Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 546/16.9BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 03/12/2025 |
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Relator: | ISABEL SILVA |
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Descritores: | JUSTO IMPEDIMENTO FALTA DE ADVOGADO NA INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS |
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Sumário: | I - O não adiamento da diligência de inquirição de testemunhas por falta de advogado, previsto no n.º 4 do artigo 118.º do CPPT, só pode ocorrer se o tribunal tiver dado cumprimento ao disposto no artigo 151.º do CPC, nos termos do n.º 3 daquele artigo 118.º.
II – À luz do artigo 118.º, n.º 4 do CPPT, a única forma de, nestas circunstâncias, obviar a que a diligência de inquirição de testemunhas não se realize e possa ser transferida para outro dia, consistirá na intervenção do mandatário faltoso ao abrigo do disposto no artigo 140.º do CPC, se para tanto reunir os necessários requisitos (justo impedimento). III - O advogado que pretenda adiar diligência de inquirição de testemunhas por motivo de doença inesperada que não lhe permita estar presente, deverá, antes da diligência, requerer o seu adiamento, justificando logo aí a verificação de uma situação de justo impedimento (artigo 140.º, n.º 1 do CPC). IV - A prova do justo impedimento é feita, por regra, pela apresentação de atestado médico, que deve ser junto com o requerimento de invocação de justo impedimento, atento o disposto no artigo 140.º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC. V- O justo impedimento deve ser apreciado em função de cada caso concreto. VI- O juiz deve adiar a diligência quando os factos permitam concluir que se está perante uma situação de justo impedimento, só assim não o fazendo se tiver indícios sérios de que se trata de expediente dilatório para provocar um adiamento injustificado da mesma. |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | * Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:I - RELATÓRIO Vem a J......, Lda, (impugnante, ora recorrente) recorrer do despacho proferido em 16.10.2019, onde deu sem efeito a inquirição da prova testemunhal, por falta do mandatário da impugnante. * * Os autos tiveram vista do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, nos termos do art. 288.º, n.º 1 do CPPT, o qual emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.* Colhidos os vistos legais, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, vem o processo à Conferência para julgamento.* II -QUESTÕES A DECIDIR:Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT]. Nesta conformidade, atentos os termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso, há que apurar se o despacho recorrido padece dos erros de julgamento de direito que lhe são assacados pela recorrente ao não atender ao justo impedimento do mandatário da recorrente. * III- FUNDAMENTAÇÃO:São as seguintes ocorrências processuais pertinentes para a decisão a proferir: 1- Em 30.04.2019 foi designada, pelo Tribunal recorrido, data para inquirição da prova testemunhal em 16.10.2019 às 11 horas – Cf. pág. 120 do SITAF. 2- As partes tiveram conhecimento do despacho a comunicar a data referida em 01) – Cf. pág. 121/124 do SITAF. 3- No dia 14.10.2019 o mandatário da Autora foi atendido pelo médico para o tratar de uma cólica renal, aconselhando o mesmo a ter repouso absoluto durante os “próximos” 5 dias. 4- No dia referido em 01) foi emitido um “atestado médico” por A........, onde consta, entre o mais, o seguinte: “A........, licenciado em Medicina e portador da Cédula Profissional n.º 2……. da Ordem dos Médicos, atesta por sua honra profissional que J......, portador do cartão de cidadão n.º 08…… válido até 31-01-2022 foi tratado hoje neste centro a uma cólica renal e que lhe foi aconselhado repouso absoluto para os próximos cinco (5) dias.” 5- No dia 15.10.2019 foi apresentado um requerimento aos presentes autos, em nome do mandatário da impugnante, com o seguinte teor: J......, Mandatário nos autos à margem identificados vem por justo impedimento informar V. Exa. que não pode estar presente na Diligência agendada para dia 16-10-2019, em virtude de lhe ter sido acometido de doença inesperada. Assim, deve dar-se sem efeito a data designada para a diligência e, em consequência, ser designada nova data para a realização da mesma. Junta: Atestado médico P’ lo Advogado A Secretária P........ – Cf. pág. 127/128 do SITAF. 6- Ao requerimento referido em 05) foi anexado o atestado médico identificado em 04) – Cf. cit. pág. 127 e 128 do SITAF. 7- No dia 16.10.2019, a Mª Juiz, proferiu em ata o seguinte despacho: Considerando que a declaração médica junta pelo Dr. J......, não refere, apesar da doença espelhada nessa declaração, que se encontra impedido de se deslocar para a realização da diligência agendada em Abril de 2019, ou evidenciou esforços, no sentido de ser substituído, tanto como da dita declaração não se consegue extrair quando o causídico foi acometido da doença em causa, não podemos nos pronunciar se existe justo impedimento. Atento o disposto no artigo 118.º do CPPT, a sua falta à diligência, bem como, a falta da testemunha regularmente notificada, não dá lugar à marcação de nova data e ainda pelo facto de não descortinarmos quais os factos que a impugnante pretendia ver esclarecidos com a apresentação da testemunha, dispensa-se a sua realização. Fixa-se em 30 (trinta) dias o prazo para as partes apresentarem, querendo, alegações escritas, nos termos e para os efeitos do disposto no art.120.º do CPPT. Findo o prazo supra sem nada tendo sido junto ou juntas as alegações, abra vista ao Ministério Público para parecer. Notifique. * Do despacho ora proferido ditado para acta, devido a um problema técnico no sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, impossibilitando a gravação desta diligência, foram neste acto, todos os presentes devidamente notificados, tendo a diligência sido declarada encerrada quando eram 11 horas e 30 minutos. – Cf. pág. 129 do SITAF. * IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO: Está em causa um despacho que não atentou ao alegado justo impedimento alegado pela impugnante e, nessa medida, deu sem efeito a inquirição da prova testemunhal agendada, com base na ausência do mandatário, da testemunha a apresentar e porque (quanto à outra testemunha), não sabia quais os factos a ser esclarecidos. O inconformismo da recorrente centra-se no facto de entender que o despacho recorrido atenta contra o “justo impedimento” e a jurisprudência em seu torno, tendo em conta o circunstancialismo fáctico que levou à sua “falta” para a diligência de inquirição da prova testemunhal agendada. Salienta que os factos e o atestado médico não foram devidamente sopesados pelo Tribunal a quo, desde logo porque o atestado médico é datado de 14.10.2019, atestando que ao mandatário havia sido recomendado repouso absoluto por cinco dias (ou seja, até 19.10.2019), indicando a doença a que foi acometido. Concluiu assim que, contrariamente ao decidido, se encontrava impedido de se deslocar para realizar a diligencia, isto é, que se verificava a o JUSTO IMPEDIMENTO. Apreciando. Na situação versada, se bem se percebe, o despacho recorrido, abandona o justo impedimento, acabando por dar sem efeito a diligência por falta de comparência do mandatário e a testemunha a apresentar, não tendo inquirido a testemunha presente por não saber quais eram os factos. A recorrente centra toda a sua atenção no facto de não ter sido acudido o justo impedimento e bem assim o adiamento da diligência de inquirição da prova testemunhal. Decorre, com efeito do artigo 118º nº 4 do CPPT que a falta de comparência do advogado ou testemunhas não é motivo de adiamento. Importa salientar que, na situação trazida, com a notificação às partes da data designada para inquirir a prova testemunhal não foi dado cumprimento ao disposto no artigo 155º do CPC, na medida em que aquela comunicação apenas levou ao conhecimento dos intervenientes processuais o dia designado para inquirição (dia 16.10.2019). O cumprimento do dever imposto pelo artigo 151º do CPC (anterior artigo 155º) é condição de não adiamento por falta de comparência dos advogados das partes consagrada e ponderada pelo próprio legislador, não havendo justificação que assim não seja no processo de impugnação judicial. Como sublinha Jorge Lopes de Sousa “ a dureza da consequência prevista no nº 4 do artº 118º, que consubstancia uma sanção processual (consequência processual negativa) que pode ter reflexos decisivos no desfecho do processo. Só pode considerar-se justificada e equilibrada se tiver sido dado cumprimento ao disposto no artigo 155º do CPC.” (in Código do Procedimento e Processo Tributário, II vol., 6ª ed., 2011, Áreas editora, pág. 289). Ainda assim, o artigo 118º nº 4 do CPPT, deve ser, também, compaginado com o disposto no artigo 140º do CPC, ex vi artigo 2º al. e) do CPPT, donde se conclui que o ato (aqui inquirição de testemunhas) não se realiza se ocorrer motivo que constitua justo impedimento. Acerca do justo impedimento, o artigo 140º do CPC, ex vi artigo 2º al. e) do CPPT, estabelece o seguinte: 1 - Considera-se «justo impedimento» o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do ato. 2 - A parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova; (…) Na situação colocada estava em causa uma falta do mandatário, comunicada ao Tribunal no dia anterior à diligência de inquirição das testemunhas (15.10.2019), através de atestado médico a dar conta que o mandatário da impugnante tinha sido consultado no dia anterior (14.10.2019) mercê de uma cólica renal, tendo o médico atestado por sua honra as condições de doença do mandatário e a recomendação de 5 dias de repouso absoluto (repouso absoluto que abrangia, como se vê da factualidade assente, o dia da diligência dada sem efeito, sem adiamento, tendo as partes sido notificadas para alegações escritas em 30 dias). A comunicação foi feita atempadamente, pelo mandatário, tendo sido junto (como prova) o atestado médico. Importa saber, também, se a situação assim configurada constituiu um evento que impeça em absoluto a prática do ato de modo a ser considerado “justo impedimento”, que a Mª Juiz se negou a considerar e analisar, senão telegraficamente. O tipo de doença (cólica renal) estava indicada, assim como a recomendação de repouso absoluto, sendo do conhecimento geral que as cólicas renais, mercê da dor inerente por via da “movimentação” dos cálculos renais, condiciona a atividade normal e diária de quem das mesmas padece. O mandatário foi acometido dessa doença dois dias antes da diligência, tendo no dia seguinte a sua secretária comunicado ao Tribunal aquela situação ao Tribunal, juntando atestado médico comprovativo. Dada a proximidade da data da diligência, não será irrazoável que, na situação em que se encontrava o mandatário, não diligenciasse em apenas um dia para ser substituído na diligência, com a necessidade de conhecimento do processo por outrem que não o mandatário constituído inicialmente. A este propósito, sumariou-se no acórdão do TRP de 24.09.2019, processo nº 2083/18.8T8MAI.P1, que: I - Sempre que a audiência final tenha sido marcada por acordo prévio (cf. art.º 151.º, n.º 1, do CP Civil) apenas o impedimento do tribunal ou o justo impedimento podem legitimar o seu adiamento. II - O justo impedimento capaz de justificar o adiamento da audiência final tem que ser feito em momento anterior ou, quando muito, coincidente com o do início aprazado para esta, através de comunicação ao tribunal com alegação de motivo imprevisto ou de força maior impeditivo da presença do advogado e apresentação da respectiva prova. III – Na eventualidade de o justo impedimento não poder ser invocado em momento anterior ou contemporâneo com o da audiência final, já se tratará diversamente da invocação de uma nulidade processual. Nesta situação, a parte interessada terá que provar, para além da ocorrência do motivo imprevisto ou de força maior impeditivo da presença do advogado em audiência, igualmente a impossibilidade de o ter comunicado antes da audiência, apresentando a respectiva prova. (…)” Discorreu-se ainda no acórdão do TRL de 06.12.2017, tirado do processo 1734/13.5tbtvd.l1-7, que: “O juiz deve adiar a audiência final se reconhecer que os factos alegados no requerimento correspondem a um caso de justo impedimento, só assim não fazendo se tiver indícios sérios de que se trata de expediente dilatório para provocar um adiamento injustificado do julgamento”. Em recente acórdão do TRL, prolatado em 01.01.2024 no processo nº 38/22.7T8PTM.E1, ali se concluiu que: I-Tendo o Sr. Advogado dos AA sido acometido de doença, facto que comunicou ao Tribunal antes da hora marcada para a continuação da audiência, dando conta da sua incapacidade para se deslocar e, invocando justo impedimento, tendo requerido o adiamento do acto com esse fundamento, protestando juntar documento comprovativo, o qual deu entrada em juízo nesse mesmo dia, estamos perante ocorrência de um evento imprevisível - a situação de doença de que fora acometido - impeditivo, conforme comprovou, da sua deslocação ao tribunal, e que não lhe é naturalmente imputável. II-Estando em causa a produção de alegações orais, tal tornava objectivamente muito difícil a sua substituição por outro causídico, que não assistira à produção da prova, revelando-se a situação verificada, nessa medida e em concreto, impeditiva da prática do acto. III-Face ao teor da comunicação e não sendo exigível que o Il. Advogado revelasse a doença que o afligia, tendo para além do mais protestado juntar declaração médica, conforme veio a fazer nesse mesmo dia, encontrava-se suficientemente indiciada a situação de justo impedimento, a justificar o adiamento da audiência nos termos das disposições conjugadas dos artigos 140.º, n.ºs 1 e 2 e 603.º, n.º 1, do CPC. IV-Decorre do que vem de se dizer que a realização da sessão da audiência final que teve lugar em 8 de Julho de 2022 sem a presença do Il Mandatário da recorrente que, deste modo, ficou impedida de produzir as alegações orais a que tinha direito, consubstancia preterição de formalidade essencial (omissão de acto processual), com valor de nulidade nos termos do artigo 195.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, uma vez que as alegações visam, precisamente, conferir à parte uma oportunidade para influenciar o juiz no exame e decisão da causa. V-A ocorrência da referida nulidade processual implica a anulação do processado a fim de a tramitação processual regressar ao momento anterior ao encerramento da audiência, de forma a ser dada à parte recorrente a possibilidade de, em sede de audiência final, proferir alegações orais, após o que deverá ser proferida nova sentença”. Também no acórdão do TCAN de 20.03.2015, prolatado no Proc. 1578/14, se sublinhou que: “o instituto do justo impedimento tem o seu fundamento num imperativo de natureza ético-jurídica, cuja inteleção é de fácil apreensão e que se prende com o facto de não poder exigir-se a ninguém que pratique actos, em processos judiciais ou administrativos, que esteja absolutamente impossibilitado de, em determinado momento, levar a cabo, por razões que não lhe sejam imputáveis. O contrário consubstanciaria uma restrição inaceitável ao núcleo essencial do direito fundamental de acesso ao Direito previsto no art. 20.o da CRP”. Por outro lado, o artigo 69º do EOA, preceitua que, sem prejuízo do disposto no nº 4 do artigo 66º, os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor não podem ser impedidos, por qualquer autoridade pública ou privada, de praticar atos próprios da advocacia. A outro passo, decorre do artigo 72º daquele EOA que, os magistrados, agentes de autoridade e trabalhadores em funções públicas devem assegurar aos advogados, aquando do exercício da sua profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas para o cabal desempenho do mandato, o que se encontra reforçado pelo artigo 12º nº 1 da lei orgânica do Sistema Judiciário, que prescreve que, “o patrocínio forense por advogado constitui um elemento essencial na administração da justiça e é admissível em qualquer processo, não podendo ser impedido perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada”. Por fim, importa ainda trazer à colação o sumariado no acórdão do TCAN de 23.01.2020, tirado do processo nº 00969/17.6BEPRT, onde se disse que: I - O não adiamento da diligência de inquirição de testemunhas por falta de advogado, previsto no n.º 4 do artigo 118.º do CPPT, só pode ocorrer se o tribunal tiver dado cumprimento ao disposto no artigo 151.º do CPC, nos termos do n.º 3 daquele artigo 118.º. II - Perante esta norma do artigo 118.º, n.º 4 do CPPT, a única forma de, nestas circunstâncias, obviar a que a diligência se não realize e possa ser transferida para outro dia, consistirá na intervenção do mandatário faltoso ao abrigo do disposto no artigo 140.º do CPC, se para tanto reunir os necessários requisitos (justo impedimento). III - O justo impedimento deve ser apreciado em função de cada caso concreto, devendo o seu regime ser devidamente adaptado a situações específicas como a falta a diligências judiciais agendadas por acordo. IV - O advogado que pretenda adiar diligência de inquirição de testemunhas por motivo de doença súbita e inesperada que não lhe permita estar presente, deverá, antes do início dessa diligência, requerer o seu adiamento, justificando logo aí a verificação de uma situação de justo impedimento (artigo 140.º, n.º 1 do CPC). V - A prova dessa situação é feita, por regra, pela apresentação de atestado médico, que deve ser junto com o requerimento de invocação de justo impedimento, atento o disposto no artigo 140.º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC. Mas se não for logo possível fazê-lo, poderá juntá-lo logo que consiga, desde que, pelo menos, decorra do circunstancialismo inerente ao impedimento essa impossibilidade de apresentação imediata. VI - O juiz deve adiar a diligência se reconhecer que os factos alegados no requerimento correspondem a um caso de justo impedimento, só assim não fazendo se tiver indícios sérios de que se trata de expediente dilatório para provocar um adiamento injustificado da mesma”. Escreveu-se ainda naquele aresto, com pertinência para a situação sob nossa mira, que: “(…) entendemos que a questão deve ser apreciada em função de cada caso concreto. Reconhecemos que a Recorrente se limitou a comunicar a impossibilidade de comparência do mandatário na diligência de inquirição de testemunhas, por este se encontrar doente; protestando juntar atestado médico e nada alegando quanto à impossibilidade de então apresentar prova da comunicada doença. (…) Todavia, julgamos que se verifica uma situação de justo impedimento, porque emergente de facto inesperado, não imputável à parte ou ao seu mandatário, relativo ao seu estado de saúde, encontrando-se provado por atestado médico que objectivamente estava impedido de comparecer no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto. A nosso ver, a circunstância de o atestado médico certificar que o mandatário da Recorrente está incapacitado para o trabalho, por um período de três dias, razão pela qual não pode comparecer no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, é suficiente para provar o justo impedimento. “O atestado não tem de indicar a doença concreta da pessoa em menção, até porque se o fizesse sem autorização expressa do doente, o médico estaria a violar deveres deontológicos de reserva e sigilo profissional que se lhe impõem. Basta assim que o médico especifique de forma suficiente as limitações à capacidade de trabalho. Sendo que, salvo se for invocada a falsidade do atestado ou das declarações dele constantes, se um médico atesta por sua honra que determinada pessoa está doente e não pode por isso cumprir com as suas obrigações profissionais, é porque por razões de saúde ela não o pode efetivamente fazer. Um atestado médico tem a força probatória própria que a lei atribui a um juízo pericial sobre os factos que atesta (Art. 388º do C.C.) e, mesmo sendo certo que esse juízo está sujeito à livre apreciação do tribunal (Art. 389º do C.C.), só se o juiz tiver especiais conhecimentos técnicos sobre a matéria e se encontrar devidamente habilitado a julgar doutro modo é que poderá afastar as conclusões duma prova assim produzida.” – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 06/12/2017, proferido no âmbito do processo n.º 1734/13.5TBTVD.217. In casu, estava em causa uma deslocação ao tribunal e o acompanhamento da produção de prova na diligência de inquirição de testemunhas. Estas são obrigações profissionais do mandatário da Recorrente, enquanto advogado, que o atestado médico certifica, ainda que em termos genéricos, que não podiam ser cumpridas por motivo de doença. (…) Quanto à questão concreta da necessidade de prova imediata do justo impedimento, não poderemos deixar de reproduzir um trecho do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 05/05/2016, proferido no âmbito do processo n.º 1117/12.4TBVNO.E1: «Apesar do art.º 140.º, n.º 2 do CPC impor que a parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova, deve entender-se que, sendo necessário que a comunicação seja logo efetuada, até à abertura da audiência, não é exigível que prontamente seja exibido atestado médico, pois, se o advogado comunicar prontamente ao tribunal as circunstâncias impeditivas do seu comparecimento e não estiver ainda munido de documento comprovativo do impedimento legítimo, deve convencer o juiz da seriedade do motivo invocado, sem prejuízo de, posteriormente e no mais curto prazo, remeter o documento justificativo da sua ausência (note-se que, não sendo tal documento enviado, o mesmo não evidencie uma causa de doença que impeça o advogado de comparecer ou o juiz duvide da genuinidade do documento, terá o mandatário de suportar as custas devidas pelo desenvolvimento processual anómalo a que deu causa).» Ora, no caso, em nome do advogado, foi o seu escritório que, na véspera da diligência, invocou em requerimento estar impedido de comparecer na diligência, por motivo de doença imprevisível, [que o colocava em situação de incapacidade para o seu trabalho nos próximos 3 dias]. Perante esta alegação, o juiz deveria ponderar se tinha razões sérias para duvidar desses factos, se haveria algum indício de que o adiamento requerido mais não era que um expediente dilatório destinado exclusivamente a atrasar o andamento da causa. Mas isso não parece que se tenha verificado no caso concreto dos autos. Em face da prova por atestado médico que veio depois a ser apresentada, constata-se que o impedimento por motivo de doença era real. Acresce que é da experiência comum que alguém que seja acometido de doença súbita não tem logo ali à mão um médico que lhe passe um atestado, sendo que essa é a forma normal e mais adequada de fazer prova de incapacidade para o exercício duma actividade profissional por motivo de doença. – cfr. o citado Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 06/12/2017, proferido no âmbito do processo n.º 1734/13.5TBTVD.217. Tudo indica que devido à doença do mandatário, foi o seu escritório de advocacia que comunicou a doença ao tribunal e terá sido também por isso (a experiência comum vai nesse sentido) que não foi logo junto o atestado médico, que estaria, eventualmente, na posse do próprio advogado. Na medida em que a doença, previsivelmente, se prolongaria por 3 dias, somente após este período poderia o mandatário deslocar-se ao seu escritório, levando o atestado médico. Neste circunstancialismo, afigura-se-nos razoável o prazo de 5 dias em que o atestado foi enviado ao Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto – 16/04/2018 (salientamos que 14 e 15 de Abril de 2018 foram sábado e domingo). (…) É nossa convicção que o caso concreto dos autos, porque o mandatário impedido assim logo o justificou, se enquadra numa situação em que se mostra inviável o substabelecimento. De véspera, seria muito difícil outro advogado que desconhecesse os contornos do processo assegurar um eficaz acompanhamento da produção da prova. Para mais quando está em causa um litígio que envolve alguma complexidade técnica e um particular estudo das suas especificidades, como resulta dos articulados e da prova requerida. (…) No caso não havia razões para se entender que o requerimento de adiamento com fundamento em justo impedimento do mandatário da Recorrente fosse um expediente dilatório, sendo que qualquer eventual dúvida sobre a seriedade da justificação apresentada foi desfeita com a junção do atestado médico, num curto período de tempo (cinco dias). Deveria, então, o adiamento da diligência ser deferido, por, neste caso concreto, ser muito menos gravoso para a realização da justiça existir um adiamento (eventualmente menos fundado) do que não ser produzida pela impugnante, de todo, qualquer prova, como veio a ocorrer. Em suma, a decisão interlocutória enferma de erro de julgamento, por se impor no caso o deferimento do requerimento de adiamento da diligência, por se verificar justo impedimento e se considerar que o atestado médico terá sido apresentado logo que foi possível ao requerente. A conclusão de que o tribunal recorrido devia ter adiado a diligência de inquirição de testemunhas por justo impedimento do mandatário da Recorrente consubstancia uma nulidade processual, devidamente invocada, por omissão desse acto que a lei prescreve e em simultâneo pela prática de um acto (o não adiamento) que a lei não admite, nos termos que já abordamos supra. Efectivamente, o artigo 195.º, n.º 1 do CPC preceitua que a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. Esta influência na decisão da causa revela-se ser manifestamente o caso, na medida em que a recusa de adiamento da diligência significou a não produção da prova testemunhal requerida, o encerramento do período de instrução, pondo em questão o julgamento da matéria de facto e, consequentemente, da sentença recorrida. Nestes termos é aplicável o disposto no artigo 195.º do CPC, sendo de anular os actos praticados no tribunal tributário subsequentes a esse despacho e ordenar a substituição desse despacho por outro que designe novo dia e hora para a inquirição de testemunhas, com observância das formalidades legais.(…)” (O sublinhado é nosso). Perante todo exposto, regressando à situação trazida, vista à luz do circunstancialismos fáctico jurídico que envolve a mesma, dada a comunicação prévia ao tribunal da doença acometida, o espaço temporal em que ocorreu, a percetível impossibilidade da presença do mandatário mercê do diagnóstico, o curto espaço de tempo para providenciar pela substituição do mesmo e, também, o facto de não ter sido dado cumprimento ao estatuído no artigo 151º do CPC, autorizam com segurança concluir que o mandatário se encontrava em situação passível de ser configurada como justo impedimento, que não lhe pode ser imputável, pelo que, ao contrário do decido no despacho recorrido, não podia ser dada sem efeito, sem marcação de nova data, a diligência de inquirição da prova testemunhal. Nesta conformidade, deve proceder o recurso, revogando o despacho recorrido, sendo de anular todos os atos processuais subsequentes praticados (art. 195º do CPC), devendo o Tribunal recorrido providencia pela marcação de nova diligência de inquirição de testemunhas, retomando a tramitação processual até final. * No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, não podem as custas ficar a cargo da recorrente por não ser parte vencida, devendo ser suportadas pela recorrida que, não tendo contra-alegado, não incluem taxa de justiça.
V- DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em: - Conceder provimento ao recurso; - Revogar o despacho recorrido; - Anular os atos praticados pelo Tribunal recorrido, subsequentes a esse despacho (revogado), o qual deve ser substituído por outro que designe novo dia e hora para a inquirição de testemunhas, com observância das formalidades legais. Custas a cargo da recorrida, que não incluem a taxa de justiça uma vez que não contra-alegou. * Lisboa, 12 de março de 2025 Isabel Silva (Relatora) ___________________ Margarida Reis (1ª adjunta) ______________ Patrícia Manuel Pires (2ª adjunta) ________________ |