Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:317/20.8 BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:01/11/2023
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:UNICIDADE DE PROCEDIMENTOS DE INSPEÇÃO
FINALIDADES E ÂMBITOS
ESTABILIDADE E SEGURANÇA JURÍDICA
CADUCIDADE DO DIREITO DE LIQUIDAÇÃO
RESTITUIÇÃO DE SUPRIMENTOS
ADIANTAMENTO POR CONTA DE LUCROS
Sumário:I-Se foi primeiramente iniciado um procedimento fundado no artigo 46.º, n.ºs 4 e 5 do RCPITA, e com o desiderato de “consulta, recolha e cruzamento de elementos”, referente aos anos de 2013 e 2014, e um segundo procedimento de inspeção externa, de âmbito geral, efetuado com base nas respetivas Ordens de Serviço, com vista a apurar a situação tributária dos sujeitos passivos e cumprimento das respetivas obrigações tributárias, por referência ao ano de 2014, mormente, incumprimento declarativo de adiantamento por conta de lucros em sede de IRS, inexiste qualquer convergência de âmbitos e finalidades, donde, a ocorrência de “uma unicidade dos procedimentos”, que permite substanciar uma violação do artigo 63.º, n.º 4, da LGT.

II-Não pode ser apontada qualquer violação da estabilidade e segurança jurídica, porquanto, por um lado, os Recorrentes desvirtuam o concreto culminar do primeiro procedimento de inspeção, ou seja, da prolação da competente nota de diligência, como, por outro lado, inexiste qualquer fundada e legítima expetativa.

III-Inexistindo uma unicidade de procedimentos de inspeção, tal determina que para efeitos de aferição da caducidade do direito à liquidação (artigo 45.º da LGT) apenas há que computar os dados referentes à ação de inspeção externa que culminou nos atos impugnados, os quais não ultrapassaram os regulados seis meses, não tendo, por conseguinte, o desiderato de obviar à suspensão do seu cômputo.

IV-São considerados rendimentos de capitais sujeitos a incidência de IRS, os lucros, incluindo os adiantamentos por conta de lucros, colocados à disposição dos respetivos titulares, desde que se demonstre, para o efeito, os respetivos factos génese (artigo 5.º do CIRS).

V-A única presunção legal estabelecida, neste particular, encontra-se plasmada no artigo 6.º, nº 4, do CIRS, segundo o qual os lançamentos em quaisquer contas correntes dos sócios, escrituradas nas sociedades, quando não resultem de mútuos, da prestação de trabalho ou do exercício de cargos sociais, presumem-se feitos a título de lucros ou adiantamento dos lucros.

VI-A norma do artigo 5.º, n.º 2, alínea h), do CIRS, não exige a escrituração formal dessa realidade como pressuposto de incidência.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I-RELATÓRIO


C. H. N. M. L. A. e A. C. F. C. C. (doravante Recorrentes), vieram interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), relativas ao ano de 2014 e correspondentes juros compensatórios, no montante total de €405.551,94.

Os Recorrentes, vieram apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem:

“a) Os Recorrentes consideram ter sido sujeitos a duas inspeções tributárias de âmbito externo, referentes aos mesmos sujeitos passivos, imposto e período de tributação, pela DSIFAE e pelo SIT, sendo que a segunda viola o disposto no n.º 4 do art.º 63º da LGT.

b) Veio, porém, o tribunal “a quo” negar provimento à pretensão dos Recorrentes por entender que o primeiro procedimento, levado a cabo pela DSIFAE visou a mera consulta, recolha e cruzamento de elementos.

c) Fundou-se no entendimento de que uma inspeção só será externa quando tais atos de inspeção sejam praticados, total ou parcialmente, fora das instalações da Administração Tributária.

d) No entanto tal entendimento vai contra a jurisprudência superior, tal como decidido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, n.º 01854/10.8BEBRG, datado de 13-11-2014, que entendeu que independentemente de a actividade de análise se ter efectuado nas instalações da Administração Tributária, isto é independetemente do local onde a mesma se realizou, ela é de qualificar como acto de procedimento de inspecção externa quando foi efectuada com base em documentos obtidos através de actos inspectivos exteriores aos serviços.

e) Tal entendimento é ainda adotado pelo Centro de Arbitragem Administrativa, no proc. n.º 580/2019-T, de 20-09-2020 que veio reforçar a ideia de que não pode a AT vir argumentar que um procedimento é interno pelo simples facto de se ter realizado exclusivamente nas suas instalações.

f) Tal lógica, contrária a que o tribunal a quo acolhe, visa salvaguardar os princípios do processo tributária, evitando que a AT possa contornar os trâmites que a lei exige para um procedimento de fiscalização externa.

g) Ademais, a própria DSIFAE classificou externo o procedimento (pág. 88 da sentença recorrida) e solicitou aos contribuintes informações, tais como documentos e declarações por eles facultados, que não poderia possuir por si mesma, não se limitando a cruzar elementos que já detivesse na sua posse.

h) O que, de per si, leva a que o procedimento não possa mais ser considerado como interno, tal como é entendimento dos professores Joaquim Freitas da Rocha e João Damião Caldeira.

i) Dúvidas não restam de que a AT solicitou diversos documentos aos Recorrentes, desde contratos de transmissão de ações, de doação, documentos bancários, bem como a prova de existência dos suprimentos com elementos das sociedades B. SGPS, Lda., P., P., SGPS, S.A, S. 2000, S.A., enviados à DSIFAE, documentos que constam como anexo aos relatórios inspetivos e fazem parte do processo administrativo (anexo 4, o qual contém 130 páginas), até aos documentos contabilísticos destas sociedades, os quais tiveram de ser obtidos junto das mesmas.

j) Posto isto, dúvidas não restam de que estamos perante a existência de duas inspeções externas realizadas aos Recorrentes, o que torna a segunda ilegal, por violação do disposto no art.º 63º, n.º 4, da LGT.

k) Comprovado que está que ambas as inspeções realizadas pela DSIFAE e pelo SIT se tratam de inspeções externas, não sendo nenhuma delas para simples consulta, recolha e cruzamento de elementos, vem o tribunal recorrido sustentar que tal não configura uma violação do disposto no artigo 63º, n.º 4 da LGT, porquanto a duplicação não será ilegal nos casos em que um deles vise a mera consulta, recolha e cruzamento de elementos, porquanto a ratio da norma é a de salvaguardar a estabilidade e segurança jurídicas, princípios que não são prejudicados nos casos englobados pela dita exceção.

l) A questão é, no caso não foram feitas correções na inspeção realizada pela DSIFAE, porque a situação dos contribuintes se encontrava regular.

m) Porém, a alteração de tal situação põe em causa e prejudica a estabilidade e segurança jurídicas que a norma do artigo 63º, n.º 4 da LGT visou proteger, porquanto ao não apresentar irregularidades na sua atividade, o normal é que a AT não faça correções aos contribuintes, o que leva a que se crie igualmente a expectativa de obtenção de estabilidade e segurança jurídica.

n) Neste sentido tende a ir a jurisprudência e doutrina portuguesas, que consideram que, por regra, a AT não está autorizada a voltar atrás com atos tributários favoráveis, como aconteceu no caso em apreço, quando a AT notifica o contribuinte do termo do primeiro dos procedimentos realizados, sem promover correções.

o) Ao proceder à emissão de uma correção com um novo procedimento inspetivo referente à mesma factualidade, ao mesmo sujeito passivo, imposto e tributação, a AT violou a estabilidade e segurança jurídicas.

p) De facto, a finalidade de ambas foi a análise de toda a questão relativa aos suprimentos que estiveram na origem das liquidações ora impugnadas e a situação tributária dos Recorrentes, como o comprovam os ofícios n.º 1587 e 1584, datados de 09/12/2015, remetidos pela DSIFAE.

q) A qual solicitou a apresentação de toda a documentação relativa aos suprimentos em causa e às operações subjacentes, bem como às entidades envolvidas, fez diversas diligências, concluindo o processo sem qualquer correção, mas propondo à Direção de Finanças de Setúbal na informação n.º DSIFAE/73/2018, a liquidação de IRS.

r) O que contraria o referido na douta sentença recorrida, que para justificar a legalidade dos dois procedimentos, alega que “...com as alterações introduzidas pela Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro, vigentes à data da segunda inspeção, veio o legislador esclarecer que, quando um dos procedimentos inspetivos se destine apenas à consulta, recolha e cruzamento de elementos, isto é, quando a Autoridade Tributária não tome qualquer posição sobre a situação tributária dos contribuintes, não se poderá concluir que existiu uma ilegal duplicação de procedimentos inspetivos externos.” (pág. 89).

s) O facto de a DSIFAE ter tomado posição sobre a situação tributária dos Recorrentes apenas confirma que o entendimento de que estamos perante um procedimento inspetivo externo, que terá sido repetido posteriormente, o que configura uma violação do disposto no artigo 63º, n.º 4 da LGT.

t) Assim, impõe-se a anulação das liquidações na origem dos presentes autos, nos termos do art.º 54º do CPPT.

u) E não pode relevar a argumentação de que a primeira fiscalização teve em vista apenas a consulta, a recolha de documentos ou elementos, como faz a douta sentença recorrida, porquanto na primeira fiscalização foi feito um juízo sobre a substância dos inúmeros documentos solicitados e apresentados, bem como das informações solicitadas e recolhidas junto de entidades terceiras e até estrangeiras, não se reduzindo à «análise formal e de coerência de documentos» - ver o citado artigo 13.º, alínea a), parte final, na redação anterior à alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 36/2016, de 01/07/2016, ou seja, na data do início do procedimento inspetivo.

v) Não o foi porque não se bastou pelo tratamento de informação e documentação que afluiu aos serviços através dos canais normais e despistagem de erros de concordância, estando já direcionada para a verificação da situação tributária dos contribuintes.

w) E são ainda as formalidades adotadas pela DSIFAE que o comprovam, porque caso contrário a AT não teria procedido à notificação prévia do procedimento, como determina a al. a) do n.º 1, do art.º 50º do RCPITA, conforme pontos C e E do probatório.

x) Por outro lado, não foram invocados factos novos, para que tal procedimento pudesse ocorrer, nem tal despacho foi proferido nesse sentido, o que era obrigatório, conforme art.º 63º, n.º 4 da LGT e jurisprudência superior estabelecida no Acórdão do TCA Sul nº 07343/14, de 27-02-2014, onde se prevê que não poderá haver mais que um procedimento externo de fiscalização relativamente ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, quanto ao mesmo imposto e período de tributação, sem que haja factos novos e uma decisão fundamentada do dirigente máximo do serviço no sentido de efetivação do novo procedimento.

y) Sendo evidente que não se apreciaram factos novos e não houve qualquer despacho fundamentado do dirigente máximo do serviço a decidir sobre a realização da segunda inspeção externa dá-se uma violação do artigo 63.º, n.º 4, da LGT, e consequentemente a ilegalidade de todos os atos subsequentes, de acordo com o artigo 54.º do CPPT, preconizando a douta sentença recorrida, uma errónea interpretação das disposições legais aplicáveis, não podendo permanecer na ordem jurídica.

z) Compreendendo o procedimento tributário todos os atos dirigidos à declaração de direitos tributários, nos termos do art.º 54º, n.º 1 da LGT, incluindo as ações previstas na al.a) desse artigo, sendo o prazo de caducidade do direito à liquidação de quatro anos, como dia o art.º 45º, n.º 1 da LGT, suspendendo a notificação do contribuinte o prazo esse prazo de caducidade, nos termos do artigo 46º, n.º 1 da LGT e tendo os Recorrentes sido notificados, no primeiro procedimento inspetivo, em 21/12/2015, quanto à Impugnante, e em 05/01/2016 quanto ao Impugnante (pontos C e E, do probatório), foi nesta data que se iniciou o prazo de suspensão do prazo de caducidade.

aa) No segundo procedimento essa notificação ocorreu em 07/12/2018 e 10/12/2018, quanto à impugnante e ao impugnante, respetivamente (pontos P e Q do probatório).

bb) Porquanto foi apenas nessas datas que eles assinaram as ordens de serviço, conforme art.º 51º, n.º2 do RCPITA.

cc) Assim, e como tendo em conta o referido 54º, n.º 1 da LGT, estamos perante um único procedimento inspetivo que compreende toda a sucessão de atos, tendo em conta que o relatório inspetivo foi notificado aos Recorrentes, no dia 24/05/2019 (pontos EE e FF do probatório), então entre 21/12/2015 até 24/05/2019, decorreu bem mais do que os 6 meses impostos pelo artigo 46.º da LGT, para a suspensão do prazo de caducidade.

dd) “O prazo de caducidade do direito à liquidação suspende-se com a notificação ao contribuinte do início de acção inspectiva externa, mas esse efeito suspensivo cessa, e o prazo conta-se do seu início, caso a inspecção ultrapasse seis meses contados a partir daquela notificação.” - Acórdão do STA, n.º 2304/13.3BEPRT, de 25/09/2019.

ee) Estando em causa um imposto de 2014 e sendo as notificações emitidas em 25/05/2019, o direito á liquidação estava caducado, contrariamente ao entendido na douta sentença recorrida, que por esse motivo, não pode permanecer na ordem jurídica.

ff) Finalmente, foi entendido na sentença recorrida que os pressupostos para as liquidações efetuadas estão reunidos na medida em que considerando que os Recorrentes receberam as transferências bancárias na qualidade de acionistas da sociedade por lucros distribuídos em razão da variação patrimonial ocorrida na esfera da S.. LLC, aquando da aquisição da participação financeira na B. e realizada na data em que as transferências foram ordenadas, por esta, para devolução dos suprimentos prestados pelo anterior acionista mas cujo direito foi cedido (a título gratuito) à S. P. LLC.

gg) Concluindo assim que os recebimentos são lucros distribuídos enquadráveis no art.º 5º, n.º 1 do CIRS.

hh) Nesta lógica, a AT presumiu uma doação quanto à transmissão dos suprimentos a favor da sociedade Southampton, porém temos o art.º 347º do CC que define que basta a prova em contrário para ilidir a presunção, a qual é feita pela factualidade demonstrada.

ii) Atento que a S. nunca registou a transmissão das quotas a seu favor, mantendo registados como empréstimos dos sócios (Doc. 15, págs. 4 e 5, anexo à impugnação) e que nos termos do art.º 969º, n.º 1 do CC a doação está sujeita à aceitação do donatário, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, Proc.º n.º 26118/10.3T2SNT.L1.S1, de 25/06/2015, e do Tribunal da Relação de Coimbra, proc. N.º1779/20.9T8ANS-A.C1, de 23/11/2021, a doação não é, pelos motivos enunciados, válida.

jj) Pelo que existe assim vicio de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, tendo a douta sentença preconizado uma errónea interpretação das disposições legais aplicáveis padecendo de erro de julgamento, não podendo permanecer na ordem jurídica.

Nestes termos, nos melhores de direito e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso, depois de recebido e analisadas as questões colocadas, ser julgado procedente por provado, sendo revogada a douta Sentença do Tribunal “a quo”, com todas as consequências legais daí advindas.”


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A Recorrida devidamente notificada optou por não apresentar contra-alegações.

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O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul proferiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A decisão recorrida fixou a factualidade que infra se descreve:

“Com relevo para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

A) A coberto dos despachos n.ºs DI201500334, DI201500335 e DI201500336, do Chefe de Divisão da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais, foi efetuada uma «ação de investigação externa de consulta, recolha e cruzamento de elementos» que incidiu sobre as sociedades O. SGPS, S.A., P. - SGPS, S.A. e B. SPPS, S.A., abrangendo os exercícios de 2012 a 2014 (facto não controvertido que se extrai da «INFORMAÇÃO N.º DSIFAE/73/2018» de fls. 577 a 594 do PAT, a que correspondem fls. 694 a 708 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

B) Em 4.12.2015, no decurso da ação a que se refere a alínea A) supra, o Chefe de Divisão de Investigação da Fraude e de Ações Especiais emitiu o despacho n.º DI201500342, ao abrigo do disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 46.º do RCPITA, para realização de um procedimento de inspeção à Impugnante, A. C. F. C. C., destinado à «consulta, recolha e cruzamento de elementos», referente aos anos de 2013 e 2014 (cf. despacho junto como doc. 4 da p.i. a fls. 41 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

C) A Impugnante tomou conhecimento do despacho a que se refere a alínea B) supra em 21.12.2015 (cf. documento junto como doc. 4 da p.i. a fls. 41 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

D) Em 4.12.2015, no decurso da ação a que se refere a alínea A) supra, o Chefe de Divisão de Investigação da Fraude e de Ações Especiais emitiu o despacho n.º DI201500343, ao abrigo do disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 46.º do RCPITA, para realização de um procedimento de inspeção ao Impugnante, C. H. N. M. L. A., destinado à «consulta, recolha e cruzamento de elementos», referente aos anos de 2013 e 2014 (cf. despacho junto como doc. 3 da p.i. a fls. 40 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

E) O Impugnante tomou conhecimento do despacho a que se refere a alínea D) supra em 5.1.2016 (cf. documento junto como doc. 3 da p.i. a fls. 40 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

F) Em 9.12.2015, o Chefe de Divisão de Investigação da Fraude e de Ações Especiais emitiu os ofícios n.º DSIFAE/1584/2015 e n.º DSIFAE/1587/2015, dirigidos, respetivamente, à Impugnante e ao Impugnante, para «ao abrigo do princípio da colaboração prevista no art. 59º da Lei Geral Tributária (…) e dos artigos 9º e 48º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira (…) comparecer[em] na DSIFAE - Divisão de Investigação da Fraude e Acções Especiais (…) a fim de prestar esclarecimentos relacionados com a sua situação tributária» (cf. ofícios juntos como docs. 10 e 11 da p.i. a fls. 48 e 49 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

G) Em 21/12/2015, a Impugnante foi ouvida, na Divisão de Serviços de Investigação da Fraude e Ações Especiais, na qualidade de administradora e acionista da sociedade B., SGPS, S.A., constando do respetivo «AUTO DE DECLARAÇÕES» o seguinte:

«(…)





Original nos autos

(…)» (cf. «Auto de Declarações» junto como doc. 16 da p.i. a fls. 76 dos autos, a que corresponde o Anexo 5 do RIT a fls. 537 do PAT e a fls. 654 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

H) Em 5.1.2016, o Impugnante foi ouvido, na Divisão de Serviços de Investigação da Fraude e Ações Especiais, na qualidade de acionista da sociedade B., SGPS, S.A., constando do respetivo «AUTO DE DECLARAÇÕES» o seguinte:

«(…)



Originais nos autos

(…)» (cf. «Auto de Declarações» a que corresponde o Anexo 5 do RIT a fls. 315 e 316 do PAT e a fls. 430 e 431 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

I) Em 14.3.2018, a Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais emitiu a «INFORMAÇÃO N.º DSIFAE/73/2018» de cujo teor se extrai o seguinte:

«1. INTRODUÇÃO

1.1 Despacho

Em cumprimento dos Despachos n.°DI201500334, DI201500335 e DI201500336 exarados pelo Exmo. Senhor Chefe de Divisão da DIFAE, nos termos do disposto nos n.º s 4 e 5 do art. 46.° do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPITA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98 de 31/12, procedeu-se a uma ação de investigação externa de consulta, recolha e cruzamento de elementos, a incindir sobre os sujeitos passivos: O. SGPS SA, NIPC 503…, doravante designada por" O.”, P. - SGPS SA, NIPC 502…, doravante designada por "P." e B., S.G.P.S. S.A, NIPC 505 …, doravante designada por "B., com extensão aos anos de 2012, 2013 e 2014.

No decurso da ação foram abertos os Despachos nºs DI201500341, DI201500342, DI2015Q0343 e DI201500344 para recolha de elementos junto dos sujeitos passivos A. C. N. M. C. C., NIF: 215 …, A. C. F. C. C., NIF:201..., C. H. N. M. L. A., NIF: 213 … e J. N. M. C. F. C., NIF: 215 …, respetivamente.

1.2 Origem e objetivos da ação

A ação teve origem na proposta efetuada na informação n.º 653/2014, de 2014-12-30, da Divisão de Estudos e Informações (DEI), elaborada na sequência da receção de um relatório da UIF/NES, onde é referido que a sociedade anónima O., foi beneficiária em 23/12/2013, de uma transferência de € 2.800.000,00, oriunda do “BPN” com o descritivo "empréstimo".

No mesmo dia, foi pedida a emissão de um cheque visado no montante de € 2.515.000,00, a favor da sociedade “B.". No entanto, e de acordo com o relatório da UIF, os fundos em apreço foram mobilizados nos dois dias seguintes, na quase totalidade, para os sujeitos passivos: A. C. N. M. C. C., A. C. F. C. C., C. H. N. M. L. A. e J. N. M. C. F.C..

No esquema seguinte ilustram-se os movimentos financeiros:

Original nos autos

2. CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS PASSIVOS ENVOLVIDOS

2.1 – O. SGPS, S.A., NIPC 503 … (…)

2.2 – P. – SGPS SA, NIPC 502 … (…)

A P. era até agosto de 2009, detentora do capital social da B. Por outro lado a B. até 19/12/2013, data em que assinou um contrato de cessão de créditos e compra e venda de ações com a O., era acionista da P.

2.3 – B. SGPS SA, NIPC 505 … (…) relaciona-se com os seguintes sujeitos passivos:


Original nos autos

(…)

4. DILIGÊNCIAS EFETUADAS / FACTOS APURADOS

Tendo em conta os movimentos financeiros descritos na informação que originou a presente ação foram feitas as seguintes diligências, com o intuito de perceber:

- Que negócios estavam subjacentes às transferências efetuadas entre entidades;

- A que título, receberam em 07/01/2014, da B., os seguintes sujeitos passivos individuais e nos seguintes montantes, e se os mesmos deveriam ter sido sujeitos a tributação em sede de IRS.

Original nos autos

4.1. O., SGPS SA:

Foram recolhidos os documentos de suporte da entrada na conta da empresa, no banco S. T., da transferência de € 2 800 00,00 oriunda da M. H. LLC, que foi contabilizada como um recebimento de um suprimento da G., SGPS, SA. NIPC: 504…, sendo esta última acionista da O., conforme documento em anexo1 com 2 folhas.

Foram recolhidos os documentos de suporte da saída de € 2 515 000,00 para a B., que tem como justificação a compra dos créditos e das ações da P. e de 50% do capital social da Pa. - I. I., SA, NIPC: 506 338 355, das quais era detentora a B., conforme contrato de cessão de créditos e compra e venda de ações da P. e da Pa., em anexo 2 com 15 folhas. Este montante, corresponde à quantia paga com a assinatura do contrato, em 19/12/2013, sendo o contrato no montante de € 10 015 000,00.

4.2. B. SGPS, S.A:

Foram recolhidos, no escritório da contabilista certificada, R. C., os documentos contabilísticos, relacionados com a entrada do montante de € 2 515 000,00 em 07/01/2014 na conta da empresa referente à venda das ações e cessão de créditos da P. e Pa. à O., e o contrato de cessão de créditos e compra e venda de ações. Em anexo 3 com 1 folha o extrato bancário do D. B. AG com registo de entrada do cheque recebido da O..

O referido contrato está no anexo 2.

Foram também recolhidos os documentos contabilísticos que suportam as transferências efetuadas para C. A., J. C., A. C. C. e A. C. C., nomeadamente o extrato bancário e a Ata n° 3 da B., que constituem o anexo 4 com 3 folhas.

A referida Ata elaborada em 03/01/2014, quando reuniram os acionistas da sociedade bem como os membros do concelho de administração refere que " ...de acordo com o ponto único da ordem de trabalhos, iniciou a sessão propondo o reembolso dos suprimentos efetuados à sociedade pelos acionistas S. P. LLC e P. H. LLC os quais tiveram a permanência legal mínima prevista no n° 2 do artº 243º do Código das Sociedades Comercias, no montante de € 1 416 404,14 e de 944 269,40, respetivamente. Os montantes acima referidos serão transferidos diretamente para as contas bancárias dos detentores do capital social da S. P. LLC e P. H. LLC. Assim, os valores referentes à sociedade S. P. LLC serão transferidos para a conta do Dr C. H. N. M. L. A. e da Srª A. C. F.C. C. Os valores referentes à sociedade P. H. LLC serão transferidos para a Drª A. C. N. M. C. C. e da Srª J. N. M. C. F. C., respetivamente...”

Havendo necessidade de se confirmar, porque eram estas transferências tituladas por uma devolução de suprimentos das empresas S. P.LLC e P. H. LLC, foi contatado C. A. na qualidade de acionista e beneficiário das mesmas, tendo o mesmo informado que estes empréstimos foram efetuados pelos anteriores acionistas, a P. e E. C., em 2009 e 2010, tendo-nos apresentado os respetivos documentos de suporte, e ainda vários contratos para podermos verificar como chegaram à posse das ações os atuais acionistas e a sua relação com os beneficiários das transferências. (Anexo 5- Esquema com alterações da titularidade das ações da B. fornecido por C. A.) que resumimos no quadro seguinte:


Original nos autos

De salientar que nenhum dos beneficiários das transferências, são acionistas nem credores da B..

A B., Lda em 29/05/2009, foi transformada em sociedade anónima, e em 15/08/2009 E. C., adquiriu as ações e os créditos da B. à sua acionista P., ficando único acionista desta empresa. Anexam-se o balancete analítico de 31 de Dezembro de 2009 e o documento de suporte contabilístico desta transação, (anexo 6 com 4 folhas)

Em 17/06/2010, E. C. através de um contrato de compra e venda de ações vende 32 000 ações da empresa B. à empresa P. H. LLC e 48 000 ações à S. P. LLC ficando estas duas empresas detentoras de todas as ações da B.. Os contratos de venda das ações fazem menção ao facto das ações serem transmitidas com todos os direitos e obrigações incluindo os suprimentos e outros créditos de que E. C. era titular, e livres de quaisquer ónus ou encargos. Anexo 7- contratos de compra e venda de ações à P. H. LLC e à S. P. LLC com 6 folhas.

Em 28/04/2011, é feito um contrato de cessão de ações a título gratuito entre os possuidores do capital social da P. H. LLC, C. M. C. C. e A. M. N. M. C. e as suas filhas A. C. N. M. C. C. e J. N. M. C. F. C.onde os primeiros cedem a cada uma delas 50% da participação nesta sociedade, ou seja, metade nas ações e títulos de capital, a título gratuito.

Anexo 8 com 2 folhas.

No mesmo dia, 28/04/2011, é feito um contrato de cessão de ações a titulo gratuito entre os possuidores do capital social da S. P. LLC, E. M. C. C. e M. L. N. M. C. C. e A. C. F. C. C., filha de ambos e C. H. N. M. L. A., filho de M. L. C. onde os primeiros cedem a cada um dos segundos 50% da participação que detém nesta sociedade, ou seja, metade das ações e títulos de capital, a título gratuito. Anexo 9 com 3 folhas.

Apesar desta operação, mantem-se as sociedades S. P. LLC e P. H. LLC como únicas acionistas da B..

No decurso da recolha de elementos foram abertos Despachos em nome dos beneficiários das transferências efetuadas pela B. a título de reembolso de suprimentos aos acionistas.

DI201500341- A. C. N. M. C. C.;

DI2Q1500342- A. C. F.C. C.;

DI201500343- C. H. N. M. L. A.;

DI201500344- J. N. M. C. F.C..

No âmbito destes procedimentos de investigação foram estes contribuintes ouvidos em Auto de Declarações, tendo declarado que:

A. C. F. C. C., NIF:201… e C. H. N. M. L. A., NIF:213 … declaram que o montante recebido, respeitou a uma restituição de suprimentos, feitos pelo seu pai e padrasto respetivamente, E. C. à empresa B., que adquiriram por doação efetuada por o mesmo e pela sua mãe. Anexam-se os dois Auto de Declarações, anexo 10 com 3 folhas.

A. C. N. M. C. C., NIF:215…e J. N. M. C. F. C., NIF:215… declaram que o montante recebido, respeitou a uma restituição de suprimentos, feitos por o seu tio E. C. e pelo seu pai C. C. à empresa B., que adquiriram por doação efetuada pelos seus pais.

Anexam-se os dois Autos de Declarações, anexo 11 com 2 folhas.

De acordo com a ata n.º 3, de 13 de Janeiro de 2014, no ponto único da ordem de trabalhos, foi feita proposta do reembolso dos suprimentos efetuados à B. pelos acionistas S. P. LLC e P. H. LLC respetivamente do montante de € 1 416 404,14 e de € 944 269,40.

No entanto a referida ata n° 3, também refere que, os montantes acima mencionados, vão ser transferidos diretamente para as contas bancárias dos detentores do capital social destas sociedades, no caso da S. P. para a conta de C. H. N. M. L. A. e A. C. F. C. C., no caso da P.H. para A. C. N. M. C. C. e J. N. M. C. F. C..

Na contabilidade da B. encontram-se registadas as transferências para as contas destes quatro indivíduos a título de restituição de suprimentos da S. P. e da P. H.

Após recolha de toda esta informação, foi elaborada a informação N° DSIFAE/107/2016 de 18/02/2016, enviada por ofício N° 114/2016 de 22/02/2016 para a Direção de Serviços de Relações Internacionais a solicitar um pedido de informações nos termos do artº 28º da CDT celebrada entre Portugal e os E.U.A., uma vez que as empresas S. P. LLC, NIPC 980… e P. H. LLC, NIPC 980 … ambas constituídas de acordo com a Lei das Sociedades de Delaware a 5 de Dezembro de 2008, com os números de sociedade 436… respetivamente, sediadas em 1.. N. M. S., suite 8.., W.de 19…, Estados Unidos da América, são as únicas acionistas da B., nos seguintes termos:

a. Confirmação da existência destas duas empresas;

b. Descrição da atividade desenvolvida por estas duas empresas;

c. Comportamento fiscal e existência de contabilidade por forma a que possa ser confirmada a anulação dos suprimentos efetuados à B. por cada uma destas empresas;

d. A verificação na contabilidade das sociedades da existência de empréstimos efetuados pelos seus acionistas ou no caso de não se tratarem de restituição de empréstimos a que título os montantes são transferidos para os mesmos, assim discriminado por sociedade e por acionistas.

A resposta a estas informações, foi remetida através do oficio n° 16462 de 22-12-20,16 da Direção de Serviços de Relações Internacionais, à qual foram juntos vários anexos, de onde consta a informação de que as referidas sociedades deixaram de estar registadas em Delaware e que passaram a estar registadas em Malta, desde 6 de Setembro de 2012.

Pelo atrás referido, através da informação n° DSIFAE/23/2017 de 06/01/2017, solicitou-se o pedido de troca de informações às autoridades fiscais de Malta, ao abrigo da Diretiva,2011/16/EU.

Em 09/10/2017 foi recebida resposta parcial, referente à empresa S. P. LLC contudo a DSRI referiu que ia reforçar o pedido de informação, não tendo até à data sido enviada qualquer resposta. Os elementos remetidos não são suficientes para podermos confirmar a existência de suprimentos efetuados pelos seus acionistas ou saber a que título foram transferidos estes valores para os mesmos.

Até à presente data, ainda não foi recebida mais qualquer informação destas duas empresas.

5. CONCLUSÕES

Sendo os objetivos da ação, saber como foram registados, contabilisticamente, os movimentos referentes às entradas e saídas de dinheiro nas 3 sociedades: O. SGPS, SA, P. - SGPS, SA e B. SGPS, SA, averiguar a que título é que a B. recebeu € 2 515 000,00 e comprovar as afirmações dos beneficiários das transferências que justificam a origem desses fundos como restituição de suprimentos por parte da empresa, conclui-se que todas as transferências se encontravam devidamente comprovadas à exceção das transferências diretas para os detentores do capital das empresas S. P. LLC e P. H.LLC., isto é, deveriam ser estas duas empresas as beneficiárias destas transferências, para restituição dos suprimentos que tinham efetuado à B., e que eventualmente poderiam transferir para os seus acionistas, como reembolso de suprimentos ou como dividendos, na sua esfera, se a isso tivessem direito.

Em resposta parcial ao pedido de troca de informações efetuado às autoridades fiscais dos EUA, uma vez que estas empresas estavam sediadas nesse país no estado de Delaware, foi informado que as referidas sociedades deixaram de estar registadas em Delaware e passaram a estar registadas em Malta.

Assim, solicitou-se o pedido de troca de informações às autoridades fiscais de Malta, que remeteram uma resposta parcial respeitante à empresa S. P. LLC, que não nos possibilita chegar a nenhuma conclusão, dado que apenas respondem à questão da existência da sociedade.

Não obstante ainda não se ter a resposta completa aos pedidos de informação, que nos permitiria confirmar a existência de suprimentos nas sociedades S. P. LLC e P. H., LLC efetuados pelos seus acionistas ou que houve distribuição de dividendos, pelos elementos conhecidos até agora, os detentores dos suprimentos na B. são as empresas S. P. LLC e P. H., LLC e não os seus acionistas.

As transferências para as suas contas afigura-se tratarem-se de incrementos patrimoniais positivos, tributados em sede de IRS nos termos do nº1 artº 5º do CIRS, já que se consideram rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação com exceção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.

Original nos autos

Razão porque, vamos remeter esta informação para a Direção de Finanças de Setúbal, área do domicílio fiscal dos quatro beneficiários destas transferências, para que a mesma promova as diligências necessárias para cobrança do IRS, que se afigure devido para os sujeitos passivos, no ano de 2014. Informa-se também que, quando a DSRI enviar resposta ao pedido de cooperação, a mesma será enviada para essa Direção de Finanças.

6. PROPOSTAS

Face ao anteriormente descrito, propõe-se o envio da informação e anexos:

- À Divisão de Estudos e Informações (DEI), para conhecimento.

- À Direção de Finanças de Setúbal, Direção de Finanças competente, para que promova os procedimentos inspetivos, para o ano de 2014, que se mostrem devidos para os S.P.s:

A. C. N. M. C. C., NIF: 215…;

A. C. F. C. C., NIF: 201 …;

C. H. . M. L. A., NIF: 213…;

J. N. M. C. F. C., NIF: 215…

(…)» (cf. «INFORMAÇÃO N.º DSIFAE/73/2018» de fls. 577 a 594 do PAT e de fls. 694 a 708 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

J) Em 14.5.2018, a Subdiretora Geral da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais exarou despacho de concordância com «INFORMAÇÃO N.º DSIFAE/73/2018» a que se refere a alínea anterior (cf. despacho exarado na «INFORMAÇÃO N.º DSIFAE/73/2018» a fls. 577 do PAT e a fls. 694 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

K) Com a «INFORMAÇÃO N.º DSIFAE/73/2018» foram remetidos à Direção de Finanças de Setúbal os seguintes «ANEXOS»:

«1 – “Nota de Lançamento” e extrato banco S. T. (2 folhas)

2 – “Nota de Lançamento”, Contrato de Cessão de Créditos e Compra e Venda de Ações e cópia de cheque (15 folhas)

3 – Extrato Bancário do D. B. AG com registo de entrada do cheque recebido da O.- 92 (1 folha)

4 – Extrato Bancário do D. B. AG com os movimentos das transferências e Ata nº 3 (3 folhas)

5 – Esquema com alterações da titularidade das ações da B. (1 folha)

6 – Balancete analítico de 31/12/2009 e documento de suporte contabilístico da compra das ações da B. (4 folhas)

7 – Contratos de compra e venda de ações à P. H. LLC e à S. P. LLC (6 folhas)

8 – Contrato de cessão de ações da P. H. LLC a título gratuito (2 folhas)

9 – Contrato de cessão de ações da S. P. LLC a título gratuito (3 folhas)

10 - Autos de Declarações dos beneficiários das transferências (3 folhas)

11 – Autos de Declarações dos beneficiários das transferências (2 folhas)»

(cf. Lista de «ANEXOS» a fls. 591 do PAT e a fls. 708 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

L) Em 15.5.2018, o Chefe de Divisão de Investigação da Fraude e de Ações Especiais dirigiu aos Impugnantes ofícios por via dos quais comunicou «que a acção inspectiva para consulta, recolha e cruzamento de elementos» referente aos Despachos n.ºs DI201500342 e DI2015Q0343 «foi concluída», juntando cópia das respetivas notas de diligência (cf. facto não controvertido - artigo 4.º da petição inicial - ofício e nota de diligência juntos como doc. 7 da petição inicial a fls. 44 e 45 dos autos, cujo teor os Impugnantes atestam ser idêntico ao dos ofícios que receberam, que se dão por integralmente reproduzidos);

M) Em 3.12.2018, foi emitida, pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal, a Ordem de Serviço n.º OI201801692 para realização de uma ação de inspeção externa, de âmbito geral, à Impugnante A. C. F. C. C., referente ao ano de 2014 (cf. «Ordem de Serviço» junta como doc. 6 da p.i. a fls. 43 dos autos, constando, igualmente, de fls. 575 do PAT a que corresponde fls. 692 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

N) Em 3.12.2018, foi emitida, pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal, a Ordem de Serviço n.º OI201801693 para realização de uma ação de inspeção externa, de âmbito geral, ao Impugnante C. H. N. M. L. A., referente ao ano de 2014 (cf. «Ordem de Serviço» junta como doc. 5 da p.i. a fls. 42 dos autos, constando, igualmente, de fls. 354 do PAT a que corresponde fls. 653 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

O) Os procedimentos de inspeção a que se referem as alíneas M) e N) supra tiveram origem na «proposta da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais» constante da «INFORMAÇÃO N.º DSIFAE/73/2018» a que se refere a alínea I) supra (facto não controvertido, que se extrai, igualmente, do ponto II.2. dos Relatórios de Inspeção Tributária de fls. 152 a 176 do PAT e de fls. 355 a 379 do PAT, a que correspondem, respetivamente, fls. 265 a 289 dos autos e fls. 470 a 496 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

P) Em 7.12.2018, a Impugnante assinou a Ordem de Serviço n.º OI201801692 a que se refere a alínea M) supra (cf. «Ordem de Serviço» junta como doc. 6 da p.i. a fls. 43 dos autos, constando, igualmente, de fls. 575 do PAT a que corresponde fls. 692 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

Q) Em 10.12.2018, o Impugnante assinou a Ordem de Serviço n.º OI201801693 a que se refere a alínea N) supra (cf. «Ordem de Serviço» junta como doc. 5 da p.i. a fls. 42 dos autos, constando, igualmente, de fls. 354 do PAT a que corresponde fls. 653 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

R) Em 7.12.2018, no âmbito da ação de inspeção efetuada ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI201801692, foi a Impugnante notificada para apresentar, na Direção de Finanças de Setúbal, os seguintes elementos:

«Justificação de a que título recebeu, no ano de 2014, a quantia de € 300.000,00 através de uma transferência bancária efetuada a partir da conta com o NIB nº 00……..33, titulada pela sociedade “B. S.G.P.S., S.A.”, no montante de € 300.000,00, efetuada por aquela sociedade no dia 08-01-2014.

Mais se solicita que com a justificação sejam apresentados todos os documentos de suporte que demonstrem inequivocamente os factos invocados. (…)» (cf. Anexo 3 do RIT a fls. 385 do PAT, a que corresponde fls. 502 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

S) Em 10.12.2018, no âmbito da ação de inspeção efetuada ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI201801693, foi o Impugnante notificado para apresentar, na Direção de Finanças de Setúbal, os seguintes elementos:

«Justificação de a que título recebeu, no ano de 2014, a quantia de € 950.000,00 através de duas transferências bancárias efetuadas a partir da conta com o NIB nº 00…….33, titulada pela sociedade “B. S.G.P.S., S.A.”, nos montantes de € 650.000,00 e € 300.000,00, efetuadas por aquela sociedade nos dias 07-01- 2014 e 08-01-2014, respetivamente.

Mais se solicita que com a justificação sejam apresentados todos os documentos de suporte que demonstrem inequivocamente os factos invocados. (…)» (cf. Anexo 3 do RIT a fls. 183 do PAT, a que corresponde fls. 296 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

T) Em 18.12.2018, no âmbito da ação de inspeção efetuada ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI201801692, a Impugnante declarou proceder «à entrega de um documento, com 148 páginas numeradas e rubricadas, justificativo da transferência no valor de € 300.000,00, efetuada pela “B. SGPS, S.A.”, em 08-01-2014», que corresponde ao Anexo 4 do RIT (cf. «Auto de Declarações» e documento a ele anexo, de fls. 387 a 536 do PAT e de fls. 504 a 653 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

U) Em 20.12.2018, no âmbito da ação de inspeção efetuada ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI201801693, o Impugnante declarou proceder «à entrega de um documento, composto por 128 páginas rubricadas, que suportam os recebimentos de € 650.000,00 e € 300.000,00 da “B. SGPS, S.A.”, nos dias 07 e 08 de janeiro de 2014», que corresponde ao Anexo 4 do RIT (cf. «Auto de Declarações» e documento a ele anexo de fls. 185 a 314 do PAT e de fls. 300 a 429 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

V) Em 21.1.2019, no âmbito das ações de inspeção efetuadas ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693, foram os Impugnantes notificados para apresentar, no Serviço de Finanças do Montijo, «os seguintes elementos, ao abrigo do artigo 59º da Lei Geral Tributária (LGT) e artigo 9º do Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária e Aduaneira:

a) Balancetes analíticos dos períodos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 da sociedade S. P., LLC;

b) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de aquisição da posição de capital na B., SGPS, S.A., realizada em 17 de Junho de 2010, bem como de todos os direitos/obrigações adquiridos com essa transação;

c) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de recebimento do montante de € 1.416.406,14, através de pagamento deliberado pela B., SGPS, S.A., em 03 de Janeiro de 2014;

d) Deliberação da sociedade S. P., LLC de restituição do montante de € 1.416.404,14, aos accionistas;

e) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação pagamento do montante de € 1.416.404,14, aos acionistas;

Os elementos referidos nas alíneas a) a e) são necessários ao correto enquadramento dos rendimentos por si auferidos, pelo que a falta de prova poderá determinar o enquadramento no artigo 87º nº 1 al. f), conjugado com o artigo 89º nº 5, ambos da LGT, sem prejuízo de eventual notificação que se mostre devida para esse efeito.

(…)» (cf. Anexos 11 de cada um dos RIT a fls. 332 e 553 do PAT, a que correspondem fls. 447 e 670 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

W) Em 26.2.2019, ao abrigo do Despacho Externo n.º DI201900277, de 22.2.2019, foi a sociedade B., SGPS, S.A., na pessoa da sua Administradora, A. C. F. C. C., notificada para apresentar no Serviço de Finanças do Montijo, os seguintes documentos:

«- Cópia dos documentos comprovativos dos movimentos financeiros subjacentes ao registo contabilístico das seguintes operações registadas na contabilidade da sociedade, com data de 2010-07-31:

a) Débito na conta “26702 – E. C.” e crédito na conta “26703 – S. P.”, no valor de € 1.416.404,14;

a) Débito na conta “26702 – E. C.” e crédito na conta “26704 – P. H.”, no valor de € 944.269,40;

(…)» (Anexo 9 do RIT a fls. 328 do PAT, a que corresponde fls. 443 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

X) Em 26.2.2019, no âmbito da ação de inspeção efetuada ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI201801693, foi elaborada «NOTIFICAÇÃO», dirigida ao Impugnante, de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)

Não tendo sido entregues em 19 de Fevereiro de 2019, os documentos justificativos do:

a) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de aquisição da posição de capital na B., SGPS, S.A., realizada em 17 de Junho de 2010, bem como de todos os direitos/obrigações adquiridos com essa transação;

b) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de recebimento do montante de € 1.416.406,14, através de pagamento deliberado pela B., SGPS, S.A., em 03 de Janeiro de 2014;

c) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de pagamento do montante de € 1.416.404,14, aos acionistas; conforme solicitado por notificação de 21 de Janeiro de 2019.

Fica notificado para, além dos elementos em falta acima referidos, proceder à entrega dos comprovativos dos movimentos financeiros identificados no “Note to the Financial Statements for the year ending 31 December 2011” entregue em 19 de Fevereiro de 2019, cuja cópia se anexa e faz parte integrante da presente notificação:

4 Intercompany debtors: valores de 1.416.404 euros e de 200.000 euros;

5 Shareholders Loan: valor de 1.986.404 euros;

(…)» (cf. Anexo 13 do RIT a fls. 344 do PAT, a que corresponde fls. 459 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

Y) Em 8.3.2019, no âmbito da ação de inspeção efetuada ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI201801693, foi o Impugnante ouvido, nos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal, constando do respetivo «AUTO DE DECLARAÇÕES» o seguinte:

«(…)

Atendendo à notificação feita pelos Serviços de Inspeção Tributária em vinte e seis de fevereiro de 2019, declara que não é possível proceder à entrega dos documentos justificativos solicitados, uma vez que não se encontra em posse dos mesmos, desconhecendo se os mesmos existem.

E mais não declarou.

(…)» (cf. Anexo 14 do RIT a fls. 346 do PAT, a que corresponde fls. 461 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

Z) Em 8.3.2019, ao abrigo do Despacho Externo n.º DI201900277, de 22.2.2019, a foi ouvida a Impugnante, na qualidade de Administradora da sociedade B., SGPS, SA, constando do respetivo «AUTO DE DECLARAÇÕES» o seguinte:

«(…)

Atendendo à notificação feita pelos Serviços de Inspeção Tributária em vinte e seis de fevereiro de 2019, declara que não é possível proceder à entrega dos documentos justificativos solicitados, uma vez que os mesmos não existem, por não se terem verificado movimentos financeiros subjacentes aos registos contabilísticos efetuados na contabilidade da sociedade em 2010-07-31, conforme contratos previamente entregues no âmbito do procedimento inspetivo, por:

a) Débito na conta “26702 – E. C.” e crédito na conta “26703 – S. P.”, no valor de € 1.416.404,14;

a) Débito na conta “26702 – E. C.” e crédito na conta “26704 – P. H.”, no valor de € 944.269,40;

E mais não declarou.

(…)» (cf. Anexo 9 do RIT a fls. 327 do PAT, a que corresponde fls. 442 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

AA) Em 17.5.2019, no âmbito da ação de inspeção efetuada à Impugnante a coberto da Ordem de Serviço n.º OI201801692, foi elaborado, pela Divisão de Inspeção Tributária II, da Direção de Finanças de Setúbal, o «RELATÓRIO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA», de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1 SITUAÇÃO DE FACTO

A. C.recebeu, através de transferência bancária para conta por si titulada no B. B. B., no dia 08 de Janeiro de 2014, o valor de € 300.000,00, provenientes da conta com o IBAN PT50 00….3 3, titulada pela B. que não foi declarado para efeitos fiscais na declaração de IRS mencionada no ponto anterior.

Por forma a apurar a que título foi recebido por A. C. aquele montante e consequentemente o motivo justificativo do não englobamento do mesmo na declaração de rendimentos Modelo 3 apresentada, foi o sujeito passivo notificado, em 07-12-2018, para apresentar justificação documental do motivo pelo qual o havia recebido.

III.2 JUSTIFICAÇÃO E ANÁLISE DOS FACTOS INVOCADOS PELO SUJEITO PASSIVO

Em 18-12-2018, A. C., entregou um conjunto de documentos que justificam, na sua ótica, os valores recebidos, mencionando que a explicação para o recebimento já havia sido dada na qualidade de acionista e administradora da B. e que resumidamente, tal transferência seria “uma restituição de suprimentos, que o seu pai o Sr. E. C., fez à Empresa”, como consta do auto de declarações.

Parte dos documentos apresentados, para esclarecer a situação em apreço, trata-se de cópias de documentos contabilísticos das sociedades B. SGPS, SA (páginas 01 a 82 da numeração do sujeito passivo) e P., SGPS, SA (páginas 83 a 148 da numeração do sujeito passivo).

No que respeita aos documentos da B., trata-se de extratos das contas POC “2521 - Accionistas (sócios) - Empréstimos”, e documentos de suporte.

No que respeita aos documentos da P., trata-se de extratos das contas POC “4131 - Empréstimos de financiamento - Empresas do grupo", e documentos de suporte.

Assim, da análise dos elementos contabilísticos, exibidos por A. C. constatou-se que ao longo do tempo, foram efetuados suprimentos pelos sócios/acionistas da B., SGPS, SA, nomeadamente pela P., SGPS, SA, que acumularam um valor de € 2.360.673,54.

Esses suprimentos, através de vários negócios, acabaram por se aglutinar apenas em nome do Sr. E. C. que detinha a totalidade das ações da B., pois, através do balancete analítico do ano de 2009 da B., bem como do extrato da conta POC “25 - Accionistas (Sócios)" é possível verificar que, através de movimento efetuado com data de 15-08-2009, foi saldada a conta “252101 – P., SGPS”, através do débito do valor de € 2.360.673,54 e creditada a conta "252102 - Sr. E. C." no mesmo montante.

Através daquele movimento foi centralizado na conta "252102 - Sr. E. C.” todo o valor que a B. evidenciava contabilisticamente como empréstimos/suprimentos do sócio à sociedade, em 31 de Dezembro de 2009.

Durante a ação de inspeção foi possível apurar que posteriormente, em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. C. vendeu a sua participação na B., da qual detinha as 80 mil ações que compunham o capital social, a duas sociedades com sede nos Estados Unidos da América, transmitindo as ações “com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular e livres de quaisquer ónus ou encargos.”, respetivamente:

48.000 ações, correspondente a 60% do capital social à S. P., LLC, com o número de pessoa coletiva equiparada 436… e sede em Delaware - EUA, pelo valor de € 300.000,00;

32.000 ações, correspondente a 40% do capital social à P. H., LLC, com o número de pessoa coletiva equiparada 980… e sede em Delaware - EUA, pelo valor de € 200.000,00;

Na sequência da alteração da titularidade do seu capital social (transmissão de E. C. para a S. P., LLC e P. H., LLC), em 31 de Julho de 2010, a B. fez refletir na sua contabilidade, a transferência dos empréstimos/suprimentos efetuados por E. C., para as sociedades S. P., LLC e P. H., LLC, respetivamente na proporção da participação social que haviam adquirido, através de 2 movimentos, evidenciados nos extratos das subcontas da conta SNC "26 - Acionistas/sócios” da B., debitando o saldo da conta SNC "26702 – E. C.", e creditando as contas SNC “26703 – S. P." e “26704 – P. H.”, como se mostra (Com a alteração de normativo contabilístico ocorrido, passando do POC para o SNC, as contas "25 - Accionistas (Sócios)’’ passaram a ser designadas por "26 - Acionistas/Sócios".):

Original nos autos

Dado que através destes registos contabilísticos aparentava terem sido reembolsados os suprimentos prestados pelo Sr. E. C. e simultaneamente terem sido prestados novos suprimentos à B., no mesmo montante, por cada uma das sociedades, foi notificada o sujeito passivo, em 26 de Fevereiro de 2019, na qualidade de administradora da B., ao abrigo do Despacho n° DI201900277 desta Direção de Finanças, para apresentação dos comprovativos dos movimentos financeiros subjacentes aos registos contabilísticos acima descritos.

Em resposta à referida notificação, a administradora da B. não apresentou os elementos solicitados, tendo ainda afirmado, em auto de declarações, que aos referidos movimentos contabilísticos não corresponderam quaisquer movimentos financeiros, ou seja, não houve lugar ao reembolso dos suprimentos feitos pelo Sr. E. C. nem à constituição de novos suprimentos, nos montantes registados, por parte das sociedades compradoras.

A inexistência dos supracitados movimentos financeiros e as declarações prestadas pela administradora da B. corroboram o estipulado no contrato de compra e venda outorgado entre o Sr. E. C. e as sociedades S. P., LLC e P. H., LLC, no qual é feita a transmissão das ações da B.

“com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular e livres de quaisquer ónus ou encargos.”, pelo preço respetivamente de 300 mil e 200 mil euros.

Assim, o direito constituído a favor da S. P., LLC e da P. H., LLC, refletido na contabilidade da sociedade B., produziu, na esfera daquelas sociedades, um incremento patrimonial em montante idêntico à diferença entre o valor dos direitos adquiridos e o valor do custo de aquisição da participação social, ou seja, € 1.416.404,14 para a S. P., LLC e € 944,269,40 para a P.- H., LLC.

Face a esta conclusão tornou-se premente averiguar qual o tratamento contabilístico dado, pelas sociedades S. P., LLC e da P. H., LLC, à operação de aquisição da participação social pelo que foi necessário notificar a sociedade S. P., LLC, na pessoa do detentor do seu capital social.

Atendendo que se havia verificado que por contrato de cessão de ações a título gratuito, assinado a 28 de Abril de 2011, E. M. C. C. e M. L. N. M. C. C. cederam de forma gratuita o capital da S. P., LLC a C. H. N. M. L. A. (filho) e A. C. F. C. C. (filha) e, ficando cada um deles em posse de 50% do capital, foi notificada esta última, em 21 de Janeiro de 2019, para apresentar os seguintes elementos:

a) Balancetes analíticos dos períodos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 da sociedade S. P., LLC;

b) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de aquisição da posição de capital na B., SGPS, S.A., realizada em 17 de Junho de 2010, bem como de todos os direitos/obrigações adquiridos com essa transação;

c) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de recebimento do montante de € 1.416.404,14, através de pagamento deliberado pela B., SGPS, S.A., em 03 de Janeiro de 2014;

d) Deliberação da sociedade S. P., LLC de restituição do montante de € 1.416.404,14, aos acionistas;

e) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de pagamento do montante de€ 1.416.404,14, aos acionistas;

O sujeito passivo referiu que não tinha esses documentos na sua posse e que teria que solicitar o seu envio ao escritório da sociedade, em Malta, para onde foi transferida a sua sede, em 06 de Setembro de 2012.

Foi a data sucessivamente adiada, por não existirem os documentos solicitados e estarem a ser elaborados pela S. P., LLC, tendo, no dia 19 de Fevereiro de 2019, a Sra. A. C. procedido à entrega de um documento, composto por 9 páginas, em resposta à notificação de 21 de Janeiro de 2019.

Da análise dos documentos entregues ressalta a não entrega de qualquer dos documentos solicitados em b), c) e e), sendo que relativamente à alínea d) apenas foi entregue uma declaração, subscrita pelos acionistas da S. P., LLC, informando que iriam proceder ao levantamento dos suprimentos diretamente a partir da B..

Resulta também da análise dos documentos que, no ano de 2010, segundo informação constante no “S. P., Limited Notes to the Financial Statements" que constitui a página 5 da numeração efetuada pelo sujeito passivo, que:

A participação financeira está refletida pelo valor de € 280.180, no ponto “2 INVESTMENTS”;

“4 INTERCOMPANY DEBTORS The company has made a loan to B. SGPS SA which is unsecured, interest free with repayment date unspecified”, ou seja, em tradução livre da nossa autoria, a sociedade S. P., LLC fez à B. um empréstimo, livre de juros, sem garantia e sem data de retorno estabelecida, no montante de € 1.416.404;

"5 SHAREHOLDERS LOAN The shareholders loan is unsecured and interest free with repayment date unspecified”, ou seja, em tradução livre da nossa autoria, a sociedade S. P., LLC recebeu um empréstimo dos sócios, livre de juros, sem garantia e sem data de retorno estabelecida, no montante de € 1.986.404;

"6 CALLED UP SHARE CAPITAL (...) Nominal value USD 1.000”, ou seja, em tradução livre da nossa autoria, o valor nominal do capital social é de mil dólares americanos. Note-se que não se encontra refletido nesta rubrica qualquer outra valorização, nomeadamente de resultados transitados ou outras componentes de capital.

Ora da leitura destas demonstrações financeiras retira-se o seguinte:

- a sociedade S. P., LLC, em 2010, aquando da aquisição de 60% do capital social da B., registou o seu direito a receber desta participada os suprimentos que E. C. lhe havia prestado até 2009, direito esse que veio nesse momento à sua posse, a título gratuito;

- esse direito não se constituiu por ter ela própria prestado os suprimentos;

- o direito não foi reconhecido tendo como contrapartida uma conta de capital, representando um incremento patrimonial, mas sim como um empréstimo dos seus sócios, que à data eram E. M. C. C.e M. L. N. M. C. C., situação nunca invocada e demonstrada;

Estas demonstrações financeiras, relembramos, são contrárias ao estipulado no contrato de compra e venda outorgado entre o Sr. E. C. e a sociedade S. P., LLC, que estipula que é feita a transmissão das ações da B. "com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular e livres de quaisquer ónus ou encargos.", pelo preço de 300 mil, bem como, ao declarado pela administradora da B., que referiu não ter havido movimento financeiro subjacente aos lançamentos contabilísticos efetuados em 2010, ou seja, a S. P., LLC não concedeu qualquer empréstimo ou prestou qualquer suprimento à B.

Face à incongruência detetada, e atendendo à informação constante nos documentos disponibilizados, foi novamente notificada em 26 de Fevereiro de 2019, o sujeito passivo A. C. para apresentação dos elementos não apresentados na anterior notificação efetuada:

a) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de aquisição da posição de capita! na B., SGPS, S.A., realizada em 17 de Junho de 2010, bem como de todos os direitos/obrigações adquiridos com essa transação;

b) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de recebimento do montante de € 1.416.404,14, através de pagamento deliberado pela B., SGPS, S.A., em 03 de Janeiro de 2014;

c) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de pagamento do montante de € 1.416.404,14, aos acionistas;

E ainda para proceder à entrega dos comprovativos dos movimentos financeiros identificados no "Notes to the Financial Statements for the year ending 31 December 2011" entregue em 19 de Fevereiro de 2019, com a seguinte descrição e montantes:

"4 Intercompany debtors: valores de 1.416.404 euros e de 200.000 euros";

"5 Shareholders loan: valor de 1.986.404 euros”;

Em 08 de Março de 2019 o sujeito passivo, em auto de declarações, referiu não ser possível proceder à entrega dos solicitados justificativos, por não os ter em sua posse e desconhecer se os mesmos existem.

Quanto à origem dos montantes recebidos da B. pelo sujeito passivo, constatou-se ainda, no decurso da ação de inspeção, que os mesmos resultaram da subscrição de um contrato de cessão de créditos e compra e venda de ações, realizado entre a B. e a O. SGPS, SA, em 19 de Dezembro de 2013 e em que a primeira recebeu um pagamento no valor de € 2.515.000,00, referente à primeira tranche prevista nesse contrato.

Na sequência do recebimento daquele montante foi, em 03 de Janeiro de 2014, deliberado em assembleia geral da B. o reembolso dos alegados suprimentos efetuados pelos acionistas, nos montantes de € 1.416.404,14 e € 944.269,40, respetivamente.

Nessa mesma deliberação é referido que as transferências são feitas diretamente para as contas dos detentores do capital social da S. P., LLC e da P. H., LLC, não sendo percetível em que montantes e porque motivos, “(…) Assim, os valores referentes à sociedade S. P., LLC serão transferidos para a conta do Dr. C. H. N. M. L. A. e da Sr.ª A. C. F. C. C.. Os valores referente à sociedade P. H., LLC serão transferidos para a Dr.a A. C. N. M. C. C. e da Sr.a J. N. M. C. F. C., respetivamente. (…)”.

Da análise de todos estes elementos verificou-se ainda que os montantes transferidos para as contas dos detentores do capital social de cada uma das sociedades, supra identificados, são diferentes dos que constam em acta, sendo que no total os valores transferidos ascenderam a € 2.507.500,00 quando a acta faz referência ao valor de € 2.360.673,54.

Concretizando, a acta menciona um reembolso no valor de € 1.416.404,14 para a S. P., LLC, mas na realidade a transferência foi de € 1.250.000,00, sendo € 950.000,00 para C. A. e € 300.000,00 para A. C..

III.3 CONCLUSÕES DA ANÁLISE AOS DOCUMENTOS RECOLHIDOS

Em face de tudo o que foi referido anteriormente, nomeadamente a análise aos documentos entregues pelo sujeito passivo e da verificação de outros elementos em posse dos serviços, das declarações escritas prestadas e das informações verbais trocadas com o técnico de inspeção, foi possível concluir o seguinte:

Em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. M. C. C. era detentor da totalidade do capital da B., SGPS, SA;

Encontrava-se registado na contabilidade da .B, SGPS, SA, a favor do Sr. E M. C. C., um crédito, por suprimentos prestados, no valor de € 2.360.673,54;

Em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. M. C. C. vendeu a totalidade do capital da B., SGPS, SA, sendo que 60% desse capital, representado por 48.000 ações, foram vendidas à S. P., LLC;

Com a venda do capital social, foram também transferidos para a adquirente “todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos" que o Sr. E. M. C. C. era detentor na B., como consta do contrato de compra e venda, sem que tenha havido qualquer pagamento por parte da S. P., LLC para além do valor atribuído à participação social;

Não existiu, subjacente àquela aquisição feita pela S. P., LLC, qualquer movimento financeiro entre as duas sociedades, tendo a adquirida B., apenas, movimentado contabilisticamente as contas de suprimentos em nome de E. C., passando o correspondente a 60% desse valor para crédito da adquirente S. P., LLC, por indicação do vendedor no contrato de venda, ou seja por E. C.;

Por doação feita em 28 de Abril de 2011, o sujeito passivo C. A. passou a deter 50% do capital social da S. P., LLC;

Após notificado o sujeito passivo para o efeito, não foi invocado nem ficou provado que o Sr. E. C. e ou a Sra. M. L. C. tenham prestado suprimentos à S. P., LLC;

Não foi invocado e consequentemente provado pelo sujeito passivo ter sido feito, por si, qualquer empréstimo ou prestação de suprimentos à S. P., LLC;

Por outro lado, se o motivo do recebimento, em apreço, por parte de A. C., do montante total de €300.000,00, fosse "para restituição de suprimentos, que o seu pai o Sr. E. C., fez à Empresa", conforme a mesmo afirmou em auto de declarações, na qualidade de acionista da B., como prova não foi apresentado qualquer contrato de mútuo entre a S. P., LLC e a B., S.G.P.S., S.A., nem qualquer comprovativo de movimento financeiro entre estas duas sociedades, nem comprovativo de pagamento de Imposto de Selo devido à prestação daquele mútuo, se tivesse, de facto, existido. Esse contrato teria que ser feito por escritura pública, nos termos do Artigo 143° do Código Civil, e à sua inobservância é aplicada a regra do artigo 364° do mesmo código, com a consequência de a falta importar a invalidade do contrato, conforme dispõe o artigo 219° daquele código;

Apenas poderia haver reembolso aos sócios se esses tivessem prestado suprimentos à S. P., LLC, mas tal situação nunca foi invocada ou demonstrada documentalmente através de movimentos financeiros.

III.4 ENQUADRAMENTO JURÍDICO, CONTABILÍSTICO E FISCAL DA SITUAÇÃO DE FACTO

O Código das Sociedades Comerciais, no seu artigo 243°, n° 1, considera como contrato de suprimento “(...) o contrato pelo qual o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível, ficando aquela obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade, ou pelo qual o sócio convenciona com a sociedade o diferimento do vencimento de créditos seus sobre ela, desde que, em qualquer dos casos, o crédito fique tendo carácter de permanência.”

Nos termos dos n.ºs 2 e 6 do mesmo artigo refere-se que o prazo de reembolso será superior a um ano sendo que a validade do contrato não depende de qualquer forma especial, pelo que não terá, forçosamente, de ser reduzido a escrito.

Ainda no mesmo artigo, no n° 5, é referido que fica sujeito ao regime de crédito de suprimento o crédito de terceiro contra a sociedade que o sócio adquira por negócio entre vivos, desde que no momento da aquisição se verifique alguma das circunstâncias previstas nos n°s 2 e 3.

Quanto à cessão dos créditos resultantes de um contrato de suprimento, a doutrina entende pacificamente que tal crédito pode ser cedido nos termos gerais de direito e sem dependência do consentimento do devedor (como em geral é o caso em direito - n°1 do artigo 577° do Código Civil).

Assim ALEXANDRE MOTA PINTO, Do Contrato de Suprimento, p. 286, cit. in Ac. RL. de 13-09- 2007 CJ, tomo IV, p. 87 afirma que: "o crédito de suprimento é cindível da participação social, pelo que se pode transmitir o crédito sem transmitir a quota, ou as acções, e vice-versa (...) A cessão do crédito a um terceiro poderá constituir uma forma de o sócio realizar o seu valor económico sem ter de esperar pelo reembolso (...) Esta cessão de crédito de suprimento não carece do consentimento da sociedade devedora(...)Parece-nos que o crédito cedido – em relação ao qual se verifica uma sucessão - deve continuar sujeito ao regime legal de suprimento, antes de mais porque se mantém o interesse fundamental da sociedade, tutelado por aquela figura (...) Se o cessionário pudesse exigir o imediato reembolso dos suprimentos, a sociedade poderia deparar-se com sérias dificuldades”.

Atendendo assim, ao preceito legal de suprimento, ínsito no artigo 243° do Código das Sociedades Comerciais, no caso em apreço, não se coloca em dúvida que tenham sido prestados suprimentos à B. por parte dos acionistas, nomeadamente E. C., em datas anteriores a 31-12-2009 e que por cessão dos mesmos tenham ficado relevados na contabilidade da sociedade, naquela data, em exclusivo, como propriedade daquele acionista.

Quanto à venda, efectuada em 17 de Junho de 2010, pelo Sr. E. C. de 60% da sua participação na B. à S. P., LLC em que foram também transferidos para a adquirente “todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos”, pelo montante de 300 mil euros (pouco mais que o valor nominal das ações transmitidas), conclui-se que a "cessão de suprimentos , no montante de €1.416.404,14, efetuada, naquela data, pelo anterior para o novo acionista foi efetuada a título gratuito, pois encontrava-se prevista no contrato de venda que não estipulou qualquer valor de venda para a mesma.

Por outro lado, apurou-se que não houve quaisquer movimentos financeiros, efetuados quer pela B. quer pela S. P., LLC, como reembolso dos suprimentos ou pagamento pela cessão dos suprimentos, respetivamente. Assim, é legítimo concluir que a S. P., LLC ficou com o direito a receber os suprimentos feito à B., pelo anterior acionista, direito pelo qual não despendeu qualquer valor. Daqui resulta também, nada obstar, quer do ponto de vista jurídico e contabilístico, quer fiscal, que a B. efetuasse o pagamento/devolução dos suprimentos no montante de € 1.416.404,14 à S. P., LLC.

Porém, com a aquisição da participação social, além de um ativo financeiro, a S. P., LLC obteve um incremento patrimonial, uma vez que "adquiriu” também o direito a receber um valor de € 1.416.404,14 relativamente a suprimentos incluídos no preço de compra da participação social, sem que a essa compra tenha correspondido um exfluxo de capital ou direitos.

Assim, afigura-se que a contabilização correta deste facto, e porque é fiscalmente relevante a forma de contabilização, na esfera da S. P., LLC (podendo as contas ter outra designação, desde que garantindo materialmente o mesmo significado), deveria ter sido, em 17 de Junho de 2010, aquando da aquisição da participação social, e apenas na parte que releva no caso em apreço - crédito sobre a B. decorrente da cessão dos suprimentos:

Original nos autos

No entanto, as demonstrações financeiras da S. P., LLC, apresentadas pelo sujeito passivo, relevam que o crédito sobre a B. decorrente da cessão dos suprimentos, efetuadas pelo anterior acionista encontra-se registado por contrapartida não de uma conta 599 - Outras Variações no Capital Próprio (ou conta equivalente, já que estamos na esfera de uma sociedade sediada em Malta), como seria correto, mas sim por contrapartida de contas de empréstimos concedidos pelos sócios/acionistas

Ora, por todos os documentos analisados, pelas declarações prestadas pelo sujeito passivo e por não haver qualquer indício ou comprovativo de movimento financeiro que mostre ter havido prestação de suprimentos, quer pelo por A. C., quer pelo Sr. E. C. ou pela Sra. M. L. C. (anteriores detentores do capital), estes não poderiam ser detentores de empréstimos ou suprimentos reembolsáveis pela S. P., LLC, concluindo-se que as demonstrações financeiras desta sociedade não refletem a realidade dos factos.

Assim, o sujeito passivo A. C., enquanto detentora do capital da S. P., LLC, apenas poderia receber as transferências bancárias no valor de 300 mil euros, exatamente na qualidade de acionista da sociedade, por lucros distribuídos em razão da variação patrimonial ocorrida, na esfera da S. P., LLC, aquando da aquisição da participação financeira na B. e realizada na data em que as transferências foram ordenadas, por esta, para devolução dos suprimentos prestados pelo anterior acionista mas cujo direito foi cedido (a título gratuito) à S. P., LLC.

Para efeitos de incidência de IRS, os recebimentos em causa são, no caso, frutos de investimento de capital (lucros distribuídos), enquadráveis no artigo 5.º n° 1 do Código do IRS:

"Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, direta ou indiretamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respetiva modificação, transmissão ou cessação, com exceção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.”

E discriminados na alínea h) do n° 2 do mesmo artigo,

"2 - Os frutos e vantagens económicas referidos no número anterior compreendem, designadamente: h) Os lucros das entidades sujeitas a IRC colocados à disposição dos respetivos associados ou titulares, incluindo adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 20".

Assim sendo, em 03 de Janeiro de 2014, com a deliberação produzida pela B., SGPS, SA, deveriam ter sido efetuados os seguintes registos contabilísticos na esfera da S. P., LLC, refletindo a devolução dos suprimentos e a entrega aos acionistas do valor recebido, sob a forma de lucros ou adiantamento por conta de lucros, sendo aqui designado por adiantamento, uma vez que se desconhece a existência de contas aprovadas e a acta da assembleia geral a deliberar a distribuição de resultados:

Original nos autos

Com a transferência bancária efetuada no dia 08 de Janeiro, os movimentos contabilísticos na esfera da S. P., LLC deveriam ter sido, no respeitante ao caso em apreço:

Original nos autos

Assim sendo, do anteriormente exposto, resulta que os valores recebidos por A. C., em 08 de Janeiro de 2014 não dizem respeito a reembolso de suprimentos, mas sim a distribuição de dividendos.

De forma alguma tais valores poderiam ser referentes a reembolso de suprimentos, uma vez que nunca o sujeito passivo referiu ter prestado suprimentos à S. P., LLC ou, quando notificado para tal, não apresentou qualquer documento que demonstrasse a prestação desses suprimentos.

Como refere o nº 4 do artigo 6º do Código do IRS,

“Os lançamentos em quaisquer contas correntes dos sócios, escrituradas nas sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, quando não resultem de mútuos, da prestação de trabalho ou do exercício de cargos sociais, presumem-se feitos a título de lucros ou adiantamento dos lucros.”, sendo esta posição assente na jurisprudência firmada no contencioso tributário, citando-se a título de exemplo o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul emitido nos processo n° 02544/08 CT 2o Juízo, de 25-11-2008, "Concluindo-se que os lançamentos feitos em conta corrente de sócios não resultam de mútuos, de prestação de trabalhos ou do exercício de cargos sociais, têm os mesmos que ter-se, presumidamente, como feitos a título de lucros ou de adiantamento dos lucros (n° 4, in fine, do art. 7° do CIRS).]",

ou no processo n° 571/2017-T do CAAD “Na verdade, como se escreveu no Acórdão do TCA-SUL de 15.07.2008, proferido no processo 02371/08 o que determina o artigo em questão é que quando a AF constate, em quaisquer empresas referidas no preceito, que as contas correntes dos respectivos sócios contém lançamentos contabilísticos de montantes em favor daqueles, cabe-lhe indagar da razão de ser de tais lançamentos, o que, por princípio, terá de ser revelado pela própria contabilidade, devidamente organizada segundo os princípios das leis comercial e fiscal; E então, ou os beneficiários demonstram que se trata de uma situação enquadrável em mútuos, em prestação de trabalho ou no exercício de cargos sociais, ou então a lei faz decorrer a "verdade ficta" de que correspondem a lucros ou a adiantamento de lucros."(sublinhado nosso),

de que resulta que aquela presunção opera a favor da AT quando esta constata que as contas correntes dos sócios contêm lançamentos de montantes a favor destes e os sócios não demonstrem que se trata de uma situação enquadrável em mútuos, em prestação de trabalho ou no exercício de cargos sociais. Ora é este precisamente o caso em apreciação.

III.5 CORREÇÃO AOS RENDIMENTOS DECLARADOS PELO SUJEITO PASSIVO PARA EFEITOS DE IRS

Em conformidade com o n° 1 do artigo 15° do Código do IRS, os sujeitos passivos residentes são tributados pela totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território nacional.

Nos termos da alínea h) do n° 2 do artigo 5.º do Código do IRS, os lucros ou adiantamento por conta de lucros, são sujeitos a IRS, constituindo rendimentos da categoria E.

Sendo, porém, a fonte do rendimento uma sociedade não residente, com sede em Malta, importa atender às normas da Convenção Entre a República Portuguesa e a República de Malta para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos

Sobre o Rendimento (CDT), que determinam a competência para tributação dos rendimentos em apreço.

Atendendo ao n° 1 do artigo 10° da CDT,

"1 - os dividendos pagos por uma sociedade residente de um Estado Contractante a um residente do outro Estado Contractante podem ser tributados nesse outro Estado."

ou seja, a competência para tributação pode ser invocada por ambos os estados, quer o estado fonte do rendimento, quer o estado de residência do efetivo beneficiário do mesmo.

Por outro lado, estabelece a alínea b) do n° 2 do artigo 10° da CDT, que

"b) Quando os dividendos forem pagos por uma sociedade residente de Malta a um residente de Portugal que é o seu beneficiário efectívo, o imposto de Malta sobre o montante bruto dos dividendos não excederá o imposto incidente sobre os lucros dos quais os dividendos são pagos.”

Assim, a retenção na fonte a efetuar pela entidade pagadora dos rendimentos (S. P., LLC), poderia ter sido reduzida nas condições descritas, desde que o sujeito passivo (beneficiário dos rendimentos) tivesse apresentado à S. P., LLC o Modelo n° 21-RF1 certificado pela Autoridade Tributária a atestar a sua residência em Portugal.

No entanto, no caso em apreço, não se afigura que o sujeito passivo tenha sido tributado pelo rendimento auferido, uma vez que na contabilidade da referida sociedade residente em Malta, pagadora dos rendimentos de capitais, não se encontra refletido o incremento patrimonial que deu origem aos resultados distribuídos.

Concluindo assim que Portugal tem competência para a tributação do rendimento obtido e atendendo ainda que:

Nos termos do n° 1 do artigo 7° do Código do IRS, os rendimentos da categoria E são sujeitos a tributação a partir do momento que são pagos ou colocados â disposição do seu titular;

Nos termos do artigo n° 1 do artigo 22° do Código do IRS, o rendimento coletável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidos em cada ano;

Não se aplica o n° 1 do artigo 40°-A do Código do IRS, uma vez que o sujeito passivo não efetuou a prova a que fazem menção os n°s 4 e 5 do mesmo artigo, ou seja, o englobamento do rendimento é feito pela totalidade;

E ainda, os rendimentos de capitais, definidos no artigo 5o e mencionados no n° 1 do artigo 71° ambos do Código do IRS, devidos por entidades não residentes, não sujeitos a retenção na fonte nos termos do n° 2 do mesmo artigo, são tributados autonomamente à taxa de 28%, conforme n° 5 do artigo 72° do Código do IRS,

Deveria o sujeito passivo ter englobado o rendimento de € 300.000,00, proveniente de lucros/adiantamento por conta de lucros, pagos ou colocados à sua disposição pela sociedade S. P., LLC, propondo-se a alteração dos rendimentos declarados, nos termos do n° 4 do artigo 65° do Código do IRS, incluindo aquele rendimento no anexo J da declaração Modelo 3 de rendimentos, a que se refere o artigo 57° do Código do IRS, nos seguintes termos:

Da correção da declaração proposta, resulta a seguinte correção em termos de imposto:

(…)» (cf. RIT de fls. 355 a 379 do PAT, a que correspondem fls. 470 a 496 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

BB) Em 17.5.2019, no âmbito da ação de inspeção efetuada ao Impugnante a coberto da Ordem de Serviço n.º OI201801693, foi elaborado, pela Divisão de Inspeção Tributária II, da Direção de Finanças de Setúbal, o «RELATÓRIO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA», de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1 SITUAÇÃO DE FACTO

O sujeito passivo C. A. recebeu, através de transferências bancárias para contas por si tituladas junto do D. B. e B. B. respetivamente, no dia 07 de Janeiro de 2014, o valor de € 650.000,00, e no dia 08 de Janeiro de 2014 o valor de € 300.000,00, provenientes da conta com o IBAN PT50 00……3 3, titulada pela B., que não foram declarados para efeitos fiscais na declaração de IRS mencionada no ponto anterior.

Por forma a apurar a que título foram recebidos por C. A. aqueles montantes e consequentemente o motivo justificativo do não englobamento dos mesmos na declaração de rendimentos Modelo 3 apresentada, foi C. A. notificado, em 10-12-2018, para apresentar justificação documental do motivo pelo qual os havia recebido.

III.2 JUSTIFICAÇÃO E ANÁLISE DOS FACTOS INVOCADOS PELO SUJEITO PASSIVO

Em 20-12-2018, o sujeito passivo C. A., entregou um conjunto de documentos que justificam, na sua ótica, os valores recebidos, mencionando que a explicação para o recebimento já havia sido dada na qualidade de acionista da B. e que resumidamente, tais transferências seriam "para restituição de empréstimos feitos pela empresa S. P., LLC à B. S.G.P.S. ”, como consta de auto de declarações. Como complemento à entrega dos documentos, o sujeito passivo C. A. esclareceu que como se observa nos documentos disponibilizados, foram constituídos, ao longo do tempo, suprimentos pelos sócios/acionistas da B. que, através de vários negócios, acabaram por ficar exclusivamente na posse do Sr. E. C. (seu padrasto).

Parte dos documentos apresentados, para esclarecer a situação em apreço, trata-se de cópias de documentos contabilísticos das sociedades B. SGPS, SA (páginas 01 a 62 da numeração do sujeito passivo) e P., SGPS, SA (páginas 63 a 128 da numeração do sujeito passivo).

No que respeita aos documentos da B., trata-se de extratos das contas POC “2521 - Accionistas (sócios) - Empréstimos”, e documentos de suporte.

No que respeita aos documentos da P., trata-se de extratos das contas POC “4131 - Empréstimos de financiamento - Empresas do grupo", e documentos de suporte.

Assim, da análise dos elementos contabilísticos, exibidos por C. A. constatou-se que ao longo do tempo, foram efetuados suprimentos pelos sócios/acionistas da B., SGPS, SA, nomeadamente pela P., SGPS, SA, que acumularam um valor de € 2.360.673,54.

Esses suprimentos, através de vários negócios, acabaram por se aglutinar apenas em nome do Sr. E. C. que detinha a totalidade das ações da B., pois, através do balancete analítico do ano de 2009 da B., bem como do extrato da conta POC "25 - Accionistas (Sócios)" é possível verificar que, através de movimento efetuado com data de 15-08-2009, foi saldada a conta “252101 – P. SGPS”, através do débito do valor de € 2.360.673,54 e creditada a conta “252102 - Sr. E. C." no mesmo montante.

Através daquele movimento foi centralizado na conta “252102 - Sr. E. C.” todo o valor que a B. evidenciava contabilisticamente como empréstimos/suprimentos do sócio à sociedade, em 31 de Dezembro de 2009.

Durante a ação de inspeção foi possível apurar que posteriormente, em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. C. vendeu a sua participação na B., da qual detinha as 80 mil ações que compunham o capital social, a duas sociedades com sede nos Estados Unidos da América, transmitindo as ações

“com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular e livres de quaisquer ónus ou encargos.”, respetivamente:

48.000 ações, correspondente a 60% do capital social à S. P., LLC, com o número de pessoa coletiva equiparada 436… e sede em Delaware - EUA, pelo valor de € 300.000,00;

32.000 ações, correspondente a 40% do capital social à P. H., LLC, com o número de pessoa coletiva equiparada 980… e sede em Delaware - EUA, pelo valor de € 200.000,00;

Na sequência da alteração da titularidade do seu capital social (transmissão de E. C. para a S. P., LLC e P. H., LLC), em 31 de Julho de 2010, a B. fez refletir na sua contabilidade, a transferência dos empréstimos/suprimentos efetuados por E. C., para as sociedades S. P., LLC e P. H., LLC, respetivamente na proporção da participação social que haviam adquirido, através de 2 movimentos, evidenciados nos extratos das subcontas da conta SNC "26 - Acionistas/sócios” da B., debitando o saldo da conta SNC "26702

- E. C.", e creditando as contas SNC “26703 – S. P." e “26704 – P. H.”, como se mostra (Com a alteração de normativo contabilístico ocorrido, passando do POC para o SNC, as contas "25 - Accionistas (Sócios)’’ passaram a ser designadas por "26 - Acionistas/Sócios".):

Original nos autos

Dado que através destes registos contabilísticos aparentava terem sido reembolsados os suprimentos prestados pelo Sr. E. C. e simultaneamente terem sido prestados novos suprimentos à B., no mesmo montante, por cada uma das sociedades, foi notificada, em 26 de Fevereiro de 2019, a administradora da B., A. C. F. C. C., ao abrigo do Despacho n° DI201900277 desta Direção de Finanças, para apresentação dos comprovativos dos movimentos financeiros subjacentes aos registos contabilísticos acima descritos.

Em resposta à referida notificação, a administradora da B. não apresentou os elementos solicitados, tendo ainda afirmado, em auto de declarações, que aos referidos movimentos contabilísticos não corresponderam quaisquer movimentos financeiros, ou seja, não houve lugar ao reembolso dos suprimentos feitos pelo Sr. E. C. nem à constituição de novos suprimentos, nos montantes registados, por parte das sociedades compradoras.

A inexistência dos supracitados movimentos financeiros e as declarações prestadas pela administradora da B. corroboram o estipulado no contrato de compra e venda outorgado entre o Sr. E. C. e as sociedades S. P., LLC e P. H., LLC, no qual é feita a transmissão das ações da B “com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular e livres de quaisquer ónus ou encargos.”, pelo preço respetivamente de 300 mil e 200 mil euros.

Assim, o direito constituído a favor da S. P., LLC e da P. H., LLC, refletido na contabilidade da sociedade B., produziu, na esfera daquelas sociedades, um incremento patrimonial em montante idêntico à diferença entre o valor dos direitos adquiridos e o valor do custo de aquisição da participação social, ou seja, € 1.416.404,14 para a S. P., LLC e €944,269,40 para a P. H., LLC.

Face a esta conclusão tomou-se premente averiguar qual o tratamento contabilístico dado, pelas sociedades S. P., LLC e da P. H., LLC, à operação de aquisição da participação social pelo que foi necessário notificar a sociedade S. P., LLC, na pessoa do detentor do seu capital social.

Atendendo que se havia verificado que por contrato de cessão de ações a título gratuito, assinado a 28 de Abril de 2011, E. M. C. C. e M. L. N. M. C. C. cederam de forma gratuita o capital da S. P., LLC a A. C. F. C. C. (filha) e C. H. N. M. L. A. (filho), ficando cada um deles em posse de 50% do capital, foi notificado este último, em 21 de Janeiro de 2019, para apresentar os seguintes elementos:

f) Balancetes analíticos dos períodos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 da sociedade S. P., LLC;

g) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de aquisição da posição de capital na B., SGPS, S.A., realizada em 17 de Junho de 2010, bem como de todos os direitos/obrigações adquiridos com essa transação;

h) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de recebimento do montante de € 1.416.404,14, através de pagamento deliberado pela B., SGPS, S.A., em 03 de Janeiro de 2014;

i) Deliberação da sociedade S. P., LLC de restituição do montante de € 1.416.404,14, aos acionistas;

j) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de pagamento do montante de€ 1.416.404,14, aos acionistas;

No momento da notificação, o sujeito passivo referiu que não tinha esses documentos na sua posse e que teria que solicitar o seu envio ao escritório da sociedade, em Malta, para onde foi transferida a sua sede, em 06 de Setembro de 2012.

Através de sucessivos contactos telefónicos com o sujeito passivo, foi a data de entrega sucessivamente adiada, por não existirem os documentos solicitados e estarem a ser elaborados pela S. P., LLC, tendo, no dia 19 de Fevereiro de 2019, o Sr. C. A. procedido à entrega de um documento, composto por 9 páginas, em resposta à notificação de 21 de Janeiro de 2019.

Da análise dos documentos entregues ressalta a não entrega de qualquer dos documentos solicitados em b), c) e e), sendo que relativamente à alínea d) apenas foi entregue uma declaração, subscrita pelos acionistas da S. P., LLC, informando que iriam proceder ao levantamento dos suprimentos diretamente a partir da B..

Resulta também da análise dos documentos que, no ano de 2010, segundo informação constante no S. P., Limited Notes to the Financial Statements" que constitui a página 5 da numeração efetuada pelo sujeito passivo, que:

A participação financeira está refletida pelo valor de € 280.180, no ponto “2 INVESTMENTS”;

“4 INTERCOMPANY DEBTORS The company has made a loan to B. SGPS SA which is unsecured, interest free with repayment date unspecified”, ou seja, em tradução livre da nossa autoria, a sociedade S. P., LLC fez à B. um empréstimo, livre de juros, sem garantia e sem data de retorno estabelecida, no montante de € 1.416.404;

"5 SHAREHOLDERS LOAN The shareholders loan is unsecured and interest free with repayment date unspecified”, ou seja, em tradução livre da nossa autoria, a sociedade S.P., LLC recebeu um empréstimo dos sócios, livre de juros, sem garantia e sem data de retorno estabelecida, no montante de € 1.986.404;

"6 CALLED UP SHARE CAPITAL (...) Nominal value USD 1.000”, ou seja, em tradução livre da nossa autoria, o valor nominal do capital social ê de mil dólares americanos. Note-se que não se encontra refletido nesta rubrica qualquer outra valorização, nomeadamente de resultados transitados ou outras componentes de capital.

Ora da leitura destas demonstrações financeiras retira-se o seguinte:

- a sociedade S. P., LLC, em 2010, aquando da aquisição de 60% do capital social da B. registou o seu direito a receber desta participada os suprimentos que E. C. lhe havia prestado até 2009, direito esse que veio nesse momento à sua posse, a título gratuito;

- esse direito não se constituiu por ter ela própria prestado os suprimentos;

- o direito não foi reconhecido tendo como contrapartida uma conta de capital, representando um incremento patrimonial, mas sim como um empréstimo dos seus sócios, que á data eram E. M. C. C. e M. L. N. M. C. C., situação nunca invocada e demonstrada;

Estas demonstrações financeiras, relembramos, são contrárias ao estipulado no contrato de compra e venda outorgado entre o Sr. E. C. e a sociedade S. P., LLC, que estipula que é feita a transmissão das ações da B. "com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular e livres de quaisquer ónus ou encargos.", pelo preço de 300 mil, bem como, ao declarado pela administradora da B., que referiu não ter havido movimento financeiro subjacente aos lançamentos contabilísticos efetuados em 2010, ou seja, a S. P., LLC não concedeu qualquer empréstimo ou prestou qualquer suprimento à B..

Face à incongruência detetada, e atendendo à informação constante nos documentos disponibilizados, foi novamente notificado em 26 de Fevereiro de 2019, o sujeito passivo C. A. para apresentação dos elementos não apresentados na anterior notificação efetuada:

d) Registo contabilístico na sociedade S. P. LLC da operação de aquisição da posição de capita! na B., SGPS, S.A., realizada em 17 de Junho de 2010, bem como de todos os direitos/obrigações adquiridos com essa transação;

e) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de recebimento do montante de € 1.416.404,14, através de pagamento deliberado pela B., SGPS, S.A., em 03 de Janeiro de 2014;

f) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de pagamento do montante de € 1.416.404,14, aos acionistas;

E ainda para proceder à entrega dos comprovativos dos movimentos financeiros identificados no "Notes to the Financial Statements for the year ending 31 December 2011" entregue em 19 de Fevereiro de 2019, com a seguinte descrição e montantes:

"4 Intercompany debtors: valores de 1.416.404 euros e de 200.000 euros";

"5 Shareholders loan: valor de 1.986.404 euros”;

Em 08 de Março de 2019 o sujeito passivo, em auto de declarações, referiu não ser possível proceder à entrega dos solicitados justificativos, por não os ter em sua posse e desconhecer se os mesmos existem.

Quanto à origem dos montantes recebidos da B. pelo sujeito passivo, constatou-se ainda, no decurso da ação de inspeção, que os mesmos resultaram da subscrição de um contrato de cessão de créditos e compra e venda de ações, realizado entre a B. e a O. SGPS, SA, em 19 de Dezembro de 2013 e em que a primeira recebeu um pagamento no valor de € 2.515.000,00, referente à primeira tranche prevista nesse contrato.

Na sequência do recebimento daquele montante foi, em 03 de Janeiro de 2014, deliberado em assembleia geral da B. o reembolso dos alegados suprimentos efetuados pelos acionistas, nos montantes de € 1.416.404,14 e€ 944.269,40, respetivamente.

Nessa mesma deliberação é referido que as transferências são feitas diretamente para as contas dos detentores do capital social da S. P., LLC e da P. H., LLC, não sendo percetível em que montantes e porque motivos, “(…) Assim, os valores referentes à sociedade S. P., LLC serão transferidos para a conta do Dr. C. H. N. M. L. A. e da Sr.3 A. C. F. C. C.. Os valores referente à sociedade P. H., LLC serão transferidos para a Dr.a A. C. N. M. C. C. e da Sr.a J. N. M. C. F. C., respetivamente. (…)”.

Da análise de todos estes elementos verificou-se ainda que os montantes transferidos para as contas dos detentores do capital social de cada uma das sociedades, supra identificados, são diferentes dos que constam em acta, sendo que no total os valores transferidos ascenderam a € 2.507.500,00 quando a acta faz referência ao valor de € 2.360.673,54.

Concretizando, a acta menciona um reembolso no valor de € 1.416.404,14 para a S. P., LLC, mas na realidade a transferência foi de € 1.250.000,00, sendo € 950.000,00 para C. A. e € 300.000,00 para A. C..

III.3 CONCLUSÕES DA ANÁLISE AOS DOCUMENTOS RECOLHIDOS

Em face de tudo o que foi referido anteriormente, nomeadamente a análise aos documentos entregues pelo sujeito passivo e da verificação de outros elementos em posse dos serviços, das declarações escritas prestadas e das informações verbais trocadas com o técnico de inspeção, foi possível concluir o seguinte:

Em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. M. C. C. era detentor da totalidade do capital da B., SGPS, SA;

Encontrava-se registado na contabilidade da B., SGPS, SA, a favor do Sr. E. M. C. C., um crédito, por suprimentos prestados, no valor de € 2.360.673,54;

Em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. M. C. C. vendeu a totalidade do capital da B., SGPS, SA, sendo que 60% desse capital, representado por 48.000 ações, foram vendidas à S. P., LLC;

Com a venda do capital social, foram também transferidos para a adquirente “todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos" que o Sr. E. M.C. C. era detentor na B., como consta do contrato de compra e venda, sem que tenha havido qualquer pagamento por parte da S. P., LLC para além do valor atribuído à participação social;

Não existiu, subjacente àquela aquisição feita pela S. P., LLC, qualquer movimento financeiro entre as duas sociedades, tendo a adquirida B., apenas, movimentado contabilisticamente as contas de suprimentos em nome de E. C., passando o correspondente a 60% desse valor para crédito da adquirente S. P., LLC, por indicação do vendedor no contrato de venda, ou seja por E. C.;

Por doação feita em 28 de Abril de 2011, o sujeito passivo C. A. passou a deter 50% do capital social da S. P., LLC;

Após notificado o sujeito passivo para o efeito, não foi invocado nem ficou provado que o Sr. E. C. e ou a Sra. M. L. C. tenham prestado suprimentos à S. P., LLC;

Não foi invocado e consequentemente provado pelo sujeito passivo ter sido feito, por si, qualquer empréstimo ou prestação de suprimentos à S. P., LLC;

Por outro lado, se o motivo do recebimento, em apreço, por parte de C. A., do montante total de €950.000,00, fosse "para restituição de empréstimos feitos pela empresa S. P., LLC à B. S.G.P.S.", conforme o mesmo afirmou em auto de declarações, na qualidade de acionista da B., como prova não foi apresentado qualquer contrato de mútuo entre a S. P., LLC e a B., S.G.P.S., S.A., nem qualquer comprovativo de movimento financeiro entre estas duas sociedades, nem comprovativo de pagamento de Imposto de Selo devido à prestação daquele mútuo, se tivesse, de facto, existido. Esse contrato teria que ser feito por escritura pública, nos termos do Artigo 143° do Código Civil, e à sua inobservância é aplicada a regra do artigo 364° do mesmo código, com a consequência de a falta importar a invalidade do contrato, conforme dispõe o artigo 219° daquele código;

Apenas poderia haver reembolso aos sócios se esses tivessem prestado suprimentos à S. P.LLC, mas tal situação nunca foi invocada ou demonstrada documentalmente através de movimentos financeiros.

III.4 ENQUADRAMENTO JURÍDICO, CONTABILÍSTICO E FISCAL DA SITUAÇÃO DE FACTO

O Código das Sociedades Comerciais, no seu artigo 243°, n° 1, considera como contrato de suprimento “(...) o contrato pelo qual o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível, ficando aquela obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade, ou pelo qual o sócio convenciona com a sociedade o diferimento do vencimento de créditos seus sobre ela, desde que, em qualquer dos casos, o crédito fique tendo carácter de permanência.”

Nos termos dos n.°s 2 e 6 do mesmo artigo refere-se que o prazo de reembolso será superior a um ano sendo que a validade do contrato não depende de qualquer forma especial, pelo que não terá, forçosamente, de ser reduzido a escrito.

Ainda no mesmo artigo, no n° 5, é referido que fica sujeito ao regime de crédito de suprimento o crédito de terceiro contra a sociedade que o sócio adquira por negócio entre vivos, desde que no momento da aquisição se verifique alguma das circunstâncias previstas nos n°s 2 e 3.

Quanto à cessão dos créditos resultantes de um contrato de suprimento, a doutrina entende pacificamente que tai crédito pode ser cedido nos termos gerais de direito e sem dependência do consentimento do devedor (como em geral é o caso em direito - n°1 do artigo 577° do Código Civil).

Assim ALEXANDRE MOTA PINTO, Do Contrato de Suprimento, p. 286, cit. in Ac. RL. de 13-09- 2007 CJ, tomo IV, p. 87 afirma que: "o crédito de suprimento é cindível da participação social, pelo que se pode transmitir o crédito sem transmitir a quota, ou as acções, e vice-versa (...) A cessão do crédito a um terceiro poderá constituir uma forma de o sócio realizar o seu valor económico sem ter de esperar pelo reembolso (...) Esta cessão de crédito de suprimento não carece do consentimento da sociedade devedora(...)Parece-nos que o crédito cedido – em relação ao qual se verifica uma sucessão - deve continuar sujeito ao regime legal de suprimento, antes de mais porque se mantém o interesse fundamentai da sociedade, tutelado por aquela figura (...) Se o cessionário pudesse exigir o imediato reembolso dos suprimentos, a sociedade poderia deparar-se com sérias dificuldades”.

Atendendo assim, ao preceito legal de suprimento, ínsito no artigo 243° do Código das Sociedades Comerciais, no caso em apreço, não se coloca em dúvida que tenham sido prestados suprimentos à B. por parte do acionistas, nomeadamente E. C., em datas anteriores a 31-12-2009 e que por cessão dos mesmos tenham ficado relevados na contabilidade da sociedade, naquela data, em exclusivo, como propriedade daquele acionista.

Quanto à venda, efectuada em 17 de Junho de 2010, pelo Sr. E. C. de 60% da sua participação na B. à S. P., LLC em que foram também transferidos para a adquirente “todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos”, pelo montante de 300 mil euros (pouco mais que o valor nominai das ações transmitidas), conclui-se que a "cessão de suprimentos , no montante de €1.416.404,14, efetuada, naquela data, pelo anterior para o novo acionista foi efetuada a título gratuito, pois encontrava-se prevista no contrato de venda que não estipulou qualquer valor de venda para a mesma.

Por outro lado, apurou-se que não houve quaisquer movimentos financeiros, efetuados quer pela B. quer pela S. P., LLC, como reembolso dos suprimentos ou pagamento pela cessão dos suprimentos, respetivamente. Assim, é legítimo concluir que a S. P., LLC ficou com o direito a receber os suprimentos feito à B., pelo anterior acionista, direito pelo qual não despendeu qualquer valor.

Daqui resulta também, nada obstar, quer do ponto de vista jurídico e contabilístico, quer fiscal, que a B. efetuasse o pagamento/devolução dos suprimentos no montante de € 1.416.404,14 à S. P., LLC.

Porém, com a aquisição da participação social, além de um ativo financeiro, a S. P., LLC obteve um incremento patrimonial, uma vez que "adquiriu” também o direito a receber um valor de € 1.416.404,14 relativamente a suprimentos incluídos no preço de compra da participação social, sem que a essa compra tenha correspondido um exfluxo de capital ou direitos.

Assim, afigura-se que a contabilização correta deste facto, e porque é fiscalmente relevante a forma de contabilização, na esfera da S. P., LLC (podendo as contas ter outra designação, desde que garantindo materialmente o mesmo significado), deveria ter sido, em 17 de Junho de 2010, aquando da aquisição da participação social, e apenas na parte que releva no caso em apreço - crédito sobre a B. decorrente da cessão dos suprimentos:

Original nos autos

No entanto, as demonstrações financeiras da S. P., LLC, apresentadas pelo sujeito passivo, relevam que o crédito sobre a B. decorrente da cessão dos suprimentos, efetuadas pelo anterior acionista encontra-se registado por contrapartida não de uma conta 599 - Outras Variações no Capital Próprio (ou conta equivalente, já que estamos na esfera de uma sociedade sediada em Malta), como seria correto, mas sim por contrapartida de contas de empréstimos concedidos pelos sócios/acionistas

Ora, por todos os documentos analisados, pelas declarações prestadas pelo sujeito passivo e por não haver qualquer indício ou comprovativo de movimento financeiro que mostre ter havido prestação de suprimentos, quer pelo sujeito passivo C. A., quer pelo Sr. E. C. ou pela Sra. M. L. C. (anteriores detentores do capital), estes não poderiam ser detentores de empréstimos ou suprimentos reembolsáveis pela S. P., LLC, concluindo-se que as demonstrações financeiras desta sociedade não refletem a realidade dos factos.

Assim, o sujeito passivo C. A., enquanto detentor do capital da S. P., LLC, apenas poderia receber as transferências bancárias no valor de 950 mil euros, exatamente na qualidade de acionista da sociedade, por lucros distribuídos em razão da variação patrimonial ocorrida, na esfera da S. P., LLC, aquando da aquisição da participação financeira na B. e realizada na data em que as transferências foram ordenadas, por esta, para devolução dos suprimentos prestados pelo anterior acionista mas cujo direito foi cedido (a título gratuito) à S. P., LLC.

Para efeitos de incidência de IRS, os recebimentos em causa são, no caso, frutos de investimento de capital (lucros distribuídos), enquadráveis no artigo 5º nº 1 do Código do IRS:

"Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, direta ou indiretamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respetiva modificação, transmissão ou cessação, com exceção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.”

E discriminados na alínea h) do nº 2 do mesmo artigo,

"2 - Os frutos e vantagens económicas referidos no número anterior compreendem, designadamente: h) Os lucros das entidades sujeitas a IRC colocados à disposição dos respetivos associados ou titulares, incluindo adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 20º".

Assim sendo, em 03 de Janeiro de 2014, com a deliberação produzida pela B., SGPS, SA, deveriam ter sido efetuados os seguintes registos contabilísticos na esfera da S. P., LLC, refletindo a devolução dos suprimentos e a entrega aos acionistas do valor recebido, sob a forma de lucros ou adiantamento por conta de lucros, sendo aqui designado por adiantamento, uma vez que se desconhece a existência de contas aprovadas e a acta da assembleia geral a deliberar a distribuição de resultados:

Original nos autos

Com as transferências bancárias efetuadas nos dias 07 e 08 de Janeiro, os movimentos contabilísticos na esfera da S. P., LLC deveriam ter sido, no respeitante ao caso em apreço:

Original nos autos

Assim sendo, do anteriormente exposto, resulta que os valores recebidos por C. A., em 07 e 08 de Janeiro de 2014 não dizem respeito a reembolso de suprimentos, mas sim a distribuição de dividendos.

De forma alguma tais valores poderiam ser referentes a reembolso de suprimentos, uma vez que nunca o sujeito passivo referiu ter prestado suprimentos à S. P., LLC ou, quando notificado para tal, não apresentou qualquer documento que demonstrasse a prestação desses suprimentos.

Como refere o nº 4 do artigo 6º do Código do IRS,

“Os lançamentos em quaisquer contas correntes dos sócios, escrituradas nas sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, quando não resultem de mútuos, da prestação de trabalho ou do exercício de cargos sociais, presumem-se feitos a título de lucros ou adiantamento dos lucros.”,

sendo esta posição assente na jurisprudência firmada no contencioso tributário, citando-se a título de exemplo o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul emitido nos processo n° 02544/08 CT 2o Juízo, de 25-11-2008,

"Concluindo-se que os lançamentos feitos em conta corrente de sócios não resultam de mútuos, de prestação de trabalhos ou do exercício de cargos sociais, têm os mesmos que ter-se, presumidamente, como feitos a título de lucros ou de adiantamento dos lucros (n° 4, in fine, do art. 7° do CIRS).]",

ou no processo n° 571/2017-T do CAAD

“Na verdade, como se escreveu no Acórdão do TCA-SUL de 15.07.2008, proferido no processo 02371/08 o que determina o artigo em questão é que quando a AF constate, em quaisquer empresas referidas no preceito, que as contas correntes dos respectivos sócios contém lançamentos contabilísticos de montantes em favor daqueles, cabe-lhe indagar da razão de ser de tais lançamentos, o que, por princípio, terá de ser revelado pela própria contabilidade, devidamente organizada segundo os princípios das leis comercial e fiscal; E então, ou os beneficiários demonstram que se trata de uma situação enquadrável em mútuos, em prestação de trabalho ou no exercício de cargos sociais, ou então a lei faz decorrer a "verdade ficta" de que correspondem a lucros ou a adiantamento de lucros."(sublinhado nosso), de que resulta que aquela presunção opera a favor da AT quando esta constata que as contas correntes dos sócios contêm lançamentos de montantes a favor destes e os sócios não demonstrem que se trata de uma situação enquadrável em mútuos, em prestação de trabalho ou no exercício de cargos sociais. Ora é este precisamente o caso em apreciação.

III.5 CORREÇÃO AOS RENDIMENTOS DECLARADOS PELO SUJEITO PASSIVO PARA EFEITOS DE IRS

Em conformidade com o n° 1 do artigo 15° do Código do IRS, os sujeitos passivos residentes são tributados peia totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território nacional.

Nos termos da alínea h) do n° 2 do artigo 5.º do Código do IRS, os lucros ou adiantamento por conta de lucros, são sujeitos a IRS, constituindo rendimentos da categoria E.

Sendo, porém, a fonte do rendimento uma sociedade não residente, com sede em Malta, importa atender às normas da Convenção Entre a República Portuguesa e a República de Malta para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos

Sobre o Rendimento (CDT), que determinam a competência para tributação dos rendimentos em apreço.

Atendendo ao n° 1 do artigo 10° da CDT,

"1 - os dividendos pagos por uma sociedade residente de um Estado Contractante a um residente do outro Estado Contractante podem ser tributados nesse outro Estado."

ou seja, a competência para tributação pode ser invocada por ambos os estados, quer o estado fonte do rendimento, quer o estado de residência do efetivo beneficiário do mesmo.

Por outro lado, estabelece a alínea b) do n° 2 do artigo 10° da CDT, que

"b) Quando os dividendos forem pagos por uma sociedade residente de Malta a um residente de Portugal que é o seu beneficiário efectívo, o imposto de Malta sobre o montante bruto dos dividendos não excederá o imposto incidente sobre os lucros dos quais os dividendos são pagos.”

Assim, a retenção na fonte a efetuar pela entidade pagadora dos rendimentos (S. P., LLC), poderia ter sido reduzida nas condições descritas, desde que o sujeito passivo (beneficiário dos rendimentos) tivesse apresentado à S. P., LLC o Modelo n° 21-RF1 certificado pela Autoridade Tributária a atestar a sua residência em Portugal.

No entanto, no caso em apreço, não se afigura que o sujeito passivo tenha sido tributado pelo rendimento auferido, uma vez que na contabilidade da referida sociedade residente em Malta, pagadora dos rendimentos de capitais, não se encontra refletido o incremento patrimonial que deu origem aos resultados distribuídos.

Concluindo assim que Portugal tem competência para a tributação do rendimento obtido e atendendo ainda que:

Nos termos do n° 1 do artigo 7° do Código do IRS, os rendimentos da categoria E são sujeitos a tributação a partir do momento que são pagos ou colocados â disposição do seu titular;

Nos termos do artigo n° 1 do artigo 22° do Código do IRS, o rendimento coletável em IRS é o que resulta do englobamento dos rendimentos das várias categorias auferidos em cada ano;

Não se aplica o n° 1 do artigo 40°-A do Código do IRS, uma vez que o sujeito passivo não efetuou a prova a que fazem menção os n°s 4 e 5 do mesmo artigo, ou seja, o englobamento do rendimento é feito pela totalidade;

E ainda, os rendimentos de capitais, definidos no artigo 5o e mencionados no n° 1 do artigo 71° ambos do Código do IRS, devidos por entidades não residentes, não sujeitos a retenção na fonte nos termos do n° 2 do mesmo artigo, são tributados autonomamente à taxa de 28%, conforme n° 5 do artigo 72° do Código do IRS,

Deveria o sujeito passivo ter englobado o rendimento de € 950.000,00, proveniente de lucros/adiantamento por conta de lucros, pagos ou colocados à sua disposição pela sociedade S. P., LLC, propondo-se a alteração dos rendimentos declarados, nos termos do n° 4 do artigo 65° do Código do IRS, incluindo aquele rendimento no anexo J da declaração Modelo 3 de rendimentos, a que se refere o artigo 57° do Código do IRS, nos seguintes termos:

Da correção da declaração proposta, resulta a seguinte correção em termos de imposto:


(…)» (cf. RIT de fls. 152 a 176 do PAT, a que correspondem fls. 265 a 289 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

CC) Em 22.5.2019, a Direção de Finanças de Setúbal emitiu o ofício n.º 006808, dirigido à Impugnante, por via do qual comunica o «RELATÓRIO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA» a que se refere a alínea AA) supra (cf. ofício a fls. 573 do PAT, a que corresponde fls. 690 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

DD) Em 22.5.2019, a Direção de Finanças de Setúbal emitiu o ofício n.º 006809, dirigido ao Impugnante, por via do qual comunica o «RELATÓRIO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA» a que se refere a alínea BB) supra (cf. ofício a fls. 352 do PAT, a que corresponde fls. 467 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

EE) O ofício a que se refere a alínea CC) supra foi entregue, em mão, à Impugnante em 24.5.2019 (cf. «Auto de Diligência» a fls. 572 do PAT e ofício a fls. 573 do PAT, a que correspondem, respetivamente, fls. 689 e 690 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

FF) O ofício a que se refere a alínea DD) supra foi entregue, em mão, ao Impugnante em 24.5.2019 (cf. «Auto de Diligência» a fls. 351 do PAT e ofício a fls. 352 do PAT, a que correspondem, respetivamente, fls. 466 e 467 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

GG) Em 25.5.2019, na sequência das correções efetuadas no âmbito da ação de inspeção a que se refere a alínea AA) supra, foi emitida, em nome da Impugnante, A. C. F. C. C., a liquidação adicional de IRS n.º 2019 5003819359 referente ao ano de 2014, e respetivos juros compensatórios, no montante total de € 97.320,32 (cf. «Demonstração de Liquidação de IRS» junta como doc. 9 da p.i. a fls. 47 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

HH) Em 25.5.2019, na sequência das correções efetuadas no âmbito da ação de inspeção a que se refere a alínea BB) supra, foi emitida, em nome do Impugnante, C. H. N. M. L. A., a liquidação de IRS n.º 2019 5003819356, referente ao exercício de 2014, e respetivos juros compensatórios, no montante total de € 308.231,62 (cf. «Demonstração de Liquidação de IRS» junta como doc. 1 da contestação a fls. 108 dos autos e «Informação» da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal a fls. 93 do PAT a que corresponde fls. 206 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas);

II) Em 4.11.2019, a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação de IRS n.º 2019 5003819359, a que se refere a alínea GG) supra, dando origem ao procedimento de reclamação graciosa n.º 2194201904002210 (cf. autuação a fls. 118 do PAT e documento de fls. 119 a 127 do PAT, constando, respetivamente, de fls. 231 a 240 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

JJ) Em 4.11.2019, o Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação de IRS n.º 2019 5003819356, a que se refere a alínea HH) supra, dando origem ao procedimento de reclamação graciosa n.º 2194201904002229 (cf. autuação a fls. 75 do PAT e articulado de fls. 76 a 84 do PAT, constando, respetivamente, de fls. 186 a 195 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

KK) Em 14.11.2019, a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal elaborou «INFORMAÇÃO», propondo o indeferimento da reclamação graciosa n.º 2194201904002210 (cf. «Informação» junta como doc. 13 da p.i. de fls. 61 a 69 dos autos, constando, igualmente, de fls. 135 a 142 do PAT, a que correspondem fls. 248 a 255 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

LL) Em 15.11.2019, a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal elaborou «INFORMAÇÃO», propondo o indeferimento da reclamação graciosa n.º 2194201904002229 (cf. «Informação» de fls. 92 a 99 do PAT, a que correspondem fls. 205 a 212 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

MM) Em 17.12.2017, a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal elaborou «INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR», no sentido de converter o projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º 2194201904002210 em decisão definitiva (cf. «Informação Complementar» junta como doc. 2 da p.i. a fls. 38 e 39 dos autos, constando, igualmente, de fls. 145 e 146 do PAT, a que correspondem fls. 258 e 259 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

NN) Em 17.12.2017, a Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal elaborou «INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR», no sentido de converter o projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º 2194201904002229 em decisão definitiva (cf. «Informação Complementar» junta como doc. 1 da p.i. a fls. 35 e 36 dos autos, constando, igualmente, de fls. 104 e 105 do PAT, a que correspondem fls. 217 e 218 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

OO) Em 18.12.2019, o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal exarou despacho de concordância com a «INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR» a que se refere a alínea MM) supra, indeferindo o pedido de reclamação graciosa n.º 2194201904002210 (cf. despacho exarado na «Informação Complementar» junta como doc. 2 da p.i. a fls. 38 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

PP) Em 18.12.2019, o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal exarou despacho de concordância com a «INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR» a que se refere a alínea NN) supra, indeferindo o pedido de reclamação graciosa n.º 2194201904002229 (cf. despacho exarado na «Informação Complementar» junta como doc. 1 da p.i. a fls. 35 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

QQ) Em 19.12.2019, o Diretor de Finanças de Setúbal emitiu o ofício n.º 017631, dirigido ao mandatário da Impugnante, por via do qual comunica a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º 2194201904002210 (cf. ofício junto como doc. 2 da p.i. a fls. 37 dos autos, constando, igualmente, de fls. 147 do PAT, a que corresponde fls. 260 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

RR) Em 19.12.2019, o Diretor de Finanças de Setúbal emitiu o ofício n.º 017633, dirigido ao mandatário do Impugnante, por via do qual comunica a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º 2194201904002229 (cf. ofício junto como doc. 1 da p.i. a fls. 34 dos autos, constando, igualmente, de fls. 106 do PAT, a que corresponde fls. 219 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

SS) No ano de 2009, a conta “25 - Accionistas (Sócios)" da sociedade B. SGPS, S.A. apresentava um total de suprimentos no valor de € 2.360.673,54 (cf. «Balancete Geral» de fls. 317 a 319 do PAT, a que correspondem fls. 432 a 434 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

TT) Em 15.8.2009, a conta “252101 – P., SGPS” referente à contabilidade da sociedade B. SGPS, S.A. apresentava um movimento a débito no valor de € 2.360.673,54 (cf. «Balancete Geral» e «Extracto de Conta 25», de fls. 317 a 319 do PAT e a fls. 320 do PAT, a que correspondem, respetivamente, fls. 432 a 434 e 435 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

UU) Em 15.8.2009, a conta "252102 - Sr. E. C." referente à contabilidade da sociedade B. SGPS, S.A. apresentava um movimento a crédito no valor de € 2.360.673,54 (cf. «Balancete Geral» e «Extracto de Conta 25», de fls. 317 a 319 do PAT e a fls. 320 do PAT, a que correspondem, respetivamente, fls. 432 a 434 e 435 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos).

VV) Em 17.6.2010, entre E. M. C. C. (aí designado «Primeiro Contraente») e a sociedade S. P. (aí designada «Segunda Contraente») foi outorgado o denominado «CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE ACÇÕES» de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)

CONSIDERANDO QUE:

I. O PRIMEIRO CONTRAENTE é dono e possuidor de 48.000 (quarenta e oito mil acções) acções ao portador, no valor nominal de cinco euros cada, da sociedade B. S.G.P.S., S.A., com o capital social de 400.000,00 € (quatrocentos mil euros)

(…)

As partes ajustam um contrato que se rege pelas cláusulas seguintes:

1. O PRIMEIRO CONTRAENTE vende à SEGUNDA CONTRAENTE as referidas acções pelo preço de € 300.000 (trezentos mil euros).

2. O preço ajustado foi pago no acto da assinatura deste contrato, contra a entrega dos títulos, pelo que o alienante dá aqui plena, definitiva e irrevogável quitação, por nada mais lhe ser devido, e a SEGUNDA CONTRAENTE declara estar na posse da totalidade das acções transmitidas.

3. As acções são transmitidas com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular, e livres de quaisquer ónus ou encargos.

4. O exercício dos direitos e o cumprimento das obrigações inerentes à titularidade dessas acções cabe, a partir de hoje, ao adquirente, independentemente de qualquer registo ou depósito.

5. O alienante obriga-se a comunicar imediatamente à B., S.G.P.S., S.A. a transmissão das acções que constituem objecto deste contrato.

(…)» (cf. Anexo 7 do RIT a fls. 542 e 543 do PAT, a que correspondem fls. 659 a 660 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

WW) Em 17.6.2010, E. M. C. C. (aí designado «Primeiro Contraente») e a sociedade P. H.LC (aí designada «Segunda Contraente») outorgaram o denominado «CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE ACÇÕES» de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)

CONSIDERANDO QUE:

I. O PRIMEIRO CONTRAENTE é dono e possuidor de 32.000 (trinta e duas mil acções) acções ao portador, no valor nominal de cinco euros cada, da sociedade B., S.G.P.S., S.A., com o capital social de 400.000,00 € (quatrocentos mil euros)

(…)

As partes ajustam um contrato que se rege pelas cláusulas seguintes:

1. O PRIMEIRO CONTRAENTE vende à SEGUNDA CONTRAENTE as referidas acções pelo preço de € 200.000 (duzentos mil euros)

2. O preço ajustado foi pago no acto da assinatura deste contrato, contra a entrega dos títulos, pelo que o alienante dá aqui plena, definitiva e irrevogável quitação, por nada mais lhe ser devido, e a SEGUNDA CONTRAENTE declara estar na posse da totalidade das acções transmitidas.

3. As acções são transmitidas com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular, e livres de quaisquer ónus ou encargos.

4. O exercício dos direitos e o cumprimento das obrigações inerentes à titularidade dessas acções cabe, a partir de hoje, ao adquirente, independentemente de qualquer registo ou depósito.

5. O alienante obriga-se a comunicar imediatamente à B., S.G.P.S., S.A. a transmissão das acções que constituem objecto deste contrato.

(…)» (Anexo 7 do RIT a fls. 544 e 545 do PAT e de fls. 661 e 662 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

XX) Em 31.7.2010, a conta "26702 – E. C." referente à contabilidade da sociedade B. SGPS, S.A. apresentava movimentos a débito no valor de € 1.416.404,14 e de € 944.269,40 (cf. «Extracto de Conta 26» a fls. 325 e 326 do PAT, a que correspondem fls. 440 e 441 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

YY) Em 31.7.2010, a conta “26703 – S. P." referente à contabilidade da sociedade B. SGPS, S.A. apresentava um movimento a crédito no valor de € 1.416.404,14 (cf. «Extracto de Conta 26» a fls. 325 e 326 do PAT, a que correspondem fls. 440 e 441 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

ZZ) Em 31.7.2010, a conta “26704 – P. H.” referente à contabilidade da sociedade B. SGPS, S.A. apresentava um movimento a crédito no valor de € 944.269,40 (cf. «Extracto de Conta 26» a fls. 325 e 326 do PAT, a que correspondem fls. 440 e 441 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

AAA) Em 28.4.2011, entre E. M. C. C. (aí designado «Primeiro Contraente»), M. L. N. M. C. C. (aí designada «Segunda Contraente»), A. C. F. C. C. (aí designada «Terceira Contraente») e C. H. N. M. L. A. (aí designado «Quarto Contraente»), foi celebrado o denominado «CONTRATO DE CESSÃO DE ACÇÕES A TÍTULO GRATUITO», extraindo-se do respetivo clausulado o seguinte:

«Considerando que:

O PRIMEIRO CONTRAENTE é dono e legítimo possuidor de 50% do capital da sociedade S. P. LLC, STATE OF DELAWARE SUITE 8.., 1..M M. S. IN THE CITY OF W., COUNTRY OF NEW CASTLE 19.., com número de sociedade 03…..

A SEGUNDA CONTRAENTE é dona e legítima possuidora de 50% do capital da sociedade S. P. LLC, STATE OF DELAWARE SUITE 8.., 1..M M. S. IN THE CITY OF W., COUNTRY OF NEW CASTLE 19.., com número de sociedade 03…..

É mutuamente celebrado o presente Contrato de cessão de acções a título gratuito, que se regerá, de boa fé, pelos seguintes termos e condições:

CLÁUSULA PRIMEIRA

O PRIMEIRO CONTRAENTE, pelo presente instrumento e devidamente autorizado pela SEGUNDA CONTRAENTE, cede à TERCEIRA CONTRAENTE, e esta toma para si, livres de ónus ou encargos, a participação que detém na referida sociedade, que corresponde a 50% das acções e títulos do capital social dessa sociedade.

CLÁUSULA SEGUNDA

Também pelo presente instrumento e devidamente autorizada pelo PRIMEIRO CONTRAENTE, a SEGUNDA CONTRAENTE cede ao QUARTO CONTRAENTE, e este toma para si, livres de ónus ou encargos, a participação que detém na referida sociedade, que corresponde a 50% das acções e títulos do capital social dessa sociedade.

CLÁUSULA TERCEIRA

As referidas acções e títulos de capital são cedidos na presente data a título gratuito.

CLÁUSULA QUARTA

Os Terceiro e Quarto Contraentes entram em posse imediata dos títulos referentes a cada uma das suas participações, declarando expressamente que os aceitam e conhecem plenamente todos os elementos estruturais, contabilísticos e de gestão da sociedade.

(…)»

(cf. Anexo 10 do RIT de fls. 550 e 552 do PAT, a que correspondem fls. 667 a 669 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

BBB) Na sequência do ofício a que se refere a alínea V) supra, o Impugnante entregou na Direção de Finanças de Setúbal, o documento denominado «S. P. LIMITED NOTES TO THE FINANCIAL STATEMENTS FOR THE YEAR ENDING 31 DEZEMBER 2011», de cujo teor se extrai o seguinte:

Original nos autos

(cf. Anexo 12 do RIT, de fls. 335 a 342 do PAT, a que correspondem fls. 450 a 457 dos autos, que se dão por integralmente reproduzido);

CCC) Na sequência do ofício a que se refere a alínea V) supra, o Impugnante entregou na Direção de Finanças de Setúbal, a «DECLARAÇÃO», datada de 31.12.2013, de cujo teor se extrai o seguinte:

«Declaração

S. P. LLC

Nós, C. H. N. M. L. A. e A. C. F. C. C., últimos beneficiários da empresa S. P. LLC, vimos por este meio informar vossas excelências que relativamente ao montante recebido pela venda das acções da empresa P. SGPS, SA pela B. SGPS, SA à empresa O. SGPS, SA, através do cheque n.º 08…. com o valor de 2.515.000€, de que iremos proceder ao levantamento directo pela B. do montante correspondente à S. P. LLC através de suprimentos existentes na empresa.

Trata-se de uma distribuição de suprimentos que a empresa B. tem vindo a acumular desde 2001, conforme documentação já enviada. Ao fazermos directamente minimizamos tempo, custos e evitamos que estes montantes tenham de sair de Portugal e assim possam ser direccionados para as nossas actividades empresariais.»

(cf. Anexo 12 do RIT a fls. 343 do PAT, a que corresponde fls. 458 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

DDD) Em 3.1.2014, foi realizada assembleia geral da sociedade B. SGPS, S.A., extraindo-se da respetiva «ATA NÚMERO TRÊS» o seguinte:

«(…)

Estiveram presentes os acionistas S. P. LLC e P. H. LLC representadas pelo Sr. Dr. J. A. L., estando assim representado 100% do capital social da sociedade B. SGPS, S.A., Estiveram igualmente presentes os membros do concelho de administração Sr.ª A. C. F. C. C., Sr.ª J. N. M. C. F. C. e Sr. L. M. F. C. C. e a assembleia geral representada por Dr. C. H. N. M. L. A. e Sr.ª A. C. N. M. C. C..

Aberta a sessão, de acordo com o ponto único da ordem de trabalhos, iniciou a sessão propondo o reembolso dos suprimentos efetuados à sociedade pelos acionista S. P. LLC e P. H. LLC, os quais tiveram a permanência legal mínima prevista no n.º 2 do artigo 243º do Código das Sociedades Comerciais, no montante de 1.416.404,14 (um milhão quatrocentos e dezasseis mil quatrocentos e quatro euros e catorze cêntimos) e 994.269,40 (novecentos e quarenta e quatro mil e duzentos e sessenta e nove euros e quarenta cêntimos), respetivamente.

Os montantes acima referidos serão transferidos diretamente para as contas bancárias dos detentores do capital social da S. P. LLC e P. H. LLC. Assim, os valores referentes à sociedade S. P. LLC serão transferidos para a conta do Dr. C. H. N. M. L. A. e da Sr.ª A. C. F. C. C..

Os valores referentes à sociedade P. H.LLC serão transferidos para a Dr.ª A. C. N. M. C. C. e da Sr.ª J. N. M. C. F. C., respetivamente.

Aprovou e deliberou a assembleia geral, por maioria dos votos emitidos, nos termos e para os efeitos do art. 386º do Código das Sociedades Comerciais, a proposta de reembolso dos suprimentos.

(…)»

(cf. Anexo 15 do RIT a fls. 568 e 569 do PAT, a que correspondem fls. 685 e 686 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

EEE) Em 7.1.2014, o Impugnante recebeu, através de transferência bancária para conta por si titulada junto do B. B. B., a quantia de € 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil euros), proveniente da conta com o IBAN PT50 00…...33, de que é titular a sociedade B. SGPS, S.A. (cf. facto não controvertido, que se extrai do Anexo 3 do RIT a fls. 386 do PAT e a fls. 503 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

FFF) Em 8.1.2014, o Impugnante recebeu, através de transferência bancária para conta por si titulada junto do B. B. B., a quantia de € 300.000,00 (trezentos mil euros), proveniente da conta com o IBAN PT50 00…...33, de que é titular a sociedade B. SGPS, S.A. (cf. facto não controvertido, que se extrai do Anexo 3 do RIT a fls. 386 do PAT e a fls. 503 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

GGG) Em 8.1.2014, a Impugnante recebeu, através de transferência bancária para conta por si titulada junto do B. B. B., a quantia de € 300.000,00 (trezentos mil euros), proveniente da conta com o IBAN PT50 00 ……33, de que é titular a sociedade B. SGPS, S.A. (cf. facto não controvertido, que se extrai do Anexo 3 do RIT a fls. 386 do PAT e a fls. 503 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido).


***


A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte:

“Com relevância para a boa decisão da causa não se provaram os seguintes factos:

1. E. C. era titular de 60% do capital social da sociedade B. SGPS, S.A. (cf. artigos 118.º da p.i.);

2. C. C. era titular de 40% do capital social da sociedade B. SGPS, S.A. (cf. artigos 118.º da p.i.);

3. E. C. e C. C. efetuaram suprimentos à sociedade B. SGPS, S.A. de idêntico valor (cf. artigos 124.º, 125.º, 126.º e 131.º da p.i.);

4. Nunca foi intenção de nenhum dos acionistas transmitir os suprimentos existentes na sociedade B. SGPS, S.A. (cf. artigos 154.º e 155.º da p.i.).


***


A motivação da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte:

“A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto baseou-se na análise crítica da prova documental produzida nos autos, designadamente nos documentos juntos pelos Impugnantes e nos documentos constantes do PAT, que não foram impugnados, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.

Foi, ainda, ouvida a testemunha P. J. N. M. P., que disse conhecer os Impugnantes no âmbito da sua atividade profissional, concretamente por ter trabalhado na empresa P. SGPS, S.A., para a qual entrou em 2007, aí exercendo funções administrativas, empresa em que era administrador e acionista E. C., pai dos aqui Impugnantes.

Pese embora a testemunha tenha referido “ter ouvido falar” de algumas das empresas pertencentes ao grupo “L. - SGPS, S.A.”, e, bem assim, conhecer a sociedade B. - que, segundo referiu, em 2007, pertencia ao «universo P.» [sendo a P. uma empresa gestora de participações sociais detida em 50% pelo grupo “L. - SGPS, S.A.” - pertencente, em partes iguais, ao Sr. E. C. e seu primo, Sr. C. C. - e em 50% pelo grupo “O., SGPS, S.A.”], tendo, nos anos 2010-2012, saído do «universo P.» e sido vendida ao “grupo do Sr. E.” -, a verdade é que a testemunha referiu desconhecer os contornos das concretas operações aqui em causa, designadamente no que se refere à transmissão das participações sociais da sociedade B., esclarecendo, ao longo do seu depoimento, que aquilo que sabia lhe houvera sido transmitido por E. C., evidenciando, assim, deste modo, que o seu conhecimento adveio apenas de conversas com terceiros, de “ouvir dizer”.

Quanto questionada sobre a existência de suprimentos e sua cessão, a testemunha limitou-se a dar a sua opinião.

Em face do exposto, a testemunha evidenciou não ter um conhecimento direto dos factos aqui em causa, não sendo o seu depoimento portador de razão de ciência suscetível de confirmar ou infirmar a prova documental junta aos autos e de inferir como provada a factualidade alegada pelos Impugnantes.

Quanto aos factos constantes dos pontos 1. e 2. dos factos não provados, não obstante a testemunha ter referido que «todas as participações na P., toda a participação e toda a responsabilidade era dividida entre o Sr. C. e o E.», a mesma não deixou de salientar que nada mais sabia, designadamente no que se refere à divisão do capital social da sociedade B quando esta saiu do «universo P.», referindo, várias vezes: «não sei precisar», «não vi o documento, não tenho conhecimento», «não faço a mínima ideia».

Acresce que não foi produzida nos autos qualquer prova documental que ateste que, à data dos factos, E. C. não era o único titular do capital da B. SGPS, S.A., sendo, igualmente, acionista C. C..

Ao invés, resulta documentalmente demonstrado nos autos, que, à data da celebração do «Contrato de Compra e Venda de Acções», em 17.6.2010, E. C. era titular das ações representativas da totalidade do capital social da sociedade B. SGPS, S.A., no valor de € 400.000,00 (80.000 ações, no valor nominal de cinco euros cada), tendo, nessa data, alienado 32.000 ações (representativas de 40% do capital social da referida sociedade) à sociedade P. H. LLC (cujo capital social era detido por C. C. (e Mulher)) e 48.000 ações (representativas de 60% do capital social da referida sociedade) à sociedade S. P. LLC (cujo capital social era detido por E. C. (e Mulher)) – cf. alíneas VV) e WW) dos factos provados.

Refira-se, aliás, que, na sua petição inicial, os Impugnantes acabam por reconhecer que, à data, E. C. era efetivamente o único titular do capital social da B., quando alegam que a situação apenas veio a ser “corrigida”, posteriormente, «com a transmissão para as sociedades S. e P., do capital correspondente a cada um dos sócios da B.» (cf. artigo 163.º da p.i.).

No que se refere ao ponto 3. dos factos não provados, também nenhuma prova foi feita pelos Impugnantes capaz de infirmar o que resulta documentalmente provado nos autos.

Sendo que o que resultou demonstrado, através dos elementos contabilísticos que foram exibidos no decurso do processo de inspeção pelos próprios Impugnantes (cf. «Balancete Geral» e «Extrato de Conta 25» - Anexo 6 do RIT), foi que, em 2009, os suprimentos efetuados, ao longo dos anos, pelos sócios/acionistas da sociedade B. SGPS, S.A. acumulavam um valor total de € 2.360.673,54 e que, através de movimento efetuado com data de 15.8.2009, foi saldada a conta “252101 – P., SGPS”, através do débito do valor de € 2.360.673,54 e creditada a conta "252102 - Sr. E. C." no mesmo montante, passando, nessa data, a estar registado na contabilidade da referida sociedade em nome de E. C. todo o valor que a B. evidenciava contabilisticamente como empréstimos/suprimentos do sócio à sociedade – cf. alíneas SS), TT) e UU) dos factos provados.

Por último, quanto ao ponto 4. dos factos não provados, os Impugnantes também não lograram demonstrar que «não era intenção de nenhum dos acionistas transmitir os suprimentos existentes na sociedade B. SGPS, S.A.».

Ao invés, da prova documental produzida nos autos resulta o contrário.

Desde logo, dos «Contrato[s] de Compra e Venda de Acções», por via dos quais E. C. vendeu a totalidade das ações representativas do capital social da sociedade B. SGPS, S.A. (60% à sociedade S. e 40% à sociedade P.) resulta que «as acções são transmitidas com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o Primeiro Contraente [E. C.] seja titular» (sublinhados nossos, cf. alíneas VV) e WW) dos factos provados).

Por outro lado, resulta, igualmente, documentalmente provado nos autos que, na sequência da alteração da titularidade do seu capital social, em 31.7.2010, a sociedade B. SGPS, S.A. fez refletir na sua contabilidade a transferência dos empréstimos/suprimentos registados em nome de E. C. (no valor total de € 2.360.673,54) para as sociedades S. P. LLC e P. H., LLC, na proporção da participação social que haviam adquirido (60% para a sociedade S. e 40% para a sociedade P., respetivamente, no valor de € 1.416.404,14 e de € 944.269,40), através de dois movimentos, evidenciados nos extratos das subcontas da conta “26 – Acionistas/sócios” da B., debitando o saldo da conta SNC “26702 – E. C.” e creditando as contas “26703 – S. P.” e “26704 – P. H. – cf. alíneas XX), YY) e ZZ) dos factos provados.

Donde, em face da prova documental produzida nos autos, que não foi infirmada através de nenhuma outra prova produzida pelos Impugnantes, não se poderá concluir, sem mais, que «nunca foi intenção transmitir os suprimentos, só se concebendo tal facto como um lapso na elaboração do contrato de venda das participações sociais», ou que «relativamente à questão da totalidade do capital da B., como os suprimentos, estarem registados em nome do sr. E. C., aconteceu por lapso».

Deste modo, e com os fundamentos supra expostos, não se consideram provados os factos referidos nos pontos 1. a 4. do probatório.”


***


III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, os Recorrentes não se conformam, com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IRS respeitantes ao ano de 2014, e correspondentes juros compensatórios, no montante total de €405.551,94.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, porquanto resultam verificados os seguintes vícios:

i. Vício procedimental, por duplicação ilegal de procedimentos de inspeção externa;
ii. Vício de violação de lei, por caducidade do direito à liquidação; e
iii. Vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, atenta a incorreta tributação, em sede de IRS, dos montantes transferidos para as contas bancárias dos Recorrentes enquanto adiantamento por conta de lucros da sociedade S. LLC.

Vejamos, então.

Ab initio, importa, desde já, relevar que os Recorrentes não procederam à impugnação da matéria de facto, em ordem aos requisitos contemplados no artigo 640.º do CPC, nada peticionando em termos de alterações ao probatório, mormente, em sede de aditamento, substituição e ou supressão, razão pela qual a matéria de facto se encontra devidamente estabilizada.

Assim, feita esta delimitação do objeto do recurso, comecemos por atentar no erro de julgamento atinente ao vício procedimental por duplicação ilegal de procedimentos de inspeção externa.

Neste particular, defendem os Recorrentes que foram sujeitos a duas inspeções tributárias de âmbito externo, referentes aos mesmos sujeitos passivos, imposto e período de tributação, pela DSIFAE e pelo SIT, sendo que a segunda viola o disposto no n.º 4, do artigo 63.º da LGT.

Mais advogando que o primeiro procedimento não visou apenas a consulta, recolha e cruzamento de elementos, na medida em que foram solicitadas informações aos Recorrentes, tais como documentos e declarações, não colhendo, assim, a argumentação gizada na decisão recorrida de que a duplicação não será ilegal nos casos em que um deles vise a mera consulta, recolha e cruzamento de elementos, porquanto a ratio da norma é a de salvaguardar a estabilidade e segurança jurídicas, princípios que não são prejudicados nos casos englobados pela dita exceção.

Sufraga, ainda neste particular, que não tendo sido realizadas quaisquer correções na inspeção realizada pela DSIFAE, tal prejudica a estabilidade e segurança jurídicas regulada no artigo 63º, n.º 4 da LGT, na medida em que foi criada a expetativa de que a situação dos contribuintes se encontrava regular.

Assim o não entendeu o Tribunal a quo, tendo esteado a improcedência relevando, desde logo, que não obstante a qualificação atribuída aos procedimentos, pela entidade fiscalizadora, não seja imperativa, “[c]ontrariamente ao que os Impugnantes procuram sustentar, forçoso será concluir que os mesmos foram objeto de dois procedimentos inspetivos com finalidades distintas: um procedimento inicial, efetuado ao abrigo dos despachos n.ºs DI201500342 e DI201500343, nos termos previstos no artigo 46.º, n.ºs 4 e 5 do RCPITA, destinado apenas à «consulta, recolha e cruzamento de elementos», referente aos anos de 2013 e 2014, e um segundo procedimento de inspeção externa, de âmbito geral, efetuado com base nas Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693, com vista a apurar a situação tributária dos sujeitos passivos e cumprimento das respetivas obrigações tributárias, por referência ao ano de 2014.”

Mais ajuizando que “[n]o caso em apreço, o que se retira dos autos, é que os Impugnantes foram notificados da conclusão da ação inspetiva destinada à consulta, recolha e cruzamento de elementos, realizada ao abrigo dos Despachos n.º DI201500342 e n.º DI201500343, através da notificação das respetivas notas de diligência (cf. alínea L) do probatório), após ter sido tomada a decisão de remeter a informação elaborada pela Direção de Serviços de Investigação da Fraude e Ações Especiais à Direção e Finanças de Setúbal, para que esta promovesse os respetivos procedimentos inspetivos contra os sujeitos passivos (cf. alíneas I) e J) do probatório), tendo, posteriormente, no âmbito das ações inspetivas externas realizadas ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693, os Impugnantes sido notificados dos relatórios de inspeção tributária nos quais foram efetuadas correções aos rendimentos, por si, declarados para efeitos de IRS do exercício de 2014 (cf. alíneas AA) a FF) do probatório).”

Concluindo, assim, que inexiste qualquer violação da estabilidade e segurança jurídica na medida em que “[c]ontrariamente ao que procuram sustentar, os Impugnantes não foram notificados que «do procedimento inspetivo nada iria resultar» ou que «a AT (DSIFAE) emitiu o despacho final da inspeção, determinando não haver lugar a correções», mas, sim, que a ação inspetiva para consulta, recolha e cruzamento de elementos foi concluída em determinada data, não tendo sido notificados de quaisquer correções no âmbito dessa ação inspetiva atendendo aos fins desse procedimento de inspeção.”

Sublinhando, adicionalmente, que “[n]ão perpassa dos autos, nem da prova produzida, que os elementos analisados no âmbito da ação inspetiva externa, que lhe sucedeu, efetuada ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693, tenham sido, exclusivamente, aqueles que foram recolhidos no âmbito da ação inspetiva destinada à consulta, recolha e cruzamento de elementos, realizada a coberto dos despachos n.º DI201500342 e n.º DI201500343.”

Alvitrando, outrossim, que “[a]inda que se considerasse que, materialmente, também os atos de inspeção realizados a coberto dos Despachos n.º DI201500342 e n.º DI2015Q0343 se inserem no âmbito da «ação de investigação externa», ainda assim, não se poderia concluir pela existência de uma duplicação ilegal de procedimentos inspetivos externos, sendo certo que a realização dessas diligências inspetivas e das posteriormente realizadas ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693 não determinaria, sem mais, uma violação do disposto no n.º 4 do artigo 63.º da LGT” porquanto “[a] atuação da DSIFAE, visando a análise de operações financeiras suspeitas, cingiu-se à mera consulta, recolha e cruzamento de elementos”, logo subsumível no citado artigo 63.º, nº4, concretamente na realidade nela excecionada em ordem à redação introduzida pela Lei nº 114/2017, de 29 de dezembro.

E, de facto, atentando na fundamentação jurídica supra expendida não se retira o aduzido erro de julgamento, porquanto o Tribunal a quo, convocou o quadro jurídico aplicável ao caso sub judice, e realizou adequada e acertadamente a competente transposição à realidade fática em apreço.

Expliquemos, então, porque assim o entendemos, começando por convocar o regime normativo que para os autos releva.

Importa, desde já, chamar à colação o disposto no artigo 54.º da LGT, o qual regulamenta o âmbito e a forma do procedimento tributário, dele se inferindo, desde logo, que o procedimento de inspeção é, efetivamente, um procedimento tributário o qual, segundo o nº5 desse mesmo normativo (atual nº6) se encontra regulado por diploma regulamentar próprio, especificamente, Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA).


Atentemos, então, no aludido diploma.


Ab initio, importa ter presente, mormente, em termos de ratio e finalidade o contemplado no preâmbulo do aludido diploma, particularmente os excertos que infra se transcrevem, do qual emerge que face à “[n]atureza da actividade inspectiva, a Administração não poderá estar subordinada a uma sucessão imperativa e rígida de actos. Porém, esta circunstância não prejudica a consagração de regras gerais de actuação visando essencialmente a organização do sistema, e consequentemente a garantia da proporcionalidade aos fins a atingir, da segurança dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários e a própria participação destes na formação das decisões, evitando a proliferação de litígios inúteis.


No respeito por estes princípios, a Lei Geral Tributária acolheu uma concepção da inspecção tributária harmónica com o moderno procedimento administrativo e as garantias dos cidadãos.


Assim, a natureza do presente diploma é essencialmente regulamentadora não se pretendendo alterar os actuais poderes e faculdades da inspecção tributária nem os deveres dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários que se mantêm integralmente em vigor.


No entanto, a melhor sistematização da acção fiscalizadora incrementará a sua eficiência e eficácia, bem como a segurança do procedimento de inspecção, tendo sido diminuída a margem de discricionaridade”.


Dispondo, assim, o artigo 2.º, nº1 do RCPITA, que: “[o] procedimento de inspeção tributária visa a observação das realidades tributária, a verificação do cumprimento das obrigações tributária e a prevenção das infrações tributárias”.


Preceituando, neste particular, os artigos 5.º a 11.º a matéria atinente aos princípios do procedimento de inspeção interna, os artigos 12.º a 14.º a regulação referente às classificações do procedimento de inspeção tributária, 0s normativos 16.º a 22.º a normação inerente à competência e garantias de imparcialidade, os preceitos 23.º a 27.º o planeamento e seleção, os artigos 28.º a 33.º a regulamentação dos atos de inspeção e as garantias do exercício da função inspetiva, os normativos 34.º a 43.º o local, horário dos atos de inspeção e prazo do procedimento, contemplando, in fine, e a partir do artigo 44.º ao 59.º a marcha do procedimento de inspeção e dos artigos 60.º a 64.º a conclusão e efeitos do procedimento de inspeção.


Face à matéria visada nos autos assume especial relevância o consignado no artigo 12.º, n.º 1 do RCPITA, segundo o qual “o procedimento de inspeção classifica-se, quanto aos fins em: a) Procedimento de comprovação e verificação, visando a confirmação do cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários;

b) Procedimento de informação, visando o cumprimento dos deveres legais de informação ou de parecer dos quais a inspeção tributária seja legalmente incumbida”.

Mais assume especial relevo para o caso sub judice, o plasmado no artigo 13.º do RCPITA, o qual preceitua quanto ao lugar da realização que o procedimento pode classificar-se em:

“a) Interno, quando os atos de inspeção se efetuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos;

b) Externo, quando os atos de inspeção se efetuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso.”.

Promanando, por seu turno, das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 36/2016, de 1 de julho, que a alínea a), do artigo 13.º, do RCPITA passou a preceituar que: “a) Interno, quando os atos de inspeção se efetuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos por esta detidos ou obtidos no âmbito do referido procedimento”.

Preceituando, outrossim, o n.º 2, do artigo 14.º, do RCPITA que se considera “procedimento parcial o que se limite à consulta, recolha de documentos ou elementos determinados e à verificação de sistemas informáticos dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários, ou ao controlo de bens em circulação”.

Ainda, neste particular, importa chamar à colação o consignado no artigo 46.º do RCPITA, mormente, os seus nºs 4 a 7, os quais consagram que:

“4 - Não será emitida ordem de serviço quando as ações de inspeção tenham por objetivo: a) A consulta, recolha e cruzamento de elementos; b) O controlo de bens em circulação; c) O controlo dos sujeitos passivos não registados. d) A contagem e valorização de inventários. (aditada pela Lei n.º 75-A/2014, de 30 de setembro)

5 - O despacho que determina a prática do ato, quando não seja necessária a ordem de serviço, deve referir os seus objetivos e a identidade da entidade a inspecionar e dos funcionários incumbidos da sua execução.

6 - Nas ações de inspeção direcionadas a contribuintes não identificados previamente, nomeadamente nas situações previstas nas alíneas b) e c) do n.º 4, o despacho conterá menção genérica dos contribuintes passíveis de controlo.

7 - As ações de inspeção que visem a mera consulta, recolha e cruzamento de elementos junto de sujeito passivo, de qualquer área territorial, com quem o sujeito passivo inspecionado mantenha relações económicas são efetuadas mediante entrega, por parte do funcionário, da nota de diligência que indica a tarefa executada.”

E bem assim o regulado no normativo 51.º do RCPITA, o qual preceitua que: “1 - Da ordem de serviço ou do despacho que determinou o procedimento de inspeção será, no início deste, entregue uma cópia ao sujeito passivo ou obrigado tributário, exceto nas situações previstas no n.º 6 do artigo 46.º

2 - O sujeito passivo ou obrigado tributário ou o seu representante deve assinar a ordem de serviço indicando a data da notificação, a qual, para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspeção.(…)”.

De convocar, in fine, o disposto no artigo 61.º, n.º 1 do RCPITA, segundo o qual “os atos de inspeção consideram-se concluídos na data de notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento”, acrescentando-se no artigo 62.º, n.º 1 do mesmo diploma, sob a epígrafe “conclusão do procedimento de inspeção” que “para conclusão do procedimento de comprovação e verificação é elaborado um relatório final com vista à identificação e sistematização dos factos detetados e sua qualificação jurídico-tributária.”

Ainda neste particular, assume especial relevo o consignado no artigo 63.º, n.º 3 da LGT, na sua redação inicial (a que passou a corresponder o artigo 63.º, n.º 4 da LGT com as alterações introduzidas pela Lei n.º 37/2010, de 2 de setembro), segundo o qual:

“O procedimento da inspeção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objetivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspeção ou inspeções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas.”

Neste conspecto, há que ter presente as alterações introduzidas pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro (1),as quais conferiram maior amplitude ao artigo 63.º, n.º 4 da LGT, mormente, às ressalvas atinentes à irrepetibilidade do procedimento inspetivo externo, dele passando a constar que: “O procedimento da inspeção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objetivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se o procedimento visar apenas a consulta, recolha de documentos ou elementos ou a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspeção ou inspeções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas.”
Dir-se-á, portanto, que em razão da aludida alteração normativa ficou plasmada a possibilidade de realização de mais do que um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo, imposto e período de tributação em determinadas situações excecionais, designadamente, quando o procedimento vise apenas “a consulta, recolha de documentos ou elementos." (2)

Ora, visto o regime que releva para o caso vertente, importa, então, fazer a devida resenha da factualidade ocorrida nos autos.

Do probatório resulta, desde logo, que foi dado início a uma ação de inspeção externa realizada a coberto dos despachos n.ºs DI201500334, DI201500335 e DI201500336, que incidiu sobre as sociedades O. SGPS, S.A., P. - SGPS, S.A. e B., SGPS, S.A., que abrangeu os exercícios de 2012 a 2014, espoletada, por seu turno, na sequência de comunicação da Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária, com vista à “análise de operações financeiras suspeitas.”

Com efeito, e como se infere da “INFORMAÇÃO DSIFAE/73/2018”, “[a] ação teve origem na proposta efetuada na informação n.º 653/2014, de 2014-12-30, da Divisão de Estudos e Informações (DEI) elaborada na sequência da receção de um relatório da UIF/NES, onde é referido que a sociedade anónima O., foi beneficiária em 23/12/2013, de uma transferência de €2.800,000,00, oriunda do “BPN” com o descritivo “empréstimo”» e, outrossim, que “no mesmo dia, foi pedida a emissão de um cheque visado no montante de € 2.515.000,00, a favor da sociedade “B.”.

Inferindo-se, assim, que os seus objetivos se coadunaram com o aquilatar “como foram registados, contabilisticamente, os movimentos referentes às entradas e saídas de dinheiro nas 3 sociedades: O. SGPS SA, P. - SGPS SA e B., SGPS, S.A, averiguar a que título é que a B. recebeu €2.515 000,00 e comprovar as afirmações dos beneficiários das transferências que justificam a origem desses fundos como restituição de suprimentos por parte da empresa.”

No decurso da aludida ação, foram emitidos os despachos n.º DI201500342 e n.º DI2015Q0343, pelo Chefe de Divisão dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e Ações Especiais, datados de 4 de dezembro de 2015, credenciando um procedimento de inspeção a cada um dos Impugnantes, ora, Recorrentes, nos termos do disposto no artigo 46.º, n.ºs 4 e 5 do RCPITA, destinado à “consulta, recolha e cruzamento de elementos” referente aos anos de 2013 e 2014.

Mais resulta dos autos que, no âmbito da evidenciada ação inspetiva às visadas sociedades veio a Direção de Serviços de Investigação da Fraude e Ações Especiais a concluir que “todas as transferências se encontravam devidamente comprovadas à exceção das transferências diretas para os detentores do capital das empresas S. P. LLC e P. H., LLC., isto é, deveriam ser estas duas empresas as beneficiárias destas transferências, para restituição dos suprimentos que tinham efetuado à B., e que eventualmente poderiam transferir para os seus acionistas, como reembolso de suprimentos ou como dividendos, na sua esfera, se a isso tivessem direito.”

Daí que, nessa conformidade, a Direção de Serviços de Investigação da Fraude e Ações Especiais propôs “[r]emeter esta informação para a Direção de Finanças de Setúbal, área do domicílio fiscal dos quatro beneficiários destas transferências, para que a mesma promova as diligências necessárias para cobrança do IRS, que se afigure devido para os sujeitos passivos, no ano de 2014”, o que foi, devidamente sancionado, por despacho da Subdiretora Geral, datado de 14 de maio de 2018, que determinou que a Direção de Finanças de Setúbal, promovesse os procedimentos inspetivos, para o ano de 2014, que se mostrem devidos, designadamente, aos ora Recorrentes.

Nessa sequência, e em cumprimento do supra expendido, foram emitidas as Ordens de Serviço n.º OI 201801692 e n.º OI 201801693, datadas de 3 de dezembro de 2018, as quais credenciaram a realização de uma ação de inspeção externa a cada um dos, ora, Recorrentes, e materializou a realização de correções meramente aritméticas à matéria tributável em sede de IRS do ano de 2014, de acordo com a fundamentação contemplada nos respetivos Relatórios de Inspeção Tributária, e devidamente corporizada no acervo fático dos autos.

Sendo ainda de relevar que, os aludidos Relatórios de Inspeção Tributária foram objeto de notificação a 24 de maio de 2019, legitimando, in fine, a emissão dos competentes atos de liquidação impugnados.

Ora, face à factualidade supra expendida, nenhuma censura merece a decisão recorrida que, de forma bem fundamentada, ajuizou que nos encontramos perante procedimentos inspetivos díspares, com âmbitos e finalidades, igualmente, distintos.

Com efeito, da realidade fática supra expendida resulta que foi primeiramente iniciado um procedimento ao abrigo dos despachos n.ºs DI201500342 e DI201500343, fundado no artigo 46.º, n.ºs 4 e 5 do RCPITA, e com o desiderato de “consulta, recolha e cruzamento de elementos”, referente aos anos de 2013 e 2014, e um segundo procedimento de inspeção externa, de âmbito geral, efetuado com base nas Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693, com vista a apurar a situação tributária dos sujeitos passivos e cumprimento das respetivas obrigações tributárias, por referência ao ano de 2014, mormente, incumprimento declarativo de adiantamento por conta de lucros em sede de IRS.

Não logrando, de todo, mérito a alegação dos Recorrentes (alínea p), no sentido de que existe convergência de finalidades, visando, nessa medida, o mesmo desiderato.

Mas, igual improcedência logra a argumentação atinente à violação da estabilidade e segurança jurídica, não só porque, por um lado, os Recorrentes desvirtuam o concreto culminar do primeiro procedimento de inspeção, ou seja, da prolação da competente nota de diligência, mas também porque, por outro lado, em nada pode ser convocada a existência de uma fundada e legítima expetativa.

Com efeito, contrariamente ao advogado em l) a o) das suas conclusões de recurso, no âmbito do primeiro procedimento inspetivo, os Recorrentes foram notificados da conclusão da ação inspetiva destinada à consulta, recolha e cruzamento de elementos, realizada ao abrigo dos Despachos n.º DI201500342 e n.º DI201500343, através da notificação das respetivas notas de diligência, em clara conformidade com o plasmado no artigo 61.º, nºs 1 e 2 do RCPITA.

Mais importando sublinhar, neste e para este efeito, que as aludidas notas de diligência surgiram, como visto, na sequência da decisão de remeter a informação elaborada pela Direção de Serviços de Investigação da Fraude e Ações Especiais à Direção de Finanças de Setúbal, para que esta promovesse os respetivos procedimentos inspetivos contra os Recorrentes.

Logo, como é bom de ver, do supra expendido em nada se poderia retirar que existia uma total conformidade da realidade declarada, bem pelo contrário, porquanto foi evidenciado que as informações recolhidas poderiam indiciar a existência de omissão de rendimentos na esfera individual dos Recorrentes.

Ademais, em nada poderia ser advogada uma violação da estabilidade e da segurança jurídica, na medida em que qualquer expetativa que se tivesse criado na convicção dos Recorrentes não, era, de todo fundada e legítima.

Sendo, outrossim, de adensar e sublinhar que só no âmbito do procedimento de inspeção externa que visou apurar a situação tributária dos sujeitos passivos, ora Recorrentes, e cumprimento das respetivas obrigações tributárias, por referência ao ano de 2014, mormente, incumprimento declarativo de adiantamento por conta de lucros em sede de IRS, é que foram prolatados os respetivos Relatórios Inspetivos, em ordem ao preceituado no artigo 62.º, nº1, do RCPITA, e ulteriores liquidações adicionais impugnadas.

Donde, nenhuma censura merece o ajuizado, e bem, pelo Tribunal a quo, no sentido de que contrariamente ao advogado pelos Recorrentes não foram notificados de que “do procedimento inspetivo nada iria resultar”, mas, tão-só, que a ação inspetiva para consulta, recolha e cruzamento de elementos foi concluída em determinada data, em razão da qual foi prolatada a respetiva nota de diligência, em clara conformidade com o postulado na lei.

Neste particular, atente-se no expendido por GUSTAVO LOPES COURINHA, que quanto ao âmbito, extensão e ratio do normativo sindicado refere que “[a] tutela visada por aquela disposição legal parece respeitar ao direito do contribuinte à segurança jurídica e à estabilidade da relação fiscal e não, própria ou exclusivamente (ou sequer, predominantemente), à proteção deste pelos contratempos, embaraços e dificuldades provocados na sua rotina comercial por uma inspeção externa. (…) o princípio da segurança jurídica e a necessidade de estabilidade jurídica da relação fiscal - e este é o princípio que está aqui em causa - gerada pela conclusão de um processo inspetivo externo opõe-se a que, uma vez escrutinada juridicamente determinada factualidade em processo inspetivo externo, seja permitida uma qualquer reapreciação da mesma, mesmo que não conduzida nas instalações do contribuinte: à mesma matéria de facto e ao mesmo objeto inspetivo não podem ser apostas duas qualificações ou tratamentos distintos, uma vez encerrado o procedimento de inspeção externa(…) A lei exige, aparentemente, que à instrução vertida na inspeção externa corresponda uma única leitura: a constante das respetivas conclusões da inspeção; e que haja, consequentemente, uma ulterior vinculação administrativa à leitura ali produzida” (…) a norma aqui em análise pretende tutelar o “direito da Requerente à segurança da situação jurídica criada na sequência da elaboração do primeiro relatório”, e não apenas os “incómodos” da inspeção externa."(3)

Neste conspecto, importa, ainda, avançar que não logra mérito a argumentação de que há “uma unicidade dos procedimentos”, sendo ambos externos, e sem que o primeiro possa ser entendido e visto como “consulta, recolha e cruzamento de elementos”, desde logo, porque atribui um alcance incorreto à solicitação de documentos, sendo certo que, de todo o modo, os elementos obtidos no procedimento de inspeção externa materializado em 2018, não são, de todo, os mesmos que foram obtidos no procedimento de mera consulta, recolha e cruzamento de dados e elementos.

Com efeito, como ajuizado na decisão recorrida, “[n]ão têm razão os Impugnantes quando alegam que «as segundas inspeções, não foram mais que uma repetição da primeira, porquanto a documentação exigida nas segundas havia já sido apresentada na primeira inspeção, sendo estas uma repetição do que anteriormente acontecera», ou que «as segundas não fizeram mais do que concretizar o relatório da fiscalização, porquanto os elementos solicitados e analisados foram os mesmos que já haviam sido sujeitos a análise por parte da DSIFAE». (…)

[n]ão perpassa dos autos, nem da prova produzida, que os elementos analisados no âmbito da ação inspetiva externa, que lhe sucedeu, efetuada ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693, tenham sido, exclusivamente, aqueles que foram recolhidos no âmbito da ação inspetiva destinada à consulta, recolha e cruzamento de elementos, realizada a coberto dos despachos n.º DI201500342 e n.º DI201500343.

Dos autos resulta, ao invés, que no âmbito da ação de inspeção externa, realizada ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693, foram solicitados aos Impugnantes (outros) documentos (cf. alíneas V) e X) do probatório) que não integram os «ANEXOS» da Informação da DSIFAE remetida à Direção de Finanças de Setúbal (cf. alínea K) do probatório). (…)

Não se poderá, pois, concluir que toda a documentação exigida já havia sido apresentada, ou que todos elementos solicitados e analisados foram os mesmos. Por outras palavras, não se poderá concluir que já tinham sido recolhidos todos os elementos e documentos que sustentaram as correções que deram origem às liquidações ora impugnadas.”

Ademais, no sentido preconizado pelo Tribunal a quo, há que ter presente o consignado no artigo 44.º do RCPITA, segundo o qual “o procedimento de inspeção é previamente preparado”, donde, essa prévia preparação terá, naturalmente, de agregar a recolha de toda a informação disponível sobre o sujeito passivo ou obrigado tributário em causa, incluindo conforme preceitua, expressamente, o seu nº2 que: “a preparação prévia consiste na recolha de toda a informação disponível sobre o sujeito passivo ou obrigado tributário em causa, incluindo o processo individual arquivado nos termos legais na Autoridade Tributária e Aduaneira, as informações prestadas ao abrigo dos deveres de cooperação e indicadores económicos e financeiros da atividade.”

Não podendo, assim, as aludidas informações obtidas mediante cruzamento de informação e ao abrigo dos deveres de cooperação descaraterizar o âmbito do primeiro procedimento inspetivo, o qual, inequivocamente se coadunou, como visto, com a consulta, recolha, e cruzamento de dados.

Ademais, como adensado na decisão recorrida, no concernente “aos atos de inspeção efetuados ao abrigo dos despachos n.ºs DI201500342 e DI201500343, em nome dos ora Impugnantes, inexistem elementos que nos permitam concluir que os mesmos se concretizaram, ainda que parcialmente, fora das instalações da DSIFAE, sendo certo que os documentos e informações a que a mesma “acedeu”, ao abrigo dos aludidos despachos, vieram à sua posse, e por si ficaram a ser detidos, na sequência das declarações prestadas pelos Impugnantes, tendo sido, por estes, apresentados com vista a suportar as suas próprias declarações.”

Sendo ainda de refutar o aduzido pelos Recorrentes em u) e v) das suas conclusões, porquanto inexistiu a alegada apreciação sobre a substância dos documentos solicitados e apresentados, em nada subvertendo, por conseguinte, o âmbito conferido pela AT. O mesmo se diga no atinente ao evidenciado em w), porquanto a leitura a contrario do normativo 50.º, nº1, alínea a), do RCPITA em nada permite desconsiderar o âmbito e extensão da mesma, já devidamente evidenciado anteriormente e plasmado no probatório.

Destarte, sendo inequívoco que o primeiro procedimento de inspeção teve, efetivamente, como desiderato a consulta, recolha e cruzamento de dados, carece de relevância o aduzido quanto à sua classificação, concretamente, como procedimento externo e interno, na medida em que a letra da lei, ora, aplicável é inequívoca e perentória, ressalvando, justamente, que só “pode haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se o procedimento visar apenas a consulta, recolha de documentos ou elementos.”

E por assim ser, improcede a aduzida violação do disposto no artigo 63.º, n.º 4 da LGT.

Atentemos, ora, no erro de julgamento atinente à caducidade do direito à liquidação.

Neste âmbito, propugnam os Recorrentes que face ao regulamentado no citado artigo 54.º, n.º 1, da LGT, existe apenas um único procedimento inspetivo que compreende toda a sucessão de atos.

Defendendo, nesse conspecto, que tendo em conta que o relatório inspetivo foi notificado aos Recorrentes, no dia 24 de maio de 2019, tal significa que entre 21 de dezembro de 2015 e 24 de maio de 2019, decorreram mais do que os seis meses impostos pelo artigo 46.º da LGT, para efeitos de suspensão do prazo de caducidade.

Concluindo, nessa conformidade, que estando em causa IRS de 2014 e sendo as notificações emitidas em 25 de maio de 2019, o direito à liquidação estava caducado, contrariamente ao entendido na douta sentença recorrida, que por esse motivo, não pode permanecer na ordem jurídica.

O Tribunal a quo, fundamentou a improcedência da arguida caducidade do direito à liquidação, da seguinte forma:

In casu, “estão em causa as liquidações adicionais de IRS, pelo que, sendo este um imposto periódico, o prazo de caducidade do direito à liquidação, de quatro anos (cf. artigo 45.º, n.º 1 da LGT), conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (cf. artigo 45.º, n.º 4, 1.ª parte da LGT).

Assim, estando em causa, nos autos, as liquidações referentes ao exercício de 2014, a contagem do prazo de caducidade iniciou-se a partir de 31.12.2014 e terminaria, sem mais, em 31.12.2018.”

Ressalvando, no entanto, que no caso vertente, “as liquidações adicionais de IRS, referentes ao exercício de 2014, ora impugnadas, são provenientes de correções promovidas pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal, no âmbito das ações de inspeção externa efetuadas ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI201801692 e n.º OI201801693 (cf. alíneas M) e N) do probatório). Donde, o efeito suspensivo do prazo de caducidade, por virtude de ação inspetiva, iniciou-se com a notificação aos contribuintes do seu início e prolongou-se até à notificação da conclusão do procedimento inspetivo, pela elaboração dos respetivos relatórios finais, se acaso tal ação inspetiva não tiver ultrapassado o prazo de seis meses a contar do seu início.”

Concluindo, assim, que “uma vez que as liquidações adicionais de IRS, e respetivos juros compensatórios, referentes ao ano de 2014, foram emitidas em 25.5.2019 (cf. alíneas GG) e HH) do probatório) (…) atento o período de suspensão da contagem do prazo de caducidade, previsto no n.º 1 do artigo 46.º da LGT (entre 7.12.2018 e 24.5.2019, no que se refere à Impugnante, e entre 10.12.2018 e 24.5.2019, no que se refere ao Impugnante), e face à data de emissão das respetivas liquidações (em 25.5.2019), não resta senão concluir que, à data, ainda não havia decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação previsto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT.”

E mais uma vez não logra provimento o entendimento dos Recorrentes.

Atentemos, ora, no quadro normativo atinente à caducidade do direito à liquidação.


Preceituava, à data, o artigo 45.º da LGT sob a epígrafe de caducidade do direito à liquidação, e na parte que, ora, releva o seguinte:

“1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro. (…)

O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.”

Mais consignava o artigo 46.º, nº1, do mesmo diploma legal, relativamente à suspensão e interrupção do prazo de caducidade que:

“1 - O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação”.

Sendo, outrossim, de chamar à colação o consignado no artigo 36.º do RCPIT relativamente ao “início e prazo do procedimento de inspeção”, segundo o qual:

“1 - O procedimento de inspeção tributária pode iniciar-se até ao termo do prazo de caducidade do direito de liquidação dos tributos ou do procedimento sancionatório, sem prejuízo do direito de exame de documentos relativos a situações tributárias já abrangidas por aquele prazo, que os sujeitos passivos e demais obrigados tributários tenham a obrigação de conservar.

2 - O procedimento de inspeção é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início.

3 - O prazo referido no número anterior poderá, no caso de procedimento geral ou polivalente, ser ampliado por mais dois períodos de três meses, nas seguintes circunstâncias:

a) Situações tributárias de especial complexidade resultante, nomeadamente, do volume de operações, da dispersão geográfica ou da integração em grupos económicos nacionais ou internacionais das entidades inspecionadas;

b) Quando, na ação de inspeção, se apure ocultação dolosa de factos ou rendimentos;

c) Outros motivos de natureza excecional, mediante autorização fundamentada do diretor-geral dos Impostos.

4 - A prorrogação da ação de inspeção é notificada à entidade inspecionada com a indicação da data previsível do termo do procedimento. (…)”

No atinente à conclusão do procedimento de inspeção importa novamente ter presente o consignado no artigo 62º do RCPIT, o qual, como visto, estatuía que para conclusão do procedimento deve ser elaborado um Relatório Final com vista à identificação e sistematização dos factos detetados e sua qualificação jurídico-tributária, consagrando, por seu turno, o seu nº2 que a notificação ao contribuinte deve ser concretizada “por carta registada nos 10 dias posteriores ao termo do prazo referido no n.º 4 do artigo 60.º, considerando-se concluído o procedimento na data da notificação. (…)”.


Ora tendo presente o plasmado na lei, concretamente, que “o prazo de caducidade do direito à liquidação suspende-se com a notificação ao contribuinte do início de ação inspetiva externa, mas esse efeito suspensivo cessa, e o prazo conta-se do seu início, caso a inspeção ultrapasse seis meses contados a partir daquela notificação”, ter-se-á de concluir que, in casu, as liquidações respeitantes ao ano de 2014, não estão, efetivamente, caducadas.


Com efeito, inexistindo, como já devidamente explanado anteriormente, uma unicidade de procedimentos de inspeção, para efeitos de aferição da caducidade do direito à liquidação há apenas que computar os dados referentes à ação de inspeção externa que culminou nos atos impugnados, os quais não ultrapassaram os aludidos seis meses, não tendo, por conseguinte, o desiderato de obviar à suspensão do seu cômputo.

Concretizando, para os devidos efeitos.

In casu, resulta do acervo fático que o procedimento de inspeção instaurado contra A. C. F. C. C., teve o seu início com a assinatura da Ordem de Serviço n.º OI 201801692, em 7 de dezembro de 2018 (cfr. alínea P) do probatório) e terminou com a notificação, entregue em mão, do respetivo relatório de inspeção no dia 24 de maio de 2019 (cfr. alíneas CC) e EE) do probatório).

Por seu turno, o procedimento de inspeção instaurado contra o C. H. N. M. L. A., teve o seu início com a assinatura da Ordem de Serviço n.º OI 201801693, em 10 de dezembro de 2018 (cfr. alínea Q) do probatório) e terminou com a notificação, entregue em mão, do respetivo relatório de inspeção no dia 24 de maio de 2019 (cfr. alíneas DD) e FF) do probatório).

Logo, como é bom de ver, no período temporal que medeia entre o início e o culminar da ação inspetiva não foram ultrapassados os seis meses consignados na lei, donde, resultando assente que os atos impugnados foram emitidos a 25 de maio de 2019, não ocorre a arguida caducidade do direito à liquidação, donde, a sentença que assim o decidiu não padece do sindicado erro de julgamento.

Aqui chegados, subsiste apenas por analisar o erro de julgamento atinente ao convocado vício de violação de lei, por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, atenta a incorreta tributação, em sede de IRS, dos montantes transferidos para as contas bancárias dos Recorrentes enquanto adiantamento por conta de lucros da sociedade S. LLC, subsumíveis no artigo 5.º, n.º 1 do CIRS.

Vejamos, então.

Os Recorrentes propugnam que a AT presumiu uma doação quanto à transmissão dos suprimentos a favor da sociedade S., contudo a mesma nunca registou a transmissão das quotas a seu favor, mantendo o registo enquanto empréstimos dos sócios.

Concluindo, assim, que existe vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, porquanto preconizada uma errónea interpretação das disposições legais aplicáveis padecendo de erro de julgamento, mormente, do artigo 969.º, n.º 1 do CC.

O Tribunal a quo entendeu que os atos impugnados não padeciam do aludido vício de violação de lei, na medida em que a AT demonstrou os factos índice que legitimam a tributação do valor transferido por ordem da sociedade B., SGPS, S.A. para as contas bancárias dos Recorrentes, enquanto de distribuição de lucros, efetuada pela sociedade com sede em Malta, denominada S., LLC, sujeitando a IRS, no âmbito da categoria E, os valores transferidos, nos termos da alínea h), do n.º 2, do artigo 5.º do CIRS, não tendo os Recorrentes logrado afastar tal natureza, mormente, que os mesmos assumiam uma alegada, mas não demonstrada, restituição de suprimentos realizados.

Com efeito, esteou a aludida improcedência após estabelecer o competente enquadramento normativo e concernente subsunção à factualidade dos autos, relevando, desde logo, que as três ordens de razão avançadas pelos Recorrentes não resultaram provadas.

Nesta conformidade, releva, desde logo, que “não lograram, porém, os Impugnantes demonstrar, nesta sede, que «E. C. não era o único titular do capital da B.», sendo «igualmente acionista, o sr. C. C.» e, bem assim, que ambos «efetuaram suprimentos à referida sociedade de valor idêntico» (cf. pontos 1. a 3. dos factos não provados).”

Propugnando, outrossim, que os Impugnantes, ora Recorrentes, também não lograram demonstrar, nesta sede, que «nunca foi intenção de nenhum dos sócios da sociedade B- SGPS, S.A. transmitir os suprimentos existentes na sociedade» (cf. ponto 4. dos factos não provados), sendo, aliás, contraditória a sua alegação, porquanto, de seguida, argumentam que a sociedade S. «não aceitou a doação dos suprimentos».

Adensando, para o efeito, que “[o]s Impugnantes não alegam - e, consequentemente, não provam - que quer os anteriores detentores do capital da sociedade S., E. C. e sua mulher, quer os ora Impugnantes, alguma vez tenham efetuado empréstimos / prestação de suprimentos à referida sociedade S.

Do mesmo modo, os Impugnantes também não alegam - e, consequentemente, também não provam - que a sociedade S. tenha efetuado a prestação de suprimentos à sociedade B.”

Materializando, depois, por reporte aos respetivos Relatórios de Inspeção Tributária que, “Dado que através destes registos contabilísticos aparentava terem sido reembolsados os suprimentos prestados pelo Sr. E. C. e simultaneamente terem sido prestados novos suprimentos à B., no mesmo montante, por cada uma das sociedades, foi notificada o sujeito passivo, em 26 de Fevereiro de 2019, na qualidade de administradora da B., ao abrigo do Despacho n° DI201900277 desta Direção de Finanças, para apresentação dos comprovativos dos movimentos financeiros subjacentes aos registos contabilísticos acima descritos.

Em resposta à referida notificação, a administradora da B. não apresentou os elementos solicitados, tendo ainda afirmado, em auto de declarações, que aos referidos movimentos contabilísticos não corresponderam quaisquer movimentos financeiros, ou seja, não houve lugar ao reembolso dos suprimentos feitos pelo Sr. E. C. nem à constituição de novos suprimentos, nos montantes registados, por parte das sociedades compradoras» (cf. alíneas Z), AA) e BB) do probatório).”

Relevando, adicionalmente, que “[n]ão se poderá, pois, concluir que «nunca foi intenção de nenhum dos sócios transmitir os suprimentos existentes na B.».

Ao invés, reitera-se, resulta documentalmente provado nos autos que, na sequência da transmissão das ações representativas do capital social da sociedade B. SGPS S.A. para a S. P., LLC e P. H., LLC «com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos» de que E. C. era titular (cf. alíneas VV) e WW) do probatório) -, a B. fez refletir, na sua contabilidade, a transferência dos empréstimos/suprimentos efetuados por E. C. para as sociedades S. P., LLC e P. H., LLC, respetivamente na proporção da participação social que estas sociedades haviam adquirido, através de 2 movimentos, evidenciados nos extratos das subcontas da conta SNC "26 -Acionistas/sócios” da B., debitando o saldo da conta SNC "26702 – E. C.", e creditando as contas SNC “26703 – S. P." e “26704 – P. H.” (cf. alíneas XX), YY) E ZZ do probatório).”

Concluindo, assim, que “[n]ão têm razão os Impugnantes quando alegam que «a realidade dos factos demonstram uma verdade material diferente da propugnada pela AT”.

Logo, “[c]omo bem se sublinha nos Relatórios de Inspeção Tributária, por não haver «qualquer indício ou comprovativo de movimento financeiro que mostre ter havido prestação de suprimentos, quer por A. C., quer por C. C., quer pelo Sr. E. C. ou pela Sra. M. L. C. (anteriores detentores do capital) estes não poderiam ser detentores de empréstimos ou suprimentos reembolsáveis pela S. P., LLC». Donde, pertencendo os mencionados montantes à sociedade S. P. LLC (proveitos) - na sequência da celebração do «CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE ACÇÕES», por via do qual as ações foram transmitidas «com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos» - e tendo os mesmos sido transferidos, em 2014, para as contas bancárias dos seus acionistas, ora Impugnantes, em termos fiscais não podem tais montantes deixar de lhes ser imputados como um seu rendimento, obtido naquele exercício, subsumível na alínea h), do artigo 5.º do CIRS, como rendimento da categoria E.”

Ora, cotejando a fundamentação supra expendida com a realidade fática constante do probatório, ajuíza-se, mais uma vez, que o entendimento propugnado pelo Tribunal a quo não merece qualquer censura, porquanto bem fundamentado, e com irrepreensível transposição do regime normativo à factualidade em contenda.

Senão vejamos.

Comecemos por atentar na fundamentação que fundou as correções aritméticas sub judice, convocando, para o efeito, os respetivos Relatórios Inspetivos, porquanto, como é consabido, é com base neles, e exclusivamente neles, que se deve aferir a legalidade e a bondades das correções.

Ora, compulsado o teor dos mesmos sintetiza-se, da seguinte forma, a fundamentação das correções em contenda:

Ø Em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. M. C. C. era detentor da totalidade do capital da B., SGPS, SA;

Ø Encontrava-se registado na contabilidade da B., SGPS, SA, a favor do Sr. E. M. C. C., um crédito, por suprimentos prestados, no valor de €2.360.673,54;

Ø Em 17 de Junho de 2010, o Sr. E. M. C. C. vendeu a totalidade do capital da B., SGPS, SA, sendo que 60% desse capital, representado por 48.000 ações, foram vendidas à S. P., LLC;

Ø Com a venda do capital social, foram também transferidos para a adquirente “todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos" que o Sr. E. M. C. C. era detentor na B., como consta do contrato de compra e venda, sem que tenha havido qualquer pagamento por parte da S. P., LLC para além do valor atribuído à participação social;

Ø Não existiu, subjacente àquela aquisição feita pela S. P., LLC, qualquer movimento financeiro entre as duas sociedades, tendo a adquirida B., apenas, movimentado contabilisticamente as contas de suprimentos em nome de E. C., passando o correspondente a 60% desse valor para crédito da adquirente S. P., LLC, por indicação do vendedor no contrato de venda, ou seja por E. C.;

Ø Por doação feita em 28 de Abril de 2011, o sujeito passivo C. A. passou a deter 50% do capital social da S. P., LLC;

Ø Após notificado o sujeito passivo para o efeito, não foi invocado nem ficou provado que o Sr. E. C. e ou a Sra. M. L. C. tenham prestado suprimentos à S. P., LLC;

Ø Não foi invocado e consequentemente provado pelos sujeitos passivos ter sido feitos, por si, quaisquer empréstimos ou prestação de suprimentos à S. P., LLC;

Ø Por outro lado, se o motivo do recebimento, em apreço, por parte de A. C., do montante total de €300.000,00, fosse "para restituição de suprimentos, que o seu pai o Sr. E. C., fez à Empresa", conforme a mesmo afirmou em auto de declarações, na qualidade de acionista da B., como prova não foi apresentado qualquer contrato de mútuo entre a S. P., LLC e a B., S.G.P.S., S.A., nem qualquer comprovativo de movimento financeiro entre estas duas sociedades, nem comprovativo de pagamento de Imposto de Selo devido à prestação daquele mútuo, se tivesse, de facto, existido. Esse contrato teria que ser feito por escritura pública, nos termos do Artigo 143° do Código Civil, e à sua inobservância é aplicada a regra do artigo 364° do mesmo código, com a consequência de a falta importar a invalidade do contrato, conforme dispõe o artigo 219.° daquele código;

Ø Por outro lado, se o motivo do recebimento, em apreço, por parte de C. A., do montante total de €950.000,00, fosse "para restituição de empréstimos feitos pela empresa S. P., LLC à B. S.G.P.S.", conforme o mesmo afirmou em auto de declarações, na qualidade de acionista da B., como prova não foi apresentado qualquer contrato de mútuo entre a S. P., LLC e a B., S.G.P.S., S.A., nem qualquer comprovativo de movimento financeiro entre estas duas sociedades, nem comprovativo de pagamento de Imposto de Selo devido à prestação daquele mútuo, se tivesse, de facto, existido. Esse contrato teria que ser feito por escritura pública, nos termos do Artigo 143° do Código Civil, e à sua inobservância é aplicada a regra do artigo 364° do mesmo código, com a consequência de a falta importar a invalidade do contrato, conforme dispõe o artigo 219° daquele código;

Ø Apenas poderia haver reembolso aos sócios se esses tivessem prestado suprimentos à S. P., LLC, mas tal situação nunca foi invocada ou demonstrada documentalmente através de movimentos financeiros» (cf. alíneas AA) e BB) do probatório, em concreto ponto III.3 dos RIT).

Em razão do supra descrito, concluiu a AT que “com a aquisição da participação social, além de um ativo financeiro, a S. P., LLC obteve um incremento patrimonial, uma vez que "adquiriu” também o direito a receber um valor de € 1.416.404,14 relativamente a suprimentos incluídos no preço de compra da participação social, sem que a essa compra tenha correspondido um exfluxo de capital ou direitos” e, por outro, que os Impugnantes, enquanto detentores do capital social da sociedade S. P. LLC, apenas poderiam receber os valores em causa, na qualidade de acionistas da referida sociedade, “por lucros distribuídos em razão da variação patrimonial ocorrida, na esfera da S. P., LLC, aquando da aquisição da participação financeira na B. e realizada na data em que as transferências foram ordenadas, por esta, para devolução dos suprimentos prestados pelo anterior acionista mas cujo direito foi cedido (a título gratuito) à S. P., LLC» e que «para efeitos de incidência de IRS, os recebimentos em causa são, no caso, frutos de investimento de capital (lucros distribuídos), enquadráveis no artigo 5.º n° 1 do Código do IRS» (cf. alíneas AA) e BB) do probatório).”

Feita a enumeração da realidade fática e as razões de direito que externaram as correções sindicadas, cumpre convocar o respetivo regime jurídico, desta feita, e em particular, o artigo 5.º do CIRS.

Com efeito, dispunha, à data, o citado artigo 5.º do CIRS, epigrafado de “Rendimentos da Categoria E”, que:

“1 - Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, direta ou indiretamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respetiva modificação, transmissão ou cessação, com exceção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.

2 - Os frutos e vantagens económicas referidos no número anterior compreendem, designadamente:

(…)

h) Os lucros e reservas colocados à disposição dos associados ou titulares e adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 20.º”.

Do teor do citado normativo retira-se que são considerados rendimentos de capitais sujeitos a incidência de IRS, os lucros, incluindo os adiantamentos por conta de lucros, colocados à disposição dos respetivos titulares, desde que se demonstre, para o efeito, os factos génese.

Relevando-se, adicionalmente, que a única presunção legal estabelecida neste particular se encontra plasmada no artigo 6.º, nº4, do CIRS, segundo o qual “os lançamentos em quaisquer contas correntes dos sócios, escrituradas nas sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, quando não resultem de mútuos, da prestação de trabalho ou do exercício de cargos sociais, presumem-se feitos a título de lucros ou adiantamento dos lucros”.

Ora, vista a fundamentação fáctico-jurídica externada e o competente quadro normativo, cumpre aquilatar se a factualidade vertida no probatório legitima, per se, e conforme sufragado pelo Tribunal a quo, a tributação enquanto Categoria E.

E a resposta é, conforme já deixámos antever, afirmativa. Senão vejamos.

Com efeito, as asserções fáticas contempladas como factualidade não provada e não impugnada, permitem, desde logo, validar o juízo em que se fundaram as correções aritméticas realizadas pela AT, e cuja legalidade foi secundada pelo Tribunal a quo, na medida em que das mesmas consta que:

“1. E. C. era titular de 60% do capital social da sociedade B. SGPS, S.A.;
2. C. C. era titular de 40% do capital social da sociedade B. SGPS, S.A;
3. E. C. e C. C. efetuaram suprimentos à sociedade B. SGPS, S.A. de idêntico valor;
4. Nunca foi intenção de nenhum dos acionistas transmitir os suprimentos existentes na sociedade B. SGPS, S.A.”

É certo que as alegações contempladas no recurso assentam, essencialmente, na circunstância de que a sociedade S. “não aceitou tal doação, porquanto nunca fez seus tais valores”, na medida em que tais suprimentos nunca foram registados pela aludida sociedade como seus, mantendo registado um crédito a favor dos sócios.

Mas, a verdade é que tal argumentação não logra provimento, na medida em que as asserções dimanantes do próprio contrato de cessão permitem inferir o oposto, em nada podendo lograr efeito útil a alegada falta de aceitação da aduzida doação, contraditada, de resto, pela factualidade enunciada no Relatório de Inspeção Tributária e plasmada no probatório.

Neste particular, atente-se, neste e para este efeito, no que se encontra vertido no aludido Relatório.

“[n]o ano de 2010, segundo informação constante no “S. P., Limited Notes to the Financial Statements" (…) resulta que:

(…)

“4 INTERCOMPANY DEBTORS The company has made a loan to B. SGPS SA which is unsecured, interest free with repayment date unspecified”

(…)

Ora da leitura destas demonstrações financeiras retira-se o seguinte:

- a sociedade S. P., LLC, em 2010, aquando da aquisição de 60% do capital social da B., registou o seu direito a receber desta participada os suprimentos que E. C. lhe havia prestado até 2009, direito esse que veio nesse momento à sua posse, a título gratuito;

- esse direito não se constituiu por ter ela própria prestado os suprimentos;

- o direito não foi reconhecido tendo como contrapartida uma conta de capital, representando um incremento patrimonial, mas sim como um empréstimo dos seus sócios, que à data eram E. M. C. C. e M. L. N. M. C. C., situação nunca invocada e demonstrada;

Estas demonstrações financeiras, relembramos, são contrárias ao estipulado no contrato de compra e venda outorgado entre o Sr. E. C. e a sociedade S. P., LLC, que estipula que é feita a transmissão das ações da B. "com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos e outros créditos de que o PRIMEIRO CONTRAENTE seja titular e livres de quaisquer ónus ou encargos.", pelo preço de 300 mil, bem como, ao declarado pela administradora da B., que referiu não ter havido movimento financeiro subjacente aos lançamentos contabilísticos efetuados em 2010, ou seja, a S. P., LLC não concedeu qualquer empréstimo ou prestou qualquer suprimento à B..

Face à incongruência detetada, e atendendo à informação constante nos documentos disponibilizados, foi novamente notificada em 26 de Fevereiro de 2019, o sujeito passivo A. C. para apresentação dos elementos não apresentados na anterior notificação efetuada:

a) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de aquisição da posição de capital na B., SGPS, S.A., realizada em 17 de Junho de 2010, bem como de todos os direitos/obrigações adquiridos com essa transação;

b) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de recebimento do montante de € 1.416.404,14, através de pagamento deliberado pela B., SGPS, S.A., em 03 de Janeiro de 2014;

c) Registo contabilístico na sociedade S. P., LLC da operação de pagamento do montante de € 1.416.404,14, aos acionistas;

E ainda para proceder à entrega dos comprovativos dos movimentos financeiros identificados no "Notes to the Financial Statements for the year ending 31 December 2011" entregue em 19 de Fevereiro de 2019, com a seguinte descrição e montantes:

"4 Intercompany debtors: valores de 1.416.404 euros e de 200.000 euros";

"5 Shareholders loan: valor de 1.986.404 euros”;

Em 08 de Março de 2019 o sujeito passivo, em auto de declarações, referiu não ser possível proceder à entrega dos solicitados justificativos, por não os ter em sua posse e desconhecer se os mesmos existem (…)”.

Logo, como é bom de ver, a AT cumpriu o ónus probatório que sobre si impendia, não tendo os Recorrentes apresentado quaisquer documentos passíveis de sustentar os lançamentos contabilísticos em causa, e afiançar que “nunca foi intenção de nenhum dos acionistas transmitir os suprimentos existentes na sociedade B. SGPS, S.A.”, como visto, dimanante da factualidade não provada.

Note-se, ademais, e como bem ajuizado pelo Tribunal a quo, o que resulta demonstrado nos autos é o inverso do propugnado pelos, ora, Recorrentes na medida em que, da conjugação das alíneas VV) e WW) cotejadas com as alíneas XX), YY) e ZZ do probatório, resulta demonstrado que na sequência da transmissão das ações representativas do capital social da sociedade B. SGPS S.A, para a sociedade S. P., LLC e P. H., LLC foram transmitidos “todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos” de que E. C. era titular.

Por seu turno, a B. fez refletir, na sua contabilidade, a transferência dos empréstimos/suprimentos efetuados por E. C. para as sociedades S. P., LLC e P. H., LLC, respetivamente na proporção da participação social que estas sociedades haviam adquirido, através de dois movimentos, evidenciados nos extratos das subcontas da conta SNC "26 -Acionistas/sócios” da B., debitando o saldo da conta SNC "26702 – E. C.", e creditando as contas SNC “26703 – S. P." e “26704 – P. H.”.

Daí que, a sociedade B., em 2010, aquando da transmissão de 60% do seu capital social para a sociedade S., registou a favor desta, um crédito de suprimentos no valor de € 1.416.404,14. Sendo que, a 28 de abril de 2011, os sócios da referida sociedade, E. C. e M. L. C., cederam a participação que detinham na sociedade S. aos ora Impugnantes, motivando a 03 de janeiro de 2014, a deliberação em assembleia geral da sociedade B., do reembolso dos suprimentos efetuados a esta sociedade, então contabilisticamente registados em nome da sua acionista S., no montante de €1.416.404,14, determinando-se que o mesmo seria transferido para as contas bancárias dos então detentores do capital social da referida sociedade S., os ora Recorrentes.

Logo, não assiste, de todo, razão aos Recorrentes quando advogam, sem qualquer suporte atinente ao efeito, que os créditos de suprimentos “se mantiveram na posse dos sócios e foram doados aos filhos”, bem pelo contrário.

Secundando-se, assim, o ajuizado pelo Tribunal a quo, neste particular, no sentido de que “[c]arecem de suporte as alegações dos Impugnantes no sentido de que «a acta com o n.º 3, datada de 3 de janeiro de 2014 (…) da sociedade B., em que é decidida a distribuição de dividendos às sociedades detentoras do capital social, não poderia ser cumprida, pois as sociedades não aceitaram as doações», que «desconhece-se a legitimidade para a decisão por parte do representante das sociedades P. e S. P., LLC», ou que «nunca foi intenção transmitir os suprimentos, só se concebendo tal facto como um lapso na elaboração do contrato de venda das participações sociais», sendo certo que, em face da demais prova documental produzida nos autos, tais alegações, desacompanhadas de qualquer outros elementos, em nada permitem contrariar a legitimidade das correções efetuadas.

Tanto mais quando são os próprios Impugnantes que declaram, na qualidade de «últimos beneficiários da empresa S. P. LLC», que iriam proceder «ao levantamento directo pela B. do montante correspondente à S. P. LLC através de suprimentos existentes na empresa» (cf. alínea CCC) do probatório).

Assim, e como bem se sublinha nos Relatórios de Inspeção Tributária, por não haver «qualquer indício ou comprovativo de movimento financeiro que mostre ter havido prestação de suprimentos, quer por A. C., quer por C. C., quer pelo Sr. E. C. ou pela Sra. M. L. C. (anteriores detentores do capital) estes não poderiam ser detentores de empréstimos ou suprimentos reembolsáveis pela S. P., LLC”.

Destarte, inexiste o apontado erro de julgamento, sendo de validar o juízo de entendimento da AT, confirmado pelo Tribunal a quo, no sentido de que face à outorga do «CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE ACÇÕES», mediante o qual as ações foram, como visto, transmitidas “com todos os direitos e obrigações, incluindo os suprimentos”, os mencionados montantes pertencem e circunscrevem-se na esfera da sociedade S. P. LLC.

Logo, tendo os mesmos sido transferidos, em 2014, para as contas bancárias dos seus acionistas, ora Recorrentes, os mesmos têm de qualificados como rendimentos da Categoria E, subsumíveis na alínea h), do artigo 5.º do CIRS, sancionando-se, portanto, que os ora Recorrentes “enquanto detentor[es] do capital da S. P., LLC, apenas poderia[m] receber a[s] transferência[s] bancária[s]» aqui em causa «por lucros distribuídos em razão da variação patrimonial ocorrida, na esfera da S. P., aquando da aquisição da participação financeira da B.», realizada «na data em que a transferência foi ordenada, por esta, para devolução dos suprimentos prestados pelo anterior acionista mas cujo direito foi cedido (a título gratuito) à S. P., LLC”.

Note-se, ademais, que conforme expendido no Acórdão do TCANorte, prolatado no processo nº 00446/11, de 07 de julho de 2016(4): “[a] norma do artigo 5.º, n.º 2, alínea h) do CIRS não exige a escrituração formal dessa realidade como pressuposto de incidência, mesmo porque “deixar ao critério do sujeito passivo a “classificação” como adiantamento por conta de lucros, de realidades da vida corrente das sociedades comerciais, que constituem verdadeiros desvios de fundos em proveito dos sócios, seria frustrar o interesse público do Estado na arrecadação de impostos e no combate à fraude e evasão fiscais e permitir que ficassem por tributar verdadeiros incrementos patrimoniais dos sócios”. É comummente aceite que quando os lucros distribuídos ou adiantamento por conta de lucros são devidamente escriturados, estamos perante um rendimento sujeito a impostos sobre o rendimento das pessoas singulares. Porém, o mesmo não acontece quanto uma parte do património das sociedades é afectado ou onerado, por contrapartida da transferência duma parte deste, de modo permanente e definitivo, para a esfera jurídica de um associado ou titular, sem que às mesmas operações lhes sejam dados os qualificativos de "lucros distribuídos" ou "adiantamentos por conta dos lucros". Tal situação ocorre quando os montantes, que deviam ter sido reconhecidos como proveitos das sociedades, acabam por não ser registados nas contabilidades destas e vão acrescer ao património individual dos respectivos associados ou titulares e, ainda, quando o registo, apesar de efectuado na contabilidade da sociedade, não foi relevado numa conta de proveitos, mas sim numa qualquer conta de passivo que confira ao associado ou titular o direito de, como qualquer normal credor, vir a exercer a respectiva exigibilidade - vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 27/01/2009, proferido no âmbito do processo n.º 02479/08.”

Conclui-se, assim, que inexiste o apontado erro de julgando, tendo a AT cumprido o ónus probatório que sobre si impendia, não logrando os Recorrentes afastar os factos índice convocados, e que permitam sustentar a alegada restituição de suprimentos, atenta, designadamente, e como visto, a inexistência de suporte documental e movimentos financeiros nesse e para esse efeito. Sendo certo que, sublinhe-se e enfatize-se a AT envidou uma postura de colaboração e pautada no inquisitório refletida, justamente, nos diversos esclarecimentos requeridos aos Recorrentes.

E por assim ser, deveriam os sujeitos passivos, ora Recorrentes, ter englobado os rendimentos de €300.000,00, e €950.000,00 provenientes de adiantamento por conta de lucros, não o tendo feito encontram-se legitimadas, por legais, as correções aritméticas realizadas e, ora, sindicadas.

Pelo que a sentença que assim o decidiu não padece do erro de julgamento que lhe é apontado, devendo, por isso, ser confirmada.


***


No caso sub judice, considera-se que o valor de taxa de justiça devida a final, calculado nos termos da tabela I.B., do RCP, é excessivo. Porquanto, ponderadas as circunstâncias do caso vertente à luz dos critérios escolhidos pelo legislador, em especial, o comportamento processual das partes litigantes, sem qualquer reparo negativo a apontar e a complexidade do processo, determina-se que haja lugar à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no art.º 6.º, n.º 7, do RCP.

***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, e confirmar a decisão recorrida, a qual se mantém na ordem jurídica.

Custas pelos Recorrentes, com dispensa do remanescente da taxa de justiça, na parte em que excede os €275.000,00.

Registe. Notifique.



Lisboa, 11 de janeiro de 2023

(Patrícia Manuel Pires)

(Jorge Cortês)

(Luísa Soares)






1) cfr. artigo 333.º da Lei n.º 114/2017, de 24 de dezembro, com início de vigência a 1 de janeiro de 2018.
2) Vide, designadamente, Acórdão TCAS, proferido no processo nº 134/08, de 20.02.2020
3) in Irrepetibilidade das Inspeções - Um contributo jurisprudencial, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 7, n.º 1, pp. 181 e 182.
4) Vide, outrossim, Acórdãos do STA, proferido nos processos nº 0769/13, de 13.11.2013, TCAS, proferidos nos processos nº 175/08, de 30.09.2021 e 1236/10, de 25.02.2021.