Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 815/10.1BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 12/12/2023 |
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Relator: | FREDERICO MACEDO BRANCO |
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Descritores: | CESSAÇÃO DE SUBSÍDIOS CRECHE; EXÉRCITO PORTUGUÊS; SUBSIDIO DE REFEIÇÃO |
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Sumário: | I – O subsídio de refeição é um subsídio diário que tem a natureza de benefício social a conceder pelo empregador público como comparticipação nas despesas resultantes de uma refeição tomada fora da residência habitual, nos dias de prestação efetiva de trabalho, em face do que, sendo a correspondente refeição satisfeita em espécie, perde objeto a atribuição do referido subsidio diário II - É incontornável o estatuído no Artº 6º do DL n.º 57-B/84, de 20 de Fevereiro, com a redação introduzida pelo Dec. Lei n.º 70-A/2000, de 5 de Maio quando refere que “Não é permitida a acumulação do subsídio de refeição com qualquer outra prestação de idêntica natureza ou finalidade, independentemente da sua denominação, ainda que atribuída pelo sector público empresarial ou pelo sector privado.” III - É manifesto que o fornecimento da refeição em espécie constitui uma prestação de natureza idêntica àquela que resulta do pagamento remuneratório do subsidio de refeição. Diferente seria a situação se o referido Subsidio fosse atribuído independentemente da prestação de trabalho nos correspondentes dias, situação em que estaria porventura integrado na remuneração. IV - A fixação do subsídio de refeição não visou incrementar a remuneração dos trabalhadores, mas antes compensar os mesmos por não terem universalmente acesso a refeitórios dos serviços, vendo-se forçados a tomar, e a pagar, as suas refeições fora de casa. V - Tendo deixado de existir a necessidade dos trabalhadores suportarem os custos de uma refeição diária, por ser fornecida gratuitamente no refeitório, deixou de fazer sentido a existência da prestação pecuniária correspondente ao subsidio de refeição, em face do que se não verifica qualquer perda de direitos adquiridos, pois que o direito ao subsidio foi substituído pelo idêntico direito à refeição em espécie. VI – Relativamente à supressão dos Subsídios de Creche e de Estudo pago pelas OGME, não pode deixar de se sublinhar que estes subsídios não têm, nem nunca tiveram, natureza remuneratória, antes consistindo num beneficio sem suporte ou vinculação legal, em face do que a sua atribuição não tinha carácter definitivo nem obrigatório, mas mera natureza espontânea, não conferindo quaisquer direitos adquiridos, em face do que sempre poderiam ser unilateralmente suprimidos. |
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Indicações Eventuais: | Subsecção SOCIAL |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório O STEFFAS - Sindicato dos Trabalhadores Civis das Forças Armadas, Estabelecimentos Fabris e Empresas de Defesa, no âmbito da Ação Administrativa Especial, intentada contra o Exército Português/OGME - Oficinas Gerais de Material de Engenharia, em representação dos seus identificados associados, tendente à impugnação da cessações dos pagamentos dos subsídios de alimentação, de creche e de estudo, inconformado com a decisão proferida em 29 de junho de 2020, através da qual foi a Ação julgada totalmente improcedente, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa. Formula o aqui Recorrente/Sindicato nas suas alegações de recurso, apresentadas em 13 de setembro de 2020, as seguintes conclusões: “1- Propôs a recorrente a presente ação dado ser inquestionável ter a entidade ora substituída pelo ora recorrido retirado aos trabalhadores por aquele representados um conjunto de prestações complementares da retribuição base e que vinha pagando aos trabalhadores associados daquele, entre os quais os identificados no processo de forma pacifica, unilateral e continuada, 2- E de tal forma que aqueles as consideravam integrantes da respetiva componente retributiva da prestação e que dado o carácter continuado e não interrompido da sua prestação, tais pagamento, por vias dos usos, integravam o estatuto remuneratório dos trabalhadores representados pelo ora recorrente. 3- Ora estando assente a existência do direito e a legitimidade da parte ora recorrente, conforme resulta da douta decisão recorrida, o que está em causa é saber se é legal a retirada de tais direitos. 4- É que, ainda que se considere que as normas invocadas na douta decisão recorrida definiram um novo quadro retributivo para os trabalhadores representados pelo ora recorrente, cabe ao julgador apreciar e acautelar a tutela daqueles de quem, na melhor da hipóteses, o legislador se não lembrou. 5- É que, dada a natureza e duração do seu pagamento, não podiam aqueles subsídios ser unilateralmente retirados aos trabalhadores que as recebiam ou estavam em condições de os vir a receber, o mesmo se passando com o valor do subsídio o qual, na melhor das hipóteses, deveriam aguardar absorção pelo eventual crescimento da prestação retributiva laboral auferida. 6- Assim não tendo entendido e pelo contrário admitida a retirada das prestações referidas nos autos, sem qualquer compensação, violou a douta decisão recorrida os princípios da confiança e da tutela dos direitos adquiridos acolhidos pelos artigos da Constituição da Republica Portuguesa e também o disposto nas correspondentes normas de direito ordinário contidos nos artigos 129°-1-al.d) do Código de Trabalho, aprovado pela Lei 9/2009, de 9/02 (sector privado) e artigo 89°-al) d) do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei 59/2008, 11 de Setembro Termos em que e nos mais de direito deve ser ao presente recurso dado provimento e, no mesmo passo, revogada a douta decisão recorrida e o R , ora recorrente condenado no pedido como é de Justiça.” A Entidade Recorrida não veio a apresentar Contra-alegações de Recurso. O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 7 de dezembro de 2020, no qual se sustentou a decisão recorrida. O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 5 de janeiro de 2021, nada veio dizer, requerer ou Promover. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento. II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente/Sindicato, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita que a Sentença recorrida terá violado os princípios da confiança e da tutela dos direitos adquiridos acolhidos pela CRP e também o disposto nos artigos 129°-1-al.d) do Código de Trabalho, aprovado pela Lei 9/2009, de 9/02 (sector privado) e artigo 89°-al) d) do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei 59/2008, 11 de Setembro. III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada e não provada: “1. Os representados do Autor trabalham sob a autoridade e direção da Entidade Demandada - cfr. documentos 1 a 9 juntos com a PI; 2. Os representados do Autor são filiados associados do Sindicato, aqui Autor - facto não controvertido; 3. Em 23/01/2007, foi publicado na Ordem de Serviço n.º 4/OGME/23-01-07, o Despacho do Diretor do OGME, nos termos do qual se referia o seguinte: “A partir de 01FEV07, são revogadas as autorizações de abono de alimentação em numerário para todos os funcionários a prestar serviço nas OGME, pelo que desde a mesma data, cessa o respetivo abono. O almoço passa a ser fornecido no refeitório destas oficinas" - cfr. documento 4 junto com a contestação; 4. Em 26/01/2007, deu entrada nos serviços da OGME - Oficinas Gerais de materiais de engenharia, Ofício com a referência 073, emitido pelo Autor, e com o assunto "Subsídio de Refeição", nos termos do qual se referia o seguinte: "Exmo. Senhor Diretor Tendo V. Exa. Anunciado através da Ordem de Serviço n.º 4 de 23/01/07 a intenção de retirar o pagamento do subsídio de refeição, aos trabalhadores que o auferem, por não o utilizarem o refeitório, vimos expor a v. Exa. o seguinte: O referido subsídio está atribuído, há longos anos, a todos os trabalhadores que manifestaram a sua vontade no sentido de o receberem, em vez de o utilizarem o refeitório das OGME, ao passo que não é conferido a quem optou pela tomada de refeições no referido refeitório, direito que usufruem sem qualquer outro encargo. No entanto, embora compreendendo o fim social prosseguido pelos serviços prestados pelo refeitório, não podemos aceitar a retirada do direito ao subsídio de refeição que está a ser pago, tendo em conta o regime legal que lhe está subjacente. De facto, a atribuição do subsídio de refeição decorre da regulamentação prevista no D. 57- B/84, de 20/2, com a redação introduzida pelo art.º 42º do D. Lei 70-A/2000 de 5/5, da qual se conclui que é devido a todos quantos preencham os requisitos aí expressamente contemplados. Ora, confrontada essa legislação e, ainda, as portarias que, anualmente, procedem à atualização dos respetivos montantes, constata-se que nenhum preceito permite que a sua concessão possa ser substituída pelo fornecimento de refeições, ainda quem naturalmente, se entenda que, no caso de o serem, estas tenham de ser pagas, mediante o preço legalmente estipulado. As atuais condições de atribuição do subsídio em causa consubstanciam um direito há longos anos adquirido e que, por isso, esperamos que seja mantido, nos precisos termos em que a regulamentação vigente o confere, como acima o referimos. Neste contexto, solicitamos que V. Exa avalie esta matéria à luz dos princípios legais e regulamentares que a regem e que, por conseguinte, o subsídio de refeição continue a ser atribuído nas precisas condições em que o vem sendo. Nessa expectativa e aguardando a resposta que se dignar facultar-nos, apresentamos os mais respeitosos cumprimentos e subscrevemo-nos" - cfr. documento 1 junto com a contestação; 5. Em 16/02/2007, foi proferido Despacho pelo GEN CEME, nos termos do qual, no que diz respeito aos subsídios de creche escolar, referiu o seguinte: "(...) ao Comando de Logística indicação sobre esta situação e enquadramento legal das ações tomadas. Deve seguir-se o escrupuloso cumprimento da lei e acabar-se com as situações legitimadas pelo costume" - cfr. documento 3 junto com a contestação; 6. Em data não apurada, e na sequência do despacho referido no ponto anterior, o Comandante da Logística, cessou a aprovação dos subsídios de creche e escolar - facto não controvertido. IV – Do Direito Em síntese, está predominantemente em causa na presente Ação a cessação do pagamento aos aqui representados dos subsídios de refeição, creche e de estudo. No que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da decisão recorrida. “(...) DA CESSAÇÃO DO PAGAMENTO DO SUBSÍDIO DE REFEIÇÃO Alega o Autor que, decidiu a Entidade Demandada, unilateralmente, retirar, com efeitos a partir de 1 de fevereiro de 2007, à generalidade dos seus trabalhadores, o subsídio de alimentação que lhe era devido e que estava fixado em € 4,03/dia, valor em vigor, à época, para os trabalhadores da Entidade Demandada, de acordo com os valores fixados para os trabalhadores da função pública, vindo, por exclusiva decisão e iniciativa do Senhor Diretor da ora Entidade Demandada, comunicado pela Ordem de Serviço n°4/OGME/23-0L07, a cessar esse pagamento, remetendo os trabalhadores para o uso do refeitório das Oficinas, decisão sem cobertura ou tutela legal. Por outro lado, alegou a Entidade Demandada que, quanto ao subsídio de refeição, num caso em que a entidade patronal, no próprio refeitório do estabelecimento, fornece gratuitamente aos seus trabalhadores as suas refeições diárias, não será obrigatória a manutenção da atribuição do subsídio de refeição, enquanto prestação pecuniária; Vejamos. O subsídio de refeição instituído pelo DL 305/77, de 29/7, e depois reformulado pelo DL 57-B/87, de 20/02, é atribuído aos servidores do Estado, e tem a "natureza de benefício social a conceder como comparticipação das despesas resultantes de uma refeição tomada fora da residência habitual, nos dias de prestação efetiva de trabalho" (vd. seu preâmbulo). Por ser assim, isto é, por o mesmo se destinar a compensar as despesas com as refeições tomadas fora da residência habitual nos dias em que se presta serviço, o mesmo não será abonado nas situações de faltas e licenças, designadamente de férias, doença, casamento, exercício do direito à greve, cumprimento de penas disciplinares, nem quando a Entidade Patronal forneça aos seus trabalhadores, uma refeição (neste caso o almoço), a título gratuito, podendo estes usufruir da mesma. E também por ser assim "não é permitida a acumulação do subsídio de refeição com qualquer outra prestação de idêntica natureza ou finalidade, independentemente da sua denominação, ainda que atribuída pelo sector público empresarial ou pelo sector privado." (seu art.° 6.°). O que vale por dizer que se (1) o trabalhador está a prestar serviço no seu local de trabalho e se (2) tem direito a frequentar gratuitamente cantina ou refeitório da entidade patronal, este benefício concedido, abarca e satisfaz plenamente a parcela destinada a compensar o custo das refeições pelo que, importa concluir, que nessas circunstâncias, os trabalhadores não têm direito a receber subsídio de refeição pois que, de contrário, estariam a ser reembolsados duas vezes pelo mesmo gasto. É, pois, seguro que, muito embora a refeição disponibilizada e o subsídio de refeição não tenham a mesma espécie, certo é que tais abonos partem do mesmo princípio e têm uma finalidade comum - a de reembolsarem os funcionários da Administração Pública pelas despesas realizadas por causa e em função da prestação do seu serviço - e que tal pode permitir que, em certas situações, haja sobreposição nas despesas abonadas. Por ser assim é que o citado art.° 6.° proíbe que se acumule o pagamento do subsídio de refeição com qualquer outra prestação de idêntica natureza, independentemente da sua denominação ou espécie. Cabe, assim, razão à Entidade Demandada, uma vez que, ambas as prestações têm a mesma natureza e o mesmo propósito, pelo que, não se pode dizer que o subsídio de refeição tenha sido suprimido, mas sim substituído por uma prestação de idêntica natureza, mas paga em espécie. Face ao exposto, não se vislumbra qualquer ilegalidade no ato impugnado, que cessou a atribuição dos subsídios de refeição. DA CESSAÇÃO O PAGAMENTO DOS SUBSÍDIOS DE CRECHE E ESCOLAR Alega o Autor que, a Entidade Demandada, deixou, unilateralmente, de pagar aos seus trabalhadores, que dele beneficiavam, o subsídio de creche e de estudo, sendo tal decisão ilegal. Por seu turno, refere a Entidade Demandada que, os subsídios de creche e de estudo não têm caráter de retribuição, nem tão pouco de direitos adquiridos, pelo que não se encontram sujeitos ao Princípio da irredutibilidade da retribuição, podendo ser unilateralmente alterados. Vejamos. A partir de outubro de 1989, o sistema retributivo da função pública passou a ser apenas composto pela remuneração base, pelas prestações sociais, pelo subsídio de refeição e pelos suplementos (cfr. artigos 15.°, do Decreto-Lei n°. 184/89, de 2 de junho e 3.° a 12.°, do Decreto-lei n.º 353-A/89, de 16 de outubro). Nem os subsídios de creche, nem o escolar, têm cabimento nos referidos preceitos legais, constituindo um acréscimo à remuneração, não se traduzindo numa atuação vinculada da Administração. Assim sendo, e considerando que a remuneração dos funcionários e agentes ao contrário do que sucede com a dos trabalhadores submetidos a um regime de direito privado é fixada por lei, não lhe podendo ser abonadas outras remunerações para além das que nela estão previstas, pelo que, não tinham os associados do Autor direito a auferir os referidos subsídios. Nestes termos, e ainda que se considerasse aplicável aos trabalhadores da Administração Pública o princípio da irredutibilidade da retribuição, aplicável para os trabalhadores do sector privado, cremos que os subsídios em causa não estavam cobertos por essa garantia, por não existir fundamento legal para a sua atribuição nem eles estarem incluídos no conceito de retribuição. Face ao exposto, não se vislumbra qualquer ilegalidade no ato impugnado, que cessou a atribuição dos subsídios de creche e de estudo.” Vejamos: Refira-se desde já que se acompanha o sentido da decisão proferida em 1ª Instância. Do Subsídio de Refeição: O subsídio de refeição é um subsídio diário que tem a natureza de benefício social a conceder pelo empregador público como comparticipação nas despesas resultantes de uma refeição tomada fora da residência habitual, nos dias de prestação efetiva de trabalho, em face do que, sendo a correspondente refeição satisfeita em espécie, perde objeto a atribuição do referido subsidio diário Dispõe sobre a referida matéria o DL n.º 57-B/84, de 20 de Fevereiro, com a redação que lhe foi dada pelo Dec. Lei n.º 70-A/2000, de 5 de Maio. É incontornável o estatuído no Artº 6º do referido diploma, quando, sob a epigrafe de “Proibição de acumulação”, estabelece que “Não é permitida a acumulação do subsídio de refeição com qualquer outra prestação de idêntica natureza ou finalidade, independentemente da sua denominação, ainda que atribuída pelo sector público empresarial ou pelo sector privado. * * * Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo, Subsecção Social, do presente Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento ao Recurso, confirmando-se a Sentença Recorrida. Custas pelo Recorrente, sem prejuízo da isenção conferida pelo artigo 4.° h) do Regulamento das Custas Judiciais. Lisboa, 12 de dezembro de 2023 Frederico de Frias Macedo Branco Rui Pereira Pedro Figueiredo |