Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1009/12.7BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 04/01/2020 |
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Relator: | ANA CELESTE CARVALHO |
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Descritores: | PROCESSO DE EXECUÇÃO; ADEQUAÇÃO DA FORMA DO PROCESSO; ATO ADMINISTRATIVO COMO TÍTULO EXECUTIVO. |
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Sumário: | I.Incorre a sentença recorrida em nulidade decisória, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, c) do CPC se aduz certa fundamentação de direito que é entre si contraditória, assim como ao existir contradição entre essa fundamentação e o dispositivo da sentença.
II. Procede o fundamento da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, b) do CPC se a sentença recorrida omite totalmente os fundamentos na emissão do juízo formulado quanto a certa questão apreciada. III. Incorre a sentença em erro de julgamento, em violação do artigo 157.º, n.º 3 do CPTA, na redação vigente à data dos factos, anterior ao D.L. n.º 214-G/2015, de 02/10, ao decidir pela inexistência de título executivo e pela inidoneidade do meio processual do processo de execução instaurado, que tem como título executivo o ato administrativo inimpugnável que concede um direito ao Exequente. IV. Incorre a sentença recorrida em erro de julgamento ao pronunciar-se pela falta de interesse em agir do Exequente, em face do pedido e da causa de pedir alegados na petição de execução. |
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Votação: | DECISÃO SINGULAR |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Nos termos do disposto nos artigos 652.º, n.º 1, c) e 656.º, ambos do CPC, aplicáveis ex vi artigo 1.º do CPTA, decide-se na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I – RELATÓRIO
J.................., devidamente identificado nos autos, no âmbito da presente execução de sentença instaurada contra o Ministério da Justiça, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 27/06/2019, que julgou improcedente o pedido, absolvendo o Executado do pedido de condenação ao pagamento da quantia de € 4.629,58, a título de ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, nos termos do artigo 170.º, n.º 2, b) do CPTA. * Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões, que infra e na íntegra se reproduzem: “1. Apesar do raciocínio expresso na fundamentação da sentença recorrida apontar no sentido da existência de erro sobre a forma de processo, excepção dilatória sanável, a sentença conclui simultaneamente pela impossibilidade de conhecimento do mérito da causa e pela absolvição do pedido, incorrendo na nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, c) do CPC. 2. Acresce ainda que a sentença recorrida decidiu pela inexistência de interesse em agir por parte do ora Recorrente sem que tivesse aduzido qualquer justificação, de facto ou de direito, para tal decisão, incorrendo, assim, na nulidade prevista no art. 615.º n.º 1 b) do CPC. 3. A sentença recorrida, ao concluir que “o pedido do Exequente (...) não pode ser desencadeado no âmbito do processo de execução de sentença regulado nos arts. 157.º a 179.º do CPTA, mas sim pela instauração de acção administrativa especial” incorre em erro de direito porquanto não aplicou, quando deveria ter aplicado, o disposto no art. 157.º n.º 3 do CPTA. 4. A sentença recorrida ao entender que o Autor não se socorreu da forma de processo adequada e ao decidir, em consequência, pela absolvição do pedido violou os arts. 278.º, n.º 1, al. b), 577.º, al. b), e 576.º, n.ºs 1 e 2, do CPC. 5. Conforme decorre da petição inicial e do processo administrativo, o Exequente foi pai nos tempos idos de 2006, viu violado o seu direito a gozar a licença de paternidade, foi reconhecida tal violação pela Exma. Ministra da Justiça e foi-lhe reconhecido o direito a uma indemnização cujo pagamento não foi efectuado. 6. O Exequente pretendeu exercer tal direito propondo uma acção dirigida à execução de acto administrativo inumpugnável e, decorridos sete anos sobre a propositura da acção, a sentença recorrida decide pela falta de interesse em agir do Exequente. 7. A sentença recorrida, ao entender que o Exequente não tem interesse em agir, isto é, que não carece de tutela judiciária, incorre em manifesto erro de julgamento de direito, demonstrando desconhecer o significado e alcance de tal pressuposto processual.”. Pede que o recurso seja julgado procedente e, em consequência, seja revogada a sentença recorrida * Notificado o ora Recorrido, o mesmo contra-alegou o recurso, tendo assim concluído: “a) O Autor, ora Recorrente, deu início à lide executiva fundando-a, expressamente, no enunciado normativo constante do n.º 2 do art. 170.º do CPTA, na redação anterior à que foi dada pelo Decreto-lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro; b) Facto processual inequívoco, o qual vem, e bem, identificado na sentença recorrida; c) O fundamento da ação foi reeditado no pedido deduzido pelo A., ora Recorrente, na P.I; d) Ora, o normativo que serviu de fundamento ao A., ora Recorrente, para instauração da ação enuncia – al. b) do n.º 2 do art. 170.º do CPTA, na redação anterior à que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro - a necessidade da existência de sentença a ser executada. e) Portanto, é inequívoco que o escopo processual que o A., ora recorrente escolheu exige a existência de sentença, que constituiria o título executivo; f) Sentença essa que inexiste; g) Daí que, como refere a sentença recorrida, o pedido do Exequente visando o pagamento da quantia de 4.629,58€, pelo Executado, “a título de ressarcimento pelos danos patrimoniais e não patrimoniais (…)”, acrescida dos inerentes juros legais, não pode ser desencadeado no âmbito do processo de execução de sentença regulado nos artºs 157º a 179º do CPTA, mas sim pela instauração de acção administrativa especial, ao abrigo do previsto nos artºs 46º e 47º deste último diploma; uma vez que, h) O despacho 22 de Setembro de 2011 da Senhora Ministra da Justiça não constitui um título executivo para a instauração da presente acção, o que impede o conhecimento do mérito da causa, levando à absolvição do Executado do pedido; i) Por isso, contrariamente ao que o Recorrente refere, a sentença recorrida não padece de qualquer um dos vícios que o Recorrente lhe pretende apontar; j) A decisão recorrida, julgou, efetivamente, a controvérsia, analisou os atos impugnados, a factualidade, bem como o enquadramento legal pertinente; k) A sentença recorrida julgou, pronunciando-se sobre todas as questões que lhe competia tomar conhecimento, não apresenta nulidades nem erros; l) Encontrando-se devidamente estruturada, sendo claro o iter cognoscitivo da decisão.”. Pede que o recurso seja indeferido ou, se assim não se entender, deverá ser considerado improcedente e confirmada a decisão recorrida. * Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não foi emitido parecer.
II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso. Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de: 1. Nulidade decisória, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, c) do CPC ao entender-se pela existência de erro na forma do processo e, simultaneamente, pela impossibilidade de conhecimento do mérito da causa e pela absolvição do pedido; 2. Nulidade decisória, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, b) do CPC ao decidir pela inexistência de interesse em agir do Exequente, sem ser aduzida qualquer fundamentação, de facto ou de direito; 3. Erro de julgamento de direito, por ao julgar verificado o erro na forma do processo, o tribunal não aplicou como devia, o artigo 157.º, n.º 3 do CPTA e por violação dos artigos 278.º, n.º 1, b), 577.º, b) e 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC; 4. Erro de julgamento no tocante à questão da falta de interesse em agir do Exequente.
III. FUNDAMENTOS
DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “A) Pelo despacho de 2006.11.28 do Senhor Director Nacional Adjunto do Executado, foi indeferido o pedido do Exequente para gozo de 15 dias de licença de parentalidade remunerada (cfr doc da petição inicial); B) Em 2006.12.28 foi proferido despacho pelo Executado que manteve o referido em A) (cfr doc da petição inicial); C) O despacho de 2011.09.22 da Senhora Ministra da Justiça, é do seguinte teor: «imagem no original» (cfr doc da petição inicial).”. DE DIREITO Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional, segundo a sua ordem lógica e prioritária de conhecimento.
1. Nulidade decisória, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, c) do CPC ao entender-se pela existência de erro na forma do processo e, simultaneamente, pela impossibilidade de conhecimento do mérito da causa e pela absolvição do pedido Vem o Recorrente a juízo assacar a nulidade decisória da sentença recorrida invocando como fundamento uma manifesta contradição lógica entre os fundamentos que conduziram ao julgamento sobre o erro na forma do processo e a decisão proferida de absolvição do pedido. Invoca ainda a contradição intrínseca do segmento decisório ao, simultaneamente, determinar a impossibilidade do conhecimento do mérito do pedido e absolver o Executado do pedido. Sustenta que o julgador seguiu uma determinada linha de raciocínio na fundamentação que levaria à conclusão pelo erro na forma do processo e à subsequente convolação do meio processual inadequado para o meio processual adequado, mas em manifesta dissonância, retirou a conclusão jurídica inconciliável e ininteligível da impossibilidade de conhecimento do mérito da causa e de absolvição do pedido. Vejamos. A nulidade aludida na alínea c), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC ocorrerá sempre que os fundamentos da decisão se encontrem em oposição com a decisão, no sentido de que entre os fundamentos e a decisão não pode existir contradição lógica.
Tal acontecerá se o juiz adotar determinada linha de raciocínio e depois ao invés de a prosseguir, extraindo dela a devida consequência jurídica, assumida no segmento decisório, vir a decidir em sentido divergente ou oposto, que a fundamentação aduzida não permitiria adivinhar. Compulsando a sentença recorrida dela decorre efetivamente o que se mostra invocado pelo ora Recorrente, pois a propósito do conhecimento da questão da existência de título executivo em que se possa fundar o presente processo de execução instaurado pelo Exequente, a sentença recorrida veio a decidir pela inexistência de título executivo, por falta de uma sentença administrativa que reconheça a pretensão do Exequente. Mais se decidiu no sentido de o pedido formulado pelo Exequente não poder ser desencadeado no âmbito do processo de execução de sentença, regulado nos artigos 157.º a 179.º do CPTA, mas sim numa ação administrativa, ao abrigo dos artigos 46.º e 47.º do CPTA, concluindo pelo impedimento do conhecimento do mérito da causa e pela absolvição do Executado do pedido. O que antecede permite fundar a nulidade decisória em que incorre a sentença recorrida, pois ao decidir-se pela inexistência de título executivo e pela inidoneidade do meio processual usado pelo Exequente, por ser meio processual próprio não a presente execução de sentença, mas a ação administrativa, deveria a sentença recorrida ter reconduzido a situação à exceção de erro na forma do processo, nos termos previstos no artigo 193.º do CPC e aferir da respetiva possibilidade de convolação do meio processual, ao invés de decidir como decidiu. A procedência da exceção de erro na forma do processo, não é como decidido na sentença recorrida, a absolvição do pedido, mas antes, e só após de se aferir a impossibilidade de convolação do meio processual e do aproveitamento de certos atos processuais, a absolvição da instância, por nulidade de todo o processo, segundo o disposto na alínea b), do n.º 4 do artigo 89.º do CPTA e alínea b) do artigo 577.º do CPC. Pelo que, a sentença recorrida incorreu em contradição ao pugnar pela falta de título executivo e pela inidoneidade do presente processo de execução de sentença e por ser meio próprio a ação administrativa e, depois, simultaneamente, concluir pela impossibilidade de conhecimento do mérito da causa e pela absolvição do pedido, por a procedência do erro na forma do processo não produzir a consequência ditada na fundamentação de direito e no dispositivo da sentença. Incorrer a sentença recorrida na invocada contradição lógica ao decidir verificar-se um impedimento do conhecimento do mérito da causa e esse impedimento conduzir à absolvição do pedido, por a procedência da matéria de exceção dilatória implicar a absolvição da instância e não do pedido, segundo o disposto nos artigos 89.º, n.º 2 do CPTA e 576.º, n.º 2 do CPC. Pelo que, enferma a sentença recorrida da nulidade decisória prevista no artigo 615.º, n.º 1, c) do CPTA, por incorrer em contradição entre os seus fundamentos, assim como entre os seus fundamentos e o dispositivo. O que implica a procedência do fundamento do recurso ora em análise.
2. Nulidade decisória, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, b) do CPC ao decidir pela inexistência de interesse em agir, sem ser aduzida qualquer fundamentação, de facto ou de direito Dirige o Recorrente ainda a nulidade decisória, por falta de fundamentação da sentença recorrida. Sustenta que a sentença recorrida decidiu pela inexistência de interesse em agir por parte do Exequente, ora Recorrente, sob a invocação de “sem necessidade de mais considerandos”, sem que fosse aduzido qualquer considerando, não constando da sentença recorrida qualquer justificação, seja de facto, seja de direito, para a falta do pressuposto processual do interesse em agir. Por isso, dirige o Recorrente a nulidade decisória, prevista no artigo 615.º, n.º 1, b) do CPC. Analisando o teor da sentença recorrida, a mesma assume o seguinte discurso no respeitante à questão da falta de interesse em agir do Exequente: “Do que antecede, é admissível figurar da falta de interesse em agir do Exequente em vir intentar esta acção, nos seus precisos termos que por economia discursiva nos abstemos de reproduzir. Em conclusão e sem necessidade de mais considerandos, a resposta à vexata quaestio dos autos que consiste em saber se o despacho de 22 de Setembro de 2011 da Senhora Ministra da Justiça, constitui um título executivo no qual pode radicar a presente acção; e, subsequentemente, saber se o Exequente possui interesse em agir, - é negativa nas suas duas vertentes. Consequentemente, dúvidas não restam que se deve indeferir o peticionado.”. Em face da reprodução integral da fundamentação de direito da sentença recorrida quanto a tal questão da falta de interesse em agir do Exequente, é manifesta a falta de fundamentação em que incorre, por nada aduzir a respeito da questão que enuncia como submetida à sua apreciação e decisão. A sentença não aduz uma única razão para fundar a decisão de falta de interesse em agir, limitando-se a dizer que por economia discursiva se abstém de reproduzir o alegado na petição de execução. Nos termos do artigo 205.º, n.º 1 da CRP, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei, pelo que o imperativo de fundamentação constitui uma imposição constitucional. Trata-se de assegurar um dos mecanismos de legitimação do poder judicial, no sentido de assegurar que as decisões dos tribunais, sendo fundamentadas, sejam compreendidas pelos cidadãos e, consequentemente, por eles respeitadas e acatadas. Por isso, em concretização do ditame constitucional, o artigo 154.º do CPC estabelece o dever de fundamentar a decisão, impondo que a decisão sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo seja sempre fundamentada. De forma a concretizar no que se há-se traduzir o respeito por esse dever de fundamentação, o n.º 2 do artigo 154.º do CPC prescreve que a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição. Por isso, quando a alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC determina como causa de nulidade da sentença, a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, trata-se de assumir as consequências do incumprimento do dever legal de fundamentação da decisão judicial, estabelecido nos artigos 205.º, n.º 1 da CRP e 154.º do CPC. Pelo que, em face do exposto, é manifesta a nulidade decisória da sentença recorrida por falta de fundamentos no tocante à questão da falta de interesse em agir do Exequente, ora Recorrente, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC. Donde, ser de proceder, por provado, o fundamento do recurso invocado pelo Recorrente.
3. Erro de julgamento de direito, por ao julgar verificado o erro na forma do processo, o tribunal não aplicou como devia, o artigo 157.º, n.º 3 do CPTA e por violação dos artigos 278.º, n.º 1, b), 577.º, b) e 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC Sem prejuízo da procedência das aludidas nulidades decisórias, impõe-se ainda conhecer dos demais fundamentos do recurso, invocando o Recorrente o erro de julgamento de direito com os fundamentos de o Tribunal a quo não ter aplicado, como devia, o disposto no artigo 157.º, n.º 3 do CPTA, assim como incorrer em violação dos artigos 278.º, n.º 1, b), 577.º, b) e 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC. Sustenta o Recorrente que a sentença recorrida faz tábua rasa da existência de um ato administrativo a que não foi dada a devida execução pela Polícia Judiciária e da possibilidade conferida ao Exequente de peticionar a execução judicial desse despacho. Defende que a sentença incorre em erro de julgamento ao decidir que o pedido formulado pelo Exequente não pode ser desencadeado no processo de execução de sentença, mas na ação administrativa, por falta de aplicação do disposto no artigo 157.º, n.º 3 do CPTA. Alega, por isso, que é errado entender pela verificação da exceção dilatória de erro na forma do processo, mas, ainda que assim se entendesse, a procedência dessa exceção não acarretaria a absolvição do pedido, mas antes a absolvição da instância, incorrendo na violação dos preceitos dos artigos 278.º, n.º 1, b), 577.º, b) e 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC. Vejamos. As questões suscitadas pelo Recorrente exigem que se dilucide o objeto da presente instância, nos exatos termos constituídos pela petição de execução apresentada em juízo pelo Exequente e pelo pedido e pela causa de pedir nela formulados. Compulsando o articulado inicial apresentado pelo ora Recorrente, dele decorre que foi instaurada ação de execução contra o Ministério da Justiça, invocando-se como título executivo o despacho de 22/09/2011 da Ministra da Justiça, de revogação dos despachos de 28/11/2006, de 18/11/2008 e de 18/12/2008 do Diretor Nacional Adjunto da Polícia Judiciária, que indeferiram a pretensão do Exequente ao gozo de 15 dias de licença parental, concedendo provimento ao recurso hierárquico interposto. Invoca o Exequente que do Parecer n.º 24/2010/AJ, em que se fundamenta o ato ministerial, junto aos autos como documento 1 (fls. 15 e segs. do processo físico), constam um conjunto de conclusões que reconhecem a impossibilidade de reconstituição natural da situação atual, tendo o interessado direito a ser indemnizado pelos prejuízos patrimoniais sofridos como consequência do ato ilegal. Mais alega o Exequente na petição de recurso que foi impedido de gozar a licença parental requerida, correspondente ao gozo de 15 dias remunerados, o que lhe causou danos que determinam o respetivo ressarcimento indemnizatório, pedindo na presente execução, a condenação do Executado ao pagamento da quantia de € 4.629,58, a título de ressarcimento pelos danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescidos dos respetivos juros de mora, ao abrigo do artigo 170.º, n.º 2, b) do CPTA. Assim configurado o presente litígio, de imediato se impõe concluir pelo erro de julgamento em que incorre a sentença recorrida ao decidir pela falta de título executivo e pela inidoneidade da presente ação executiva para fazer valer a pretensão material formulada em juízo pelo Exequente. Considerando a data da instauração da ação executiva em juízo, em abril de 2012, vigorava a redação do artigo 157.º do CPTA antes da reforma introduzida pelo D.L. n.º 214-G/2015, de 02/10, o qual estipulava no seu n.º 3 que “Quando haja acto administrativo inimpugnável de que resulte um direito para um particular e a que a Administração não dê a devida execução ou exista outro título executivo passível de ser accionado contra ela, pode o interessado lançar mão das vias previstas no presente título para obter execução judicial.”. Tal preceito, corresponde hoje, com alterações, ao disposto no artigo 157.º, n.º 2 do CPTA. Tal regra legal tem por desiderato estender o âmbito de aplicação do regime do Título VIII, referente ao processo executivo, a outros títulos executivos, para além das sentenças proferidas pelos Tribunais Administrativos. O que significa que não são as sentenças administrativas os únicos títulos executivos em face do disposto no CPTA, admitindo-se que também o possam ser certos atos administrativos. Por isso, quando o título executivo não seja efetivamente uma sentença administrativa, sempre a que as disposições legais se refiram à sentença, deve considerar-se outros títulos executivos, de entre os quais, os atos administrativos inimpugnáveis de que resulte um direito para o particular, Exequente, como no presente caso. Não se trata de apreciar se estão reunidos os demais requisitos processuais para a admissibilidade da presente ação executiva em juízo, designadamente, todos os demais pressupostos processuais, como o da tempestividade da instauração da ação executiva em juízo ou sequer, se estão reunidos os pressupostos de procedência da pretensão material formulada em juízo pelo Exequente. Importa apenas neste âmbito, à luz do que foi decidido na sentença recorrida e segundo o fundamento do recurso, decidir pela procedência do erro de julgamento de direito ao ter-se decidido pela falta de título executivo, por inexistência de uma sentença administrativa e, consequentemente, pelo erro na forma do processo, por não ser a presente ação executiva o meio processual adequado e próprio, porque, ao contrário do decidido, o ato administrativo praticado pela Ministra da Justiça, em 22/09/2011, que ora consta da alínea C) do julgamento da matéria de facto assente constitui um título executivo, que permite fundar a instauração da ação executiva. Segundo os termos em que a presente ação executiva foi instaurada pelo Exequente, é o mesmo titular de um título executivo, segundo o disposto no artigo 157.º, n.º 3 do CPTA, na redação à data aplicável, por ter sido proferido ato administrativo inimpugnável que reconhece o seu direito ao gozo de licença parental. Tal se afigura bastante para concluir pelo erro de julgamento da sentença recorrida, que olvidou em absoluto o que se encontra previsto no artigo 157.º, n.º 3 do CPTA, que permite que sejam instauradas ações executivas que tenham por base título executivo diferente de uma sentença administrativa, designadamente, a prática de um ato administrativo inimpugnável, como no presente caso. Apenas não consta do título executivo a concreta quantia que ora é peticionada pelo Exequente, por se ter remetido para a sua liquidação, o que importa apurar na presente instância executiva. Por conseguinte, procede o fundamento do recurso no tocante ao erro de julgamento da sentença em relação à falta de título executivo e quanto ao erro na forma do processo, por violação do disposto no artigo 157.º, n.º 3 do CPTA. Do mesmo modo no tocante ao erro de julgamento por violação dos artigos 278.º, n.º 1, b), 577.º, b) e 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, porquanto sendo a presente ação executiva o meio processual próprio, a consequência processual não é a da absolvição do pedido, antes a nulidade do processado, com a indagação da possibilidade do aproveitamento de certos atos processuais, segundo o disposto no artigo 193.º do CPC. Termos em que, em face do exposto, procede o fundamento do recurso, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento de direito, por violação do disposto no artigo 157.º, n.º 3 do CPTA, vigente à data da instauração da ação em juízo, por ser a presente ação executiva o meio processual próprio para fazer valer a pretensão formulada pelo Exequente e o mesmo ser titular do titulo executivo que consiste no despacho ministerial que reconhece o direito ao gozo da licença parental remunerada de 15 dias, com a consequente violação dos artigos 278.º, n.º 1, b), 577.º, b) e 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC ao decidir-se pela absolvição do pedido.
4. Erro de julgamento no tocante à questão da falta de interesse em agir do Exequente Por último, assaca o Recorrente o erro de julgamento à sentença recorrida no tocante ao juízo emitido sobre a falta de interesse em agir do Exequente para instaurar a presente ação, sustentando em que em face do alegado na petição de recurso decorre o interesse do Exequente em vir a juízo. É manifesta a razão que assiste ao Recorrente. Não obstante a sentença recorrida incorrer em nulidade decisória, por falta de invocação das razões que fundamentem o juízo formulado da falta de interesse em agir do Exequente para vir formular a pretensão deduzida em juízo, em face das razões invocadas como causa de pedir na petição de recurso, é manifesto que o Exequente tem interesse processual em vir formular a pretensão que deduziu em juízo. O Exequente requereu uma pretensão à Administração que foi indeferida e interposto recurso hierárquico, veio a ser concedido provimento ao recurso e a reconhecer-se a pretensão requerida, a qual, por não ter ainda sido satisfeita pela Administração, implica o interesse processual de recurso à justiça. O Exequente enquanto beneficiário do ato administrativo que reconhece o direito ao gozo da licença parental de 15 dias, assim como perante a impossibilidade da reconstituição natural da situação atento o decurso do tempo, reconhece o direito ao respetivo ressarcimento pelos danos sofridos, remetendo apenas para momento ulterior a sua respetiva liquidação. Por conseguinte, incorre a sentença recorrida em erro de julgamento de direito ao decidir pela falta de interesse processual em agir do Exequente. Termos em que, pelas razões aduzidas, procede o fundamento do recurso, por provado. * Pelo que, em suma, em face de todo o exposto, será de conceder provimento ao recurso, em anular a sentença recorrida com fundamento em nulidades decisórias e erros de julgamento e em ordenar a baixa dos autos para o seu normal prosseguimento se nada mais obstar. * Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma: I. Incorre a sentença recorrida em nulidade decisória, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, c) do CPC se aduz certa fundamentação de direito que é entre si contraditória, assim como ao existir contradição entre essa fundamentação e o dispositivo da sentença. II. Procede o fundamento da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, b) do CPC se a sentença recorrida omite totalmente os fundamentos na emissão do juízo formulado quanto a certa questão apreciada. III. Incorre a sentença em erro de julgamento, em violação do artigo 157.º, n.º 3 do CPTA, na redação vigente à data dos factos, anterior ao D.L. n.º 214-G/2015, de 02/10, ao decidir pela inexistência de título executivo e pela inidoneidade do meio processual do processo de execução instaurado, que tem como título executivo o ato administrativo inimpugnável que concede um direito ao Exequente. IV. Incorre a sentença recorrida em erro de julgamento ao pronunciar-se pela falta de interesse em agir do Exequente, em face do pedido e da causa de pedir alegados na petição de execução. * Por tudo quanto vem de ser exposto, decide-se no presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, em anular a sentença recorrida e em ordenar a baixa dos autos para o normal prosseguimento da ação executiva instaurada pelo Exequente, fundada na prática do ato ministerial praticado em 22/09/2011, que reconhece o direito ao ressarcimento pela falta de gozo da licença parental remunerada de 15 dias, se nada mais obstar. Custas pelo Recorrido, em ambas as instâncias.
(Ana Celeste Carvalho) |