Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06092/10
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:07/08/2010
Relator:COELHO DA CUNHA
Descritores: ACÇÃO ADMINISTRATIVA COMUM
ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
UTILIZAÇÃO PROCESSUAL
ARTS. 37º E 38º DO CPTA.
Sumário:I- Nos termos do artigo 37º n.º1 do CPTA “Seguem a forma da acção administrativa comum os processos que tenham por objectos litígios cuja apreciação se inscreve no âmbito da jurisdição administrativa e que nem neste Código, nem em outro sejam objecto de regulação especial”.

II- A acção administrativa comum não pode ser utilizada para obter o efeito que resultaria da anulação do acto impugnável (cfr.artº38º, n.º2 do CPTA).
Aditamento:
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Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no 2- Juízo do TCA -Sul

1- Relatório
A..., residente na Av...., em Lisboa, intentou no TAF de Lisboa, acção administrativa comum, com processo sumário, contra o Instituto de Segurança Social , I.P., pedindo a actualização do seu número total de anos para taxa de formação de pensão de 36 para 40 anos, sendo cinco correspondentes ao serviço militar e 36 anos correspondente a actividade profissional, com o consequente pagamento ao A. do valor que resulta da actualização, com efeitos retroactivos à data do início da pensão, bem como o pagamento de um complemento especial de pensão de 17,5% relativos a cinco anos de serviço militar.
Por saneador-sentença de 05.11.2009, a Mmª Juíza do TAC de Lisboa, julgou procedente a arguida inidoneidade do meio processual, bem como a caducidade da mesma, absolvendo o R. da instância.
Inconformado, o A. interpôs recurso jurisdicional para este TCA-Sul, em cujas alegações enunciou as conclusões seguintes:
1ª A sentença recorrida, absolveu a R. da instância, com fundamento em inidoneidade do meio processual, considerando que deveria ter sido interposta acção administrativa especial e não acção administrativa comum.

2ª Tal decisão é ilegal dado que qualquer deficiência de carácter formal dos articulados é passível de correcção oficiosa ou, quando tal não seja possível, de convite á pane para corrigir os articulados, artg° 88 n°1 e 2 do C.P.T.A.

3ª Por outro lado, o A,, na sua Petição inicial, o A. pretende ver reconhecido o direito a um período de contagem acrescido de tempo de serviço militar e para taxa de formação, para efeitos de pensão de reforma, e ver reconhecido o direito a um complemento especial de pensão de reforma, tratando-se, assim, de factos novos que se reconduzem á condenação da administração ao reconhecimento do preenchimento de condições e à adopção das condutas necessárias ao restabelecimento de direitos, sendo, a acção administrativa comum o meio idóneo para tal, o que pode ser proposto a todo o tempo, artgsº 37nº 2 alínea 3) e d) e 41 n°1 do C.P.T.A.

4ª O que nada tem a ver com a reclamação anterior a que se alude na sentença que, aliás, foi deferida - artg° 27 da contestação.

5ª Consequentemente, a decisão recorrida ao considerar que o meio idóneo adequado era a acção administrativa especial e estava esgotado o prazo para a acção, violou as normas legais supra-citadas.

6ª E, de qualquer modo, só com a publicação e entrada em vigor da lei 3/2009, em 31.12.2008, foi regulamentada a lei 9/2002, verificando-se que a mesma se aplica a todos os beneficiários do sistema previdencial de segurança social, aí se estatuindo, ainda, que os pedidos de contagem para efeitos de atribuição dos benefícios previstos na mesma lei, podem ser apresentados a todo o tempo, artgsº 2 alínea a) e 15 da lei 3/2009.

7ª Tendo, também, a decisão recorrida violado estes preceitos legais, por omissão de aplicação dos mesmos.
O R. não contra-alegou.
A Digna Magistrada do Mº Pº emitiu douto parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir
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2- Matéria de Facto
Para a decisão da causa. Mostram-se pertinente a seguinte factualidade:
a) Em 16.02.2009, o A. intentou a presente acção administrativa comum, sob a forma sumária, contra o Instituto de Segurança Social, I.P., deduzindo os pedidos supra indicados;
b) Na contestação, o R. invocou as excepções da impropriedade do meio processual e da caducidade;
c) Tais excepções foram julgadas procedentes por despacho saneador de 5.11.2009, sendo o R. absolvido da instância;
d) O A. é pensionista por invalidez do regime geral da Segurança Social desde 1.12.2006;
e) Em 23.11.2006 foi deferido ao A. o processo de reforma, tendo o mesmo sido notificado, de que a partir de Dezembro de 2006, iria receber pensão no valor de €2.960, 67 por depósito em conta bancária, e ainda os valores atrasados da pensão desde 9.05.2006 (data da entrada do requerimento de pensão por invalidez).
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3- Direito Aplicável
O despacho recorrido considerou inidóneo o meio processual, dizendo que a causa de pedir, na qual necessariamente se mostram motivados os pedidos cumulados, elenca e elege factos que respeitam à formação do acto de atribuição da pensão por invalidez, de que o ora recorrente é titular, sendo certo que a acção administrativa comum não pode ter por objecto a impugnação de actos administrativos (cfr. artigo 37º,n.º2, alíneas a) a j) do CPTA), já que para tal objecto/litigio o meio processual adequado é o da acção administrativa especial (cfr. artigo 46º,n.º2, alíneas a) a b) do CPTA).
Ora, o recorrente pretende a reavaliação da situação do facto, relevante e definidora do montante da pensão por invalidez, o que deveria ter motivado a adequada impugnação judicial, mediante a interposição da acção administrativa especial.
Com esta fundamentação, o despacho recorrido julgou procedente a arguida inidoneidade do meio processual.
No tocante à caducidade, entendeu o despacho recorrido que a mesma se reporta, necessariamente, à verificação do decurso do prazo legal para a interposição da acção administrativa especial, prazo esse de três meses, como prescreve o artigo 58º,n.º2, alínea b) do CPTA, meio processual idóneo para a impugnação do “quantum” da pensão de invalidez atribuída ao recorrente.
Discordando deste entendimento, o recorrente alega, no essencial, que a decisão proferida é ilegal, dado que qualquer deficiência de carácter formal dos articulados é passível de correcção oficiosa ou, quando tal não seja possível, de convite à parte para corrigir os articulados (artº 88 n.º1 e 2 do CPTA).
Por outro lado, alega ainda o recorrente ter pretendido, na petição inicial, o direito a um período de contagem acrescido de tempo de serviço militar e para a taxa de formação, para efeitos de pensão de reforma, e ver reconhecido o direito a um complemento especial de pensão de reforma, e ver reconhecido o direito a um complemento especial de pensão de reforma, tratando-se, assim, de factos novos que se reconduzem à condenação da Administração ao reconhecimento do preenchimento de condições e à actuação das condutas necessárias ao restabelecimento de direitos, sendo a acção administrativa comum o meio idóneo para tal, e que pode ser proposto a todo o tempo (artigo 37º, n.º2, als. b) e d) e 41º, n.º1 do CPTA (cfr. conclusões 2ª e 3ª) – sublinhado nosso.
Consequentemente, a decisão recorrida, ao considerar que o meio idóneo adequado era a acção administrativa especial e estava esgotado o prazo para a acção, violou as normas supra-citadas.
É esta a questão a apreciar.
Nos termos do artigo 37, n.º1 do CPTA, “Seguem a forma da acção administrativa comum os processos que tenham por objectos litígios cuja apreciação se inscreve no âmbito da jurisdição administrativa e que nem neste Código, nem em outro sejam objecto de regulação especial”. E de acordo com o artigo 38ºnº2, “ Sem prejuízo do disposto no n.º anterior, a acção administrativa comum não pode ser utilizada para obter o efeito que resultaria da anulação do acto impugnável.
Como diz o Ministério Público, a satisfação da pretensão material deduzida na acção implicaria a alteração do conteúdo do acto que fixou o montante da pensão, independentemente de essa alteração resultar ou de factos ou de normas não consideradas naquele acto.
Por outro lado, diz ainda o Ministério Público, “ a eventual reapreciação da situação do recorrente em vista do novo cálculo da sua pensão terá que passar por um procedimento administrativo, no termo do qual deverá ser emitido o acto jurídico da administração, de deferimento ou de indeferimento”.
E assim, não poderia o recorrente obter esse efeito, porque contenderia com os efeitos já fixados por acto administrativo não impugnado e, por isso, só poderá ver redifinida a sua situação através de novo acto administrativo, que constitui prerrogativa de definição prévia por parte da Administração.
Em suma, pode dizer-se que a acção administrativa comum é uma das formas do processo aplicáveis no âmbito do contencioso administrativo, definido por exclusão, tal como resulta do disposto no artigo 37º,n.º1, do CPTA.
Esta forma de processo é, pois aplicada a qualquer das pretensões para as quais o CPTA não estabeleça um modelo específico de tramitação, contrapondo-se, por isso, quer à acção administrativa especial (...) quer às formas do processo urgente (cfr.C.A. Fernandes Cadilha, “Dicionário e Contencioso Administrativo”, Almedina, 2006, p.15 e ss.).
Melhor concretizando, com a presente acção, o A. ora recorrente pretendeu impugnar a legalidade de um acto administrativo constitutivo de direitos, em tempo praticado pelo R., mas o meio próprio para impugnar tal acto teria sido lançar, em tempo oportuno, do recurso contencioso de anulação, hoje acção administrativa especial.
Na verdade, a jurisprudência do Supremo Tribunal, tem vindo a aceitar de modo pacífico, que o acto administrativo que não foi objecto de impugnação contenciosa, consolida-se na ordem jurídica (vide, entre outros, Acs. do STA de 20.01.87, in Ac.Dout. n.º318, p.709; Ac STA de 26.06.07, in Ac.Dout n.º430, p.1113; Ac. do Tribunal Constitucional n.º84/89, de 9.2.99, in B.M.J. n.º484, p.81).
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4- Decisão
Em face do exposto, conclui-se que a decisão recorrida não merece censura, ao julgar procedentes as excepções de inidoneidade do meio processual e de caducidade assim absolvendo o R.
Custas pela recorrente em ambas as instâncias.
Lisboa, 08/07/2010
COELHO DA CUNHA
FONSECA DA PAZ
RUI PEREIRA