Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 168/22.5BELLE |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 10/13/2022 |
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Relator: | JORGE CORTÊS |
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Descritores: | PENHORA DE IMÓVEL. PAGAMENTO DE DÍVIDA SUJEITA A PLANO DE PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES. |
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Sumário: | O produto da venda de imóvel penhorado à ordem de um processo de execução fiscal não pode ser afecto ao pagamento da dívida de outro processo de execução fiscal, mesmo que exista identidade do executado em ambos os processos. Não pode haver lugar a diligências de cobrança de dívida sujeita a plano de pagamento prestações, dado que a execução está suspensa. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO I- Relatório P ……………….. e C ……………….., notificados do ofício n.º 383, de 07/02/2022, que determinou a penhora de um imóvel de que são proprietários e da subsequente decisão de aplicação do produto da venda daquele no pagamento das prestações da dívida no âmbito do processo execução fiscal n.º ……………..489, deduziram reclamação, ao abrigo do preceituado nos artigos 276º e ss. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), através da qual requereram «a anulação do acto do órgão de execução que determinou a aplicação do valor de €29.913,73 ao pagamento do valor em divida no processo de execução fiscal n.º ……………..489». Por meio de sentença de 18/06/2022, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, julgou improcedente a reclamação, mantendo na ordem jurídica o acto impugnado. Os reclamantes interpuseram recurso, no qual alegaram e formularam as conclusões seguintes: 1. O processo de execução fiscal n.º ……………489, subjacente à Reclamação que deu causa a este Recurso, encontrava-se garantido e existia um plano de pagamento em prestações aprovado e a ser cumprido. 2. A fracção autónoma não se encontrava penhorada à ordem daquele processo. 3. À data dos factos, no processo de execução fiscal n.º …………..070, havia sido requerido o pagamento em prestações e oferecida garantia, estando pendente Reclamação Judicial, pugnando no sentido de ser aceite o pagamento em 60 prestações, a qual veio a ser aceite. 4. Tendo tomado conhecimento de que os Recorrentes iriam vender a fracção autónoma acima identificada, no dia 07.02.2022, o serviço de finanças de Portimão apressou-se a penhorar a fracção em causa, para garantia do valor devido nos processos de execução fiscal n.ºs ………070 e …………088, ambos respeitantes ao IRS de 2015 e 2017. 5. A escritura pública de compra e venda da fracção autónoma, agendada para 07.02.2022, teve de ser adiada para o dia 11.02.2022, uma vez que a Autoridade Tributária não permitiu que as guias de IMT e de IS fossem emitidas atempadamente - correndo o risco de que os adquirentes perdessem o interesse na aquisição da fracção, com os prejuízos que isso poderia trazer aos Recorrentes. 6. O Serviço de Finanças de Portimão não notificou os Recorrentes e informou a Mandatária dos Recorrentes, por email de 10.02.2022 (10h52m), da presença deste funcionário da AT no local da celebração da escritura de compra e venda com vista à recolha do cheque bancário de €115.200 e entrega do IMT e Imposto de Selo, indicando ainda que da aplicação do valor de €115.200 seriam antecipadas as prestações do plano prestacional que se encontrava a decorrer e o restante aplicado no processo 11122022101255070 e apensos - o despacho que assim determinou foi proferido em 11.02.2022 e não foi notificado aos Recorrentes. 7. No dia 11.02.2022 foi outorgada a escritura pública de compra e venda da fracção autónoma, pelo preço total de €128.000, sendo que €12.800 haviam sido pagos a título de sinal, directamente aos Recorrentes, e €115.200 foram pagos em cheque, a título de pagamento do valor remanescente do preço, e entregues directamente ao representante da Fazenda Pública presente na escritura. 8. Com efeito, o serviço de finanças de Portimão solicitou à Direcção de Finanças de Lisboa que indicasse um funcionário para estar presente no cartório notarial e receber o cheque, o que veio a suceder. 9. Finalmente, o Serviço de Finanças de Portimão enviou à Mandatária dos Recorrentes, por email, cópia do cheque e das guias de pagamento e informou-a de que os cheques haviam sido aplicados no pagamento dos valores em dívida, a saber, o cheque n.º ……………. do B……., no valor de €115.200, foi aplicado (i) no pagamento da guia modelo 50 no valor de €85.286,27, no processo de execução fiscal n.º …………..070, e na guia modelo 50 no valor de €29.913,73, no processo de execução fiscal n.º ………..489. 10. A fracção autónoma não se encontrava penhorada à ordem daquele processo. 11. O processo de execução fiscal n.º …………..489 encontrava-se garantido e existia um plano de pagamento em prestações aprovado e a ser cumprido. 12. O Serviço de Finanças de Portimão estava informado sobre as garantias a prestar e estava pendente uma reclamação judicial que implicava a suspensão dos processos de execução fiscal n.ºs 1112202101255070 e 111202101255088. 13. Os Recorrentes e a sua Mandatária não aceitaram a penhora do imóvel nem a aplicação do valor ao pagamento de quaisquer valores, não podendo tal aceitação ser presumida. 14. A conduta do Serviço de Finanças de Portimão é ilegal e inconstitucional, por violação dos artigos 196.º e seguintes do CPPT, 55.º da LGT e 266.º da CRP, pelo que não pode manter-se na ordem jurídica. X Não há registo de contra-alegações.X A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal notificada para o efeito, emitiu parecer no qual entende ser de conceder provimento ao recurso.X Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, cumpre apreciar e decidir.X II- Fundamentação1.De Facto. A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: A. Contra os Reclamante correu, no Serviço de Finanças de Portimão, o processo de execução fiscal n.º …………..489, a que foi apensado o processo de execução fiscal n.º …………979 - facto que se extrai o documento identificado como n.º 1, constante nos autos. B. Os Reclamantes apresentaram pedido de pagamento em prestações no âmbito dos procedimentos de execução fiscal acima referidos - facto que emerge do requerimento a fls. 177 dos autos, numeração SITAF. C. O pedido de pagamento em prestações apresentado pelos Reclamantes foi deferido, nos moldes definidos no “print” do sistema informático da Autoridade Tributária, cujo excerto se segue: «Texto no original» D. Em 7 de Fevereiro de 2022, foi determinada, no âmbito dos processos de execução fiscal n.º ………….070 e ……..888, a penhora do seguinte bem [doravante igualmente identificado apenas como imóvel] (doc. 9, junto com a p.i.): «Texto no original» E. Por comunicação electrónica datada de 10 de Fevereiro de 2022, a mandatária dos Reclamantes, participou ao Serviço de Finanças de Portimão, o seguinte (doc. 8 junto com a p.i.): «Texto no original» F. Antecedendo a comunicação acima referida, constava, infra, comunicações electrónicas com o seguinte teor: «Texto no original» G. À comunicação electrónica enviada pela mandatária dos Reclamantes, melhor identificada na alínea E), o Serviço de Finanças de Portimão, respondeu o seguinte: X Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:P) Em 11/03/2022, os serviços elaboraram informação, ao abrigo do disposto no artigo 277.º/2, do CPPT, da qual consta, entre o mais, o seguinte: «22-Verifica-se ainda que com referência ao processo executivo nº ………….070, em 2022.02.11, foi efetuado um pagamento voluntário através do DUC (Documento Único de Cobrança) nº …………….., no montante de € 85.286,27. // 23- Consultada a tramitação dos processos de execução fiscal (PEFs) nº …………..489 e …………..979, no Sistema de Execuções Fiscais (SEFWEB), verifica-se que os mesmos se encontram extintos por pagamento voluntário em 2022.02.11, com o pagamento do DUC (Documento Único de Cobrança) nº 2………………, no valor de € 29.913,73. // A reclamação tem por fundamento a ilegalidade, inconstitucionalidade e inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que foi realizada, por violação dos artigos 266º da CRP, alínea a) e e) do nº 2 do artigo 8º da LGT, artigo 55º da LGT e artigo 59º da LGT. // Nos termos do nº 2 do art.º 277º do CPPT, o órgão da execução fiscal poderá ou não revogar o ato reclamado. // Perante o exposto, verifica-se que foi remetido o ofício nº 416 em 2022.02.11, à Conservatória do Registo Predial de Portimão, para desistência da penhora da fração autónoma designada pela letra “…”, inscrita na matriz predial urbana da freguesia de ……., concelho de …………, sob o artigo nº …….., efetuada à ordem dos processos executivos nº 1…………070 e ………….088, e, salvo melhor opinião, parece ser de manter o pagamento efetuado nos processos executivos nº …………….489 e …………979, no valor de € 29.913,73, e remeter o processo ao tribunal». X 2.2. De Direito.2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento em que terá incorrido a sentença sob escrutínio. Está em causa o acto que determinou a aplicação do produto da venda do imóvel penhorado, referido na alínea D), do probatório, ao pagamento da dívida exequenda, cujo processo de execução corre termos em nome dos recorrentes sob o n.º …………..489. Ou seja, não está em causa nos autos a afectação do produto da venda em apreço ao pagamento da dívida cuja cobrança coerciva é assegurada através dos processos de execução fiscal n.os …………..070 e ………..088. Mas apenas a parte do acto que determinou o pagamento da dívida titulada pelo processo de execução fiscal n.º ………….489. A sentença julgou improcedente a presente reclamação judicial. Estruturou, para tanto, a argumentação seguinte. «No caso dos autos, da prova produzida, resulta que, previamente à celebração da escritura pública de compra e venda do imóvel em causa, e para efeitos da emissão das guias de impostos sobre o património necessárias à sua celebração, os Reclamantes, através da sua mandatária, foram informados de que do valor de € 115.200,00 seriam antecipadas as prestações do plano prestacional que se encontrava a decorrer [e aplicado o remanescente no processo 1112-2021/01255070 e apenso]. // Condições que aceitaram, atenta a emissão do cheque do valor remanescente à ordem do I…….. E.P.E, entregue aos serviços da Administração Tributária, no seguimento da celebração da escritura, e que originou a aplicação do montante agora em crise». 2.2.2. Os recorrentes assacam à sentença sob escrutínio erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa. Afirmam que a afectação do produto da venda ao pagamento de dívida não garantida pela penhora em causa é ilegal e inconstitucional. Está em causa pagamento voluntário, mas não espontâneo, da dívida exequenda, associada ao processo de execução fiscal n.º 1………….489. A falta de espontaneidade do pagamento deve-se ao facto de a liquidação da dívida ter ocorrido na sequência de penhora do imóvel - referido na alínea D) -, decretada pelos serviços da recorrida, após tomarem conhecimento da decisão de venda do mesmo, tomada pelos recorrentes. Suscita-se a questão de saber se a recorrida pode afectar o produto da venda ao pagamento de dívida associada a processo de execução fiscal diferente daquele que “usufrui” da garantia corporizada na penhora do imóvel em causa. A afectação em exame mostra-se precludida, dado que a apreensão judicial do imóvel, confere garantia ao credor exequente, apenas em relação aos créditos, cobrados em processo executivo, no âmbito do qual foi adoptada a diligência de apreensão em causa (artigos 822.º e 824.º do Código Civil). Tal significa que o direito real de garantia associado à penhora em referência apenas opera em relação aos créditos fiscais garantidos, no âmbito de tal processo executivo e não em relação a outros. Pelo que a afectação do produto da venda em relação ao crédito exequendo titulado pelo processo de execução fiscal n.º ………489 não pode ser admitida, porquanto a penhora foi realizada no âmbito dos processos de execução fiscal n.os …………070 e …………888. Mais se refere que, havendo plano de pagamento em prestações da dívida exequenda (1), no quadro do processo de execução fiscal n.º …………489 (2), o qual se mostra vigente, não pode a Administração Fiscal, realizar diligências de cobrança coerciva e pagamento da dívida, ao arrepio do mesmo, porquanto tal actuação contraria o regime de pagamento em prestações da dívida exequenda (3). O acto impugnado incorreu nas ilegalidades apontadas, pelo que não se pode manter, devendo ser anulado. Ao decidir em sentido discrepante, a sentença sob recurso deve ser revogada e substituída por decisão que jugue procedente a reclamação judicial. Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso. Dispositivo Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a reclamação judicial, anulando o acto impugnado, no segmento referido em 2.2.2. Custas pela recorrida, sem prejuízo da dispensa da taxa de justiça, dado não ter oferecida contra-alegações. Registe. Notifique. (Jorge Cortês - Relator) (1) Artigo 196.º do CPPT.(1.ª Adjunta – Patrícia Manuel Pires) (2.ª Adjunto – Vital Brito Lopes) (2) Alínea C), do probatório. (3) Neste sentido, v. Acórdão do STA, de 03/05/2017, P. 0435/17. |