Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 237/24.7BCLSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 12/19/2024 |
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Relator: | MARIA TERESA CAIADO FERNANDES CORREIA |
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Descritores: | RESPONSABILIDADE DOS CLUBES E SOCIEDADES DESPORTIVAS PELO COMPORTAMENTO DOS ESPETADORES TARJA E OBJETOS PIROTÉCNICOS |
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Sumário: | I- A prevenção da adoção de atitudes incorretas por parte de todos os que assistem ao espetáculo desportivo (leia-se: sócios, simpatizantes, adeptos ou espetadores) é, pois, tarefa que aqui - como além fronteiras - , defende-se recair não só sobre o clube visitado (aquele que tem o domínio do facto; sobretudo na ótica dos deveres in vigilando v.g. quanto ao recinto, infraestruturas, sistemas de videovigilância, etc.), mas também sobre o clube visitante (sobretudo na ótica dos deveres in formando v.g. normas referentes à segurança que impõe a obrigação de os clubes instituírem sistemas de gestão de segurança, ou seja, medidas de prevenção, técnicas idóneas de prevenção, meios de reação, estratégias de comunicação, etc.): cfr. 5º a art. 16º-A da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho; art. 2º e art. 5º da RAR n.º 52/2018; art. 17º do CD da FIFA e art. 16º do RD da UEFA; II- Donde, resultando, como resultou provado nos autos, que os adeptos da recorrente (sociedade desportiva visitada) exibiram dentro do recinto e durante o decurso do evento desportivo, uma tarja, com dimensão superior a 1mx1m, com a seguinte mensagem: “Vozes de trolha não chegam ao céu. Na defesa do símbolo sempre” e que ainda arremessaram e deflagraram artefactos pirotécnicos (a saber: 2 flashligts; 1 pote de fumo e 2 tochas incandescentes), mostra-se manifesto que a mesma não logrou prevenir a violência no desporto (v.g. quer através do integral cumprimentos dos deveres de supervisão, de monotorização, de inspeção, quer através do integral cumprimento dos deveres para a educação e/ou promoção para o fair-play), desrespeitando não só os comandos constitucional, legais e regulamentares, como sobretudo os seus deveres in vigilando e in formando (que, sublinhe-se, conhecia: como resulta do ato sindicado e da defesa que apresentou e, acrescente-se dos regulamentos desportivos a que autovinculou): cfr. art. 79º n.º 2 in fine da CRP; art. 5º a art. 16º-A da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho; art. 2º e art. 5º da RAR n.º 52/2018; art. 17º do CD da FIFA e art. 16º do RD da UEFA; III- A responsabilidade disciplinar dos clubes por comportamentos dos adeptos é subjetiva, portanto, dependente da sua atuação culposa: in “A RESPONSABILIDADE DOS CLUBES DESPORTIVOS PELO COMPORTAMENTO DOS SEUS ADEPTOS. UMA ANÁLISE JURISPRUDENCIAL; Tiago Rodrigues Bastos; José Ricardo Gonçalves; Sérgio Castanheira; @pública – Revista Eletrónica de Direito Público; VOL. 8 N.º 1 abril 2021, fls. 86; www.e-publica.pt”; IV- O tribunal arbitral a quo ao confirmar a deliberação impugnada do Pleno da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da entidade demandada, datada de 2024-02-27, reconheceu também que tal deliberação assentava não só em prova suficiente, como ainda em prova com valor probatório reforçado, a saber: o relatório da equipa de arbitragem e, importa dize-lo: fê-lo corretamente à luz das disposições legais e regulamentares aplicáveis: cfr. art. 169º e art. 243º ambos do CPP e art. 363º, n.º 2 e art. 371º n.º 1 ambos do CC; art. 13º al. f) do RD LPFP e art. 44º do RD UEFA; neste sentido vide Acórdão deste TCAS, de 2024-06-20, processo 78/20BCLSB, disponível em www.dgsi.pt.; V- O que permitiu a conclusão, que se mostra acertada (porque em conformidade com o que resulta dos autos – o facto é que no recinto, e durante o evento, desportivo foi exibida tarja e deflagrados objeto pirotécnicos não autorizados - e com as normas legais e regulamentares aplicáveis e supra identificadas), que a recorrente não empregou (todas) as medidas exigidas pelas circunstâncias e (ainda) adequadas a evitar o comportamento antidesportivo verificado, uma vez que face à previsibilidade dos fenómenos causadores de risco para a vida e integridade física dos espetadores, ordem pública, património, igualdade e ética desportiva (recorde-se, atentos os dados da experiência sobre os fenómenos de violência no desporto, mas também no caso o cadastro disciplinar da sociedade desportiva recorrente, sobretudo por sanções semelhantes à infração disciplinar que o acórdão arbitral ora recorrido confirmou), capazes de constituir fontes de perigo para os espetadores como sejam, repete-se: no caso, a descrita tarja, com dimensão superior a 1mx1m, arremesso e deflagração de 2 flashligts, de 1 pote de fumo e de 2 tochas incandescentes; VI- Ou seja, a concreta exibição da descrita tarja, com dimensão superior a 1mx1m, e o arremesso e deflagração de 2 flashligts, de 1 pote de fumo e de 2 tochas incandescentes, não consubstancia um imprevisto, mas sim uma possibilidade, que podia (repete-se: atente-se v.g. na estrutura logística, nas atribuições e competências da sociedade desportiva recorrente e na previsibilidade, recorde-se ainda averbamento de antecedentes no seu registo de natureza disciplinar, referenciados na matéria dada por assente nos presentes autos) e devia, ter sido oportunamente antecipada pela recorrente, a qual não tendo demonstrado que, no âmbito do dever in vigilando e in formando a que está adstrita, praticou ato idóneo destinado a evitar os comportamentos antidesportivos de que está acusada foi, pois, por tais comportamentos corretamente responsabilizada às luz das normas do direito disciplinar desportivo, como bem concluiu a deliberação sindicada e, bem assim o confirmou o acórdão arbitral recorrido; VII- O art. 2º n.º 1, 4 e 5 da Portaria nº 301/2015, de 22 de setembro conjugado com a tabela constante do Anexo I (1.ª linha) da mesma Portaria, em ação de arbitragem necessária, com o valor de €4.465,00, não é inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade (art. 18º n.º 2da CRP) nem do princípio da tutela jurisdicional efetiva (art. 20º n.º 1 da CRP). |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção SOCIAL |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | EM NOME DO POVO acordam os juizes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul – Subsecção Social: *** I. RELATÓRIO: S..., com os demais sinais dos autos, intentou no Tribunal Arbitral do Desporto – TAD, contra a FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL - FPF, ação arbitral impugnando a decisão final proferida pelo Pleno do Conselho de Disciplina da FPF - Secção Profissional, de 2024-02-27, no âmbito do Processo Disciplinar - PD n.º ......2023/2024, que condenou a Demandante pela prática de uma infração disciplinar p. e p. pelo art. 127º e pelo art. 187.º, nº 1, al. b) do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional - RD LPFP, em sanção disciplinar de multa, no montante de €4.465,00 (quatro mil, quatrocentos e sessenta e cinco euros). * Por decisão arbitral de 2024-10-08 o TAD julgou a ação improcedente e, em consequência, confirmou a decisão disciplinar condenatória recorrida de 2024-02-27, proferida pela entidade demandada: cfr. fls. 4 a 77. * Inconformada, a demandante, ora recorrente, interpôs recurso de apelação para este Tribunal Central Administrativo do Sul - TCA Sul, no qual peticionou, além do mais, a revogação do acórdão arbitral recorrido, para tanto, apresentando as suas alegações com as conclusões recursivas que se transcrevem: “…
…”: cfr. fls. 78 a 124. * Por seu turno a entidade demandada, ora recorrida, contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida, para tanto, apresentando as respetivas contra-alegações com as conclusões que se transcrevem: “…
…”: cfr. fls. 127 a 186. * O presente recurso foi admitido e ordenada a sua subida em 2024-11-18: cfr. fls. 187. * O Digno Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal Central, de acordo com o disposto no art. 146º e art. 147º ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – CPTA, emitiu parecer, de que ressalta: “… 5. Da análise aos presentes Autos, nomeadamente da decisão de que se recorre, à motivação de recurso apresentada pela Recorrente e bem assim à subsequente resposta da Recorrida, entende o Ministério Público que a decisão de que se recorre procedeu a uma correta apreciação dos factos trazidos ao conhecimento do Tribunal e à sua subsunção ao Direito, evidenciando clara e suficiente fundamentação, pelo que, salvo melhor opinião, não merece qualquer censura. 6. Nessa linha, entende-se acompanhar, em toda a extensão, o sentido e fundamentação da resposta apresentada pela Recorrida, cujo argumentário se subscreve, sem necessidade de desnecessária repetição. Termos em que o Ministério Público pugna pela improcedência do presente recurso…”: cfr. fls. 193. E, de tal parecer, notificadas, as partes nada disseram: cfr. fls. 194 a 216. * Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente (cfr. art. 36º nº 2 do CPTA), mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos Juizes Desembargadores Adjuntos, vem o presente processo à conferência para julgamento. *** II. OBJETO DO RECURSO: Delimitadas as questões a conhecer pelo teor das alegações de recurso apresentadas pela entidade recorrente e respetivas conclusões (cfr. art. 635°, n° 4 e art. 639°, n°1, nº. 2 e nº 3 todos do Código de Processo Civil – CPC ex vi artº 140° do CPTA), não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas - salvo as de conhecimento oficioso -, importa apreciar e decidir agora se a decisão arbitral sob recurso incorreu em erro de julgamento de direito e inconstitucionalidade quanto ao valor das custas. Vejamos: *** III. FUNDAMENTAÇÃO: A – DE FACTO: No acórdão arbitral recorrido foi julgada provada a seguinte factualidade:
* B – DE DIREITO: DO ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO (v.g. ónus da prova; culpa; presunção de inocência; art. 346º e art. 349º ambos do Código Civil – CC; art. 32º n. º2 da Constituição da República Portuguesa – CRP; art. 13º al. f); art. 127º n.º 1; art. 187.º nº 1 al. b) do RD LPFP; Lei nº 113/2019, de 11 de setembro): Ressalta do discurso fundamentador da decisão arbitral recorrida que: “…
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Correspondentemente, e como resulta do sobredito, o tribunal arbitral a quo decidiu não dar provimento ao recurso interposto pela demandante, e em consequência:
O assim decidido pelo tribunal arbitral a quo escora-se em tese que, se acompanha. Vejamos: Como decorre dos autos e o probatório elege, em 2024-01-31, no estádio municipal de …., realizou-se o jogo n.º ..........., entre a SS... (ora recorrente) e a G...; a contar para a 19ª jornada da Liga. Neste jogo, adeptos (identificados através de vestes que ostentavam e dos cânticos que entoavam) afetos à equipa visitada, ora recorrente, localizados na bancada nascente inferior, sector...., fora da Z..., lá exibiram uma tarja, com dimensão superior a 1mx1m, com a seguinte mensagem: “Vozes de trolha não chegam ao céu. Na defesa do símbolo sempre”. Mais ficou assente que, no decurso do suprarreferido jogo, pelas 21:17 horas, foram ainda deflagrados 2 flashligts, 1 pote de fumo e 2 tochas incandescentes, na mesma bancada nascente inferior, sector...., fora da Z.... Reduzindo a vexatia questio aos seus termos mais simples, estamos, perante um caso de responsabilidade disciplinar das sociedades desportivas pelos comportamentos social ou desportivamente incorretos dos seus adeptos. E no que importa considerar para a economia dos autos, concretamente sobre os deveres, o ónus da prova e a responsabilidade da sociedade desportiva visitada pelos comportamentos antidesportivos dos seus sócios, simpatizantes, adeptos ou espetadores. Princípio basilar nesta matéria - de acordo com o quadro legal vigente e, bem assim de acordo com as normas internacionais que o Estado Português adotou e a que a entidade recorrida (entidade de natureza privada com estatuto de utilidade pública desportiva), bem como a recorrente (sociedade desportiva visitada) se encontram vinculadas -, é o princípio da ética desportiva, princípio do qual decorre um feixe de deveres cujo cumprimento primeiramente impende, no que ao caso interessa, sobre os clubes e sociedades desportivas: cfr. art. 3º da Lei n.º 5/2007, de 16 de janeiro, na redação atualizada – Lei de Bases da Atividade Física e do Desposto – LAFD; art. 3º da Resolução Assembleia da República n.º 11/87, que aprovou a Convenção Europeia sobre a Violência e Excesso dos Espectadores; art. 8º e art. 9º da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, que estabelece o Regime Jurídico da Segurança e combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, na redação atualizada; art. 2º e art. 5º da Resolução Assembleia da República n.º 52/2018, que aprovou a Convenção do Conselho da Europa sobre a Abordagem Integrada da Segurança, da Proteção e dos Serviços por Ocasião dos Jogos de Futebol; vide Estatutos da FPF; Regulamentos da FIFA e da UEFA. Tais deveres, descobrem-se expressamente identificados no acórdão arbitral recorrido, não só na epítome da posição das partes sobre o litígio (vide v.g. pontos 27 a 32; 42 a 45; 50 a 52; etc), como sobretudo na decisão impugnada que o acórdão arbitral recorrido confirmou, por considerar, resumidamente, que a recorrente não logrou provar a adoção de medidas que permitam a conclusão de que a sua conduta não resultou de comportamento culposo (vide v.g. fls. 68 e 69) e, bem assim, pelo concreto preenchimento dos elementos típicos do art. 127º n.º e art. 187 n.º 1 al. b) ambos do RD LPFP. Destarte, consabidamente, tais deveres são: deveres in vigilando (ou seja, em síntese, deveres de supervisão, de monotorização, de inspeção) e são ainda os deveres in formando (ou seja, em síntese, deveres de formação, de comunicação, de promoção de fair-play): cfr. art. 3º da LAFD; art. 3º da RAR n.º 11/87; art. 8º e art. 9º da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho; art. 2º e art. 5º da RAR n.º 52/2018 e deliberação impugnada do Pleno da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da entidade recorrida, de 2023-11-02, proferida no âmbito do RHI n.º 05-23/24. Tais deveres são complementares e contribuem para o assegurar de um clima que se pretende de maior segurança nos recintos desportivos e nas suas imediações, antes, durante e depois do espetáculo desportivo, visando assim a garantia da integridade física e moral de todos os participantes e de todos os espetadores (v.g. das crianças aos idosos) e de todas as atividades desportivas, em rigorosa simetria com a determinada: “… proteção dos direitos dos indivíduos à integridade física assim como da sua expectativa legitima de assistirem a jogos de futebol e a outros eventos desportivos sem medo de violência, desordem publica ou outras atividades criminosas, prosseguindo o objetivo de assegurar um ambiente seguro, protegido e acolhedor nos jogos…” e ainda a operacionalizar a responsabilização dos clubes e das sociedades desportivas: cfr. art. 8º e art. 9º da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho; art. 2º e art. 5º da RAR n.º 52/2018; vide “A RESPONSABILIDADE DOS CLUBES DESPORTIVOS DECORRENTE DO COMPORTAMENTO INCORRETO DOS SEUS ADEPTOS; Guilherme Gomes Monteiro Macedo; Universidade de Coimbra; Dissertação no âmbito do Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais, julho de 2023”. Dito de outro modo, a prevenção da adoção de atitudes incorretas por parte de todos os que assistem ao espetáculo desportivo (leia-se: sócios, simpatizantes, adeptos ou espetadores) é, pois, tarefa que aqui - como além fronteiras- , defende-se recair não só sobre o clube visitado (aquele que tem o domínio do facto; sobretudo na ótica dos deveres in vigilando v.g. quanto ao recinto, infraestruturas, sistemas de videovigilância, etc.), mas também sobre o clube visitante (sobretudo na ótica dos deveres in formando v.g. normas referentes à segurança que impõe a obrigação de os clubes instituírem sistemas de gestão de segurança, ou seja, medidas de prevenção, técnicas idóneas de prevenção, meios de reação, estratégias de comunicação, etc.): cfr. 5º a art. 16º-A da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho; art. 2º e art. 5º da RAR n.º 52/2018; art. 17º do CD da FIFA e art. 16º do RD da UEFA. Donde, resultando, como resultou provado nos autos, que os adeptos da recorrente (sociedade desportiva visitada) exibiram dentro do recinto e durante o decurso do evento desportivo, uma tarja, com dimensão superior a 1mx1m, com a seguinte mensagem: “Vozes de trolha não chegam ao céu. Na defesa do símbolo sempre” e que ainda arremessaram e deflagraram artefactos pirotécnicos (a saber: 2 flashligts; 1 pote de fumo e 2 tochas incandescentes), mostra-se manifesto que a mesma não logrou prevenir a violência no desporto (v.g. quer através do integral cumprimentos dos deveres de supervisão, de monotorização, de inspeção, quer através do integral cumprimento dos deveres para a educação e/ou promoção para o fair-play), desrespeitando não só os comandos constitucional, legais e regulamentares, como sobretudo os seus deveres in vigilando e in formando (que, sublinhe-se, conhecia: como resulta do ato sindicado e da defesa que apresentou e, acrescente-se dos regulamentos desportivos a que autovinculou): cfr. art. 79º n.º 2 in fine da CRP; art. 5º a art. 16º-A da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho; art. 2º e art. 5º da RAR n.º 52/2018; art. 17º do CD da FIFA e art. 16º do RD da UEFA. Aqui chegados, importa recordar que a recorrente alega que a decisão arbitral recorrida não só inverte as regras do ónus da prova, como desrespeita o princípio constitucional da culpa e da presunção de inocência, pois, não negando a ocorrência dos factos ilícitos, considera contudo ter sido confirmada sanção disciplinar impugnada por não ter alegado nem provado que cumpriu deveres, para além de considerar também que mesmo que tivesse tentado cumprir o ónus que o tribunal a quo lhe transferiu (ou seja, o ónus de provar a sua inocência) sempre o mesmo estaria coartado, uma vez que entende que o seu direito de defesa foi desconsiderado pela entidade recorrida, aquando da produção da prova testemunhal apresentada em sede disciplinar e, assim incorretamente sufragado pelo acórdão arbitral recorrido. Ponto é que “… uma questão que tem sido consensual entre a jurisprudência: a responsabilidade disciplinar dos clubes por comportamentos dos adeptos é subjetiva, portanto, dependente da sua atuação culposa, pelo que, interpretadas à luz do referido princípio, as referidas normas do RD LPFP não merecem reparo de natureza constitucional em face de não assentarem na responsabilidade objetiva dos clubes pela prática de atos de terceiros, em desrespeito do princípio da culpa e daquele que dele emana - a pessoalidade da responsabilidade sancionatória (cfr. n.ºs 2 e 3 do art. 30.º da CRP)…”: negrito introduzido pela relatora; in “A RESPONSABILIDADE DOS CLUBES DESPORTIVOS PELO COMPORTAMENTO DOS SEUS ADEPTOS. UMA ANÁLISE JURISPRUDENCIAL; Tiago Rodrigues Bastos; José Ricardo Gonçalves; Sérgio Castanheira; @pública – Revista Eletrónica de Direito Público; VOL. 8 N.º 1 abril 2021, fls. 86; www.e-publica.pt”. Relevando saber agora se os comportamentos antidesportivos melhor identificados nos presentes autos (recorde-se: desfraldar uma tarja, com dimensão superior a 1mx1m, com a seguinte mensagem: “Vozes de trolha não chegam ao céu. Na defesa do símbolo sempre”, arremesso e deflagração de 2 flashligts, de 1 pote de fumo e de 2 tochas incandescentes) se mostram suficientes, nomeadamente à luz do princípio de que “quem acusa tem o ónus de provar” e da aplicação das presunções judiciais/naturais e legais, para julgar, como foram incumpridos os deveres de vigilância e de formação a que a recorrente se encontrava obrigada. A resposta mostra-se afirmativa. Na exata medida em que o acórdão arbitral recorrido identificou com minúcia a motivação e, expressamente, referiu que: “… formou a sua convicção com base no acervo probatório carreado para os autos, cuja prova foi apreciada segundo as regras da experiência e da sua livre apreciação, (…) em estrita observância do princípio da livre apreciação da prova e do princípio in dúbio pro reo. (…). Note-se, de resto, que no âmbito do direito disciplinar desportivo, o princípio da livre apreciação da prova vê-se condicionado pelo valor especial e reforçado que os relatórios oficiais e declarações complementares das equipas de arbitragem e dos delegados da LPFP merecem tal contexto, em harmonia com o estipulado com o art. 13º, al. f) do RD LPFP (…), anote-se que, as chamadas presunções naturais ou hominis, que permitem ao julgador retirar de um facto conhecido ilações para adquirir um facto desconhecido são, em abono da verdade, o produto das regras de experiencia; o juiz, valendo-se de um certo facto e das regras da experiência, conclui que esse facto denuncia a existência de outro facto (…) a factualidade dada como assente resulta da instrução da causa, para além de qualquer dúvida razoável…”, deixando assim claro ter alcançado a verdade judicial e prática que não, necessariamente, a verdade ontológica: sublinhado nossos. Acresce resultar do acórdão arbitral recorrido que os árbitros do TAD apreciaram livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; sendo que a livre apreciação não abrangeu os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes: cfr. art. 607º n.º 5 do CPC ex vi art. 1º do CPTA ex vi art. 61º da Lei n.º 74/2013, de 06 de setembro, na redação atualizada; art. 169.° e art. 243.° ambos do Código de Processo Penal - CPP e art. 363.°, n.º 2 e art. 371º n.º 1 ambos do CC; art. 13 al. f) do RD LPFP e art. 44º do RD UEFA. Vale isto por dizer que o tribunal arbitral a quo ao confirmar a deliberação impugnada do Pleno da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da entidade demandada, datada de 2024-02-27, reconheceu também que tal deliberação assentava não só em prova suficiente, como ainda em prova com valor probatório reforçado, a saber: o relatório da equipa de arbitragem e, importa dize-lo: fê-lo corretamente à luz das disposições legais e regulamentares aplicáveis: cfr. art. 169º e art. 243º ambos do CPP e art. 363º, n.º 2 e art. 371º n.º 1 ambos do CC; art. 13º al. f) do RD LPFP e art. 44º do RD UEFA; neste sentido vide Acórdão deste TCAS, de 2024-06-20, processo 78/20BCLSB, disponível em www.dgsi.pt.. Mas significa também que o tribunal arbitral a quo ao analisar e decidir como o fez, não descurou a possibilidade de contraprova da demandante, ora recorrente, deixando então expresso no acórdão recorrido que a mesma, não logrou criar idónea dúvida na sua convicção probatória: vide factos assentes e não assente e motivação do acórdão recorrido. Com efeito, a concreta falta de contraprova da demandante (quer em sede graciosa, quer em sede judicial) também à prova de primeira aparência, ainda ínsita no ato sindicado confirmado pelo acórdão arbitral recorrido, descobre-se num olhar holístico sobre a peça processual em apreço (e, aliás bem exemplificado nas conclusões recursivas da recorrida pela falta de identificação de aplicação de qualquer medida sancionatória aos seus associados ou de tomada de providências, in loco, através dos delegados indicados por si para aquele jogo em concreto, para identificar e expulsar os responsáveis pelos comportamentos incorretos), circunstância que nada conflitua com as regras do ónus da prova, nem com o princípio da presunção da inocência ou da culpa. Isto porque, a recorrente podia ter identificado as diligências genéricas e/ou concretas que teria adotado no caso concreto, com vista a assegurar as obrigações de segurança a que estava obrigada (v.g. no cumprimento dos seus deveres de vigilância e sobretudo de formação), e não o fez. É certo que alegou, e arrolou prova, com vista a demonstrar o reforço dos protocolos de cooperação com as forças policiais, nomeadamente nos procedimentos de revista, mas não logrou provar que tal esforço tivesse alcançado o fim em vista. O que permitiu a conclusão, que se mostra acertada (porque em conformidade com o que resulta dos autos – o facto é que no recinto, e durante o evento, desportivo foi exibida tarja e deflagrados objeto pirotécnicos não autorizados - e com as normas legais e regulamentares aplicáveis e supra identificadas), que a recorrente não empregou (todas) as medidas exigidas pelas circunstâncias e (ainda) adequadas a evitar o comportamento antidesportivo verificado, uma vez que face à previsibilidade dos fenómenos causadores de risco para a vida e integridade física dos espetadores, ordem pública, património, igualdade e ética desportiva (recorde-se, atentos os dados da experiência sobre os fenómenos de violência no desporto, mas também no caso o cadastro disciplinar da sociedade desportiva recorrente, sobretudo por sanções semelhantes à infração disciplinar que o acórdão arbitral ora recorrido confirmou), capazes de constituir fontes de perigo para os espetadores como sejam, repete-se: no caso, a descrita tarja, com dimensão superior a 1mx1m, arremesso e deflagração de 2 flashligts, de 1 pote de fumo e de 2 tochas incandescentes. Resulta, pois, dos autos que a recorrente não logrou (sequer atempadamente) evitar tais condutas, nem detetar, denunciar, sinalizar ou remover tais objetos não autorizados, deste modo contribuindo para o consolidar “… de alguma impunidade permissiva, impeditiva de que se estabeleça uma franca e desejável convivência entre todos os participam e assistem…” ao espetáculo desportivo, em desrespeito das normas legais e regulamentares que lhe são aplicáveis: cfr. art. 79º n.º 2 in fine da CRP; art. 5º a art. 16º-A da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho; art. 2º e art. 5º da RAR n.º 52/2018; art. 17º do CD da FIFA e art. 16º do RD da UEFA; Acórdão do Tribunal Constitucional - TC n.º 730/95; Acórdão do TC n° 391/2015, de 12 de agosto, publicado no DR, II Série, de 2015-11-16; vide Acórdão deste TCAS, de 2024-06-20, processo 78/20BCLSB, disponível em www.dgsi.pt; art. 127º n.º 1; art. 187.º nº 1 al. b) do RD LPFP; Lei nº 113/2019, de 11 de setembro. Ou seja, a concreta exibição da descrita tarja, com dimensão superior a 1mx1m, e o arremesso e deflagração de 2 flashligts, de 1 pote de fumo e de 2 tochas incandescentes, não consubstancia um imprevisto, mas sim uma possibilidade, que podia (repete-se: atente-se v.g. na estrutura logística, nas atribuições e competências da sociedade desportiva recorrente e na previsibilidade, recorde-se ainda averbamento de antecedentes no seu registo de natureza disciplinar, referenciados na matéria dada por assente nos presentes autos) e devia, ter sido oportunamente antecipada pela recorrente, a qual não tendo demonstrado que, no âmbito do dever in vigilando e in formando a que está adstrita, praticou ato idóneo destinado a evitar os comportamentos antidesportivos de que está acusada foi, pois, por tais comportamentos corretamente responsabilizada às luz das normas do direito disciplinar desportivo, como bem concluiu a deliberação sindicada e, bem assim o confirmou o acórdão arbitral recorrido. Termos em que a decisão arbitral recorrida não padece do invocado erro de julgamento. DO ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO (v.g. inconstitucionalidade da Portaria nº 301/2015, de 22 de setembro): Nas palavras da Recorrente o artº 2º n.º 1, 4 e 5 da Portaria nº 301/2015, de 22 de setembro conjugado com a tabela constante do Anexo I (1.ª linha) da mesma Portaria, em ação de arbitragem necessária, com o valor de €4.465,00, é inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade (art. 18º n.º 2da CRP) e do princípio da tutela jurisdicional efetiva (art. 20º n.º 1 da CRP), devendo essas normas ser desaplicadas. Como se sumariou no Acórdão deste TCAS, de 2024-11-04, processo n.º 149/19.6BCLSB, que por se concordar e por ter inteira aplicação ao caso em concreto, se transcreve: “… o valor das custas finais fixados no acórdão arbitral do TAD espelha, na sua génese, uma dupla perspetiva: a primeira, a capacidade económica dos litigantes e a segunda, os custos a que a mesma se destina, ou seja, prover os custos mais elevados do serviço de justiça prestado pelos tribunais arbitrais, neste sentido intuído do valor concretamente fixado na segunda linha da tabela do Anexo I da Portaria nº 301/2015, de 22 de Setembro, de acordo com o estipulado nos nºs 1 e 5 do artº 2º deste diploma, o que não é inconstitucional…”. Vale isto por dizer que: “… a aplicação de uma sanção disciplinar de multa, para além da questão do seu montante, implica um juízo de censura sobre o comportamento do arguido, o registo da sua aplicação, "condicionando" comportamentos futuros face ao instituto da reincidência, bem como a sua desresponsabilização pelos atos praticados por adeptos e simpatizantes durante o espetáculo desportivo. Assim, a revogação de uma sanção disciplinar de multa, vai muito para além do envolvido. Assim sendo, preponderará o critério relativo a bens imateriais do art. 34.º, n.º 1 do CPTA, sendo o seu valor indeterminável, com a aplicação do art. 34º, nº 2 do CPTA…”.: cfr. Acórdão deste TCAS, de 2024-11-04, processo n.º 149/19.6BCLSB. Donde, alinhando com o entendimento jurisprudencial administrativo com o entendimento jurisprudencial constitucional, o valor das custas finais fixado pelo tribunal arbitral a quo à luz do disposto no invocado art. 2º n.º 1, 4 e 5 da Portaria nº 301/2015, de 22 de setembro conjugado com a tabela constante do Anexo I (1.ª linha) da mesma Portaria, não se mostra inconstitucional: cfr. Acórdão do TCAS, de 2024-11-04, processo n.º 149/19.6BCLSB; Acórdão do TCAS, de 2020-02-13, processo nº 149/17.0BCLSB e Acórdão do Tribunal Constitucional -TC, n.º 543/2019, de 2019-12-19, disponíveis em www.dgsi.pt. Termos em que, sem necessidade de mais amplas considerações, a decisão arbitral recorrida não padece outrossim do invocado erro de julgamento. *** IV. DECISÃO: Pelo exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Administrativo – Subsecção Social deste TCAS em julgar improcedente o recurso interposto e, em consequência, confirmar o acórdão arbitral recorrido. Custas pela recorrente. 19 de dezembro de 2024 (Teresa Caiado – relatora) (Rui Pereira – 1º adjunto) (Maria Helena Filipe – 2ª adjunta) |