Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:179/25.9BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:09/30/2025
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:ERRO NA FORMA DO PROCESSO
INDEFERIMENTO LIMINAR
Sumário:I - A todo o direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde uma ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação (artigo 2/2 do Código de Processo Civil).
II - Concluindo pelo erro na forma do processo, há, depois, que verificar a viabilidade da convolação para a forma processual que seria adequada, visto o disposto nos artigos 97/3 LGT e artigo 98/4, do CPPT.
III - Nos termos do nº 1 do artigo 149º CPC, é de 10 dias o prazo para as partes requererem qualquer ato ou diligência, arguirem nulidades, deduzirem incidentes ou exercerem qualquer outro poder processual.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I – RELATÓRIO

Vem M…, interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que rejeitou liminarmente a ação de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões por si apresentada, contra o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. (IGFSS, I.P.), visando “a prestação de informações sobre as diligências de penhora realizadas e (ii) solicitava a declaração das dívidas exequendas em falhas, nos termos do disposto no artigo 272.º do CPPT, caso a informação solicitada certificasse a inexistência de bens penhoráveis”, no âmbito dos processos de execução fiscal instaurados contra a devedora originária C…, SGPS, S.A..

Nas alegações de recurso apresentadas, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:

A. «O presente recurso é interposto do despacho liminar proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que rejeitou liminarmente a petição inicial da Intimação para Prestação de Informações, Consulta de Processos ou Passagem de Certidões apresentada pelo Recorrido ao abrigo do artigo 146.°, n.° 1 do CPPT e artigos 104.° e seguintes do CPTA.
B. No âmbito do pedido de intimação para prestação de informações, veio o ora Recorrente requerer que a Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Recorrido se pronunciasse sobre o requerimento apresentado no dia 20 de maio de 2025, de prestação de informações, ao abrigo do direito à informação procedimental, alegando que se encontravam reunidos os pressupostos estabelecidos no artigo 104.° do CPTA.
C. O Recorrente alegou e demonstrou que todos estes requisitos encontravam reunidos, ou seja, a existência de omissão de resposta por parte do IGFSS em relação ao requerimento de prestação de informações apresentado e o seu legítimo interesse na obtenção das informações requeridas.
D. Outrossim, considerou o Tribunal a quo, em primeiro lugar que "a intimação para prestação de informações não constitui o meio processual adequado para fazer valer pretensões dirigidas contra actos e omissões verificadas em um processo de execução fiscal, cabendo esse lugar à reclamação judicial.''
E. E em segundo lugar, apresentou a recomendação ao Recorrente para "[r]epetir junto do órgão de execução fiscal o requerido em 20/05/2025", (...) [e]sperar o decurso do prazo legal de decisão, fixado em 10 dias, para, uma vez confrontado com a recusa ou o silêncio do órgão de execução, socorrer-se da reclamação judicial prevista no artigo 276.° do CPPT."
F. Este entendimento é contrário ao sufragado por sentença prolatada pelo mesmo Tribunal a quo, na ação de Intimação a um Comportamento apresentada pelo ora Recorrente autuada sob o n.° 325/24.0BECTB, a propósito do pedido de prestação de informações dirigido ao IGFSS, no âmbito dos presentes processos de execução fiscal. na qual se pode ler que a "intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, prevista no artigo 104.° do CPTA, aplicável ex vi do artigo 146.°, n.° 1 do CPPT, é o meio processual que se justifica quando não seja dada satisfação, pela entidade administrativa competente, aos pedidos formulados no exercício do direito à informação, designadamente, no âmbito do processo de execução fiscal."
G. A questão que aqui se coloca é a de saber se a presente Intimação constitui um meio processual adequado para compelir o órgão da execução fiscal a prestar informações requeridas pelo Executado sobre as diligências de penhoras efetuadas e sobre a declaração em falhas relativamente aos processos de execução fiscal pendentes, ao abrigo do direito à informação consagrado no artigo 268.° da CRP.
H. Dispõe o n.° 1 do artigo 103.° da LGT que o processo de execução fiscal tem natureza judicial, "sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional".
I. Donde se infere que são praticados no âmbito do processo de execução fiscal actos materialmente administrativos, que estão sujeitos a regras aplicáveis ao procedimento administrativo, como sejam as regras que regem o direito à informação procedimental, consagrado no artigo 268.° da CRP e nos artigos 59.° e 67.° da LGT.
J. Ocorrendo inércia por parte do órgão da execução fiscal em dar cumprimento ao pedido de informações formulado pelo Executado, ao abrigo do direito à informação, não cabe, naturalmente, pelo menos, em termos imperativos, apenas e só a aplicação da reclamação prevista no artigo 276. °, n.° l, do CPPT.
K. Decorre do artigo 276.°, n.° 1 do CPPT que as decisões proferidas pelo órgão de execução fiscal e outras autoridades da Administração Tributária que, no processo de execução fiscal, afetem direitos ou interesses legítimos do executado ou de terceiro são suscetíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1.° instância.
L. Os atos que podem ser objeto de reclamação nos termos do artigo 276.° do CPPT são, assim, os atos que exteriorizam decisões do órgão de execução fiscal e que afetem direitos e interesses legítimos do executado.
M. Todavia, em certas circunstâncias, este meio processual pode não ser o adequado para reagir no caso de omissões do órgão de execução fiscal.
N. A jurisprudência já veio admitir que a reclamação judicial prevista no artigo 276.°, n.° 1 do CPPT não é o único meio de reação contra atos materialmente administrativos praticados pelo órgão de execução fiscal, em particular, quando ocorre omissão ou inércia do órgão de execução fiscal.
O. Conforme defende JORGE LOPES DE SOUSA, em comentário ao artigo 276.° do CPPT, deverão ser admitidos outros meios processuais, para além da reclamação judicial prevista naquela norma, em situações em que aquele meio processual não se revele adequado, designadamente "em situações em que não há uma decisão da administração tributária"
P. Tais meios processuais serão permitidos ao abrigo do disposto nos artigos 151.° do CPPT e 49.°, n.° 1 al. d), e 49.°-A, n.° 1, al. b) do ETAF "que atribuem ao tribunal a competência para decidir os incidentes, a par da impugnação de actos lesivos, nada havendo na lei que obste a que os interessados gerem os incidentes inominados que entenderem adequados."
Q. Pelo exposto, deverá concluir-se que a presente acção de Intimação deverá ser admitida, pese embora a natureza judicial do processo de execução fiscal, na medida em que constitui o meio processual adequado para compelir o IGFSS ao cumprimento do dever de prestar as informações requeridas pelo Recorrente.
R. Pois, aquilo que o Recorrente pretende por via da presente Intimação é compelir o IGFSS a proferir decisão sobre o requerimento apresentado no dia 20 de maio de 2025, assim permitindo ao Recorrente recorrer à reclamação prevista no artigo 276.° do CPPT, caso esta decisão seja lesiva dos seus direitos e legítimos interesses.
S. É assim manifesto que o Despacho Liminar recorrido incorre em erro de direito por incorrecta interpretação das disposições conjugadas do artigo 146.°, do artigo 104.° do CPTA, assim como do artigo 268.° da CRP, violando tais disposições legais.
T. Admitindo, sem conceder, que a presente Intimação possa não ser o meio processual adequado à satisfação da pretensão do Recorrente, o Tribunal a quo deveria, ainda assim, ter convolado a petição por si apresentada em petição de incidente inominado, nos termos do artigo 98.°, n.° 4, da LGT.
U. O executado pode solicitar a intervenção do tribunal tributário para apreciar a ocorrência de vicissitudes anómalas no processo de execução fiscal que se traduzam em omissões reiteradas e ilegais do órgão da execução fiscal, ao abrigo do artigo 151.° do CPPT, sob pena de violação da garantia da tutela jurisdicional efectiva, ínsita no artigo 20.°, n.°s 1, 4 e 5, do CRP.
V. É reconhecido no despacho recorrido, que o Recorrente, na qualidade de Executado, por reversão de dívidas à Segurança Social da devedora originária C… SGPS, S.A., tem o legitimo interesse de ser informado sobre as diligências de penhoras efetuadas em relação a si e aos demais responsáveis subsidiários e, em particular, se foram, ou não, penhorados bens destes responsáveis subsidiários, e sobre a declaração em falhas dos processos executivos.
W. Não é aceitável a atuação omissiva do IGFSS, ora Recorrido, no que concerne ao dever de informar o Recorrente acerca das diligências de penhoras realizadas no âmbito dos processos de execução fiscal, assim como da respetiva declaração em falhas, omissão que se mantém até à presente data, na medida em que vem obstar, na prática, que algum dia se possa retomar a contagem do prazo de prescrição da dívida exequenda.
X. Para quem tem vindo a requerer a prestação das informações aqui em questão, e aguarda por uma resposta do IGFSS, há quase dois anos, não fará sentido encerrar este processo, instaurado, sob recomendação da sentença proferida no processo 325/24.0BECTB, e instaurar agora um outro - a reclamação judicial - a pedir a intimação do órgão de execução fiscal para fazer o que aqui é já evidente que ela omitiu há muitos meses, em manifesto desrespeito da lei, como pretendido no despacho recorrido.
Y. O Recorrente deve poder, assim, suscitar a apreciação do incumprimento do dever de prestação de informações requeridas no requerimento de 20 de maio de 2025 (assim como nos anteriores sucessivos requerimentos) ainda sem resposta por parte do IGFSS, através da dedução de incidente inominado no processo de execução fiscal, ao abrigo do artigo 151.°, n.° 1, do CPPT, e 49.°, n.° 1, alínea d), do ETAF, sob pena de denegação de justiça e consequente violação do direito fundamental da Recorrente a uma tutela jurisdicional efectiva no âmbito do processo de execução fiscal, decorrente do artigo 20.°, n.°s 1, 4 e 5, da CRP.
Z. Em face do exposto, não se pode deixar de concluir que caem por terra argumentos sustentados no despacho recorrido para indeferir liminarmente a p.i. da presente Intimação.
AA. Nesta situação, impunha-se ao Tribunal a quo proceder à convolação da petição inicial da acção de Intimação em petição inicial de incidente inominado, ao abrigo do artigo 151.°, n.° 1, do CPPT, e 49.°, n.° 1, alínea d), do ETAF, em conformidade com o artigo 98.°, n.° 4 da LGT.
BB. É assim manifesto que o Despacho Liminar recorrido incorre em erro de direito por incorrecta interpretação das disposições conjugadas do 151.°, n.° 1, do CPPT, e 49.°, n.° 1, alínea d), do ETAF assim como do artigo 20.°, n.°s 1, 4 e 5, da CRP, violando tais disposições legais.

Nestes termos
E com o sempre mui douto suprimento deste Venerando Tribunal deve ser dado provimento ao Recurso, revogando-se a Decisão Liminar recorrida e ordenado que os autos regressem ao Tribunal a quo, para aí prosseguirem os seus termos com vista à apreciação da matéria suscitada pelo Recorrente na acção de Intimação para Prestação de Informações, Consulta de Processos ou Passagem de Certidões, deduzida perante aquele Tribunal ao abrigo do artigo 104.° e ss do CPTA.
Subsidiariamente, requer o Recorrente, sem conceder, que no caso de ser adoptado o entendimento relativo à inadequação da acção de Intimação Intimação para Prestação de Informações, Consulta de Processos ou Passagem de Certidões para a questão sub judice, deverá a Decisão Liminar recorrida ser revogada, e determinada a convolação dos presentes autos no Incidente Inominado, previsto nos artigos 151.° do CPPT e 49.°, n.° 1, alínea d), do ETAF, em conformidade com o artigo 98.°, n.° 4, da LGT e ordenado o regresso dos mesmos ao Tribunal a quo para aí prosseguirem até ser proferida sentença sobre o respectivo mérito.»

O IGFSS, I.P. não apresentou contra-alegações.

O Tribunal a quo, admitiu o recurso com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Os autos foram com vista ao Ministério Público, que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa de vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre decidir.


II – Fundamentação

Cumpre, pois, apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso.

Assim, na falta de especificação no requerimento de interposição do recurso, nos termos do artigo 635/3 do Código de Processo Civil, deve-se entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao Recorrente. O objeto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (artigo 635/4 CPC). Assim, todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões e devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Atento o exposto, e tendo presentes as conclusões de recurso apresentadas, importa decidir se a decisão recorrida que indeferiu liminarmente a intimação, por erro insuprível na forma do processo, padece de erro de julgamento.


II.1- Dos Factos

Apesar de a tal não estar obrigado, por se tratar de um despacho liminar, Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

1. «Na secção de processo executivo de Castelo Branco do IGFSS, I.P. corre termos o processo de execução fiscal n.º 0501201300070505 e apensos, autuados originariamente contra a empresa C…, SGPS, S.A. por falta de entrega de contribuições e quotizações de entidade empregadora devidas a favor do Instituto da Segurança Social, I.P., tendo a dívida exequenda ali sob cobrança sido revertida contra o ora requerente, na qualidade de responsável subsidiário por reversão – resulta do teor do documento intitulado Notificação de Valores em Dívida junto com o requerimento com a ref.ª Sitaf 006935019;

2. Em 20/05/2025, o requerente dirigiu à Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do IGFSS, I.P. um requerimento no âmbito do qual solicitava, por relação ao processo de execução fiscal n.º 0501201300070505 e apensos, o seguinte:
“(i) Que seja prestada informação sobre as diligências de penhoras efetuadas em relação ao Executado e demais responsáveis subsidiários e, em particular, se foram, ou não, penhorados quaisquer bens e rendimentos; e
(ii) Que seja emitida a declaração em falhas nos processos executivos, nos termos do artigo 272.º do CPPT, caso seja apurada a inexistência de bens penhoráveis do Executado e demais responsáveis subsidiários”.
- cfr. documento junto com o requerimento com a ref.ª Sitaf 006935022;

3. Em 19/06/2025, através de legal mandatário, o requerente deu entrada da presente petição inicial directamente junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco – cfr. ref.ª Sitaf 006935026.»


Quanto a factos não provados, na sentença exarou-se o seguinte:

«Sem quaisquer outros factos, provados ou não provados, que relevem para a decisão a proferir em sede liminar.»


E quanto à motivação da decisão de facto, consignou-se:

«O Tribunal formou a sua convicção, no que tange aos factos acima referenciados, a partir da análise crítica dos documentos instruendos da petição inicial, para onde remeteu em cada específico ponto levado ao probatório.»


II.1 .b) É o seguinte o teor da decisão sob recurso, no segmento decisório que aqui interessa:

«(…)
Nos termos do princípio da especialidade das formas processuais, a cada pretensão jurídica corresponde um, e só um, meio processual adequado para a fazer valer em juízo (cfr. artigos 2.º, n.º 2 do CPC e 97.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária [LGT]).
Ou seja, o autor deve sempre eleger o concreto meio processual adequado à pretensão material que pretende ver assegurada, sob o risco de, acabando por optar por um meio processual impróprio ou inidóneo, ocorrer um erro na forma do processo (cfr. artigo 193.º, n.º 1 do CPC), o qual, não podendo ser convolado para o meio processual correcto (cfr. artigos 98.º, n.º 4 do CPPT e 97.º, n.º 3 da LGT), constitui uma nulidade processual susceptível de determinar o indeferimento liminar da petição inicial ou a absolvição do réu da instância – tudo dependendo de este já ter sido citado ou notificado e ter apresentado contestação nos autos (cfr. artigos 576.º, n.º 1 e 577.º, alínea b) do CPC).
Em matéria processual tributária, a lei elegeu um conjunto de meios processuais, sendo uns próprios, outros acessórios e outros, ainda, urgentes. No artigo 146.º, n.º 1 do CPPT, precisamente, o legislador consagrou a intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões como um meio processual acessório, embora objecto de regulação extra-sistemática: neste caso, através do processo urgente previsto no artigo 104.º e ss do CPTA.
Concentrando-nos neste, dele resulta que quando não seja dada integral satisfação a pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a correspondente intimação (cfr. artigo 104.º, n.º 1 do CPTA).
Como resulta da própria previsão normativa, o que é tutelado pelo meio processual em causa é o direito à informação procedimental em matéria tributária, o que pressupõe:
i) de um lado, e um pouco tautologicamente, o reconhecimento do interessado ao direito à informação procedimental administrativa, o que se tem por constitucional (cfr. artigo 268.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa [CRP]) e legalmente definido (cfr. artigos 55.º, 56.º, n.º 1 e 59.º, n.º 3 da LGT);
ii) de outro, que a Administração Tributária tenha sido confrontada com uma interpelação administrativa prévia à qual não tenha dado plena satisfação, seja por recusa, indeferimento ou deferimento meramente parcial da informação solicitada (cfr. artigo 105.º,n.ºs 1 e 2 do CPTA).
Todavia, é outro o alcance do processo de execução fiscal, ao qual o legislador atribuiu expressamente a natureza de um verdadeiro processo judicial (cfr. artigo 103.º, n.º 1 da LGT). Neste, com efeito, quaisquer actos ou omissões imputadas ao órgão onde corre a execução fiscal, ainda que materialmente administrativas, apresentam a natureza de verdadeira decisões proferidas no âmbito de um processo judicial cujo contencioso deve ser decidido através do apelo a outro meio processual.
É ele o incidente da reclamação de actos do órgão de execução fiscal (cfr. artigo 276.º e ss do CPPT), que deve ser apresentado no prazo de 10 dias – e não 20, como ocorre com a intimação prevista no artigo 105.º, n.º 2 do CPTA – junto do próprio autor do acto ou omissão imputadas – a fim de lhe ser ainda possível, e querendo, revogar o acto impugnado –, mas dirigido ao Tribunal tributário competente (cfr. artigo 277.º, n.º 2 do CPPT).
Recortando o distinto alcance entre a intimação prevista no artigo 104.º e ss do CPTA e a reclamação do artigo 276.º e ss do CPPT, constituindo ambos processos urgentes, pode dizer-se o seguinte: “O meio processual de intimação para a consulta de documentos e passagem de certidões (...) visa assegurar o direito à informação previsto no art.° 268.° n.° l da CRP, em que não seja dada integral satisfação aos pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou de direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sendo esse o campo de aplicação de tais meios processuais acessórios como esclarece a norma do art.° 104.° do CPTA.
Mas já não para o requerente obter quaisquer informações ou outros actos relevantes em processos judiciais contra si pendentes, como é o caso, das execuções fiscais contra si instauradas (…). [C]omo expressamente consta da norma -do art.° 103.° n.º l da LGT, o processo de execução fiscal tem natureza judicial e em que os actos materialmente administrativos nelas praticados pelos órgãos da administração tributária deles cabe reclamação para o juiz e não a utilização de tal meio processual acessório, por força do disposto no n.°2 do mesmo art.° 103.° da LGT” (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 30/01/2007, tirado no processo 01596/07).
Dito de outra forma, portanto, a intimação para prestação de informações não constitui o meio processual adequado para fazer valer pretensões dirigidas contra actos e omissões verificadas em um processo de execução fiscal, cabendo esse lugar à reclamação judicial.
Esta reclamação judicial, que para ter natureza urgente só precisa que o reclamante alegue a ocorrência de prejuízo irreparável na subida do incidente apenas a final (cfr. artigo 278.º, n.ºs 3 e 6 do CPPT), apresenta-se, de facto, como um meio processual de plena jurisdição, e não já de mera anulação, em que o Tribunal pode ordenar ao órgão de execução fiscal a adopção de verdadeiras injunções de forma a sanar quaisquer ilegalidades detectadas na sua actuação.
Por conseguinte, decorridos 10 dias desde a apresentação de requerimento expresso nesse sentido (cfr. artigo 21.º, alínea a) do CPPT, em função da natureza judicial da execução fiscal), o silêncio ou omissão de resposta a um requerimento processual, tendente à certificação dos actos de penhora realizados e à verificação dos pressupostos da declaração da dívida exequenda em falhas, nos termos do artigo 272.º do CPPT, devem ser arguidos judicialmente através do referido incidente reclamativo.
Quanto à declaração da dívida exequenda em falhas, nos termos e com os pressupostos do artigo 272.º do CPPT, nomeadamente por falta de bens penhoráveis dos responsáveis tributários (cfr. alínea a), a mesma constitui um acto de natureza materialmente administrativa, passando o contencioso da sua recusa, ou omissão por parte do órgão de execução fiscal, também pela reclamação de actos prevista no artigo 276.º e ss do CPPT, na precisa razão em que esse acto confronta o executado no processo de execução fiscal com a possibilidade de poder relevar o cômputo prescricional da obrigação exequenda (cfr. artigo 274.º do CPPT), oferecendo-se como jurisdicionalmente sindicável (cfr., nesse sentido, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 22/06/2023, tirado no processo 00235/23.8BEPRT).
No caso que temos defronte foi, exactamente, o que ocorreu.
Isto é, o requerente, que no processo de execução fiscal n.º 0501201300070505 e apensos confronta a qualidade de responsável subsidiário por reversão, tendo aquele sido autuado originariamente pelo IGFSS, I.P. contra a empresa C…, SGPS, S.A. (cfr. facto provado 1), dirigiu um requerimento ao órgão de execução fiscal em que pedia que lhe fossem indicadas as diligências de penhora ocorridas no processo e, a existir uma situação de insuficiência patrimonial de bens penhoráveis, que fosse a dívida exequenda declarada em falhas (cfr. facto provado 2), reagindo contra uma alegada omissão do dever de decidir através da impugnação para prestação de informações prevista no artigo 104.º e ss do CPTA (cfr. facto provado 3).
Não só esse não constitui o meio processual adequado a fazer valer a pretensão em causa quanto o erro na forma de processo aí descoberto não pode ser sanado através da convolação:
i) ora porque tendo o requerimento sido dirigido ao órgão exequente em 20/05/2025, e sendo contínuos os prazos do processo judicial tributário (cfr. artigos 20.º, n.º 2 do CPPT e 138.º, n.º 1 do CPC), entre os 10 dias seguintes – momento da verificação da omissão – e a data da apresentação da petição inicial decorreram mais do que outros tantos dias, tal como previsto no artigo 277.º, n.º 1 do CPPT;
ii) a petição inicial foi apresentada directamente no Tribunal, sem formulação de conclusões e sem passar pelo órgão exequente, tal como previsto no artigo 277.º, n.º 2 do CPPT.
Assim sendo, por não estar em causa o exercício ao direito à informação procedimental, por o processo de execução fiscal ter natureza judicial, e embora conscientes da decisão proferida no processo n.º 325/24.0BECTB (cfr. documento junto com o requerimento com a ref.ª Sitaf 006935021), a que acresce o facto de o Tribunal ser competente para analisar os pressupostos da declaração da dívida exequenda em falhas por tal se afigurar como um acto potencialmente lesivo de direitos e interesses legalmente protegidos em matéria tributária, cumpre recomendar ao requerente a eleição da reclamação judicial prevista no artigo 276.º e ss do CPPT como o meio processual concretamente ajustado à composição do litígio que nos apresenta, devendo:
1. Repetir junto do órgão de execução fiscal o requerido em 20/05/2025, sem que contra tal se oponha o disposto no artigo 13.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, por estarmos na presença de um autêntico processo de natureza judicial;
2. Esperar o decurso do prazo legal de decisão, fixado em 10 dias, para, uma vez confrontado com a recusa ou o silêncio do órgão de execução, socorrer-se da reclamação judicial prevista no artigo 276.º do CPPT;
3. Podendo então o Tribunal, logo, decidir e compor definitivamente a recusa ou o silêncio do órgão exequente, bem como proferir uma decisão acerca dos pressupostos e extensão – retroactiva – da declaração em falhas, a qual é relevante para o cômputo da prescrição da dívida exequenda.
Em conformidade com o que acabámos de enunciar e defender, ao Tribunal cumpre agora, apenas, indeferir liminarmente a presente petição inicial.
Eis, precisamente, como se decidirá.
(…)»


II.2 Do Direito

O Requerente e ora Recorrente, é executado por reversão no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) que corre termos na Seção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (IGFSS, IP), sob o nº 0501201300070505 e apensos, PEF originariamente instaurado contra C…, SGPS, S.A, para cobrança coerciva de dívidas de contribuições e cotizações à Segurança Social.

Em 20 de maio de 2025, no âmbito daqueles processos apresentou um requerimento em que solicitava: “(i) que seja prestada informação sobre as diligências de penhoras efetuadas em relação ao Executado e demais responsáveis subsidiários e, em particular, se foram, ou não, penhorados quaisquer bens e rendimentos; e (ii) Que seja emitida a declaração em falhas nos processos executivos, nos termos do artigo 272.º do CPPT, caso seja apurada a inexistência de bens penhoráveis do Executado e demais responsáveis subsidiários ”. – cf. alínea 2) da matéria assente.

Não tendo recebido qualquer resposta ao solicitado, intentou junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco ação de Intimação para Prestação de Informações, Consulta de Processos ou Passagem de Certidões na qual termina pedindo que o IGFSS, IP seja intimado a:
«(i) prestar informação sobre as diligências de penhoras efetuadas em relação aos responsáveis subsidiários e, em particular, se foram, ou não, penhorados bens destes responsáveis subsidiários, e
(ii) prestar informação sobre a declaração em falhas nos processos de execução fiscal pendentes, nos termos do artigo 272.º do CPPT, por não ter sido possível localizar bens ou rendimentos suscetíveis de penhora do Executado e dos demais responsáveis subsidiários, conforme resulta do despacho de declaração em falhas proferido pelo Senhor Chefe do Serviço de Finanças da Covilhã

A ação foi liminarmente indeferida, por erro na forma do processo e a sua não convolação por estar já ultrapassado o prazo para a sua dedução.

É contra esta decisão, com a qual não se conforma o ora Recorrente que vem interposto o presente recurso

Nas alegações de recurso apresentadas, alega, em suma, ser esta a forma de processo adequada a fazer valer o seu direito e à satisfação da sua pretensão de obter as informações aguardadas e pretendidas, e caso assim não seja entendido a sua convolação em petição inicial de incidente inominado, ao abrigo do artigo 151.º, n.º 1, do CPPT, e 49.º, n.º 1, alínea d), do ETAF, em conformidade com o artigo 98.º, n.º 4 da LGT.

Argumenta ainda ser esta a forma de processo que o mesmo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco indicou ser a adequada no âmbito do processo que corre termos sob o nº 325/24.0BECTB.

Vejamos, então:

Como é por demais consabido, a todo o direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde uma ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação (artigo 2/2 do Código de Processo Civil).

Em princípio, a cada pretensão jurídica corresponde um e um só meio processual para fazer valer o seu direito em juízo.

Cabe ao autor escolher de entre o catálogo dos meios processuais disponíveis o mais adequado a fazer valer a sua pretensão e arcar com as consequências da sua escolha.

No caso concreto ora em apreciação, como vimos já, o Autor e ora Recorrente intentou junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco ação de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões.

Pelas razões aduzidas no despacho de indeferimento liminar supratranscrito e que se tornaria fastioso aqui repetir, considerou-se que o Requerente e ora Recorrente errou na forma de processo que elegeu, indicando-se como forma processual adequada a reclamação para o juiz do processo prevista no artigo 276º do CPPT.

Dissente o ora Recorrente do assim decidido quanto à indicação deste meio processual argumentando, em suma, que não estamos perante um ato praticado pelo órgão de execução fiscal mas sim perante a omissão de um ato que o Recorrente entende que deveria ter sido praticado e o não foi, recorrendo aos ensinamentos de Jorge Lopes de Sousa, que cita e transcreve nas conclusões e alegações de recurso.

Embora continuando a defender ser a intimação a fórmula processual mais adequada à satisfação da sua pretensão, concede que, a não ser assim, poderia ter deduzido incidente inominado ao abrigo do disposto nos artigos 151.º, n.º 1, do CPPT, e 49.º, n.º 1, alínea d), do ETAF, em conformidade com o artigo 98.º, n.º 4 da LGT, pedindo a convolação.

Com efeito, concluindo pelo erro na forma do processo, havia, depois, que verificar a viabilidade da convolação para a forma processual que seria adequada, visto o disposto nos artigos 97/3 LGT e artigo 98/4, do CPPT.

Ora, na decisão recorrida o Mmº Juiz a quo depois de considerar que quer o pedido prestação de informações quer de declaração em falhas, quer a causa de pedir, eram consentâneos com a forma processual de reclamação judicial prevista no artigo 276º CPPT, concluiu pela insusceptibilidade de convolação, por ter sido excedido o prazo em que poderia ter sido deduzida.

Desde já diremos que pelas razões assertiva e certeiramente aduzidas no despacho reclamado, concordamos que houve erro na forma de processo que o ora Recorrente elegeu para formular a sua pretensão.

Com efeito, e tal como decidido, o processo de execução fiscal tem, todo ele, natureza judicial, não se encontrando, pois, justificação para o recurso a um meio processual pensado e dirigido para tutelar o exercício ao direito à informação procedimental ou de de acesso aos arquivos e registos administrativos.

Cabia sim, reclamação para o juiz do processo, ou através da reclamação prevista no artigo 276º como concluiu a Mª Juíza a quo na decisão reclamada, ou seguindo os ensinamentos de Jorge Lopes de Sousa, através da dedução de incidente inominado, tese que sufragamos.

Ora, concluindo pelo erro na forma do processo, visto o disposto nos artigos 97/3 LGT e artigo 98/4, do CPPT, seguidamente cumpriria verificar a viabilidade da convolação para a forma processual que seria adequada.

Todavia, mesmo elegendo a tese apresentada pelo ora Recorrente nas conclusões e alegações de recurso, no sentido da convolação em incidente inominado, esbarramos, ainda assim, com o decurso do prazo para o deduzir.

Com efeito, na falta de disposição especial, visto o disposto nos artigos 2.e) e 20/2 do CPPT, temos que nos socorrer do disposto no Código de Processo Civil.

Ora, nos termos do nº 1 do artigo 149º CPC, é de 10 dias o prazo para as partes requererem qualquer ato ou diligência, arguirem nulidades, deduzirem incidentes ou exercerem qualquer outro poder processual.

Considerando que o requerimento foi apresentado junto do órgão de execução fiscal em 20 de maio de 2025 e não foi decidido, o ora Recorrente tinha até ao dia 9 de junho para deduzir o incidente, podendo o ato ser ainda praticado nos três dias úteis seguintes mediante o pagamento de uma multa.

Todavia, quando a ação deu entrada em juízo, em 19 de junho de 2025, estava já esgotado o prazo para deduzir o incidente.

Porque excedido o respetivo prazo de dedução, não é já possível a convolação, assim se concluindo pela improcedência do recurso.

Em face do exposto, e sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva.


Sumário/Conclusões:

I - A todo o direito, exceto quando a lei determine o contrário, corresponde uma ação adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-lo coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da ação (artigo 2/2 do Código de Processo Civil).
II - Concluindo pelo erro na forma do processo, há, depois, que verificar a viabilidade da convolação para a forma processual que seria adequada, visto o disposto nos artigos 97/3 LGT e artigo 98/4, do CPPT.
III - Nos termos do nº 1 do artigo 149º CPC, é de 10 dias o prazo para as partes requererem qualquer ato ou diligência, arguirem nulidades, deduzirem incidentes ou exercerem qualquer outro poder processual.


III - Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão de indeferimento liminar recorrida.

Custas pelo Recorrente que decaiu.

Lisboa, 30 de setembro de 2025.

Susana Barreto

Isabel Vaz Fernandes

Luísa Soares