Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:30375/24.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:09/25/2025
Relator:JOANA COSTA E NORA
Descritores:EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
DECISÃO RECORRÍVEL
REFORMA DA SENTENÇA
Sumário:A sentença que declara extinta a instância por inutilidade superveniente da lide não aprecia o mérito da causa, pelo que é passível de recurso, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 142.º do CPTA, e, assim sendo, o requerimento de reforma da sentença quanto a custas tem de ser feito na alegação de recurso, e não ao tribunal que proferiu a sentença, nos termos conjugados dos n.ºs 1 e 3 do artigo 616.º do CPC.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

Acordam, em conferência, os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul:


I – RELATÓRIO


J… intentou intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, contra a COMISSÃO PARA A IGUALDADE NO TRABALHO E NO EMPREGO. Pede a intimação da entidade demandada a satisfazer a sua pretensão informativa.
Pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa foi proferida sentença a julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, condenando a entidade demandada no pagamento das custas.
A entidade demandada requereu, ao abrigo do n.º 1 do artigo 616.º do CPC, a reforma da sentença quanto a custas, pugnando pela sua isenção, nos termos da alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP).
Em 24.06.2025, o Tribunal a quo proferiu despacho de não admissão do pedido de reforma da sentença.
A entidade demandada interpôs recurso de apelação tendo por objecto tal despacho, cujas alegações contêm as seguintes conclusões:
“A) O presente recurso é admissível, nos termos dos artigos 140.º e seguintes do CPTA, nomeadamente, o artigo 142.º, n.º 3 , alínea b) do mesmo Código, por se tratar de matéria sancionatória.
B) A ora recorrente, não poderia ter apresentado qualquer recurso da sentença de 08.01.2025, relativa à ação de intimação para prestação de informações, uma vez que, só após ter sido citada para a ação, prestou a informação, que já lhe havia sido pedida anteriormente pela, ora recorrida, e, a que, ainda, não tinha sido possível responder, pela ora recorrente. Este facto foi considerado provado pela aludida sentença, de 08.01.2025.
C) A ora recorrente apenas lhe restava a possibilidade de recorrer à reforma da sentença quanto a custas, nos termos do n.º 1 do artigo 616.º do C. P. Civil, por força do artigo 1.º do CPTA.
D) Estipula a alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do R.C.P., que, “estão isentos de custas as entidades públicas quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estão especialmente conferidos pelo respetivo estatuto, e a quem a lei especialmente atribua legitimidade processual nestas matérias”, o que é o caso da CITE, cuja lei orgânica aprovada pelo Governo, bem o demonstra, através do Decreto-Lei n.º 76/2012, de 26 de março.
E) As atribuições que são conferidas à CITE pela referida lei, demonstram que esta Comissão está isenta de custas, em qualquer circunstância processual em que se encontre, seja como ré numa ação de intimação para prestação de informações, seja como ré numa ação administrativa de impugnação de deliberação de parecer vinculativo, que tenha emitido, em virtude da sua missão se inserir sempre em defesa de direitos fundamentais dos cidadãos, pelo que a sua ação abrange, essencialmente, uma das tarefas fundamentais do Estado, que é a de promover a igualdade entre homens e mulheres, conforme dispõe o artigo 9.º alínea h) da Constituição da República Portuguesa.
F) Assim, face ao que antecede e pelo que será doutamente suprido por V. Exas., deve dar-se provimento ao presente recurso, em virtude da falta de fundamentação legal do despacho recorrido, por não ter aplicado bem os preceitos referidos nas alíneas anteriores, devendo interpretar-se e aplicar-se no sentido aí expresso, anulando-se a decisão recorrida, nos termos do artigo 149.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o que se afigura de elementar JUSTIÇA.”
A recorrida não respondeu à alegação da recorrente.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, não emitiu pronúncia.
Com dispensa de vistos dos juízes-adjuntos (cfr. n.º 4 do artigo 657.º do CPC), cumpre apreciar e decidir.


II – QUESTÕES A DECIDIR

Face às conclusões das alegações de recurso – que delimitam o respectivo objecto, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC -, a questão que ao Tribunal cumpre solucionar é a de saber se o despacho de 24.06.2025 padece de erro de julgamento de direito.


III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O despacho recorrido não fixou factos.


IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

O despacho recorrido não admitiu o pedido de reforma da sentença quanto a custas apresentado pela recorrente, considerando que a sentença era passível de recurso, nos termos dos artigos 140.º, n.º 1, e 142.º, n.º 3, alínea d), do CPTA, e atento o disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 616.º do CPC. Mais se afirmou no despacho recorrido que a ora recorrente foi demandada, no âmbito dos presentes autos de intimação para prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões, por não ter prestado à requerente um conjunto de informações que esta lhe solicitou, e não para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estejam especialmente conferidos pelo respetivo estatuto, não se enquadrando no âmbito da isenção estabelecida no artigo 4.º, n.º 1, alínea g), do RCP, pelo que, ainda que o pedido de reforma da sentença fosse admissível, este sempre se mostraria improcedente.
Insurge-se a recorrente contra o assim decidido, alegando que não poderia ter interposto recurso da sentença proferida nos presentes autos uma vez que, só após a citação, prestou a informação requerida, pelo que apenas poderia impugnar a sua condenação em custas através da reforma da sentença, nos termos do n.º 1 do artigo 616.º do CPC. Mais alega que está isenta de custas, nos termos da alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do RCP, porquanto as atribuições que lhe são conferidas pela sua lei orgânica, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 76/2012, de 26 de Março, demonstram que tal isenção opera em qualquer circunstância processual em que se encontre, em virtude da sua missão se inserir sempre em defesa de direitos fundamentais dos cidadãos, abrangendo a sua acção a promoção da igualdade entre homens e mulheres.
Vejamos.
Dispõe o artigo 616.º do CPC, nos seus n.ºs 1 e 3, o seguinte: “1 - A parte pode requerer, no tribunal que proferiu a sentença, a sua reforma quanto a custas e multa, sem prejuízo do disposto no n.º 3.(…) 3 - Cabendo recurso da decisão que condene em custas ou multa, o requerimento previsto no n.º 1 é feito na alegação.” Ou seja, a parte pode requerer, no tribunal que proferiu a sentença, a sua reforma quanto a custas e multa, mas se couber recurso da decisão que condene em custas ou multa, tal requerimento é feito na alegação de recurso.
Assim, para aferir da admissibilidade do pedido de reforma da sentença quanto a custas, há que determinar se a sentença é passível de recurso.
A sentença proferida nos presentes autos julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, em virtude de, na pendência da acção, a entidade demandada ter remetido à autora certidão da qual constava a informação pela mesma requerida, com o que ficou satisfeito o efeito útil pela mesma pretendido. Nestes termos, a sentença proferida pôs termo ao processo sem se pronunciar sobre o mérito da causa. Com efeito, a instância foi extinta sem se apreciar o pedido, e apenas porque o mesmo foi satisfeito pela entidade demandada.
Ora, nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 142.º do CPTA, é sempre admissível recurso, independentemente do valor da causa e da sucumbência, das decisões que ponham termo ao processo sem se pronunciarem sobre o mérito da causa.
Não tendo a sentença proferida nos presentes autos apreciado o mérito da causa, era a mesma passível de recurso, pelo que o requerimento de reforma da mesma quanto a custas teria de ser feito na alegação de recurso, e não ao tribunal que proferiu a sentença, nos termos conjugados dos n.ºs 1 e 3 do artigo 616.º do CPC.
Nestes termos, bem andou o Tribunal a quo ao não admitir o pedido de reforma da sentença quanto a custas.
Não obstante não o ter admitido, o certo é que o Tribunal, no despacho recorrido, acabou por se pronunciar sobre o requerido, no sentido do respectivo indeferimento, pelo que, dado que o recorrente se insurge também quanto a tal pronúncia, importa apreciar o acerto da mesma.
Está em causa saber se a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego beneficia da isenção de custas prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do RCP, tendo sido demandada em processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões.
Dispõe tal norma que estão isentas de custas as entidades públicas quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto, e a quem a lei especialmente atribua legitimidade processual nestas matérias.
Ora, sendo demandada em processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões, a recorrente não actua no âmbito das suas especiais atribuições para defesa de direitos fundamentais dos cidadãos ou de interesses difusos, estando em causa, antes, o dever de facultar o acesso a informação administrativa que sobre a mesma impende. Não se incluindo a situação em apreço no âmbito de aplicação da norma invocada pela recorrente para sustentar a sua isenção de custas, improcede também nesta parte o recurso.
Termos em que improcede o recurso.
*
Vencida, é a recorrente responsável pelo pagamento das custas, nos termos dos artigos 527.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.

V – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 25 de Setembro de 2025

Joana Costa e Nora (Relatora)
Marta Cavaleira
Marcelo Mendonça