra a douta sentença que julgou procedente a
reclamação de atos do órgão de execução fiscal, apresentada nos termos do art.º 276.º do CPPT, e em consequência, determinou a extinção por prescrição dos processos de execução fiscal, n.ºs 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191, 3085201481160283, 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663, 3085201701990560.

B. Discorda a Fazenda Pública, do entendimento sufragado na douta sentença e com o mesmo não se conforma, por quanto procede de um erro na análise da matéria de facto e das questões jurídicas, nomeadamente quanto à prescrição das dívidas.

C. O tribunal sustenta a sua tese no facto de considerar que “ainda que se verifica que o Reclamante tinha conhecimento da existência dos processos de execução fiscal, perscrutados os factos – designadamente o próprio documento junto pelo Reclamante respeitante ao pedido de assistência com a referência PT_AM161520_20200903_UIPE_1 (Cfr. alínea I) do probatório) – não se consegue aferir se as formalidades a que obedecem as citações previstas no artigo 190.º, n.º 2 do CPPT, que consubstanciam a indicação dos direitos do executado, designadamente, os de defesa, foram comunicadas”.

D. Salvo melhor opinião, é entendimento da Representação da Fazenda Pública, que a referida decisão não adotou a melhor solução jurídica e a mais acertada. Senão vejamos,

E. Com base nas provas documentais tidas no PEF, decidiu bem, a Autoridade Tributária em não reconhecer a prescrição das dívidas, na medida em que, com a devida vênia.

F. A citação aqui colocada em crise pela sentença objeto do presente recurso, cumpriu na integra o estabelecido pelo legislador no artigo 190.º do CPPT, como se pode comprovar com o documento da fl. 412 do SITAF.

G. Após consulta do pedido de cobrança de créditos ao Reino Unido (proc. AM 51018), no âmbito do mecanismo de assistência mútua na recuperação de créditos entre Estados Membros da União Europeia ((Diretiva 2010/24/UE de 16 março 2010, Regulamento de execução (UE) n.º 1189/11, da Comissão Europeia, de 18.11 e Decreto Lei n.º 263/12 de 20.12), foi possível constatar o seguinte:

H. Que foram garantidos na integra os direitos do reclamante, ora recorrido, por quanto, foi informado do seguinte:

I. Na alínea h) do pedido da notificação, consta a informação de que, dispõe de um prazo de 60 dias, a contar da data da notificação, para querendo apresentar impugnação;

J. Também, na al. l), do documento identificado no ponto 8, do Recurso, foi ainda o recorrido informado de que, caso pretenda contestar, a peça deverá ser redigida “em língua portuguesa, com os fundamentos referidos no documento de notificação anexo”.

K. Pelo que, em momento algum, o reclamante, ora recorrido ficou lesado no seu direito de informação, relativamente ao direito que lhe assiste enquanto executado.

L. Até porque, a citação aqui posta em causa pela sentença objeto do presente recurso, foi efetivada ao abrigo da Diretiva 2010/24/UE de 16 março 2010, Regulamento de execução (UE) n.º 1189/11, que determina que “Qualquer pedido de notificação deve incluir o original ou uma cópia autenticada de cada documento cuja notificação é pedida”.

M. Razão pela qual, não compreende esta Representação, o argumento do tribunal a quo, em desconsiderar o efeito duradouro da citação, porque supostamente, a citação enviada e pessoalmente efetivada pelas Autoridades do Reino Unido, não salvaguardou os direitos do ora reclamante.

N. Pelo exposto, incorreu em erro de julgamento de Facto e de Direito a sentença, de que se recorre, ao considerar que “não se consegue aferir se as formalidades a que obedecem as citações previstas no artigo 190.º, n.º 2 do CPPT, que consubstanciam a indicação dos direitos do executado, designadamente, os de defesa, foram comunicadas”, devendo, em consequência, ser revogada.

Nestes termos e nos demais de Direito, deve ser dado provimento ao presente recurso por erro de julgamento de facto e de direito, revogando-se a douta sentença recorrida.
Porém, V. Exas. Decidindo, farão a costumada JUSTIÇA!”.

* *
O Recorrido apresentou contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

“1. A sentença recorrida não merece reparo e deve ser mantida;

2. A mesma vem decidir pela extinção, por prescrição dos processos de execução fiscal n.ºs 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191 e 3085201481160283, e anulação de todos os atos subsequentes dependentes da citação do Recorrido e contra si praticados, no âmbito dos processos de execução fiscal nºs 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663 e 3085201701990560, tendo por base o não cumprimento dos requisitos legais estabelecidos no artigo 163.º do CPPT, mais concretamente, a inexistência de menção à possibilidade e requisitos para o usufruto pelo executado da dação em pagamento, suspensão da execução e regularização da situação tributária, através da prestação de uma garantia idónea, sendo necessária a menção na citação do seu valor ou em alternativa da obtenção de autorização da sua dispensa, na citação dos referidos processos de execução;

3. Tendo por base o disposto no Tribunal a quo entendeu ter-se verificado o prejuízo dos direitos de defesa do aqui Recorrido pelo que as referidas citações não poderiam levar à suspensão do prazo de prescrição e, ademais, nos casos em que não se verificasse a prescrição, todos os atos que tivessem sido praticados desde então seriam anuláveis;

4. Ora, não podendo a AT concordar com este entendimento veio apresentar o devido recurso, alegando, em síntese que as citações por si realizadas cumpriam com tudo o legalmente estabelecido, mais concretamente, faziam referência ao prazo para apresentação da oposição à execução pelo aqui Recorrido, não tendo sido quaisquer direitos de defesa do Recorrido postos em causa, pelo que não poderiam enfermar de erro e, assim, levar às consequências legais acima referidas;

5. A Recorrente carece de razão quanto ao por si alegado em sede de recurso e a douta sentença recorrida não merece censura, na parte em que considerou procedente o peticionado pelo aqui Recorrido.

Vejamos,
6. Conforme se verifica da documentação junta aos autos e contrariamente ao que vem a AT alegar em sede de recurso, as comunicações enviadas pelas autoridades fiscais do Reino Unido, que a AT insiste em considerar “citações pessoais”, não cumprem com os requisitos estabelecidos no artigo 163.º do CPPT.

7. Mais concretamente, em momento algum é feita qualquer referência à possibilidade e requisitos para o usufruto pelo executado da dação em pagamento, suspensão da execução e regularização da situação tributária, através da prestação de uma garantia idónea, sendo necessária a menção na citação do seu valor ou em alternativa da obtenção de autorização da sua dispensa.

8. Esta omissão impediu o aqui Recorrido de solicitar a utilização de qualquer um desses meios de pagamento ou de suspensão dos processos de execução em apreço pelo que, tal como entendido no âmbito da sentença objeto deste recurso, existiu um prejuízo efetivo na esfera do mesmo.

9. Neste sentido, tal como bem menciona o Tribunal recorrido, anda a Doutrina nacional «(…)[c]omo “defesa” do executado, para este efeito, não se poderá considerar apenas a possibilidade de dedução de oposição, mas sim o uso de todas as faculdades que a lei atribui ao executado no processo executivo, como a possibilidade de requerer o pagamento em prestações ou de requerer a dação em pagamento, direitos que, significativamente, podem ser exercidos precisamente no prazo de oposição (arts. 189.º, n.ºs 1 a 3, 196.º, n.º 1, e 201.º, n.º 1, do CPPT).
Trata-se, em qualquer dos casos, de possibilidades atribuídas ao executado para lhe facilitar o pagamento da dívida que, por este motivo, cabem perfeitamente num conceito lato de “defesa”, já que em qualquer deles se levantam obstáculos ao prosseguimento normal da execução.
De resto, não se compreenderia que, atribuindo a lei estas faculdades de requerer pagamento em prestações ou dação em pagamento, e traduzindo-se elas em direitos importantes para o executado, não houvesse qualquer sanção processual para a sua supressão derivada de omissão indevida da administração tributária».

10. De facto, como é entendimento do Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do Acórdão de 0369/23.9BEBJA, de 08.05.2024, “É inquestionável que, nos termos do disposto no artigo 190.º, n.º 1 do CPPT, a citação deve conter, além do mais, os elementos supra referidos previstos nas alíneas c), e e) do nº 1 do artigo 163.º do CPPT ou, em alternativa, ser acompanhada de cópia do título executivo.
Por sua vez, resulta do artigo 191.º, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC) , ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT, que é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização observadas as formalidades prescritas na lei. E segundo o nº 4 do mesmo normativo a arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado. Por conseguinte, a arguição da nulidade só não deve ser atendida se se demonstrar que não existiu prejuízo para a defesa do citado, a nível da globalidade dos direitos processuais que podem ser exercidos na sequência da citação, sendo que o que é relevante para a ocorrência de tal nulidade é a mera possibilidade de prejuízo para a defesa do citado e não a demonstração da existência de efectivo prejuízo - cf., entre outros, acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 10/4/2002, Processo 26503 e de 2/2/2014, Processo n.º 01910/13”.

11. Ora, considerando que no caso em apreço é indubitável que os direitos processuais do aqui Recorrido foram diretamente afetados, outra não poderá ser a conclusão do que a já proferido pelo Tribunal a quo.

12. No presente recurso, a AT não acrescenta qualquer outra argumentação que leve a uma decisão diferente, limitando-se a repetir o já por si invocado em sede de procedimento administrativo.

13. Razão pela qual deve improceder o recurso da Ilustre Representante da Fazenda Pública e manter-se a sentença ora em crise, com todos as consequências legais.

TERMOS EM QUE, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se, consequentemente, a douta sentença recorrida, que não merece censura, com a consequente extinção, por prescrição dos processos de execução fiscal nºs 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191 e 3085201481160283, e anulação de todos os atos subsequentes dependentes da citação do Recorrido e contra si praticados, no âmbito dos processos de execução fiscal nºs 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663 e 3085201701990560, com as devidas e legais consequências, nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!”.
* *
A Exmª. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer defendendo seja negado provimento ao recurso.

* *
Com dispensa de vistos atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito ao ter declarado a prescrição de vários processos executivos por considerar que ocorreu a nulidade da citação na medida em que não respeitou todas as formalidades previstas no artigo 190.º, n.º 2 do CPPT.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Com relevância para a decisão da causa, considera-se provada a seguinte
factualidade constante dos autos:

A) A Autoridade Tributária e Aduaneira instaurou contra o Reclamante, designadamente, os seguintes processos de execução fiscal:
PEF n.° 3085201601249657
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2015
€ 207,18
PEF n.° 3085201601513923
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2015
€ 207,17
PEF n.° 3085201601827308
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2015
€ 207,16
PEF n.° 3085201701459783
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2016
€ 201,86
PEF n.° 3085201701707663
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2016
€ 201,86
PEF n.° 3085201701850814
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IRS
2013
€ 3.339,91
PEF n.° 3085201701990560
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2016
€ 201,86
PEF n.° 30852018010118040
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IRS
2014
€ 2.830,29
PEF n.° 3085201801672800
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IRS
2015
€ 2.953
PEF n.° 3085201501434527
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2014
€ 207,17
PEF n.° 3085201501632159
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2014
€ 207,17
PEF n.° 3085201501846191
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2014
€ 207,17
PEF n.° 3085201801362623
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2017
€ 196,55
PEF n.° 3085201801750186
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2017
€ 196,55
PEF n.° 3085201881096305
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2017
€ 196,54
PEF n.° 3085201901211668
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IRS
2016
€ 301
PEF n.° 3085201901216716
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IRS
2017
€ 2.292,70
PEF n.° 3085201481160283
Tributo
Período de tributaçãoQuantia exequenda
IMI
2013
€ 207,17


(cfr. fls. certidões de dívida a fls. 208-267 [fls. 1 a 4, 16 a 19, 22 a 25, 28 a 31, 34 a 37, 40 a 42, 45 a 48, 51 a 53, 56 a 58 do pdf.], fls. 268-327 [fls. 1 a 4, 25 a 28, 29 a 32, 33 a 36, 39 a 42, 45 a 48, 51 a 53, 56 a 58 do pdf.] fls. 330-392 [fls. 1 a 4 do pdf.], dos processos de execução fiscal junto aos autos, numeração do SITAF, assim como as posteriores referências);

B) A 06/04/2018, ao abrigo de um pedido de assistência mútua na cobrança de créditos, com a referência PT GB AM51018, a Autoridade Tributária e Aduaneira preencheu um documento com o título “Pedido de notificação”, dirigido aos serviços do Reino Unido, identificando o Reclamante como destinatário e a sua qualidade de devedor principal, constando do documento, designadamente, a seguinte indicação quanto ao objeto da notificação:

(cfr. fls. 412-418 [fls. 2 do pdf.]);

C) No documento identificado na alínea anterior constam, nomeadamente, a indicação dos seguintes processos de execução fiscal:

(cfr. fls. 412-418 [fls. 3 do pdf.]);

D) A 15/05/2018, no âmbito do pedido de notificação identificado na alínea B), os serviços da autoridade requerida do Reino Unido comunicaram aos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira que os documentos tinham sido entregues na morada indicada no dia 28/04/2018 e que tinham sido assinados por “H...” (cfr. quadro 10 do pedido de notificação a fls. 412-418 dos autos);

E) A 29/04/2018, o Reclamante enviou para o Serviço de Finanças de Lisboa 3 um e-mail com o assunto “PT_AM51018_20180425_UNF: G…” (cfr. fls. 422 dos autos);

F) A 30/04/2018, em resposta ao e-mail identificado na alínea anterior, a Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 3 solicitou ao Reclamante a indicação do seu número de contribuinte e que anexasse os documentos a que se referia (cfr. fls. 425-427 dos autos);

G) A 13/05/2018, em resposta a este e-mail do órgão de execução fiscal, o Reclamante enviou a fotografia da certidão de dívida do processo de execução fiscal n.º 3085201701459783 (cfr. fls. 425-427 dos autos);

H) A 14/05/2018, em resposta ao Reclamante nesta sequência de e-mails, o órgão de execução fiscal respondeu o seguinte:

(cfr. fls. 425-427 dos autos);

I) A 08/06/2021, ao abrigo de um pedido de assistência mútua na cobrança de créditos, com a referência PT_AM161520_20200903_UIPE_1, os serviços do Reino Unido endereçaram ao Reclamante um ofício com a indicação do montante em dívida ao Estado Português e com a cópia do formulário emitido pelas autoridades Portuguesas, com referência aos processos de execução fiscal n.º 3085201701850814, n.º 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201901216716 (cfr. fls. 441-453 dos autos [fls. 1, 4, 6, 7, 8 do pdf.]);

J) A 22/02/2024, deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa 3 um requerimento do Reclamante com o seguinte teor:
G..., residente em 182a M………………., titular do Número de Identificação Fiscal português 2…, tendo tomado conhecimento de que se encontram instaurados contra si os processos de execução fiscal abaixo identificados, vem invocar a CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO, assim como a PRESCRIÇÃO DAS DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS, relativamente a todas as prestações tributárias em execução fiscal nos processos abaixo identificados, nos termos dos artigos 45.° e 48.°, ambos da Lei Geral Tributária, assim como nos termos do artigo 175.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e do artigo 303.° do Código Civil, com as devidas e legais consequências, porquanto, tanto quanto é do seu conhecimento, nunca foi válida e eficazmente notificado de quaisquer liquidações de imposto, nem citados em tais processos de execução fiscal. (…) “ (cfr. fls. 330-392 [fls. 42 do pdf.], do processo de execução fiscal junto aos autos);

K) A 17/04/2024, com referência ao requerimento identificado na alínea anterior, o órgão de execução fiscal elaborou uma informação de onde se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
B - Da prescrição
(…)
Nas dívidas de IMI referentes aos anos de 2013, 2014, 2014, 2014, 2017, 2017, 2017, 2015, 2015, 2015, 2016, 2016 e 2016 a contagem do prazo prescricional inicia-se a partir de 2014-01-01, 2015-01-01,2015-01-01,2015-01-01,2018-01-01,2018-01-01, 2018-01-01, 2016-01-01,2016-01-01,2016-01-01,2017-01-01,2017-01-01 e 2017-01-01 nos PEF s n.°s 3085201481160283, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191, 3085201801362623, 3085201801750186, 3085201881096305, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201701459783, 3085201701707663, 3085201701990560 e terminaria sem considerar quaisquer causas interruptivas ou suspensivas em 2021-12-31,2022-12-31,2022-12-31, 2022-12-31, 2025-12-31, 2025-12-31, 2025-12-31, 2023-12-31, 2023-12-31,2023-12-31,2024-12-31,2024-12-31 e 2024-12-31, respetivamente.
Relativamente às dívidas de IRS referentes aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016 a contagem do prazo prescricional inicia-se a partir de 2014-01-01, 2015-01-01,2016-01-01 e 2017-01-01 nos processos executivos em causa n.°s 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800 e 3085201901211668 e terminaria sem considerar quaisquer causas interruptivas ou suspensivas em 2021-12-31,2022-12-31,2023-12-31 e 2024-12-31, respetivamente.
(…)
Esgotados os procedimentos de cobrança voluntária e coerciva previstos nas disposições legislativas nacionais foi acionado, pela Comissão Interministerial para a Assistência Mútua em Matéria de Cobrança de Créditos (CIAMMCC), o pedido de cobrança dos créditos ao Reino Unido ((proc. AM 51018), no âmbito do mecanismo de assistência mútua na recuperação de créditos entre Estados Membros da União Europeia (Diretiva 2010/24/UE de 16 março 2010, Regulamento de execução (UE) n.° 1189/11, da Comissão Europeia, de 18.11 e Decreto Lei n.° 263/12 de 20.12).
Esta notificação (citação pessoal - Notificação penhora - ativação da venda, ofício n.° 3494, de 21-03-2018 referente aos processos executivos n.°s 3085201481160283, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201701459783, 3085201701707663, 3085201701990560, 3085201901211668, 3085201701850814, 3085201801011804) ao abrigo deste instrumento veio a ocorrer aos 28-04-2018 tendo sido assinada pelo ora executado.
Deste modo, dever-se-á considerar-se esta citação como causa interruptiva da prescrição, a qual (citação), inutiliza para a prescrição o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo, como obsta ao início da contagem do novo prazo de prescrição enquanto o processo executivo não findar, desde que, na data da citação não se encontre decorrido o prazo prescricional, o que aconteceu no caso sob análise.
Por outro lado, foi encetado novo pedido de cobrança dos créditos ao Reino Unido (proc. AM 1615/20), no âmbito do mecanismo de assistência mútua na recuperação de créditos entre Estados Membros da União Europeia relativamente aos processos executivos n.°s 3085201701850814, 3085201801011804 e 3085201801672800 e 3085201901216716).
Ao contrário do que acontece com a citação pessoal, afigura-se-nos que a citação postal realizada a 2018-07-24, 2018-10-21,2019-02-17, 2019-04-24 e 2018-09-23 no âmbito dos processos executivos n.°s 3085201801362623, 3085201801750186, 3085201881096305, 3085201901211668 e 3085201801672800 não configurou um facto interruptivo da prescrição e consequentemente não teve por efeito inutilizar, para a prescrição, todo o tempo decorrido até à data em que se verificou esse facto (citação postal). (…) (330-392 dos autos [fls. 49 a 61 do pdf.]);

L) A 27/05/2024, a Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 3 proferiu o seguinte despacho de indeferimento do requerimento apresentado pelo Reclamante:
Concordo, pelo que de acordo com os fundamentos constantes da presente informação, respetivo parecer que antecede, indefiro o pedido de reconhecimento de prescrição da divida nos processos de execução fiscal n.°s 3085201481160283, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191, 3085201801362623, 3085201801750186, 3085201881096305, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201701459783, 3085201701707663, 3085201701990560, 3085201901211668, 3085201701850814, 3085201801011804 e 3085201801672800.
Indefere-se o pedido de reconhecimento da caducidade do direito à liquidação do imposto que originou o facto tributário.” (cfr. fls. 330-392 dos autos [fls. 47 do pdf.]).

Factos não provados
1) No âmbito do pedido de assistência mútua com a referência PT GB AM51018 foram comunicados ao Reclamante os seus direitos de defesa e os outros direitos;
2) No âmbito do pedido de assistência mútua com a referência PT_AM161520_20200903_UIPE_1 foram comunicados ao Reclamante os seus direitos de defesa e os outros direitos;
MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
Para a fixação da matéria de facto provada, a convicção do Tribunal baseou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, nos documentos e processos de execução fiscal juntos, não impugnados, conforme remissão feita em cada uma das alíneas do probatório.
No que concerne aos factos não provados n.º 1) e n.º 2), a convicção do Tribunal fundou-se na ausência de prova quanto à comunicação ao Reclamante, nomeadamente, dos direitos que pode exercer quando é chamado aos processos de execução fiscal.”.

* *
IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Vem a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira apresentar recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa invocando na conclusão A) das suas alegações que o recurso visa reagir contra a sentença que “(…) julgou procedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal apresentado nos termos do art. 276º do CPPT, e em consequência determinou a extinção por prescrição dos processos de execução fiscal, n.ºs 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191, 3085201481160283, 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663 e 3085201701990560”, alegando para o efeito erro de facto e de direito.

Importa referir com exatidão que o dispositivo da sentença quanto à procedência é o seguinte:
i) Julga-se procedente, por provada, a presente reclamação e, consequentemente, julgam-se extintos, por prescrição, os processos de execução fiscal n.º 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191 e 3085201481160283;
ii) Julga-se procedente, por provada, a presente reclamação quanto aos processos de execução fiscal números 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663, 3085201701990560 e, consequentemente, anulam-se todos os atos subsequentes dependentes da citação do Reclamante e contra si praticados.”.

A Recorrente alega que a citação posta em crise na sentença, cumpriu integralmente o estabelecido no art. 190º do CPPT como consta do documento de fls. 412 do SITAF, discordando do entendimento do tribunal a quo de que “ainda que se verifique que o reclamante tinha conhecimento da existência dos processos de execução fiscal perscrutados os factos – designadamente o próprio documento junto pelo Reclamante respeitante ao pedido de assistência com a referência PT_AM161520_20200903_UIPE_1 ( Cfr. alínea I) do probatório) – não se consegue aferir se as formalidades a que obedecem as citações previstas no artigo 190.º, n.º 2 do CPPT, que consubstanciam a indicação dos direitos do executado, designadamente, os de defesa, foram comunicadas.”.

O Recorrido apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso e a manutenção do decidido.

Vejamos então.

Importa desde já destacar que, pese embora a Recorrente invoque erro de julgamento de facto, na verdade não procedeu à impugnação da matéria de facto nos termos do art.º 640.º do CPC, nada requerendo em termos de aditamento, alteração ou supressão ao probatório, apenas limitando-se a invocar de forma genérica o erro de julgamento de facto, sem qualquer indicação clara e expressa dos factos que considera provados, nem o específico meio probatório em que sustenta o seu entendimento, pelo que deve manter-se inalterada a matéria de facto assente na sentença recorrida.

Prosseguindo.

O recurso apresentado pela AT recai não só sobre o dispositivo relativo à extinção por prescrição de diversos processos executivos – com os nºs 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191 e 3085201481160283 - mas também sobre o dispositivo da sentença que, em relação aos processos executivos com os nºs 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663 e 3085201701990560, determinou a anulação de todos os atos subsequentes, dependentes da citação do reclamante e contra si praticados.

Na verdade, a procedência da reclamação referente a todos os processos acima identificados assentou na nulidade da citação, declarada pelo tribunal a quo nos seguintes termos:
“(…) A citação é o ato destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução (cfr. artigo 35.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Nos termos do n.º 1, do artigo 189.º do CPPT “[a] citação comunica ao devedor os prazos para oposição à execução e para requerer a dação em pagamento, e que o pedido de pagamento em prestações pode ser requerido até à marcação da venda.”
Além de dever conter os elementos previstos nas alíneas a), c), d) e e) do n.º 1 do artigo 163.º do CPPT ou, em alternativa, ser acompanhada de cópia do título executivo, “[a] citação é sempre acompanhada da nota indicativa do prazo para oposição, ou para dação em pagamento, nos termos do presente título, bem como da indicação de que, nos casos referidos no artigo 169.º e no artigo 52.º da lei geral tributária, a suspensão da execução e a regularização da situação tributária dependem da efectiva existência de garantia idónea, cujo valor deve constar da citação, ou em alternativa da obtenção de autorização da sua dispensa. (cfr. artigo 190.º, n.º 1 e n.º 2 do CPPT).
No caso em apreço, verifica-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira fez dois pedidos junto do Reino Unido de assistência mútua para cobrança dos créditos: - o primeiro pedido a 06/04/2018, com a referência PT GB AM51018 8, tendo indicado no respetivo formulário os seguintes processos de execução fiscal 3085201481160283, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201701459783, 3085201701707663, 3085201701990560, 3085201701850814, 3085201801011804 (cfr. alíneas B) e C) do probatório);
- o segundo pedido com a referência PT_AM161520_20200903_UIPE_1, vindo indicado nos documentos juntos a estes autos pelo Reclamante os números dos processos de execução fiscal 3085201701850814, n.º 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201901216716, observando-se, quando comparado com o primeiro pedido, a repetição da indicação dos processos sublinhados (cfr. alínea I) do probatório).
Coligidos os factos, constata-se que no âmbito do primeiro pedido de assistência feito pelas autoridades portuguesas ao Reino Unido foram entregues ao Reclamante documentos referentes aos processos de execução fiscal a correr termos em Portugal (cfr. alínea D) do probatório), tanto que o Reclamante envia um e-mail ao serviço de finanças de Lisboa 3 a pedir informações, chegando mesmo a enviar a fotografia da certidão de dívida respeitante ao processo de execução fiscal n.º 3085201701459783 (cfr. alíneas E), F) e G) do probatório).
A mesma conclusão se extrai em relação ao segundo pedido de assistência, ou seja, de que o Reclamante tinha conhecimento que existiam processos de execução fiscal a correr termos contra ele em Portugal, tanto que os documentos respeitantes a este segundo pedido de assistência foram juntos a estes autos pelo Reclamante (cfr. alínea I) do probatório).
Contudo, ainda que se verifique que o Reclamante tinha conhecimento da existência dos processos de execução fiscal, perscrutados os factos - designadamente o próprio documento junto pelo Reclamante respeitante ao pedido de assistência com a referência PT_AM161520_20200903_UIPE_1 (cfr. alínea I) do probatório) – não se consegue aferir se as formalidades a que obedecem as citações previstas no artigo 190.º, n.º 2 do CPPT, que consubstanciam a indicação dos direitos do executado, designadamente, os de defesa, foram comunicadas.
Ora, de acordo com o artigo 191.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi alínea e), do artigo 2.º do CPPT, “(…) é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei.”, definindo o n.º 4 deste mesmo artigo que “[a] arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado.”
Como defendido pela Doutrina que se acompanha e adere (in SOUSA, Jorge Lopes de, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. III, 6.ª Ed., Áreas Editora, 2011, páginas 138 e 139): “[c]omo “defesa” do executado, para este efeito, não se poderá considerar apenas a possibilidade de dedução de oposição, mas sim o uso de todas as faculdades que a lei atribui ao executado no processo executivo, como a possibilidade de requerer o pagamento em prestações ou de requerer a dação em pagamento, direitos que, significativamente, podem ser exercidos precisamente no prazo de oposição (arts. 189.º, n.ºs 1 a 3, 196.º, n.º 1, e 201.º, n.º 1, do CPPT).
Trata-se, em qualquer dos casos, de possibilidades atribuídas ao executado para lhe facilitar o pagamento da dívida que, por este motivo, cabem perfeitamente num conceito lato de “defesa”, já que em qualquer deles se levantam obstáculos ao prosseguimento normal da execução.
De resto, não se compreenderia que, atribuindo a lei estas faculdades de requerer pagamento em prestações ou dação em pagamento, e traduzindo-se elas em direitos importantes para o executado, não houvesse qualquer sanção processual para a sua supressão derivada de omissão indevida da administração tributária.”
Entende-se que esta falta de comunicação dos direitos ao Reclamante prejudica a sua defesa, bastando a mera possibilidade deste prejuízo e não a demonstração do efetivo prejuízo, o que não é de afastar neste caso, uma vez que não é possível verificar nestes autos se as formalidades aludidas foram comunicadas ao executado e, como consequência desta omissão, o Reclamante não foi coartado no exercício dos direitos que lhe deviam ter sido comunicados, elencados no artigo 190.º, n.º 2, tanto que não resulta dos autos o exercício de nenhum deles, inclusivamente a prerrogativa de se opor às execuções fiscais.
Face ao exposto, conclui-se pela nulidade da citação nos processos de execução fiscal números 3085201481160283, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201701459783, 3085201701707663, 3085201701990560, 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800 e 3085201901216716, nos termos do artigo 191.º, n.º 1 do CPC, por não terem sido observadas as formalidades prescritas no artigo 190.º, n.º 2 do CPPT, tendo por efeito a anulação dos termos subsequentes dos processos de execução fiscal que deles dependam absolutamente, de acordo com o estatuído no artigo 165.º, n.º 2, o que se determinará no dispositivo em relação aos processos de execução fiscal cujas dívidas exequendas não estiverem prescritas.”.

Discorda a Recorrente de tal entendimento defendendo que a citação cumpriu na íntegra o disposto no art. 190º do CPPT, remetendo para o documento de fls. 412 do SITAF e alegando que, após consulta do pedido de cobrança de créditos ao Reino Unido (proc. AM 51018) no âmbito do mecanismo de assistência mútua na recuperação de créditos entre Estados membros da União Europeia, foi possível constatar que foram garantidos na íntegra os direitos do reclamante (indicação do prazo para apresentação de impugnação e caso pretenda contestar a peça deve ser redigida em língua portuguesa), não tendo, em momento algum sido lesado o direito de informação ao reclamante - cfr. conclusões F) a K) das alegações.

Apreciando.

Vejamos desde já a factualidade assente e não impugnada:

- A AT instaurou contra o executado, ora Recorrido, os processos de execução fiscal melhor identificados na alínea A) tendo, em 04/04/2018 formulado um pedido dirigido aos serviços do Reino Unido de notificação ao abrigo da assistência mútua na cobrança de créditos (com a referência PT GB AM51018), constando do documento, quanto ao objeto da notificação, “informar o destinatário dos documentos a que o presente documento informativo está anexado” (cfr. alínea B);
- A autoridade requerida do Reino Unido comunicou à AT em 15/05/2018 que os documentos tinham sido entregues na morada indicada no dia 28/04/2018 e tinham sido assinados por “H...” - cfr. alínea D);
- Após troca de emails entre o executado e a AT, aquele apresenta em 22/02/2024 requerimento com o teor descrito na alínea J) e que passamos igualmente a transcrever:
G..., residente em 182a M……………., titular do Número de Identificação Fiscal português 2…, tendo tomado conhecimento de que se encontram instaurados contra si os processos de execução fiscal abaixo identificados, vem invocar a CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO, assim como a PRESCRIÇÃO DAS DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS, relativamente a todas as prestações tributárias em execução fiscal nos processos abaixo identificados, nos termos dos artigos 45.° e 48.°, ambos da Lei Geral Tributária, assim como nos termos do artigo 175.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e do artigo 303.° do Código Civil, com as devidas e legais consequências, porquanto, tanto quanto é do seu conhecimento, nunca foi válida e eficazmente notificado de quaisquer liquidações de imposto, nem citados em tais processos de execução fiscal. (…)”; (sublinhado nosso)
- O requerimento foi objeto de despacho de indeferimento proferido em 27/05/2024 pela Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3 como consta da alínea L) , com a fundamentação vertida na alínea K), contra o qual foi apresentada a reclamação nos termos do art. 276º do CPPT, invocando novamente o Reclamante a caducidade do direito à liquidação, a prescrição das dívidas tributárias e afirmando que as comunicações enviadas pelas autoridades fiscais do Reino Unido não cumprem com os requisitos contidos no art. 163º do CPPT (como consta das conclusões apresentadas na petição inicial da reclamação). (sublinhado nosso)

Do acima exposto resulta que o Reclamante no requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal invocou a caducidade da liquidação e a prescrição da dívida decorrentes da falta de notificação e de citação, respetivamente, sendo que na reclamação do art. 276º do CPPT volta a invocar a caducidade da liquidação e a prescrição da dívida, sendo que agora invoca a falta dos requisitos dos títulos executivos.

O tribunal a quo, na sentença ora recorrida, analisou a situação em apreço e concluiu que ocorreu a nulidade da citação nos termos do art. 191º, nº 1 do CPC, por não terem sido observadas as formalidades prescritas no art. 190º, nº 2 do CPPT, tendo em consequência determinado a anulação dos termos subsequentes dos processos executivos.

E, na apreciação e decisão com referência à prescrição dos processos executivos tomou em consideração as causas legalmente previstas no art. 49º da LGT quanto à suspensão e interrupção do prazo de prescrição.

Mais concluiu que, face à nulidade da citação, inexiste um ato de citação com a virtualidade de interromper o prazo de prescrição das dívidas exequendas, tendo, após o computo dos respetivos prazos, declarado a prescrição das dívidas exequendas relativas aos PEF elencados na alínea i) do dispositivo com a sua consequente extinção.

Importa relembrar que o ato de citação pode estar inquinado por duas espécies de vícios distintos e de consequências bem diversas: falta de citação e nulidade da citação.

Ocorre falta de citação quando o ato se omitiu (inexistência pura) ou, ainda que efetuado, tenha sido feito, com atropelo à lei tão grave e erro tão grosseiro, que lhe deva ser equiparado. Aqui se abrangem os casos em que, apesar de formal e processualmente existir citação, se há-de entender que esta não se mostra efetuada.
Verifica-se a nulidade da citação quando o ato se praticou, mas não se observaram, na sua realização, as formalidades prescritas na lei (neste sentido Ac. TRP de 21/06/2022 – proc. 2000/00.5T8OVR-A.P1)

A falta de citação integra uma nulidade absoluta, de conhecimento oficioso e determina a anulação de todo o processado, após a petição inicial (cfr. art.º 187.º, al. a) e art.º 188.º ambos do CPC).

A nulidade da citação é considerada uma nulidade secundária, só pode ser invocada pelo demandado, e a ela se reporta o art.º 191.º do CPC.

Daqui resulta que apenas a falta de citação é questão de conhecimento oficioso, sendo que a nulidade da citação, enquanto nulidade secundária, tem de ser invocada pelo executado no prazo de oposição, ou nos casos de citação edital ou quando não tiver sido indicado prazo para deduzir oposição, na primeira intervenção do citado no processo.

Como se enuncia no Ac. do STA DE 07/09/2005- proc. 0950/05:
I – São distintas as situações em que ocorre no processo de execução fiscal falta de citação e nulidade de citação.
II – A falta de citação em processo de execução fiscal só ocorre se se verificar uma situação enquadrável nas alíneas a) a d) do n.º 1 do art. 195.º do C.P.C. e, para além disso, o respectivo destinatário alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que lhe não foi imputável (art. 190.º, n.º 5, do C.P.P.T.).
III – A nulidade de citação em processo de execução fiscal ocorre quando a citação tenha sido efectuada, mas não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (art. 198.º, n.º 1, do C.P.C.).
IV – Só a falta de citação, e não também a nulidade de citação, é enquadrável na alínea a) do n.º 1 do art. 165.º do C.P.P.T. e, por isso, só aquela pode constituir nulidade insanável do processo de execução fiscal, invocável a todo o tempo até ao trânsito em julgado da decisão final, se a falta prejudicar a defesa do citado.
V – A nulidade de citação, no processo de execução fiscal, só pode ser arguida dentro do prazo indicado para a oposição (equivalente à contestação em processo declarativo), ou, nos casos de citação edital ou quando não tiver sido indicado prazo para deduzir oposição, na primeira intervenção do citado no processo.”.

Ora como vimos supra, se por um lado o executado invoca a falta de citação, sem qualquer densificação, no requerimento dirigido ao OEF, na reclamação apresentada posteriormente ao indeferimento desse requerimento invoca a falta de requisitos dos títulos executivos.

A sentença recorrida considerou que, verificando-se a nulidade da citação, a interrupção da prescrição decorrente da citação não produziu quaisquer efeitos, razão pela qual considerou que o prazo de prescrição das dívidas exequendas referentes aos processos executivos com os nºs 3085201701850814, 3085201801011804, 3085201801672800, 3085201601249657, 3085201601513923, 3085201601827308, 3085201501434527, 3085201501632159, 3085201501846191 e 3085201481160283, já havia decorrido com a consequente prescrição das dívidas exequendas e extinção dos processos executivos.

Não concordamos com o assim decidido porquanto a nulidade da citação não impede a interrupção da contagem do prazo de prescrição, nos termos do nº 3 do art. 323º do Código Civil (Nesse sentido veja-se o Acórdão do STA de 11/03/2009- proc. 0219/08).

E assim sendo, conclui-se que a citação interrompeu a contagem do prazo de prescrição com o consequente efeito instantâneo e duradouro (art. 326 e art. 327º do C. Civil), razão pela qual os processos executivos não se mostram prescritos.

Quanto ao decidido com referência aos processos de execução fiscal nºs 3085201901216716, 3085201701459783, 3085201701707663 e 3085201701990560, consubstanciado na anulação de todos os atos subsequentes, dependentes da citação do reclamante e contra si praticados, na sequência da declaração pelo tribunal a quo da nulidade da citação sem que esta tenha sido invocada junto do órgão de execução fiscal e, não sendo questão de conhecimento oficioso, não poderia a sentença recorrida ter declarado essa nulidade e ter anulado os termos dos processos de execução fiscal acima mencionados.

Por tudo o que vem exposto, conclui-se ser de conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a reclamação improcedente, com a presente fundamentação.
* *
V- DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e em consequência julgar a reclamação improcedente com a presente fundamentação.

Custas pelo Recorrido, em ambas as instâncias.
Lisboa 26 de junho de 2025
Luisa Soares
Lurdes Toscano
Susana Barreto