| Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 355/24.1BELLE | 
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| Secção: | CT | 
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| Data do Acordão: | 04/30/2025 | 
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| Relator: | FILIPE CARVALHO DAS NEVES | 
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| Descritores: | PROCESSO DE CONTRAORDENAÇÃO PORTAGENS COIMAS NULIDADE INSUPRÍVEL | 
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| Sumário: | I – Nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 79.º do RGIT, a decisão que aplica a coima deve conter a coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação. II – Se a decisão de aplicação da coima não contiver todos os elementos que fazem parte da decisão de aplicação da coima indicados nas alíneas a) a f) do n.º 1 do art.º 79.º do RGIT, ocorre nulidade insuprível do processo de contraordenação como resulta da alínea d) do n.º 1 do art.º 63.º do RGIT, nulidade que é de conhecimento oficioso e importa a anulação dos termos subsequentes do processo (cf. n.ºs 3 e 5 do art.º 63.º do RGIT). | 
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| Votação: | Unanimidade | 
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| Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais | 
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| Aditamento: |  | 
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO Vem a Autoridade Tributária e Aduaneira («AT») apresentar recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que, no âmbito do processo de contraordenação n.º 11122023060000201920, julgou procedente o recurso judicial apresentado por L…, Unipessoal, Lda., por entender que na decisão de aplicação da coima que foi proferida não foi observado o requisito da descrição sumária dos factos a que alude a alínea b) do n.º 1 do art.º 79.º do Regime Geral das Infrações Tributárias («RGIT»), enfermando, assim, da nulidade insuprível prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º do mesmo diploma legal A Recorrente apresentou alegações, rematadas com as seguintes conclusões: «I) Decidiu a Meritíssima Juiz a quo pela procedência dos autos de Recurso, decretando a nulidade da decisão de aplicação da coima e anulando os termos subsequentes do processo de contraordenação n.º 11122023060000201920, no qual foi aplicada uma coima única no montante de €1.985,25, acrescida de custas, por entender “que não pode ter-se como adequadamente cumprido, na decisão de aplicação da coima, o requisito da descrição sumária dos factos a que alude a alínea b) do n.º 1 do artigo 79.º do RGIT, enfermando, assim, da nulidade insuprível prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º do mesmo diploma legal”; II) A Mmª Juiz a quo considerou que na decisão de aplicação de coima não se indica “qual o dever omitido e qual o momento (o termo do prazo) em que tal dever devia ter sido cumprido. Ora, repete-se, na descrição sumária dos factos não se encontra indicado qual o dever omitido, por forma a ser possível analisar se foi correta a subsunção dos factos descritos às normas infringidas e punitivas consideradas e aplicadas”; III) Salvo melhor e douta opinião, não pode a FP concordar com tal conclusão; IV) Com efeito, afigura-se-nos que a sentença recorrida incorreu em erro de apreciação no que concerne à invocada nulidade insuprível consagrada no artigo 63.º, n.ºs 1, alínea d), do mesmo diploma, por falta do requisito enunciado no art.º 79.º, n.º 1 do RGIT; V) Desde logo, porque as exigências daquele preceito deverão considerar-se satisfeitas dado que a decisão condenatória proferida pela Chefe de Finanças de Portimão, em 04-01-2024, constante do probatório (B)), encontra-se bem fundamentada, de harmonia com o disposto no art.º 79.º n.º 1, do RGIT, dela constando expressamente todos os fundamentos, normas infringidas e punitivas, nomeadamente encontra-se descrito não só o imposto/ tributo devido, como todas as passagens realizadas pela arguida com referência à data/hora da infração, local e montante da taxa de portagem não paga, aí se referindo expressamente que as normas infringidas pela arguida se traduzem no incumprimento do dever “Falta de pagamento de taxa de portagem”; VI) Ora, bastando-se a lei com uma descrição sumária dos factos, afigura-se-nos que esta exigência se há de considerar plenamente satisfeita quando, como no caso sub judice, o elemento essencial do tipo, a saber, a falta de pagamento da taxa de portagem pela passagem/circulação de veículos automóveis em infraestruturas rodoviárias concessionadas, designadamente autoestradas e pontes, associados às respetivas matrículas, foi concretizada sem aquele pagamento; VII) Em consonância, diferentemente do entendimento preconizado na sentença a quo, consta da fundamentação do Acórdão do STA no Processo 01004/17BEPRT 0588/18, de 17-10-2018, nomeadamente: “É certo que no referido art.º 5.º se descrevem, nos seus n.ºs 1, alíneas a) e b), e 2, os diversos modos como pode concretizar-se essa falta de pagamento, uma vez que esta, em razão da diversidade de modos de pagamento, pode resultar de uma multiplicidade de circunstâncias. Mas essas circunstâncias não constituem elementos essenciais do tipo, pois se destinam apenas a concretizar um e o mesmo ilícito, qual seja a falta de pagamento da portagem. Por isso, não se exige a menção às mesmas na “descrição sumária dos factos” requerida pela primeira parte da alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT. Acresce que esses elementos não essenciais do tipo foram oportunamente comunicados à Arguida aquando da notificação que lhe foi efectuada ao abrigo do art.º 70.º do RGIT (…).” VIII) Efetivamente, na decisão de aplicação e fixação de coima, aqui em causa, o ilícito penal está descrito de molde a permitir à arguida, na veste de um comum destinatário na posição daquela, entender claramente os factos que lhe são imputados; IX) Face ao que antecede, considera a RFP que o recurso deve ser admitido, nos termos do artigo 83º, n.º 1 do RGIT. Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida como é de inteira JUSTIÇA.». *A Exma. Magistrada do Ministério Público («EMMP») junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé apresentou resposta, terminando com as seguintes conclusões: «a)Alega a Recorrente, em síntese, que o Tribunal a quo fez uma incorreta interpretação e aplicação do preceito normativo contemplado no art.º 79.º, n.º 1, al. b) do RGIT, ao considerar que a decisão que aplicou a coima deve conter a descrição sumária dos factos. b) Ou seja, segundo a Recorrente, as exigências daquele preceito legal deverão considerar-se satisfeitas, pois a descrição sumária da factualidade, constante da decisão administrativa que aplicou a coima única, permitiu à arguida o exercício cabal do seu direito de defesa, sendo indiferente o modo como o não pagamento se concretizou. c)A Mmª Juiz a quo considerou que na decisão de aplicação de coima não indicava qual o dever omitido e qual o momento (o termo do prazo) em que tal dever devia ter sido cumprido. Ou seja, na descrição dos factos não se encontrava explicitado qual o dever omitido, por forma a ser possível analisar se foi correta a subsunção dos factos descritos às normas infringidas e punitivas consideradas e aplicadas. d) Ora, nenhuma censura se faz à sentença, na parte em que declara a nulidade da decisão, com a qual se concorda, no que se refere à omissão “da descrição sumária dos factos” por se entender que o Tribunal “a quo” fez uma correta interpretação dos mencionados preceitos legais, uma vez que estamos perante um ato que afeta direitos e interesses legítimos dos contribuintes, pelo que deve conter uma descrição clara e precisa dos factos que permita a sua perceção, na sua plenitude, aos olhos de um cidadão comum, desprovido de conhecimento jurídicos. e)Além de ser fundamental a descrição da forma de cometimento dos factos para se apreciar a gravidade da ilicitude e da culpa do agente. f) Vislumbra-se deste modo, que agiu a Meritíssima Juiz corretamente ao considerar que os factos em apreço consubstanciam uma nulidade insuprível do processo de contraordenação, nos termos do artigo 63.º, n.º 1, alínea d), do Regime Geral das Infrações Tributárias. Nestes termos, deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente. Vossas Excelências, no entanto, melhor apreciarão e decidirão como for de Justiça!». * *Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão. * O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cf. art.º 412.º, n.º 1.º, do Código de Processo Penal – «CPP» – ex vi artigo 74.º, n.º 4, do Regime Geral das Contraordenações – «RGCO» –, ex vi art.º 3.º, al. b), do RGIT), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente. Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo, porquanto não se verifica a nulidade da decisão de aplicação da coima decorrente da insuficiente descrição sumária dos factos subjacente à imputação da contraordenação em referência. * III.A - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «A) Em 19-11-2023, foi autuado no Serviço de Finanças de Portimão, em nome de L… UNIPESSOAL, LDA., o processo de contraordenação n.º 11122023060000201920, por infrações consubstanciadas na falta de pagamento de taxas de portagem – cfr. fls. 1 do registo do sitaf n.º 004872854; B) Em 04-01-2024, no âmbito do processo de contraordenação referido na alínea antecedente, foi proferida, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Portimão, decisão de aplicação de coima com o seguinte teor: (…) «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» - cfr. fls. 30 a 33 do registo do sitaf n.º 004872854;». * «Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.». * «A convicção do Tribunal quanto aos factos provados decorre da análise crítica dos documentos juntos aos autos, supra identificados a propósito de cada uma das alíneas do probatório e cujo conteúdo não foi impugnado.». *Considerando que pode ser relevante para a decisão da causa, ao abrigo do disposto na alínea a) do art.º 431.º do CPP, aplicável ex vi do art.º 41.º do RGCO e da alínea b) do art.º 3.º do RGIT, acorda-se em aditar ao probatório o seguinte facto: C) A AT com referência ao processo de contraordenação n.º 11122023060000201920 emitiu documento dirigido à Recorrida com o seguinte teor: ««Imagem em texto no original» III.B De Direito O Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé julgou o recurso judicial procedente por nulidade da decisão de aplicação da coima face ao disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 63.º do RGIT, e em consequência, declarou a sua nulidade, bem como os ulteriores termos do referido processo, fundamentando-se no seguinte: «Como se sabe, no âmbito do processo contraordenacional, a imputabilidade de uma determinada conduta ao agente tem forçosamente de assentar na verificação real de um facto típico, ilícito e culposo, integrável num tipo objetivo e subjetivo, não sendo possível proceder a extrapolações interpretativas sem nexo direto entre os factos imputados ao arguido e as normas consideradas infringidas e punitivas. E é precisamente isso que sucede no caso concreto dos presentes autos, em que o órgão aplicador da coima não faz traduzir na descrição sumária dos factos um comportamento específico e concreto imputado à ora Recorrente, subsumível à norma infringida e punitiva feita constar da decisão de fixação da coima. Até porque, podendo estar em causa uma contraordenação omissiva pura (não se sabe se assim é porque não vem descrito nenhum específico comportamento do agente), em que o facto tipicamente ilícito consiste apenas em não fazer algo a que se estava legalmente obrigado a fazer dentro de determinado prazo (não pagamento da portagem), poder-se-ia entender estar cumprido o requisito legal da decisão de aplicação da coima “descrição sumária dos factos” (artigos 63.º, n.º 1, alínea d), primeira parte e 79.º, n.º 1, alínea b) do RGIT) se nesta fosse indicado corretamente qual o dever omitido e qual o momento (o termo do prazo) em que tal dever devia ter sido cumprido. Ora, repete-se, na descrição sumária dos factos não se encontra indicado qual o dever omitido, por forma a ser possível analisar se foi correta a subsunção dos factos descritos às normas infringidas e punitivas consideradas e aplicadas. Desta feita, confrontado o conteúdo da decisão recorrida, e perante a insuficiência da descrição apontada, não se logra outrossim atingir o iter lógico e valorativo trilhado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Portimão no processo de formação da sua decisão condenatória. (…) Assim sendo, resulta do exposto que não pode ter-se como adequadamente cumprido, na decisão de aplicação da coima, o requisito da descrição sumária dos factos a que alude a alínea b) do n.º 1 do artigo 79.º do RGIT, enfermando, assim, da nulidade insuprível prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º do mesmo diploma legal. E por ser nula a decisão recorrida, devem também anular-se os termos subsequentes do processo, nos termos do n.° 3 deste último preceito.» Não se conformando com o assim decidido vem a Fazenda Pública alegar que a decisão de aplicação da coima, que consta da alínea B) do probatório, respeita todos os requisitos discriminados no art.º 79.º, n.º1 do RGIT, defendendo que a mesma não é nula, sendo que a descrição dos factos é sintética e simples dada a própria natureza dos factos tipificados, e suficiente para permitir à Recorrida aperceber-se claramente dos factos que lhe são imputados. Por seu turno, a EMMP junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé e a EMMP junto deste Tribunal sufragam que o recurso apresentado não merece provimento, devendo ser mantida a sentença em dissídio. Apreciemos. Adiantando, desde já, a nossa posição, entendemos que não tem razão a Recorrente. Vejamos, então, porquê. O art.º 79.º do RGIT, sob a epígrafe «Requisitos da decisão que aplica a coima» consagra o seguinte: «1 - A decisão que aplica a coima contém: a) A identificação do infrator e eventuais comparticipantes; b) A descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas; c) A coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação; d) A indicação de que vigora o princípio da proibição da reformatio in pejus, sem prejuízo da possibilidade de agravamento da coima, sempre que a situação económica e financeira do infrator tiver entretanto melhorado de forma sensível; e) A indicação do destino das mercadorias apreendidas; f) A condenação em custas. 2 - A notificação da decisão que aplicou a coima contém, além dos termos da decisão e do montante das custas, a advertência expressa de que, no prazo de 30 dias, o infrator deve efetuar o pagamento ou recorrer judicialmente, sob pena de se proceder à sua cobrança coerciva. 3 - A notificação referida no número anterior é sempre da competência do serviço tributário referido no artigo 67.º». E o art.º 63.º do mesmo diploma estabelece o seguinte: «1 - Constituem nulidades insupríveis no processo de contraordenação tributário: a) O levantamento do auto de notícia por funcionário sem competência; b) A falta de assinatura do autuante e de menção de algum elemento essencial da infração; c) A falta de notificação do despacho para audição e apresentação de defesa; d) A falta dos requisitos legais da decisão de aplicação das coimas, incluindo a notificação do arguido. 2 - Não constitui nulidade o facto de o auto ser levantado contra um só agente e se verificar, no decurso do processo, que outra ou outras pessoas participaram na contraordenação ou por ela respondem. 3 - As nulidades dos atos referidos no n.º 1 têm por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente, devendo, porém, aproveitar-se as peças úteis ao apuramento dos factos. 4 - Verificadas as nulidades constantes das alíneas a) e b) do n.º 1, o auto de notícia vale como participação. 5 - As nulidades mencionadas são de conhecimento oficioso e podem ser arguidas até a decisão se tornar definitiva.». Aqui chegados, regressemos, então, ao caso que nos ocupa. Tal como acima já se apontou, a sentença recorrida entendeu, em conformidade com os factos assentes, que a notificação da decisão de aplicação da coima era nula face ao disposto na alínea d) do n.º 1 do art.º 63.º e da alínea b) do n.º1 do art.º 79.º, ambos do RGIT, tendo considerado que a decisão de aplicação da coima não continha na descrição sumária dos factos menção a um «comportamento específico e concreto imputado à ora Recorrente, subsumível à norma infringida e punitiva feita constar da decisão de fixação da coima.». No entanto, não podemos acompanhar o julgado neste conspecto pelo Tribunal a quo. É que da decisão de aplicação da coima em dissídio consta na descrição sumária dos factos, além do mais, o valor da coima aplicada e das custas, os factos imputados descritos de forma discriminada, assim como a norma infringida e a norma sancionatória, e ainda o prazo do pagamento e a possibilidade de recurso judicial, bem como da proibição da «reformatio in pejus» e por fim que o não pagamento implica a execução coerciva da dívida [cf. pontos B. e C) do probatório]. No essencial, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo («STA») tem acolhido o entendimento da doutrina de que a «descrição sumária dos factos» imposta pela alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT e, bem assim, os demais requisitos da decisão de aplicação da coima enumerados nesse número «devem ser entendidos como visando assegurar ao arguido a possibilidade de exercício efetivo dos seus direitos de defesa, que só poderá existir com um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão» (cf. Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 2010, 4.ª edição, anotação 1 ao art. 79.º, pág. 517 e o acórdão do STA de 20/03/2019, processo n.º 02226/16.6BEPRT, disponível em www.dgsi.pt). No que respeita à «descrição sumária dos factos», há que sublinhar que este requisito da decisão administrativa de aplicação da coima constante da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do art.º 79.º do RGIT, «tem de ser interpretado em correlação necessária com o tipo legal no qual se prevê e pune a infração imputada ao arguido, pelo que os factos que importa descrever sumariamente na decisão de aplicação da coima não são senão os factos essenciais que integram o tipo de ilícito em causa». (cf. acórdão do STA de 03/02/2021, proc. 0656/19.0BEPNF, consultável em www.dgsi.pt). Cumpre ainda assinalar que quanto ao cumprimento do requisito em apreço da decisão de aplicação da coima, o STA, em acórdão de 07/04/2021, proc. n.º 0319/19.7BEMDL, disponível em www.dgsi.pt, afirmou de forma lapidar que «esta exigência se há-de considerar satisfeita quando (…) o elemento essencial do tipo - a falta de pagamento da taxa de portagem pela circulação de veículo automóvel em infra-estruturas rodoviárias está descrito na decisão administrativa, não apenas por referência à norma que prevê a contra-ordenação, o que não seria suficiente, mas mediante a descrição detalhada do comportamento - falta de pagamento de taxas de portagem no que concerne ao veículo identificado pela respectiva matrícula e com referência aos trajectos expressamente indicados, com indicação dos locais, datas e horas a que se verificaram as infracções e aos montantes das respectivas taxas». E é precisamente este o caso dos autos, pois do teor da «descrição sumária dos factos» ínsita na decisão de aplicação da coima sub judice resulta suficientemente evidenciada a enunciação do comportamento que integra o tipo de contraordenação em causa: não pagamento de taxas de portagem relativamente ao veículo identificado pela respetiva matrícula e com referência aos trajetos expressamente apontados, com menção dos locais, datas e horas a que se verificaram as infrações e aos montantes das respetivas taxas [cf. pontos B) e C) dos factos assentes]. Pelo que, e na esteira do já decidido por este Tribunal no acórdão proferido em 03/04/2025, no processo n.º 354/24.3BELLE, também disponível em www.dgsi.pt, decorre, portanto, do teor da decisão de aplicação da coima transcrita na alínea B) do probatório que se mostra cumprido o disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 79.º no que se refere à «descrição sumária dos factos». No entanto, esta conclusão não permite, por si, que se conclua pela procedência do recurso jurisdicional apresentado pela Recorrente, porquanto a decisão de aplicação da coima em dissídio viola o disposto na alínea c) do n.º1 do art.º 79.º do RGIT, a saber, não contém a indicação dos elementos que contribuíram para a fixação da coima. Senão vejamos. Sobre esta matéria, com as mesmas partes e relativamente à mesma questão, foi já proferido acórdão neste TCAS, em 03/04/2025, no âmbito do processo n.º 354/24.3BELLE, do qual nos permitimos transcrever o seguinte, cujo teor acompanhamos na íntegra e sem reserva: «A decisão de aplicação da coima, tal como resulta do transcrito art. 76º do RGIT, deve conter, designadamente, e nos termos da alínea c) do nº 1 “a coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação” (sublinhado nosso) Por um lado, na decisão de aplicação da coima enunciada na alínea E) do probatório consta a propósito da “medida da coima” o seguinte: não permitindo à arguida saber quanto à fundamentação da concreta definição da coima aplicada, que fatores previstos no art. 27º do RGIT foram ponderados na determinação da coima. O art 27º do RGIT consagra o seguinte: “1 - Sem prejuízo dos limites máximos fixados no artigo anterior, a coima deverá ser graduada em função da gravidade do facto, da culpa do agente, da sua situação económica e, sempre que possível, exceder o benefício económico que o agente retirou da prática da contraordenação. 2 - Se a contraordenação consistir na omissão da prática de um ato devido, a coima deverá ser graduada em função do tempo decorrido desde a data em que o facto devia ter sido praticado. 3 – (…) 4- (…)”. Por outro lado foi aplicada a coima única no montante de € 1.867,64, relativamente às infrações praticadas, sem que se encontre evidenciado o apuramento das coimas parcelares. Como se enuncia no Acórdão do STA de 13/07/2023 – proc. 0819/21.9BEAVR “I- Na fixação de cada coima parcelar, é essencial que a decisão administrativa contenha elementos suficientes que permitam à arguida perceber como foi determinada a coima, uma vez que há a necessidade de ter em consideração diversas variáveis no seu cálculo, o que conflitua com o exercício efectivo do direito de defesa, configurando essa omissão a nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 63º, com referência à alínea c) do nº 1 do artigo 79º, ambos do RGIT. II - Na expressão “elementos que contribuem para a sua fixação” [da coima] cabem a moldura abstracta e as circunstâncias agravantes ou atenuantes que operam na determinação dos seus limites mínimo e máximo, operação que integra a primeira fase da determinação da medida da coima, sendo que não faz sentido exigir a indicação dos elementos que contribuem para a fixação da medida concreta da coima e não exigir a indicação dos elementos relativos à determinação na medida legal ou abstracta, em especial nos casos em que estes elementos sejam variáveis. III - Além disso, a finalidade da norma é assegurar o efectivo exercício do direito de defesa (que a Constituição garante no artigo 32º nº 10 da CRP), o que só é verdadeiramente possível acedendo às molduras abstractas parcelares, em particular nas situações de cúmulo.”. Na verdade, tal como se sublinha no Acórdão do STA de 28/10/2020- rec. 01959/17.4BEBRG, “… em concurso e cúmulo material, de uma coima única, impõe-se a especificação e discriminação das coimas parcelares aplicadas a cada uma das infracções imputadas à arguida, com a menção da moldura mínima e máxima, como se deixou exarado na decisão recorrida, uma vez que esta é de montante variável e calculada em razão do valor das taxas de portagem correspondentes às utilizações das infraestruturas rodoviárias feitas em períodos diários por cada veículo interveniente (nº4 e 5 do artigo 7º da Lei nº 25/2006), e não ser por esse motivo de fácil apreensão, (…) o que significa que se mostra essencial que na fixação de cada coima parcelar a decisão administrativa contenha elementos suficientes que permitam à arguida perceber como foi determinada a coima, uma vez que no caso concreto, ainda que a mesma corresponda ao limite mínimo, há necessidade de ter em consideração diversas variáveis no seu cálculo.” Face ao exposto podemos concluir que in casu a decisão de aplicação da coima não indica os elementos necessários para que a arguida possa conhecer como foi determinada a medida das coimas que lhe foram fixadas, bem como da fixação da coima única, ficando claro que tal omissão põe em causa o seu direito de defesa, o que constitui nulidade insuprível, nulidade essa que terá por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que dependam absolutamente da decisão de aplicação de coima que padece de tal nulidade, incluindo a notificação da decisão. Por tudo o que vem exposto decide-se negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida, embora com a presente fundamentação, declarando-se a nulidade da decisão de aplicação da coima por violação da alínea c) do art. 79º conjugada com a alínea d) do nº 1 do art. 63º, ambos do RGIT, e determina-se a baixa do processo à autoridade administrativa para eventual renovação sancionatória, se a tal nada mais obstar.» Acolhemos, pois, o entendimento vertido no acórdão transcrito, sem necessidade de outras considerações, para evitar repetições, e concluímos também que não merece provimento o recurso jurisdicional apresentado, mantendo a sentença recorrida na ordem jurídica nos termos acima indicados, declarando-se a nulidade da decisão de aplicação da coima por violação da alínea c) do art.º 79.º, conjugada com a alínea d) do n.º 1 do art.º 63.º, ambos do RGIT, e determina-se a baixa do processo à autoridade administrativa para eventual renovação sancionatória, se a tal nada mais obstar * Nos termos expostos, acordam os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, manter a sentença recorrida, com a presente fundamentação, declarando-se a nulidade da decisão de aplicação da coima e, consequentemente, determina-se a baixa do processo à autoridade administrativa para efeitos de eventual renovação do ato sancionatório, se a tal nada mais obstar. Sem custas. Registe e notifique. Lisboa, 30 de abril de 2025 (Filipe Carvalho das Neves) (Luísa Soares) (Susana Barreto) |