Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:587/13.8BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:01/23/2025
Relator:MARIA DA LUZ CARDOSO
Descritores:IRS - TRABALHO DEPENDENTE
AJUDAS DE CUSTO
ÓNUS DA PROVA
Sumário:I - A característica essencial das ajudas de custo é o seu carácter compensatório, visando reembolsar o trabalhador pelas despesas que foi obrigado a suportar em favor da sua entidade patronal, por motivo de deslocações ou novas instalações ao serviço desta, e a inexistência de qualquer correspectividade entre a sua percepção e a prestação de trabalho.
II - Porque a lei exclui do conceito de rendimentos da categoria A para efeitos de IRS as ajudas de custo que não excedam os limites legais, tal como definidos para os servidores do Estado (cfr. artigo 2.°, n.º 3, alínea e), e 6, do CIRS), a tributação em sede de IRS dos montantes auferidos a titulo de ajudas de custo e que se compreendam dentro desses limites só pode ser sustentada se a Administração Tributária demonstrar a falta de verificação dos pressupostos para a atribuição desses montantes a esse título, o que lhe permitirá alterar a declaração de rendimentos (cfr. artigos 55.°, 74°, n.° 1 e 75.°, n.° 1, da LGT).
III - É sobre a Administração Tributária que recai o ónus de demonstrar que as quantias devidamente declaradas como ajudas de custo constituem retribuição.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I - RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente), veio interpor recurso da sentença proferida em 28 de maio de 2018 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por J......., (doravante Recorrido) do despacho de indeferimento expresso da reclamação graciosa deduzido contra a liquidação adicional de IRS nº .........8 e respetivos juros compensatórios, relativa ao ano de 2008, no valor total de €6.201,68.
Com o requerimento de interposição do recurso, a Recorrente apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões:

CONCLUSÕES:

1. Não concorda a Representação da Fazenda Pública com a, aliás, Douta Sentença, na qual se decidiu pela procedência da presente Impugnação, ordenando a anulação do ato tributário – liquidação de IRS referente ao ano de 2008 -, por ter considerado não ter a AT reunido indícios suficientes de molde a requalificar as verbas recebidas a título de ajudas de custo como remunerações do trabalho dependente;
2. Entende a Autoridade Tributária ter feito devida prova de estarmos perante pagamentos/recebimentos que, anda que qualificados pelas partes como ajudas de custo, ou seja, tendo natureza compensatória, revestiram, na verdade, natureza remuneratória;
3. O próprio Tribunal “a quo” refere que a Autoridade Tributária evidencia, em favor da sua tese, que os valores duplicaram nos meses de junho e novembro, meses correspondentes ao pagamento dos subsídios de férias e natal. Entende, no entanto, que tal circunstância, desacompanhada de outros elementos fácticos que permitam descaracterizar as verbas auferidas como ajudas de custo não são suficientes para subsumir os valores auferidos pelo Impugnante na categoria A;
4. Mas a “ausência de outros elementos fácticos” que invoca resulta precisamente de desconsiderar todos os outros elementos recolhidos pelos serviços inspetivos, relativizando-os e julgando-os de nenhum valor;
5. Foram diversos os elementos recolhidos pelos serviços de inspeção e elencados a fls. 3 do RIT, nomeadamente, 1. Nos três primeiros meses o valor mensal das ajudas de custo foi constante, independentemente do número de dias, levando a que o valor líquido mensal totalizasse sempre € 1.775,00; 2. Em Abril e Maio, o valor mensal das ajudas de custo foi de € 1.170,00, independentemente do número de dias, para que o contribuinte auferisse mensalmente a quantia de €2.000,00; 3. Em Junho, mês em que foi processado o subsídio de férias, o valor das ajudas de custo duplicou para que o valor a receber fosse exactamente o dobro do recebido no mês anterior; 4. Em Julho e Agosto, a situação é precisamente igual à ocorrida nos meses de Abril e Maio; 5. Em Setembro, o valor das ajudas de custo foi de € 2.670,00 porque lhe foi descontado um “adiantamento de vencimento” de € 1.500,00, daí resultando que o valor a receber foi exactamente o mesmo (€ 2.000,00); 6. Em Outubro, o valor das ajudas de custo aumentou para € 1.420,00, e isto independentemente do número de dias, passando o valor recebido pelo sujeito passivo para € 2.250,00; 7. Em Novembro, mês em que foi processado o subsídio de Natal, o valor das ajudas de custo duplicou para que o montante a receber fosse exactamente o dobro do valor recebido no mês anterior, tal como aconteceu em Junho; 8. Em Dezembro, a situação é idêntica ao mês de Outubro.”. A estes somou-se o facto de se ter verificado que o sujeito passivo prestou serviço para além do horário normal de trabalho, o que nos termos do disposto no art,º 197.º da lei n.º 99/20013, de 27.08, constitui trabalho suplementar, o qual deve ser remunerado nos termos do art.º 258.º do mesmo diploma – e dos mapas de pagamento não consta qualquer referência a trabalho suplementar. Pelo que, se discorda da Douta sentença, quando refere ausência de outros elementos fácticos;

6. Tendo ficado devidamente fundamentando, igualmente de direito, por aqueles
serviços, a qualificação que fizeram dos valores pagos como tratando-se de rendimento de trabalho dependente;
7. E quanto ao ónus da prova, suporta-se o tribunal no disposto no n.º 1 do art.º 75.º da LGT, afirmando que só passa a competir ao contribuinte a prova de que declarou todos as situações a que estava legalmente vinculado quando, efetivamente, a AT tenha carreado elementos de facto que sejam suscetíveis de abalar a dita presunção da escrita. E como entende que a AT não reuniu os indícios suficientes não terá cumprido com aquele ónus;
8. Refere a Douta Sentença que, atentas as redações dos n.ºs 2 e alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS, “as ajudas de custo, à data, eram consideradas como remuneração, a partir do valor que excedesse os limites legais. O mesmo sucedia com as verbas para despesas de deslocação, viagens ou representação de que não tivessem sido prestadas contas até ao termo do exercício”;
9. No entanto, do n.º 1 do art.º 2.º do CIRS, na redação à data dos factos, resulta considerarem-se rendimentos de trabalho dependente as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular, provenientes de trabalho por conta de outrem. E o n.º 2 do mesmo preceito vem elencar de forma abrangente qual a configuração que poderão ter aquelas remunerações, nomeadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações, etc, etc. Ou seja, os pagamentos realizados pela entidade patronal ao seu trabalhador, independentemente da forma que revestirem são, à partida, por lei, enquadrados na categoria de rendimentos de trabalho dependente, ou seja, entendeu o legislador que terão desde logo um caráter remuneratório;
10. O disposto na alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS aplica-se apenas às ajudas de custo, ou seja, aos valores pagos não a título remuneratório, mas a título compensatório. E o que aquela alínea nos diz é que, aqueles pagamentos realizados a título compensatório pela entidade patronal, ainda assim serão tributados como se fossem pagos a título remuneratório, desde que ultrapassados determinados limites;
11. Caberá, então, salvo melhor opinião, ao Impugnante, fazer prova de que os pagamentos realizados revestem a natureza de ajuda de custo, ou seja, possuem natureza compensatória, assim os eximindo á aplicação dos n.ºs 1 e 2 do art.º 2.º do CIRS. Passaria então a pertencer à Autoridade Tributária demonstrar que os pagamentos que revestem tal natureza ultrapassam os montantes a partir dos quais a lei prevê a sua tributação;
12. A questão decidenda, in casu, está precisamente na qualificação prévia dos pagamentos realizados pela sociedade CMN como ajudas de custo, para se poder proceder à aplicação da alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS, ou seja, para aferir se excedem ou não os limites legalmente impostos. Caso se conclua que os pagamentos realizados não têm carater compensatório, mas meramente remuneratório, não há sequer que ir para aquela alínea d) do n.º 3 do artigo, pois trata-se apenas de aplicar a regra geral prevista nos n.ºs 1 e 2;
13. E como o CIRS indica que os pagamentos realizados pela entidade patronal ao seu trabalhador serão considerados rendimentos de trabalho (ou seja, a lei assume que revestem caráter remuneratório), salvo melhor opinião caberá sempre a quem paga os rendimentos e quem os recebe fazer prova de que os mesmos revestem natureza compensatória. Ou seja, cabe-lhes demonstrar perante a Autoridade Tributária que os mesmos se destinam a compensar o trabalhador por gastos necessários e indispensáveis ao exercício da atividade;

14. Por outro lado, e trata-se de diferente requisito, a alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS, aplicável apenas nas situações de pagamento de ajudas de custo, faz depender a sua tributação, não apenas do cumprimento dos limites legais, mas também da observação dos pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado. Ainda que os montantes pagos revistam natureza compensatória, apenas estarão isentos se cumprirem os requisitos previstos para a atribuição dos mesmos aos funcionários do estado;
15. Afirma o Tribunal “a quo” que” só passa a competir ao contribuinte a prova de que declarou todas as situações a que estava legalmente vinculado quando, efetivamente, a AT tenha carreado elementos de facto que sejam suscetíveis de abalar a dita presunção da escrita”. Ainda que acedendo, sem conceder, não se concorda, no entanto, que não tenha a Autoridade Tributária demonstrado “o quid da qualificação efectuada, sendo que dos elementos constantes do Relatório de Inspecção não se podem extrair, nem do ponto de vista fáctico, nem consequentemente do ponto de vista legal, pressupostos para a qualificação efectuada pela entidade fiscalizadora”, pois, como dito, ainda assim se entende que, no caso, reuniu a Autoridade Tributária prova indiciária suficiente a fazer abalar a presunção prevista no n.º 1 do art.º 75.º da LGT;
16. Competindo, então, ao Impugnante, vir fazer prova de que, de facto, aqueles pagamentos visaram suportar as despesas que teve com deslocações e outras, ao serviço da sua entidade patronal. Cabia-lhe nomeadamente explicitar porque razão eram tais pagamentos realizados com periodicidade mensal, porque é que nos meses em que recebia subsídio de férias e Natal duplicavam os valores daquelas ajudas, ou qual a justificação para o facto de receber ajudas de custo mesmo em gozo de férias (atenta a regularidade mensal), ou ainda, o facto de, estando fixado um determinado horário no seu contrato de trabalho ser praticado outro, com acréscimo de horas, as quais aparentemente nunca foram pagas pela entidade patronal como trabalho extraordinário, apenas constando pagamento de ajudas de custo;
17. Ao decidir, como decidiu, a Douta Sentença fez errada apreciação dos factos – erro de julgamento de facto e fez também errada aplicação do direito – erro de julgamento de Direito - tendo violado o disposto nos n.ºs 1, 2 e 3 do art.º 2.º do CIRS e art.º 75.º da LGT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente Impugnação, tudo com as devidas e legais consequências.”

*

O Recorrido, devidamente notificada para o efeito, apresentou contra-alegações, tendo as suas conclusões o seguinte teor:

“CONCLUSÕES

A.A sentença ora recorrida determinou a anulação da liquidação de IRS do ano de 2008 por vicio de violação de lei consubstanciada na insuficiência da fundamentação e errónea interpretação da citada norma de incidência no que respeita à desconsideração dos rendimentos auferidos pelo Recorrido a título de ajudas de custo por parte da AT.

B.O objecto de recurso do Ilustre Representante da Fazenda Pública considera que a liquidação adicional se deverá manter atendendo a que o montante pago a título de ajudas de custo ao Recorrido constitui remuneração proveniente de trabalho por conta de outrem e, nessa medida, considerado como rendimento de trabalho dependente de acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.Q do CIRS.

C. Considerou o Tribunal a quo, e bem, que sempre caberia à Autoridade Tributária (AT) demonstrar que as ajudas de custo não correspondem a efectivas deslocações e que os montantes pagos excediam os limites previstos na lei.

D. Ora, dos autos e tal como exaustivamente fundamentado na sentença ora recorrida, em nenhum momento a Representante da Fazenda Pública ou a AT faz a prova que lhe competia para afastar a verificação dos pressupostos legais quanto à não tributação das ajudas de custo: (i) a prova de que os montantes auferidos enquanto ajudas de custo ocorreram por inexistência de efectivas deslocações por parte do trabalhador ao serviço e no interesse da sua entidade patronal; e, (ii) de que o pagamento de quantitativo diário excedia os limites anualmente fixados para os servidores do Estado.

E. Bem andou a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que considerou, na senda do Acórdão do STA de 08/11/06, recurso 01082/04, que sendo a alínea d) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS uma verdadeira norma de delimitação negativa de incidência ou exclusão de tributação de IRS, o ónus da prova de tal excesso, bem como a verificação da falta de pressupostos de atribuição, enquanto pressuposto da norma de tributação, sempre recair ia sobre a AT.

F. Na verdade, da apreciação da prova vertida nos autos, resultou claro que não foi possível qualificar, sem mais, as ajudas de custo como revestindo natureza remuneratória - antes pelo contrário, ficou provado que as deslocações do Recorrido ocorreram efectivamente para Sines, Figueira da Foz, Alhandra e Loulé e que o local de trabalho era em Amora, Seixal.

G. De facto, nos termos do disposto na aludida norma de exclusão de incidência de IRS, apenas as ajudas de custo que excedam o limite legal fixado anualmente para os servidores do Estado estão sujeitas a IRS.

H. Sendo certo que, o ónus de prova de tal excesso, bem como da verificação dos pressupostos da sua atribuição, como pressuposto da norma de tributação, impendia sobre a AT e a Fazenda Pública não logrou fazer prova nesse sentido, "agarrando-se" a uma presunção, a um mero enquadramento legal, nem sequer considerando existir excesso para além do limite legalmente estabelecido, nem contrariando a existência de verdadeiras deslocações

I. Provando-se que ocorreram efectivas deslocações do Recorrido do seu local de trabalho, sempre caberia à AT a prova do excesso do seu pagamento ou a prova da inexistência das deslocações em causa. Revelando para efeitos de tributação de ajudas de custo que o trabalhador esteja efectivamente deslocado do seu local de trabalho e que as mesmas tenham um carácter compensatório.

J. Assim, a definição do regime da atribuição das ajudas de custo e sua não tributação na

esfera de um trabalhador particular resulta do regime consagrado no artigo 2.º do Código do IRS.

K.O pagamento das ajudas de custo e sua tributação dependem, de acordo com a aludida norma legal, da verificação dos seguintes pressupostos substantivos: (i) os montantes serem auferidos enquanto ajudas de custo por realização de uma efectiva deslocação por parte do trabalhador ao serviço e no interesse da sua entidade patronal; e, (ii) o pagamento de quantitativo diário não exceder os limites anualmente fixados para os servidores do Estado.

L. Neste sentido, o Acórdão do STA n.º 24239 de 15/12: "De facto, (...) tudo se passa por conhecer se num montante de ajudas de custo são descortináveis os dois vectores patentes na alínea d) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS; ou seja, tem que se identificar a natureza legal dos pagamentos e, num segundo momento, verificar se o montante reembolsado excedeu os limites legais. Ora, esses vectores ou condições sempre se encontraram no ClRS e não, como pretendia a Administração Fiscal, no Decreto-lei n.º 519-M/79. De 28 de Dezembro" (actual DL 106/98).

M. Ora, in casu, ficou mais do que provado e admitido pela própria Fazenda Pública, que ocorreram efectivas deslocações por parte do Recorrido para Sines, Figueira da Foz, Alhandra e Loulé ao serviço da entidade patronal.

N. De facto, ficou provado que o Recorrido à data em que foi contratado para a empresa residia em Portugal bem corno, havia sido contratado para o desempenho de funções nas oficinas sitas no local da sede da CMN.

O. Assim, ficou determinado pelo Tribunal a quo que a liquidação adicional era ilegal, uma vez que a AT se limitou a desconsiderar as ajudas de custo nos termos em que haviam sido atribuídas pela entidade empregadora ao trabalhador, sem ponderar os limites previstos na lei quanto à sua atribuição e não sujeição a IRS.

P. Desse modo, ficou provado que, não logrou a AT, em sede de inspecção tributária, dar a conhecer ao contribuinte os fundamentos da tributação dos montantes recebidos a título de ajudas de custo, que, de acordo com os dois pressupostos substantivos para a sua determinação, passaria por demonstrar que os valores pagos constituem ajudas de custo que excedem os valores máximos legalmente estabelecidos, ou seja, as ajudas de custo atribuídas ultrapassaram os limites impostos na alínea d) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS. Ou

Q. Demonstrar que, nos termos do artigo 74.º da LGT, o trabalhador não realizou as deslocações ao serviço da sua entidade patronal, nem suportou as despesas em causa.

R. Não tendo logrado demonstrar tais pressupostos, bem andou a sentença do Tribunal o quo ao considerar que nunca estaria a AT em condições de efectuar correcções às declarações dos contribuintes, assentes na descaracterização das ajudas de custo, pois que tal revelará uma errada aplicação das normas jurídicas atinentes à presente querela, o que determinou, bem, a anulação da liquidação adicional de IRS.

S. Ou seja, bem andou a sentença recorrida ao determinar que, a AT não logrou demonstrar
que as ajudas de custo pagas ao Recorrido excederam os limites legais, nem que não
ocorreram efectivas deslocações.

T. O mesmo é dizer que, não conseguiu a AT em definitivo fundamentar a desconsideração das ajudas de custo a que procedeu.

U. Face ao que foi vertido nos presentes autos, em particular o invocado quanto ao dever de fundamentação da AT, bem assim o que foi referido quanto ao ónus da prova que sobre si impendia, considerou o Tribunal a quo, por ser evidente, que o Recorrido prestou serviço à sua entidade patronal com sede em Portugal, em obras sitas em Sines, Figueira da Foz, Alhandra e Loulé, encontrando-se, assim, deslocado do seu local de trabalho.

V. Portanto, sempre caberia à AT a obrigação de demonstrar/provar que as estadias do Recorrido em Sines, Figueira da Foz, Alhandra e Loulé não eram ocasionais, o que não aconteceu.

W. Contudo, sempre se reiterará que, ficou provado que o Recorrido foi contratado para exercer funções em Amora - Seixal, na sede da empresa.

X. Bem como, ficou provado ser o domicílio necessário do Recorrido em Amora, Seixal - Portugal -, e nunca em Sines, Figueira da Foz, Alhandra ou Loulé.

Y. Desta forma, por cada deslocação que realizou, sempre seriam devidas ajudas de custo.

Z. Nesse sentido, atento o disposto na alínea d) do n.º 3 do artigo 2.5 do CIRS, deveria a AT fundamentar a liquidação adicional de IRS que teve por base as ajudas de custo consideradas enquanto rendimento de trabalho dependente, ou invocando que a sua atribuição foi excessiva face aos limites legais estabelecidos na lei ou provando a sua não ocorrência.

AA. Assim, resultou claro, como provado e devidamente apreciado pelo Tribunal a quo, reitere-se que a sede da CMN situa-se em Amora, pelo que, sem mais, se pode reter que o Recorrido foi contratado para preslar trabalho ria Amora, podendo deslocar-se (!) para outros locais.

BB. De facto, o Recorrido foi contratado para prestar trabalho em Amora - Seixal, tratando-se a sua prestação de trabalho em quaisquer outros locais de verdadeiras deslocações, pelas quais sempre seria devido o pagamento de ajudas de custo por parte da entidade patronal.

CC. Com efeito, apesar de ter sido contratado para prestar trabalho na sede da CMN, obrigou-se a aceitar as deslocações que a entidade patronal lhe pudesse impor para fora da sede da empresa, sendo que esta custearia as despesas com tais deslocações.

DD. De facto, a questão da "residência habitual" deverá ser tida em primordial conta.

EE. Isto porque, entendem os tribunais ser legítimo o pagamento de valores a título de ajudas de custo quando exista deslocação da residência habitual.

FF. Ora, não só ficou demonstrado como provado nos presentes autos a efectiva deslocação
da residência habitual, por parte do Recorrido, como também se conseguiu patentear a deslocação do domicílio profissional.

GG. Pelo que, bem andou a douta sentença, ao considerar que a AT interpretou de forma absolutamente errada os pressupostos da não tributação das ajudas de custo, conduzindo a um entendimento e, consequentemente, liquidação ilegal por errada aplicação das normas jurídicas.

HH. Quanto à questão do ónus da prova e da falta de fundamentação que sempre caberia à AT veja-se, entre outras, as doutas sentenças proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, nesse mesmo sentido, quanto aos trabalhadores da CMN nus processos n.-s 289/13.5BEBJA, 344/13.1BEBJA,176/13.7BEBJA, 453/13.7BEBJA, 414/13.7BEBJA, 119/13.8BEBJA, 341/13.7BEBJA, 288/13.7BEBJA, 355/13.2BEBJA, 342/13.7BEBJA, 336/13.7BEBJA, 145/13.7BEBJA, 338/13.7BEBJA, 339/13.5BEBJA, 127/13.9BEBJA; pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, nesse mesmo sentido, quanto aos trabalhadores da CMN nos processos n.ºs 835/13.4BEALM, 586/13.OBEALM e pelos Tribunais Administrativos e Fiscais de Sintra e Penafiel, nesse mesmo sentido, quanto aos trabalhadores da CMN nos processos n.ºs 1176/13.2BESNT, 764/13.1BEPNF, respectivamente.

II. As aludidas Impugnações, que foram totalmente procedentes, apresentadas nos Tribunais Administrativos e Fiscais de Beja, Almada, Sintra e Penafiel por outros trabalhadores da mesma empresa CMN, com a mesma identidade de factos e fundamentos, tiveram por base a impugnação das liquidações de IRS do ano de 2008 na sequência da mesma acção inspectiva levada a cabo pela Direcção de Finanças de Setúbal a cerca de 300 trabalhadores.

JJ. No mesmo sentido foram, entre muitos outros, os doutos Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte e do Tribunal Central Administrativo Sul, proferidos no âmbito dos processos n.ºs 764/13.1BEPNF e 696/13.3BEALM, respectivamente, que, com a mesma identidade de factos e fundamentos, tiveram por base a impugnação da liquidação adicional de IRS referente ao ano de 2008 (ut. Doc. n.º 1 e se dá por integrado para todos os legais efeitos), tendo-se acordado negar provimento ao recurso apresentado pela Fazenda Pública.

Nestes termos, e nos que V.s Ex.ªs muito doutamente suprirão, com os fundamentos expostos, deve ser considerado totalmente improcedente, por não provado, o Recurso apresentado, confirmando-se a sentença recorrida que determinou a anulação da liquidação adicional de IRS do ano de 2008, com as legais consequências.
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O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos legais (artigo 657º, n. º2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), cumpre apreciar e decidir.

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Delimitação do objeto do recurso

Em ordem ao consignado no artigo 639º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir:

i)se a sentença recorrida incorre em erro de julgamento na apreciação dos factos e na aplicação do direito ao julgar procedente a impugnação.

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II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1- De facto

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO
III.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Com base na documentação junta aos autos, na posição assumida pelas partes, e com base no processo administrativo instrutor consideram-se provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa:

A. Em 16.04.2007, o Impugnante J....... celebrou escrito denominado de “Contrato de Trabalho a Termo Certo” com a sociedade designada “C........., LDA”, com sede na Rua Almeida Garrett, nº…., 1º direito, concelho do Seixal, do qual resulta, designadamente, o seguinte:

Primeira
A celebração deste contrato é legalmente permitida e tem por justificação o desempenho de funções determinadas pelo acréscimo temporário de actividade, de acordo com a alínea f) do art. 129.º do diploma supra citado. (…)
Segunda
À Segunda Outorgante é atribuída a categoria profissional de Engenheiro Mecânico, competindo-lhe desempenhar as funções respectivas, nos termos em que estão descritas no Contrato de Trabalho aplicáveis.
Quarta
A Segunda Outorgante desempenhará as suas funções na Praceta Emídio Santana, nº ….-Casal do Marco-2850-588, ou em outro local para onde eventualmente seja deslocado.
Quinta
A Segunda Outorgante cumprirá o período de trabalho semanal de quarenta horas, no seguinte horário de trabalho: De Segunda a Sexta-Feira das 9:00 horas às 18:00 horas, sendo o período de Almoço das 13:00 às 14:00 horas. (cf. fls. 24 e 25 do Processo Administrativo-PA, que se dão por integralmente reproduzidas);

B. No ano de 2008, o Impugnante tinha a sua residência e domicílio fiscal na Av. Vieira da Silva, nº…., 5º direito, em Corroios (cfr. fls. 24 e 25, 35 do PA apenso);

C. Durante o ano de 2008, e ao abrigo do contrato referido na alínea A), o Impugnante J....... efetuou diversas deslocações para as instalações/obras da empresa “C........., LDA”, sitas em Sines, Figueira da Foz, Alhandra e Loulé (facto alegado no artigo 24. da petição inicial e corroborado pelos recibos de remunerações e folha de itinerário; A AT não impugna a realização das deslocações e o facto de o mesmo ter estado deslocado nesses locais, sindica é que de acordo com o estipulado contratualmente o abono de tais despesas configure ajudas de custo. Coloca, assim, em causa a natureza das despesas mas não refuta que as deslocações se tenham realizado);

D. No ano de 2008, a sociedade designada “C........., LDA”, pagou ao Impugnante J....... o valor de €18.205,00, a título de ajudas de custo (cf. fls. 58 a 61 do PA apenso, que se dão por integralmente reproduzidas; facto que se extrai do RIT e do teor da p.i.);

E. Em 14 de março de 2009, o Impugnante apresentou declaração modelo 3 de IRS, referente ao ano de 2008, tendo declarado no Anexo A, rendimentos de trabalho dependente no valor total de €14.000,00 (facto não controvertido e que se extrai do RIT e cf. fls. 49 e 50 do PA que se dão por integralmente reproduzidas);

F. Em 19.06.2012, a Autoridade Tributária, credenciada pela Ordem de Serviço n.º OI201201021, deu início a uma ação de Inspeção Tributária, de âmbito parcial, com vista à análise do cumprimento das obrigações tributárias do Impugnante, em sede de IRS, respeitante ao ano de 2008 e que teve por base os elementos recolhidos na sociedade “C........., LDA” (cf. RIT a fls. 48 e seguintes do PA apenso, que se dão por integralmente reproduzidas);

G. No âmbito da ação de inspeção referida na alínea antecedente, foi elaborado, em 09 de novembro de 2012, o relatório final de Inspeção Tributária, do qual resultou alteração ao rendimento colectável no valor de €18.205,00 constando do seu teor, designadamente, o seguinte:
“De acordo com o artigo 249.º da Lei n.° 99/2003, de 27 de Agosto, em vigor à data dos factos, "...na contrapartida do trabalho inclui-se a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie..." e até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador.

Assim, e de acordo com o artigo 2° do Código do IRS:
“1 - Consideram-se rendimentos de trabalho dependente todas as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular, provenientes de:
a) Trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado;
(...)
2 - As remunerações referidas no número anterior compreendem, designadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações ... prémios ... e outras remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não.
3 - Consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente:
(...)
d) As ajudas de custo e as importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço da entidade patronal, na parte em que ambas excedam os limites legais ou quando não sejam observados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado, e as verbas para despesas de deslocação, viagens ou representação de que não tenham sido prestadas contas até ao termo do exercício.”
Da análise aos recibos de vencimento, bem como outros elementos recolhidos na empresa "C....... - M........., Lda”, respeitantes ao ano de 2008 verificou-se o seguinte:
1. Ao sujeito passivo, para além dos rendimentos do trabalho dependente declarados pela empresa e pelo próprio, no montante de €14.000,00, foram ainda pagos com carácter de regularidade, uma importância a título de "ajudas de custo" no total de €18.206,00. (Vd. Anexo2).
2. Os valores, pagos a título de "ajudas de custo”, não foram objecto de retenção na fonte por parte da entidade pagadora dos rendimentos nem foram englobados pelo sujeito passivo em análise na respetiva Modelo 3 entregue.
3. Da cláusula Quinta do "Contrato Individual de trabalho a termo certo” celebrado entre a CMN e o sujeito passivo, que se junta no Anexo 3, consta que o período de trabalho semanal é de quarenta horas, sendo o horário de trabalho de Segunda a Sexta-Feira das 9 horas às 18 horas, com uma pausa para o almoço das 13 às 14 horas.



a) Estes valores incluem o vencimento + subsídio de férias/Natal
b) Ajudas de custo em duplicado, por ter sido pago subsídio de férias/Natal
4. No exemplar da "folha de itinerário relativa ao mês de Maio de 2008”, que se junta no Anexo 4 consta que o trabalhador iniciava o serviço às 7 horas e regressava à Amora às 22 horas.
Assim, verifica-se que o sujeito passivo prestou serviço para além do horário normal de trabalho, o que nos termos do artigo 197° da Lei n° 99/2003, de 27 de Agosto, constitui trabalho suplementar, o qual deve ser remunerado, nos termos do artigo 258° do mesmo diploma legal, no entanto, nos mapas de pagamento não consta qualquer referência a trabalho suplementar.

Da análise ao quadro anterior verifica-se que:
1. Nos três primeiros meses o valor mensal das ajudas de custo foi constante, independentemente do número de dias, levando a que o valor líquido mensal totalizasse sempre € 1.775,00;
2. Em Abril e Maio, o valor mensal das ajudas de custo foi de € 1.170,00, independentemente do número de dias, para que o contribuinte auferisse mensalmente a quantia de €2.000,00;
3. Em Junho, mês em que foi processado o subsídio de férias, o valor das ajudas de custo duplicou para que o valor a receber fosse exactamente o dobro do recebido no mês anterior,
4. Em Julho e Agosto, a situação é precisamente igual à ocorrida nos meses de Abril e Maio;
5. Em Setembro, o valor das ajudas de custo foi de € 2.670,00 porque lhe foi descontado um “adiantamento de vencimento” de € 1.500,00, dal resultando que o valor a receber foi exactamente o mesmo (€ 2.000,00);
6. Em Outubro, o valor das ajudas de custo aumentou para € 1.420,00, e isto mdependentemente do número de dias, passando o valor recebido pelo sujeito passivo para € 2.250,00,
7. Em Novembro, mês em que foi processado o subsídio de Natal, o valor das ajudas de custo duplicou para que o montante a receber fosse exactamente o dobro do valor recebido no mês anterior, tal como aconteceu em Junho;
8. Em Dezembro, a situação é idêntica ao mês de Outubro.

De acordo com a doutrina as características inerentes às compensações, sob a forma de ajudas de custo, são antes a sua natureza variável e a inexistência de correspondência entre o seu recebimento e a prestação de trabalho, visando tão-só o reembolso do trabalhador pelas despesas que teve de suportar derivado das deslocações que efetuou ao serviço da entidade patronal e em seu favor.

Face ao exposto, conclui-se que a título de ajudas de custo foram recebidos valores de forma fixa, regular e permanente durante o ano de 2008, os quais não visaram compensar o trabalhador por despesas realizadas ao serviço da entidade patronal, mas sim remunerá-lo pelo trabalho efectuado ao serviço da entidade patronal, estando assim enquadrados como rendimentos de trabalho dependente, nos termos do n.° 2 do artigo 2.° do Código do IRS.

Verifica-se assim, conforme o referido anteriormente, que ao sujeito passivo, para além dos rendimentos do trabalho dependente declarados pela empresa e pelo próprio, no montante de € 14.000,00, foi ainda paga, com carácter de regularidade, uma importância a titulo de "ajudas de custo” que no ano de 2008 atingiu o montante de € 18.205,00, que deve ser considerada como complementos de remuneração, constituindo, como tal, rendimento de trabalho dependente (categoria A) que deveriam ter sido englobada nos termos do artigo 22.° do Código do IRS.
Deste modo, e porque a entidade pagadora dos rendimentos não procedeu à retenção do IRS correspondente, cabe ao titular dos mesmos a responsabilidade originária pelo seu pagamento de acordo com o n.º 2 do artigo 103.” do Código do IRS, pelo que se procederá à correção das remunerações declaradas de harmonia com o disposto no n.° 4 do artigo 65.º° do mesmo diploma, mediante o acréscimo das importâncias pagas a título de "ajudas de custo".

Face ao exposto verifica-se a omissão de rendimentos na declaração entregue pelo sujeito passivo pelo que se propõe a alteração dos rendimentos declarados, nos termos do n.° 4 do artigo 65.º do Código do IRS, corrigindo-se o valor dos rendimentos da categoria “A" nos seguintes termos:

” (cf. RIT a fls. 44 e seguintes do PA apenso);

H. Em resultado das correções referidas na alínea antecedente, em 20-11-2012, a AT emitiu a liquidação adicional de IRS n.º …….8, referente ao ano de 2008, com o valor a pagar de €5.853,16 e a respetiva liquidação de demonstração de juros compensatórios no montante de €725,66 (cf. fls. 43 e 44 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas);

I. A 26-11-2012, a AT emitiu a liquidação de demonstração de acerto de contas nº 2012 00011164851, referente ao ano de 2018, com valor total a pagar de €6.201,68 (cf. fls. 42 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

J. Em 12.04.2013, na sequência da notificação dos atos de liquidação referidos nas alíneas antecedentes, o Impugnante apresentou reclamação graciosa, tendo sido prolatada informação instrutora datada de 30 de abril, propondo o seu indeferimento (cfr. fls. 2 a 25 e 31 a 40 do PA apenso);

K. A 02.05.2013, o Chefe de Divisão por delegação da Direção de Finanças com base na informação constante na alínea antecedente, proferiu projeto de indeferimento de reclamação (cfr. fls. 31 do PA apenso);

L. Na sequência da notificação do projeto de indeferimento referido na alínea antecedente, o Impugnante exerceu audição prévia, tendo sido proferida informação complementar de indeferimento da reclamação graciosa da qual se extrai, designadamente, o seguinte:
“3. Relativamente ao que vem exposto impõe-se referir:
•Não se pode dizer que o RIT se limita a tecer considerações genéricas quando as correções se encontram fundamentadas na análise do contrato individual de trabalho, nos recibos de vencimento, bem como nos documentos analisados junto da entidade empregadora;
• Por outro lado, como se refere no projeto de decisão, só se consideram ajudas de custo as importâncias recebidas a titulo de compensação pela realização de despesas ocasionais e excecionais suportadas pelo/ trabalhador, ao serviço da sua entidade patronal, desde que sejam respeitados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado e não excedam os limites legais.
• O que significa que, não se verificando os pressupostos da sua atribuição, não tinha a AT que apurar se excediam os limites legais.
• Ora o que a AT verificou no procedimento inspetivo e no âmbito deste procedimento é que os valores pagos a título de ajudas de custo foram pagos de forma fixa, regular e permanente, não correspondendo a deslocações esporádicas nem dependendo da apresentação de documentos comprovativos das despesas realizadas, pelo que não visavam o respetivo reembolso ou compensação;
•Não obedeciam por isso aos pressupostos legais da sua atribuição, antes constituíram uma verdadeira contraprestação do trabalho realizado;
•No mais, por já ter sido objeto de apreciação, remete-se para o que foi referido no projeto de decisão.
Termos em que, não tendo os reclamantes juntado aos autos nenhum elemento relevante, suscetível de alterar o projeto de decisão de INDEFERIMENTO, converte-se o mesmo em DECISÃO DEFINITIVA (cfr. fls. 52 e 53 do PA apenso);

M. A 21.05.2013, foi proferido despacho de indeferimento expresso da reclamação graciosa referida em J), pelo Chefe de Divisão de Inspeção Tributária, por delegação de competências da Direção de Finanças de Setúbal (cf. fls. 53 do PA apenso, que se dá por integralmente reproduzida);

N. Em 18.06.2013, a petição inicial deu entrada neste Tribunal (cf. carimbo aposto a fls. 1 dos autos);”
*

Factos não provados

“Não existem factos alegados não provados com interesse para a decisão da causa.”

*

Motivação

“MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

A decisão da matéria de facto resultou do exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que constam dos autos e do PA apenso, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.”

*
II.2 - De direito

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por J......., contra liquidação adicional de IRS nº .........8 e respetivos juros compensatórios, relativa ao ano de 2008, no valor total de €6.201,68, na sequência do que determinou a anulação do ato impugnado.

As questões sob recurso que importa aqui apreciar e decidir são de saber se a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e de direito na análise concreta que faz da situação laboral do ora Recorrido quanto aos valores auferidos a titulo de ajudas de custo, e bem assim, quanto aos pressupostos de qualificação desse tipo de pagamentos e respetivo ónus da prova.

Alega a Recorrente que a sentença recorrida que julgou procedente a impugnação judicial e anulou a liquidação adicional de IRS relativa ao ano de 2008, incorreu em erro na de julgamento na apreciação da matéria de facto e de direito, por a Autoridade Tributária e Aduaneira ter reunido indícios a seu ver suficientes para se concluir que os montantes pagos pela entidade patronal ao trabalhador a título de ajudas de custo, constituíam antes verdadeiras remunerações do trabalho prestado.

Para assim decidir a Mma Juíza a quo, entendeu, em síntese que “No caso vertente, caberia à AT demonstrar o quid da qualificação efetuada, sendo que dos elementos constantes do relatório de Inspeção não se podem extrair, nem do ponto de vista fáctico, nem consequentemente do ponto de vista legal, pressupostos para a qualificação efetuada pela entidade fiscalizadora, não permitindo inferir no sentido remuneratório das verbas auferidas pelo Impugnante.”

(…)

não se afigura ao Tribunal que a AT tenha reunido factos índice de molde a requalificar as verbas recebidas a título de ajudas de custo como remunerações do trabalho dependente.”

Discorda, a Recorrente, do assim decidido por entender que “… ter feito devida prova de estarmos perante pagamentos/recebimentos que, anda que qualificados pelas partes como ajudas de custo, ou seja, tendo natureza compensatória, revestiram, na verdade, natureza remuneratória;

(…)

5. Foram diversos os elementos recolhidos pelos serviços de inspeção e elencados a fls. 3 do RIT, nomeadamente, 1. Nos três primeiros meses o valor mensal das ajudas de custo foi constante, independentemente do número de dias, levando a que o valor líquido mensal totalizasse sempre € 1.775,00; 2. Em Abril e Maio, o valor mensal das ajudas de custo foi de € 1.170,00, independentemente do número de dias, para que o contribuinte auferisse mensalmente a quantia de €2.000,00; 3. Em Junho, mês em que foi processado o subsídio de férias, o valor das ajudas de custo duplicou para que o valor a receber fosse exactamente o dobro do recebido no mês anterior; 4. Em Julho e Agosto, a situação é precisamente igual à ocorrida nos meses de Abril e Maio; 5. Em Setembro, o valor das ajudas de custo foi de € 2.670,00 porque lhe foi descontado um “adiantamento de vencimento” de € 1.500,00, daí resultando que o valor a receber foi exactamente o mesmo (€ 2.000,00); 6. Em Outubro, o valor das ajudas de custo aumentou para € 1.420,00, e isto independentemente do número de dias, passando o valor recebido pelo sujeito passivo para € 2.250,00; 7. Em Novembro, mês em que foi processado o subsídio de Natal, o valor das ajudas de custo duplicou para que o montante a receber fosse exactamente o dobro do valor recebido no mês anterior, tal como aconteceu em Junho; 8. Em Dezembro, a situação é idêntica ao mês de Outubro.”. A estes somou-se o facto de se ter verificado que o sujeito passivo prestou serviço para além do horário normal de trabalho, o que nos termos do disposto no art,º 197.º da lei n.º 99/20013, de 27.08, constitui trabalho suplementar, o qual deve ser remunerado nos termos do art.º 258.º do mesmo diploma – e dos mapas de pagamento não consta qualquer referência a trabalho suplementar. Pelo que, se discorda da Douta sentença, quando refere ausência de outros elementos fácticos;
6. Tendo ficado devidamente fundamentando, igualmente de direito, por aqueles Serviços, a qualificação que fizeram dos valores pagos como tratando-se de rendimento de trabalho dependente;
7. E quanto ao ónus da prova, suporta-se o tribunal no disposto no n.º 1 do art.º 75.º da LGT, afirmando que só passa a competir ao contribuinte a prova de que declarou todos as situações a que estava legalmente vinculado quando, efetivamente, a AT tenha carreado elementos de facto que sejam suscetíveis de abalar a dita presunção da escrita. E como entende que a AT não reuniu os indícios suficientes não terá cumprido com aquele ónus;
(…)
10. O disposto na alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS aplica-se apenas às ajudas de custo, ou seja, aos valores pagos não a título remuneratório, mas a título compensatório. E o que aquela alínea nos diz é que, aqueles pagamentos realizados a título compensatório pela entidade patronal, ainda assim serão tributados como se fossem pagos a título remuneratório, desde que ultrapassados determinados limites;
11. Caberá, então, salvo melhor opinião, ao Impugnante, fazer prova de que os pagamentos realizados revestem a natureza de ajuda de custo, ou seja, possuem natureza compensatória, assim os eximindo á aplicação dos n.ºs 1 e 2 do art.º 2.º do CIRS. Passaria então a pertencer à Autoridade Tributária demonstrar que os pagamentos que revestem tal natureza ultrapassam os montantes a partir dos quais a lei prevê a sua tributação;
12. A questão decidenda, in casu, está precisamente na qualificação prévia dos pagamentos realizados pela sociedade CMN como ajudas de custo, para se poder proceder à aplicação da alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS, ou seja, para aferir se excedem ou não os limites legalmente impostos. Caso se conclua que os pagamentos realizados não têm carater compensatório, mas meramente remuneratório, não há sequer que ir para aquela alínea d) do n.º 3 do artigo, pois trata-se apenas de aplicar a regra geral prevista nos n.ºs 1 e 2;
(…)

16. Competindo, então, ao Impugnante, vir fazer prova de que, de facto, aqueles pagamentos visaram suportar as despesas que teve com deslocações e outras, ao serviço da sua entidade patronal. Cabia-lhe nomeadamente explicitar porque razão eram tais pagamentos realizados com periodicidade mensal, porque é que nos meses em que recebia subsídio de férias e Natal duplicavam os valores daquelas ajudas, ou qual a justificação para o facto de receber ajudas de custo mesmo em gozo de férias (atenta a regularidade mensal), ou ainda, o facto de, estando fixado um determinado horário no seu contrato de trabalho ser praticado outro, com acréscimo de horas, as quais aparentemente nunca foram pagas pela entidade patronal como trabalho extraordinário, apenas constando pagamento de ajudas de custo;”

Vejamos então de que lado está a razão.

Anote-se, desde já, que as questões suscitadas pelo presente recurso e referente à mesma entidade patronal, mesmo ano, com matéria factual semelhante e idênticas alegações e conclusões de recurso, apenas relativo a diferentes trabalhadores/Impugnantes, pronunciou-se esta Secção do Tribunal Central Administrativo Sul, nomeadamente nos Acórdãos de 2017.09.28, 20018.05.17, 2019.05.18, 2020.02.20, 2020.06.25, 2020.09.30 e 2020.09.30, proferidos nos processos nº 578/13.9BEALM e 696/13.3BEALM, 581/13.9BEALM, 555/13.0BEALM, 1176/13.2BESNT, 766/13.8BEALM e 430/13.8BEALM, respetivamente, e que, por sua vez, haviam já seguido o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 2016.11.10, proferido no processo nº 00764/13.1BEPNF, a cuja fundamentação aderimos sem qualquer reserva.

Antes de mais, convoquemos os preceitos legais que relevam para o efeito.

Dispunha o n.º 2 do artigo 2º, do Código do IRS (CIRS), em vigor à data dos factos, que:

“[a]s remunerações referidas no número anterior compreendem, designadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões, participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos, participações em multas e outras remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não”.

Mais dispondo a alínea d), do nº3 do citado normativo que:

“d) As ajudas de custo e as importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço da entidade patronal, na parte em que ambas excedam os limites legais ou quando não sejam observados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado, e as verbas para despesas de deslocação, viagens ou representação de que não tenham sido prestadas contas até ao termo do exercício.”

As ajudas de custo, à data, eram consideradas como remuneração, a partir do valor que excedesse os limites legais. O mesmo sucedia com as verbas para despesas de deslocação, viagens ou representação de que não tivessem sido prestadas contas até ao termo do exercício.

Os valores pagos a título de ajudas de custo, dado o carácter compensatório que lhes é reconhecido (compensação por despesas que o trabalhador é obrigado a suportar, designadamente por motivo de deslocações), não se integram no conceito de remuneração, para efeitos de IRS.

Quanto ao ónus da prova, importa ter presente que em sede de IRS, a determinação do rendimento coletável, tem por base a declaração Modelo 3, a qual deve ser entregue pelo
sujeito passivo, vigorando, portanto, o princípio da verdade declarativa.

Preceitua, neste âmbito, o artigo 75º, nº1, da Lei Geral Tributária (LGT), no sentido de que se presumem verdadeiras as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei. O princípio da verdade declarativa coloca na esfera de atuação dos contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos, logo a AT está vinculada a liquidar os tributos com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, a posteriori, ao controlo dos factos declarados.

Assim, só passa a competir ao contribuinte a prova de que declarou todos as situações a que estava legalmente vinculado quando, efetivamente, a AT tenha carreado elementos de facto que sejam suscetíveis de abalar a dita presunção da escrita.

No caso vertente, caberia à AT demonstrar o quid da qualificação efetuada, tendo o Tribunal a quo, entendido que “…dos elementos constantes do relatório de Inspeção não se podem extrair, nem do ponto de vista fáctico, nem consequentemente do ponto de vista legal, pressupostos para a qualificação efetuada pela entidade fiscalizadora, não permitindo inferir no sentido remuneratório das verbas auferidas pelo Impugnante.”

Ora, resulta do teor do Relatório inspetivo, que a AT para fundamentar a correção em sede do IRS que está na génese da liquidação adicional em causa, começa por evidenciar a base legal que reputa aplicável, para depois evidenciar que “foram ainda pagos com carácter de regularidade, uma importância a título de "ajudas de custo" no total de €18.206,00”

Concretizando, neste particular, que “Da cláusula Quinta do "Contrato Individual de trabalho a termo certo” celebrado entre a CMN e o sujeito passivo, que se junta no Anexo 3, consta que o período de trabalho semanal é de quarenta horas, sendo o horário de trabalho de Segunda a Sexta-Feira das 9 horas às 18 horas, com uma pausa para o almoço das 13 às 14 horas.

Especificando que “No exemplar da "folha de itinerário relativa ao mês de Maio de 2008”, que se junta no Anexo 4 consta que o trabalhador iniciava o serviço às 7 horas e regressava à Amora às 22 horas.

Para depois extrapolar que “o sujeito passivo prestou serviço para além do horário normal de trabalho, o que nos termos do artigo 197.º da Lei n° 99/2003, de 27 de Agosto, constitui trabalho suplementar, o qual deve ser remunerado, nos termos do artigo 258.º do mesmo diploma legal, no entanto, nos mapas de pagamento não consta qualquer referência a trabalho suplementar.

Refere ainda o Relatório da AT que: “Nos três primeiros meses o valor mensal das ajudas de custo foi constante, independentemente do número de dias, levando a que o valor líquido mensal totalizasse sempre € 1.775,00; Em Abril e Maio, o valor mensal das ajudas de custo foi de € 1.170,00, independentemente do número de dias, para que o contribuinte auferisse mensalmente a quantia de €2.000,00; Em Junho, mês em que foi processado o subsídio de férias, o valor das ajudas de custo duplicou para que o valor a receber fosse exactamente o dobro do recebido no mês anterior; Em Julho e Agosto, a situação é precisamente igual à ocorrida nos meses de Abril e Maio; Em Setembro, o valor das ajudas de custo foi de € 2.670,00 porque lhe foi descontado um “adiantamento de vencimento” de € 1.500,00, daí resultando que o valor a receber foi exactamente o mesmo (€ 2.000,00);Em Outubro, o valor das ajudas de custo aumentou para € 1.420,00, e isto mdependentemente do número de dias, passando o valor recebido pelo sujeito passivo para € 2.250,00;Em Novembro, mês em que foi processado o subsídio de Natal, o valor das ajudas de custo duplicou para que o montante a receber fosse exactamente o dobro do valor recebido no mês anterior, tal como aconteceu em Junho; Em Dezembro, a situação é idêntica ao mês de Outubro.”

Para depois concluir que “(…) a título de ajudas de custo foram recebidos valores de forma fixa, regular e permanente durante o ano de 2008, os quais não visaram compensar o trabalhador por despesas realizadas ao serviço da entidade patronal, mas sim remunerá-lo pelo trabalho efectuado ao serviço da entidade patronal, estando assim enquadrados como rendimentos de trabalho dependente, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do Código do IRS.”

Do teor da fundamentação supra transcrita resulta que as quantias percebidas a título de ajudas de custo foram consideradas remunerações, não porque o seu recebimento tivesse excedido os limites qualitativos e quantitativos consignados na lei, mas porque, no entender da AT, o modo de atribuição (através de uma quantia periódica e regular) constituía indicador suficiente de que esta quantia não se destinava a compensar quaisquer custos.

No entanto, diga-se desde, já, que, como bem se entendeu na decisão recorrida, dos elementos constantes do relatório de Inspeção não se podem extrair, nem do ponto de vista fáctico, nem consequentemente do ponto de vista legal, pressupostos para a qualificação efetuada pela entidade fiscalizadora, não permitindo inferir no sentido remuneratório das verbas auferidas pelo Impugnante.

Do contrato de trabalho celebrado entre o ora Recorrido e a sua entidade empregadora, concretamente o teor da cláusula 4.ª, resulta que o Impugnante foi contratado para desempenhar as funções de Engenheiro Mecânico na Praceta Emídio Santana, nº10, Casal do Marco-2840-588 Aldeia de Paio Pires, ou em outro local para, eventualmente, seja deslocado (cfr. alínea A. dos factos provados).

A empresa “C........., LDA”, tem a sua sede na Amora, concelho do Seixal (cfr. alínea A. dos factos provados).

Mais alega a Recorrente, que cabia ao Impugnante, ora Recorrido, a prova de que os rendimentos em causa não revestem natureza remuneratória, e só depois à Autoridade Tributária e Aduaneira a prova do excesso dos pagamentos efetuados.

Desde já adiantaremos que não tem razão.

Como se escreve no Acórdão proferido em 14 de janeiro de 2021, no processo n.º583/13.5BEALM:

«É consabido que em sede do procedimento administrativo tributário de liquidação,


recai sobre a administração fiscal indagar sobre a verificação do facto tributável e demais elementos pertinentes à liquidação do imposto, e tal procedimento só pode culminar com a liquidação em sentido estrito quando, face aos elementos constantes do processo administrativo, estiver adquirida a convicção da existência e conteúdo do ato tributário, de acordo com os artigos 55° e 74° da Lei Geral Tributaria. Cabe, assim, à Autoridade tributária e Aduaneira o ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação e ao contribuinte o ónus de prova da existência dos factos tributários que alega como fundamento do seu direito.

Por todos e como decidido no citado aresto do TCA Sul Proc nº 581/13.9BEALM, o (…) o ónus da prova de que os montantes percebidos pelo trabalhador não têm finalidade compensatória, antes consubstanciando rendimentos que proporcionam um acréscimo de capacidade contributiva, assim sendo suscetíveis de tributação, compete à Administração Fiscal, contrariamente ao defendido pelo apelante (cfr. artº.342, do C.Civil; artº.74, nº.1, da L.G.Tributária; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/5/2004, proc.832/03; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/11/2006, proc.1099/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/1/2009, proc.2690/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/3/2011, proc.4489/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6450/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/11/2017, proc. 712/13.9BEALM).

Nestes termos e tendo sido aceite pela Fazenda Pública a efetividade da deslocação, a qual, segundo as regras da experiência comum, implica naturalmente a criação de gastos acrescidos, incumbia-lhe demonstrar que os montantes auferidos pelo Impugnante a título de ajudas de custo não tinha qualquer relação com as deslocações e despesas suportadas, representando um ganho real para o trabalhador e ainda que esses montantes auferidos excediam as despesas normais das deslocações ao serviço da entidade patronal, o que não logrou fazer.

Ora, tal como nos processos que temos referido, nos presentes autos a Autoridade Tributária e Aduaneira não fez qualquer prova nesse sentido nem invoca haver excesso para além do limite legalmente estabelecido.

Depois, e como se refere nos Acórdão deste TCAS, citados, nomeadamente os proferidos nos Proc. nº 712/13.9BEALM e Proc. nº 578/13.9 BEALM, de 2017.11.0 e 2018.09.28, em casos idênticos ao presente, o facto de os valores serem pagos ao trabalhador a título de ajudas de custo de forma fixa e regular não implica, necessária e automaticamente, que se esteja perante uma retribuição
Circunstâncias relacionadas com a dificuldade de estimar a natureza e os montantes das despesas adicionais a que se sujeita quem está deslocado no estrangeiro, com a inexistência de estruturas administrativas para as processar ou outras vicissitudes, estão entre muitas possíveis razões para que entre a entidade patronal e os trabalhadores seja fixado um valor constante, correspondente aos custos que presumivelmente irão suportar.» (fim de citação).

Neste sentido se escreve na sentença recorrida:

“(…)

O mesmo se diga quanto à observação de trabalho suplementar, ou seja, não basta a AT atentar no horário do contrato de trabalho e depois do confronto com a evidência de partida e regresso extrapolar que não existe uma deslocação que deve ser abonada como ajuda de custo mas sim como trabalho suplementar. Ademais, para a qualificação do trabalho como suplementar não basta que o mesmo tenha sido prestado para além do horário de trabalho, e isto porque que existem um conjunto de condições que carecem de ser cumpridas e acauteladas, conforme resulta dos artigos 197.º e seguintes da Lei nº 99/2003, de 27 de agosto.

Aduza-se, em abono da verdade, que não colocando a AT em causa que as deslocações do Impugnante se efetivaram, e consignando-se no contrato de trabalho que o local de trabalho era no Casal do Marco ou noutro local para onde fosse chamado a deslocar-se, e sendo a sede da entidade patronal no Seixal, então as verbas pagas, por força das despesas com alojamento, alimentação e deslocação por exercício de funções de Engenheiro Mecânico, devem ser qualificadas como ajudas de custo.

Quanto ao suporte documental cumpre relevar que a lei não exige a elaboração de boletins de itinerários semelhantes aos previstos para os funcionários do Estado para que as prestações efetuadas a trabalhadores por conta de outrem assumam a natureza de ajudas de custo. Neste sentido, importa convocar os Arestos proferidos pelo TCA Norte nos processos nºs 00764/13.1BEPNF, de 10 de novembro de 2016 e 04861/04VISEU, de 12 de junho de 2014 e Tribunal Central Administrativo Sul, no processo nº 07890/14, de 29 de junho de 2016, todos integralmente disponíveis para consulta em www.dgsi.pt.

Dimana, assim, axiomático que a AT não ilidiu o ónus probatório a que se encontrava investida, uma vez que os indícios recolhidos pela AT não permitem suportar a conclusão a que chegou de que as ajudas de custos auferidas efetuadas consubstanciam vencimentos, donde, subsumíveis e tributadas enquanto rendimentos do trabalho dependente.

Caberia, por isso, à AT reunir outros indicadores que, por si só ou conjugadamente, suportassem a conclusão de que as quantias em causa são consideradas remuneração de trabalho, em cumprimento do ónus probatório que sobre si impende, como decorre do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT).

Nesta conformidade, concluímos que a AT não reuniu indicadores suficientes de que o abono das quantias em causa não observava os pressupostos da atribuição de ajudas de custo aos servidores do Estado. Aceite que estava pela AT a efetividade da deslocação, a qual, segundo as regras da experiência comum, implica geralmente despesas, incumbia-lhe demonstrar (ainda que através de factos indiciários) que esse abono mensal e diário era totalmente independente das deslocações e das inerentes e normais despesas, representando um ganho real para o trabalhador ou, pelo menos, que esse abono excedia as despesas normais das deslocações ao serviço da entidade patronal. O que a AT não fez.”

Assim, contrariamente ao alegado pela Recorrente, nenhum erro de julgamento é de apontar à sentença recorrida.

Da prova carreada para os autos, retira-se que o ora Recorrido foi contratado para prestar serviço na sede da entidade patronal (Seixal), ou noutro local no qual exista necessidade de ser destacado.

Ao contrário do que alega a Recorrente, cabia à AT no relatório de inspeção demonstrar que não houve efetiva deslocação do trabalhador da sede da empresa (Seixal) ao local da obra localizada em Sines, Figueira da Foz, Alhandra e Loulé, não sendo suficiente para cumprir o ónus da prova a referência que os valores duplicaram nos meses de junho e novembro, meses esses correspondentes ao pagamento dos subsídios de férias e natal, tal circunstância desacompanhada de outros elementos fácticos que permitam descaracterizar as verbas auferidas como ajudas de custo não são suficientes para subsumir os valores auferidos pelo Impugnante na Categoria A, enquanto rendimentos de trabalho dependente.

Aceite pela AT a efetividade da deslocação, a qual, segundo as regras de experiência comum, implica geralmente despesas, incumbia-lhe demonstrar que os montantes auferidos pelo Impugnante a título de ajudas de custo era independente das deslocações e respetivas despesas, representando um ganho real para o trabalhador ou pelo menos, que esses montantes auferidos excediam as despesas normais das deslocações ao serviço da entidade patronal, o que não logrou fazer.

Quanto ao suporte documental, cumpre salientar, que a lei não exige a elaboração de boletins de itinerários semelhantes aos previstos para os funcionários do Estado para que as prestações efetuadas a trabalhadores por conta de outrem assumam a natureza de ajudas de custo. Neste sentido, importa convocar os Arestos proferidos pelo TCA Norte nos processos nºs 00764/13.1BEPNF, de 10 de novembro de 2016 e 04861/04VISEU, de 12 de junho de 2014 e Tribunal Central Administrativo Sul, no processo nº 07890/14, de 29 de junho de 2016, todos integralmente disponíveis para consulta em www.dgsi.pt.

Em suma, os elementos apurados no relatório de inspeção são insuficientes para dar como cumprido o ónus da prova que recai sobre a AT.

Pelo exposto, na improcedência das conclusões do recurso interposto, impõe-se julgar o mesmo improcedente, mantendo-se, em consequência, a sentença recorrida.

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III. DECISÃO



Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção do Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente (artigo 527º, n.ºs 1 e 2, do CPC).

Registe e notifique.


Lisboa, 23 de janeiro de 2025.
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[Maria da Luz Cardoso]

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[Vital Lopes)
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[Teresa Costa Alemão]