Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:732/11.8BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:09/30/2025
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:MÉTODOS INDIRETOS
ÓNUS DA PROVA/IRREGULARIDADES CONTABILÍSTICAS
DEMONSTRAÇÃO DO EXCESSO DE QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA COLETÁVEL
Sumário:I-O Relatório de Inspeção Tributária é um documento que, quando devidamente fundamentado e desde que baseado em critérios objetivos, faz fé pública relativamente aos factos que integra.

II- O documento evidenciado em I), é, no entanto, um meio de prova, competindo, assim, ao Tribunal valorá-lo de acordo com o princípio da livre apreciação da prova e fixar, autónoma e fundamentadamente, a factualidade que repute pertinente para o litígio a dirimir.

III-Decorre do artigo 104.º, nº2 da CRP, que deve evitar-se a existência de imposto sem rendimento efetivo, contudo a tributação pelo rendimento real constitui um princípio ou uma regra que permite, excecionalmente, desvios ou exceções.

IV-Compete à AT demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiretos e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação;

V-A escolha do critério deve ser externada mediante uma fundamentação clara, coerente, ainda que possa ser sucinta, estabelecendo, por seu turno, o artigo 90.º da LGT, os critérios de quantificação da matéria tributável por métodos indiretos cujo elenco não é taxativo, admitindo, ademais, a alínea d), que a AT possa socorrer-se de outros elementos declarados pelo próprio contribuinte.

VI-Tendo sido atestadas divergências, incoerências, inexatidões, modificação de forma de inventariação, valores por estimativa, e bem assim margens de comercialização globais, manifestamente inferiores às que promanam da análise da rentabilidade dos produtos, as mesmas mediante interpretação conjugada com os demais indícios, permitem alicerçar a convicção de que se encontra impossibilitada a necessária comprovação, verificação e validação das existências finais contabilizadas em cada um dos exercícios, e nessa medida, apurar, de forma direta, o resultado do exercício declarado em cada ano.

VII-Compete ao Impugnante de acordo com o critério legal de repartição do ónus da prova demonstrar o excesso de quantificação, não bastando suscitar dúvidas quanto ao resultado obtido, antes impondo-se que demonstre a inadequação ou errada aplicação dos critérios de quantificação utilizados, e que as mesmas traduzam, por conseguinte, excesso de quantificação.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:

ACÓRDÃO


I – RELATÓRIO

L……… LACAGEM …………….., LDA., (doravante Recorrente ou Impugnante), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou improcedente a impugnação judicial das liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) dos exercícios de 2007, 2008 e 2009, no montante total de €36.841,37,


***

A Recorrente apresentou as suas alegações, formulando as conclusões, que infra se reproduzem:

CONCLUSÕES:

a. O nosso sistema jurisdicional de julgamento da matéria de facto tributária, alegada pela AT e pelos particulares, assenta no princípio da liberdade de convicção do juiz na apreciação das provas (art.º 607.º n.º 5 do CPC e 2.º, alínea e) do CPPT).

b. O art.º 607.º n.º 5 do CPC não confere ao juiz quaisquer poderes constitutivos sobre quais as provas admissíveis em juízo e sobre qual a sua força probatória: os meios probatórios são os que como tal estão definidos na lei e, por outro lado, em nada, essa liberdade pode ser vista como contendo qualquer espaço de discricionariedade do julgador sobre os critérios pelos quais ele deve formar a sua convicção na apreciação dos factos que são alegados pela AT ou pelos particulares.

c. A convicção do juiz tem de ser elaborada em função da natureza das provas admissíveis em direito e da força probatória que lhes é conferida pela lei. Sobre elas dispõem, em termos gerais, os art.ºs 341.º a 396.º do Código Civil, referindo, essencialmente, as presunções legais, as presunções judiciais, a confissão, os documentos autênticos, os documentos particulares, a prova pericial, a prova por inspecção e a prova testemunhal, e, em sede de matéria tributária, também especificamente os art.ºs 115.º, n.º 2 do CPPT e 76.º, n.º 1 da LGT – as informações oficiais.

d. A sentença recorrida relevou, erradamente, o relatório dos serviços de fiscalização tributária, constante do processo administrativo junto ao processo de impugnação judicial e no qual se fundaram as liquidações impugnadas, como sendo um documento autêntico com força probatória plena relativamente a todo o seu conteúdo descritivo.

e. O art.º 371.º, n.º 1, do CC estabelece que os documentos autênticos “fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador”.

f. Uma coisa é o relato dos actos por si praticados como autoridade competente em matéria de fiscalização tributária (agente de fiscalização tributária) e a constatação ou o relato dos factos ou de dados de facto que estão retratados na concreta e examinada contabilidade do contribuinte, nos seus documentos de suporte ou até em outros documentos de terceiros, que estão abrangidos pela força probatória plena e uma outra coisa completamente distinta é a determinação que é feita pela mesma autoridade pública, a partir dessas bases de facto, socorrendo-se, para tanto das regras racionais, da lógica, da ciência, da experiência comum, ou até das regras técnicas, que tem por ajustadas à matéria e à situação factual, de factos que têm a natureza de mero resultado de ilações tiradas pelo agente, a qual é de livre apreciação do juiz, devendo a convincência deste ser baseada nas regras da lógica, da técnica, da ciência, da contabilidade, da e experiência comum.

g. A extensão da força probatória plena aos factos que são atestados com base nas percepções da entidade documentadora cinge-se aos factos cuja determinação é directamente, resultante da percepção directa da autoridade documentadora, abrangendo apenas os factos cuja existência é constatada a partir das capacidades de registo visual, auditivo, sensitivo ou técnico do agente de autoridade.

h. Sempre que a afirmação da existência dos factos derive da elaboração de um juízo construído sobre certa base factual antes determinada não pode falar-se de uma percepção contida na capacidade documentadora de constatação do que se passou.

i. O relatório dos serviços de fiscalização tributária só pode considerar-se, assim, como documento autêntico na parte em que o mesmo corresponda ao desempenho da actividade material que o agente de autoridade levou a cabo, compreendida na sua competência administrativa de fiscalização e de controlo.

j. O juízo sobre se a veracidade do conteúdo que o integra, para além desse âmbito, é já um momento exterior ao documento consubstanciado no relatório, devendo ser levado a cabo com base nos meios de prova admitidos em direito e de acordo com a força probatória que a lei lhes atribui.

k. Ao contrário do entendido na sentença recorrida, os art.ºs 76.º, n.º 1 da LGT e 115.º, n.º 2 do CPPT não conferem às informações oficiais, entre as quais se inclui o relatório dos serviços de fiscalização, qualquer força probatória plena relativamente a todo o seu conteúdo: o sentido de tais preceitos é o de estabelecer que as informações oficiais são provas admissíveis em direito a apreciar segundo o princípio da livre apreciação, fora do âmbito que não esteja coberto por regra de tabelação legal do valor probatório.

l. É completamente infundado o entendimento sufragado na sentença recorrida, no sentido de à cessação da presunção de verdade das declarações dos contribuintes e dos dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, estabelecida no art.º 75.º, n.º 1 da LGT, por mor da verificação de anomalias, incorrecções ou incongruências a que alude o n.º 2 do mesmo artigo, se suceder, correlativamente, uma presunção de veracidade das informações oficiais da AT que, fundamentadamente, constatam tais anormalidades das declarações, dados e apuramentos inscritos na contabilidade ou escrita do contribuinte.

m. As presunções legais só existem quando constituídas pelo legislador: ora não existe preceito que expressamente a contemple na situação dos autos.

n. Mas independentemente de inexistir norma que preveja essa alegada presunção, acresce que a mesma conclusão se retira do estabelecido no art.º 74.º, n.ºs 1 e 3 da LGT, ao prever que cabe à AT o ónus de prova dos factos constitutivos dos direitos por si invocados contra o contribuinte, bem como dos factos integradores dos conceitos indeterminados de anomalias, incorrecções e incongruências a que alude o n.º 2 do art.º 75.º da LGT: se a dúvida sobre a existência do facto se resolve contra quem tem o ónus de prova (AT) é porque não existe (ou a AT não goza de) qualquer presunção legal da sua existência.

o. No mesmo caminho se situa o art.º 87.º, n.º 4 do CIVA ao afirmar que “se for demonstrado, sem margem para dúvidas, que foram praticadas omissões ou inexactidões no registo e na declaração a que se referem, respectivamente, as alíneas a) do n.º 2 do art.º 65.º e c) do n.º 1 do artigo 67.º, procede-se à tributação do ano em causa com base nas operações que o sujeito passivo presumivelmente efectuou, sem ter em conta o disposto no n.º 1 do art.º 60.º”.

p. Entendendo, embora, como a sentença, que esta demonstração não tem de corresponder a uma certeza lógica, a efectuar pela AT, resulta, todavia, evidente que a AT está obrigada a provar, com base nos meios gerais de prova admissíveis em direito, o que afirma no conteúdo do relatório, no que esteja para além dos factos directamente percepcionados, a que se cinge a força probatória plena, tendo nesse âmbito o relatório a natureza de um documento de livre apreciação.

q. A prova dos factos integradores dos pressupostos que autorizam a utilização do método de avaliação indirecta para a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis, bem como da expressão quantitativa dos mesmos, que são referidos no relatório dos serviços de fiscalização tributária, rege-se pelas normas gerais em matéria de prova, conferindo o legislador ao relatório também a natureza de prova que faz fé em juízo nos termos admitidos pelo princípio da liberdade de convicção do julgador, na sua apreciação.

r. Ora, analisado o julgamento efectuado pela sentença recorrida em sede da matéria de facto, constata-se que o julgador atribuiu a todo o conteúdo do relatório dos serviços de fiscalização tributária a natureza de prova de presunção legal, dando por assentes os factos fixados no probatório, que estão referidos no conteúdo desse relatório, apenas em função da presumida existência e admissibilidade de prova por presunção e não em função de uma apreciação crítica operada dentro do princípio da liberdade de apreciação das provas.

s. Não obstante, sempre haverão que ser dados como provados os factos supra referidos e extraídos do relatório pericial e bem assim a eliminação do facto não provado sob a alínea R), o qual deve passar a provado na seguinte dimensão: do processo de lacagem resultam desperdícios, cuja percentagem não se logrou apurar.

t. Tendo em conta os factos provados, não se verifica a situação da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria tributária, ao contrário do que arrazoou a AT.

u. Na verdade, conquanto padecendo de alguns erros formais, certo é que a AT pode, perante a contabilidade da recorrente, alcançar a certeza sobre a expressão exacta dos factos tributários e da sua quantificação.

v. No mínimo, impõe-se dar como não provada essa impossibilidade e, tendo em conta que o ónus de prova da dúvida relativamente a essa matéria se resolve contra a AT, devem, decorrentemente, ser anuladas as liquidações efectuadas com recurso à avaliação indirecta.

w. A sentença incorre ainda em outro erro de direito ao entender o disposto no n.º 3 do art.º 74.º da LGT como dispensando a AT de fazer prova dos elementos de facto que interessam à determinação da quantificação da matéria tributária.

x. Ao contrário do entendido pela decisão recorrida, a AT está obrigada a provar os factos que importam a tal quantificação: o que acontece é que, em caso de dúvida sobre essa existência, esta deve ser resolvida contra o contribuinte, se a mesma respeitar a alegado excesso, pelo que o ónus de prova apenas cabe ao sujeito passivo no que importa à prova respeitante aos factos que integrem a demonstração da existência do excesso da quantificação.

y. Por outro lado, importa notar que o ónus de prova do contribuinte sobre os factos integradores do excesso da quantificação não se traduz em um ónus de prova de um excesso de quantificação em montante preciso ou concretamente balizado: sendo o valor dos rendimentos ou bens tributáveis determinados indirectamente, com base “em indícios, presunções ou outros elementos que a administração disponha” (art.º 83.º, n.º 2 da LGT), também o excesso de quantificação poderá ser demonstrado por forma estimada, não se podendo exigir do contribuinte o cumprimento das regras da avaliação directa para se poder dar como demonstrado esse excesso ou a prova da expressão quantitativa exacta do excesso.

z. O entendimento em sentido contrário corresponderia a defender a aplicação, para o mesmo acto da determinação da matéria tributável, de dois sistemas diversos de avaliação (directa e indirecta), com quebra do princípio consitucional da igualdade em matéria de acesso ao direito e aos tribunais, na vertente relativa à exigência da conformação de um processo equitativo, consagrada no art.º 20.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.

aa. Todo o probatório da sentença se encontra inquinado de erro de julgamento, porquanto entendeu que o relatório dos serviços de fiscalização tinha a natureza de documento autêntico e que o mesmo fazia prova plena relativamente a tudo o que dele constava e que gozava de presunção legal da veracidade em relação a todo o seu conteúdo, independentemente de os factos haverem sido directamente percepcionados com base na visão, audição, sensibilidade, apoiados ou não em meios técnicos ou tecnológicos ou de se ter aportado ao conhecimento dos factos apenas com base em ilacções formadas sobre factos que antes haviam sido directamente percepcionados, pelo que há que repeti-lo na sua totalidade, independentemente de se poder chegar, em alguns pontos, a um resultado de igual sentido.

bb. O facto de a AT ter o poder, na determinação indirecta do valor dos bens ou rendimentos tributáveis, de lançar mão de indícios, presunções e outros elementos objectivos de que disponha (art.º 83.º, n.º 2 da LGT) e de os critérios enunciados no art.º 90.º da mesma Lei estarem funcionalmente vocacionados para essa determinação indirecta, que naturalmente só poderá ser uma determinação estimada ou presuntiva (presunção hominis), não subtrai a decisão administrativa de fixação do critério de quantificação ao âmbito normativo do art.º 268.º, n.º 3 da CRP, que estabelece, sem excepções, o dever fundamental de fundamentação, de forma expressa e acessível, de todas as decisões administrativas que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados.

cc. A circunstância de o n.º 4 do art.º 77.º da LGT, que dispõe sobre a extensão e o conteúdo do dever de fundamentação, em caso de decisão administrativa de tributação pelos métodos indirectos, usar a expressão “e indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável” não quer dizer, ao contrário do argumentado na sentença recorrida, que a administração não tenha de expor as razões pelas quais lança mão do concreto critério na decisão de quantificação, quais os factores ou elementos que o compõem, ou que o corporizam, e os termos em que o mesmo funciona ou opera para determinar indirectamente a matéria tributável.

dd. A AT tem de precisar, no seu discurso de fundamentação, na situação concreta, quais os termos, factores ou elementos que corporizam o concreto critério que decidiu aplicar, independentemente deste ser nominado ou inominado, e os termos em que o mesmo opera: a indicação de qualquer critério de avaliação pressupõe necessariamente que se deixem enunciados, em termos gerais e abstractos, os parâmetros e factores que o corporizam (sendo perante eles que há que fazer o juízo da sua adequação para a inferência do valor indirecto a determinar), sendo por comparação com eles que há que confrontar os factos apurados para apurar o seu resultado.

ee. Mas afinal o que é isto do indicador da rentabilidade fiscal do volume de negócios???

ff. Sem enunciação, em termos gerais e abstractos, dos elementos, factores ou parâmetros que compõem a estrutura do critério elegido e da bondade dos mesmos para concretamente aferir a matéria tributável avaliada indirectamente, não é possível falar da indicação de certo critério, seja ele nominado ou inominado e muito menos dar-se satisfação à exigência da externação, em concreto, da ponderação dos concretos factores que influenciaram a determinação do resultado.

gg. Ao contribuinte cabe apenas controverter a bondade, idoneidade ou aptidão do critério concretamente elegido para aferir a matéria tributável fixada, bem como a correcção da ponderação dos factores concretos (factos pressupostos e ponderações) que foram tidos em conta pela administração e a exactidão desses factores no caso concreto.

hh. Coisa diferente – e que será a responsável pela errada visão judicial – é o entendimento (que não seguimos) de que a fundamentação tenha de expor as razões pelas quais a AT não lançou mão de outros critérios possíveis porventura tidos por mais adequados, pois esta questão tem a natureza de questão académica.

ii. Acresce que da confissão feita pela FP, em 22.6.2018, resulta que o CAE em que a impugnante foi inserida até 31.12.2007, compreende a fabricação de estruturas e partes metálicas para pontes, torres, mastros, comportas, pilares e para outros fins e inclui a fabricação de construções metálicas préfabricadas (elementos modulares para exposições, barracões de estaleiros de construção, etc.), actividades que manifesta e claramente não tinha nem tem, não existindo qualquer correspondência entre o CAE 28110 e o CAE 25610 que compreende a metalização, esmaltagem, anodização, galvanização, polimento, endurecimento, gravação, desbarbamento, decapagem, limpeza, plastificação, lacagem, coloração, tratamento térmico e outros tratamentos similares dos metais, efectuados geralmente em regime de subcontratação ou à tarefa.

jj. A validade técnica do critério exige que o universo dos factores-base de conformação do critério assumido pela administração seja idêntico ou próximo daquele a que a situação investigada se reporta, o que não verificou dada a forma errada e parcial como a AT abordou e concretizou a análise efectuada.

kk. O entendimento da sentença, em sentido contrário ao aqui expendido, sofre de erro de direito, sendo a interpretação conjugada dos art.ºs 84.º, n.º 3 e 77.º, n.º 4 da LGT, aplicada na sentença recorrida, patentemente inconstitucional, por violação do art.º 268.º, n.º 3 da CRP, inconstitucionalidade que aqui se deixa invocada para todos os efeitos.

ll. Ao contrário do considerado na sentença recorrida, a indicação feita do critério aplicado pela AT, efectuada nos autos, sofre ainda de falta/insuficiência formal de fundamentação.

mm. A fundamentação expendida limita-se a indicar o critério da rentabilidade fiscal do volume de negócios segundo os valores médios do sector de actividade em que a recorrente se insere (CAE 25610) e na expressão com que o mesmo “consta da base de dados da DGCI”, apenas referindo, a mais, que “o indicador é obtido com base no tratamento estatístico das declarações de todos os contribuintes entregues e que se inserem neste sector de actividade, não sendo deste modo um indicador estimado de forma subjectiva”, sem que se diga qual a sua estrutura abstracta e que factores ou elementos é que o compõem e o modo como operam, cingindo-se a mencionar a fonte de conhecimento dos elementos que considerou.

nn. Sem indicação dos parâmetros que compõem o critério, por banda da AT, não se vê como é que o contribuinte possa saber se a sua estrutura concreta de custos, bem como, por exemplo, se as quebras de produção, desperdícios de materiais utilizados no fabrico (e cuja expressão influencia seriamente a rentabilidade fiscal), estão, aí, relevados.

oo. O contribuinte não está obrigado legalmente a conhecer os termos do critério, os seus factores constitutivos ou relevantes e respectiva ponderação que constam da base de dados da DGCI.

pp. Cabia à AT expressar os parâmetros ou elementos do critério que constam da referida base de dados da DGCI e fundamentar a idoneidade ou adequação da aplicação dos mesmos na situação concreta, bem como efectuar a ponderação dos factores concretos da avaliação tidos em conta.

qq. Ora, a sentença recorrida entendeu não caber no dever de fundamentação da decisão de quantificação esses aspectos: assim sendo, não está o contribuinte na posição de saber se existe justaposição aos factores abstractos do critério dos factores concretos do caso, e determinar-se pela sua aceitação ou pela sua contestação, através dos meios graciosos e contenciosos.

rr. No método indirecto de determinação da matéria tributável, ao abrigo do disposto nos art.ºs 83.º, n.º 2, 87.º, n.º 1, alínea b), e 88.º, n.º 1, alíneas a) e d) da LGT, a quantificação da matéria tributável, a efectuar com base nos critérios estabelecidos no art.º 90.º da mesma Lei, é, por natureza (cfr. art.º 83.º, n.º 2 da LGT), uma matéria tributável aproximada ou estimada, estando a competência para a prática do respectivo acto de fixação legalmente atribuída à AT.

ss. Ao contrário do entendido na sentença recorrida, não goza a administração de qualquer poder discricionário na prática do acto: tal resulta evidente do facto de a administração tributária estar vinculada aos critérios estabelecidos no art.º 90.º da LGT e de estar obrigada a indicar o critério ou critérios concretamente a utilizar, no caso, o que se traduz em ter de referir ou indicar os elementos ou factores que enformam estruturalmente o critério a utilizar e os termos em que o mesmo opera.

tt. O acto de aplicação do critério administrativamente elegido não é mais do que um juízo subsuntivo de integração e de ponderação dos factos averiguados, antes dados como assentes pela administração, nos factores ou parâmetros que compõem o critério, os quais conduzem a resultado razoável ou adequadamente próximo da realidade determinanda.

uu. É exactamente por isso que o art.º 84.º, n.º 2 da LGT obriga a que a AT indique precisamente “a ponderação dos factores que influenciaram a determinação do resultado”, ponderação essa a efectuar, obrigatoriamente, dentro das regras do critério.

vv. A AT não goza de qualquer discricionariedade de eleição de factores factuais ou normativos que não relevem dentro do critério elegido e dos factos apurados na fiscalização tributária.

ww. A quantificação da matéria tributável é um acto consequente da decisão administrativa da necessidade de utilização dos métodos indirectos da matéria tributável, por impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, devida a inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou dos seus registos e outras anomalias, e está sujeita ao princípio da congruência no que se refere aos elementos de facto considerados nessa decisão.

xx. O princípio da congruência encontra-se, expressamente, assumido na al. b) do n.º 1 do art.º 87.º da LGT, ao referir a impossibilidade tanto à comprovação como à quantificação da matéria tributável relativas aos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, constituindo ao dois aspectos uma unidade normativa.

yy. Tendo a AT desconsiderado como sendo custos certos valores declarados e contabilizados na contabilidade da ora recorrente com base na sua errada qualificação e contabilização, como acontece com aqueles que justificaram as correcções aritméticas, não pode vir, depois, a incluí-los, também, na base da totalidade de custos declarados para sobre eles aplicar, também, o indicador da rentabilidade fiscal, como acontece na quantificação efectuada.

zz. Sendo assim, os montantes anuais dos custos reais, pressupostos pela AT como equivalentes ao montante do volume de negócios efectuado, para o efeito da aplicação do indicador da rentabilidade fiscal e do apuramento da matéria tributária estimada, são de valor muito inferior aos que foram tidos como estando contabilizados e sobre os quais se fez operar o indicador de rentabilidade fiscal para aferir o volume de negócios pressuposto nas liquidações.

aaa. Tal excesso é ainda aferível pelo facto de não terem considerados quaisquer desperdícios, sendo a asserção da sentença recorrida, de que não estão contabilizados, espúria, pois ao retirar a força probatória da contabilidade, deverão ser considerados todos os factores que possam contribuir para o apuramento da matéria colectável ainda que por presunções.

bbb. Finalmente, quanto ao segmento de que: “Além disso, sendo a média resultante dos operadores económicos do sector, já contém em si mesma os custos “de inactividade, desperdícios, quebras, incluindo factores normais e anormais da actividade” (cfr. RIT), pelo que não é correcta a afirmação de que as quebras e desperdícios não tenham entrado no cálculo efectuado pelo órgão inspectivo”, tal julgamento só pode resultar de uma opinião pessoal ou estribada em conhecimentos pessoais da senhora juiz, sendo curiosa, esta posição, quando é a própria Fazenda Pública que no âmbito do Processo n.º 06854/13 do TCAS a propósito destes mesmos rácios deixou consagrado: “Como está bem de ver, e como realça a Fazenda Pública na contestação apresentada, “as diferenças de margens, a existirem, praticadas por diferentes sujeitos passivos, no mesmo sector de actividade, obtidas a partir de valores reais, têm que ser analisadas em consonância com todos os factores que nelas influem. As empresas não são todas iguais, não se comportam todas da mesma maneira e, o contexto onde se inserem, não obedece a requisitos padrão que as coloca em iguais circunstâncias, pelo que as margens que praticam não têm necessariamente que ser iguais”.

ccc. Também por estas razões, o tal indicador da rentabilidade fiscal do volume de negócios é inidóneo.

ddd. Deste modo as liquidações impugnadas, na parte recorrida, sofrem de manifesto erro de facto e de direito, por excesso na quantificação, ao contrário do ajuizado na sentença recorrida, pelo que devem ser anuladas.

eee. Normas jurídicas violadas: entre outras, 74º, 75º, 76º, 77º, 83º e 90º da LGT, 371º do CC, 115º do CPPT e 607º do CPC.

Termos em que, atento tudo o acima alegado – e contando sempre com o douto suprimento de V.ªs Excelências - deve ser dado provimento ao recurso, ser revogada a sentença recorrida e anuladas as liquidações impugnadas, na parte recorrida, com as legais consequências.”


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A Recorrida apresentou as suas contra-alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem:

1. Contrariamente ao alegado a douta decisão recorrida não padece do alegado erro de julgamento e de valoração na apreciação da prova, porquanto, a mesma para além de ter analisado e valorado a globalidade da prova produzida nos presentes autos, efetuou uma correta subsunção da factualidade controvertida ao direito aplicável, impondo-se concluir que a mesma não é merecedora de qualquer censura e que a recorrente efetua uma interpretação deturpada da douta decisão recorrida.

2. A decisão recorrida foi alicerçada não apenas na factualidade fiscalmente relevante constante do RIT, mas na valoração conjugada de um vasto conjunto de meios probatórios, no elenco dos quais se encontra a documentação apresentada pela recorrente, o PA apresentado pela Fazenda Pública, aqui se incluindo o RIT, as testemunhas arroladas pela recorrente e pela Fazenda, o relatório pericial colegial, no âmbito do qual, os respetivos peritos designados, procuraram responder a um vasto conjunto de questões formuladas pelas partes intervenientes, visando, na sua essência, averiguar se a contabilidade da impugnante, enquanto sistema de informação do respetivo desempenho, reunia as condições legais para servir de instrumento à quantificação direta da matéria tributável em sede de IRC e IVA, gerada pela atividade empresarial, ou se pelo contrário, no caso concreto, não estando reunidas as referidas condições, a quantificação da matéria tributável apenas poderia ser efetuada com recurso à metodologia de avaliação indireta.

3. A recorrente defende a tese segundo a qual o RIT, não poderia ter sido valorado pelo Tribunal “ a quo”, como tendo força probatória plena, uma vez que no seu entendimento tal meio probatório consubstancia uma simples informação oficial, cujo valor probatório deve ser aferido nos termos do artigo 76º, nº 1 da LGT.

4. Contrariamente à ideia que a recorrente tenta inculcar a este Venerando Tribunal, o Tribunal “ a quo”, no rigoroso cumprimento do principio da legalidade e da descoberta da verdade material, apreciou todas as provas produzidas pelas partes intervenientes e explicou, de forma fundamentada, as razões pelas quais valorou ou não valorou algumas dessas provas.

5. E no que ao RIT concerne, o Tribunal “ a quo”, em obediência ao principio da legalidade, atribuiu-lhe, nada mais nada menos, do que o valor probatório que o legislador expressamente lhe confere, norteado pelo principio da livre apreciação da prova e pelo direito do contraditório.

6. Contrariamente à tese defendida pela recorrente, à luz do citado artigo 76º/1 da LGT, o valor probatório do relatório da inspeção é expressamente assumido na lei para as informações fundamentadas e baseadas em critérios objetivos.

7. E tal como se referiu no mencionado Acórdão nº 07148/13 de 26-06-2014 do TCA Sul, “não sendo o relatório impugnado, este passa a ter força probatória plena.”.

8. No caso em apreço, o relatório de inspeção - que faz parte integrante do PA - não foi impugnado pela ora recorrente, motivo pelo qual a força probatória do mesmo não foi afastada.

9. Mas para além do relatório de inspeção não ter sido impugnado, resulta dos presentes autos, designadamente, da argumentação refletida na PI, nas subsequentes alegações e na globalidade da prova junta aos autos, que a recorrente não logrou sequer criar a dúvida quanto à veracidade da factualidade constante no relatório de inspeção.

10. Não tendo a recorrente logrado colocar em crise ou sequer criar a dúvida sobre a veracidade dos factos constantes do relatório de inspeção, impõe-se concluir que a sua argumentação recursiva não poderá ter outro fim senão a sua improcedência.

11. A prova que foi produzida no âmbito dos presentes autos evidencia uma realidade bem distinta daquela que é invocada pela recorrente, pois no caso em apreço, não só a AT logrou fazer prova inequívoca da verificação dos pressupostos de que depende a aplicação dos métodos indiretos para determinação da matéria tributável da recorrente como também o Tribunal “ a quo ”identificou de forma clara e inequívoca os factos e as provas a partir das quais formou a sua convicção, tendo revelado de forma clara e objetiva todo o iter cognicitivo que o levou a decidir no sentido em que decidiu e não noutro.

12. Contrariamente à tese que a recorrente tenta incutir a este Tribunal, a Administração Tributária fundamentou de forma exaustiva, clara e objetiva, as razões de facto e de direito que a legitimou a recorrer à metodologia da avaliação indireta, encontrando-se tal fundamentação de facto e de direito, espelhada no ponto IV do relatório de inspeção que aqui se dá por integralmente reproduzido, para todos os efeitos legais.

13. Atentos os factos fiscalmente relevantes que foram apurados pela inspeção e bem assim as evidências probatórias recolhidas no âmbito do procedimento de inspeção tributária, verifica-se que o recurso à avaliação indireta se encontra justificado pela manifesta falta de credibilidade da contabilidade da recorrente.

14. Contrariamente ao alegado pela recorrente, resulta inequivocamente dos elementos probatórios recolhidos no âmbito da ação de inspeção, que a Administração Tributária indicou factos concretos, verificados in loco, ou seja, diretamente da contabilidade da recorrente, que legitimaram o recurso à avaliação indireta – vide relatório de inspeção, com especial ênfase para o ponto IV, de fls. 35 a fls. 65 do PA, que se encontra junto aos autos.

15. A alegação da recorrente no sentido de que a AT podia, perante a sua contabilidade, alcançar a certeza sobre a expressão exata dos factos tributários e a sua quantificação, não é mais do que a negação pura das evidências probatórias que no caso concreto abalaram, de forma irremediável a presunção de verdade e de boa fé, dos seus registos contabilísticos e das suas declarações fiscais.

16. Para além das evidências probatórias que se encontram refletidas no âmbito do relatório de inspeção, destaca-se também pela sua pertinência enquanto meio de prova, o relatório de peritagem colegial, que teve por principal escopo, analisar se estavam reunidas as condições legais para que a Administração Tributária ficasse legitimada a proceder ao apuramento da matéria tributável da impugnante através do recurso à avaliação indireta.

17. Tal como decorre da leitura do relatório pericial, as considerações e conclusões efetuadas pela maioria dos senhores peritos - perito designado pelo Tribunal e perito designado pela Fazenda Pública e nalguns casos também pelo perito designado pelo impugnante – corroboram a factualidade e as conclusões constantes do relatório de inspeção, designadamente, no que concerne à impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável em sede de IRC e de IVA.

18. Considerando as evidências probatórias juntas aos autos, designadamente, no que se reporta ao relatório de inspeção e ao relatório de peritagem, impõe –se concluir pela legalidade da aplicação dos métodos indiretos para determinação da matéria tributável da ora recorrente e consequentemente pela improcedência da argumentação por ela invocada.

19. Contrariamente à tese defendida pela recorrente, no caso concreto dos autos, o vasto conjunto de factos fiscalmente relevantes que foram apurados diretamente dos registos contabilísticos e das declarações fiscais da recorrente, não permitiam que a sua matéria tributável fosse apurada através da avaliação direta, motivo pelo qual, a decisão recorrida ao concluir que no caso concreto estavam reunidos os requisitos para a decisão de aplicar métodos indiretos de avaliação, efetuou uma correta valoração da globalidade da prova produzida, devendo, em consequência manter-se na ordem jurídica.

20. No que se reporta à prova do excesso de quantificação, a recorrente defenda a tese segundo a qual o ónus de prova sobre os factos integradores do excesso da quantificação não se traduz num ónus de prova de um excesso de quantificação em montante preciso ou concretamente balizado, podendo tal excesso de quantificação ser demonstrado por forma estimada.

21. Dispõe o n.º3 do art.º74.º da LGT, em matéria de repartição do ónus da prova que «Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indiretos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação».

22. Como se salienta no Ac. do STA, de 16/11/2011, proferido no proc.º0247/11, «De acordo com as regras de distribuição do ónus da prova, para pôr em causa a quantificação da matéria tributável a que a AT chegou com recurso a métodos indiretos não basta ao sujeito passivo suscitar dúvidas quanto ao resultado obtido, antes se lhe impondo que demonstre a inadequação ou errada aplicação dos critérios de quantificação utilizados (cfr. art. 74.º, n.º 3, da LGT)».

23. Por outro lado e como se escreveu no Ac. do STA de 17/03/2010, tirado no proc.º01211/09, «Persistindo a situação de "non liquet" quanto ao excesso na quantificação a que chegou a Administração tributária, a dúvida terá de ser decidida em desfavor da recorrente, que não logrou provar a existência de tal excesso, nem se afigura evidente para este Tribunal que o alegado excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou que seja manifesto, notório ou ostensivo».

24. Como se extrai do probatório – e também do quadro alegatório refletido na impugnação e no presente recurso – a recorrente não logrou demonstrar o erro ou excesso de quantificação ou da manifesta inadequação do critério de quantificação da matéria tributável à sua realidade (ou seja, às condições concretas em que a mesma exercia a atividade), nomeadamente, não logrou demonstrar qual o eventual impacto dos desperdícios no seu processo produtivo, porquanto nunca quantificou os mesmos, sendo certo que tinha aos seu alcance todos os meios para o poder fazer.

25. A teoria da recorrente segundo a qual o excesso de quantificação da matéria tributável apurada com recurso a métodos indiretos, pode ser efetuado por estimativa não encontra qualquer base legal de sustentação, traduzindo-se apenas por uma interpretação subjetiva que visa de forma ilegal, colocar em crise a quantificação da matéria tributável, sendo certo que o legislador foi muito claro quando fez incidir tal ónus probatório no sujeito passivo da relação tributária: o excesso de quantificação terá de ser provado de forma clara e inequívoca, com a invocação de demonstração de factos concretos, e não em meras alegações desprovidas de base probatória adequada, sendo certo que, conforme é jurisprudencialmente aceite, ainda que o sujeito passivo logre suscitar a dúvida, esta será valorada contra ele - vide entre muitos outros Ac. do STA de 17/03/2010, tirado no proc.º01211/09.

26. Acresce referir, que a recorrente, embora não concorde com a decisão recorrida, designadamente no que se reporta à matéria de facto, por indevida valoração da prova, não cumpre o ónus imposto no art. º640.º do CPC, porquanto, não identifica os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação realizado nos autos, que fossem suscetíveis de impor uma decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida e bem assim a decisão que no seu entender, deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, limitando-se a apontar alegados vícios à decisão recorrida, de uma forma genérica.

27. Não tendo impugnado eficazmente a decisão relativa à matéria de facto, as alegações da recorrente quanto ao excesso de quantificação resultam insubstanciadas, uma vez que não se alicerçam em factos concretos e assentes ou elementos de prova que este Venerando Tribunal possa valorar diferentemente da decisão recorrida, motivo pelo qual, se impõe a improcedência da argumentação invocada pela recorrente.

28. Estabelece o nº 1 do artigo 90ºda LGT que “ em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável, a determinação da matéria tributável por métodos indiretos poderá ter em conta os seguintes elementos (…)”.

29. A indicação destes elementos, como resulta inequivocamente da letra da lei, é meramente exemplificativa, pelo que outros elementos ou fatores que forem pertinentes, podem ser tidos em conta, e, obviamente, não se exige que, para apuramento do lucro tributável por métodos indiretos, todos aqueles elementos que a lei elenca tenham obrigatoriamente de ser considerados sempre, em todo e qualquer caso.

30. Neste contexto, para além dos critérios que ali se elencam de forma exemplificativa, está a Administração Tributária legitimada para lançar mão de outros critérios, que se revelem mais adequados e coerentes à quantificação exata e justa em cada caso concreto.

31. Face ao teor do ponto V do RIT, impõe-se concluir que contrariamente ao alegado pela recorrente, a AT fundamentou de forma exaustiva o critério adotado, não havendo qualquer violação dos comandos jurídico-tributários vigentes à data do facto tributário, tendo a ação inspetiva cumprido escrupulosamente o legalmente estabelecido em matéria de seleção e fundamentação do critério adotado para quantificação da matéria tributável determinada por métodos indiretos.

32. Acresce ainda referir que a recorrente apesar de contestar o critério que serviu à quantificação da matéria tributável, não disponibilizou outros que fossem mais credíveis, por se afigurarem mais coerentes e adequados à quantificação exata e justa, propiciando uma certeza (exigível) como meio de prova, revelando-se por isso incapaz de, justificadamente, colocar em crise, a quantificação da matéria tributável.

33. Nas circunstâncias concretas dos presentes autos, face à globalidade da prova que foi produzida e que foi levada ao probatório, a impugnante não logrou apresentar provas que fossem adequadas e suficientes para abalar ou pôr em causa o racionalmente justificado critério de quantificação da matéria coletável aplicado pela AT.

34. Por outro lado, não se verifica o alegado erro de julgamento de direito que a recorrente imputa à decisão recorrida, porquanto, no que à seleção do critério de quantificação concerne, o Tribunal estando vinculado ao cumprimento da lei, não pode exigir mais do que aquilo que foi definido pelo legislador e se este não obriga a AT a fundamentar a escolha do (s) critério (s) mas apenas que os indique, não pode o Tribunal exigir que, além de indicar, a AT também fundamente, pois tal constituiria, além do mais, uma violação grosseira da lei

35. Termos em que, se impõe concluir que a decisão recorrida não enferma do alegado erro de julgamento de direito, devendo, em consequência, manter-se na ordem jurídica.

36. Por fim alega a recorrente que a douta decisão recorrida padece de outro erro de julgamento, ao considerar que a recorrente não fez prova de que a quantificação da matéria tributária, efetuada pela AT, sofra de excesso. Mas mais uma vez, não assiste razão à recorrente, porquanto, a fundamentação que é refletida pela decisão recorrida, demonstra que a mesma não padece do alegado erro de julgamento sobre o excesso da quantificação da matéria tributável da recorrente, sendo certo que face aos factos que resultaram provados e não provados outro não poderia ser o sentido da decisão.

37. Acresce referir, que embora a recorrente alegue que a decisão recorrida padece do alegado erro de julgamento de direito, continua sem demonstrar qual seria o critério a adotar no caso em concreto e quais as concretas repercussões ficais que tal critério acarretaria para a prova de um eventual excesso de quantificação da matéria tributável.

38. Em abono da verdade, a recorrente limita-se a debitar teorias, decorrentes da interpretação que efetua do quadro legal, sem qualquer correspondência com o verdadeiro sentido e alcance das normas que regem a escolha do critério de quantificação da matéria tributável.

39. Ora, tal como se encontra devidamente espelhado no relatório de inspeção, a Administração Tributária provou fundamentadamente a verificação dos pressupostos de determinação da matéria tributável por métodos indiretos, sendo certo que o rácio adotado pela Administração Tributária é objetivo, pois o mesmo é fornecido pela alínea a) do nº 1 do artigo 90º da LGT e não se baseia em convicções pessoais ou estimativas subjetivas, como pretende fazer crer a recorrente.

40. Temos assim que, as alegações da recorrente não são suficientes para criar a convicção de que o valor apurado para a matéria tributável seja efetivamente excessivo ou não esteja devidamente fundamentado.

41. Termos em que, se impõe concluir, que a douta decisão recorrida, não enferma dos vícios que lhe são imputados pela ora recorrente, motivo pelo qual não merece qualquer reparo ou censura, devendo manter-se no ordenamento jurídico, com as consequências legais daí decorrentes.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências

deve ser negado provimento ao presente recurso e em consequência manter-se a decisão recorrida.”


***

O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser negado provimento do recurso.

***

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

***

II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A decisão consignou como factualidade provada o seguinte:

“Com relevância para a boa decisão da causa, julgo provados os seguintes factos:

1) A impugnante é uma sociedade comercial por quotas que tem por objecto social lacagem de alumínios, ferro e seus derivados (cfr. certidão permanente a fls. 660 do PA);

2) Do pacto social da sociedade constam dois sócios, nomeadamente Manuel ………………e Maria ……………………, casados entre si, incumbindo a gerência a Manuel …………………. desde 28/04/1994 (cfr. certidão permanente a fls. 660 do PA);

3) Os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças da Guarda lavraram o ofício n.º 31766 datado de 21 de Outubro de 2010, dando conhecimento de que “a muito curto prazo, se deslocará(ão) à morada acima referenciada, técnico(s) dos Serviços de Inspecção” com a finalidade de verificar o “cumprimento das correspondestes obrigações tributárias”, nos seguintes termos (cfr. fls. 640 do PA):

“(…)

Nos termos da alínea l) do n.º 3 do artigo 59.º da Lei Geral Tributária (LGT) e do artigo 49.º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT) fica(m) notificado(s) de que, a muito curto prazo, se deslocará(ão) à morada acima referenciada, técnico(s) dos Serviços de Inspecção Tributária.

A visita do(s) técnico(s) tem como finalidade a verificação do cumprimento das correspondentes obrigações tributárias e terá o âmbito e extensão a seguir indicados:

« Quadro no original»

A eventual alteração, ao âmbito e extensão da acção inspectiva, resultará de despacho fundamentado da entidade que a ordenou (artigo 15.º do RCPIT).

(…)”

4) Em 09 de Maio de 2011 foi elaborado pelos serviços da Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças da Guarda relatório de inspecção, que mereceu em 11 de Maio de 2011 despacho de concordância da Chefe de Divisão da Inspecção Tributária em regime de substituição, por delegação de competências do Director de Finanças da Guarda, onde foram propostas correcções em sede de IVA e IRC, no valor total de Eur. 165.775,44 a título de IRC e Eur. 30.404,35 a título de IVA, cujo teor se dá integralmente por reproduzido (cfr. fls. 2-72 do PA), designadamente:

“(…)
III - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável
1. Não dedutibilidade fiscal de encargos relacionados com viatura ligeira de passageiros adquirida em 2008
1.1. Exercício de 2008 e 2009
Até 31-12-2007 do activo imobilizado da empresa faziam parte as seguintes viaturas ligeiras de passageiros:

« Quadro no original»


Em 2008, a estas viaturas, acresceu a aquisição de nova viatura ligeira de passageiros matricula ………, Mercedez Benz …… 200 K, com 5843 Kms conforme factura 15000524 da empresa S................ ……… Lda NIPC …….., pelo valor de € 43.000,00 (registo 1227 de 31-12-2008). Foi registada na conta 261119.

« Quadro no original»


Em Fevereiro de 2009, está registado o contrato de locação financeira celebrado com a Sofinloc com o n.º 644137, no valor de financiamento de € 35.000,00, inerente a esta viatura, datado de 22 de Dezembro de 2008. Na escrita da empresa só foi registado em Fevereiro de 2009, conforme registo contabilístico 228.
Do valor de € 43.000,00 que foi o preço de aquisição, a empresa pagou € 8.000,00 em 2008, ainda que o valor de € 5.000,00 apenas tivesse sido registado em 2009 conforme recibo 403362 de 24-12-2008 emitido pela S................ Lda NIPC ……………….
Resulta do exposto que a empresa passou desde 31-12-2008 a possuir 3 viaturas ligeiras de passageiros com preço de aquisição, de todas elas, superior a € 40.000,00. Quando analisado o quadro do pessoal da empresa verifica-se que o órgão social é composto por dois sócios - Director e a esposa Escriturária de 1ª. Os restantes colaboradores da empresa são da produção e em número de até quatro, auferindo um rendimento bruto médio de € 500,00. Assim e para duas pessoas com poder de decisão na empresa, existem três viaturas ligeiras marca Mercedez, com preço de aquisição superior a € 40.000,00. Neste contexto, cumpre apreciar a dedutibilidade fiscal dos encargos originados por esta viatura, que em 2008 e 2009, foram os seguintes:

O juízo sobre a oportunidade e conveniência do acto de gestão efectivado na aquisição de mais uma viatura ligeira de passageiros, quando do imobilizado já faziam parte duas, é exclusivo da empresa, não podendo Administração Tributária, intrometer-se na forma como ela gere e aplica os seus recursos. No entanto, todo o activo que a empresa decide adquirir gera encargos e por essa via traduz-se numa diminuição dos resultados da actividade e por conseguinte tributáveis. Por essa via, fica legitimada a análise e fiscalização por parte da Administração Tributária dos encargos fiscalmente dedutíveis. Isso mesmo se encontra plasmado no artigo 23° do CIRC “Custos ou perdas” que prevê no n.º 1:
“1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (…)”
Os custos ou perdas da empresa são os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Temos por isso dois requisitos indispensáveis e cumulativos para que os custos sejam aceites para efeitos de IRC: por um lado, que sejam comprovados com documentos emitidos nos termos legais e, por outro, que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos. A ausência de qualquer destes requisitos implica a sua desconsideração. isto é, as respectivas quantias deverão ser adicionadas ao resultado contabilístico
Os encargos deduzidos inerentes à aquisição da terceira viatura ligeira de passageiros com valor de aquisição superior a € 43.000,00, não podem ser fiscalmente dedutíveis uma vez que não se demonstra que tal activo seja indispensável para a realização de proveitos. De facto e com a norma invocada o legislador afasta do conceito de custo fiscal, todos aqueles encargos que não tenham um objectivo exclusivamente empresarial, e que atendendo à sua natureza tenham por fim o proveito particular dos representantes da sociedade.
Face ao exposto serão objecto de correcção, à luz do preceituado no artigo 23º n.º 1 do CIRC, os encargos que estão indevidamente a influenciar a determinação do lucro tributável, dos exercícios de 2007 e 2008, nos valores a seguir discriminados:

As correcções descritas têm a seguinte influência no apuramento do lucro tributável:

IV - Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
O recurso à avaliação indirecta da matéria tributável enquanto método subsidiário de avaliação directa, apenas pode ocorrer nos casos e condições expressamente previstos na lei. O artº 8º da LGT identifica os pressupostos, que permitem à Administração Tributária o recurso à avaliação indirecta, verificando-se no caso aqui em estudo:
“Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto” (alínea b) do referido artigo).
Nos termos do artigo 88º da LGT, a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, na empresa inspeccionada, resulta das seguintes anomalias e incorrecções:
a) Insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, e irregularidades na sua organização ou execução insupríveis em qualquer prazo legal - (artigo 88º n.º 1 alínea a) da LGT),
b) Factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva maior do que a declarada - (artigo 88º alínea d) da LGT)
Ou seja, no âmbito da auditoria tributária realizada, concluiu-se que a contabilidade e as declarações fiscais entregues, não espelham o resultado efectivo, concreto, da realidade económica - financeira gerado pela actividade da empresa.
Os fundamentos que sustentam tal conclusão são os seguintes:
1. Fluxos financeiros registados ao nível da conta Caixa e Depósitos à Ordem
Para que a contabilidade apresente uma imagem verdadeira e apropriada dos resultados gerados pelas operações da empresa é necessário que as respectivas contas reproduzam os factos ocorridos no exercício, sob pena de existirem movimentos que não passaram pela escrita da empresa e por conseguinte não estão reflectidos na situação líquida da sociedade.
Ao nível dos fluxos financeiros é de primordial importância estar a sua origem e destino devidamente evidenciado na escrita para que a Administração Tributária exerça a sua acção legal de controlo e fiscalização da situação tributária dos agentes económicos envolvidos. E neste contexto que o legislador fiscal previu ao nível dos pagamentos e recebimentos um conjunto de regras a serem respeitadas designadamente as previstas no artigo 63.º- C - Contas bancárias exclusivamente afectas à actividade empresarial da Lei Geral Tributária, “1 -Os sujeitos passivos de IRC, bem como os sujeitos passivos de IRS que disponham ou devam dispor de contabilidade organizada, estão obrigados a possuir, pelo menos, uma conta bancária através da qual devem ser, exclusivamente, movimentados os pagamentos e recebimentos respeitantes à actividade empresarial desenvolvida.
2 - Devem, ainda, ser efectuados através da conta ou contas referidas no n.º 1 todos os movimentos relativos a suprimentos, outras formas de empréstimos e adiantamentos de sócios, bem como quaisquer outros movimentos de ou a favor dos sujeitos passivos.
3 - Os pagamentos respeitantes a facturas ou documentos equivalentes de valor igualou superior a 20 vezes a retribuição mensal mínima devem ser efectuados através de meio de pagamento que permita a identificação do respectivo destinatário, designadamente transferência bancária, cheque nominativo ou débito directo.”
O objectivo desta norma é o de permitir o controlo da efectividade dos fluxos financeiros registados e conhecer a origem/destinatários dos mesmos, prevenindo-se desta forma a fuga e evasão fiscal.
Em conformidade e no âmbito de uma auditoria tributária, torna-se necessário analisar se esta norma é respeitada pelo sujeito passivo e se os movimentos/saldos de Caixa e de Depósitos à Ordem, são coincidentes com a realidade, caso contrário existirão movimentos que não passaram pela escrita da empresa pondo em causa a sua credibilidade.
Da verificação efectuada ao nível destas contas, comprova-se que a contabilidade não permite conhecer a origem e destino da totalidade dos fluxos financeiros realizadas pela empresa, impossibilitando por essa via a comprovação directa e exacta da origem e aplicação de recursos.
Por outro lado, também certos movimentos registados não respeitam o desiderato legal imposto pelo artigo 63° - C da LGT, designadamente o previsto no n.º 2 e 3.
Assim:
1.1. A conta Caixa
a) Exercício de 2007
A conta Caixa, no exercício de 2007, apresenta o saldo devedor de € 84.814,96. Face à materialidade deste saldo, foi analisada esta conta, tendo sido detectado o seguinte:
- Em 30-04-2007, através do registo 440 de 30-04-2007, é efectuado o seguinte lançamento contabilístico:

Representa este facto que deu entrada nas disponibilidades da empresa o montante de € 224.698,23 por contrapartida de uma conta de outros credores (assim designada na contabilidade), com um mero documento de lançamento interno, sem especificação da origem e efectividade desse valores. Refira-se que com este lançamento a conta 26899 ficou saldada.
 Também em 30-04-2007, através dos registos 441 e 442 respectivamente nos valores de € 331.498,85 e € 105.194,41, que têm como documentos de suporte notas de pagamento emitidas pela empresa em nome de vários fornecedores, a conta caixa é creditada pelos valores identificados. Só com o lançamento descrito no ponto anterior de uma entrada que não está documentada, é que o sujeito passivo consegue registar o pagamento aos seus fornecedores.
 Em 31-12-2007, através do registo 1244, que tem como documento de suporte um documento interno, são regularizadas várias contas de fornecedores por contrapartida de saída de caixa. O valor global do lançamento ascende a € 147.094,46 e o lançamento envolveu as seguintes contas:

b) Exercício de 2008
A 31-12-2008 a conta caixa apresenta o saldo positivo de € 51.418,99. Analisada a respectiva conta corrente, salienta-se o seguinte:
-através do registo 523 de 31-05-2008, que tem como suporte um documento interno, foram movimentadas as seguintes contas (entre outras):

Estes valores de depósitos e levantamentos, não têm correspondência nos respectivos extractos bancários sendo que o documento de suporte não discrimina a natureza da operação (numerário ou cheques e respectiva identificação) e a origem e destino destes fluxos financeiros registados.
- com o registo 1116 de 30-11-2008, é registada uma saída de caixa no montante de € 131.490,26 correspondente a um depósito de cheques e de valores no banco Caixa …………………, não estando identificada a respectiva origem. Após este lançamento a conta caixa fica com o saldo negativo de € 57.622,62. Representa este facto que a empresa deposita em bancos valores cuja totalidade não tinha entrado nas disponibilidades da empresa.
c) Exercício de 2009
A 31-12-2009, a conta caixa apresenta o saldo de € 138,22, mais coincidente com a realidade da empresa ao contrário do evidenciado nos restantes exercícios. Analisados os respectivos movimentos, destacam-se os seguintes factos:
- Até ao dia 21-12-2009, a conta caixa apresentava o saldo devedor de € 74.885,30. Estão registados factos idênticos aos descritos nos pontos anteriores. Exemplos:

« Quadro no original»


- Através do registo; que tem como suporte um documento interno, é registada uma entrada em disponibilidades da empresa - caixa no valor de € 13.000,00 por contrapartida da conta POC 2559 "Accionistas - outras operações". Antes dessa entrada em caixa a conta apresentava o saldo negativo de € 12.861,78. Não foi respeitada a norma prevista no artigo 63º C da LGT, pelo que a origem deste montante não é passível de comprovação.
1.2. Os depósitos à ordem
Relativamente à conta de Depósitos à ordem, que nos termos do POC respeita aos meios de pagamento existentes em contas à vista nas instituições de crédito, os documentos que devem servir de suporte à movimentação contabilística, são os cheques, e os documentos emitidos pelo banco referentes a cada uma das operações realizadas: depósitos, descontos e cobranças, ordens de pagamento, ordens de transferência, pagamento de juros, entre outras.
Note-se que nem sempre o valor contabilístico apurado na conta "Depósitos à Ordem", corresponde à realidade do saldo desta conta no Banco, em virtude de poderem existir cheques emitidos pela empresa e que ainda não foram apresentados no banco.
Portanto, periodicamente devem ser confrontados os valores constantes da contabilidade com os que estão discriminados no extracto bancário. Quando existirem divergências, devem apurar-se as razões das mesmas, e proceder-se às correcções contabilísticas caso se tenha detectado erro ou omissão no registo contabilístico. Mas os lançamentos contabilísticos de correcção devem sempre ser suportados pelos documentos adequados e não apenas pelo extracto bancário.
Todos estes procedimentos têm como objectivo permitir comprovar e documentar a origem e destino dos dinheiros inerentes à actividade empresarial, por forma a que a contabilidade evidencie uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira e dos resultados das operações da empresa.
Nos pontos anteriores foram descritos factos que demonstram essa impossibilidade, designadamente:
*) Lançamentos com base em documentos internos que contêm descrições genéricas de depósitos/levantamentos de cheques, sem especificação e documentação da natureza dos fluxos (discriminação dos cheques, numerário, dos talões de depósito)
*) Falta de documentação de suporte que permita a identificação da respectiva origem e destino do fluxo.
*) Não correspondência dos movimentos com os extractos bancários.
*) Pagamentos e recebimentos por caixa bem como movimentos com accionistas (em 2009) sem o respectivo movimento bancário de suporte, em desrespeito pela norma fiscal prevista no artigo 63°-C da LGT.
A par destas situações, serão apresentados nos pontos seguintes, outros indícios que reforçam o facto de a escrita da empresa não reflectir todas as operações activas e passivas realizadas. Assim:
a) Exercício de 2007
Os saldos contabilísticos das contas de depósitos à ordem são coincidentes com os saldos bancários, tal como se discrimina no quadro seguinte:

« Quadro no original»


Faria tal antever que a empresa efectuaria conciliação bancária. No entanto tal não corresponde à realidade. De facto, em 31 de Dezembro, através do registo 1237 de 31-12-2007, que tem como suporte um documento interno, é processado um acerto contabilístico de entradas e saídas por contrapartida de caixa, por forma a que os saldos da escrita sejam coincidentes com os bancários, tal como se descreve no quadro seguinte:

« Quadro no original»


Nos documentos de lançamento não são discriminados e identificados os cheques, os depósitos e levantamentos não têm correspondência com os extractos bancários. Não é pois possível comprovar a respectiva origem e destino dos fluxos financeiros registados.
Importa também ressalvar que ao longo do ano, os saldos contabilísticos da conta depósitos à ordem são sempre superiores aos saldos bancários efectivos, não existindo justificação para as diferenças existentes.
b) Exercício de 2008
Os saldos contabilísticos das contas de depósitos à ordem apresentam pequenas divergências com os saldos bancários, tal como se discrimina no quadro seguinte:

« Quadro no original»


A aproximada similitude entre saldos faria antever a existência de conciliações bancárias. No entanto, tal não corresponde à realidade. De facto e no final do ano, também são feitos lançamentos de regularização de saldos por forma a que as contas tenham correspondência nos extractos bancários. Apresentam-se os seguintes exemplos:
- Registo 1229 de 31-12-2008, documento interno com mera identificação de contas, que apresenta os seguintes movimentos relacionados com a conta depósitos à ordem da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo:

« Quadro no original»


Desconhece-se que levantamentos são estes, se em dinheiro ou em cheque. Quando surge no descritivo do documento “Levantamento de cheques”, não estão os mesmos identificados, desconhecendo-se o seu destino. O mesmo sucede em relação aos depósitos, se são em numerário ou de cheques, e qual a sua origem. Por outro lado, não é possível comprovar tais valores de entrada ou saída nos extractos bancários.
- Registo 1125 de 30-11-2008, que tem como suporte um documento interno no qual está contabilizada uma saída de bancos, conta POC 1205 - Depósitos à Ordem M…………… por contrapartida de entrada de caixa, no valor de € 18.69 I ,69, desconhecendo-se a natureza da saída (cheque ou dinheiro) e qual o seu destino.

Até este registo a contabilidade evidenciava na conta 1205 - Depósitos à Ordem M ……….., o saldo positivo de € 19.206,61, que não correspondia de forma alguma com o respectivo extracto bancário.
c) Exercício de 2009
Existem diferenças entre os saldos da contabilidade e os extractos bancários. A 31-12-2009:

« Quadro no original»


Na conta da Caixa…………………passou a ser elaborada circularização bancária a partir de Setembro de 2009, estando as diferenças devidamente justificadas.
Na conta M …………., não foi justificada a diferença existente.
Note-se que no decorrer do exercício de 2009, existem um conjunto de registos contabilísticos de levantamentos e depósitos efectuados por contrapartida de caixa e cujos documentos de suporte são meros documentos internos com descrição das contas utilizadas, não sendo identificada a natureza do fluxo financeiro (numerário ou cheques) e respectiva origem ou destino conforme fundamentação já aqui apresentada.
2. As Existências
Consideram-se existências todos os bens armazenáveis adquiridos ou produzidos pela empresa e que se destinem à venda ou a serem incorporados na produção.
Entre essas existências estão os produtos acabados, que são os bens resultantes do processo produtivo da empresa que, tendo atingido a sua fase final, estão aptos a serem vendidos.
A empresa em análise apenas declara em inventário matérias-primas, subsidiárias e de consumo, o que não é justificável, pois existirão sempre produtos acabados prontos para venda.
A comprovação, verificação e validação do valor das existências no final de cada exercício é uma questão que assume primordial importância numa acção inspectiva. Isto porque se trata de um componente que entra no apuramento do custo das existências vendidas e consumidas a qual influencia o apuramento do resultado do exercício e por conseguinte o resultado fiscal. A fórmula do seu apuramento é dada pela seguinte equação:

Resulta desta equação que quanto mais elevada a existência final menor é o custo do exercício e maior o resultado. A contrário maior será o custo do exercício e menor o respectivo resultado.
A respectiva quantificação é atingida através de duas formas possíveis:
a)Sistema de inventário permanente, que permite determinar permanentemente o valor dos stocks em armazém e apurar em qualquer momento os resultados obtidos nas vendas ou na produção;
b) Sistema de inventário intermitente. Neste caso o valor dos stocks em armazém e dos resultados apurados, só é determinável através de inventariações directas dos valores em armazém, efectuada em princípio no final do ano, para encerramento das respectivas contas.
Não sendo legalmente obrigado a dispor de inventário permanente, pressupõe-se que no final de cada ano, o sujeito passivo realiza uma inventariação directa das existências que estão em armazém, aplicando assim as regras do inventário intermitente.
Outra forma possível é o sujeito passivo possuir software gestão que permita identificar em cada momento as mercadorias em armazém.
É o caso da presente sociedade que face à magnitude de referências de produtos, dispõe de um software de gestão que permite imprimir listagens informáticas das existências em armazém, numa determinada data.
Os representantes do sujeito passivo exibiram os inventários finais dos exercícios de 2007, 2008, 2009 e o inicial de 2007 que corresponde ao final de 2006. Analisados os respectivos inventários, foram detectados um conjunto de irregularidades que serão descritas nos pontos seguintes:
a) Inventário final de 2006 que corresponde ao inicial de 2007
O valor contabilizado como existências finais a 31-12-2006 ascende ao montante de € 238.370,43. O documento de suporte é composto por várias folhas impressas do software de gestão "Listagem de Inventário entre a data / / / e 31-12-2006. "
Sucede que o total desta listagem ascende ao montante de € 179.161,53 e não € 238.370,43 como declarado.
Representa este facto que sem documento de suporte algum o sujeito passivo acresceu ao valor da inventariação realizada o valor de € 59.208,90. Isso mesmo se comprova através do talão de somatório das várias parcelas da listagem impressa que totaliza € 16 179.161,53 tendo sido acrescido o valor de € 59.208,90 para dar os € 238.370,43. A justificação apresentada foi a de que tal valor foi acrescido por estimativa.
No âmbito do procedimento inspectivo, mais precisamente no dia 22-03-201 I, foi impressa uma listagem do computador. Com essa listagem foram obtidos dois diferentes resultados:
*) € 227.372,27 se forem considerados apenas os valores positivos de stock.
*) € 158.908,30 se for considerado o somatório das quantidades positivas e negativas de existências. Isto porque em determinados produtos as saídas foram superiores às entradas, originando stocks negativos.
Tal como se demonstra, nos dois casos o total das existências que consta do sistema informático é manifestamente diferente dos valores quantificados pela empresa.
b) Inventário final de 2007
Verifica-se a mesma situação à do exercício anterior. Desta vez o total da folhas impressas do sistema informático totaliza € 73.810,47. Para dar os € 253.810,47, foi acrescido o montante de € 180.000,00 o qual não tem qualquer suporte documental. Isso mesmo se comprova através do talão de somatório das várias folhas da listagem impressa que totaliza € 73.810,47 tendo sido acrescido o valor de € 180.000,00 para dar os € 253.810,47. A justificação apresentada foi a de que tal valor foi acrescido por estimativa.
No âmbito do procedimento inspectivo, mais precisamente no dia 22-03-2011, foi impressa uma listagem do computador. Com essa listagem foram obtidos dois diferentes resultados:
*) € 235.124,27 se forem considerados apenas os valores positivos de stock.
*) € 94.753,18 se for considerado o somatório das quantidades positivas e negativas de existências. Isto porque em determinados produtos as saídas foram superiores às entradas, originando stocks negativos.
Tal como se demonstra, nos dois casos o total das existências que consta do sistema informático é manifestamente diferente dos valores quantificados pela empresa.
c) Inventário final de 2008
Em 2008, a listagem de inventário apresentada corresponde a diversas folhas impressas da listagem de existências do software de gestão. O seu somatório totaliza € 250.858.88, valor das existências declaradas a 31-12-2008. 17
No âmbito do procedimento inspectivo, mais precisamente no dia 22-03-2011, foi impressa uma listagem do computador. Com essa listagem foram obtidos dois diferentes resultados:
*) € 214.803,99 se forem considerados apenas os valores positivos de stock.
*) € 163.769,13 se for considerado o somatório das quantidades positivas e negativas de existências. Isto porque em determinados produtos as saídas foram superiores às entradas, originando stocks negativos.
Tal como se demonstra, nos dois casos o total das existências que consta do sistema informático é manifestamente diferente dos valores quantificados pela empresa.
d) Inventário final de 2009
O total das existências declaradas ascende ao montante de € 149.550,00. Referente às existências deste ano já não foi fornecida qualquer listagem de inventários a 31-12-2009 do software de gestão, mas antes folhas impressas de Excel. Não consta o somatório das mesmas. Foi solicitado o ficheiro do Excel para validar os cálculos tendo sido detectado que o total da inventariação ascende a € 150.174,4 e não € 149.550,00 como foi declarado.
Também neste exercício e no âmbito do procedimento inspectivo, mais precisamente no dia 22-03-2011, foi impressa uma listagem do computador. Com essa listagem foi obtido o seguinte resultado:
*) € 18.923,18. A maior parte das referências dos produtos apresenta stock nulo.
e) Conclusão
Após os testes de validação a esta área das existências conclui-se pelo seguinte:
1 - No exercício de 2006 (existência inicial de 2007) e 2007, o sujeito passivo sem qualquer suporte documental, incrementa ao valor das existências fornecido por listagens extraídas do software de gestão, parte de inventários/existências, os montantes de € 59.208,90 em 2006 e € 180.000,00 em 2007.
2 - Já no exercício de 2008, o valor das existências é o que resulta do somatório de diferentes folhas de famílias de produtos impressas de inventário do software de gestão.
3 - Analisadas as listagens de inventários do software de gestão em 22-03-2011, detecta-se que os valores por elas evidenciados diferem completamente dos valores escriturados, a saber:

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4 - No exercício de 2009, o critério de quantificação foi diferente. As existências surgem referenciadas em folhas Excel impressas, por família de produto, sendo que o somatório dessas verbas totaliza € 150.174,4 e não € 149.550,00 como foi declarado. A listagem informática do software de gestão das existências a 31-12-2009, apresenta o valor de € 18.923,18.
5 - As divergências, incoerências, inexactidões, mudança de forma de inventariação, valores por estimativa, são por demais evidentes. Por essa via fica impossibilitada a necessária comprovação, verificação e validação das existências finais contabilizadas em cada um dos exercícios. Consequentemente o resultado do exercício declarado em cada ano não pode ser comprovado de forma directa e exacta pois está influenciado por valores que indiciam terem sido objecto de manipulação.
3. Saídas de produção e de armazém
Da análise ao software de gestão utilizado pelo sujeito passivo foram impressas listagens de saídas de produtos da empresa, para detectar se todos eles tinham sido objecto de facturação, isto é objecto de Factura ou Venda a Dinheiro.
Nesse âmbito foram detectados inúmeros documentos com a respectiva numeração e data, emitidos em nome de consumidor final, identificados não como factura ou venda a dinheiro mas como saída de produção (exercício de 2007 e 2008) e saídas de armazém (exercício de 2009).
A configuração do documento é exactamente igual à de uma factura ou venda a dinheiro, com as mesmas descrições, inclusivamente com a referência a “Os artigos foram colocados a disposição do adquirente nesta data ao abrigo do art. 35, n.º 5 alínea j) do CIVA”. A única diferença é a de que surge inscrita a designação de saída de armazém ou de produção e não factura ou venda a dinheiro.
A justificação apresentada pela gerência para estes documentos foi o da necessidade de acertar existências que estavam erradas no software de gestão.
Fazendo uma análise detalhada por exercício:
a) Exercício de 2007
No exercício de 2007, foram detectados diversos documentos numerados identificados com a designação de Saída de Produção (SP). Estão também emitidos em nome do cliente ****** Consumidor final A única diferença é a de que surge inscrita a designação de saída de produção e não factura ou venda a dinheiro.
Diferentemente da forma utilizado nos outros exercícios, neste, os documentos com a designação de saída de produção, foram emitidos ao longo do ano e não a 31 de Dezembro.
Assim e fazendo um levantamento dos documentos emitidos:

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Nestas saídas de produção não aparece discriminado nem o preço unitário nem o respectivo valor, mas somente as quantidades. Somando as respectivas quantidades informaticamente, apura-se o montante de 255.315,00 unidades de medida (metros ou unidades, consoante o tipo de produto) de saídas de produto.
Não é justificável o facto de quase diariamente serem emitidos diversos documentos destes de saída de produção, para acertar existências. Por outro lado se esse fosse o objectivo, a 31 de Dezembro de 2007, a listagem informática das existências em armazém deveria servir para quantificar as existências em armazém. No entanto não foi isso que aconteceu, tal como foi demonstrado no ponto - Inventariação de existências.
b) Exercício de 2008
Também no exercício de 2008, foram detectados diversos documentos numerados identificados com a designação de Saída de Produção (SP). Estão também emitidos em nome do cliente ****** Consumidor final. A única diferença é a de que surge inscrita a designação de saída de produção e não factura ou venda a dinheiro
Para analisar os documentos em questão foram emitidas novas vias do documento 31797 de 17-07-2008 e 33958 de 31-12-2008. Nestes documentos não está inscrito o preço de venda unitário, mas tão só as quantidades.
Também na listagem de vendas clientes/produtos não aparece o valor destas operações, mas sim os documentos de saída. Através do somatório das quantidades foi possível quantificar em unidades de medida (metros ou unidades) o valor de 273.970,58 de saídas.
Maioritariamente, os documentos emitidos, têm todos eles a data de 31-12-2008.
Da análise efectuada, não se compreende e também não foi justificada a existência de vários documentos emitidos para o mesmo produto, com numeração diferente mas a mesma data.
Meramente a titulo de exemplo:

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Isto sucede com múltiplos produtos.
c) Exercício de 2009
No exercício de 2009, apenas consta um único documento com a designação de saída de armazém. Tem o número 302 e data de 31-12-2009. O código do cliente é o ****** Consumidor final.
Foi emitida uma via deste documento, aparecendo discriminada uma quantidade elevada de produtos, com quantidades variáveis e respectivo preço de venda unitário que corresponde ao preço de custo parametrizado no computador. Na última página não está quantificado o valor da operação. Este surge discriminado na listagem de vendas clientes/produtos:
*) Valor de € 328.583,83 e as quantidades totalizam 205.901,995 unidades de medida (metros ou unidades conforme o tipo de produto).
d) Conclusão 21

A justificação apresentada pelos representantes da sociedade de que estas saídas eram para acerto de existências, não responde a um conjunto de questões que legitimamente se colocam e ficam em aberto:
*) Porque razão em 2007, esses documentos eram emitidos com uma frequência quase diária? Existindo esses acertos, porque motivo no final do ano a listagem de inventário dada pelo sistema informático não é utilizada como inventário de existências?
*) Porque razão em 2008, os documentos emitidos a 31-12-2008, têm numeração diversa e existem vários documentos a darem saída do mesmo produto?
*) Porque razão estes documentos de saída de armazém e produção reúnem as condições para serem usadas como documento de transporte?
Obviamente que as questões que se colocam levantam indícios objectivos que o sistema contabilístico potencia a existência de operações não justificadas.
4. O programa de facturação
Como já referido o sujeito passivo emite as facturas através de um programa de facturação. No exercício de 2007, foi detectada a existência da factura nº 8544 de 11-05-2007 emitida em nome de dois clientes distintos e com valores diferentes:
*) Irmãos P……….. - Servo …………. Lda NIPC ………….no valor de € 2.663,27 mais IVA de € 529,70 totalizando € 3.052,08.
*) Paulo ………… & Silva Lda NIPC ………….. no valor de € 2.511,52 mais IVA de € 499,75, totalizando € 2.879,52.
Os representantes do sujeito passivo informaram que tal se devia a um lapso, tendo inicialmente a factura sido enviada para o cliente Irmãos P……. - Serralharia ………….., mas em nome de Paulo ………. & S……. Tendo sido detectado o erro, foi corrigida a factura (aproveitando para corrigir também as quantidades de um produto facturado, razão da diferença de valores).
Mais disseram que, em caso de lapso, o procedimento seguido era o de corrigir os documentos emitidos, ao invés de processar notas de débito e/ou notas de crédito, consoante os casos, ou proceder à anulação do documento errado e respectiva substituição.
Também esclareceram que actualmente o programa de facturação já não permite estas rectificações, exigindo a emissão de nova factura.
Independentemente das razões apontadas, o facto é que o sistema de facturação permitia que o sujeito passivo emitisse com o mesmo número e data, facturas para clientes diversos, o que põe em causa a integridade da facturação declarada.
5. As margens de comercialização
Através do sistema de software de gestão da empresa, foi obtida uma listagem com a designação de “Análise de Rentabilidade de Produtos” dos exercícios de 2007/2008 e 2009. Esta listagem desagrega as quantidades facturadas por tipo de produto, identificando o valor da venda e o valor do custo, considerando este o que consta da ficha de produto.
Feito o tratamento dessa informação foi obtida a seguinte margem média de comercialização
(Venda-Custo Venda/Venda):

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Se esta margem for comparada com a que resulta da contabilidade, considerando desta apenas o valor do custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas a qual inclui apenas as compras e não custos de mão de obra, electricidade, etc, apura-se a seguinte margem de comercialização:
Resulta do exposto que a margem de comercialização que resulta da contabilidade é manifestamente inferior à definida pelo sujeito passivo segundo os critérios de produção.

Tendo em contra os factos descritos constata-se que para aqueles custos de mercadorias vendidas e existências consumidas registados na contabilidade, o valor dos proveitos teria que ser superior ao declarado.
Ainda que o sujeito passivo tenha justificado as divergências com o facto de o custo da venda associado a cada produto ser meramente indicativo, não estar actualizado por impossibilidade organizativa, não corresponder muitas das vezes à referência do produto, e por esses motivos não ser condizente com a realidade, o facto é que tais justificações não permitem iludir a dúvida fundada de que a margem de comercialização é superior à que a contabilidade evidencia.
6. Comparação com rácios do sector de actividade
Perante os factos relatados, foi adoptado o procedimento de comparar alguns rácios do sujeito passivo com os do sector de actividade, a nível nacional, em que ele se insere. Essa comparação foi ao nível das áreas de análise identificadas nos pontos anteriores, designadamente, margens de comercialização, rotação de stocks e rentabilidade fiscal.
Qualquer comparação de rácios com os do sector de actividade, merece o cuidado devido. Isto porque cada empresa apresenta as suas especificidades, que a podem fazer divergir do sector de actividade. Para abreviar estes possíveis desvios, a comparação que aqui se procede é com a média do sector de actividade.
Este teste visa confirmar a existência ou não de diferenças significativas.
Assim:
a) Margem bruta de comercialização I e II

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As margens brutas de comercialização que a contabilidade do sujeito passivo reflecte são manifestamente inferiores às da média do sector de actividade em que ele se insere. Se forem adoptados nesta comparação os valores que resultam do sistema informático “Listagem rentabilidade de produtos”, essa divergência deixa de ser tão significativa. Por essa via se demonstra que não são as possíveis especificidades da empresa que a fazem divergir da média nacional do sector de actividade em que ela se insere, mas outros factos que não estão relevados na contabilidade.
b) Duração média de existências

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Como já descrito as existências inventariadas não podem ser comprovadas, existindo erros, incorrecções, valores definidos por estimativa, o que inviabiliza a sua certificação. Por conseguinte, os desvios perante a média do sector de actividade, também aqui, não são justificáveis pelas especificidades da empresa analisada.
c) Rentabilidade fiscal

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As omissões e incorrecções detectadas, objectivamente influenciam negativamente o resultado da actividade declarado. Por conseguinte, também aqui os desvios perante a média do sector de actividade não são justificáveis pelas especificidades do sujeito passivo.
d) Conclusão
Neste teste comparativo com alguns dos rácios do sector de actividade no qual a empresa se insere, demonstra-se que existem divergências apenas passíveis de justificação pelas omissões e incorrecções detectadas na contabilidade da empresa.
7 - Factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada.
Da auditoria tributária realizada foram detectados factos que indiciam que a empresa possui uma capacidade contributiva superior à que os resultados da actividade reflectem, relativamente aos exercícios inspeccionados:
a) Exercício de 2007
No exercício de 2007, estão registados diversos documentos relacionados com encargos suportados com consumíveis e inscrições em provas de Karting, conforme discriminação efectuada no quadro seguinte:

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Foi esclarecido pelos representantes da empresa, que esta patrocinava a participação de um piloto (descendente de 10 grau dos sócios da sociedade) em provas de Karting, o qual possuía o logótipo da empresa. Por esse facto devem ser consideradas como de despesas de publicidade.
Independentemente da natureza deste encargo, que não foi objecto de correcção no presente procedimento inspectivo por se aceitar a justificação apresentada, o facto é que o mesmo indicia que o sujeito passivo no exercício da sua actividade libertou recursos capazes de patrocinar os encargos decorrentes desta participação, para além de todos os outros necessários à actividade.
E verdade que o resultado declarado da actividade foi positivo em € 20.391,70. No entanto, a capacidade evidenciada da empresa em suportar encargos de € 9.707,08 (quase metade do resultado) legitimamente induz pela existência de recursos não declarados que potenciam tais dispêndios.
b) Exercício de 2008
Como já aqui descrito no presente relatório a empresa em 2008, adquiriu uma viatura ligeira de passageiros, matricula ………., Mercedez Benz SLK 200 K, a gasolina, com 5843 Kms. Desde então a empresa passou a ter no seu imobilizado três viaturas ligeiras de passageiros marca Mercedez, cujo valor de aquisição foi superior a € 40.000,00.
Do valor de € 43.000,00 que foi o preço de aquisição, a empresa pagou € 8.000,00 em 2008, ainda que o valor de € 5.000,00 apenas tivesse sido registado em 2009 conforme recibo 403362 de 24-122008 emitido pela S................ Lda NIPC ……………...
Em Fevereiro de 2009, está registado o contrato de locação financeira celebrado com a S………… com o n." 644137, no valor de financiamento de € 35.000,00, inerente a esta viatura, datado de 22 de Dezembro de 2008. Na escrita da empresa só foi registado em Fevereiro de 2009, conforme registo contabilístico 228.
Por esta forma a empresa evidencia uma capacidade de investimento, neste caso num bem de luxo no valor de € 43.000,00, o qual não emerge do resultado declarado da actividade exercida, pois neste ano foi negativo em (€ 11.763,32).
Perante o exposto, também por esta via e objectivamente se conclui, pela existência de indícios sérios de que existem outras fontes de recursos gerados pela actividade que permitem financiar este tipo de bens, mas não reflectidos na contabilidade.
8 - Conclusão
A determinação do lucro tributável tem como ponto de partida o resultado liquido do exercício evidenciado pela contabilidade. Daí que a esta, como instrumento base da quantificação do imposto devido, deva obedecer, na sua estrutura, a determinadas normas impostas pela lei fiscal, designadamente: “Reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo ...” artigo 17º n.º 3 alínea h) do CIRC.
Já em sede de IVA, a contabilidade deve ser adequada ao apuramento e fiscalização do imposto - artigo 290 n.º 1 alínea g), devendo por isso reflectir todas as operações realizadas pela empresa, por forma a permitir comprovar o IVA devido.
Os factos descritos neste capítulo demonstram que a escrita não reflecte todas as operações realizadas pelo sujeito passivo, uma vez que:
*) Ao nível dos fluxos financeiros de entrada e saída da empresa, existem movimentos cuja origem e destino não é comprovável, indiciando a existência de factos não declarados. Por outro lado os saldos de caixa apresentam saldos elevados, indiciando entradas superiores às que foram geradas pelas operações declaradas. Ao nível dos bancos o sistema de controlo é completamente deficiente existindo acertos anuais por conta de caixa para haver similitude com os saldos bancários.
*) A inventariação realizada ao nível das existências finais apresenta incoerências, divergências, acréscimos de valores por estimativa. Todos estes factos impossibilitam a validação e comprovação dos valores declarados. Tratando-se de um componente que influencia o apuramento do CEVC e por essa via do resultado do exercício, a sua manipulação origina a ocultação de transacções não declaradas.
*) Foi detectada a existência de documentos de saída de produção e armazém, que não deram origem a factura ou venda a dinheiro. A explicação apresentada pelos representantes da sociedade da necessidade de acertos de stocks, não justifica na íntegra este procedimento utilizado, indiciando a existência de transacções não declaradas.
*) O programa de facturação permitia imprimir com o mesmo número, facturas para mais que um cliente. A integridade e operacionalidade do sistema leva a concluir que o sujeito passivo podia realizar múltiplas transacções com o mesmo número de factura, sendo facturadas apenas a um cliente.
*) As margens de comercialização globais que resultam da contabilidade são manifestamente inferiores às detectadas na análise da rentabilidade dos produtos. Ainda que o sujeito passivo tenha justificado as divergências com o facto de o custo da venda associado a cada produto ser meramente indicativo, não estar actualizado por impossibilidade organizativa, não corresponder muitas das vezes à referêncía do produto, e por esses motivos não ser condizente com a realidade, o facto é que tais justificações não permitem iludir a dúvida fundada de que a margem de comercialização é superior à que a contabilidade evidencia.
*) Foi feita uma comparação com os principais rácios do sector de actividade em que a empresa se insere ao nível das margens de comercialização, tempo médio de existências e rentabilidade fiscal. Em todos eles existem desvios significativos, sendo que estes não são justificáveis pelas especificidades da empresa.
*) Nos exercícios inspeccionados de 2007 e 2008, a empresa evidencia uma capacidade de gerar recursos para fazer face a encargos com bens não essenciais ao processo produtivo e realizar investimentos, não condizentes com os resultados da actividade declarados. Por essa via denota uma capacidade contributiva superior à que emerge dos resultados por si declarados.
Decorre do exposto que a contabilidade da empresa enquanto sistema de informação do respectivo desempenho, não reúne as condições legais para servir de instrumento à quantificação da matéria tributável em sede de IRC e IVA, gerada pela actividade empresarial.
Face a essa impossibilidade, não cabe outra alternativa à Administração Tributária que não seja o recurso à avaliação indirecta como forma de quantificar os impostos devidos, a qual assenta os seus pressupostos na:
"Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto" - (alínea b) do artigo 87.º da LGT), a qual se aplica por
a) Insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, e irregularidades na sua organização ou execução insupríveis em qualquer prazo legal- (artigo 88º n.º 1 alínea a) da LGT).
b) Factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva maior do que a declarada - (artigo 88° alínea d) da LGT)
Note-se que aplicação da Lei Geral Tributária emerge da aplicação dos artigos 52º do CIRC e 90º do CIVA.
V - Critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos
Percorrido o caminho da fundamentação que legitima o recurso à avaliação indirecta, a qual visa, nos termos do n.º 2 do art. 83º da LGT, determinar o valor dos rendimentos a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a AF disponha, é chegado o momento de definir um critério de quantificação - artigo 90° da LGT.
Este, tem, em conformidade com o n.º 1 do art.º 84º da LGT, de cimentar-se em critérios objectivos para que a quantificação da matéria colectável que daí resulte, se aproxime da realidade que se procura apurar, e que a mesma tenha como sustento elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação.
Qualquer indicador extraído do sistema de informação da empresa estaria inquinado com as omissões e inexactidões demonstradas, levando a que a quantificação realizada conduzisse a resultados incorrectos. No entanto, afastar por completo os dados do sistema de informação da empresa, como por exemplo a sua estrutura de custos, seria quantificar valores sem ter em conta as especificidades do operador económico em análise.
Em conformidade, procurou-se que o critério seleccionado reunisse as seguintes condições:
*) Que incorpore completamente a estrutura de custos que a empresa apresenta, por forma a balizar a quantificação por avaliação indirecta com as características próprias da sociedade.
*) Que incorpore todo um conjunto de custos, como sejam os de inactividade, desperdícios, quebras, incluindo factores normais e anormais da actividade.
*) Que seja objectivo, na medida em que resulte de tratamento estatístico, e não esteja por isso enviesado por escolhas subjectivas do auditor.
*) Que seja fiável, isto é apresente características do sector de actividade no qual a empresa actua em condições de plena concorrência de mercado, por forma a contrabalançar os dados informativos da sociedade que estão influenciados por omissões/inexactidões.
O indicador que reúne estas condições e por isso escolhido é o da rentabilidade fiscal do volume de negócios, em valores médios do sector de actividade em que a empresa se insere (CAE 25610), enquadrável no artigo 90º n.º 1 alínea a) da Lei Geral Tributária.
Este indicador que consta da base de dados da DGCI, é obtido com base no tratamento estatístico das declarações de todos os contribuintes entregues e que se inserem neste sector de actividade, não sendo por isso um indicador estimado de forma subjectiva.
Nos exercícios inspeccionados ele apresenta os seguintes valores:

Assim e tendo por base a estrutura de custos que a empresa apresenta, é possível estimar o volume de negócios respectivo. Por aplicação da seguinte equação matemática:
Volume de negócios estimado=Total de Custos contabilizados/(1- Indicador de rentabilidade fiscal)
quantifica-se o seguinte volume de negócios estimado:

« Quadro no original»


Tendo por base o volume de negócios estimado, por aplicação do indicador de rentabilidade, é possível quantificar o seguinte lucro tributável em sede de IRC:

« Quadro no original»


Em conformidade o lucro tributável estimado que constituirá a matéria tributável sujeita a IRC, ascende aos valores de € 60.311,23 (Exercício de 2007); € 55.296,53 (Exercício de 2008) e € 50.167,68 (Exercício de 2009).
Serão estes os montantes sujeitos a tributação em sede de IRC.
(…)”

5) Por requerimento com data de entrada no Serviço de Finanças de Fornos de Algodres em 13 de Junho de 2011, a ora impugnante apresentou pedido de revisão da matéria colectável (cfr. fls. 172-191 do PA);

6) Em 28 de Junho de 2011 realizou-se reunião de peritos onde foi lavrada a acta n.º 7.1, de onde se consignou que os peritos realizariam nova reunião após consultar novamente diversos documentos da contabilidade da ora impugnante (cfr. fls. 77-78 do PA);

7) Em 26 de Janeiro de 2011 realizou-se reunião de peritos onde foi lavrada a acta n.º 7.2, de onde se retira que os peritos não chegaram a acordo (cfr. fls. 79-83 do PA);

8) Em 11 de Julho 2011, foi proferido pelo Director de Finanças da Guarda despacho de fixação da matéria colectável, cujo teor se reproduz (cfr. fls. 84-86 do PA), designadamente:

“(…)
Segundo as actas da reunião os peritos analisaram tanto o relatório da inspecção tributária como a petição apresentada, tendo entendido - na primeira reunião – “... ser necessário consultar novamente documentação à contabilidade ...”. razão porque foi agendada nova reunião. Nesta reunião foram analisados os documentos externos apresentados no que se refere a fluxos financeiros, inventários, falta de emissão de facturas ou vendas a dinheiro, restantes fundamentos do relatório e a quantificação efectuada, como tudo consta da acta n.º 7.2, com a fundamentação da mesma constante e que aqui se dá por integralmente reproduzida.
Os peritos não lograram obter acordo. No seu parecer o perito da parte remete para a petição apresentada e refere que a haver incorrecções estas poderiam ser corrigidas pelo método directo. A perita nomeada pela Administração Tributária, pronuncia-se, também, pela prova produzida adicionalmente e rebate a falta de prova que, mesmo assim, continua a existir.
A fixação teve por base o relatório da inspecção tributária, que se dá por integralmente reproduzido, o qual foi sancionado por despacho de 11 de Maio de 2011.
Da sua análise resulta haverem razões fundadas para as correcções efectuadas, bem como resulta evidente a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria colectável, pelo que se mostra legitimado o recurso à aplicação de métodos indirectos, atenta a fundamentação aí expandida.
Por outro lado, das suas conclusões não se retira que não seja esta a capacidade contributiva da contribuinte.
Da sua análise conclui-se, ainda, pelo cumprimento por parte da administração tributária do ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação da matéria tributável por métodos indirectos, sendo que não se verifica igual cumprimento por parte da requerente em relação à quantificação, mesmo depois da prova produzida adicionalmente, que tal como é referido na acta nº. 7.2 se mostrou inconclusiva - cfr. nº. 3 do artº. 74º. da LGT).
Nestes termos, tudo visto e ponderado, decido fixar a matéria tributável em sede de IRC e o Imposto sobre o Valor Acrescentado, nos valores fixados inicialmente, que assim mantenho, para cada um dos anos de 2007 a 2009.
Nos termos do disposto no nº. 9 do artº. 91º. da LGT, fixo um agravamento à colecta de 5%, a qual fica, no entanto dependente de não ser deduzida impugnação judicial (cfr. aI. c) do mesmo preceito). (…)”

9) Em 02 de Novembro de 2011 a ora impugnante remeteu a este TAF de Castelo Branco a petição inicial na origem dos presentes autos (cfr. fls. 1 de SITAF);

10) Nos exercícios de 2007, 2008 e 2009, a contabilidade da sociedade ora impugnante apresentou fluxos financeiros de entrada e saída da empresa cuja origem e destino não é comprovável pela análise da contabilidade;

11) Os saldos de caixa da sociedade eram, nos exercícios de 2007 e 2008, bastante elevados;

12) A contabilidade da sociedade reflecte, nos anos de 2007, 2008 e 2009, acertos anuais por conta de caixa para haver similitude com os saldos bancários;

13) A inventariação das existências finais apresenta incoerências, divergências e acréscimos de valores por mera estimativa;

14) Nos anos de 2007, 2008 e 2009, foi detectada na contabilidade da ora impugnante a existência de documentos de saída de produção e armazém que não deram origem a factura ou venda a dinheiro;

15) O programa de facturação permitia imprimir com o mesmo número facturas para mais do que um cliente;

16) As margens de comercialização globais que resultam da contabilidade são inferiores às detectadas na análise da rentabilidade dos produtos;

17) A sociedade ora impugnante apresenta desvios significativos do rácio do sector de actividade em que se insere ao nível das margens de comercialização, tempo nédio de existências e rentabilidade fiscal;

18) No exercício de 2007 a contabilidade da sociedade reflectiu que esta suportara encargos no valor de Eur. 9.707,08 com consumíveis e inscrições em provas de karting, visando o patrocínio de um piloto descendente em 1.º grau dos sócios da sociedade, que ostentava o logótipo da empresa no veículo utilizado;

19) Em 2008 a sociedade ora impugnante adquiriu uma viatura ligeira de passageiros com matrícula ……….., de marca Mercedes Benz e modelo SLK 200 K, a gasolina, com 5843 km, pelo valor de aquisição de Eur. 43.000;

20) Por conta da aquisição daquele veículo, a ora impugnante pagou em 2008 a quantia de Eur. 8.000, e em Fevereiro de 2009 registou na sua contabilidade a locação financeira do veículo;

21) Com a aquisição do veículo referido, a sociedade ora impugnante passou a ter no seu imobilizado três viaturas ligeiras de passageiros marca Mercedes, de valor superior a Eur. 40.000;

22) A contabilidade da impugnante adoptava o registo dos movimentos de disponibilidades por Caixa, quando o podia fazer directamente por Bancos;

23) Desta prática resultou, que saldasse depois o Caixa, por Fornecedores, Bancos, por movimentações dos valores;

24) O registo 441, no valor de € 331.498,85, diz respeito a pagamentos documentados em numerário, no valor de € 295.065,12; (quesito 1.1 Fazenda Pública)

25) O registo 442, no valor de € 105.194,41, diz respeito a pagamentos documentados por cheque no valor total de € 14.000,00, e em numerário e um deles sem identificação de cheque no valor global de € 91.194,41;

26) O registo 523 de 31-05-2008, identificado a pág. 34 e 35 do relatório da inspecção, correspondente a movimentos lançados nas contas de Caixa e Bancos, dizem respeito aos depósitos dos valores recebidos dos clientes e despesas e pagamentos, que foram lançados na conta Caixa quando deveriam ter sido registados na conta Bancos;

27) O registo 1116 de 30-11-2008, identificado a pág. 35 do relatório da inspecção, corresponde a depósitos efectuados pela impugnante naquele mês;

28) O montante de € 131.490,26 correspondente ao registo 1116 está errado, pois foram somados todos os talões de depósitos efectuados no mês de Novembro de 2008, dos quais constavam cheques que foram devolvidos e depositados em data posterior;

29) Da contabilidade não constavam todos os documentos justificativos daqueles depósitos;

30) No registo 525 de 31-05-2009, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, o depósito no valor de € 12.521,46 na conta Banco, diz respeito ao depósito de dois cheques do cliente Paulo ………… & S……., Lda., que haviam sido devolvido;

31) No registo 525 de 31-05-2009, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, o depósito no valor de € 12.521,46 na conta Banco, diz respeito ao depósito de dois cheques do cliente Paulo ………..& S……., Lda., que haviam sido devolvido;

32) No registo 525 de 31-05-2009, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, o levantamento de € 2.900,70 diz parcialmente respeito à soma dos cheques que serviram para pagar salários, nos valores de € 539,50, € 539,50 e € 521,70 e que foi contabilizado no processamento de salário, por Caixa;

33) No registo 627 de 30-06-2009, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, o depósito no valor de € 11.256,29 na conta Banco, diz respeito ao depósito de vários cheques de clientes;

34) O registo n.º 803, de 31-08-2009, identificado a pág. 36 do relatório de inspecção, corresponde ao acerto de contas correntes de clientes na contabilidade com as contas correntes do Software de Gestão;

35) No registo n.º 1237, de 31/12/2007, os depósitos e levantamentos contabilizados têm correspondência com os extractos bancários, excepto o registo de Eur. 44,80 que corresponde a um estorno contabilístico sem reflexo no extracto bancário;

36) O registo 1229 de 31-12-2008, identificado a pág. 39 do relatório da inspecção, corresponde a um o depósito efectuado na conta Banco, no valor de € 4.108,99, por depósito de cheque do cliente J…………..— Montagem ……….., Lda., para pagamento do recibo n.º 2646, de 12/11/2008, e o levantamento de cheques CCAM, no valor de € 26.624,58, tinha como destino o pagamento das facturas de fornecedores, impostos, outras despesas, que tinham sido contabilizados por Caixa, com excepção da quantia de Eur. 1.000,00;

37) O registo 1125 de 30/11/2008, identificado a pág. 40 do relatório de inspecção, é um documento interno que não permite comprovar o destino do levantamento de cheques no valor de 18.691,69€, integrando o mesmo o saldo de caixa contabilístico;

38) Existem, fora da contabilidade da impugnante, documentos justificativos do destino do levantamento de cheques no valor total de 16,900,55€ e uma regularização dos movimentos efectuados no registo 1038, no valor de 1.791,14€, relativamente ao registo 1125 de 30/11/2008, identificado a pág. 40 do relatório de inspecção;

39) A impugnante não é substancialmente produtora, mas sobretudo comercial, juntando aos bens adquiridos a lacagem;

40) O quadro de pessoal da sociedade ora impugnante, nos anos de 2007 a 2009, era composto pelos dois sócios e trabalhadores de produção, numa média de 4 trabalhadores ao longo daqueles anos, auferindo um rendimento bruto médio de Eur. 500.00;

41) Em 20 de Julho de 2011 foi emitida a liquidação adicional de IRC atinente ao exercício de 2007 n.º ……………..206, com um valor a pagar de Eur. 10.112,99, que se discrimina da seguinte forma (cfr. documento n.º 1 junto com a p.i.):

« Imagem no original»

42) Em 20 de Julho de 2011 foi emitida a liquidação adicional de IRC atinente ao exercício de 2007 n.º ………………212, com um valor a pagar de Eur. 14.585,98, que se discrimina da seguinte forma (cfr. documento n.º 2 junto com a p.i.):

« Imagem no original»

43) Em 20 de Julho de 2011 foi emitida a liquidação adicional de IRC atinente ao exercício de 2007 n.º …………..222, com um valor a pagar de Eur. 12.142,40, que se discrimina da seguinte forma (cfr. documento n.º 3 junto com a p.i.):

« Imagem no original»


***

A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:

“Com relevância para a boa decisão da causa, não se provou o seguinte:

A) A viatura ligeira de passageiros com matrícula …………, de marca Mercedes Benz e modelo SLK 200 K tem por objecto exclusivo empresarial;

B) Os gerentes deslocam-se na referida viatura aos clientes, aos fornecedores e às instituições oficiais;

C) Os lançamentos contabilísticos na conta caixa e depósitos à ordem nos exercícios inspeccionados, com base em documentos internos, demonstram a origem e o destino dos recursos financeiros;

D) É possível apurar as origens e destinos dos dinheiros da impugnante;

E) Os pagamentos a fornecedores e as movimentações por Bancos saídos do Caixa não constituem pagamentos não documentados na contabilidade;

F) É possível reconstituir os movimentos financeiros, eliminando os movimentos por Caixas e fazendo passar tudo somente por Bancos;

G) Quanto ao registo n.º 440 de 30-04-2007, a pág. 33 do relatório da inspecção, o movimento corresponde à anulação de um documento de 2006 que serviu na altura para regularizar o saldo de caixa urna vez que se mostrava não aceitável a existência de tal montante (€ 224.698,33) em Caixa;

H) Este saldo existia em 2006, uma vez que o fornecedor não passava recibos e não tinham sido emitidas notas de pagamento;

I) O registo 1244 de 31-12-2007, identificado a pág. 34 do relatório da inspecção, corresponde à regularização de várias contas de fornecedores por contrapartida da conta Caixa, e indirectamente por Bancos, uma vez que os pagamentos a fornecedores foram efectuados por cheques;

J) Foi efectuado o acerto das contas correntes na contabilidade com as contas correntes do Software de Gestão da impugnante, para as contas da contabilidade da impugnante estarem de acordo com as contas dos fornecedores e do software de gestão;

K) No registo 525 de 31-05-2009, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, é possível identificar o registo da quantia de € 1.300,00 atinente ao levantamento de € 2.900,70;

L) O registo 621 de 30-06-2009, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, corresponde a um levantamento efectuado na CCAM para depositar no B ………….. para reforçar saldo existente neste Banco;

M) No registo 627 de 30-06-2009, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, o levantamento no valor de € 12.387,20 tinha como destino o pagamento das facturas de fornecedores Adriano ……….& ………a, Lda. e T ……. Lda., bem como o pagamento de outras despesas e salários;

N) O registo 120085, que tem como suporte um documento interno, identificado a pág. 36 do relatório da inspecção, corresponde a um reforço de tesouraria para garantir o bom funcionamento dos respectivos pagamentos;

O) No registo n.º 1237, de 31/12/2007, referente a entradas e saídas por contrapartida de caixa, são identificados os cheques;

P) No registo 1229 de 31-12-2008, identificado a pág. 39 do relatório da inspecção, o levantamento no valor de € 7.800,00 foi em dinheiro e destinou-se ao pagamento de despesas;

Q) As diferenças entre as entradas de material e as saídas de material correspondem aos valores que estavam em inventário no final de cada exercício económico, descontando as quebras normais;

R) Do processo de lacagem resultam desperdícios entre 5% e 10%;

S) Todas as saídas de produção que a Autoridade Tributária refere no relatório de inspecção dizem respeito a produtos começados pelo código 00, que correspondem a alumínio em bruto;

T) A contabilidade da ora impugnante respeitava integralmente as normas de organização contabilística.


***

A motivação da matéria de facto assentou no seguinte:

“A convicção do tribunal baseou-se nos documentos constantes do processo administrativo, conforme se indicou ao longo do rol de factos provados, e atendendo à posição assumida pelas partes nos seus articulados (artigos 74.º e 76.º, n.º 1, da LGT, e artigos 362.º e ss. do Código Civil).

O Tribunal valorou, ainda, a prova testemunhal produzida pela impugnante e pela Fazenda Pública, bem como o relatório produzido pelo colégio de peritos.

Foram testemunhas da Autora:

Maria ………………………., empregada de escritório da ora impugnante desde 1994, sócia, e foi sócia-gerente da sociedade no início da sua actividade, e cônjuge do sócio-gerente da sociedade.

Quanto ao conhecimento directo revelado, afirmou que a L……………. se dedica exclusivamente à lacagem de alumínio, e à compra e venda de alumínio, que adquirem em bruto e vendem ao serralheiro; que existe bastante desperdício na actuação da sociedade, especialmente no pó utilizado para lacar o alumínio; e que quando o alumínio fica danificado não têm capacidade técnica para recuperar o material, sendo entregue a uma “sucata” que paga 50 cêntimos pelo quilo de alumínio.

Relatou, ainda, que o desperdício de pó está armazenado em caixas num terreno da empresa; que o escoamento desse desperdício para entidades que recebem esse tipo de produtos é muito caro, pelo que têm vindo a acumular o produto em armazenamento, relatando, ainda, que têm tentado obter apoio junto do Município para suportar o transporte dessas caixas.

Referiu, também, que a viatura Mercedes de turismo era utilizada para transporte do pessoal da sociedade, para ir a clientes ou fazer transporte de mercadorias.

A testemunha respondeu prontamente àquilo que lhe foi perguntado, de forma aparentemente espontânea. Não obstante, tratando-se, como a própria afirmou, de um negócio pequeno e familiar, o Tribunal não pode deixar de denotar que existirá sempre um interesse no desfecho favorável da causa, quanto mais não seja indirecto, uma vez que é detentora de capital na sociedade e funcionária da mesma. Posto isto, o seu depoimento será apenas valorado na medida em que seja corroborado pelo depoimento das demais testemunhas, cuja imparcialidade é mais verosímil do que a da testemunha em apreço.

C …………………….., empregada fabril da impugnante há cerca de 20/22 anos.

Quanto ao conhecimento directo revelado, relatou que são 5 funcionário, mais os dois patrões, e que a média de trabalhadores da sociedade foi, ao longo dos anos, de 4/5 funcionários; que os desperdícios de pó da lacagem, se forem da mesma cor, são aproveitáveis, mas que se houver mistura de cores é desperdício, pelo que a actividade de lacagem acaba por gerar muito desperdício.

Relatou, também, que os colegas que fazem entrega de materiais fazem-no recorrendo à carrinha da sociedade.

Prestou um depoimento espontâneo, embora atribulado, não deixando de ser credível, contribuindo para a formação da convicção do Tribunal na decisão sobre a matéria de facto.

Por banda da Fazenda Pública, prestou depoimento a seguinte testemunha:

R ……………………….., Inspector Tributário responsável pelo procedimento de inspecção e elaboração relatório de inspectivo.

A testemunha explicou detalhadamente os procedimentos encetados para recolha de elementos para o procedimento de inspecção, o raciocínio subjacente à sua recolha, e as conclusões a que chegou, vertidas no relatório de inspecção.

Prestou um depoimento calmo e coerente, mas que nada de inovador trouxe além daquilo que havia já vertido no relatório de inspecção tributária.

Quanto aos factos provados:

O facto 10) resulta provado por análise do relatório pericial. Respondendo aos quesitos 1, 2 e 3, retira-se do relatório pericial que há valores a crédito que por mera análise do acervo documental da contabilidade não se apuram qual a sua origem (cfr. resposta ao quesito 1). Alguns vêem a sua origem justificada apenas por documentos juntos pelo perito da impugnante em sede de perícia – o que, logicamente, denota que aqueles documentos não estavam antes na contabilidade da impugnante – e outros nem sequer conseguiram ser justificados naquela sede. Vejam-se as conclusões consignadas a páginas 16 do relatório dos peritos:

Pelo que e para efeito do questionado de acordo com a amostra e logo com o universo dos registos, não é possível comprovar que todos os depósitos, levantamentos e pagamentos identificados nos extratos bancários, tenham suporte documental e respetivo registo contabilístico, pese embora adicionalmente tenham sido apresentados pelo perito da impugnante, documentos justificativos de diversas operações.

Em rigor, os valores na origem do facto 11) não é controvertido. Na verdade, a contabilidade da ora impugnante apresentava um saldo de caixa devedor de Eur. 84.814,96 no exercício de 2007, e um saldo de caixa positivo de Eur. 51.418,99, valores francamente elevados (em ambos os sentidos). O saldo de caixa é, por definição, o dinheiro, em notas e moedas, efectivamente na posse de contribuinte. Ora, é impossível a existência de um saldo devedor, e muito menos de um valor manifestamente elevado de Eur. 84.814,96, bem como um saldo positivo de Eur. 51.418,99 é manifestamente desajustado da realidade uma sociedade familiar como a ora impugnante, pelo que a classificação de tais saldos como “elevados”, conforme preconizado pela Autoridade Tributária em sede de RIT, se demonstra.

Quanto ao facto 12), na resposta ao quesito 7.º formulado pela Fazenda Pública, responde o colégio de peritos:

“Contudo tal reconciliação evidencia por si mesma, que anteriormente à mesma, os saldos da contabilidade de clientes não se encontravam corretos.

Pelo exposto os registos do documento 803 não dizem respeito a pagamentos, mas a acertos de saldos de clientes, que no final são debitados em caixa (11) por 22.667,80€.

Pese embora não estejam na contabilidade, contudo a data dos recebimentos e os meios utilizados podem ser observadas nos recibos e na respetiva correspondência com o extrato do software de gestão.

Assim e dado que no documento em apreço se efetua uma reconciliação de saldos, significa que as operações que originariamente os justificaram não foram refletidas na data em que o deveriam ter sido — na contabilidade.

Na ausência de outro tipo de controlo, designadamente mapas de caixa diários, o saldo de caixa, não pode ser controlado integralmente a partir da contabilidade. Existem registos em que podem ser conciliados com o extracto da conta caixa e documento justificativo.

O mesmo acontece com os saldos de bancos que podem ser conciliados com os extractos bancários, dado que a contabilidade não apresenta a integralidade das operações bancárias.

Após a contabilização do registo 803 de 22.667,80€, o saldo de caixa contabilístico é de

129.083,70€ (Anexo 35).”

Ou seja, em sede de peritagem, após junção de documentação variada, foi possível apurar a conciliação dos movimentos entre saldos de caixa e saldos bancários. O facto em apreço, porém, é retirado do RIT e consubstancia um dos factos-indícios elencados pelo órgão inspectivo para recorrer à quantificação da matéria colectável com recurso a métodos indirectos. A contabilidade em si mesmo, e como resulta objectivamente da peritagem, não elucidava as conciliações que eram feitas, pelo que existia, à luz daquilo que estava vertido e arquivado na contabilidade da ora impugnante, acertos anuais nos saldos de caixa para “equilibrar” com os saldos bancários apresentados.

O facto 13) resulta provado por análise da resposta aos quesitos 18.º a 21.º, formulados pela Fazenda Pública. Embora o colégio de peritos refira que o valor das existências finais coincide com o valor do balanço nalguns dos anos (2006, que não foi objecto de inspecção), já em 2007 referem que o “valor da listagem das existências finais de 2007, tem uma diferença para menos de 180.000€, relativamente ao valor do Balanço”, que o “valor da listagem das existências finais de 2008 é de 246.024,80€ e o valor de Balanço é de 250.056,87€”, com uma divergência de Eur. 4.032,07, e que relativamente a 2009 “listagens de inventários de 2009 não se encontravam arquivadas nas pastas, existindo somente um documento (Anexo 54), com o seguinte texto: "As existências finais em 2009 era de 149.550€ valor esse transmitido pela D. Maria ………..”. O facto-indício, conforme alegado pela Autoridade Tributária, é o de que a inventariação apresentava irregularidades, por ser incoerente e divergente, o que se demonstra, uma vez que relativamente aos anos de 2007 e 2008 os inventários e os balanções não coincidiam, e relativamente a 2009 a contabilidade nem sequer estava devidamente documentada, registando-se valores por indicação da sócia, sem sabermos com base em que é que a sócia dava o valor em apreço, pelo que também a assunção de que aqueles valores eram estimados se prova.

O facto 14) é sustentado pela Fazenda Pública em particular na conclusão formulada a pág. 51 do RIT. Existem vários documentos de saída de materiais cujo código de cliente é “consumidor final”. Este facto, em rigor, não é controvertido. As partes divergem, porém, no motivo que origina a emissão de tais documentos, sustentando a impugnante que esses documentos visam tão-só acertar existências e não titular vendas. O facto, porém, é objectivo: existiam documentos de saída de produção e armazém que não deram origem a factura ou venda a dinheiro.

O facto 15) resulta sustentado a pág. 51-52 do RIT, e, independentemente das ilações que possa daí retirar-se, é um facto objectivo que a impugnante não põe em causa.

O facto 16) resulta sustentado a pág. 52-53 do RIT, concatenado com os documentos da contabilidade a fls. 843-886 do PA, e, da análise dos mesmos documentos, resulta provado e sustentado a pág. 53-55 do RIT o facto 17).

Os factos 18), 19), 20) e 21) não são controvertidos.

Os factos 22) e 23) são demonstrados pelas respostas dadas aos vários quesitos por parte dos peritos.

Os factos 24) e 25) resultam da resposta ao quesito 1.1 da Fazenda Pública; o 26) da resposta ao quesito 6.º da impugnante; os factos 27) a 29) da resposta aos quesitos 8.º a 10.º da impugnante; os factos 30) e 31) da resposta ao quesito 11.º da impugnante; o 32) da resposta ao quesito 12.º; o 33) da resposta ao quesito 14.º; o 34) da resposta ao quesito 16.º; o 35) da resposta ao quesito 20.º; o 36) da resposta ao quesito 22.º; o 37) da resposta ao quesito 23.º; o 38) da resposta ao quesito 23.º

O facto elencado em 39) não é controvertido.

O facto 40), alegado pela Fazenda Pública, resulta do depoimento das duas testemunhas da impugnante.

Quanto aos factos não provados:

A única prova produzida para prova de A) e B) foi o depoimento da sócia da sociedade ora impugnante. Como se referiu oportunamente, o Tribunal não ficou convencido quanto à imparcialidade do depoimento daquela testemunha. Depois, do depoimento da segunda testemunha resultou que normalmente os clientes iam buscar as encomendas às instalações da ora impugnante e, quando os colegas faziam entregues a clientes, utilizam a carrinha da sociedade. estamos a falar de três veículo ligeiros de passageiros, nenhum subsumível a uma carrinha comercial apta a transportar produtos como aqueles que eram produzidos pela ora impugnante.

Note-se, aliás, que o modelo SLK 200 K da Mercedes corresponde a um veículo de aspecto “desportivo”, baixo. Não é minimamente verosímil que aquele veículo fosse utilizado para transportar alumínios ou produtos de alumínio lacado. Podia existir um transporte pontual de produtos, mas é convicção do Tribunal que não seria esse o objectivo da utilização primacial do veículo.

De resto, também nenhuma prova foi feita que os sócios se deslocassem com frequência a clientes ou fornecedores, e consequentemente que tais veículos servissem para esse desiderato.

Os factos C) a F) não resultam provados por prova de facto contrário [cfr. item 10) dos factos provados, a título exemplificativo].

O facto elencado em G) não se prova atenta a resposta ao quesito 4.º da impugnante; nenhum meio de prova foi produzido para demonstrar o facto elencado em H); o item I) não se provou atenta a resposta ao quesito 5.º da impugnante, assim como J); o item K) por referência à resposta ao quesito 12.º da impugnante; L) por referência à resposta ao quesito 13.º; M) por referência ao quesito 15.º; N) por referência ao quesito 8.º da Fazenda Pública; O) por referência à resposta aos quesitos 19.º e 20.º da impugnante; e P) não resultou provado na resposta ao quesito 22.º da impugnante, não tendo sido produzido qualquer outro meio de prova para o efeito.

Para prova de Q) a ora impugnante juntou o documento n.º 3 anexo ao documento n.º 4, e os documentos n. os19 e 20. Sustenta que as entradas se encontram apuradas pelos documentos 4 e 19, e que as saídas pelo documento n.º 20. Ora, entre os primeiros documentos não é possível estabelecer uma relação entre compras e materiais que constam do extracto de conta, que não contêm quantidades, e o documento n.º 20 correspondem, igualmente, a um extracto de vendas, sem que a correlação entre valores, quantidades e tipo de produto possa ser estabelecida sem mais. Cumpriu à impugnante o ónus não só probatório da realidade que alega, mas antes de mais o ónus de alegação da relação entre os meios de prova que carreia. Limitando-se a retirar conclusões daqueles documentos que neles não estão espelhadas de forma objectiva, a prova do facto alegado tem de soçobrar.

O facto elencado em R) foi objecto de peritagem, mas, em rigor, é matéria fora do âmbito da peritagem económico-financeira, tanto que os peritos não ofereceram uma resposta tecnicamente informada, recorrendo a dados generalistas do sector. As testemunhas da impugnante, por seu turno, explicaram porque que motivos existiam desperdícios e que estes eram armazenados nas traseiras do edifício onde labora a ora impugnante. Ficou por provar-se, porém, a quantificação de tal desperdício, que é, isso sim, o pertinente para a prova do facto alegado, cuja prova assim soçobra.

Nenhum meio de prova foi produzido para prova de S).

Não se provou que a contabilidade da ora impugnante respeitasse as normas de normalização contabilística, tal como resulta das respostas dos peritos da Fazenda Pública e do Tribunal aos quesitos 1.º, n.º 2, 9.º. n.º 2, 11.º e 16.º formulados pela Fazenda Pública, pelo que não se prova o facto elencado em T).”


***

III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra os atos de liquidação adicionais de IRC, dos exercícios de 2007, 2008 e 2009.

Ab initio, e em termos de concreta delimitação da lide, importa evidenciar que a Recorrente aparta, expressamente, do âmbito do presente recurso jurisdicional o erro de julgamento atinente às correções aritméticas, balizando, assim, o âmbito do presente recurso ao erro de julgamento no âmbito das correções decorrentes da avaliação indireta. Face ao exposto, o presente recurso cinge-se, naturalmente, às aludidas correções à matéria coletável decorrentes da aplicação dos métodos indiretos, estando, portanto, vedada qualquer pronúncia quanto à sentenciada improcedência das correções aritméticas. No mesmo sentido se ajuíza quanto às preterições de formalidades no âmbito do procedimento de inspeção tributária, e à falta de fundamentação formal-no seu todo- do Relatório de Inspeção Tributária, porquanto não obstante tenham sido julgadas improcedentes, não foram, ora, objeto de qualquer sindicância.

Feito este introito, e tendo presente que em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso, há, então, que enunciar as respetivas questões.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir:

O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, na medida em que:

i. Valorou, erradamente, o Relatório de Inspeção Tributária, porquanto o reputou com força probatória plena, desrespeitando o consignado nos artigos 76.º da LGT e 115.º do CPPT, inquinando, por conseguinte, a fixação da matéria de facto no seu todo;

ii. Desrespeitou o âmbito e alcance do princípio da verdade declarativa ínsito no artigo 75.º da LGT;

iii. Não valorou, por um lado, factualidade constante no Relatório Pericial, cujo elenco identifica e requer o competente aditamento, e por outro lado, consignou como factualidade não provada realidade que deveria estar contemplada como provada;

iv. Erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos, visto que:

a. Ajuizou que se encontravam reunidos os pressupostos para a determinação da matéria coletável de IRC, através do recurso aos métodos indiretos;

b. Interpretou erradamente a questão da quantificação, quer na vertente da densificação e repartição do ónus probatório, na fundamentação do critério, e da concreta demonstração do excesso do quantum, particularmente no domínio da desconsideração dos desperdícios.

Apreciando.

Comecemos, então, por apreciar se o Tribunal a quo valorou, erradamente, o Relatório de Inspeção Tributária, porquanto o reputou com força probatória plena.

Alega a Recorrente que a decisão recorrida relevou, erradamente, o Relatório dos serviços de fiscalização tributária, como sendo um documento autêntico com força probatória plena relativamente a todo o seu conteúdo descritivo, sendo que o mesmo só pode considerar-se como tal na parte em que o mesmo corresponda ao desempenho da atividade material que o agente de autoridade levou a cabo, compreendida na sua competência administrativa de fiscalização e de controlo, em clara violação do consignado nos artigos 76.º, n.º 1 da LGT e 115.º, n.º 2 do CPPT.

Densifica para o efeito que, no caso vertente o julgador atribuiu a todo o conteúdo do Relatório dos serviços de fiscalização tributária a natureza de prova de presunção legal, dando por assentes os factos fixados no probatório, que estão referidos no conteúdo desse relatório, apenas em função da presumida existência e admissibilidade de prova por presunção e não em função de uma apreciação crítica operada dentro do princípio da liberdade de apreciação das provas.

Conclui, assim, que todo o probatório da sentença se encontra inquinado de erro de julgamento, porquanto, como referido, entendeu que o Relatório dos serviços de fiscalização tinha a natureza de documento autêntico e que o mesmo fazia prova plena relativamente a tudo o que dele constava e que gozava de presunção legal da veracidade em relação a todo o seu conteúdo, independentemente de os factos haverem sido diretamente percecionados com base na visão, audição, sensibilidade, apoiados ou não em meios técnicos ou tecnológicos ou de se ter aportado ao conhecimento dos factos apenas com base em ilações formadas sobre factos que antes haviam sido diretamente percecionados.

Dissente a Recorrida, advogando, desde logo, que a decisão recorrida para além de ter feito uma correta apreciação do valor probatório do Relatório de Inspeção Tributária, a prova deve ser concatenada no seu todo, sendo que uma leitura atenta do probatório permite inferir que foi ponderado não só o Relatório de Inspeção Tributária, como a prova testemunhal e a prova pericial, e sem que nenhum erro possa ser apontado.

Vejamos, então, antecipando que a razão está do lado da Recorrida.

Explicitemos, então, as razões pelas quais assim o entendemos.

Preceitua, desde logo, o artigo 76.º, nº1, da LGT, sob a epígrafe de “valor probatório” que: “1 - As informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos, nos termos da lei.”

Mais prescrevendo o normativo 115.º do CPPT relativamente aos meios de prova que:

“1 - São admitidos os meios gerais de prova.

2 - As informações oficiais só têm força probatória quando devidamente fundamentadas, de acordo com critérios objectivos.

3 - O teor das informações oficiais será sempre notificado ao impugnante, logo que juntas.

4 - A genuinidade de qualquer documento deve ser impugnada no prazo de 10 dias após a sua apresentação ou junção ao processo, sendo no mesmo prazo feito o pedido de confronto com o original da certidão ou da cópia com a certidão de que foi extraída.”

Como doutrina o Aresto deste TCAS, prolatado no âmbito do processo nº 862/06, de 09 de julho de 2020:

“O RIT é um documento que, quando devidamente fundamentado e desde que baseado em critérios objectivos, faz fé pública relativamente aos factos que integra (cfr. artigo 76.º, n.º 1, da LGT).

Trata-se de um tipo de documento autêntico (cfr. artigo 363.º, n.º 2, do CC), com força probatória plena, apenas ilidível nos termos da lei (através da arguição da sua falsidade – artigo 372.º, n.º 1, do CC), no que concerne aos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora.”

Ora, tendo presente o quadro normativo supra exposto, nenhuma censura merece a interpretação atinente à força probatória que foi propugnada na decisão recorrida. Note-se que, a Recorrente advoga que o Tribunal a quo interpretou erradamente o valor probatório do Relatório de Inspeção Tributária mas a verdade é que o faz numa perspetiva genérica, convocando todo o probatório sem cuidar de corporizar e destrinçar donde promanam essas asserções de facto e onde estão, especificamente, plasmadas no probatório.

Ademais, de uma leitura atenta do probatório dos autos, e inclusive da motivação da matéria de facto verifica-se que o Tribunal a quo de forma expressa e clara evidencia que “valorou, ainda, a prova testemunhal produzida pela impugnante e pela Fazenda Pública, bem como o relatório produzido pelo colégio de peritos.”

Logo, faz claudicar per se, a sua alegação no sentido de que “todo o probatório da sentença se encontra inquinado de erro de julgamento”. De resto, o supra expendido não teria, de todo, qualquer virtualidade no domínio da impugnação da matéria de facto, porquanto não são admitidas impugnações genéricas, ou seja, não são permitidos, recursos genéricos contra a matéria de facto assente pelo tribunal recorrido: o recurso não pode ser genérico atacando a matéria de facto no seu conjunto sem precisar os pontos concretos, nem pode ser genérico apontando para a prova em geral produzida no processo (1).

De todo o modo, e descendo ao caso vertente, verifica-se que o Tribunal a quo, enunciou, e bem, a factualidade de acordo com a natureza do respetivo meio de probatório, tendo, acertada e idoneamente, fixado a existência de um Relatório de Inspeção Tributária com o teor descrito no ponto 4), tendo depois autonomizado a factualidade que reputou relevante para o caso vertente.

Daqui resulta, portanto, que sendo o Relatório da ação inspetiva um documento autêntico, com força probatória plena, ilidível nos termos da lei, no que concerne às circunstâncias objetivas nele atestadas, com base na perceção direta do seu autor (2), não se vislumbra de que forma existe qualquer erro de julgamento que possa ser assacado ao acervo fático dos autos.

De resto, sublinhe-se que inexiste qualquer expressa evidenciação de quais os factos em concretos que estariam erradamente fixados, não podendo, como visto e ora se reitera convocar o probatório no seu todo, quando ademais, e como já evidenciámos anteriormente, existe uma deficiente avaliação do probatório dos autos.

É certo que, a Recorrente sufraga que o Relatório da Administração Tributária “só pode considerar-se como documento autêntico na parte em que o mesmo corresponda ao desempenho da actividade material que o agente de autoridade levou a cabo, compreendida na sua competência administrativa de fiscalização e de controlo”, mas é igualmente certo que tal é manifestamente insuficiente, porquanto tal alegação é notoriamente abstrata e indefinida, não convocando, como referido, quais os factos que foram considerados nessa perspectiva, de que forma e com extensão.

De relevar a final que, o Relatório de Inspeção Tributária é um meio de prova, competindo, assim, ao Tribunal valorá-lo de acordo com o princípio da livre apreciação da prova e fixar, autónoma e fundamentadamente, a factualidade que repute pertinente para o litígio a dirimir, tal como realizado no caso vertente.

Logo, não lhe assiste qualquer razão neste concreto particular.

In fine, advoga que existiu uma errónea apreciação do princípio da verdade declarativa -e se bem interpretamos a sua pretensão- confluindo num erro de julgamento de facto.

Mas, mais uma vez, sem razão.

Senão vejamos.

Neste âmbito, advoga que é destituído de razão o entendimento sufragado na sentença recorrida, no sentido de à cessação da presunção de verdade das declarações dos contribuintes e dos dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, estabelecida no artigo 75.º, n.º 1 da LGT, se suceder, correlativamente, uma presunção de veracidade das informações oficiais da AT.

Ora, preceitua, justamente, o citado normativo que:

“1 - Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.

2 - A presunção referida no número anterior não se verifica quando:

a) As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”.

Daí resulta que, gozando o contribuinte da presunção de verdade da sua declaração, compete à AT o ónus da prova dos pressupostos legais da sua atuação. O que significa que, in casu, tem o ónus de demonstrar factualidade suscetível de abalar a presunção de veracidade dos rendimentos declarados pela Impugnante, ora Recorrente, só então passando a competir ao mesmo o ónus da prova de que os mesmos correspondem à realidade.

Mas esse foi, justamente, o sentido que foi conferido pela decisão recorrida.

Com efeito, a sentença visada, diz e bem, que “nos termos do artigo 75.º, n.º 1, da LGT, presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal. Por esse motivo, e como resultaria das regras gerais de Direito em matéria de distribuição do ónus probatório, dispõe o legislador no n.º 3 do artigo 74.º da LGT que, em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à AT o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação. Por outras palavras, cabe ao órgão inspectivo alegar e demonstrar a verificação dos requisitos dos artigos 87.º e 88.º da LGT, conforme explanados.”

Logo, não se vislumbra que tenha existido qualquer errónea interpretação do princípio da verdade declarativa, inerente enunciação da prova e transposição para o acervo fático dos autos, em nada se podendo inferir a interpretação que propugna quanto a presunções legais e com o alcance que lhe pretende conferir.

De relevar ainda neste âmbito que carece de qualquer relevo e materialidade o expendido em o), não só face a todo o expendido anteriormente, mas também porque relacionado com o IVA, donde imposto sem qualquer respaldo e nexo com o litígio em contenda.

É certo que, poderá existir erro de julgamento quanto à concreta densificação e interpretação da prova produzida mas tal já radica em erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito no âmbito da concreta legitimação da avaliação indireta, e que se analisará em sede própria.

Prosseguindo, ora, com o erro de julgamento de facto, concatenado com o aditamento de factualidade constante no Relatório Pericial e bem assim com a supressão de um facto não provado tendo por base o mesmo meio probatório.

Ora, se o que está em causa é o Tribunal a quo ter errado o seu julgamento de facto, cumpre ter em conta a tramitação processual atinente à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.

Para o efeito, importa começar por aferir se a Recorrente cumpriu os requisitos consignados no artigo 640.º do CPC.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (3).

No concernente à observância dos requisitos constantes do citado normativo relativamente à prova testemunhal, importa relevar que a indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova.

Sendo que, conforme enuncia o STJ, no seu Acórdão de Uniformização de Jurisprudência proferido no processo nº 8344/17.6T8STB.E1-A.S1, de 17.10.2023:Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.”

Mais importa ter presente que nem todos os factos alegados pelas partes, ainda que provados, carecem de integrar a decisão atinente à matéria de facto, porquanto apenas são de considerar os factos cuja prova (ou não prova) seja relevante face às várias soluções plausíveis de direito. Por outro lado, cumpre distinguir entre factos provados e meios de prova, sendo que uns não se confundem com os outros.

Feitos estes considerandos iniciais, ajuíza-se mediante uma concatenação das alegações de recurso com as competentes conclusões, que foram cumpridos os aludidos requisitos na medida em que são evidenciados os factos cujo aditamento se requer, mediante concreta convocação dos competentes meios probatórios e inerente relevância para a presente lide.

Aqui chegados, assumido o preenchimento dos competentes requisitos legais, há, então, que aferir da sua valia, pertinência e concreto aditamento requerido.

Neste âmbito, advoga a Recorrente o aditamento dos factos que infra se enumeram, convocando como meio probatório o Relatório Pericial, e por reputar que os mesmos revestem relevo para efeitos de demonstração da falta de verificação dos pressupostos da avaliação indireta:
“1. Os peritos nomeados pelas partes no âmbito da perícia efetuada nos presentes autos apuraram que existem alguns depósitos bancários constantes dos respetivos extratos para os quais não existem documentos de suporte na contabilidade – pág. 3 a 6 do Relatório pericial;
2. Os mesmos peritos apuraram que existem débitos em contas bancárias (levantamentos) que não estão refletidos na contabilidade - pág. 6 a 16 do Relatório pericial, não obstante aí constar que o perito nomeado pela impugnante ter alegado que existe prova documental para algumas dessas operações não refletidas na contabilidade;
3. Era prática corrente que muitos dos fluxos financeiros de entrada e saída ocorressem contabilisticamente pela conta #11-Caixa, e não diretamente pelas contas #12- Depósitos à ordem - pág. 17 do Relatório pericial;
4. Pelo registo nº 440, de 30/4/2007 foi debitada a conta #11-Caixa, por € 224.698,33 e creditada a conta #26899-Outras, por € 224.698,33, não havendo cheques na base desse processamento – resposta ao quesito 4º de pág. 19 do Relatório pericial e respostas aos quesitos 1 e 1.1 de pág. 35 e 36 do Relatório pericial;
5. A conta #26899-Outras apresentava, em 31/12/2006, um saldo devedor de € 224.698,33 por crédito da conta #11-Caixa, que até aí tinha esse saldo devedor, conforme registo efetuado e, dezembro de 2006 - resposta ao quesito 4º de pág. 19 do Relatório pericial, (pelo que o registo nº 440, de 30/4/2007, não resulta de anulação de uma operação real, antes constitui a reposição do saldo devedor que a conta #11Caixa tinha em 31/12/2006 imediatamente antes da transferência aludida neste ponto, saldando a conta #26899- Outras);
6. O registo nº 440, de 30/4/2007, não está relacionado com os registos nº 441 e 442 – resposta ao quesito 1º de pág. 35 do Relatório pericial;
7. O registo 441, de 30/4/2007, refere-se a diversos pagamentos, por cheque (€ 36.433,73) e em numerário (€ 95.065,12) ao fornecedor Adriano ……. & ………., Lda. – respostas ao quesito 1.1 de pág. 36 do Relatório pericial;
8. Em face da informação disponível na contabilidade não é possível fazer a segregação dos pagamentos aludidos nos registos nºs 440, 441 e 442, de 30/4/2004, distinguindo aqueles (pagamentos) que foram feitos por meio de cheques daqueles que terão sido feitos efetivamente em numerário - respostas ao quesito 1.2 de pág. 37 e 38 do Relatório pericial;
9. O registo nº 1244, de 31/12/2007 respeita a acertos de saldos de fornecedores, com base em documento interno, entre os registos na contabilidade e no software de gestão - resposta ao quesito 5º de pág. 20 do Relatório pericial, de fls. 846 do processo físico, e quesito 2º de pág. 38 do Relatório pericial;
10. Relativamente ao registo aludido no ponto anterior, apenas é possível conciliar o acerto de €5.549,18 (não sendo possível conciliar a parte restante) - resposta ao quesito 2º de pág. 38 do Relatório pericial;
11. Não é possível efetuar uma correspondência direta e imediata entre o valor dos depósitos apresentados no registo nº 523, de 31/5/2008 e os extratos bancários, apenas sendo possível fazer tal correspondência somando os depósitos constantes no registo nº 513 (M ………..) e nº 514 (C……….), podendo concluir-se que é ajustado o saldo contabilístico com os respetivos extratos bancários de maio de 2008 - resposta ao quesito 6º de pág. 19 e 20 do Relatório pericial e resposta ao quesito 3º de pág. 38 a 40 do Relatório pericial;
12. Os dados disponíveis na contabilidade não permitem justificar, só por si, a origem e destino dos fluxos financeiros referentes ao registo nº 523, de 31/5/2008, embora se possa retirar alguma informação dos extratos bancários - pág. 22 do Relatório pericial, onde também consta que o perito da impugnante exibiu documentos que permitem justificar a origem e destino desses fluxos financeiros;
13. Existem recibos emitidos a clientes correspondentes aos depósitos referidos no registo nº 1116, de 30/11/2008, apesar de algumas incongruências verificadas nos descritivos desses recibos - resposta ao quesito 8º de pág. 22 e 23 do Relatório pericial;
14. O saldo da conta #11-Caixa após o registo nº 1116, de 30/11/2008, é negativo em €57.622,62 - resposta ao quesito 4º de pág. 40 do Relatório pericial.
15. Os dois levantamentos, no total de € 18.200,00, referidos no registo nº 621, de 30/6/2009, destinaram-se a um depósito em numerário efetuado no mesmo dia na conta do M……………..(€ 17.500,00) e a integrar o saldo de Caixa (€ 700,00) - resposta ao quesito 13º de pág. 25 do Relatório pericial e resposta ao quesito 5º de pág. 40 do Relatório pericial;
16. O registo aludido no ponto anterior não reflete a transferência entre contas caucionadas na empresa, sendo antes composto por dois lançamentos a débito da conta #11- Caixa e a crédito da conta #12-Bancos/CA, nos valores de €700,00 e €17.500,00 - resposta ao quesito 5º de pág. 40 do Relatório pericial;
17. O levantamento, no montante de €12.387,20, creditado na conta #11-Bancos/CA e debitado na conta #11-Caixa, corresponde ao somatório de vários débitos do extrato bancário, incluindo 3 cheques destinados a pagamento de salários cujo total soma €1.587,20, não sendo possível saber o destino do montante restante - resposta ao quesito 15º de pág. 26 do Relatório pericial e ao quesito 6º de pág. 41 do Relatório pericial;
18. Salvo o valor das reconciliações efetuadas no registo nº 803, os movimentos de recebimentos podem ser observados quer no extrato de conta corrente da contabilidade e no software de gestão e a natureza do recebimento (dinheiro ou cheque) pode ser observado nos recibos emitidos – resposta ao quesito 17º de pág. 27 do Relatório pericial;
19. Após o registo nº 803, no valor de € 22.667,80, o saldo contabilístico da conta #11- Caixa é de € 129.083,70 - resposta ao quesito 7º pág. 43 do Relatório pericial;
20. Os depósitos e levantamentos contabilizados sob o registo acima referido têm correspondência com os extratos bancários, exceto o registo de € 44,80 que corresponde a um estorno contabilístico sem reflexo no extrato bancário - resposta ao quesito 20º pág. 27 a 30 do Relatório pericial e doc. 19 anexo à p.i.;
21. Através do registo nº 1237 acima referido não é possível comprovar a origem e destino de todos os fluxos financeiros registados, sendo, no entanto, possível confirmar, através do extrato bancário, o tipo de operação que esteve na sua base e, por confronto com outros documentos, como cheques, torna-se possível em alguns casos, conhecer a origem e/ou os destinos desses fluxos – resposta aos quesitos 20º e 21º, a pág. 27 a 30 do Relatório pericial e doc. 19 anexo à p.i., e ainda, resposta ao quesito 9º a págs. 43 a 46 do Relatório pericial;
22. Não foi possível estabelecer uma relação direta entre alguns levantamentos em numerário efetuados na CCAM (no total de € 16.400,00) e os depósitos no B…… incluídos no registo aludido no ponto anterior, apenas tendo sido possível estabelecer tal relação quanto aos levantamos no total de €11.000,00, sendo duvidosa tal relação quanto ao levantamento de € 3.000,00 em 19/12/2007 - resposta ao quesito 9º.1 a pág. 46 e 47 do Relatório pericial;
23. O documento 1237 acima aludido regista na contabilidade, por agrupamento de vários registos detalhados no extrato bancário e sem outro suporte documental anexo a ele - resposta ao quesito 9º.2 a pág. 47 do Relatório pericial;
24. Mesmo com recurso ao documento 20 apresentado pela impugnante e cópia dos cheques, não é possível discriminar os pagamentos efetuados com os levantamentos em numerário no total de € 7.800,00, incluídos no registo 1229 acima aludido - resposta ao quesito 10º, a pág. 47 e 48 do Relatório pericial;
25. O registo nº 120085, de 31/12/2009, no valor de € 13.000,00, refere-se a um débito em caixa e crédito na conta#25-Sócios, não existindo outra prova documental em anexo, designadamente talão de depósito ou cheque, transferência bancária - resposta ao quesito 8º pág. 43 do Relatório
pericial;
26. A impugnante não possui programa de existências em funcionamento e o inventário de stocks era efetuado manualmente - resposta ao quesito 24º, a pág. 33 do Relatório pericial;
27. Não existem diferenças significativas de proveitos totais registados na contabilidade e no sistema de faturação da empresa nos anos de 2007, 2008 e 2009 - resposta aos quesitos 24º e 25º, a pág. 34 do Relatório pericial;
28. Os valores de “vendas” registados na contabilidade da empresa foram os seguintes:
Vendas 2007 2008 2009
Contabilidade: 890.326,01 915.111,98 855.688,47
- resposta ao quesito 26º, a pág. 34 do Relatório pericial;

30. Em alguns períodos dos exercícios de 2007, 2008 e 2009 a conta #11-Caixa apresenta saldos negativos - resposta ao quesito 12º, a pág. 49 do Relatório pericial;
31. Os valores máximos da conta #11-Caixa em cada um dos exercícios foram os seguintes, não sendo possível conferir agora a aderência desses saldos à realidade, o que só poderia ser feito por contagem física efetuada na altura:
Valor
2007 543.211,81
2008 400.018,69
2009 143.593,55
- resposta ao quesito 12º.1, a pág. 50 do Relatório pericial;
32. Os saldos da conta #11-Caixa evidenciados nos balanços finais de 2007 e 2008 foram os seguintes, não sendo possível conferir agora a aderência desses saldos à realidade (até porque não existem mapas de controlo), o que só poderia ser feito por contagem física efetuada na altura:
Valor
31/12/2007 84.814,96
31/12/2008 51.418,99
- resposta ao quesito 13º, a pág. 50 e 51 do Relatório pericial;
33. Em 31/12/2009 havia considerável diferença entre o saldo contabilístico da conta #1205- M…….. B………(€ 850,83) e o saldo da conta bancária (€ 10.054,74) sem que existam elementos justificativos dessa diferença - resposta ao quesito 15º, a pág. 52 do Relatório pericial;
34. Os inventários inicial e final de 2007 estão suportados por listagens identificativas, com os seguintes valores da contabilidade e nas listagens, exceto quanto à verba de €180.000,00, constante da fita-soma agrafada às listas de inventário de 31/12/2007, que não está suportada por listagem de stocks:
Contabilidade Listagem Inventários
31/12/2006 238.370,43 238.370,43
31/12/2007 253.810,47 (*) 253.810,47
(*) – esse valor inclui € 180.000,00 acima aludido, que não está discriminado com listagem de stock - resposta ao quesito 17º, a pág. 53 do Relatório pericial;
35. As diferenças entre os valores de existências reveladas pela comparação entre o programa de gestão de existências e os balanços de cada um dos exercícios em causa são as seguintes:
Diferenças
31/12/2006 0
31/12/2007 180.000,00 (*)
31/12/2008 4.032,07 (**)
31/12/2009 Não há elementos (***)
(*) – conforme explicado no ponto anterior;
(**) – valor a menos nas listagens relativamente ao valor de balanço;
(**) – não foi possível obter demonstrações financeiras que permitam confirmar o valor inscrito no balanço e as listagens não se encontram arquivadas;
- resposta ao quesito 18º, a pág. 53 e 54 do Relatório pericial;
36. A Impugnante adota o sistema de inventário periódico - resposta ao quesito 19º, a pág. 54 e 55 do Relatório pericial;
37. O código de referência do alumínio começado por “00” refere-se ao alumínio em bruto, comprado aos fornecedores, e só residual e excecionalmente são usados códigos de referência de produtos vendidos ou oferecidos começados por “00”, como “00S2011 – Tubo 10020” - resposta ao quesito 23º, a pág. 57 do Relatório pericial;
37. O código de referência do alumínio começado por “00” refere-se ao alumínio em bruto, comprado aos fornecedores, e só residual e excecionalmente são usados códigos de referência de produtos vendidos ou oferecidos começados por “00”, como “00S2011 – Tubo 10020” - resposta ao quesito 23º, a pág. 57 do Relatório pericial;
38. Do sistema de gestão e faturação constam documentos de “saída de produção” referentes aos exercícios de 2007 e 2008, mas essa informação do sistema, relativa aos stocks de matérias-primas e de produtos acabados, não tem completa aderência à realidade por existência de erros na introdução das referências dos materiais - resposta ao quesito 24º, a pág. 58 do Relatório pericial;
39. Nos anos 2007 e 2008 não existem documentos emitidos de “saída de armazém” e em 2009 foi emitido um documento (nº 302, de 31/12/2009) contendo referências de produto começadas por 00, 01, 02 e 03, mas também neste caso o documento visava apenas o acerto interno de stocks entre as referências de matérias-primas e as referências de produtos acabados, com correspondência em documentos de entrada de armazém com referências diferentes - resposta ao quesito 25º, a pág. 58 e 59 do Relatório pericial.

Vejamos, então, cada um de per se.

Relativamente aos pontos 1 e 2 supra evidenciados, os mesmos não revestem a roupagem de um facto, carecendo da devida densificação, sendo que o importa, em concreto, apurar é quais os depósitos devidamente identificados que não se encontram idónea e adequadamente suportados e a particularização, convenientemente substanciada, dos débitos em contas bancárias não refletidos na contabilidade.

Acresce que, a realidade fática que a Recorrente pretende que figure enquanto factualidade assente, já se encontra contemplada no acervo fático dos autos, mormente, nos artigos 22.º e seguintes e sem que tenha existido uma concreta impugnação ao abrigo do citado artigo 640.º do CPC, seja propugnando uma alteração ou mesmo supressão do probatório dos autos.

Face ao exposto, improcede o requerido aditamento.

No que concerne ao ponto 3), o mesmo apresenta, novamente, uma falta de substanciação, sendo que é, igualmente, irrelevante a “prática corrente” tal como é identificada pela Recorrente.

Acresce que a realidade concatenada com os fluxos financeiros de entrada já se encontra refletida em 22) do probatório, tendo, outrossim, de ser interpretada de forma conjugada com a matéria de facto não provada, especificamente, a identificada em C) a F).

De evidenciar e sublinhar, neste e para este efeito, que a Recorrente nada requereu, em particular, quanto ao aludido ponto do probatório, sendo que quanto à factualidade não provada apenas requereu a supressão do facto R).

Adicionalmente, há que sublinhar que o próprio Relatório Pericial na página 17 -a que Recorrente alude- refere de forma expressa que “existem documentos internos que indiciam um esforço de reconciliação dos saldos bancários entre a contabilidade e os saldos evidenciados dos bancos, mas que de todo pela referência documental não é possível reconciliar”. (destaque nosso).

Logo, improcede o requerido aditamento.

Atentemos, ora, nos factos elencados em 4), 5) e 6), cuja análise faremos de forma conjugada.

De relevar, desde já, que os mesmos já se encontram refletidos em G) e H) do probatório enquanto factualidade não provada, e sem que, reitere-se, tenha existido alguma impugnação da matéria de facto e da sua concreta supressão. Logo, o supra expendido faz claudicar, per se, o requerido aditamento.

Ademais, importa ter presente que tal realidade apenas permitiria adensar a existência de irregularidades na contabilidade, donde atestar o expendido quanto à legitimação da avaliação indireta.

Atentemos, ora, no ponto 7, relevando, desde já, que o mesmo só em parte carece de ser densificado, concretamente, na parte respeitante aos cheques.

Com efeito, o registo 441 já se encontra contemplado no probatório, concretamente, no ponto 24), do qual resulta que o montante em numerário ascende a €295.065,12. Note-se que, tal asserção e valor encontra-se em conformidade com o expendido no Relatório Pericial, e em desconformidade, aliás, com o aduzido pela Recorrente (€95.065,12).

É certo que, a aludida alínea não contempla a identificação dos cheques, razão pela qual e atenta a redação expendida anteriormente, e o meio probatório em questão, procede-se ao aditamento de um facto com a redação que infra se descreve, e adoptando a mesma sequência numérica constante no probatório:

44) O registo 441, datado de 30 de abril de 2007, evidenciado no ponto 24) do probatório, engloba pagamentos, por cheque, cujo valor total ascende a € 36.433,73 (facto que se extrai do Relatório pericial a página pág. 36);

Prosseguindo, ora, com o ponto 8, o qual deve ser rejeitado. Por um lado, porque mais não representa que uma conclusão, e por outro lado, porque as asserções de facto que relevam relativamente a esses específicos registos já se encontram contempladam nos pontos 24) e 25) -não impugnados expressamente.

Vejamos, ora, os pontos 9 e 10.

Afirmando, para o efeito, que improcede o supra requerido, desde logo, porque há que atentar o que resulta como não provado na alínea I), sendo que tal asserção não foi impugnada.

Ademais, há que sublinhar e adensar que no Relatório Pericial a páginas 38 é evidenciado como conclusão, donde sem qualquer insusceptibilidade de integrar o probatório enquanto tal, que quanto ao registo 1244, só “foi possível conciliar o acerto de 5.549,18. Não foi possível conciliar os restantes.”

Face ao exposto improcede o aludido aditamento.

Atenhamo-nos, ora, no ponto 11, evidenciando, mais uma vez, que improcede a sua pretensão, desde logo, porque a roupagem do mesmo mais não representa que uma conclusão, sendo, ademais, opinativo, não podendo, como é bom de ver, constar no acervo fático a menção “podendo concluir-se que é ajustado o saldo contabilístico com os respetivos extratos bancários de maio de 2008”.

Além disso, quanto a essas asserções há que ter presente o já contemplado no ponto 26) do probatório e mais uma vez sem qualquer impugnação da matéria de facto, no sentido da sua alteração ou supressão.

De adensar que, à semelhança do já expendido anteriormente, e ora se reitera, a factualidade nela constante apenas permite legitimar a avaliação indireta.

No respeitante ao ponto 12, e na linha do já expendido anteriormente, há que evidenciar que o seu aditamento está, desde logo, votado ao insucesso, porquanto representa, tão-só, uma conclusão totalmente coadunada com o thema decidendum, e sem a menor substanciação espácio-temporal. Note-se que, o que importa é segregar o que se retira, em concreto, e em que moldes e nada disso foi substanciado. Ademais, não se viulsmbra de que forma, em concreto, assumiria relevância para os efeitos pretendidos.

E por assim ser, mais uma vez improcede o aludido aditamento.

No respeitante ao aditamento do ponto 13, dir-se-á que a realidade fática que releva e relacionada com a asserção constante nesse número já se encontra contemplada no ponto 27) do probatório ainda que com roupagem díspar, sendo que as incongruências vêm densificadas nos pontos 28) e 29), improcedendo, por conseguinte, o visado aditamento.

No respeitante ao ponto 14 supra, relacionado com o saldo da conta #11-Caixa, importa, evidenciar que o mesmo não carece de ser individualizado, porquanto não releva com o âmbito e extensão que lhe pretende conferir a Recorrente.

E isto porque, é não controvertido o que resulta contabilisticamente dos saldos da conta caixa, bastando para tanto atentar no respetivo Relatório de Inspeção, sendo que o busílis resulta da concreta interpretação desse saldo e do facto do mesmo ser contranatura.

Aliás, justamente na página do Relatório Pericial invocada pela Recorrente consta que “os saldos negativos de caixa não têm aderência à realidade.”

Face ao exposto, e sem necessidade de quaisquer considerações adicionais improcede o visado aditamento.

No respeitante ao facto 15) respeitante à existência de dois levantamentos, corporizados no registo nº 621, ajuíza-se que o mesmo é, igualmente, de improceder, desde logo, porque a realidade de facto alegada pela Impugnante na sua petição inicial e que releva para a discussão da lide, concretamente, da idoneidade da avaliação indireta, encontra-se vertida na alínea L) da factualidade não provada e sem que tenha sido impugnada e requerido qualquer alteração ou supressão. Ademais, e como resulta da motivação da matéria de facto a asserção nela constante resulta por referência à resposta ao quesito 13.º, e a Recorrente nada sindicou, nesse e para esse efeito.

Quanto ao facto 16), improcede o seu aditamento, porquanto o mesmo, mais uma vez, representa um mero juízo conclusivo, totalmente coadunado com a questão decidenda, sendo que a matéria visada está inteiramente conexionada com o expendido anteriormente, razão pela qual damos eximimo-nos de expender novas considerações.

No concernente ao facto 17), reputa-se, igualmente, de indeferir a pretensão da Recorrente, na linha do que foi expendido quanto ao facto 15), na medida em que a realidade de facto alegada pela Impugnante no seu articulado inicial e com relevo para a presente lide, encontra-se vertida na alínea M) da factualidade não provada e sem que tenha sido impugnada e requerida qualquer alteração ou supressão. De ressalvar, outrossim, que na motivação da matéria de facto a asserção nela constante resulta por referência à resposta ao quesito 15.º, e a Recorrente nada sindicou, nesse e para esse efeito.

Relativamente aos pontos 18), 19), e 20), os mesmos carecem, igualmente, de ser espelhados no probatório, desde logo, por representarem asserções conclusivas (18 e 20), não controvertidas e sem relevo (19). De resto, há, igualmente, que evidenciar que a asserção atinente ao registo 803 e ao registo 1237, já se encontra contemplada no acervo fático dos autos, particularmente, nos pontos 34) e 35).

Os pontos 21) a 24) não têm a roupagem de um facto, consubstanciando, mais uma vez, um juízo conclusivo e opinativo, sendo que, reitere-se, a realidade de facto atinente ao registo 1237 já se encontra contemplada em 35).

Acresce, outrossim, que há ter presente a realidade contemplada em O) da factualidade não provada, e que não, foi de todo, impugnada, e tem a devida asserção no respetivo Relatório Pericial, e sem qualquer sindicância, devidamente individualizada e como legalmente se impõe.

Refira-se, ademais, que as mesmas em nada permitem defender a tese propugnada pela Recorrente, bem pelo contrário, na medida em que tais juízos conclusivos perminem discernir as anomalias da contabilidade e as demais inferências atinentes à avaliação indireta e que apreciaremos em sede própria.

No respeitante ao facto 25, reiteramos a esteira de entendimento que preconizámos quanto aos factos 15) e 17), ajuízando-se, portanto, o seu indeferimento, porquanto a realidade de facto alegada pela Impugnante na sua petição inicial e que releva para a discussão da lide encontra-se vertida na alínea N) da factualidade não provada e sem que tenha sido impugnada e requerida qualquer alteração ou supressão. Ademais, e como resulta da motivação da matéria de facto a asserção nela constante resulta por referência à resposta ao quesito 8.º, e a Recorrente nada sindicou, nesse e para esse efeito.

Atenta a realidade constante no ponto 26), e uma vez que a mesma se infere, efetivamente, do meio probatório evidenciado pela Recorrente, admite-se o seu aditamento, com o teor propugnado e que infra se descreve:

45) A impugnante não possui programa de existências em funcionamento e o inventário de stocks era efetuado manualmente - resposta ao quesito 24º, a pág. 33 do Relatório pericial;

Relativamente aos pontos 27), e 28), para além de os mesmos assumirem uma conclusão que não um facto (facto 27), não aquiescemos relevância para a presente lide, sendo, ademais realidades não controvertidas.

No atinente ao ponto 29), e por o mesmo se afigurar relevante para a presente lide, e assumir conformidade com o meio probatório nele elencado, admite-se o seu aditamento nos moldes peticionados, aditando-se, assim, um facto com a seguinte roupagem:

46. A Impugnante não tem registo contabilístico dos desperdícios resultantes da lacagem de artigos, nem tais desperdícios estão refletidos no inventário de stocks ou em registo extracontabilístico - resposta ao quesito 27º, a pág. 34 e 35 do Relatório pericial;

No respeitante aos pontos 30), 31) e 32) supra, para além da sua roupagem ser eminentemente conclusiva e opinativa, e tal como evidenciámos anteriormente quanto ao facto 14), e que, ora, damos por reproduzido, limitamo-nos a ressaltar que o saldo da conta #11-Caixa, é não controvertido, sendo que tal como referido, o que resulta objectado é a concreta interpretação desse saldo. Reiterando-se, mais uma vez, atenta a sua especial relevância, que os próprios Peritos sublinham nesse concreto particular, que inexiste aderência à realidade dos saldos negativos de caixa.

No concernente ao ponto 33), o mesmo apresenta um juízo conclusivo que não um facto, com considerações não devidamente substanciadas e que inviabilizam a sua corporização no probatório, mormente, de que “havia considerável diferença”. Ademais, sempre se dirá que a asserção final conclusiva nela constante é uma realidade que alterca com o entendimento da Recorrente e vai, como veremos, validar e secundar o entendimento constante na decisão recorrida.

No que diz respeito aos factos cujo aditamento a Recorrente requer ao abrigo dos pontos 34) e 35), entende-se que os mesmos devem ser aditados à matéria de facto, porquanto revestem relevo para a lide e encontram-se em conformidade com o meio probatório elencado, concretamente, Relatório Pericial. Face ao exposto, admite-se o seu aditamento nos moldes requeridos.

Adita-se, assim, a seguinte factualidade:

47) Os inventários inicial e final de 2007 estão suportados por listagens identificativas, com os seguintes valores da contabilidade e nas listagens, exceto quanto à verba de €180.000,00, constante da fita-soma agrafada às listas de inventário de 31/12/2007, que não está suportada por listagem de stocks:
Contabilidade Listagem Inventários
31/12/2006 238.370,43 238.370,43
31/12/2007 253.810,47 (*) 253.810,47
(*) – esse valor inclui € 180.000,00 acima aludido, que não está discriminado com listagem de stock - resposta ao quesito 17º, a pág. 53 do Relatório pericial;

48) As diferenças entre os valores de existências reveladas pela comparação entre o programa de gestão de existências e os balanços de cada um dos exercícios em causa são as seguintes:
Diferenças
31/12/2006 0
31/12/2007 180.000,00 (*)
31/12/2008 4.032,07 (**)
31/12/2009 Não há elementos (***)
(*) – conforme explicado no ponto anterior;
(**) – valor a menos nas listagens relativamente ao valor de balanço;
(**) – não foi possível obter demonstrações financeiras que permitam confirmar o valor inscrito no balanço e as listagens não se encontram arquivadas;
- resposta ao quesito 18º, a pág. 53 e 54 do Relatório pericial;

Relativamente ao facto 36), o mesmo é não controvertido e não reveste relevo para a presente lide.

E no que respeita ao facto 37), não se afigura de relevo para a lide, sendo certo que a realidade coadunada com os aludidos códigos e que se reputou de pertinente para a concreta materialidade dos autos encontra-se refletida em S) da factualidade não provada e sem que, mais uma vez, tenha existido qualquer impugnação no sentido da sua alteração ou supressão.

Relativamente ao facto 38), indefere-se o seu aditamento, porquanto a sua redação é eminentemente conclusiva e inteiramente coadunada com o thema decidendum, na medida em que aferir e concluir se a informação do sistema relativa aos stocks de matérias primas e de produtos acabados tem ou não aderência à realidade e se a mesma permite legitimar enquanto facto indiciante a determinação da matéria coletável pela avaliação indireta, é a questão que importa dilucidar, não podendo, naturalmente, configurar como facto.

Por último, quanto ao facto elencado em 39), o mesmo-entenda-se na parte que releva- já se encontra contemplado no probatório, concretamente, no ponto 14) do probatório. Ademais, a última parte mais não representa que uma conclusão.

Improcede, assim, o seu aditamento.

Uma nota final em termos de aditamento por complementação quanto à menção nas alegações de recurso da Recorrente de que “no mínimo, impõe-se dar como não provada essa impossibilidade”, no sentido de a mesma em nada poder consubstanciar um expresso aditamento ao probatório, porque a realidade de facto que pretende, alegadamente, aditar mais não representa que uma conclusão atinente, justamente, à questão em contenda, ou seja, da concreta impossibilidade de determinação da matéria coletável pela avaliação direta, donde legitimidade ou não para efeitos de determinação da matéria coletável pela avaliação indireta.

Com efeito, no probatório o que tem de constar são as ocorrências da vida real devidamente substanciadas espácio-temporalmente, para que depois o julgador ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova, aprecie se estão ou não reunidos os requisitos para a adopção dos métodos indiretos, e não a concreta conclusão que daí resulte.

Subisiste, ora, por analisar a supressão do facto R) constante na factualidade não provada.

Aduz a Recorrente que o facto em causa deve ser dado como provado na seguinte dimensão: “do processo de lacagem resultam desperdícios, cuja percentagem não se logrou apurar”.

De relevar, desde já, que a Recorrente não substancia, em rigor, qual a justificação pela qual deve ser suprimida a factualidade não provada, não apartando a motivação que foi avançada na decisão recorrida para sustentar essa asserção, nem tão-pouco, o meio probatório que permitia a assunção fática da realidade que reputa como assente.

De todo o modo, sempre se dirá que nenhuma censura merece a opção constante na decisão recorrida, no sentido de consideração da aludida factualidade como não provada. Aliás, essa é, justamente, a adequada técnica jurídica a ser encetada porquanto a factualidade é fixada de acordo com a realidade alegada pelas partes e de acordo com o respetivo ónus da prova.

Ora, in casu, não há dúvida que a Recorrente alegou na sua petição inicial, em concreto nos artigos 248.º e seguintes o que consta como factualidade não provada e cuja demonstração não logrou fazer, seja mediante a insuficiência da prova testemunhal, seja mediante a concreta ausência de prova documental que permita atestar a existência de desperdícios na alvitrada percentagem.

Note-se, ademais, que se aditou um facto, decorrente da concreta impugnação da matéria de facto, que assevera que a Impugnante não tem registo contabilístico dos desperdícios resultantes da lacagem de artigos, nem tais desperdícios estão refletidos no inventário de stocks ou em registo extracontabilístico.

Logo, nenhuma censura merece a factualidade não provada evidenciada em R), na medida em que dos autos não resultou minimamente demonstrado, donde, provado que do processo de lacagem resultam desperdícios entre 5% e 10%.

Há, outrossim, que adensar -e conforme daremos nota em sede de apreciação do erro de julgamento quanto ao quantum- que a Impugnante, ora, Recorrente tem de realizar uma prova fidedigna e que ateste um excesso, devidamente identificado, na quantificação da matéria colectável exigindo, portanto, a alegação e prova de factos concretos que deponham no sentido de que o método escolhido pela AT não se mostra adequado à tarefa que se propõe, e determine um resultado totalmente desfasado da realidade vertente.

Com efeito, cabe ao Impugnante, o ónus de demonstrar o excesso de quantificação, não bastando suscitar dúvidas quanto ao resultado obtido, antes impondo-se que demonstre a inadequação ou errada aplicação dos critérios de quantificação utilizados, donde a falta de consideração inequívoca de excesso realidade que, como é bom de ver, não se compadeceria, de todo e in limite, com a supressão e ulterior aditamento da matéria de facto preconizado pela Recorrente.

Aqui chegados, estabilizada a respetiva matéria de facto, há, então, que aquilatar do erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

A Recorrente alega, desde logo, que existe erro de julgamento, porquanto inversamente ao ajuizado pelo Tribunal a quo tendo em conta os factos provados, não se verifica a situação da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria tributária, ao contrário do que arrazoou a AT.

Densifica, para o efeito, que o erro da AT da não valoração dos factos a que se reporta o probatório pericial determina a insusceptibilidade de dar-se como provada a situação de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável dos impostos liquidados.

Conclui que, não obstante se reconheça que a contabilidade da Recorrente padeça de alguns erros formais, certo é que a AT poderia, ainda assim, alcançar a certeza sobre a expressão exacta dos factos tributários e a sua quantificação, sendo que, no limite, impunha-se dar como não provada essa impossibilidade e, tendo em conta que o ónus de prova da dúvida relativamente a essa matéria se resolve contra a AT, devem, decorrentemente, ser anuladas as liquidações efectuadas com recurso à avaliação indirecta.

Dissente a AT, propugnando pela manutenção da decisão recorrida, porquanto estabeleceu o devido enquadramento normativo com acertada transposição para o caso vertente.

Advoga, nesse âmbito, que inversamente ao sustentado pela Recorrente as realidades de facto que resultaram provadas, mormente, as decorrentes do Relatório Pericial permitem, justamente, secundar o entendimento vertido na decisão recorrida, estando, assim, perfeitamente legitimada a adopção dos métodos indiretos.

Vejamos, então.

O Tribunal a quo após estabelecer o devido enquadramento normativo, elencar os pressupostos que legitimam o recurso aos métodos indiretos dilucidou, como se transcreve:

“Quanto ao facto-indício (1) [ao nível dos fluxos financeiros de entrada e saída da empresa, existem movimentos cuja origem e destino não é comprovável, indiciando a existência de factos não declarados] (…) é o próprio raciocínio da impugnante que denota que parte de um pressuposto erróneo. Refere a impugnante que os lançamentos contabilísticos na conta caixa e depósitos à ordem nos exercícios inspeccionados, tinham todos base em documentos internos que demonstram a origem e o destino dos recursos financeiros. Sucede, porém, que estes ditos documentos internos não só não cumprem as normas de normalização contabilística, como não conferem qualquer credibilidade às operações.”

Adensa, depois, que “o que ressalta quer do procedimento de revisão quer da produção de prova pericial nesta sede, é que alguns documentos até existiam e a ora impugnante até consegue justificar essas operações, mas esses documentos foram juntos a posteriori, não constavam da contabilidade, o que é quanto basta para asseverar que o facto-indício se verifica e parte de um pressuposto de facto e de direito correcto. “

Sublinhando, adicionalmente, que “não obstante, diga-se, desde já, que a impugnante também não conseguiu demonstrar, nem sequer nesta sede, os fluxos financeiros inerentes aos registos 440 [item G) da matéria de facto não provada], 1244 [item I) da matéria de facto não provada], 120085 [item N) da matéria de facto não provada] uma fatia considerável do registo 1229 [item P) da matéria de facto não provada], parte do registo 525 [item K) da matéria de facto não provada], 621 [item L) da matéria de facto não provada], parte do registo 627 [item M) da matéria de facto], o que legitima a manutenção daquele facto-indício.”

Propugna, igualmente, que “quanto aos factos-indícios (2) [os saldos de caixa apresentam saldos elevados, indiciando entradas superiores às que foram geradas pelas operações declaradas] e (3) [ao nível dos bancos o sistema de controlo é completamente deficiente existindo acertos anuais por conta de caixa para haver similitude com os saldos bancários], a impugnante nada alega com grande especificidade, com excepção de que o método de registo contabilístico passava por registo de todos os movimentos de disponibilidades por Caixa, quando o podia fazer directamente por Bancos, saldando-se depois o Caixa, por Fornecedores, Bancos, por movimentações dos valores. Admitindo-se que assim seja, só demonstra o facto-indício (3): o sistema de controlo dos registos na conta “bancos” é deficiente existindo acertos anuais, ou seja, a contabilidade não revelava a realidade dos fluxos financeiros. E essa discrepância da realidade poderia não ser apenas ao nível do simples registo contabilístico, como ao nível dos valores dos fluxos registados. A verdade é que não sendo os registos contabilísticos rigorosos, é impossível discernir se correspondem à realidade dos fluxos financeiros ou não, pelo que é um facto-indício suficientemente grave para, só por si, justificar a elisão de veracidade da contabilidade da impugnante.”

Quanto ao facto indiciário da inventariação realizada ao nível das existências finais apresentar incoerências, divergências, acréscimos de valores por estimativa e a constatação da existência de documentos de saída de produção e armazém, que não deram origem a factura ou venda a dinheiro, secunda a decisão recorrida advogando como segue: “[r]esulta da matéria de facto provada que as premissas do órgão inspectivo se provaram: existem, efectivamente, discrepâncias nas existências contabilizadas, para as quais a impugnante também não avança uma justificação plausível. Afirmar que as saídas de armazém de produto em bruto com o código 00 serviam para acertar existências não justifica por que motivo nos inventários de 2007 existe uma fatia de Eur. 180.000,00 (valor não despiciendo) sem qualquer suporte documental, ou porque em 2008 o valor contabilizado de existências não corresponde ao valor do software de controlo de stock, nem por que motivo as existências de 2009 não têm qualquer suporte documental de inventariação, divergindo, ainda, dos valores fornecidos pelo software.”

No respeitante ao indício atinente ao programa de facturação “[o] qual permitia imprimir com o mesmo número, facturas para mais que um cliente, facto que a impugnante não infirma, a única justificação avançada é de que é um problema do programa informático que os programadores deviam ter acautelado. Ora, o problema colocado com aquela constatação facto não é a possibilidade de o sistema de facturação permitir alterar documentos em si mesmo, mas sim que essa alteração tenha efectivamente ocorrido. Isoladamente, a possibilidade de o programa permitir fazê-lo não é o suficiente para fazer cessar a presunção de veracidade da contabilidade da ora impugnante. O que faz cessar essa presunção é que efectivamente a impugnante o tenha feito. Note-se que, como resulta do RIT, não se trata de mera correcção à identificação do cliente, mas também aos produtos facturados. “

No concernente aos indícios concernentes às margens de comercialização globais que resultam da contabilidade serem manifestamente inferiores às detectadas na análise da rentabilidade dos produtos, e de ter sido feita uma comparação com os principais rácios do sector de actividade em que a empresa se insere ao nível das margens de comercialização, tempo médio de existências e rentabilidade fiscal, apresentando desvios significativos em todos eles, é avançado na decisão recorrida a seguinte fundamentação jurídica:

“[a] impugnante não apresenta uma justificação nesta sede para os desvios apurados que, em rigor, também não põe em causa. Note-se que o ponto de partida dos serviços de inspecção foram os dados internos da sociedade. É pouco credível que uma discrepância de 10 pontos percentuais nos três exercícios venha de uma desactualização dos dados do software por impossibilidade organizativa. Compreende-se se ocorrer pontualmente, mas não em três anos seguidos.

Atenta a divergência não despicienda de 10 pontos percentuais (que não são um indício isolado, são mais um indício numa lista já longa de fortes indícios de uma contabilidade que não exprime a realidade empresarial da sociedade), o órgão inspectivo testou vários rácios pela média nacional (…) a média inclui não só sociedades com um volume de vendas superior ao seu, como sociedades com um volume inferior ao seu, além de uma média (aritmética) é, por definição, um quociente, ou seja, é um valor relativo. Testar a sua realidade pela média do sector onde se insere não visa apurar se corresponde exactamente àquele quociente, mas se existe um desfasamento significativo. E esse desfasamento foi apurado face aos valores registados na contabilidade, e não relativamente aos valores do software de rentabilidade, contabilidade, essa, que serve como base para, por exemplo, cálculo dos impostos a pagar. É uma coincidência que não pode deixar de ter relevo, em particular lida em conjunto com os demais factos-indícios.

Além disso, outros dos rácios apurados e com divergência face à média nacional é a de duração dos stocks, mostrando-se que a duração média das existências da ora impugnante era superior à média nacional, quando também se apurou que as existências eram apuradas de forma um tanto anárquica à margem de suporte documental preciso e credível. A justificação de que os valores dos produtos não se encontram actualizados não justifica nem as outras nem esta discrepância. Por fim diz a impugnante que o órgão inspectivo não identifica que dados foram omitidos. Pois bem, se o órgão inspectivo soubesse que dados foram exactamente omitidos faria uma correcção aritmética e não uma correcção por métodos indirectos.”

Por fim, e no atinente ao último indício de que nos exercícios inspeccionados de 2007 e 2008, a empresa evidencia uma capacidade de gerar recursos para fazer face a encargos com bens não essenciais ao processo produtivo e realizar investimentos não condizentes com os resultados da actividade declarados, sustenta a decisão recorrida que:

“Objectivamente, os gastos em apreço são desajustados à estrutura empresarial. Os gastos de 2007 correspondem a quase metade dos valores positivos daquele ano, é certo, mas comportam o gasto, pelo que se nos afigura que o dispêndio de patrocínios não pode ser um indício de uma capacidade económica superior à declarada.

Já não podemos dizer o mesmo relativamente à aquisição do veículo. Apesar do valor do veículo (que não é despiciendo, ao contrário do que a impugnante pretende convencer) ser elevado, o gasto efectivamente incorrido foi de Eur. 8.000. Mas incorreu nesses Eur. 8.000 num exercício em que apresenta resultados negativos – antes da contabilização de tal gasto, note-se!, uma vez que previdentemente só foi registado na contabilidade já em 2009 – de mais de Eur. 11.000. Se a sociedade teve um resultado negativo superior ao valor despendido e não correu a crédito para liquidar aqueles Eur. 8.000, qual é a origem das quantias despendidas?”

Vejamos, então, se a decisão recorrida merece a censura que lhe é endereçada.

Para o efeito, há, desde logo, que atentar no respetivo regime normativo, aquilatar do respetivo ónus probatório, e sua concreta repartição, e em que situações é legítimo lançar mão dos métodos indiretos de fixação da matéria tributável, estabelecendo depois a competente transposição para o caso sub judice.

Atentemos, então.

O recurso aos métodos indiretos só deve ser utilizado quando configure a única solução para se chegar à identificação do valor da matéria tributável efetiva. Assume, portanto, a natureza subsidiária e residual (cfr. artigo 85.º, n.º 1, da LGT). Uma “ultima ratio fisci”, para que a AT possa cumprir o poder/dever que lhe está cometido de diligenciar no sentido de que todos os contribuintes paguem os impostos devidos.

“É, de facto, doutrinária e jurisprudencialmente líquido que a AT apenas estará legitimada a recorrer a presunções, na tarefa de encontrar a matéria tributável do contribuinte, -ainda que, por natureza e norma, meramente aproximativa da efectiva, quando este tenha rompido com o seu dever de colaboração para com aquela na medida em que, por um lado, a declarada, nos termos do princípio vigente neste domínio, não mereça credibilidade, por se indiciar fundadamente, que não tem aderência à realidade e, por outro, porque não haja metodologia alternativa que permita a sua fixação directa e exacta (correcções técnicas), sendo, ao caso e atento o imposto liquidado, relevante o preceituado nos art.ºs 82.º, 83.º e 84.º do CIVA e no art.º 81.º, do CIRS” (4).

Neste particular, importa, desde logo, ter presente o consignado no artigo 81.º da LGT, o qual preceitua que:

“1 - A matéria tributável é avaliada ou calculada diretamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indireta nos casos e condições expressamente previstos na lei”.

Preceituando, por seu turno, o normativo 83.º da LGT, sobre os fins da avaliação direta e bem assim indireta, no sentido que:

“1 - A avaliação direta visa a determinação do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação.

2 - A avaliação indireta visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha”.

Daí que, a determinação da avaliação direta, tenha como ponto de partida as declarações dos contribuintes e/ou os dados apurados na sua contabilidade, os quais se presumem verdadeiros.

Preceituando, neste âmbito, o já citado artigo 75.º, nº1, da LGT, de que se presumem verdadeiras as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei. Como já demos nota anteriormente e ora se reitera, o princípio da verdade declarativa coloca, assim, na esfera de atuação dos contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos, logo a AT está vinculada a liquidar os tributos com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, a posteriori, ao controlo dos factos declarados.

Com efeito, só passa a competir ao contribuinte a prova de que declarou todos as situações a que estava legalmente vinculado quando, efetivamente, a AT tenha carreado elementos de facto que sejam suscetíveis de abalar a dita presunção da escrita. Nessa medida, se por qualquer das razões previstas na lei, a presunção consagrada no citado normativo 75.º, n.º 1 da LGT deixar de funcionar, a AT fica legitimada a efetuar a determinação da matéria tributável, preferencialmente com recurso aos métodos diretos ou, quando tal não seja, de todo, possível, a métodos indiretos.

Note-se que, como decorre do citado normativo, concretamente, do seu nº2, a presunção de veracidade da contabilidade cessa quando revelar “[o]missões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”.

Daí que, tenha existido a preocupação legal de se objetivarem as situações em que a matéria coletável pode ser fixada através de métodos indiretos, consagração legislativa taxativa, na medida em que não é qualquer omissão, erro ou inexatidão das declarações ou da contabilidade do sujeito passivo que permite o recurso a métodos indiretos de avaliação da matéria coletável, sendo exigido que tais irregularidades sejam de tal forma relevantes que tornem inviável a quantificação direta.

O mesmo é dizer que, se não obstante a existência de irregularidades contabilísticas, for, ainda assim, possível quantificar diretamente a matéria coletável, deve-se lançar mão dos métodos diretos, desde que os mesmos permitam, com segurança, concluir no sentido da ocorrência do facto tributário e da sua quantificação concreta.

No tocante à concreta enumeração, como visto, taxativa, há que chamar à colação o plasmado nos normativos 87.º e 88.º da LGT.

Preceituando, para o efeito, o citado artigo 87.º, n.º 1, da LGT:

“1 - A avaliação indireta só pode efetuar-se em caso de:

a) Regime simplificado de tributação, nos casos e condições previstos na lei;

b) Impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável de qualquer imposto;

c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar, sem razão justificada, mais de 30% para menos ou, durante três anos seguidos, mais de 15% para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores objetivos da atividade de base técnico-científica referidos na presente lei.

d) Os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artigo 89.º-A;

e) Os sujeitos passivos apresentarem, sem razão justificada, resultados tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante três anos consecutivos, salvo nos casos de início de actividade, em que a contagem deste prazo se faz do termo do terceiro ano, ou em três anos durante um período de cinco.

f) Existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património ou o consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.”

Esclarecendo, por seu turno, o artigo 88.º da LGT, no atinente à impossibilidade de determinação direta e exata da matéria tributável que:

“A impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indiretos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorreções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:

a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;

b) Recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;

c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com o propósito de simulação da realidade perante a administração tributária e erros e inexatidões na contabilidade das operações não supridos no prazo legal.

d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada”.

Importando, ainda, ter presente que no domínio da errónea quantificação compete ao sujeito passivo provar -após demonstração por parte da AT que se mostram adequadamente fundamentados os pressupostos e critérios adotados para o recurso à avaliação indireta- que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade.

Sendo certo que, não se pode perder de vista que a avaliação indireta representa, em bom rigor, uma aproximação da realidade tributária, donde a provável falibilidade, e inverosimilhança da quantificação é resultado da inevitabilidade em acionar o método indireto ou presuntivo, derradeira possibilidade de repor a legalidade e apurar uma determinante e insubstituível matéria tributável que, apenas por motivos, deficiências, imputáveis ao sujeito passivo, não pode estabelecer-se com recurso à via direta e normal, ou seja, mediante os seus elementos de contabilidade (5).

Como doutrinado, no Acórdão do STA, proferido no processo nº 0537/11, datado de 21 de setembro de 2011:

“I - Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à AF o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.°, n.° 3 da LGT).

II - Não logrando o contribuinte provar a existência de tal excesso, nem se afigurando evidente para o Tribunal que o alegado excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou que seja manifesto, notório ou ostensivo, é de manter o “quantum” tributável fixado pela AF, desde que devidamente fundamentado.”

Aqui chegados, e uma vez que, como já densificado anteriormente, compete à AT demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiretos e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação, importa, então, atentar no preenchimento do respetivo ónus probatório, aquilatando, para o efeito, se bem decidiu a sentença quando julgou que a AT estava legitimada a proceder à determinação da matéria coletável por via presuntiva.

Vejamos, então.

De relevar, ab initio, que inversamente ao aduzido pela Recorrente a factualidade provada em nada permite sufragar a tese que propugna, sendo que, conforme fomos antecipando na impugnação da matéria de facto, toda a realidade atinente ao Relatório Pericial permite, justamente, suportar a tese oposta.

Mais importa evidenciar que, face ao enquadramento normativo supra expendido e inversamente ao sustentado pela Recorrente, inexistiu qualquer errónea enunciação, ponderação e transposição do ónus probatório nas respetivas esferas jurídicas.

Expliquemos, então, por que razão entendemos que se encontram, efetivamente, reunidos os pressupostos para a avaliação da matéria coletável por via dos métodos indiretos.

Preliminarmente há que evidenciar que não assiste razão à Recorrente quando sufraga que não foram ponderados todos os pressupostos que legitimaram a determinação da matéria coletável por recurso a métodos indiretos, na medida em que o Tribunal a quo elencou os mesmos secundando o entendimento vertido no Relatório de Inspeção Tributária, justificando, de forma casuística, quais as razões de facto e de direito que permitiam legitimar o recurso à avaliação indireta.

No caso vertente, conforme resulta expressamente do Relatório de Inspeção Tributária a fundamentação legal para o recurso à avaliação indireta assenta no disposto nos artigos 52.º do CIRC, 87.º, nº1, alínea b), e 88.º, alíneas a), e d) ambos da LGT.

Entendeu, pois, a AT que se estava perante a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável do imposto, resultante da “Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais” e também da “Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada.”

Evidenciou, para o efeito, o aludido Relatório como circunstâncias fáticas impeditivas de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis ao correto apuramento e quantum direto e exato, as que infra se descrevem, e que estão em inteira conformidade com o elencado na decisão recorrida:

i. No âmbito dos fluxos financeiros de entrada e saída da empresa, existem movimentos cuja origem e destino não é comprovável, indiciando a existência de factos não declarados;

ii. Os saldos de caixa apresentam saldos elevados, indiciando entradas superiores às que foram geradas pelas operações declaradas;

iii. Ao nível dos bancos o sistema de controlo é completamente deficiente existindo acertos anuais por conta de caixa para haver similitude com os saldos bancários;

iv. A inventariação realizada ao nível das existências finais apresenta incoerências, divergências, acréscimos de valores por estimativa;

v. Existência de documentos de saída de produção e armazém, que não deram origem a fatura ou venda a dinheiro;

vi. O programa de facturação permitia imprimir com o mesmo número, facturas para mais que um cliente;

vii. As margens de comercialização globais que resultam da contabilidade são manifestamente inferiores às detectadas na análise da rentabilidade dos produtos;

viii. Mediante comparação dos principais rácios do sector de actividade em que a empresa se insere ao nível das margens de comercialização, tempo médio de existências e rentabilidade fiscal, existem desvios significativos em todos eles;

ix. A empresa evidencia uma capacidade de gerar recursos para fazer face a encargos com bens não essenciais ao processo produtivo e realizar investimentos não condizentes com os resultados da actividade declarados.

Face aos indícios supra expendidos, conclui que a contabilidade apresenta anomalias e irregularidades, não reunindo as condições legais para servir de instrumento à quantificação da matéria tributável em sede de IRC, gerada pela actividade empresarial, traduzindo, nessa medida, a impossibilidade da sua comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria coletável, legitimando, assim, a determinação da matéria coletável mediante a avaliação indireta.

E assim também o entendemos. Vejamos, então, mediante análise casuística dos mesmos.

Iniciemos pelos três primeiros indícios supra expendidos, e cuja análise faremos de forma conjunta.

No Relatório de Inspeção Tributária a justificação dos aludídios indícios é segregada, designadamente, mediante alusão a diversos registos e lançamentos que são especificamente individualizados e que permitem concluir pela existência de :

Þ Lançamentos com base em documentos internos que contêm descrições genéricas de depósitos/levantamentos de cheques, sem especificação e documentação da natureza dos fluxos (discriminação dos cheques, numerário, dos talões de depósito)

Þ Falta de documentação de suporte que permita a identificação da respectiva origem e destino do fluxo.

Þ Não correspondência dos movimentos com os extractos bancários.

Þ Pagamentos e recebimentos por caixa bem como movimentos com accionistas (em 2009) sem o respectivo movimento bancário de suporte, em desrespeito pela norma fiscal prevista no artigo 63°-C da LGT.

Þ A empresa não realiza reconciliações bancárias.

Þ São feitos lançamentos de regularização de saldos por forma a que as contas tenham correspondência nos extractos bancários.

E a verdade é que, para além da Recorrente nada ter alegado, de forma devidamente individualizada, nas presentes alegações de recurso que permita apartar as asserções supra expendidas, o probatório sustenta, justamente, a existência de fluxos financeiros sem comprovação da origem e do destino, a existência de saldos de caixa sem aderência à realidade, na medida em que indiciam, efetivamente, entradas superiores às que foram geradas pelas operações declaradas, constatando-se, outrossim, um controlo deficitário, com falhas significativas e com acertos anuais tendentes a harmonizar os saldos contabilísticos com os saldos bancários.

Neste âmbito, veja-se, desde logo, que do recorte probatório dos autos resulta demonstrada a factualidade indiciante supra evidenciada, conforme resulta, expressamente, das asserções constantes em 10) a 13), e da concreta enumeração atinente a registos específicos respeitantes aos movimentos de disponibilidades por Caixa e bem assim de depósitos, elencados, especificamente, nos pontos 23) a 26) e 27) a 33).

Acresce que a matéria de facto não provada e, como visto, não impugnada permite alicerçar o supra expendido, conforme se atesta, designadamente, do contemplado em C) a H) e ulteriores densificações enquanto registos perfeitamente identificados por reporte ao respetivo Relatório de Inspeção Tributária, mormente, os elencados em K) a P).

Reitere-se, in fine, o já aduzido em sede de impugnação da matéria de facto quanto à existência de saldos de caixa devedores, nas quais os Peritos são, efetivamente, perentórios em afirmar que “os saldos negativos de caixa não têm aderência à realidade.”

Face ao exposto, não se vislumbra que a prova carreada aos autos permita secundar a posição da Recorrente no sentido da falta de demonstração dos pressupostos para avaliação indireta.

Prosseguindo, ora, quanto às divergências na inventariação ao nível das existências finais, as quais apresentam incoerências, divergências, acréscimos de valores por estimativa.

Neste âmbito, é expressamente densificado no Relatório de Inspeção Tributária que mediante análise das listagens fornecidas pelo sujeito passivo, ora Recorrente, o total das existências que consta do sistema informático é manifestamente diferente dos valores quantificados pela empresa.

Materializando, de forma sintetizada, que:

“Após os testes de validação a esta área das existências conclui-se pelo seguinte:
1 - No exercício de 2006 (existência inicial de 2007) e 2007, o sujeito passivo sem qualquer suporte documental, incrementa ao valor das existências fornecido por listagens extraídas do software de gestão, parte de inventários/existências, os montantes de € 59.208,90 em 2006 e € 180.000,00 em 2007.
2 - Já no exercício de 2008, o valor das existências é o que resulta do somatório de diferentes folhas de famílias de produtos impressas de inventário do software de gestão.
3 - Analisadas as listagens de inventários do software de gestão em 22-03-2011, detecta-se que os valores por elas evidenciados diferem completamente dos valores escriturados
4 - No exercício de 2009, o critério de quantificação foi diferente. As existências surgem referenciadas em folhas Excel impressas, por família de produto, sendo que o somatório dessas verbas totaliza € 150.174,4 e não € 149.550,00 como foi declarado. A listagem informática do software de gestão das existências a 31-12-2009, apresenta o valor de € 18.923,18.”

E mais uma vez, não se vislumbra o aduzido erro na análise e interpretação do aduzido indício sendo que o probatório, particularmente, o plasmado em 13), permite inferir no sentido propugnado pela AT e, como visto secundado e bem, na decisão recorrida. Acresce que resultou, igualmente, atestado, e ora aditado à matéria de facto que, a impugnante não possui programa de existências em funcionamento e o inventário de stocks era efetuado manualmente.

A isso não obstando, a factualidade, ora, aditada que traduz a segregação das diferenças entre os stocks dos inventários iniciais e finais, porquanto é ponto assente que as divergências e incoerências existem, estão densificadas, e describilizam, de forma evidente, os resultados apurados. Conforme aduzido pela AT no seu Relatório de Inspeção Tributária “esta componente influencia o apuramento do CEVC e por essa via do resultado do exercício, a sua manipulação origina a ocultação de transacções não declaradas.”

In fine, há, igualmente que ter presente a factualidade não provada, mormente, a indicada em Q) e S).

Estão, assim, devidamente atestadas as divergências, incoerências, inexactidões, modificação de forma de inventariação, valores por estimativa, as quais permitem, mediante interpretação conjugada com os demais indícios, alicerçar a convicção de que se encontra impossibilitada a necessária comprovação, verificação e validação das existências finais contabilizadas em cada um dos exercícios, e nessa medida, apurar, de forma direta, o resultado do exercício declarado em cada ano, porquanto, influenciado por valores que indiciam terem sido objecto de manipulação, e sem que seja possível fazer o discernimento quantitativo e individualizado.

Prosseguindo, ora, com a existência de documentos de saída de produção e armazém, que não deram origem a fatura ou venda a dinheiro, e bem assim com o facto de o programa de facturação permitir imprimir com o mesmo número, facturas para mais do que um cliente.

A concreta materialização das conclusões supra evidenciadas, é atestada no respetivo Relatório da seguinte forma:

Þ Foram detectados inúmeros documentos com a respectiva numeração e data, emitidos em nome de consumidor final, identificados não como factura ou venda a dinheiro mas como saída de produção (exercício de 2007 e 2008) e saídas de armazém (exercício de 2009).
Þ A justificação apresentada pelos representantes da sociedade de que estas saídas eram para acerto de existências, não responde a um conjunto de questões que legitimamente se colocam e ficam em aberto:
o Porque razão em 2007, esses documentos eram emitidos com uma frequência quase diária? Existindo esses acertos, porque motivo no final do ano a listagem de inventário dada pelo sistema informático não é utilizada como inventário de existências?
o Porque razão em 2008, os documentos emitidos a 31-12-2008, têm numeração diversa e existem vários documentos a darem saída do mesmo produto?
o Porque razão estes documentos de saída de armazém e produção reúnem as condições para serem usadas como documento de transporte?

E o certo é que o probatório reflete essa asserção conforme resulta dos pontos 13) e 14) não impugnados. Ademais, a factualidade não provada analisada no seu todo inferir no sentido propugnado, mormente, as evidenciadas em Q) e R), as quais permitem inferir no sentido secundado na decisão recorrida.

Sendo, igualmente, de evidenciar e adensar que a Recorrente nada apartou -em concreto- quanto a esse indício, limitando-se a asserções absolutamente genéricas, não conseguindo, ademais, dar uma justificação plausível para as questões que são aventadas pela AT e supra elencadas.

Mas, no mesmo sentido, teremos de inferir quanto ao facto de o programa de facturação permitir imprimir com o mesmo número faturas para mais do que um cliente, sendo que tal asserção se encontra contemplada no probatório especificamente em 15), existindo, igualmente, situações perfeitamente individualizadas no respetivo Relatório de Inspeção Tributária nesse e para esse efeito.

Acresce que, tal como a decisão recorrida evidenciou os indícios não podem ser analisados de forma atomística, mas sim conjugada, ajuizando-se, assim, que os aludidos indícios permitem corroborar e legitimar a avaliação indireta.

Prosseguindo.

Analisemos, ora, a questão das margens de comercialização globais, das quais resulta que as declaradas na contabilidade são manifestamente inferiores às que promanam da análise da rentabilidade dos produtos.

Neste âmbito, é corporizado no respetivo Relatório de Inspeção que:

Þ Através do sistema de software de gestão da empresa, foi obtida uma listagem com a designação de “Análise de Rentabilidade de Produtos” dos exercícios de 2007/2008 e 2009. Esta listagem desagrega as quantidades facturadas por tipo de produto, identificando o valor da venda e o valor do custo, considerando este o que consta da ficha de produto.
Þ Feito o tratamento dessa informação foi obtida uma margem média de comercialização (Venda-Custo Venda/Venda) de 38,97%, 37,42%, e 27, 49%, relativamente aos exercícios de 2007, 2008 e 2009.
Þ Se esta margem for comparada com a que resulta da contabilidade, considerando desta apenas o valor do custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas a qual inclui apenas as compras e não custos de mão de obra, electricidade, etc, apura-se a seguinte margem de comercialização, de 29,23%, 29,75% e 25,34%.
Þ A margem de comercialização que resulta da contabilidade é manifestamente inferior à definida pelo sujeito passivo segundo os critérios de produção.
Þ Os custos de mercadorias vendidas e existências consumidas registados na contabilidade, o valor dos proveitos teria que ser superior ao declarado.

E a verdade é que o probatório permite, efetivamente, secundar o supra expendido, donde, validar o juízo de entendimento que foi perfilhado na decisão recorrida, conforme se atesta, desde logo, do plasmado em 15) e 16), tendo, outrossim, de ter em consideração o constante em S) da factualidade não provada.

Note-se, ademais e neste concreto particular, que a Recorrente não sindica a existência desses mesmos desvios -dando inclusive os mesmos por verificados- sendo que nada demonstra, de forma fidedigna, e devidamente substanciada para essa diferença percentual.

Acresce que, tal como enunciou a decisão recorrida e, ora, se secunda, não é crível que discrepâncias como as supra evidenciadas cujo limite percentual máximo ascende a cerca de 10% resulte de uma desatualização de dados de software, quando, de resto, essa desatualização se protela num período temporal de pelo menos três anos.

Idêntica conclusão teremos que retirar quanto à asserção das rácios. Com efeito, tal como consta elencado como pressuposto indiciante, foi estabelecida uma comparação dos principais rácios do sector de actividade nos quais a empresa se insere ao nível das margens de comercialização, tempo médio de existências e rentabilidade fiscal, tendo, nessa conformidade, sido constatados desvios significativos em todos eles.

Note-se, neste conspecto, que a AT ressaltou, desde logo, que a comparação de rácios com os sectores de avidade deve ser feita de forma cuidada, na medida em que cada empresa apresenta as suas especificidades, que a podem fazer divergir do sector de actividade, razão pela qual optou fazer uma comparação com a média do sector de actividade.

Neste âmbito, consta, expressamente, no respetivo Relatório de Inspeção Tributária como asserções que fundam o indicador supra elencado, sintetizando como segue:

- Margens brutas de comercialização que a contabilidade do sujeito passivo reflecte são manifestamente inferiores às da média do sector de actividade em que ele se insere:


- Por outro lado, existe outrossim, durações médias de existências que apresentam, igualmente, esses desvios, como se descrevem:


- Daí se extrapolando uma rentabilidade fiscal em valores percentuais bastante significativos, designadamente os que infra se descrevem:


Ora, atentas as realidades supra expendidas, e tendo presente, outrossim, que as mesmas não foram apreciadas de forma arbitrária, e que o probatório, mormente, nos pontos 16) e 17) contempla essa mesma asserção, nada há censurar ao raciocínio que foi expendido na decisão recorrida que ponderou e bem esse indício como factor devidamente legitimante dos métodos indiretos.

Secunda-se, assim, o que foi expendido na decisão recorrida e que infra se transcreve:

“o órgão inspectivo testou vários rácios pela média nacional. E, aqui chegados, um parêntesis para afastar o argumento da autora de que a média poderá não expressar as circunstâncias da sociedade inspeccionada, podendo demonstrar a realidade de estruturas societárias com um volume de negócios muito superior ao seu. Não é mentira, aquilo que alvitra a impugnante. Mas a média inclui não só sociedades com um volume de vendas superior ao seu, como sociedades com um volume inferior ao seu, além de uma média (aritmética) é, por definição, um quociente, ou seja, é um valor relativo. Testar a sua realidade pela média do sector onde se insere não visa apurar se corresponde exactamente àquele quociente, mas se existe um desfasamento significativo. E esse desfasamento foi apurado face aos valores registados na contabilidade, e não relativamente aos valores do software de rentabilidade, contabilidade, essa, que serve como base para, por exemplo, cálculo dos impostos a pagar. É uma coincidência que não pode deixar de ter relevo, em particular lida em conjunto com os demais factos-indícios.
Além disso, outros dos rácios apurados e com divergência face à média nacional é a de duração dos stocks, mostrando-se que a duração média das existências da ora impugnante era superior à média nacional, quando também se apurou que as existências eram apuradas de forma um tanto anárquica à margem de suporte documental preciso e credível. A justificação de que os valores dos produtos não se encontram actualizados não justifica nem as outras nem esta discrepância.
Por fim diz a impugnante que o órgão inspectivo não identifica que dados foram omitidos. Pois bem, se o órgão inspectivo soubesse que dados foram exactamente omitidos faria uma correcção aritmética e não uma correcção por métodos indirectos, que, por definição, encerra sempre uma álea de incerteza. O contribuinte se não quer submeter-se a tal álea de incerteza deverá, como tal, cumprir com os deveres de organização contabilística para beneficiar da presunção de veracidade, que manifestamente não foram cumpridos pela sociedade ora impugnante.”

Subsiste apenas por analisar o indício atinente à capacidade de gerar recursos para fazer face a encargos com bens não essenciais ao processo produtivo e realizar investimentos não condizentes com os resultados da actividade declarados. No fundo, um indício relacionado com a existência de uma capacidade contributiva superior à declarada.

Conforme já tivemos oportunidade de evidenciar anteriormente, os indícios devem ser analisados de forma conjugada, e nessa medida, o mesmo, no seu cômputo de apreciação global pode e deve ser equacionado como pressuposto legitimador.

Note-se que no Relatório de Inspeção Tributária são expressamente evidenciados, neste e para este efeito, o seguinte:

Þ No exercício de 2007 estão registados diversos documentos relacionados com encargos suportados com consumíveis e inscrições em provas de Karting, o que indicia que o sujeito passivo no exercício da sua actividade libertou recursos capazes de patrocinar os encargos decorrentes desta participação, para além de todos os outros necessários à actividade
Þ O resultado declarado da actividade foi positivo em € 20.391,70. No entanto, a capacidade evidenciada da empresa em suportar encargos de € 9.707,08 (quase metade do resultado) legitimamente induz pela existência de recursos não declarados que potenciam tais dispêndios.
Þ A empresa em 2008, adquiriu uma viatura ligeira de passageiros, matricula ………….., Mercedez Benz SLK 200 K, a gasolina, com 5843 Kms. Desde então a empresa passou a ter no seu imobilizado três viaturas ligeiras de passageiros marca Mercedez, cujo valor de aquisição foi superior a € 40.000,00.
Þ Em Fevereiro de 2009, está registado o contrato de locação financeira celebrado com a S……….. com o n.º ………, no valor de financiamento de € 35.000,00, inerente a esta viatura, datado de 22 de Dezembro de 2008. Na escrita da empresa só foi registado em Fevereiro de 2009, conforme registo contabilístico 228.
Þ Por esta forma a empresa evidencia uma capacidade de investimento, neste caso num bem de luxo no valor de € 43.000,00, o qual não emerge do resultado declarado da actividade exercida, pois neste ano foi negativo em (€ 11.763,32).

Ora, tais factos estando devidamente comprovados, permitem adensar a existência de indícios sérios de que existem outras fontes de recursos gerados pela actividade que permitem financiar este tipo de bens, mas não reflectidos na contabilidade. Acresce que, do teor das alegações nada resulta, expressamente, apartado nesse e para esse efeito.

Ademais, é preciso ter presente que no âmbito da alínea d), do artigo 88.º da LGT, ou seja, “no âmbito da tributação dos acréscimos patrimoniais não justificados, contemplados na alínea em contenda, a AT não tem que demonstrar a falta de veracidade da declaração e/ou escrita ou documentação de suporte, bastando-lhe demonstrar mediante factos concretamente identificados que existe uma patenteada capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada.”

Ora, tendo presente as asserções fáticas que determinaram o recurso à avaliação indireta supra expendidas, entende-se que nenhuma censura pode ser apontada à decisão recorrida quando ajuizou que estavam reunidos os pressupostos para a tributação presuntiva, na medida em que as mesmas se afiguram, efetivamente, impeditivas de comprovar e quantificar, de forma direta e exata, a matéria tributável do imposto.

Uma última nota para evidenciar que a questão da dúvida não tem nos métodos indiretos o alcance que lhe é conferido pela Recorrente, sendo que, ademais, no caso vertente da prova produzida não resulta uma fundada dúvida que pudesse aproveitar ao contribuinte nos moldes peticionados.

Conclui-se, assim, que não se verifica a convocada preterição ao referido princípio, na medida em que a dúvida relevante nunca se poderá considerar fundada se assentar na ausência ou inércia probatória da parte onerada com a prova, sobre quem recaía o dever de comprovar os factos constitutivos do direito alegado (artigo 342º, nº 1, do Código Civil e 74.º da LGT). Ora, in casu, não tendo a Impugnante cumprido o seu ónus probatório, não pode reclamar a subsunção normativa no normativo 100.º do CPPT, e aplicação da regra ínsita no seu nº1.

Atentemos, ora, no erro de julgamento atinente à quantificação.

Neste âmbito, importa, como visto, analisar primeiramente se o Tribunal a quo, como reclama a Recorrente, enunciou erradamente o ónus probatório nesta concreta vertente do quantum, especificamente do método utilizado, e da concreta fundamentação que carece de ser corporizada para o efeito.

Em caso negativo, se existe uma deficiente fundamentação do critério utilizado, porquanto não foram minimamente densificados os parâmetros para a escolha do método, não se aquilatando, em concreto, a aduzida rácio do setor e as diretrizes de atuação.

Improcedendo esta falta de fundamentação, se existiu erro de julgamento na valoração da prova, porquanto resultou demonstrada a desadequação, o desfasamento do critério, donde o excesso de quantificação.

Vejamos, então.

Aquando do enquadramento normativo, realizámos uma dilucidação da base legal, explicitando, em concreto, a repartição do ónus da prova no domínio da avaliação indireta, razão pela qual nos eximimos de tecer quaisquer outras considerações adicionais, dando as mesmas por reproduzidas.

E face ao supra expendido, ter-se-á de concluir que inexiste qualquer erro de julgamento quanto à concreta enunciação do ónus probatório no domínio da quantificação.

E isto porque ao contrário do alegado pela Recorrente não basta criar dúvida sobre o concreto quantum e o seu desfasamento, não podendo ser demonstrado como aduz a Recorrente de forma estimada.

Com efeito, e tal como já evidenciámos anteriormente, demonstrada que esteja a legalidade do recurso a métodos indiretos de avaliação da matéria coletável, cabe ao contribuinte demonstrar concretamente o erro ou o excesso de quantificação. Sendo que, é preciso ter presente que qualquer critério utilizado para a quantificação da matéria coletável por recurso a métodos indiretos é uma aproximação à realidade e não um retrato exato da mesma.

Dir-se-á, portanto, que em termos de quantificação, existe sempre uma margem de erro por inerência a estes métodos, que cabe ao contribuinte afastar mas, de forma sustentada, objetiva e plenamente demonstrada, o que, como veremos, não sucede no caso vertente.

Compete, assim, ao Impugnante de acordo com o critério legal de repartição do ónus da prova demonstrar o excesso de quantificação, não bastando suscitar dúvidas quanto ao resultado obtido, antes impondo-se que demonstre a inadequação ou errada aplicação dos critérios de quantificação utilizados, e que as mesmas traduzam, por conseguinte, excesso de quantificação. Dir-se-á, portanto, que as divergências de quantificação são sempre substanciais.

A este propósito, refere-se no Acórdão do STA, proferido no processo nº 0407/12, de 19.11.2014, que: “[e]stabelecida a legitimidade do recurso aos métodos indirectos, impende sobre o Impugnante a demonstração do erro ou manifesto excesso na quantificação da matéria tributável, sendo que a dúvida a esse propósito será decidida em sentido desfavorável à sua pretensão.”

De sublinhar, ainda, que não se vislumbra, nem de resto, se encontra, devidamente, substanciado como é tal pode determinar a violação do princípio consitucional da igualdade em matéria de acesso ao direito e aos tribunais, na vertente relativa à exigência da conformação de um processo equitativo, consagrada no art.º 20.º, n.º 4 da CRP.

Note-se, ademais, que “[à] luz do princípio da capacidade contributiva, o termo de comparação a mobilizar para o juízo de igualdade há de extrair-se da concretização legislativa da capacidade contributiva que com cada tributo se visa atingir, conquanto se reconheça à(s) norma(s) interposta(s) a necessária conformidade com o mesmo princípio (v. Casalta Nabais, José, O Dever Fundamental de Pagar Impostos – Contributo para a compreensão constitucional do estado fiscal contemporâneo, (3.ª Reimpr.), Almedina, Coimbra, 2012, p.444)”, conforme é doutrinado no Acórdão do Tribunal Constitucional, prolatado no âmbito do processo nº 475/2020, de 01 de outubro de 2020.

Logo, e transpondo o supra exposto para o caso vertente, não se vislumbra, de todo, que a expressa consagração do regime jurídico da avaliação indireta, mormente, no domínio da densificação do ónus probatório com a amplitude e delimitação que vimos analisando consagre qualquer violação do princípio da igualdade.

Ademais há que sublinhar que, situações idênticas à da Recorrente serão tratadas da mesma forma. Logo, sem necessidade de quaisquer considerações adicionais, improcede a aduzida arguição.

Prosseguindo, ora, com as concretas exigências de fundamentação do método escolhido.

Neste concreto particular, aduz a Recorrente que a decisão administrativa de fixação do critério de quantificação tem de encontrar-se, devidamente, fundamentada.

Adensando, depois, que o próprio teor do n.º 4 do artigo 77.º da LGT, não permite inferir -ao contrário do argumentado na sentença recorrida- que a AT não tenha de expor as razões pelas quais lança mão do concreto critério na decisão de quantificação, quais os fatores ou elementos que o compõem, ou que o corporizam, e os termos em que o mesmo funciona ou opera para determinar indiretamente a matéria tributável.

Conclui, assim, que a AT tem de precisar, no seu discurso de fundamentação, quais os termos, fatores ou elementos que corporizam o concreto critério que decidiu aplicar, independentemente de este ser nominado ou inominado, e os termos em que o mesmo opera.

Sufragando, depois, que assim o não entendendo errou a decisão recorrida, não só porque equacionou uma dimensão incorreta da fundamentação, como, in casu, o método não se encontra minimamente corporizado, não se aquiescendo o que é o indicador da rentabilidade fiscal do volume de negócios.

Vejamos, então.

De relevar, desde já, que inversamente ao aduzido pela Recorrente o discurso fundamentador da decisão recorrida em nada permite retirar que reputa desnecessária uma concreta fundamentação do método, apenas sufraga que, no caso vertente, existe uma clara e objetiva externação dos motivos que levaram à escolha do método.

Atentemos, para o efeito, no teor da decisão recorrida.

Após convocar o teor do artigo 77.º da LGT, e bem assim o normativo 88.º da LGT, evidencia que “[q]uanto à falta de fundamentação de aplicação do critério, na verdade o vício que a impugnante aponta é que desconhece por que motivo foi escolhido aquele critério e não qualquer outro.”

Esclarecendo, depois, que “[t]ratando-se o momento de escolha de um critério para cálculo da matéria tributável por recurso a métodos indirectos um momento de discricionariedade técnica, não basta ao órgão apenas justificar a prática do acto – que já se demonstrou – mas motivar o porquê daquele conteúdo, mormente o porquê daquele critério.”

Densificando, depois, por reporte e concreta enunciação do Relatório de Inspeção Tributária que:

“No caso concreto, os serviços inspectivos motivam a sua escolha da seguinte forma (cfr. pág. 61-62 do RIT):
“Percorrido o caminho da fundamentação que legitima o recurso à avaliação indirecta, a qual visa, nos termos do n.º 2 do art. 83º da LGT, determinar o valor dos rendimentos a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a AF disponha, é chegado o momento de definir um critério de quantificação - artigo 90° da LGT.
Este, tem, em conformidade com o n.º 1 do art.º 84º da LGT, de cimentar-se em critérios objectivos para que a quantificação da matéria colectável que daí resulte, se aproxime da realidade que se procura apurar, e que a mesma tenha como sustento elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação.
Qualquer indicador extraído do sistema de informação da empresa estaria inquinado com as omissões e inexactidões demonstradas, levando a que a quantificação realizada conduzisse a resultados incorrectos. No entanto, afastar por completo os dados do sistema de informação da empresa, como por exemplo a sua estrutura de custos, seria quantificar valores sem ter em conta as especificidades do operador económico em análise.
Em conformidade, procurou-se que o critério seleccionado reunisse as seguintes condições:
*) Que incorpore completamente a estrutura de custos que a empresa apresenta, por forma a balizar a quantificação por avaliação indirecta com as características próprias da sociedade.
*) Que incorpore todo um conjunto de custos, como sejam os de inactividade, desperdícios, quebras, incluindo factores normais e anormais da actividade.
*) Que seja objectivo, na medida em que resulte de tratamento estatístico, e não esteja por isso enviesado por escolhas subjectivas do auditor.
*) Que seja fiável, isto é apresente características do sector de actividade no qual a empresa actua em condições de plena concorrência de mercado, por forma a contrabalançar os dados informativos da sociedade que estão influenciados por omissões/inexactidões.
O indicador que reúne estas condições e por isso escolhido é o da rentabilidade fiscal do volume de negócios, em valores médios do sector de actividade em que a empresa se insere (CAE 25610), enquadrável no artigo 90º n.º 1 alínea a) da Lei Geral Tributária.
Este indicador que consta da base de dados da DGCI, é obtido com base no tratamento estatístico das declarações de todos os contribuintes entregues e que se inserem neste sector de actividade, não sendo por isso um indicador estimado de forma subjectiva.
Prosseguem os serviços inspectivos descrevendo no que consiste tal critério e como se procederá ao cálculo da matéria colectável por aplicação daquele critério.
Temos, assim, uma fundamentação não só expressa, clara na justificação e motivos explanados, como congruente com a conclusão. Em rigor, a impugnante insurge-se relativamente à suficiência dessa fundamentação, porque entende que não se motiva por que é que este critério é melhor do que qualquer outro.”

Sustenta, adicionalmente, que “[a] suficiência visa possibilitar ao contribuinte um conhecimento concreto da motivação do acto, e essa motivação encontramo-lo no relatório. É certo que podiam ter sido escolhidos quaisquer outros critérios, dezenas deles, talvez. Os serviços inspectivos não têm de discorrer sobre todos os potenciais métodos aplicáveis, porque norma nenhum lhes impõem ponderar entre este ou aquele outro método. Obrigar a administração tributária a discorrer e afastar o mérito dos mais variados e hipotéticos critérios seria criar uma torrente de motivações sem fim à vista, desproporcional e desnecessário ao fim que a fundamentação visa: dar a conhecer ao contribuinte o percurso percorrido pelo decisor para chegar àquela decisão.”

Para depois concluir que: “os serviços inspectivos escolheram um critério, justificando previamente o recurso ao critério, motivando a escolha daquele critério em concreto, de forma clara e congruente com os motivos invocados para a sua escolha, espelhando uma ponderação cuidada na escolha de critério. Além disso a impugnante não propugna qualquer outro critério por mais adequado, insistindo tão-só na ausência de motivação da escolha do critério, o que não se verifica. Repita-se, o órgão inspectivo não tem o dever de escolher de entre vários critérios; tem o dever de eleger um critério, o que melhor se adequa ao caso concreto, motivando a escolha daquele critério e não de qualquer outro critério hipotético. Por todo o exposto, não se verifica a falta de fundamentação da escolha de critério.”

Ora, como é bom de ver, a decisão recorrida não propugnou, de todo, que o critério careça de se encontrar fundamentado, bem pelo contrário, reputou é que, no caso concreto, essa fundamentação existe.

E a verdade é nenhuma censura pode ser apontada à fundamentação supra expendida.

É ponto incontroverso que a escolha do critério deve ser externada mediante uma fundamentação clara, coerente, ainda que possa ser sucinta-tal como ajuíza e bem a decisão recorrida- e é, igualmente incontestável que no caso sub judice essa fundamentação existe.

Note-se que, a letra da lei, concretamente o artigo 90.º da LGT é claro, e apresenta uma enumeração dos elementos que podem ser objeto de ponderação, mormente, “as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros”.

Daí resulta, portanto, que o aludido normativo estabelece os critérios de quantificação da matéria tributável por métodos indiretos cujo elenco não é taxativo, admitindo, ademais, a alínea d), que a AT possa socorrer-se de outros elementos declarados pelo próprio contribuinte.

Note-se inclusive que é a AT mediante invocação da base legal, que sustenta que o critério teria de cimentar-se em normas objetivas, mediante concatenação de elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação sub judice, evidenciando, ulteriormente as razões pelas quais deveria ponderar as concretas especificidades do operador económico em análise.

Seguidamente, explicou, de forma objetiva e coerente, os elementos de facto e de direito tendentes a obter o resultado mais adequado, fiável e condizente com a sua estrutura operativa.

Ulteriormente, elencou o método que reputou adequado, concretizando que o mesmo se coaduna com a rentabilidade fiscal do volume de negócios, em valores médios do sector de actividade em que a empresa se insere (CAE 25610), enquadrável no artigo 90.º n.º 1 alínea a) da LGT.

Materializando, in fine, com a devida mensuração e concreta determinação da matéria coletável.

Resulta, assim, que o aludido método presuntivo se apresenta racional, adequado e fundamentado em factos concretamente apurados, cujo cômputo é passível de enquadramento no normativo convocado pela AT.

Não podendo, de todo, lograr provimento a argumentação atinente à rentabilidade fiscal do volume de negócios, na medida em que a mesma se encontra perfeitamente densificada no Relatório de Inspeção Tributária.

Com efeito, de uma leitura atenta do respetivo Relatório de Inspeção Tributária, esclarece-se a fonte, a forma como é obtido este indicador, e seguidamente a descrição das médias do setor de atividade nos exercícios inspecionados.

Densifica-se, depois, a fórmula matemática atinente ao efeito, no caso, quantificando-se o volume de negócios estimado, e depois a concreta quantificação do lucro tributável em sede de IRC.

Logo, é por demais evidente que está fundamentado, de facto e de direito, o aduzido critério.

Ademais, como doutrinado no Aresto do STA, proferido no processo nº 0477/12, de 05 de dezembro de 2012, “[n]ada impede que a Administração conjugue vários dos “elementos” que a lei indica que “poderá ter em conta” na avaliação indirecta, pois que lhe cabe, dentro dos limites da lei, eleger o critério que repute mais adequado à determinação da matéria tributável, cabendo ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação em caso de litígio entre a administração Tributária e o sujeito passivo.”

Como bem refere a Recorrente -ainda que concluindo no sentido inverso na concreta transposição para o caso vertente- cabia à AT expressar os parâmetros ou elementos do critério que constam da referida base de dados da DGCI e fundamentar a idoneidade ou adequação da aplicação dos mesmos na situação concreta, e a verdade é que o fez.

Aquiesce-se que, de facto, a AT goza de um poder discricionário na escolha do critério e ulterior quantificação -desde que com subsunção no aludido normativo- mas é certo que essa opção específica e o seu enquadramento, tem de ser devidamente fundamentado. Mas a verdade é que in casu, e face a todo o exposto anteriormente, resulta inequívoco que toda essa fundamentação consta no respetivo Relatório de Inspeção.

Improcede, assim, o supra expendido.

Aqui chegados, cumpre analisar se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento na medida em que resulta demonstrada a inidoneidade do critério, e o excesso de quantificação que dele dimana.

No entanto, mais uma vez, o juízo de entendimento da Recorrente não procede, na medida em que da prova produzida não resultou demonstrada a alegada inedaquação do método, conforme resulta, desde logo, da factualidade não provada e da concreta consideração dos desperdícios.

Mas, expliquemos, então, porque assim o entendemos.

De acordo com o aduzido pela Recorrente, a demonstração do erro de quantum resulta, desde logo, da desconformidade do CAE com a concreta atividade, da desconsideração de custos mediante correções aritméticas e depois inclusão no indicador da rentabilidade fiscal e desconsideração de desperdícios.

Mas sem razão.

Advoga, desde logo, a Recorrente que resulta que o CAE em que a Impugnante foi inserida até 31.12.2007, compreende a fabricação de estruturas e partes metálicas para pontes, torres, mastros, comportas, pilares e para outros fins e inclui a fabricação de construções metálicas préfabricadas (elementos modulares para exposições, barracões de estaleiros de construção, etc.), actividades que manifesta e claramente não tinha nem tem, não existindo qualquer correspondência entre o CAE 28110 e o CAE 25610 que compreende a metalização, esmaltagem, anodização, galvanização, polimento, endurecimento, gravação, desbarbamento, decapagem, limpeza, plastificação, lacagem, coloração, tratamento térmico e outros tratamentos similares dos metais, efectuados geralmente em regime de subcontratação ou à tarefa.

Mas, a verdade é para além da questão nunca ter sido antes colocada nesta óptica, a verdade é que o probatório nada reflete nesse isso. Sem embargo sempre se dirá que não se encontra, de todo, substanciado de que forma, e quais os concretos desfasamentos quantitativos que tal realidade traduziria e expressa corporização do excesso por reporte aos resultados apurados pela AT.

No concernente aos custos, a própria convocação não permite justificar um erro de quantum que inquine o ato impugnado, na medida em que a letra da lei não estabelece qualquer delimitação à sua concreta ponderação, sendo certo que, no caso vertente, o mesmo é, outrossim, inócuo até porque concretamente favorável ao Impugnante, ora, Recorrente. Não logrando, por isso, mérito o aduzido em ww) a yy).

Sendo, outrossim, de evidenciar que não se vislumbra, de todo, qualquer violação do princípio da congruência, nem, de resto, a mesma se encontra, efetivamente, densificada. Foi respeitado, como vimos, todo o quadro normativo atinente à avaliação indireta, existindo a unidade que a Recorrente advoga.

Ademais, itera-se mais uma vez, inexiste qualquer expressa densificação do quantum.

Por último, e no atinente à falta de ponderação dos desperdícios, importa evidenciar que, tal como resulta da matéria de facto não provada -e já devidamente densificado em sede de impugnação da matéria de facto e para cuja fundamentação remetemos por forma a evitar um juízo repetitivo e sem valia adicional- nada resulta demonstrado em termos de concreta existência de desperdícios, sua concreta percentagem e de que forma a mesma impactaria na determinação da matéria coletável, ou seja, de que forma traduziria um excesso de quantificação.

Aliás, e tal como já evidenciado anteriormente resultou provado que a impugnante não tem registo contabilístico dos desperdícios resultantes da lacagem de artigos, nem tais desperdícios estão refletidos no inventário de stocks ou em registo extracontabilístico.

Sendo, igualmente, de evidenciar que carece de qualquer materialidade o aduzido em bb), quando, ademais, não demonstrou o aduzido excesso, e bem assim o alegado quanto ao Acórdão que convoca, porquanto realidades de facto sem similitude, logo não transponíveis.

Carecendo, igualmente, de qualquer análise e concreta abordagem a alusão a uma eventual insconstitucionalidade aduzida em kk), porquanto não tem a menor concretização. Aliás, refira-se neste âmbito que todas as arguidas insconstitucionalidades são realizadas de uma forma totalmente genérica e sem a necessária substanciação razão pela qual carecem de qualquer dilucidação neste concreto particular.

Dir-se-á, portanto, que os factos vertidos no probatório não constituem base factual bastante para se poder concluir pelo erro, excesso ou inadequação do método utilizado pela AT na quantificação da matéria coletável.

Mais importa ter presente que a mera circunstância de existirem, eventualmente, outros critérios de quantificação porventura mais ajustados à realidade do contribuinte -os quais a Recorrente, nem tão-pouco concretiza, visto que não alegou, concretizou e densificou a existência de um outro critério mais credível, por coerente e adequado à quantificação exata e justa, que reclama-não é fundamento, per se, para se concluir pela inadequação do critério escolhido pela AT na medida em que represente também ele um esforço de aproximação à realidade.

Ademais, importa relevar, in fine, que a prova do erro ou excesso de quantificação ou da manifesta inadequação do critério de quantificação à realidade concreta do sujeito passivo, tem de ser positiva e concludente.

Destarte, resultando demonstrado, como visto, os pressupostos legais para a utilização dos métodos indiretos, e apresentando-se, como visto, fundamentado o critério que a AT lançou mão, no apuramento do quantum do rendimento, competia à Impugnante, ora, Recorrente demonstrar que a utilização de tal critério conduziu, sem margem para dúvidas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade, demonstração essa que, como visto, não logrou, de todo, fazer.

E por assim ser, improcede, igualmente, o vício atinente à quantificação do apuramento sub judice.

Improcede, in totum, o presente recurso, com a consequente manutenção da a decisão recorrida em toda a sua extensão.


***


IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
Registe. Notifique.


Lisboa, 30 de setembro de 2025

(Patrícia Manuel Pires)

(Cristina Coelho da Silva)

(Sara Loureiro)


(1)Vide Acórdão do TCA Norte, proferido no processo nº 02324/04.9 BEPRT, datado de 31.05.2012 e bem assim Aresto do TCA Sul, proferido no processo nº 618/10.3 BELRS de 07.06.2018
(2)Vide, designadamente, Acórdão deste TCA Sul, proferido no processo nº 07165/13, de 22.03.2018.
(3) António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.
(4)Vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no recurso nº 2016/07, de 14 de novembro de 2007, disponível para consulta em www.dgsi.pt.
(5)Vide, designadamente, Acórdão do TCAN, proferido no processo n.º 00235/04.7BEPNF de 25.01.2007.