Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 781/20.5 BELRA |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 05/19/2022 |
| Relator: | RUI PEREIRA |
| Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL ATRASO NA ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA PRAZO RAZOÁVEL |
| Sumário: | I – De acordo com a lei e a jurisprudência do TEDH, a responsabilidade do Estado por violação do direito a uma decisão judicial em “prazo razoável”, isto é, por demoras excessivas, é “não apenas das próprias «autoridades judiciárias», mas, em geral, das que são consequência da actuação das autoridades competentes com reflexo no processo (aqui se incluindo órgãos do poder legislativo ou executivo e autoridades colaborantes com as autoridades judiciárias). II – Compulsada quer a jurisprudência do TEDH, quer a do STA, é de considerar que um processo decorreu para além do “prazo razoável” quando o mesmo foi decidido para além do momento em que, em circunstâncias normais, deveria ter sido decidido e que esse atraso se ficou a dever ao deficiente e culposo funcionamento da “máquina judicial” (em sentido lato). III – Uma tal apreciação há de ser concreta e global. Concreta, na medida em que sempre haverá que atender às específicas características do processo, como a sua natureza, a sua complexidade, a quantidade de intervenientes, o comportamento das partes, os seus incidentes e ocorrências especiais que possam ter influenciado a marcha do processo. E global, porque, regra geral, deve ter-se em consideração a duração global do processo em causa, e não o que sucedeu em cada uma das suas fases. IV – A ponderação sobre a razoabilidade da duração dum processo não deve ser feita em abstracto, mas sim em função das suas concretas características e circunstâncias. É que um mesmo prazo de duração pode ser razoável para um concreto processo e ser excessivo para outro. V – Numa abordagem em abstracto, um processo de complexidade normal, e sem ocorrências especiais, numa só instância, será adequado o prazo de três anos para a respectiva conclusão, a que haverá que descontar o período de tempo em que o processo esteve a aguardar o impulso das partes ou em que a instância esteve suspensa pela ocorrência duma causa prejudicial. VI – Face às vicissitudes do processo, não se pode considerar desrazoável o prazo de cinco anos e sete meses, nele se incluindo a totalidade do período em que os autos estiveram a aguardar o impulso processual das partes e o período de suspensão da instância, contabilizado em dois anos e onze meses. VII – Se a demora na decisão do processo, porque não excedente do prazo razoável a que aludem o artigo 20º, nº 4 da CRP, o artigo 6º, § 1º da CEDH, o artigo 2º, nº 1 do CPCivil e o artigo 2º, nº 1 do CPTA, se ficou a dever-se a factores externos ao funcionamento dos Tribunais, relacionados com a inércia das partes e com a suspensão da instância, por motivo da existência de causa prejudicial, não contestada, o Estado Português não violou o direito da autora a uma decisão em prazo razoável, ficando deste modo afastada a verificação do pressuposto de ilicitude de actuação do Estado Português, susceptível de o fazer incorrer em responsabilidade civil extracontratual. |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO 1. E..., residente na Rua …., intentou no TAF de Leiria contra o Estado Português uma acção administrativa, tendo em vista a efectivação de responsabilidade civil extracontratual por atraso na justiça. 2. Para fundamentar o pedido, alegou em síntese o seguinte: – Instaurou em 29-6-2016 uma acção de divisão de coisa comum, a correr termos no Juízo de Competência Genérica de Peniche, Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Processo nº 2120/16.0T8LRA, na sequência da morte do seu companheiro, ocorrida em 10-1-2010, e com fundamento em sentença proferida no Processo nº 436/11.1TBPNI, pelo Tribunal Judicial de Peniche – 1º Juízo, a qual reconheceu a sua qualidade de comproprietária de prédio urbano sito em Ferrel, Peniche; – Até à presente data ainda não houve uma sentença no processo nº 2120/16.0T8LRA, estando este ainda em primeira instância e como tal sujeito a recurso; – A autora não consegue usufruir, auferir, retirar dos seus bens qualquer dividendo ou renda enquanto a indivisão do imóvel se mantiver, sendo que do ponto de vista estritamente jurídico, a acção em causa é de manifesta simplicidade, tratando-se de um simples pedido de divisão de coisa comum; – Os tempos de “paragem” do Processo nº 2120/16.0T8LRA são injustos e desproporcionais para a autora e inconcebíveis para um Estado de Direito, Republicano, Democrático, assente na dignidade Humana e inserido na União Europeia, desde 1986; – A autora tem prejuízos enormes com a situação de atraso na aplicação da justiça pelo Tribunal de Peniche, nomeadamente atendendo ao valor de mercado do prédio em causa, sendo que se pudesse arrendar o mesmo lhe daria um lucro anual em rendas de 11.400,00 EUR; – A autora tem uma importante massa patrimonial que não consegue gerir, o que lhe causou a falta de meios de subsistência, tendo sido obrigada a recorrer a apoio económico para subsistir e a pedir dinheiro emprestado; – O atraso e as delongas da justiça causaram danos irreversíveis à autora, nomeadamente danos patrimoniais no valor de 32.000,00 EUR; – A autora sentiu-se, sente-se e continuará a sentir-se frustrada pela ineficácia do sistema judicial na defesa dos seus interesses, pelo que, tem direito a ser compensada pelo atraso significativo da justiça é um dano que a lei e a jurisprudência considera como sendo natural e presumido, como direito a ser ressarcido. 3. A final, pediu a condenação do réu nos seguintes termos: a) Se declare que o Estado Português violou o artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e o artigo 20º, nºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa no seu segmento “direito a uma decisão em prazo razoável”; b) Se condene o réu Estado Português a pagar à autora: I. Uma indemnização por danos patrimoniais no valor de € 32.000,00€ (trinta e dois mil euros) e juros; II. A quantia total de € 29.080,00€ (vinte e nove mil e oitenta euros), e juros desde a notificação, a título de indemnização por danos não patrimoniais pela violação do seu direito a uma Justiça em prazo razoável; III. A quantia de 500,00€ (quinhentos euros) por mês de atraso e juros desde a notificação da presente acção até ao fim do processo; IV. Mais deverá ser o Estado Português condenado nos juros à taxa legal que se vencerem desde a citação até efectivo e integral pagamento; V. O Estado português ser condenado a não receber as quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado. 4. O TAF de Leiria, por sentença datada de 10-2-2022, julgou a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu o Estado Português dos pedidos. 5. Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação para este TCA Sul, tendo concluído a sua alegação nos seguintes termos: “1º - Há nulidade da sentença por violação do dever de análise crítica da documentação junta aos autos. 2º - Do confronto dos “factos não provados” com os documentos constantes dos autos resulta que a recorrente dispõe, por mês da sua reforma e da pensão do falecido companheiro, de 488,55 €, veja-se o IRS de 2019, doc. nº 6 e não tem mais fontes de rendimentos. 3º - É com os 488,55 € que paga a água, luz; gás, telefone, alimentação, produtos de higiene pessoal, roupas; paga o IMI no valor de 105,50 € (cento e cinco euros e cinquenta cêntimos), veja-se doc. nº 16 e gasta o valor médio de 173,93 € (cento e setenta e três euros e noventa e três cêntimos) com medicamentos, veja-se doc. n.º 17 e 18. 4º - É por ter comprovadas graves dificuldades económicas que a autora tem Apoio Judiciário nas modalidades de “Dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo”, veja-se o Ap. Judiciário, e tem dívidas no valor de 45.000,00 € (quarenta e cinco mil euros), veja-se doc. nº 19. 5º - A recorrente tem comprovadamente, doc. nºs 6, 17,18 e 19, graves dificuldades económicas, vivendo a baixo do limiar da pobreza, pelo que devia o facto A) ter sido considerado provado. 6º - Quanto ao facto não provado B): O património da autora tem, para efeitos de valor de mercado, o valor de 257.000,00 EUR”, decidiu a douta sentença que o apartamento T2 com 100 m2, a garagem de 25 m2 e o apartamento T1, não valem, no seu conjunto, o valor de 257.000,00€. 7º - Resulta do Relatório pericial, Engº C...e outros, doc. 7, que o apartamento T2 vale 42.500,00 € e o apartamento T1 vale 23.170,00 € e a garagem vale 4.000,00 €, o que corresponde ao valor total de 69.670,00 € (sessenta e nove mil e seiscentos e setenta euros). 8º - Os docs. 8 a 15 provam que os apartamentos T2 de 100 m2 tem o valor de mercado de 150.00,00 € (cento e cinquenta mil euros), veja-se docs. nºs 13, 14 e 15; os apartamentos T1 de 50 m2 tem um valor médio de mercado de 110.000,00 € (cento e dez mil euros), veja-se docs. nºs 9, 11 e 12; e as garagens de 25 m2 o valor médio de 17.00,00 €, veja-se docs. nºs 8 e 10. 9º - Para efeitos de valor de mercado os 3 (três) imóveis da recorrente: 1 (um) apartamento T1, de 50 m2, 1 (um) apartamento T2, de 100 m2 e 1 (uma) garagem, de 25 m2, ascendem ao valor médio de mercado de 257.000,00 €, mas erradamente a douta sentença refere-se a um único imóvel ou o imóvel, singular, quando de facto, a recorrente tem 3 (três) imóveis que estão em causa, veja-se pág. 19 “in fine” e 20, início. 10º - A douta sentença afirma que, pág. 20: “Desde logo, quanto ao alegado valor do imóvel, o mesmo não tem sequer respaldo no relatório pericial produzido no âmbito do Proc. nº 2120/16.0T8LRA.” o que vai contra o próprio relatório pericial, doc. 7, subscrito por Engº C...e outros, que refere: apartamento T2 vale 42.500,00€ e o apartamento T1 vale 23.170,00€ e a garagem vale 4.000,00€, o que corresponde ao valor total de 69.670,00€ (sessenta e nove mil e seiscentos e setenta euros). 11º - E ainda, pág. 20: “(…) ao que acresce que se desconhecem as concretas características dos imóveis a que se referem os docs. nºs 8 a 15 juntos com a petição inicial, de tal modo que fica inviabilizada qualquer comparação com o imóvel dos autos.”, o que é incorrecto, porque nos docs. 8 a 15 e o Relatório Pericial constam justamente a características dos imóveis: áreas, localização, tipologia, valores, etc. 12º - Quanto ao facto não provado D. “A impossibilidade de gestão do imóvel objecto dos autos causou à autora falta de meios de subsistência, tendo sido obrigada a recorrer a apoio económico para subsistir e a pedir dinheiro emprestado;” a douta sentença, com todo o respeito, não relevou os documentos, isto porque a recorrente dispõe, por mês, da sua reforma e da pensão do falecido companheiro, do valor de 488,55 €, veja-se o IRS de 2019, doc. nº 6 e não tem mais fontes de rendimentos. 13º - É com os 488,55 € que paga a água, luz; gás, telefone, alimentação, produtos de higiene pessoal, roupas; paga o IMI no valor de 105,50 € (cento e cinco euros e cinquenta cêntimos), veja-se doc. nº 16, e gasta o valor médio de 173,93 € (cento e setenta e três euros e noventa e três cêntimos) com medicamentos, veja-se docs. nºs 17 e 18. 14º - É por ter comprovadas graves dificuldades económicas que a autora tem Apoio Judiciário nas modalidades de “Dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo”, veja-se o Ap. Judiciário, e tem dívidas no valor de 45.000,00€ (quarenta e cinco mil euros), veja-se doc. nº 19. 15º - A douta sentença do tribunal a quo, págs. nºs 21 a 39, decidiu que não há violação do direito a uma decisão em prazo razoável, omitindo que o processo já corre termos no douto tribunal há quase 7 (sete) anos. 16º - E decidiu que a culpa do atraso no processo não é do douto tribunal ou do aqui recorrido, o que não corresponde à verdade, desde já se demonstra incorrecto o argumento de que: “Ou seja, constata-se que, pelo menos desde 09.01.2019 (i.e., 2 anos, 6 meses e 10 dias após o início do processo de divisão de coisa comum aqui em análise), o desenvolvimento do processo tem estado subtraído da actuação do Tribunal, antes dependendo de impulso das partes”, porém a determinação da suspensão do processo foi iniciativa do tribunal a quo, devido à sua incapacidade de decidir e de agir e essa suspensão não foi requerida por nenhuma das partes, aliás muito pelo contrário, já foram feitos requerimentos aos autos para que o mesmo deixasse de estar suspenso, mas o tribunal não o entendeu, permanecendo na sua incapacidade de decidir. 17º - Os 2 anos, 6 meses e 10 dias referidos correm por conta e ónus do próprio douto tribunal a quo, o qual é incapaz de se pronunciar e produzir uma sentença, o que nos reporta para a sua culpa, ilicitude, e efectivo o atraso na aplicação da justiça. 18º - Com todo o respeito, o incumprimento dos prazos não se deve às partes, mas sim ao réu – recorrido –, sendo que processo ainda está em curso, não tendo sequer conhecido a sentença da primeira instância, pelo que os quase 7 (sete) anos em primeira instância são desproporcionais e desadequados face aos acontecimentos factuais ao logo do processo, pois que o prazo, considerado pela jurisprudência como aceitável em primeira instância, é de 3 (três) anos. 19º - A duração da tramitação do Proc. nº 2120/16.0T8LRA viola o direito da recorrente a uma decisão em prazo razoável, sendo que “o atraso na decisão de processos judiciais, quando viola o direito a uma decisão em prazo razoável, é um facto ilícito, gerador de responsabilidade civil do Estado.” – cfr. Ac. do TAC Sul, de 31 de Janeiro de 2018, proferido no Proc. nº 1444/12.0BELSB. 20º - O facto de o processo se encontrar sem sentença há quase 7 (sete) anos deve esse facto ser imputado ao Estado, é manifesto que tal prazo supera a duração razoável de 3 anos em primeira instância, pelo que é de concluir que a tramitação do aludido processo viola o direito da recorrente a uma decisão em prazo razoável, nos termos do artigo 12º da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, artigo 20º, nºs 1 e 4 da CRP e artigo 6º, nº 1 da CEDH, encontrando-se assim, preenchido o requisito do facto ilícito. 21º - O recorrido deve ser responsabilizado pelo atraso na justiça e por isso ser condenado”. 6. O Estado Português contra-alegou, tendo concluído nos seguintes termos: “1 – A recorrente interpôs recurso da sentença de 10-2-2022 que julgou totalmente improcedente a acção que tinha em vista a efectivação da responsabilidade civil extracontratual por atraso da justiça no processo nº 2120/16.0T8LRA. 2 – Diga-se, antes de mais, que a responsabilidade extracontratual de actos públicos por factos ilícitos, firma-se nos pressupostos de responsabilidade civil previstos nos artigos 483º e segs. do Código Civil, doravante CC, de verificação cumulativa que a sua concretização depende, além da prática de um a facto (ou sua omissão) e do dano, da ilicitude daquele, da culpa do agente e do nexo de causalidade entre o facto e o dano (vd. acórdãos do STA, de 27-5-2004, proferido no processo nº 1234/02, e de 9-2-2005, proferido no processo nº 01348/02, ambos disponíveis em www.dgsi.pt). 3 – Para efeito de verificação do requisito ilicitude, não basta “alegar a demora excessiva de um processo, para se concluir pela sua ilicitude. 4 – Na realidade, antes importa verificar – como se evidencia das decisões do Supremo Tribunal Administrativo (STA) e do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) sobre esta matéria –, se os casos sub judice, analisando-os detalhada e pormenorizadamente, estiveram indevidamente parados sem motivo justificado e em períodos de tempo excessivo por culpa da máquina da justiça” (citação do acórdão do TCAS, de 6-1-2022, proferido no processo nº 2078/18.1BELSB, disponível em www.dgsi.pt;). 5 – Daí que, não seja suficiente a mera pendência do processo durante “quase 7 anos”, como alude a recorrente nas conclusões (que assim a contabiliza agora nas conclusões 15º, 18º e 20º), para que o Estado Português seja condenado. 6 – Para condenar-se o Estado Português, no caso dos autos, impunha-se que se verificasse atraso e este lhe fosse imputável, o que, no caso dos autos não se verifica como detalhada, pormenorizada e fundamentadamente a MMª Juiz decidiu. 7 – Neste conspecto, a sentença é clara, congruente e suficiente e mostra-se plenamente sustentada na matéria de facto dada como provada, sem quaisquer contradições ou imprecisões. 8 – Matéria de facto dada como provada que a recorrente não impugnou, em algum aspecto, nem requereu a sua alteração, deverá a mesma manter-se incólume. 9 – Ora, dos autos nº 2120/16.0T8LRA resulta que, pelo menos desde 9-1-2019, os mesmos se encontravam “subtraídos à esfera de actuação do Tribunal já que desde essa data as partes se encontravam a diligenciar pelo cumprimento dos procedimentos indicados no relatório pericial em vista da legalização do prédio a dividir e sem o que o mesmo era indivisível”. 10 – Diligências essas prévias e necessárias à divisão do prédio urbano (composto por casa de habitação, de rés-do-chão e 1º andar, com quatro apartamentos para habitação e duas garagens, sito na Rua de …., freguesia de Ferrel, concelho de Peniche, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …º, omisso na Conservatória do Registo Predial), que as partes naqueles autos (nº 2120/16.0T8LRA) não encetaram. 11 – A isto acresce que, desde 30-1-2020 (não tendo as partes procedido até então às diligências prévias necessárias à divisão do prédio), os autos (nº 2120/16.0T8LRA) se encontram suspensos em virtude da existência de uma causa prejudicial, ou seja, por se encontrar pendente o processo de inventário nº 140/13.6TBPNI, no âmbito do qual podia ser definida a titularidade da propriedade sobre aquele prédio urbano, através do sorteio dos lotes e da subsequente adjudicação, com as necessárias implicações na titularidade concreta do prédio objecto da acção de divisão (nº 2120/16.0T8LRA), razão pela qual esta deveria aguardar pela partilha da herança objecto do processo de inventário. 12 – Daí que o Tribunal a quo tenha concluído que “a tramitação processual do Proc. nº 2120/16.0T8LRA apenas esteve sob a alçada do Tribunal durante 2 anos, 6 meses e 10 dias, sendo apenas esse período que lhe é imputável”, e sendo o prazo razoável, em média, de 3 anos em 1ª instância, a duração daquela tramitação não foi ultrapassada pelo Tribunal. 13 – Sem olvidar que, nos presentes autos, não foram alegados quaisquer atrasos respeitantes ao processo de inventário nº 140/13.6TBPNI. 14 – Assim, não se mostrando ultrapassada a duração do referido processo por factos imputáveis ao recorrido Estado Português, bem andou a sentença sob recurso ao considerar não ter sido violado o direito da autora, ora recorrente, a uma decisão em prazo razoável e, por não se encontrar preenchido este pressuposto da ilicitude, julgou totalmente improcedente os pedidos indemnizatórios deduzidos pela autora. 14 – Acresce que, dos documentos juntos pela recorrente, só por si, não podia a sentença sob recurso, como não o fez, extrapolar e, sem mais, extrair e considerar provados factos que os mesmos não comprovavam. 15 – Isto porque os documentos não são factos, mas meros meios de prova de factos (alegados e controvertidos). 16 – Assim, atenta a fundamentação da matéria de facto não provada vertida na sentença sob recurso, por um lado os factos dados como não provados foram assim considerados por circunstâncias imputáveis à recorrente, por não ter indicado prova testemunhal e não ter articulado factos concretos e, por outro, por dos documentos já referidos não poder extrair, sem mais, os factos que a recorrente considera e como entende nas conclusões 2ª a 14ª. 17 – Daí que, apenas podia, como bem o fez, dar como provados os factos que os mesmos comprovavam. 18 – A sentença sob recurso é clara, congruente e suficiente, mostrando-se plenamente sustentada na matéria de facto dada como provada, sem quaisquer contradições ou imprecisões. 19 – Pelo que, nenhuma censura nos merece a sentença recorrida, não padecendo, por isso, da nulidade do artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC, que na motivação de recurso, a recorrente aponta, à sentença. 20 – No caso dos autos, a MMº Juiz analisou e decidiu as questões que interessavam à correcta decisão do litígio, enunciando claramente, a sentença sob recurso, os fundamentos de facto provados que servem de suporte à aplicação do direito, ou seja, enuncia também os fundamentos de direito que justificam a decisão que proferiu. 21 – Não assistindo, por isso, razão à recorrente, não estando a sentença recorrida ferida das invocadas nulidades, quer nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea c), quer da alínea d) do CPC. 22 – Donde, nenhuma censura nos merece a sentença recorrida, devendo a mesma ser mantida”. 7. Colhidos os vistos legais aos Exmºs Juízes Adjuntos, vêm os autos à conferência para julgamento. II. OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR 8. Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nºs 1, 2 e 3, todos do CPCivil, “ex vi” artigo 140º do CPTA, não sendo lícito a este TCA Sul conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso. 9. E, tendo em conta as conclusões do recurso, são as seguintes as questões a apreciar por este TCA Sul: a) Nulidade da sentença por violação do dever de análise crítica da documentação junta aos autos, nomeadamente no que respeita aos rendimentos auferidos pela recorrente e no tocante ao valor dos imóveis em causa no processo que deu origem ao atraso, bem como aos demais factos dados como não provados (conclusões 1ª a 14ª da alegação da recorrente); e, b) Erro de julgamento da sentença, por ter decidido que não ocorria violação do direito a uma decisão em prazo razoável, omitindo que o processo já corria termos no tribunal há quase 7 (sete) anos, sem decisão (conclusões 15ª a 21ª da alegação da recorrente). III. FUNDAMENTAÇÃO A – DE FACTO 10. A sentença recorrida considerou assente a seguinte factualidade: 1) Em 29-6-2016, a aqui autora instaurou acção de divisão de coisa comum no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Leiria – Instância Central – Secção Cível, ao qual foi atribuído o nº 2120/16.0T8LRA – doc. nº 1 junto com a petição inicial, para o qual se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido; 2) A acção a que se refere o ponto anterior foi instaurada contra C…., P… e M…, extraindo-se da petição inicial, para além do mais, o seguinte: “(…) 1º A A. é mãe dos três RR., não tendo sido casada com o pai destes C...(Doc. nº 1, 2 e 3).2º Com quem coabitou em união de facto desde 1967 e até ao óbito deste ocorrido em 10.01.2010 (Doc. nº 4)3º Por douta sentença já transitada em julgado, proferida nos autos de Proc. nº 436/11.1TBPNI, que correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial de Peniche, foram os RR. e a herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de C…, condenados a reconhecer que a ora A. “(...) é comproprietária na proporção de metade do prédio urbano composto por casa de habitação, de rés-do-chão e 1º andar, com quatro apartamentos para habitação e duas garagens, sito na Rua de …., freguesia de Ferrel, concelho de Peniche, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …, omisso na Conservatória do Registo Predial.” (Doc. nº 5).4º Quer isto dizer que o supra descrito imóvel pertence à A. e aos RR. na proporção de metade indivisa para aquela e a restante metade para estes. (Docs. nºs 6 e 7).5º Trata-se, pois, de um bem indiviso.6º O imóvel em causa possui quatro apartamentos destinados a habitação e duas garagens, constituindo espaços autónomos entre si, com entradas independentes,7º Pelo que o mesmo é divisível, devendo para tanto constituir-se o imóvel em propriedade horizontal.8º Porém, os dois primeiros RR. opõem-se a tal, pelo que não é possível ultimar a divisão.(…) Nestes termos e nos melhores de direito, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada e em consequência serem citados os RR. nos termos do nº 1 do artigo 926º do CPC, para querendo contestarem os autos, seguindo-se os demais termos até final. (…)” – doc. nº 1 junto com a petição inicial, para o qual se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido; 3) Por decisão de 4-7-2016, a Secção Cível da Instância Central de Leiria declarou-se incompetente para julgar a causa, por ser competente para o efeito a secção da instância local de Peniche – fls. 24 a 27 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 4) Em 13-9-2016, os autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA foram remetidos à Instância Local de Peniche – fls. 31 a 34 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 5) Os ofícios de citação dos requeridos naqueles autos foram remetidos em 21-9-2016 – fls. 36 a 40 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 6) Em 3-10-2016 foi junto aos autos comprovativo de requerimento de apoio judiciário pelo requerido M… – fls. 42 a 46 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 7) Em 4-10-2016 foi junto aos autos comprovativo de requerimento de apoio judiciário pelo requerido P…, nomeadamente na modalidade de nomeação e pagamento da compensação de patrono – fls. 47 a 51 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 8) Em 29-11-2016 foi junto aos autos ofício de nomeação de patrono ao requerido P… – fls. 94 a 95 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 9) Em 13-1-2017 foi apresentada contestação por P… – fls. 100 a 108 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 10) Em 25-1-2017, a autora apresentou resposta à contestação a que se refere o ponto anterior – fls. 110 a 115 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 11) Em 20-2-2017 foi aberta conclusão, tendo sido proferido despacho em 21-2-2017 pelo qual foi determinado que se procedesse ao registo da acção, bem como se notificasse a autora para juntar aos autos certidão da Conservatória do Registo Predial comprovativa da inscrição do ½ do prédio em seu nome e se oficiasse o ISS para informar se já havia sido proferida decisão sobre o pedido de apoio judiciário formulado pelo requerido M… – fls. 118 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 12) Em 10-3-2017 foi junto aos autos ofício da Conservatória do registo Civil e Predial de Peniche, relativo ao despacho de qualificação do registo da acção – fls. 130 a 131 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 13) Em 10-4-2017 foi junta aos autos a decisão relativa ao pedido de apoio judiciário do requerido M…. – fls. 137 a 139 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 14) Em 4-5-2017 foi aberta conclusão, tendo sido proferido despacho em 5-5-2017, a renovar o despacho proferido em 21-2-2017, na parte relativa à junção aos autos de certidão pela Autora – fls. 140 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 15) Em 23-5-2017, a autora procedeu à junção aos autos da Certidão da Conservatória do Registo Predial de Peniche comprovativa da inscrição de metade do prédio a favor da ora requerente – fls. 148 a 154 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 16) Em 26-5-2017, 8-6-2017 e 16-6-2017 foram proferidos despachos em vista da obtenção de informação, apresentação para consulta e emissão de certidão de documentos constantes do processo de inventário correspondente ao Proc. nº 140/13.6TBPNI – fls. 155 a 168 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 17) Em 26-6-2017 foi aberta conclusão, tendo sido proferido despacho em 28-6-2017, pelo qual se analisaram e decidiram os argumentos constantes da contestação do requerido P…. e se determinou a notificação das partes para indicarem os respectivos peritos, com a cominação de que nenhuma o fazendo, a perícia destinada à formação dos quinhões será realizada por um único perito designado pelo tribunal – fls. 169 a 172 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 18) Em 4-7-2017, a aqui autora apresentou requerimento, requerendo a solicitação de passagem de certidão dos relatórios periciais juntos aos autos de Proc. nº 140/13.6TBPNI em 8-4-2016 (Relatório) e 11-7-2016 (Adenda ao Relatório) e a sua junção aos presentes autos – fls. 176 a 179 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 19) Em 6-9-2017 foi aberta conclusão e proferido despacho em 10-9-2017, o qual determinou que: solicite aos autos mencionados no requerimento em referência (o mencionado no ponto anterior), as certidões a que ali se aludem – fls. 186 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 20) Em 27-9-2017 foram juntas aos autos as certidões a que se referem o ponto anterior – fls. 188 a 247 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 21) Em 3-10-2017 foi aberta conclusão, tendo sido proferido despacho em 4-10-2017, pelo qual se determinou a notificação das certidões às partes – fls. 249 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 22) Em 4-5-2018 foi aberta conclusão, tendo sido proferido despacho em 4-5-2018, pelo qual foi determinado que: notifique as partes para, no prazo de 10 dias virem indicar os respectivos peritos, nos termos já anteriormente determinados – fls. 254 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 23) As partes apresentaram respostas ao despacho a que se refere o ponto anterior em 10-5-2018, 11-5-2018 e 21-5-2018 – fls. 258 a 263 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 24) Em 28-5-2018 foi aberta conclusão e proferido despacho, pelo qual foram nomeados os peritos – fls. 264 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 25) Em 20-7-2018 foi apresentado, pelos peritos, pedido de prorrogação de prazo de entrega do relatório de perícia, o qual foi deferido por despacho de 4-10-2018 – fls. 275 a 277 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 26) Em 12-10-2018 foi junto aos autos o relatório de perícia, do qual se extrai, para além do mais, o seguinte: Ver documento original – fls. 278 a 289 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 27) O relatório a que se refere o ponto anterior foi notificado às partes por ofícios de 19-10-2018 – fls. 290 a 292 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 28) Em 13-11-2018 foi aberta conclusão e proferido despacho, do qual consta que atento o teor do relatório pericial, e resultando do mesmo que a divisibilidade do prédio pressupõe o cumprimento prévio dos procedimentos enumerados no relatório pericial, antes de mais, notifique as partes para, em 10 dias, informarem se é sua pretensão diligenciar pelo cumprimento dos referidos procedimentos, sob pena de, caso nada digam, o prédio ser considerado indivisível – fls. 293 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 29) Em 22-11-2018 e 29-11-2018 foram apresentadas respostas, respectivamente, pelo requerido M… e pela aqui autora, pelas quais manifestaram intenção de diligenciar pelo cumprimento dos procedimentos enumerados no relatório pericial, a fim de se proceder à divisão do imóvel em causa – fls. 297 a 301 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 30) Em 9-1-2019 foi aberta conclusão e proferido despacho, pelo qual, para além do mais, foi determinado que, atenta a posição assumida pelas partes M…. e E…, concede-se aos mesmos o prazo de 120 dias para diligenciar pelo cumprimento dos procedimentos indicados no relatório pericial – fls. 302 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 31) Em 17-2-2019 foi junto aos autos, pelo requerido M…., orçamento para a realização dos actos descritos na pág. 5 da peritagem – fls. 303 a 307 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 32) Em 14-3-2019 foi aberta conclusão e proferido despacho, do qual se extrai que: as partes M…. e E… informaram o tribunal que iriam diligenciar pelo cumprimento dos procedimentos indicados no relatório pericial, ora tais diligências são da responsabilidade das partes que as requerem, não cabendo ao tribunal pronunciar-se sobre tal questão, estando apenas os autos a aguardar que as partes informem que deram cumprimento ao solicitado, a fim de prosseguirem os seus termos – fls. 308 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 33) Em 6-5-2019 foi apresentado requerimento pelo requerido M…., a informar que até àquela data havia sido feito levantamento topográfico georreferenciado com a implementação do imóvel de habitação e garagens e o requerimento de aquisição do terreno baldio, com a área de 256 m2, à Câmara Municipal de Peniche – fls. 309 a 313 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 34) Em 4-6-2019 foi aberta conclusão e proferido despacho, concedendo mais 90 dias para concretização das diligências – fls. 314 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 35) Em 24-9-2019 foi apresentado requerimento pelo requerido M…., pelo qual requereu a concessão de mais prazo para que se proceda à legalização do imóvel, pois estamos à espera que o Sr. C…. e o Sr. P… assinem a Declaração, doc. nº 6, relativa a autorização da Legalização de Edifícios Habitacionais e Garagens na Rua …., na localidade de Ferrel – fls. 315 a 322 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 36) Em 8-10-2019 foi apresentado requerimento pelo requerido M…., do qual se extrai, para além do mais, o seguinte: “(…) 1º O presente signatário, no seguimento do Douto Despacho de Vossa Excelência que ordenou que fossem realizadas as diligências para legalização dos imóveis, procedeu a contactos junto dos Requeridos: Sr. C… e Sr. P… para que estes o ajudassem na legalização dos bens, cuja assinatura na Declaração de legalização era necessária, tendo para tal enviado:a) e-mail na data de 19-9-2019 – para mandatária do sr. P…– doc. nº 1; b) carta registada com aviso de recepção para a mandatária do Sr. C…, devidamente recebida na data de 26-9-2019 – doc. nº 2; c) o requerimento junto ao presente processo, na data de 24-9-2019, com a notificação de ambos os dois requeridos, sob a N. referência 6174974. 2º O cumprimento do Despacho da Câmara Municipal de Peniche para entrega da declaração do pedido de legalização dos imóveis, apesar de devidamente recebida pelos requeridos, não obteve a resposta da parte destes, tendo o prazo terminado a dia 30 de Setembro de 2019, 2ª feira.3º Tendo unicamente o presente signatário e a Srª E... contribuído para o cumprimento integral do douto despacho da Câmara Municipal de Peniche, o que não basta, conforme documentação já junta ao processo.4º Os requeridos mesmo tendo sido notificados dos doutos despachos do tribunal e dos pedidos do presente signatário decidiram ambos propositadamente nada fazer.5º Facto é que os vários problemas se mantem sem a legalização dos imóveis:. o problema do esgoto comum que se mantém sem acesso ao ramal público de esgotos e de forma compatível com a quantidade de dejectos que aí vão parar diariamente e que se acumulam e chegam ao interior da casa da Srª E... – junta doc. nº 3; . o pagamento de uma única factura da água respeitante a todos os imóveis, o que implica para uma senhora de 74 ter de ir entregar a todas as fracções cópia da factura e depois ter de ir receber a quota parte de cada um no pagamento e deslocar-se à Junta de Freguesia de Ferrei para o seu pagamento, sendo que o seu estado de saúde é já bastante debilitado; . a desvalorização económica do imóvel por estar em propriedade comum e não dividido em propriedade horizontal; . a possibilidade de constituição em propriedade horizontal – tornando-o divisível; . a impossibilidade de gozo pleno e efectivo de todas as faculdades e direitos do Direito de Propriedade - Vender, Hipotecar, Arrendar, nele constituir empresa ou Hostel, etc; . a possibilidade de obtenção de licença de uso habitação perante os serviços da Câmara Municipal de Peniche e nos termos da lei, como é de conhecimento geral, atendendo à qualidade e à divisão certa como foram construídos os imóveis, sendo o mesmo referido no Relatório de Peritagem apresentado neste processo pelos peritos; . o perigo para a saúde pública devido aos maus cheiros e às constantes queixas por parte dos vizinhos, pois que o entupimento do esgoto é de tal forma grave, que o cheiro a fezes e urina é nauseabundo; . a legalização dos imóveis é imperiosa e urgente, não apenas por constituir um Direito reconhecido às partes. 6º Nestes termos, e salvo melhor entendimento, entendemos que M…. e E... fizeram tudo o que estava ao seu alcance para cumprir com os doutos Despacho de Vossa Excelência e legalizar os imóveis em causa.(…)” – fls. 323 a 337 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 37) Em 30-10-2019 foi aberta conclusão e proferido despacho, pelo qual foi declarado que o prédio a dividir não é divisível em substância (atenta a posição assumida pelo requerido M..., que não foi contrariado pelas demais partes, e na senda do despacho de 13-11-2018 em face das conclusões constantes do relatório pericial e não procedendo as partes ao cumprimento dos procedimentos ali elencados), mais tendo sido designada data para realização de conferência de interessados – fls. 338 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 38) Em 20-11-2019 foi iniciada conferência de interessados, a qual foi dada sem efeito, em virtude da impossibilidade de notificação do requerido C…, por devolução dos respectivos ofícios de notificação – fls. 346 a 348 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 39) Em 30-1-2020 foi realizada conferência de interessados, na qual foi proferido despacho de suspensão dos autos, com os seguintes fundamentos: atendendo a que corre termos neste Tribunal processo de inventário com o nº 140/13.6TBPNI, onde o bem em causa nestes autos se encontra a ser ali partilhado, sendo de meu conhecimento funcional que se encontra agendada diligência – dia 13-2-2020 – para sorteio dos lotes não adjudicados, é meu entendimento que, podendo vir a existir uma alteração dos titulares do prédio em causa nestes autos, deverão estes aguardar o trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida naqueles autos de inventário, por forma a harmonizar os termos deste processo com a realidade fáctica do prédio em questão – fls. 349 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 40) Em 16-4-2020 foi apresentado requerimento pelo requerido M…a, pelo qual o mesmo requeria, em suma, a condenação dos demais requeridos em litigância de má-fé – fls. 350 a 355 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA, bem como doc. nº 5 junto com a petição inicial; 41) Em 14-8-2020 foi apresentada resposta ao requerimento a que se refere o ponto anterior pelo requerido C….– fls. 357 a 361 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA; 42) Em 21-9-2020 foi aberta conclusão e proferido despacho, pelo qual se decidiu que: “(…) Analisado o teor do requerimento, temos que os motivos elencados prendem-se, além do mais, com a conduta processual dos RR. nos autos de inventário. Os presentes autos foram declarados suspensos até ao termo da partilha que decorre nos autos nº 140/13.6TBPNI. Atendendo a que o despacho que determinou a suspensão destes autos transitou em julgado, nada mais há a determinar quanto a tal matéria, uma vez que o requerimento apresentado não é apto a por em crise tal despacho. No mais, considerando tudo o que fica exposto e se retira cabalmente do teor do requerimento e resposta, a verdade é que a conduta processual invocada pelo requerente M... respeita a outro processo não podendo ser avaliada nestes autos. (…) Assim sendo e por tudo quanto ficou exposto, não resta senão concluir que as partes não agiram como litigantes de má-fé. Termos em que, julgo improcedente o pedido de condenação como litigante de má-fé” – fls. 362 a 363 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA; 43) Em 29-10-2020 foi apresentado requerimento pelo requerido M…, pelo qual o mesmo procedeu à junção aos autos de três documentos, mais requerendo ao tribunal que notifique os demais réus para que procedam à assinatura dos demais herdeiros na declaração que se anexa como documento 3 (autorização da Legalização de Edifícios Habitacionais Rua de …, e legalização das duas Garagens sitas na Rua …, na localidade de Ferrel) – fls. 365 a 388 do suporte físico dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA; 44) Em 27-11-2020 foi aberta conclusão e proferido despacho, do qual se extrai o seguinte: “(…) os presentes autos se encontram suspensos a aguardar decisão final nos autos de inventário nº 140/13.6TBPNI, uma vez que o bem em causa cuja divisão se requer terá sido adjudicado a um dos interessados, restando finalizar as operações de partilha, homologando o mapa final. (…) Os referidos autos de inventário foram suspensos pelo período de 15 dias (desde o dia 16-11-2020) a requerimento das partes. (…) foi determinada a realização conjunta de tentativa de conciliação em todos os processos em que as partes são intervenientes e seus mandatários, o que inclui os presentes autos e os referidos autos de inventário, havendo decorrido uma sessão no dia 16-11-2020 estando agendada a sua continuação para o dia 13 de Janeiro de 2021, uma vez que se encontram em ponderação e discussão propostas que visam o acordo de todos os interessados nos vários processos que existem neste Tribunal, procurando dessa forma pôr-lhes fim (…)” – fls. 391 do suporte físico dos autos de Processo nº 2120/16.0T8LRA. 11. Ademais, a sentença recorrida considerou ainda não provados os seguintes factos: a) Que o rendimento mensal da autora fica abaixo do valor das respectivas necessidades; b) Que o património da autora tem, para efeitos de valor de mercado, o valor de 257.000,00 EUR; c) Que se a autora pudesse arrendar o imóvel, o mesmo daria um lucro anual de 11.400,00 EUR a título de rendas; d) Que a impossibilidade de gestão do imóvel objecto dos autos causou à autora falta de meios de subsistência, tendo sido obrigada a recorrer a apoio económico para subsistir e a pedir dinheiro emprestado; e) Que a duração do processo nº 2120/16.0T8LRA causou à autora nervos e ansiedade, dúvida permanente quanto ao desfecho do processo, situação de incerteza na planificação das decisões a tomar em relação ao seu património. B – DE DIREITO 12. Comecemos por apreciar a invocada nulidade da sentença recorrida, por violação do dever de análise crítica da documentação junta aos autos, nomeadamente no que respeita aos rendimentos auferidos pela recorrente e no tocante ao valor dos imóveis em causa no processo que deu origem ao atraso, bem como aos demais factos dados como não provados (conclusões 1ª a 14ª da alegação da recorrente). 13. De acordo com o disposto no artigo 615º, nº 1 do CPCivil, a sentença é nula quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. 14. A recorrente fundamenta a invocação da nulidade da sentença na violação do dever de análise crítica da documentação junta aos autos; porém, como decorre do citado artigo 615º do CPCivil, apenas a não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão é causa de nulidade da sentença, situação que não ocorre nos autos, já que a sentença se encontra fundamentada de facto e de direito. 15. Deste modo, a pretensa nulidade de que a sentença poderia padecer não existe, devendo antes ser reconduzida ao erro de julgamento de facto, o que constitui vício material da sentença, mas distinto da sua nulidade. Por conseguinte, improcede a alegação de nulidade assacada à sentença recorrida. 16. Resta apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por ter decidido que não ocorria violação do direito a uma decisão em prazo razoável, omitindo que o processo já corria termos no tribunal há quase 7 (sete) anos, sem decisão (conclusões 15ª a 21ª da alegação da recorrente). 17. A sentença recorrida fundamentou tal conclusão nos seguintes termos: “Transpondo os entendimentos supra referidos para a questão aqui em apreço, atenta a factualidade dada como provada, resulta que o processo de divisão de coisa comum que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Juízo de Competência Genérica de Peniche como Proc. nº 2120/16.0TBLRA iniciou-se em 29-6-2016, encontrando-se ainda pendente, quando já decorreram cerca de 5 anos e 7 meses desde a respectiva interposição. Porém, é certo que tal não significa necessariamente que toda a duração do processo (e, bem assim, a sua ainda actual pendência) seja imputável ao Estado Português, enquanto titular do exercício da função jurisdicional, visto que, tal como explicitado, se deve atender, para efeitos da verificação da existência de atraso na prolação de decisão em prazo razoável, à ocorrência de factores que tenham subtraído a tramitação da esfera do Tribunal e, bem assim, ao comportamento das partes e à complexidade da causa. No caso em apreço, como invoca o demandado na respectiva contestação, julgamos que existem efectivamente circunstâncias que nos levam à conclusão de que não pode ser imputado ao Estado a totalidade do período de tramitação do processo em análise, por não estar em causa um funcionamento anormal dos serviços judiciais respectivos, mas sim vicissitudes e características do próprio processo e do comportamento das partes. Com efeito, ao contrário do que pretende fazer crer a autora, nos autos em análise não está em causa uma simples acção de divisão de coisa comum, cuja matéria de facto entende ser igualmente simples e sem complexidade. O que se constata, em bom rigor, é que, pelo menos desde 9-1-2019 os autos se encontram subtraídos à esfera de actuação do Tribunal do Proc. nº 2120/16.0T8LRA, já que desde essa data as partes se encontram a diligenciar pelo cumprimento dos procedimentos indicados no relatório pericial em vista da legalização do prédio a dividir (sem o que o mesmo será indivisível) – cf. pontos 30 e seg. do probatório. Mais se constata que, num segundo momento, já desde 30-1-2020 (e não tendo as partes procedido até então às diligências prévias necessárias à divisão do prédio), os autos encontram-se suspensos em virtude da existência de uma causa prejudicial, concretamente por se encontrar pendente o processo de inventário nº 140/13.6TBPNI, no âmbito do qual se encontram a ser realizadas diligências em vista da adjudicação do imóvel a um dos interessados – cf. pontos 39 e seg. do probatório. De tal factualidade decorre, pois, não só a complexidade da matéria levada a decisão no Proc. nº 2120/16.0T8LRA, como também o facto de a conclusão da pretendida divisão de coisa comum não depender de qualquer actuação do Tribunal, mas sim das partes em litígio e da sua diligência para suprir os problemas do prédio e que impedem a sua divisão. Não é despiciendo, pois, para a matéria que aqui nos ocupa, que o relatório pericial produzido naqueles autos tenha concluído que a possibilidade de divisão do prédio depende da prévia realização de procedimentos que incumbem às partes em litígio, por forma a suprir o facto de estarmos perante uma construção clandestina, que carece de legalização junto da respectiva Câmara Municipal, bem como da correcção das divergências entre os documentos matriciais e o que existe no local, da constituição de propriedade horizontal e da promoção do registo do prédio na conservatória do registo predial – cf. ponto 26 dos factos provados. Atentas as vicissitudes expostas, que revelam a complexidade da matéria em litígio e, bem assim, o comportamento das partes envolvidas, afigura-se forçoso concluir não poder o Estado responder pelos períodos em que a tramitação processual dos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA esteve subtraída da sua alçada, antes estando dependente do impulso e actuação das partes. Neste sentido, o demandado invoca precisamente que a demora na tramitação processual, tem que ver com a actuação das partes (e a respectiva litigância) e com a complexidade da matéria subjacente àqueles autos, que se prende com a cessação da compropriedade de um imóvel. (…) À luz destes entendimentos jurisprudenciais, cujo teor sufragamos, não serão designadamente imputáveis ao Estado, para efeitos da aferição da prolação de decisão em prazo razoável, os períodos de atraso imputáveis às partes e outros intervenientes processuais, quer por a tramitação do processo a estes ter estado acometida (dependendo exclusivamente do impulso dos mesmos), quer por estes terem efectuado uma utilização abusiva dos meios processuais à sua disposição. Portanto, para efeitos de contagem do período de tempo jurisprudencialmente fixado como correspondendo à decisão em prazo razoável, apenas serão contabilizados os momentos de tramitação do processo que sejam concretamente imputáveis à Administração da Justiça, de tal modo que é com base na soma da totalidade dos períodos de tempo em que o processo esteve parado por causa imputável à Administração da Justiça que se poderá determinar, afinal, se foi ou não violado o direito à prolação de decisão em prazo razoável. Retornando ao caso em apreço, cumpre ter presente que, conforme já se deixou explicitado supra, para efeitos de concretização do conceito de prazo razoável, entende-se que a duração média do processo em primeira instância deve corresponder a 3 anos e a duração média de todo o processo deve corresponder a um período que vai de 4 a 6 anos. Tendo isto em consideração, temos que o processo de divisão de coisa comum aqui em análise se iniciou em 29-6-2016, não se encontrando ainda concluído. Porém, constata-se que o período em causa não é integralmente da responsabilidade do Estado na medida em que, como se disse, da factualidade apurada nos autos resulta que em 9-1-2019 o Tribunal concedeu às partes a oportunidade de realizarem as diligências elencadas no relatório pericial em vista da legalização do imóvel, sem o que o mesmo não é divisível (cf. ponto 30 dos factos provados). Mais decorre da factualidade apurada que foi determinada, em 30-1-2020 (e após se constatar não terem as partes cumprido os trâmites de que depende a divisão do prédio), a suspensão dos autos por existência de causa prejudicial, concretamente a realização de diligências em vista da adjudicação do imóvel no âmbito do processo de inventário no âmbito do qual o mesmo se encontra a ser partilhado – cf. ponto 39 do probatório. Ou seja, constata-se que, pelo menos desde 9-1-2019 (i.e., 2 anos, 6 meses e 10 dias após o início do processo de divisão de coisa comum aqui em análise), o desenvolvimento do processo tem estado subtraído da actuação do Tribunal, antes dependendo de impulso das partes. De resto, desconhece-se, não vindo alegado pela autora, que concretas diligências estão a ser levadas a cabo no Proc. nº 140/13.6TBPNI e de cuja conclusão os autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA dependem necessariamente. Em suma, pretendendo a autora obter a divisão de imóvel, a respectiva divisibilidade está dependente essencialmente da realização de uma série de diligências prévias em vista da sua legalização, a qual necessariamente incumbe aos comproprietários e não ao Tribunal, tal como exigido pelo relatório pericial junto àqueles autos em 12-10-2018. Dito de outro modo, é da actuação das partes e não do Tribunal do Proc. nº 2120/16.0T8LRA que depende a divisibilidade do prédio subjacente àqueles autos, tendo sido concedida às partes oportunidade para tanto desde 9-1-2019, as quais, porém, não concluíram as diligências necessárias para o efeito (veja-se, de resto, o requerimento apresentado naqueles autos em 29-10-2020, do qual decorre que ainda nessa data não tinham sequer sido assinados por todos os comproprietários os documentos necessários para a legalização do edifício). Do exposto resulta, portanto, que a tramitação processual do Proc. nº 2120/16.0T8LRA apenas esteve sob a alçada do Tribunal durante 2 anos, 6 meses e 10 dias, sendo apenas esse período que lhe é imputável. Isto posto, atendendo a que, conforme expendido, ao Estado apenas podem ser imputados os períodos em que a tramitação do processo de divisão de coisa comum esteve a aguardar o seu impulso (não sendo responsável pelas actuações e omissões dos comproprietários do imóvel a dividir) e que, bem assim, a duração média – que corresponde à duração razoável – de um processo em 1ª instância é de cerca de 3 anos e a duração média de todo o processo deve corresponder, em princípio, a um período que vai de 4 a 6 anos, a duração da tramitação do Proc. nº 2120/16.0T8LRA pelo Juízo de Competência Genérica de Peniche não se afigura desconforme com o direito da autora a uma decisão em prazo razoável, tal como preceituado nos artigos 6º, nº 1 da CEDH e 20º, nº 1 e 4 da CRP. Por todo o exposto, impõe-se julgar improcedente o pedido da autora de declaração da violação dos normativos aqui em apreço”. 18. E, ao entrar na análise dos pressupostos da responsabilidade civil do Estado, nomeadamente na ilicitude da conduta do Estado, a sentença recorrida concluiu o seguinte: “Conforme supra referido, para se verificar o direito da autora a indemnização, com fundamento na violação do prazo razoável de decisão, importa que, antes de mais, tenha ocorrido um facto ilícito violador desse seu direito. A ilicitude comporta uma lesão antijurídica que se traduz na violação objectiva de uma norma, princípio jurídico, regras de ordem técnica ou deveres de cuidado, da qual resulte a ofensa de direitos e interesses legalmente protegidos. Ou seja, depende de um comportamento activo ou omissivo voluntário do órgão ou agente, no exercício das suas funções e por causa delas. Deste modo, a ilicitude reconduz-se à reprovação da conduta do agente por confronto com o plano geral e abstracto previsto na lei (por contraponto à culpa, que pressupõe uma avaliação da conduta do agente em concreto). Tal como previamente já foi referido, no que concerne ao regime aqui aplicável, há uma remissão integrativa para o preenchimento deste requisito, através do estipulado para a responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função administrativa. No que respeita concretamente à ilicitude, o artigo 9º do RRCEEEP estabelece o seguinte: “(…) 1 – Consideram-se ilícitas as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos. 2 – Também existe ilicitude quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos resulte do funcionamento anormal do serviço, segundo o disposto no nº 3 do artigo 7º”. Este normativo faz apelo a duas componentes de ilicitude: i) a violação objectiva de normas, princípios jurídicos ou regras; ii) ofensa a direitos e interesses legalmente protegidos. Ora, no caso concreto, a análise da ilicitude contende com saber se no Proc. nº 2120/16.0T8LRA foi ou não proferida decisão judicial que apreciou em prazo razoável, e com força de caso julgado, a pretensão da aqui autora. Para resolver esta questão assume-se como relevante concretizar o conceito de prazo razoável, na medida em que para além da referência expressa no artigo 12º do RRCEEEP, a lei nada diz a esse respeito. Apesar da dificuldade na concretização deste conceito, na medida em que a mesma não pode ser feita em termos meramente abstractos (ou seja, pela adopção de critérios generalizados), o mesmo tem sido objecto de densificação pela doutrina e pela jurisprudência, quer do TEDH, quer dos Tribunais nacionais. Estas têm evoluído no sentido de apontar uma metodologia adequada a avaliar a razoabilidade da duração de um processo, nos termos supra expendidos em sede de apreciação do pedido anterior e que aqui se reiteram, concluindo-se que a duração média – que corresponde à duração razoável – de um processo em 1ª instância é de cerca de 3 anos. Ora, conforme então referido e com base nos ali identificados critérios, é de concluir que a duração da tramitação do Proc. nº 2120/16.0T8LRA não violou o direito da autora a uma decisão em prazo razoável, na medida em que a tramitação imputável ao Estado se limitou ao período de 2 anos, 6 meses e 10 dias desde o início do processo de divisão de coisa comum, portanto, ainda dentro do parâmetro jurisprudencialmente fixado. Ora, no que à ilicitude concerne, o já mencionado acórdão do STA proferido no Proc. nº 090/12 explicita no seu sumário que “(…) I – O atraso na decisão de processos judiciais, quando viola o direito a uma decisão em prazo razoável, é um facto ilícito, gerador de responsabilidade civil do Estado. (…)”. Transpondo o entendimento vertido nesse acórdão para o caso em apreço, afigura-se forçoso concluir pela não verificação in casu de facto ilícito, com fundamento na violação do preceituado no artigo 6º, § 1 da CEDH e no artigo 20º, nºs 1 e 4 da CRP, precisamente porque não foi ultrapassado pelo Tribunal o prazo considerado como razoável para decisão do processo judicial em causa, encontrando-se o mesmo ainda pendente em virtude de vicissitudes inerentes à actuação dos comproprietários e às características do imóvel a dividir. Atento todo o exposto, temos que a duração da tramitação daquele processo pelo Tribunal no qual corre os seus termos não viola o direito da autora a uma decisão em prazo razoável, tal como preceituado nos artigos 6º, § 1 da CEDH e 20º, nºs 1 e 4 da CRP, inexistindo, pois, qualquer ilicitude a ser imputada ao demandado. (…) Como consequência da não verificação de violação, pelo demandado, do preceituado nos artigos 6º, § 1 da CEDH e 20º, nºs 1 e 4 da CRP no que concerne à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável nos autos de Proc. nº 2120/16.0T8LRA e, bem assim, do não cumprimento de um dos pressupostos legais de que depende a responsabilidade civil extracontratual do Estado, improcede igual e necessariamente todo o demais peticionado pela autora, uma vez que os demais pedidos formulados assentam na mesma causa de pedir que, como já se concluiu, não merece acolhimento por este Tribunal, precisamente porque não foi violado o direito da autora à obtenção de decisão em prazo razoável”. Nenhum reparo nos merece o decidido. 19. A jurisprudência do STA, a propósito do que deve ser entendido como “prazo razoável”, para efeitos da duração dum processo judicial, corrobora a conclusão a que chegou a sentença recorrida. 20. Assim, no acórdão do STA, de 27-11-2013 (processo nº 0144/13), escreveu-se o seguinte: “(…) só se pode afirmar que um processo foi decidido para além do «prazo razoável» quando o mesmo foi julgado para além do momento em que, em circunstâncias normais, deveria ter sido decidido e que esse atraso se ficou a dever ao deficiente e culposo funcionamento da «máquina judicial». Só assim, isto é, só havendo a certeza de que o processo foi decidido para além do tempo em que seria razoável decidi-lo e que essa anomalia se ficou a dever a culpa dos serviços da administração da justiça é que se poderá afirmar que se verificam as condições determinantes da emergência do direito a uma indemnização ressarcitória por via da responsabilidade civil extracontratual. Sendo assim, se se concluir que a decisão final foi proferida para além do «prazo razoável», mas que esse atraso se deve a uma tramitação com incidências extraordinárias, não provocadas pelo funcionamento da «máquina judicial» – designadamente que se ficou a dever à complexidade do processo, à própria natureza deste ou ao censurável comportamento das partes – então haverá que concluir não estarem reunidos os requisitos de que depende o apontado dever indemnizatório. Sendo certo que nessa apreciação o que releva é a análise da tramitação do processo no seu conjunto e não o que aconteceu em cada uma das suas fases o que obriga a que se não dê demasiada atenção ao cumprimento de cada um dos prazos dos actos desse percurso em detrimento de uma visão de conjunto que atenda a todas as suas incidências. Ou seja, e dito de forma diferente, na procura das causas responsáveis pelo atraso na decisão do processo a atenção deve ser concentrada naquelas que decorrem do comportamento das autoridades judiciárias pois que só se concluir que a demora foi irrazoável, foi chocante, foi inaceitável para os critérios e expectativas do homem comum e que tal resulta do andamento da máquina da administração da justiça é que se poderá falar na responsabilidade civil extracontratual do Estado. Juízo esse que terá de ter em conta (1) a complexidade do processo, (2) o comportamento das partes (3) a actuação das autoridades competentes no processo e (4) a importância do litígio para o interessado – vd., por todos, acórdão deste STA de 9/10/2008 (rec. 319/08)”. 21. E, no acórdão (igualmente do STA), de 21-5-2015 (processo nº 072/14), concluiu-se nos seguintes termos: “(…) Sustentou-se ainda no acórdão deste Supremo de 10-9-2009 [Proc. nº 083/09 consultável no mesmo sítio] que “a definição do que seja um prazo razoável não só não é meramente objectiva como também essa qualificação não pode ser atribuída em abstracto antes havendo de ter em consideração as circunstâncias concretas de cada caso, designadamente as relacionadas com natureza e complexidade do processo, a conduta do requerente e o comportamento das autoridades competentes (magistrados, órgãos de polícia e agentes dos serviços de justiça). O que quer dizer que o facto de a conclusão do processo ter excedido o prazo legal, pode não ser qualificado como ilícito e culposo – vd., entre outros, acórdãos deste STA, de 15-10-98 (rec. 36.811) e de 17-3-2005 (rec. 230/03). Ou seja, a violação do direito a uma decisão num prazo razoável só pode gerar a obrigação de indemnizar se as circunstâncias concretas do caso ditarem que ela podia ter sido alcançada num prazo inferior ao que efetivamente foi e que tal só aconteceu por incúria ou negligência dos operadores judiciários”. 22. Por sua vez, no acórdão do STA, de 6-2-2020, proferido no âmbito do processo nº 03/16, concluiu-se: “(…) Em nosso entender, este raciocínio linear não toma na devida conta a circunstância de que estas situações de indemnização por atraso na justiça são situações sui generis, estando-se em face de um “non facere”, além do mais não reportado a nenhum prazo específico. Acresce a isto que estamos no âmbito do exercício de um direito que tem uma fonte simultaneamente interna (artigo 20º CRP) e internacional (artigo 6º CEDH), sendo que a adequação do ordenamento interno às exigências que derivam da adesão à CEDH pode implicar algumas soluções mais específicas ou individualizadas do legislador ou mesmo do julgador, no sentido de não vulnerar de forma desproporcional o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas. O princípio da subsidiariedade da tutela europeia pressupõe a exaustão dos remédios domésticos e o dever do Estado de implementar ou prover à existência desses mesmos remédios domésticos. Ora, a solução preconizada pelas instâncias nos presentes autos teria como consequência uma restrição excessiva do mencionado direito. A verdade é que nestas situações de indemnização por atraso na justiça, um eventual atraso terá de ser apreciado de forma unitária, desde a proposição da acção até à prolação da decisão de mérito final. Até porque pode haver atrasos em certas fases do processo e não em todas, sendo isso, no entanto, suficiente para condenar o Estado por atraso na justiça. Só uma visão global do processo permite, pois, ao julgador, avaliar se a decisão judicial foi dada sem dilações indevidas”. 23. A autora e ora recorrente entende que foi ultrapassado o “prazo razoável” para a decisão de um processo, contrariamente ao que decidiu a decisão recorrida, já que no caso “sub iudice” tal prazo se devia computar em três anos e não em cinco anos e sete meses. Vejamos. 24. Resulta da lei e da jurisprudência do TEDH que a responsabilidade do Estado por violação do direito a uma decisão judicial em “prazo razoável”, isto é, por demoras excessivas é “não apenas das próprias «autoridades judiciárias», mas, em geral, das que são consequência da actuação das autoridades competentes com reflexo no processo (aqui se incluindo órgãos do poder legislativo ou executivo e autoridades colaborantes com as autoridades judiciárias)” (cfr. acórdão do STA, de 18-2-2021, processo nº 02386/16.6BEPRT). 25. E, compulsada que a jurisprudência do TEDH, quer a do STA, é de considerar que um processo decorreu para além do “prazo razoável” quando o mesmo foi decidido para além do momento em que, em circunstâncias normais, deveria ter sido decidido e que esse atraso se ficou a dever ao deficiente e culposo funcionamento da “máquina judicial” (em sentido lato). 26. Uma tal apreciação há de ser concreta e global. Concreta, na medida em que sempre haverá que atender às específicas características do processo, como a sua natureza, a sua complexidade, a quantidade de intervenientes, o comportamento das partes, os seus incidentes e ocorrências especiais que possam ter influenciado a marcha do processo. E global, porque, regra geral, deve ter-se em consideração a duração global do processo em causa, e não o que sucedeu em cada uma das suas fases – não obstante o TEDH já ter demonstrado alguma flexibilidade no que toca à duração manifestamente excessiva de uma das suas fases num determinado processo em que, apreciado o mesmo na sua globalidade, não se tenha verificado um atraso desrazoável. 27. Assim, a ponderação sobre a razoabilidade da duração dum processo não deve ser feita em abstracto, mas sim em função das suas concretas características e circunstâncias. É que um mesmo prazo de duração pode ser razoável para um concreto processo e ser excessivo para outro. 28. Isto leva-nos obrigatoriamente a ponderar, no caso do processo aqui em questão – uma acção de divisão de coisa comum –, a concreta complexidade atinente às dificuldades encontradas para tornar um prédio indivisível num prédio susceptível de ser dividido em quinhões e a assunção dessa responsabilidade pelas partes, que levaram à concessão de prazo (por duas vezes, 120 dias + 90 dias) às mesmas para tal desiderato, até se concluir, por despacho judicial, datado de 30-10-2019, que o prédio a dividir não era divisível em substância e, finalmente, à suspensão da instância, por o prédio em questão estar a ser objecto de partilha no processo de inventário nº 140/13.6TBPNI, determinada por despacho de 30-1-2020, que não foi objecto de censura pela aqui recorrente (cfr. ponto 39. do probatório). 29. Ora, como se deixou dito, o que releva, por via de regra, é sempre a duração global do processo, sendo que a discussão sobre a eventual duração excessiva do processo, no caso “sub iudice”, só se coloca por via das elencadas vicissitudes a que o mesmo esteve sujeito. 30. Por outro lado, e ainda numa abordagem em abstracto, um processo de complexidade normal, e sem ocorrências especiais, numa só instância, seria adequado o prazo de três anos, a que haverá que descontar o período de tempo em que o processo esteve a aguardar o impulso das partes ou em que a instância esteve suspensa pela ocorrência duma causa prejudicial. 31. Neste circunstancialismo, e até à data de 9-1-2019 – data em que o processo ficou a aguardar o impulso das partes para levarem a cabo os procedimentos necessários à divisão do prédio, tal como reconhecido pelos peritos nomeados pelo tribunal –, o processo apenas esteve pendente durante cerca de dois anos e sete meses. 32. E, por outro lado, o período de tempo ocorrido entre 30-1-2020 (data em que a instância foi suspensa, com fundamento na pendência do processo de inventário nº 140/13.6TBPNI, onde o bem objecto da acção de divisão de coisa comum estava a ser partilhado) e 1-2-2022 (data da prolação da sentença na presente acção) não pode ser contabilizado, uma vez que a instância do processo nº 2120/16.0T8LRA se encontrava suspensa, a aguardar a decisão a proferir no aludido processo de inventário. 33. Assim, face às vicissitudes do processo, não podemos considerar desrazoável o prazo de cinco anos e sete meses, nele se incluindo a totalidade do período em que os autos estiveram a aguardar o impulso processual das partes e o período de suspensão da instância, contabilizado em dois anos e onze meses. 34. Em suma, a demora na decisão do processo, porque não excedeu o prazo razoável a que aludem o artigo 20º, nº 4 da CRP, o artigo 6º, § 1º da CEDH, o artigo 2º, nº 1 do CPCivil e o artigo 2º, nº 1 do CPTA, ficou a dever-se a factores externos ao funcionamento dos Tribunais, relacionados com a inércia das partes e com a suspensão da instância, por motivo da existência de causa prejudicial, não contestada, razão pela qual o Estado Português não violou o direito da autora e aqui recorrente a uma decisão em prazo razoável, ficando deste modo afastada a verificação do pressuposto de ilicitude de actuação do Estado Português, susceptível de o fazer incorrer em responsabilidade civil extracontratual. IV. DECISÃO 35. Nestes termos, e pelo exposto, acordam os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul em negar provimento ao recurso e, com a presente fundamentação, confirmar a sentença recorrida. 36. Custas a cargo da autora/recorrente, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe foi concedido. Lisboa, 19 de Maio de 2022 (Rui Fernando Belfo Pereira – relator) (Dora Lucas Neto – 1ª adjunta) (Pedro Figueiredo – 2º adjunto) |