Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 32753/24.5BELSB |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 09/25/2025 |
| Relator: | MARA DE MAGALHÃES SILVEIRA |
| Descritores: | SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DE ATO NEGATIVO INTERESSE EM AGIR PERICULUM IN MORA |
| Sumário: | I - O pedido de acreditação, que inicia o procedimento de avaliação para efeitos de acreditação, corresponde ao apresentado e submetido nos termos deste artigo 28.º do Regulamento n.º 392/2013, publicitado no Diário da República n.º 200/2013, Série II de 2013.10.16; II - O interesse em agir consiste na verificação da necessidade ou utilidade da ação tal como configurada pelo autor; III - Dispõe de interesse em agir na suspensão de eficácia da deliberação de não acreditação do ciclo de estudos, a Requerente que alega ter-se produzido, previamente à prática do ato expresso negativo, o ato tácito de deferimento, em termos tais que com a suspensão de eficácia do ato expresso de indeferimento, o ato tácito retoma a sua validade e eficácia, permitindo-lhe dar continuidade ao procedimento administrativo de acreditação; IV - Não se tendo produzido, previamente à prática do ato (expresso) de não acreditação, o ato tácito de deferimento do pedido de acreditação, a situação de facto consumado e os prejuízos de difícil reparação que a requerente advoga, decorrentes da impossibilidade de ministrar o ciclo de estudos, não resultam do ato de indeferimento, nem da produção dos efeitos deste, mas sim de não existir na esfera jurídica da Requerente, em decorrência de um ato (tácito) de acreditação, um direito a prosseguir com o procedimento; V - Não se pode considerar preenchido o pressuposto do periculum in mora quando se verifica que a constituição da situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação alegados pela Requerente não são um resultado do ato suspendendo, de tal forma que a tutela cautelar (meramente conservatória) requerida não detém aptidão a impedir a sua verificação. |
| Votação: | Unanimidade |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Administrativa Comum |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Subsecção Administrativa Comum, do Tribunal Central Administrativo Sul: 1. Relatório C.E.S.P.U. – Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário, CRL (doravante A., Requerente ou Recorrente) instaurou, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, providência cautelar contra a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (doravante Entidade Requerida, Requerida ou Recorrida), peticionando, no essencial, a suspensão de eficácia do ato, correspondente à deliberação de 26.10.2024, de não acreditação do ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina conferente ao grau de Mestre pelo Instituto Universitário de Ciências da Saúde da Requerente. Por sentença de 8 de julho de 2025, o Tribunal julgou procedente a exceção dilatória de falta de interesse em agir, absolvendo a Requerida da instância. Inconformada a Requerente/Recorrente, interpôs recurso jurisdicional dessa decisão para este Tribunal Central Administrativo, concluindo nos seguintes termos: 1. Deve o Tribunal Central Administrativo Sul usar dos poderes conferidos pelos arts° 662° n° 1 e 2 e 649° CPC e alterar o facto 1 dado como provado na sentença recorrida. Notificada, a Entidade Requerida apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões, I. A douta sentença recorrida, ao dar como indiciariamente provado que «em 15-11-2023, a Requerente apresentou, junto dos serviços da Requerida, o seu pedido de acreditação do ciclo de estudos do Mestrado Integrado em Medicina, o qual foi instruído como processo n.° NCE/23/2300152», não incorreu em qualquer erro de julgamento. 4.2. Do erro de julgamento de direito
* Cumpre, pois, ao abrigo do disposto no artigo 149.º, n.º 1 do CPTA, conhecer em substituição do mérito da ação cautelar. 4.3. Do conhecimento em substituição Com vista ao conhecimento em substituição, ao abrigo do disposto no artigo 149.º, n.º 1, 2 e 4 do CPTA, adita-se à matéria de facto provada, o seguinte facto considerado perfunctoriamente provado: 3. Em 26.7.2024 a Entidade Requerida expediu, por correio eletrónico, para a Requerente a notificação da decisão de não acreditação referida no ponto anterior. – doc. 1 do requerimento inicial. * A Requerente peticiona a suspensão de eficácia da deliberação de 26.10.2024 do Conselho de Administração da Requerida de não acreditação do ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina conferente ao grau de Mestre pelo Instituto Universitário de Ciências da Saúde. Sustenta encontrarem-se preenchidos os pressupostos de adoção da tutela cautelar. A respeito do fumus boni iuris, advoga que o ato suspendendo padece dos vícios de violação do direito de audiência prévia e falta de fundamentação, incorrendo ainda em erro nos pressupostos de facto. Quanto ao periculum in mora sustenta verificar-se um manifesto receio de constituição de uma situação de facto consumado e ocorrência de prejuízos de difícil reparação porquanto, alegando que se produziu, previamente ao ato suspendendo, um ato tácito de deferimento do seu pedido de acreditação, destinando-se a providência a manter o status quo decorrente desse deferimento tácito, da execução do ato suspendendo resulta a impossibilidade de dar continuidade à tramitação administrativa subsequente à acreditação com o registo do deferimento e obtenção de autorização para iniciar a ministração do Mestrado Integrado, pelo que inúmeros investimentos por si feitos e outros que pretende fazer serão adiados. Alega que a execução do ato tornará inútil a sentença a proferir na ação principal porque a continuidade do procedimento administrativo ficará irremediavelmente adiada e não concretizada, impossibilitando ao IUCSCESPU e aos docentes de ministrar o curso de medicina. Daí advoga que a Requerente e o seu corpo docente ficarão desmotivados e impedidos de demonstrar e obter reconhecimento e credibilidade académica, científica e pedagógica decorrente de ministrar o ciclo de estudos em Mestrado Integrado em Medicina. Aduz que celebrou protocolos com universidades, resultando da execução do ato que a sua imagem externa fica irremediavelmente hipotecada, afetando negativamente o ingresso de estudantes. Mais sustenta que, com a execução do ato, os docentes e médicos doutorados que por si iriam ser contratados irão migrar para outra instituição universitária, que os alunos do ciclo básico do Mestrado Integrado em Medicina irão continuar a deslocar-se para as universidades em Espanha com quem colabora e que os alunos interessados em frequentar o ciclo de estudos deixarão de procurar o ensino da Requerente, daí ocorrendo uma diminuição na frequência do seu curso de ciências biomédicas. Considera que face à ausência de alunos e só estarem autorizados a formar médicos parcialmente, excluindo o ensino clínico, tal desmotiva o corpo docente, o que determina a diminuição do labor e desempenho, repercutindo-se na Requerente. E que a imediata execução do ato suspendendo limita a oportunidade de os estudantes poderem continuar a seguir o curso de medicina. Mais advoga que tal traduzirá a estagnação do projeto académico da requerente relativamente ao ciclo de estudos do Mestrado Integrado em Medicina, perdendo a oportunidade de prosseguir os projetos académicos que já tem programados, nomeadamente o ensino clínico para o qual havia o compromisso de contratação de 84 docentes doutorados, dos quais 91,4 são clínicos, bem como a não implementação do ensino em três grandes hospitais (um privado e dois públicos) cujos protocolos de colaboração para tal, foram assinados. Ocorrendo prejuízo para a Requerente e seus discentes e docentes, com a perda de prestígio e idoneidade perante estudantes e outras instituições universitárias, de receitas e angariação de projetos e publicações académicas. Quanto à ponderação de interesses aduz que os danos resultantes da recusa da providência são superiores aos que resultam da sua concessão porquanto a Requerida nenhum interesse tem que possa ser afetado ou prejudicado pela suspensão de eficácia do ato, inexistindo graves prejuízos para o interesse público que possam ser produzidos se o ato for suspenso. Vejamos. No artigo 120.º do CPTA estão enunciados os critérios de que a lei faz depender a possibilidade de concessão de providências cautelares, nos seguintes termos, 1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente. 2 - Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências. Assim, deste normativo resulta que são pressupostos, de preenchimento cumulativo, para a adoção de medida cautelar (i) a verificação de fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora), (ii) a probabilidade de que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente (fumus boni iuris) e (iii) caso se verifiquem estes dois requisitos, o tribunal terá ainda de proceder ao juízo relativo à ponderação dos interesses públicos e privados em presença, que poderá determinar a recusa da providência quando, num juízo de proporcionalidade, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências. Da circunstância de as condições de procedência das providências cautelares definidas no art.º 120.º, n.º 1 e n.º 2 do CPTA serem de verificação cumulativa, resulta que basta a não verificação de qualquer delas para que a providência seja julgada improcedente, a significar que fica prejudicada a apreciação dos demais requisitos (cf. art. 608.º, n.º 2 do CPC). Iniciando-se pelo requisito do periculum in mora entende-se que este se encontra preenchido sempre que exista fundado receio que, quando o processo principal termine e sobre ele venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada ou cabal às situações jurídicas e pretensão objeto de litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja porque tal evolução gerou ou conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis. Tem-se considerado que se está perante uma situação de facto consumado sempre que da não adoção da providência cautelar ocorra uma situação de impossibilidade total de reintegração da situação jurídica conforme ao Direito. Assim, haverá uma situação de facto consumado quando, na pendência de qualquer ação principal, a situação de facto se altere de modo a que a decisão que nela venha a ser proferida, sendo favorável ao requerente, perca toda a sua eficácia (Ac. do TCA Norte de 5.4.2024, proferido no processo 00419/23.9BEPRT). A providência também deve ser concedida quando os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de “prejuízos de difícil reparação” no caso de a providência ser recusada, seja porque a reintegração no plano dos factos se perspetiva difícil, seja porque pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou, pelo menos, de reparar integralmente. Refira-se que para aferir da verificação do requisito do periculum in mora, o juiz “deve fazer um juízo de prognose colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há ou não razão para recear que tal sentença venha a ser inútil, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica. Neste juízo, o fundado receio há-de corresponder a uma prova, em princípio a cargo do Requerente, de que tais consequências são suficientemente prováveis para que se possa considerar ‘compreensível ou justificada’ a cautela que é solicitada. Como decorre da universalidade das providências admitidas, tanto releva actualmente o periculum in mora de infrutuosidade, que exigirá, em regra, uma providência conservatória, de modo a manter a situação existente, como o periculum in mora de retardamento, que postulará a adopção de uma providência antecipatória, que antecipe parcial ou mesmo totalmente, ainda que sempre em termos provisórios, a solução pretendida ou regule interinamente a situação” [Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa (Lições), 14ª edição, Coimbra, Almedina, 2015, p. 293]. Determina a lei que o receio deve ser fundado, ou seja, “apoiado em factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo”, não bastando “simples dúvidas, conjecturas ou receios meramente subjectivos ou precipitados assentes numa apreciação ligeira da realidade, embora, de acordo com as circunstâncias, nada obste a que a providência seja decretada quando se esteja face a simples ameaças advindas do requerido, ainda não materializadas, mas que permitam razoavelmente supor a sua evolução para efetivas lesões” (Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, Volume III, Almedina, 2ª edição, pág. 87). O periculum in mora “pressupõe, assim, um juízo qualificado ou um temor racional, isto é, deve assentar em factos concretos e consistentes que permitam afirmar, com objetividade e distanciamento, a seriedade e a atualidade da ameaça, bem como a necessidade de serem adotadas medidas urgentes, que permitam evitar o prejuízo. O mesmo é dizer que só a presença de um prejuízo atual, concreto e real, reconhecido como efetivamente grave, iminente e irreparável, resultante da demora da sentença definitiva de mérito, pode justificar o acolhimento do pedido apresentado pela via da urgência. Exige-se, no fundo, um juízo de probabilidade “forte e convincente”, a ser valorado pelo julgador segundo um critério objetivo”, de tal forma que uma providência cautelar “será injustificada se o periculum in mora nela invocado se fundar num juízo hipotético, genérico, abstrato, futuro ou incerto, ou num receio subjetivo, sustentado em meras conjeturas” (Marco Carvalho Gonçalves, Providências Cautelares, 2015, Almedina, pp. 206-213). Feito este enquadramento há que considerar que a Recorrente assenta os prejuízos (e a situação fáctica consumada) que alega advirem como resultado da produção dos efeitos (não suspensão de eficácia) do ato que lhe indeferiu o pedido de acreditação do ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina conferente ao grau de Mestre pelo Instituto Universitário de Ciências da Saúde na circunstância de dispor, já, na sua esfera jurídica de um ato (tácito) de deferimento dessa pretensão. E que, como tal, lhe possibilita dar continuidade ao procedimento administrativo de acreditação e, consequentemente, obter autorização e assim ministrar o referido ciclo de estudos. Cumpre, portanto, em primeiro lugar, e com vista a apurar se da produção de efeitos do ato suspendendo na pendência da ação principal resultará a constituição de uma situação de facto consumado que tornará inútil a sentença a proferir no processo principal ou a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que a requerente aí visa assegurar, aferir, ainda que perfunctoriamente, se na esfera jurídica da Requerente existe já o status quo que pretende conservar, isto é, um direito a dar continuidade ao procedimento de acreditação por dispor a seu favor de um ato (tácito) de deferimento. Como resulta do disposto no artigo 61.º da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, as instituições de ensino superior gozam do direito de criar ciclos de estudos que visem conferir graus académicos (n.º 1), sendo que a entrada em funcionamento de ciclos de estudos que visem conferir graus académicos carece de acreditação pela Agência de Avaliação e Acreditação para a Garantia da Qualidade do Ensino Superior e de subsequente registo junto do ministério da tutela (n.º 3). A acreditação de um ciclo de estudos, sendo da competência da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, consiste na verificação do preenchimento dos requisitos legais exigidos para a sua criação e funcionamento (artigos 52.º e 53.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de março, que aprova o regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior). Nos termos do artigo 54.º-A do Decreto-Lei n.º 74/2006 o procedimento de acreditação dos ciclos de estudos é fixado por regulamento da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (n.º 1), o qual corresponde ao Regulamento n.º 392/2013, publicitado no Diário da República n.º 200/2013, Série II de 2013-10-16. Dispondo, também, aquele artigo 54.º-A que “4 - No caso de pedido de acreditação de ciclo de estudos a ministrar inicialmente, inserido em processo de reconhecimento ou de alteração de reconhecimento de interesse público de estabelecimento de ensino superior privado ou de criação de um estabelecimento de ensino superior público, a decisão de acreditação deve ser proferida no prazo máximo de seis meses sobre a formulação do pedido devidamente instruído. 5 - Nos restantes casos, a decisão sobre o pedido de acreditação de um ciclo de estudos deve ser proferida no prazo máximo de nove meses sobre a formulação do pedido devidamente instruído. 6 - Findos os prazos indicados nos n.º s 4 e 5, considera-se tacitamente deferido o pedido, tendo-se o ciclo de estudos como acreditado para todos os efeitos legais pelo período de um ano.” Prevê-se, ainda, no artigo 59.º do Decreto-Lei n.º 74/2006 que a acreditação é conferida pelo prazo estabelecido na decisão do processo de acreditação de um ciclo de estudos, nos termos do disposto em Regulamento aprovado pelo conselho de administração da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, ou pelo prazo de um ano, em caso de deferimento tácito. Nos termos do Regulamento n.º 392/2013, publicitado no Diário da República n.º 200/2013, Série II de 2013-10-16, o procedimento de avaliação com vista à acreditação inicia-se mediante pedido subscrito pelo dirigente máximo da instituição de ensino superior interessada ou, quando se trate de instituição de ensino superior não pública, da respetiva entidade instituidora (artigo 9.º). Sendo que o pedido de acreditação deverá conter os elementos elencados no n.º 1 do artigo 28.º do Regulamento, sendo submetido por via dos “formulários eletrónicos para submissão dos pedidos de acreditação, que concretizam e especificam os elementos a que se refere o número anterior, e define quais são os elementos que a entidade de ensino superior interessada fornece em língua inglesa” (n.º 2 do artigo 28.º do Regulamento). O pedido é sujeito a apreciação liminar nos termos do artigo 30.º do Regulamento, sendo liminarmente indeferido se, detetadas deficiências e concedido para o seu suprimento, não forem supridas ou for manifesta a falta de requisitos exigidos para a acreditação. Não havendo indeferimento liminar, há lugar a uma avaliação realizada por comissões de avaliação externa compostas por peritos independentes, com qualificação adequada às áreas científicas dos ciclos de estudos a avaliar (artigo 11.º do Regulamento). E concluídas as tarefas de avaliação, a comissão de avaliação externa elabora um relatório preliminar fundamentado que é sujeito a audiência prévia (artigos 15.º e 16.º do Regulamento). Concluída a audiência da instituição do ensino superior interessada, a comissão de avaliação externa elabora o relatório final, competindo ao Conselho de Administração da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior a decisão, favorável ou desfavorável, do procedimento de acreditação, e que tem por base o relatório de avaliação e compreende a decisão sobre a avaliação a que se refere o n.º 1 do artigo 18.º (artigos 17.º, n.º 1, 18.º, 33.º e 34.º do Regulamento). Estabelece-se artigo 19.º do Regulamento que “a adoção de decisões e a prática de atos e formalidades procedimentais estão sujeitos aos prazos gerais constantes do Código de Procedimento Administrativo, bem como às regras nele previstas para a respetiva contagem”. Ora, nos termos do artigo 130.º do CPA, “existe deferimento tácito quando a lei ou regulamento determine que a ausência de notificação da decisão final sobre pretensão dirigida a órgão competente dentro do prazo legal tem o valor de deferimento” (n.º 1), sendo que “há deferimento tácito se a notificação do ato não for expedida até ao primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo da decisão” (n.º 2). Do regime exposto decorre que, devendo a decisão sobre o pedido de acreditação apresentado pela Requerente ser proferida no prazo máximo de nove meses (artigo 54.º-A, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 74/2006), se esta não tiver sido tomada em tal prazo e a notificação do ato expedida até ao primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo da decisão, dá-se o deferimento tácito do pedido, tendo-se o ciclo de estudos como acreditado para todos os efeitos legais pelo período de um ano. Virando-nos, agora, para o probatório resulta provado que o pedido de acreditação foi apresentado pela Requerente em 15.11.2023, tendo sido a decisão de não acreditação tomada em 26.7.2024 e, nessa mesma data, expedida a notificação do ato. Iniciado, mediante o pedido apresentado, o procedimento de acreditação em 15.11.2023, considerando o disposto no artigo 87.º, als. a), b) e d) do CPA, o prazo de 9 meses para a decisão terminaria em 15.8.2024. Donde, tendo sido o ato expresso de indeferimento proferido em 26.7.2024, naturalmente que não se formou o ato tácito de deferimento do pedido de acreditação da Requerente. Daqui resulta que não existe na esfera jurídica da Requerente, em decorrência de um ato tácito de deferimento, um direito a prosseguir com o procedimento de acreditação que, obstaculizado pela produção dos efeitos do ato expresso de indeferimento, determinasse a produção dos prejuízos alegados pela Requerente. Isto é, a situação fáctica consumada e os prejuízos de difícil reparação que a Recorrente alega não emergem da produção dos efeitos do ato de indeferimento do pedido de acreditação, em moldes que apenas a suspensão de eficácia deste fosse suscetível de os evitar, assim garantindo a utilidade da decisão a proferir na ação principal. Na realidade, tais prejuízos e que, no essencial, se traduzem na impossibilidade de o Instituto Universitário de Ciências da Saúde ministrar o ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina conferente ao grau de Mestre, resultam da falta de acreditação do mesmo, de tal forma que, ainda que se suspendesse a eficácia do ato de indeferimento do pedido de acreditação, os mesmos sempre se produziriam por não existir na ordem jurídica, e na titularidade da Requerente, o status quo (detenção da acreditação) que esta alegou. À consubstanciação do periculum in mora realizada nos autos pela Requerente subjaz um circunstancialismo fáctico que a mesma não detém, qual seja a acreditação do ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina conferente ao grau de Mestre, e, consequentemente, não é da produção dos efeitos do ato de não acreditação que resulta a impossibilidade de o Instituto Universitário de Ciências da Saúde, os seus docentes, discentes e alunos, darem início e completarem o ciclo de estudos, não obtendo o reconhecimento que alegam, estagnando os projetos académicos e adiando os investimentos realizados e a realizar pela autora. O ato (suspendendo) limita-se a manter a situação pré-existente e essa é a de, não estando acreditado o ciclo de estudos, a Requerente não poder prosseguir com o procedimento administrativo, registando a acreditação, e vindo a ministrar o ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina conferente ao grau de Mestre. De tal forma que, mesmo que o ato fosse suspenso, daí não resultaria a possibilidade de a Requerente o fazer, produzindo-se, sempre e de qualquer forma, os efeitos que a Recorrente sustenta. Donde não se pode considerar preenchido o pressuposto do periculum in mora, porquanto, realizado o juízo de prognose, assume-se à evidência que a constituição da situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação alegados pela Requerente não são um resultado do ato suspendendo, pelo que a tutela cautelar (meramente conservatória) requerida não detém aptidão a impedir a sua verificação. Sem prejuízo, impõe-se considerar que, mesmo que se aceitasse a tese da Requerente da formação do ato tácito em 11.7.2024 (que dependeria da demonstração da apresentação do pedido de acreditação em 11.10.2023, o que não sucedeu), haveria que considerar o disposto na parte final do n.º 6 do artigo 54.º-A e no n.º 1 do artigo 59.º do Decreto-Lei n.º 74/2006 que prevê que a acreditação por ato tácito se mantém em vigor pelo período de 1 ano, ou seja, até 11.7.2025. Ora, porque a suspensão de eficácia do ato de indeferimento expresso manteria em vigor o ato tácito de deferimento apenas pelo período de um ano, ou seja, até 11.7.2025, e não sem termo, na presente data, naturalmente, que a mesma não teria aptidão a permitir que a Requerente prosseguisse com o procedimento administrativo visando ministrar o ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina conferente ao grau de Mestre, obviando aos danos que alega resultarem da produção dos efeitos do ato suspendendo. Como se escreveu no Ac. deste TCA Sul de 16.10.2024, proferido no processo 120/23.3.BEPNF, “Ora, todos os danos alegados pela Recorrente: as despesas incorridas, as previstas realizar, a afectação da respectiva imagem e credibilidade, a desmotivação de alunos e de docentes, têm a ver com o procedimento de acreditação do referido ciclo de estudos e principalmente com a falta desta. Dito de outro modo, não é a paralisação dos efeitos do acto de indeferimento da acreditação, pedida em 2021, que vai obstar a que os mesmos ocorram, uns porque já se verificaram [não estando, por isso, em causa o risco de se virem a produzir caso a providência não seja decretada], outros porque estão apenas estimados e dependem do deferimento da acreditação [e a suspensão de eficácia do acto suspendendo apenas podia implicar a reposição do deferimento tácito já caducado, nos termos expendidos supra], outros porque nem sequer foram considerados indiciariamente provados nos autos [e não resultam impugnados no recurso], pelo que não preenchem o exigido receio de produção de prejuízos de difícil reparação. A constituição de uma situação de facto consumado pressupõe que o juiz do processo cautelar, partindo da situação concreta alegada pelo requerente, efectue um juízo perfunctório de ser fundado o receio invocado por aquele de, na pendência da acção principal, a sua situação se alterar pela ou em resultado da execução do acto suspendendo, tornando uma eventual decisão de procedência inútil por então ser de todo em todo impossível a reintegração específica na sua esfera jurídica. Exemplo, se não for decretada a suspensão de eficácia do acto administrativo que determinou a demolição de um imóvel, a respectiva execução na pendência da acção principal irá tornar inútil a sentença que o anule, pois, no plano dos factos, imóvel já estará demolido, resultado a que o autor pretendia obstar com a sentença anulatória. De acordo com o legado no r.i. a acção principal é de impugnação do acto aqui suspendendo. Considerou o juiz a quo que, a ser concedido provimento à mesma será possível proceder à reintegração da situação conforme a legalidade, através da acreditação do curso de mestrado integrado em medicina. Discorda a Recorrente porque esse entendimento carece de sustentação fáctica pois levará anos a tramitar a acção principal e muitos anos escolares se terão iniciado e terminado, sendo impossível repor os efeitos da ilegalidade praticada. Ora, a paralisação dos efeitos do acto de indeferimento expresso não permitirá obstar a que muitos anos escolares se iniciem e terminem antes de ser proferida a acção principal, ou seja, a situação inerente ou resultante da falta de acreditação manter-se-á quer a providência requerida seja decretada ou não. Por outro lado, se a sentença a proferir na acção principal for de anulação do acto, dependerá dos respectivos fundamentos saber se implicará para a Recorrida praticar novo acto que defira a acreditação ou não - por exemplo, se a anulação se dever apenas à falta de audiência prévia ou por proceder parte dos vícios de erro nos pressupostos de facto e/ou de direito que a Recorrente invoca, o acto de indeferimento anulado poderá ser repetido pela Recorrida sem esse/s vício/s e a reintegração da legalidade não passará pela pretendida acreditação”. Não se pode, pois, considerar demonstrado o requisito do periculum in mora. Dado que as condições de procedência das providências cautelares definidas no art. 120.º, n.º 1 e n.º 2 do CPTA, são de verificação cumulativa, basta a não verificação de qualquer delas para que a providência seja julgada improcedente, não havendo, pois, que conhecer os demais requisitos supra enunciados (cf. art. 608.º, n.º 2 do CPC). 4.4. Da condenação em custas
Mara de Magalhães Silveira Marta Cavaleira Lina Costa |