Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:582/24.1BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:05/23/2024
Relator:JOANA MATOS LOPES COSTA E NORA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS
PRESSUPOSTOS
Sumário:I - Cabe a quem se pretenda valer da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, a demonstração da verificação dos pressupostos previstos no artigo 109.º, n.º 1, do CPTA, a qual deve assentar em factos cuja alegação se lhe impõe.
II - Os direitos à livre deslocação no território nacional, à segurança e à saúde, constitucionalmente garantidos a todos os cidadãos portugueses, só assistem aos estrangeiros e apátridas que se encontrem ou residam em Portugal, em conformidade com o princípio da equiparação, consagrado no n.º 1 do artigo 15.º da Constituição da República Portuguesa.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção COMUM
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

Acordam, em conferência, os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul:


I – RELATÓRIO

S…, I…, S… e P…, de nacionalidade russa, residentes na Rússia, intentaram intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, contra o Ministério da Administração Interna e a Agência para a Integração, Migrações e Asilo, I.P.. Pedem a condenação das entidades demandadas, num prazo razoável, a proferir decisão do seu pedido de autorização de residência. Alegam, para tanto e em síntese, que: (i) Em 07.03.2023, solicitaram autorização de residência para actividade de investimento, ao abrigo do artigo 90.º-A, n.º 1, da Lei n.º 23/2007, de 04 de Julho, sem que tenha existido qualquer decisão até o momento, tendo decorrido já o prazo de decisão; (ii) A falta de decisão do seu pedido causa-lhes graves prejuízos, na medida em que não podem residir e programar as suas vidas no território nacional e são obrigados a manter a actividade de investimento, não podendo administrá-la pessoalmente; (iii) Não fazem parte da lista de pessoas sujeitas a restrições de circulação na União Europeia decorrente das sanções impostas à Rússia devido à invasão da Ucrânia; (iv) A omissão das entidades requeridas viola o direito à boa administração e o princípio da decisão.
Pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa foi proferida sentença a rejeitar liminarmente a petição por não terem sido alegados factos que permitam concluir que o recurso à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, é indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade e garantia.
Os autores interpuseram o presente recurso de apelação, cujas alegações contêm as seguintes conclusões:
“(…)
Normas jurídicas violadas: artigo 615º, nº 1, alíneas d) e e), do CPC; artigos 20.º, nº 5, e 266º, nº 1, da CRP, artigos 4º, n.º 2, d, artigos 5º, 59º, 109º, 110º e 110º-A, do CPTA; artigos 6º e seguintes, 45º e seguintes, artigo 82º, n.º 5 e n.º 7 e artigo 122º, nº 1, d, da Lei nº 23/2007; artigo 20º da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985.
1. Conforme exposto, a decisão recorrida indeferiu liminarmente a petição inicial por suposta inadequação do meio processual utilizado pelos Recorrentes;
2. A decisão recorrida não permite distinguir os fatos que foram considerados como provados e relevantes, de modo que é obscura quanto aos seus fundamentos, devendo ser declarada nula. A decisão recorrida é ainda nula pois afirma que determinados factos não foram provados, incorrendo em excesso de pronúncia, pois isto não poderia ser decidido em sede liminar.
3. A decisão merece ser reformada quanto aos pressupostos fáticos, vez que foram demonstrados vários factos que não foram considerados pela decisão recorrida, que estão efetivamente demonstrados na P.I.
4. Os direitos, liberdades e garantias estão suficientemente densificados e alegados pela P.I. aperfeiçoada e documentos anexos, de modo que a decisão recorrida merece ser reformada admitindo-se o cabimento da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias dos Autores, de modo a aplicar a jurisprudência do Tribunal Administrativo sobre o tema.
5. Como demonstrado, uma eventual tutela cautelar não resguarda os interesses, liberdades e garantias dos Recorrentes, pois estes pretendem ver a sua situação resolvida de forma definitiva e não provisória, devendo a decisão recorrida ser reformada neste ponto, admitindo-se o cabimento da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias e determinando o prosseguimento da presente ação.
6. A decisão recorrida aplica o direito de forma equivocada, pois não há qualquer visto que se adeque a situação dos Recorrentes, tendo os Recorrentes solicitado as suas autorizações de residência, estes aguardam a decisão dos seus pedidos e não soluções intermediárias, devendo a sentença ser reformada neste ponto, admitindo-se os pedidos formulados na P.I.
(…)”
As entidades recorridas não responderam à alegação dos recorrentes.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, pugnou pela improcedência do recurso, reiterando a fundamentação da sentença recorrida.
Sem vistos dos juízes-adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. n.º 2 do artigo 36.º do CPTA), cumpre apreciar e decidir.


II – QUESTÕES A DECIDIR

As questões que ao Tribunal cumpre solucionar são as de saber se a sentença recorrida padece de:
a) Nulidade por não elencar os factos provados e por considerar factos não provados numa decisão liminar;
b) Erro de julgamento:
a. De facto, por terem sido demonstrados factos que não foram considerados na decisão;
b. De direito:
i. Por terem sido alegados e densificados os direitos, liberdades e garantias em causa;
ii. Por a tutela cautelar não ser suficiente para a salvaguarda dos direitos invocados.


III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida não fixou factos.
*
Os recorrentes impugnam a decisão sobre a matéria de facto, alegando que foram demonstrados factos que não foram considerados na decisão.
Vejamos.
Nos termos do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
Assim, considerando que os recorrentes não especificam quais os concretos factos que entendem estar demonstrados e que não foram considerados na decisão, decide-se rejeitar o recurso quanto à matéria de facto.


IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A. Da nulidade da sentença

Nos termos do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, “É nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Alegam os recorrentes que a sentença é nula por não elencar os factos provados e por considerar factos não provados numa decisão liminar.
Vejamos.
Nos termos da citada alínea b), a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, e não quando não especifique fundamentos de facto que não a justificam. Visando a fundamentação a exteriorização das razões, de facto e de direito, que determinaram certa decisão, só faz sentido que constem da sentença os fundamentos que a justificam, e não quaisquer outros. Assim, assentando a decisão na falta de alegação de factos, inexistem factos passíveis de serem enunciados para sustentarem tal decisão, porquanto se os mesmos não foram alegados, muito menos se têm por provados. É esse o caso dos presentes autos, em que a decisão de rejeitar liminarmente a petição se baseou na circunstância de o autor não ter cumprido o ónus de alegar factos aptos a concluir pela carência de uma decisão urgente e definitiva para tutela de direitos, liberdades e garantias, enquanto pressuposto do meio processual utilizado.
Neste contexto, se é certo que a sentença recorrida não fixou factos, tal não consubstancia qualquer nulidade na medida em que a decisão naquela contida não assenta em factos, antes na falta de alegação de factos concretizadores de um dos pressupostos de recurso à intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias.
Ademais, e ao contrário do que alegam os recorrentes, a sentença recorrida não elencou factos não provados.
Ante o exposto, improcede a invocada nulidade da sentença.


B. Do erro de julgamento

A sentença recorrida rejeitou liminarmente a petição com a seguinte fundamentação:
“(…)
Ora, no caso sub judice, os Requerentes não alegaram quaisquer factos que justifiquem a tutela principal urgente, apenas aduziram que a ausência de decisão até ao momento os impede de residir e programar as suas vidas no território nacional e são obrigados a manter a atividade de investimento, sendo que não a podem administrar pessoalmente, o que lhes causa prejuízos de natureza financeira. Sustentaram, ainda, que a omissão das Entidades Requeridas viola o direito à boa administração e o princípio da decisão.
Desde logo, a mera alegação dos direitos supra elencados sem uma concretização mínima da forma como se mostram beliscados os aludidos direitos não permite ao Tribunal conhecer a questão por não ser possível perceber de que modo se mostram ameaçados.
Compulsado o requerimento inicial, os Requerentes apenas alegaram de forma vaga e genérica, no art.º 18.º do articulado, que “(…) sem a análise em tempo razoável do processo, ficam bastante limitados, sem conseguir programar as suas vidas, de uma forma estável e tranquila”, o que se afigura manifestamente insuficiente para o emprego do presente meio processual, por se verificar, desde logo, que não está demonstrado o pressuposto da indispensabilidade que subjaz à intimação para a defesa de direitos, liberdades e garantias.
Destarte, os Requerentes não cuidaram de alegar e depois provar, como se impunha, com recurso a factos concretos, de que modo a tutela do direito invocado carece de uma decisão definitiva urgente.
(…)
Por outro lado, colhe-se do intróito do requerimento inicial que os Requerentes não residem em Portugal, razão pela qual o princípio da equiparação previsto no art.º 15.º, n.º 1 da CRP, não lhe é aplicável (v. neste sentido, Acórdão do STA de 10/09/2020, Proc. n.º 01798/18.5BELSB, e Acórdão do TCAS de 5/07/2017, Proc. n.º 532/17.1BELSB, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
Assim, perante a ausência de motivos que justifiquem que a alegada demora na obtenção dos títulos de residência implica a produção de danos imediatos ou previsíveis, e bem assim, justificar a urgência na tutela principal urgente, torna-se forçoso concluir que não podem os Requerentes lançar mão da intimação para a defesa de direitos, liberdades e garantias, nos termos do art.º 109.º do CPTA.
(…).”
Ou seja, o Tribunal a quo decidiu rejeitar liminarmente a p.i. porque os autores recorrentes “não alegaram quaisquer factos que justifiquem a tutela principal urgente” e porque a mera alegação do “direito à boa administração” e do “princípio da decisão” “sem uma concretização mínima da forma como se mostram beliscados” não permite perceber de que modo se mostram ameaçados, pelo que não está demonstrado o pressuposto da indispensabilidade que subjaz à intimação para a defesa de direitos, liberdades e garantias. Acresce que os recorrentes não residem em Portugal, pelo que não lhes é aplicável o princípio da equiparação.

Insurgem-se os recorrentes contra o assim decidido, alegando que os direitos, liberdades e garantias invocados estão suficientemente densificados e alegados e que a tutela cautelar não os resguarda pois pretendem ver a sua situação resolvida de forma definitiva e não provisória, inexistindo qualquer visto que se adeque à sua situação.

Vejamos.

A intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias “(…) pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adoção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar.” - cfr. artigo 109.º, n.º 1, do CPTA. Trata-se de um meio processual sumário e principal, pois que visa a prolação de uma decisão urgente e definitiva. E tem carácter excepcional porque só pode ser utilizado quando “a célere emissão de uma decisão de mérito (…) se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento de uma providência cautelar”, sendo a regra a da utilização da acção não urgente, sempre que esta, ainda que conjugada com o processo cautelar, seja apta a garantir aquela tutela.
Nestes termos, o recurso à intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, pressupõe a sua indispensabilidade, a qual ocorrerá quando for necessária uma tutela urgente para assegurar o exercício de um direito, liberdade e garantia, e quando a tutela cautelar não for possível ou suficiente para o efeito. No que concerne à impossibilidade ou insuficiência do decretamento de uma providência cautelar, “A impossibilidade poderá resultar do facto de o juiz, para se pronunciar, ter necessariamente de ir ao fundo da questão, o que, como é sabido, lhe está vedado no âmbito dos procedimentos cautelares. Por sua vez, a insuficiência respeita à incapacidade de uma decisão provisória satisfazer as necessidades de tutela do particular, posto que estas apenas lograrão obter satisfação com uma tutela definitiva, sobre o fundo da questão. Estamos a referir-nos àquelas situações sujeitas a um período de tempo curto, ou que digam respeito a direitos que devam ser exercitados num prazo ou em datas demarcadas, maxime, questões relacionadas com eleições, actos ou comportamentos que devam ser realizados numa data fixa próxima ou num período de tempo determinado (como exames escolares ou uma frequência do ano lectivo), situações de carência pessoal ou familiar em que esteja em causa a própria sobrevivência pessoal de alguém, ou, ainda, casos relativos à situação civil ou profissional de uma pessoa.” – cfr. CATARINA SANTOS BOTELHO, “A intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias: quid novum?”, O Direito, n.º 143, I, 2011, pp. 31-53.

Assim, cabe a quem pretenda valer-se deste meio processual alegar factos concretos idóneos ao preenchimento dos referidos pressupostos, a saber: (i) “a existência de uma situação jurídica individualizada que caracterize um direito, liberdade e garantia, cujo conteúdo normativo se encontre suficientemente concretizado na CRP ou na lei para ser jurisdicionalmente exigível por esta via processual”, não bastando invocar, genericamente, um direito, liberdade e garantia; e (ii) “a ocorrência de uma situação, no caso concreto, de ameaça do direito, liberdade e garantia em causa, que só possa ser evitada através do processo urgente de intimação” – cfr. Carlos Alberto Fernandes Cadilha e Mário Aroso de Almeida, “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 4.ª edição, Almedina, 2017, p. 883.

Considerando o descrito enquadramento jurídico, e face à alegação dos recorrentes, no caso em apreço, não estão verificados os pressupostos de recurso à intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias.

Com efeito, os recorrentes apenas alegam que a demora na decisão do seu pedido de autorização de residência viola o princípio da dignidade humana e os seus direitos à liberdade, à livre deslocação no território nacional, à segurança, à identidade pessoal, a trabalhar e à estabilidade no trabalho ou à saúde, sem explicar em que termos concretos isso acontece, ou seja, sem alegar factualidade apta a concluir no sentido que pretendem. Ou seja, nem sequer se trata de uma alegação insuficiente; é mesmo uma falta de alegação de factos. E para se poder concluir pela indispensabilidade de uma tutela de mérito urgente no caso concreto, impunha-se-lhes que alegassem factualidade concreta demonstrativa de que a falta de decisão do pedido de autorização de residência os impedia de desenvolver uma vida normal (privada, familiar, profissional, etc), designadamente que tinham em Portugal o centro da sua vida, o que, manifestamente, não fizeram.
Assim, a alegação dos recorrentes reconduz-se a uma pressa na obtenção da autorização de residência, e a uma expectativa - legítima, aliás – de ver decidido o seu pedido no prazo legal, o que não se confunde com uma situação de urgência, não tendo sido alegada qualquer factualidade consubstanciadora de uma situação de urgência na tutela de um direito fundamental. Os autores recorrentes não descrevem uma situação factual de urgência e lesão dos direitos que invocam – necessária ao preenchimento dos pressupostos de recurso à intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias -, limitando-se a afirmar uma mera lesão dos mesmos, não sendo possível extrair da sua alegação qualquer urgência para os recorrentes na concessão de autorização de residência. É que não basta estar em causa um direito, liberdade e garantia, sendo ainda necessário demonstrar que é urgente a sua tutela, o que os recorrentes, nos termos expostos, não fizeram.
Acresce que – como bem se refere na sentença recorrida - não assistem aos recorrentes os direitos que invocam. É verdade a Constituição da República Portuguesa garante tais direitos a todos os cidadãos, e que o artigo 15.º estende o gozo dos direitos do cidadão português aos estrangeiros e apátridas que se encontrem ou residam em Portugal. Sucede que os recorrentes nem se encontram nem residem em Portugal, pelo que, não beneficiando de tal extensão, não lhes assistem aqueles direitos. Já quanto à dignidade da pessoa humana, consubstancia a mesma um princípio, um valor constitucional objectivo que se projecta em vários direitos constitucionalmente consagrados, também não lograram os recorrentes concretizar a sua violação.
Assim, não só pela falta de alegação de factos consubstanciadores da indispensabilidade de uma decisão urgente, mas também por não assistirem aos autores recorrentes os direitos que invocam, não se mostram verificados os pressupostos de recurso à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.

Afirmam ainda os recorrentes que a tutela cautelar não é suficiente para a salvaguarda dos direitos invocados.
Todavia, trata-se de uma mera – e extemporânea – conclusão sem qualquer substracto factual, que desconsidera, em absoluto, a tutela que o processo cautelar assegura.
De todo o modo, sempre se dirá que, atentos os contornos factuais alegados, a situação de facto descrita pelos recorrentes, não sendo de urgência – como é exigível que seja para que se recorra à intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias -, seria – se fosse urgente - susceptível de ser acautelada com a adopção de uma providência cautelar que intimasse a entidade demandada a emitir um título de residência provisório, de modo a permitir que os recorrentes permanecessem, de modo regular, em Portugal até ser proferida decisão em acção principal de condenação a decidir o pedido de autorização de residência, não se mostrando, assim, imprescindível, nem sequer necessário, que se decida definitivamente com carácter urgente se os recorrentes têm direito à emissão de autorização de residência.
Tal decretamento, para além de suficiente para tutela dos direitos cuja violação os recorrentes invocam, não poria em causa o regime de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território português, constante da Lei n.º 23/2007, de 04 de Julho, considerando que a entidade a quem cabe decidir o pedido de autorização de residência não se pronunciou ainda sobre o preenchimento das condições legalmente previstas para a concessão de tal autorização.

Não se revelando indispensável ao exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade e garantia, a célere emissão de uma decisão, nem sendo impossível ou insuficiente para o efeito o decretamento de uma providência cautelar, não se mostram verificados os pressupostos de recurso à intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias.

Termos em que se impõe julgar improcedentes os fundamentos de recurso invocados.
*
Sem custas, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, alínea b), do Regulamento das Custas Processuais.


V – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes da Subsecção comum da Secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul em:
a) rejeitar o recurso quanto à matéria de facto;
b) negar provimento ao recurso interposto e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.

Sem custas.

Lisboa, 23 de Maio de 2024

Joana Costa e Nora (Relatora)
Marcelo Mendonça
Ricardo Ferreira Leite