Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 392/09.8BECTB |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 06/19/2024 |
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Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
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Descritores: | IRS MAIS-VALIAS IMOBILIÁRIAS REGIME TRANSITÓRIO CASA DE HABITAÇÃO PROVA RECLAMAÇÃO GRACIOSA TEMPESTIVIDADE |
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Sumário: | I - O respeito pelo princípio do inquisitório implica que, sendo relevantes para a descoberta da verdade material, se levem a cabo diligências de prova, quer requeridas pelas partes, quer mesmo oficiosamente. II - O momento temporal relevante para efeitos de determinação da aplicação do regime transitório constante do art.º 5.º do DL n.º 442-A/88, de 30 de novembro, é o do início da vigência do CIRS e o do fim da vigência do CIMV e não a data de aquisição do imóvel alienado. III - Uma casa não deixa de ser de habitação, por referência a 31.12.1988, apenas por não dispor de um conjunto de condições que a FP entende que deveria ter, quando está provado que há décadas que a mesma era habitada. IV - Uma casa de habitação pobre não deixa de ser uma casa de habitação. V - A posição da FP sustenta-se em afirmações que revelam um profundo desconhecimento da realidade do país, designadamente na década de 80 do século XX, na beira interior, onde, como é do conhecimento geral, eram inúmeras as situações de casas de habitação sem água canalizada, simplesmente por ela não estar disponível à população. VI - A circunstância de as matrizes revelarem profundas incorreções, situação que também não era rara à época, não descarateriza a realidade fática. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acórdão I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio recorrer da sentença proferida a 30.10.2016, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por I… (doravante Recorrida ou Impugnante), que teve por objeto o indeferimento da reclamação graciosa que versou sobre a liquidação oficiosa de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), relativa ao ano de 2003. O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Nas suas alegações, a Recorrente concluiu nos seguintes termos: “1 - Perante a existência de datas divergentes para a prova da notificação da liquidação impugnada - 26/11/2007 - invocada pela impugnante - e 23/11/2007 - indicada pela Administração Tributária na decisão de reclamação graciosa - impunha-se ao Tribunal “ quo”, averiguar qual delas correspondia à realidade dos factos, ao invés de ter “optado” pela data invocada pela impugnante, sem que para tanto tenha sido apresentada qualquer prova que demonstrasse a veracidade desta alegação. 2 - Não pode o Tribunal “ a quo” dar como assente um facto que apenas foi alegado por uma das partes, sem qualquer sustentabilidade probatória, pela simples razão de a outra parte não o ter alegado, porquanto, havendo evidencias no PA que a data de notificação da liquidação impugnada é distinta daquela que foi alegada pela impugnante, o Tribunal “a quo” deveria investigar qual das duas datas corresponderia à verdade dos factos, independentemente de a Fazenda Pública ter ou não feito referencia expressa a tal data, pois o conhecimento da data de notificação da liquidação impugnada constituí nos presentes autos questão essencial cuja procedência dependerá a continuidade da apreciação ou não do mérito da mesma e o desfecho dos presentes autos. 3 - No caso em apreço, houve omissão do acto (notificação) que permitiria à Fazenda Pública a possibilidade de se pronunciar sobre a questão de facto relativa à data de notificação da liquidação impugnada, em manifesta violação do disposto no n° 3 do artigo 3.º do CPC. 4 - Por outro lado, é também manifesta a susceptibilidade de essa omissão influir na decisão da causa, na medida em que impediu a Fazenda Pública de nela influir activamente, designadamente, mediante a apresentação de provas documentais, que concretizando o princípio do contraditório pudessem ser ponderadas na decisão, independentemente de serem nela atendidos. 5 - A omissão da notificação para assegurar à Fazenda Pública a possibilidade de se pronunciar sobre a prova da data de notificação da liquidação impugnada, porque influi no exame da decisão da causa, constitui nulidade processual (artigos 195, n° 1 e 3, n° 3 do CPC, aplicáveis ex vi da alínea e) do artigo 2º do CPPT) o que inquina a validade dos actos posteriormente praticados, incluindo a decisão recorrida. 6 - Ao desprezar os elementos probatórios constantes do PA junto pela Fazenda Pública, designadamente, o processo de reclamação graciosa, e ao partir do pressuposto que a data alegada pela impugnante era a data de notificação da liquidação impugnada, a sentença recorrida violou: o principio da investigação ou inquisitório, porquanto, não cuidou de averiguar/investigar qual a data em que efectivamente a impugnante foi notificada da liquidação; O principio da descoberta da verdade material, porquanto, não tendo ordenado a realização de diligencias de investigação com vista ao apuramento da data de notificação, não se apurou a verdade dos factos, tendo optado por uma mera alegação, sem qualquer sustentabilidade probatória; O principio da igualdade das partes, porquanto, ao optar por uma alegação efectuada por uma das partes (da impugnante ) sem qualquer base probatória, em detrimento de evidencias existentes nos autos carreadas pela outra parte (Fazenda Pública) beneficiou uma das partes, sem conceder à outra parte a oportunidade de confirmar as evidencias constantes do PA, que iriam demonstrar a tese da improcedência da presente impugnação como consequência da in3vidade da reclamação graciosa. 7 - A violação dos princípios supra referidos, provocou um défice instrutório de prova, que impediu o Tribunal “a quo” de conhecer a verdade dos factos, culminando numa decisão que frustra os legítimos direitos e interesses da Fazenda Pública, máxime da realização da justiça. 8 - Neste contexto, e porque o Tribunal “a quo, não investigou a existência de provas adicionais àquelas que a Fazenda Pública juntou no PA, no sentido de dar como provado que a impugnante foi presumivelmente notificada da liquidação impugnada no dia 23/11/2007, juntam-se os documentos numerados de 1 a 12 que complementam o referido elemento de prova e permitem a este Digno Tribunal verificar que a impugnante foi presumivelmente notificada da liquidação em apreço, na data consignada na decisão de reclamação graciosa, ou seja, no dia 23/11/2007 — vide docs. 1 a 12 que complementam a prova documental existente no PA, designadamente a decisão de reclamação graciosa. 9- O Tribunal “a quo” ao dar como não provada a data de notificação da liquidação impugnada, e partir do pressuposto que a data sugerida pela impugnante seria a data a considerar para efeitos de notificação da liquidação, violou as regras instituídas pelos artigos 38° e 39° do CPPT, estando a douta sentença recorrida ferida de vicio de violação de lei que inquina a validade da decisão recorrida. 10 - À luz do quadro legal vigente à data dos factos, a reclamação graciosa deve ser considerada intempestiva, pelo que se impõe concluir que assiste razão à Fazenda Pública quando alega que a presente impugnação deve ser julgada improcedente em consequência da intempestividade da reclamação graciosa apresentada pela impugnante. 11 - Quanto à apreciação do mérito da impugnação, a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento, por errada apreciação da prova produzida e do regime jurídico aplicável à questão controvertida dos autos, que inquinam a validade da mesma. 12 - A douta sentença recorrida, erra quando estabelece um paralelismo entre a situação factual dos presentes autos e a situação factual do aresto que serviu de fundamentação à sua decisão. 13 - Desde logo, contrariamente ao que é defendido pela douta sentença recorrida, no âmbito dos presentes autos não estamos perante um terreno que foi adquirido como rústico em data anterior a 1/01/89 (data da entrada em vigor do CIRS) mas sim perante um prédio misto, composto por terra de cultura com oliveiras, com uma casa térrea para arrumos — vide escritura de compra e venda a fls. 31 a fls. 35 junto à contestação que constitui o PA. 14 - Não estando perante a mesma realidade factual, não pode o Tribunal “a quo” “arrastar” para a sua fundamentação, um acórdão que teve na sua mira de apreciação e decisão uma realidade factual distinta. 15 - Contrariamente à tese defendida pela douta sentença recorrida, a norma transitória contida no artigo 5º, n° 1, do Decreto-Lei n° 442-A/88, não é aplicável ao facto tributário que despoletou a liquidação impugnada, porquanto, a realidade física e jurídica que a impugnante adquiriu em 22 de Maio de 1985 é manifestamente distinta da realidade física e jurídica que a impugnante alienou em 31 de Outubro de 2003. 16 - A escritura de compra e venda celebrada em 22 de Maio de 1985, é clara na descrição que efectua do prédio que foi adquirido pela impugnante: “(...)prédio misto sito no M…, Freguesia da R…, Concelho de Celorico da Beira, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 6…, composto por terra de cultura com oliveiras, com uma casa térrea para arrumos - vide escritura de compra e venda a fls. 31 a fls. 35 juntas com a contestação, que constitui o PA. 17 - Conforme decorre da referida escritura, não existe qualquer referência a casa para habitação, nem muito menos qualquer descrição da mesma, apenas a menção a uma casa térrea para arrumos! 18 - Por seu turno, em 13 de Maio de 1997, o então marido da impugnante R…, apresentou perante o serviço de finanças de Celorico da Beira, um requerimento no âmbito do qual solicitava que fosse anexado ao prédio rústico sob o artigo 6..., uma casa de arrumos conforme escritura datada de 28 de Junho de 1985 — vide requerimento a fls. 59, junto à contestação, que constitui o PA. 19 - Posteriormente, em 3 de Julho de 2003, o então marido da impugnante, R…, apresentou no serviço de finanças de Celorico da Beira, a declaração Modelo 129 - declaração para inscrição ou alteração de inscrição de prédios urbanos na matriz - declarou no quadro 06 que o prédio urbano era “uma casa de um único piso (térrea) destinada a habitação com um anexo para arrumos” - vide fls. 36 a fls. 39, juntas à contestação, que constitui o PA. 20 - No quadro 08, o referido R…, declarou que o motivo que deu lugar à apresentação da declaração foi a modificação do prédio urbano, tendo no quadro 10 - outros elementos - declarado que o prédio urbano estava omisso há mais de 20 anos - fls. 36, juntas à contestação, que constitui o PA. 21- Em toda a prova documental que se encontra junta aos autos, não existe qualquer referencia a casa de habitação, na verdade, tal descrição apenas surge na escritura de compra e venda datada de 26.03.2007, quando a impugnante vende ao sujeito passivo J… um prédio destinado à habitação, sob o artigo 471° da freguesia da Ratoeira. 22 - A douta sentença recorrida errou quando entendeu que o prédio adquirido pela impugnante em 22 de Maio de 1985, era um prédio rústico, quando na realidade a escritura de compra e venda e as restantes evidencias documentais dos autos - veja-se o requerimento apresentado pelo então marido da impugnante, R…, em 13 de Maio de 1997,a fls. 59, juntas com a contestação que constitui o PA — são demonstrativas que estamos perante um prédio misto, constituído por uma parte rústica e uma parte urbana que era constituída por uma casa de arrumos. 23 - Contrariamente ao que a douta sentença recorrida entendeu, quando a impugnante adquiriu o prédio misto, a parte urbana era exclusivamente constituída por uma casa térrea para arrumos e não por uma casa destinada à habitação. 24 - As obras que foram efectuadas na parte urbana do prédio supra identificado, originaram uma parte de prédio susceptível de utilização independente e de inscrição matricial separada, modificando o conteúdo originário do direito, como também da titularidade da parte modificada, susceptível de utilização independente, tendo implicado uma variação do valor tributável do prédio inicial. 25 - Com efeito, aquando da aquisição do prédio misto estávamos perante uma casa térrea para arrumos e após a venda estamos perante uma casa de um único piso destinada a habitação, compota por 4 assoalhadas. 1 cozinha, 1 casa de banho, 1 vestíbulo e corredor e unia despensa/arrecadação. 26 -Sempre que a data relevante para efeitos de inscrição matricial e de sujeição a tributação na parte modificada/ampliada/melhorada de um prédio, susceptível de utilização independente, tenha ocorrido após a entrada em vigor do CIRS - facto que se verificou na situação sub júdice - a posterior alienação onerosa daquela parte, separada ou conjuntamente com o prédio em que se integra, é abrangida pela previsão normativa da alínea a) do n° 1 do artigo 10° do CIRS, não lhe podendo aproveitar a exclusão tributária prevista no artigo 5° do Decreto-Lei n° 442-A/88, de 30 de Novembro. 27 - A douta sentença recorrida refere que a prova produzida nos presentes autos, permite concluir que à data da aquisição do terreno existia uma casa de habitação cujas condições de salubridade ou de conforto não relevam para o caso dos autos, em virtude de não ter resultado provada a alteração da substancia da mesma, visto destinar-se antes e depois da entrada em vigor do CIRS a habitação. 28 - Toda a prova documental existente nos autos, evidencia que só em 2003, é que a casa de arrumos, passou a ter características que a adaptaram de forma a poder afectar a mesma a habitação, sendo certo, que até essa data, toda a prova documental vai no sentido de estarmos perante uma casa de arrumos, sem qualquer possibilidade de ser habitável. 29 - A douta sentença recorrida para concluir que se trata de uma casa destinada à habitação, fez letra morta de todas as evidencias documentais e deu como provados os seguintes factos, que resultaram do depoimento da testemunha M…, da testemunha J… e da testemunha J…: “ a casa tinha quatro divisões, não tinha quarto de banho; tinha janelas e tinha lareira” 30 - Certo é que as mesmas testemunhas, designadamente, as testemunhas J… e da testemunha J…, não souberam referir quantas divisões tinha a casa, disseram que não tinha casa de banho, não tinha canalização, tinha o chão em terra batida, não souberam precisar, com certeza, quantas janelas e portas tinha, mas referindo que tinha uma lareira. Todavia, quanto a estes factos, o Tribunal “a quo” nem uma palavra referiu sobre os mesmos, apesar de dizer que todos os depoimentos se mostraram credíveis. 31 - Perante a prova documental existente nos autos, e as poucas e imprecisas indicações das testemunhas, não se consegue perceber como é que o Tribunal “ a quo “ conclui, sem qualquer hesitação, pela existência de casa destinada à habitação, quando todas as evidencias documentais, nas quais a impugnante e a testemunha R… são intervenientes (veja-se a aquisição do imóvel, a alienação do imóvel, a apresentação do requerimento pedindo a anexação da casa de arrumos ao prédio sob o artigo 6...°, a apresentação da declaração modelo 129,) são demonstrativas do contrário, ou seja, que não existia uma casa de habitação, mas antes uma casa de arrumos, desprovida de características passíveis de a considerar habitável. 32 - Da generalidade do depoimento das testemunhas inquiridas, resultou claro, que a casa que foi adquirida pela impugnante, só se tomou habitável, depois das obras que a mesma efectuou, sendo certo que até esse momento a casa, apesar de ter lareira, portas e janelas, não detinha as características mínimas que permitissem a sua habitabilidade. 33 - Não obstante o Tribunal “ a quo” referir que “todos os depoimentos foram livre, prontos e credíveis, não obstante existir alguma desconformidade quanto a pormenores sobre os quais testemunharam, o que, analisado em conjunto, não abalou a credibilidade das testemunhas” a verdade é a douta sentença recorrida sofre de défice instrutório, porquanto, não deu como provados factos relevantes que foram referidos pelas testemunhas, como por exemplo: o facto de o chão da casa ser de terra batida (facto dito e repetido várias vezes pela testemunha J…); o facto de a casa não ter água, não ter canalização, facto referido pelas testemunhas J… e R…; o facto de a casa não ter isolamento, facto referido pela testemunha J…; O facto de todas as testemunhas referirem que para a recorrente a tomar habitável teve de efectuar obras. 34- Atenta a relevância que estes factos assumem para ajusta composição do litigio em apreço, devem os mesmos ser aditados ao rol dos factos que o Tribunal “a quo” deu como provados, o que desde já se requer. 35 -Face à prova produzida, resulta que o acto tributário em sindicância, não padece de qualquer vicio susceptível de abalar a sua validade, não sendo imputável aos serviços da Administração Tributária, qualquer erro, quer o erro sobre os pressupostos de facto, quer o erro sobre os pressupostos de direito, porquanto, a Administração Tributária efectuou um correcto enquadramento dos factos ao direito aplicável, impondo-se, por isso, concluir, que não são devidos juros indemnizatórios, pelo que, também nesta parte, a douta sentença recorrida, padece de vicio de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito. Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências deve ser dado provimento ao presente recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida nos termos supra expostos”. A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: “A) Nas alegações, a ATA impugna a matéria de facto fixada na sentença sob recurso sem contudo (i) especificar os pontos concretos que considera incorrectamente julgados (ii) nem referir com exactidão todas as passagens da gravação da prova testemunhal que, na opinião da Recorrente, impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnada ou (iii) transcrever as passagens da gravação em que funda o seu recurso. B) A ATA não indicou concretamente nenhum dos factos considerados provados pelo Tribunal a quo que entende que foram mal julgados, nem transcreveu os depoimentos que considerou relevantes para o seu ponto de vista e tampouco referiu com exactidão todas as passagens da gravação em que funda o seu recurso. C) Compulsadas as alegações da ATA constata-se que não existe naquele articulado uma única referência aos diversos factos elencados no Ponto III. (Fundamentação) 1 (De facto) da douta sentença e não se consegue lograr perceber com precisão e exactidão quais os factos provados que a mesma considera incorrectamente apreciados. D) Acresce que a ATA, tendo optado por não transcrever os depoimentos que considerou relevantes para sustentação do seu ponto de vista, não refere com exactidão todas as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sendo que algumas das gravações indicadas possuem uma duração de 18 minutos. E) Assim, deve o recurso apresentado pela ATA ser imediatamente rejeitado por força do n° 1 do artigo 640° do CPC. F) A data em que a ora Recorrida foi notificada da liquidação de IRS n° 2007 5004574247 é efectivamente a data indicada na douta sentença, ou seja, no dia 26/11/2007. G) É assim inequívoco que a nota de liquidação de IRS impugnada foi expedida por via postal pela ATA em 21/11/2007. Assim e aplicando-se o disposto no art. 38°, n° 2 e no artigo 39°, n° 1, ambos do CPPT, a notificação em crise, porque efectuada por carta registada, presume- se feita no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte a esse, caso esse dia não seja útil. Ora, sendo a data de registo da liquidação de IRS 21/11/2007, o terceiro dia foi o dia 24/11/2007, um Sábado, pelo que a mencionada notificação se presume recebida no Io dia útil seguinte, ou seja, 26/11/2007 (Segunda-feira), como sempre foi indicado pela ora Recorrida e aceite pela douta sentença em crise. H) Não se vislumbrar o motivo pelo qual o Tribunal a quo estava obrigado a notificar a ATA para assegurar que esta se pronunciasse sobre a prova da data da notificação da liquidação impugnada. Muito menos se descortina como tal possa constituir uma violação do art. 3º do CPC e representar uma nulidade processual. I) Foi a ATA a parte que invocou a extemporaneidade da reclamação graciosa apresentada pela ora Recorrida e fê-lo logo na sua contestação na qual contraditou a factualidade alegada na petição inicial de impugnação judicial. Ora, a ATA podia nessa fase processual (e, em rigor, até à fase das alegações escritas) ter carreado para os autos todos os elementos de prova que entendesse necessários ou convenientes para sustentar a data de notificação que defende. 3) A ora Recorrida não tinha o dever de provar que a data da notificação ocorreu em 26/11/2007 pois a caducidade do direito de reclamação graciosa corresponde à verificação do decurso de um determinado prazo para que uma tal reclamação pudesse ser instaurada, pelo que não cabe à ora Recorrida mas sim à ATA o ónus de alegação e prova da caducidade do direito de reclamar graciosamente e, consequentemente, da caducidade do direito de impugnação judicial. K) A ora Recorrida sustentou a impugnação judicial também na violação do princípio da legalidade e da tipicidade da tributação em sede de tributação de mais-valias e, por conseguinte, da inexistência do tributo, cuja violação é geradora de nulidade da liquidação. L) A inexistência jurídica do tributo não está sujeita a prazo de arguição, pelo que a impugnação judicial sub judice é, em qualquer circunstância, tempestiva. M) O Tribunal a quo não cometeu nenhum erro, lapso ou omissão e andou bem nesta decisão, tendo, com base nos meios de prova carreados para os presentes autos, fundamentado devidamente, de facto e de direito, a posição sustentada na douta sentença. N) Da prova documenta! constante dos autos e da prova testemunhai produzida em audiência de julgamento, ficaram provados todos os factos elencados nas alíneas de j) a w) da fundamentação de facto da douta sentença. O) Por força do artigo 5º, n° 1, do Decreto-Lei n° 442-A/88, de 30 de Novembro, conjugado com no § 2.° do artigo 1.° do anterior Código do Imposto de Mais Valias, os proveitos resultantes da alienação de prédios rústicos, mistos ou urbanos, adquiridos a título oneroso antes de 1 de janeiro de 1989., estão subtraídos à tributação em sede de IRS, pelo que só estão sujeitos a IRS os ganhos decorrentes de transmissões efectuadas após aquela data. P) No caso vertente, a data da aquisição é, inquestionavelmente, o dia da outorga da escritura de compra e venda, ou seja, 22 de Maio de 1985. Q) Afigura-se totalmente descabido o entendimento sufragado pela ATA quando equipara a regularização da inscrição na matriz de um prédio omisso, mediante a entrega do modelo 129, à aquisição do imóvel pela ora Recorrida. A mera entrega de um impresso - o modelo 129 - no competente serviço de finanças em 03/07/2003 é absoluta e completamente irrelevante em matéria de transmissão da propriedade e, consequentemente, na tributação de mais-valias imobiliárias em sede de IRS. R) No tocante à qualificação do prédio, a alteração da respectiva classificação matricial só dispõe para o futuro, de onde resulta que a aptidão do terreno alienado, o qual sempre se tratou de um prédio rústico. S) O prédio objecto da aquisição em 1985 não era um terreno para construção mas sim um prédio rústico e não estava localizado em zona urbanizada ou compreendida no plano de urbanização já aprovado. T) A criação de impostos e a disciplina dos seus elementos essenciais terão de constar de Lei da Assembleia da República ou Decreto-Lei aprovado no âmbito de lei de autorização legislativa, sendo os elementos essenciais do imposto sujeitos à reserva de lei parlamentar são a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes (art. 103°, n° 2, da CRP). U) Sabendo-se que, são normas de incidência as que definem o conjunto de factos sujeitos a tributação - incidência objectiva - e as que identificam as pessoas a ele obrigadas - incidência subjectiva é pois de salientar que o artigo 1º do CIMV não tributava os ganhos resultantes da transmissão de prédios rústicos, urbanos ou mistos que não fossem para construção. E o artigo 5º do Decreto-Lei n° 422/88 - norma de incidência - afasta do âmbito da norma de incidência objectiva, artigo 10° do CIRS, os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias. V) Não se encontrando expressamente prevista a incidência do IRS sobre a transmissão do mencionado imóvel verifica-se a inexistência de facto tributário que se reconduz à ilegalidade abstracta da liquidação impugnada. W) A ora Recorrida não foi notificada de qualquer decisão final após o exercício de audição prévia pelo que a liquidação impugnada não teve em conta os fundamentos invocados na audição prévia, nem as provas apresentadas. Ou seja, a ATA não considerou os factos novos capazes de afastar a tributação dos ganhos realizados com a venda do imóvel, nem se pronunciou sobre a prova apresentada e nem precisou porque não atendeu aos documentos juntos. X) Donde, neste caso, a liquidação oficiosa é nula com fundamento na preterição de formalidade essencial, uma vez que a ATA não notificou a Recorrida da decisão final eventualmente proferida após o exercício do direito de audição prévia. Y) Por isso, bem andou o Tribunal a quo ao julgar totalmente procedente o pedido de impugnação judicial formulado pela ora Recorrida. Nestes termos e nos mais de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser o presente recurso imediatamente rejeitado, por força do disposto n° 1 do artigo 640° do CPC, ou, caso assim não se entenda, deve ser negado provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser confirmada a douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, com o que farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA!”. Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de dever ser negado provimento ao recurso. Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.
São as seguintes as questões a decidir: a) Há erro na decisão proferida sobre a matéria de facto? b) Verifica-se erro de julgamento, quanto à (in)tempestividade da reclamação graciosa, resultante de défice instrutório atinente à notificação da liquidação? c) Há erro de julgamento, por não se reunirem os pressupostos de exclusão de tributação de mais-valias, previsto no regime transitório constante do art.º 5.º do DL n.º 442-A/88, de 30 de novembro?
II. DA ADMISSIBILIDADE DA JUNÇÃO DE DOCUMENTOS Cumpre, antes de mais, aferir da admissibilidade da junção dos documentos na presente instância, com as alegações de recurso. Vejamos. Nos termos do art.º 651.º do CPC, aplicável ex vi art.º 281.º do CPPT: “1 - As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância”. Assim, de acordo com esta disposição legal é admissível a apresentação de documentos com as alegações de recurso ou nos casos em que a sua apresentação não tenha sido possível em momento anterior (v. a remissão expressa para o art.º 425.º do CPC) ou quando tal junção se torne necessária em virtude do julgamento proferido em 1.ª instância. Quanto ao alcance desta última situação, trata-se da admissibilidade da junção de documentos quando o julgamento em 1.ª instância seja “de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo” (1-António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2018, p. 242.), não sendo admissível a junção de documentos para prova de factos que já se sabia estarem sujeitos a prova (2-António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Reimpressão, Almedina, Coimbra, 2019, p. 786.). Chama-se a este propósito à colação o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 27.05.2015 (Processo: 0570/14), onde se refere: “[N]os termos do art. 651.º (anterior art. 693.º-B), n.º 1, do CPC, no caso de recurso, as partes podem juntar documentos às alegações, não só nas situações excepcionais a que se refere o art. 425.º (anterior art. 524.º, n.ºs, 1 e 2), como também no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância. Ou seja, (…) são três, e não dois, os fundamentos excepcionais justificativos da apresentação de documentos com as alegações de recurso: (i) quando os documentos não tenham podido ser apresentados até ao termo do prazo para apresentação das alegações a que se refere o art. 120.º do CPPT (encerramento da discussão da causa na 1.ª instância); (ii) quando os documentos se destinem a provar factos posteriores aos articulados ou a sua junção se tenha tornado necessária, por virtude de ocorrência posterior; (iii) quando a sua apresentação apenas se revele necessária devido ao julgamento proferido em 1ª instância (…). (…) [A] possibilidade resultante desta última hipótese só se verificará quando «pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida» e já não quando «a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da acção (ter perdido, quando esperava obter ganho de causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado na 1.ª instância» (ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, Coimbra editora, 2.ª edição, págs. 533 e 534.). Assim, a junção de documentos às alegações de recurso só poderá ter lugar se a decisão da 1.ª instância «criar pela primeira vez a necessidade de junção de determinado documento quer quando se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes não contavam» (ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 115.º, pág. 95.)”. In casu, a Recorrente juntou, com as suas alegações, três documentos, todos de data anterior à da propositura da presente ação. Como resulta claro, a junção dos documentos em causa não se poderá enquadrar no âmbito da 1.ª parte do n.º 1 do art.º 651.º, dado tratar-se de documentos datados de momento anterior sequer à propositura da impugnação. Resta aferir se a sua junção se enquadra no âmbito da 2.ª parte da mencionada disposição legal, tal como defende a Recorrente. Desde já se adiante que a resposta é afirmativa. Com efeito, como resulta da decisão recorrida e é mencionado pela Recorrente, o Tribunal a quo deu como correta a data de notificação indicada pela ora Recorrida, no articulado de resposta à matéria de exceção, articulado não notificado à FP e de cujo teor apenas com a sentença teve conhecimento, nunca tendo tido a possibilidade de o contraditar. Face ao exposto, admite-se a junção de tais documentos.
III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO III.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “a) A 12/11/2007 foi emitida a liquidação n.º 20075004574247, relativa ao ano de 2003, calculando um valor de rendimento global de 62.007,19euros, valor a pagar de 9.840,52€, e com data de compensação a 15/11/2007 (cfr. cópia de nota de liquidação, de fls. 71 dos autos); b) Na liquidação a que se refere a alínea anterior é indicada como data de compensação: 2007-11-15 (cfr. cópia de nota de liquidação, de fls. 71 dos autos); c) A 15/11/2007 foi emitida a compensação n.º200700007107762 e correspondente ofício de notificação, sendo indicada como data limite de pagamento o dia 26/12/2007, onde se apurou um saldo a pagar de 12.393,12 euros (cfr. cópia de ofício de fls. 166 dos autos); d) A 23/04/2008 foi remetida Reclamação Graciosa da liquidação a que se referem as alíneas anteriores (cfr. cópia de RG, de fls. 103 e ss. dos autos); e) A 24/04/2008 foi recepcionada a RG a que se refere a alínea anterior no Serviço Finanças do Concelho da Guarda (cfr. carimbo aposto, documento de fls. 103 dos autos); f) A 27/05/2009 foi decidida a RG no sentido da sua extemporaneidade (cfr. decisão e informação de fls. 98 a 101 dos autos), lendo-se além do mais da mesma: 1. O sujeito passivo supra identificado apresentou uma reclamação graciosa contra a liquidação de IRS n.º 2008 5004574247 relativa ao exercício de 2003, cuja nota de cobrança totaliza o montante a pagar de € 12.393,1. A contribuinte vem alegar que os ganhos resultantes da alienação de um prédio misto da freguesia da R…, concelho de Celorico da Beira estão excluídos de tributação em sede de IRS. 2. Foi emitida proposta de decisão, na qual se concluía pelo indeferimento por Intempestividade. 3. Em 2009-05-14 foi notificado a reclamante, nos termos da alínea b) do art. 60° da LGT, para o exercício do direito de audição. 4. A reclamante exerceu o direito de audição alegando que "a reclamação graciosa deu entrada no serviço de finanças (…) dentro do prazo legal conferido à contribuinte para o feito". 5. No ponto 3 do exercício do direito de audição, a reclamante vem invocar o art. 70° e o art. 102° do CPPT, para a contagem dos prazos na apresentação das reclamações graciosas. A reclamante refere "De acordo com o disposto no artigo 70° do CPPT a reclamação graciosa será apresentada no prazo de 120 dias contados a partir dos factos previstos no n" 1 do artigo 102°. Nos termos da alínea a) do n" 1 do artigo 102°, o prazo para a reclamação graciosa conta-se do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte". 6, O CIRS prevê no art. 140° que os sujeitos passivos do IRS podem reclamar contra a respectiva liquidação ou impugna-la nos termos e com os fundamentos estabelecidos no CPPT, no entanto o nº 4 do mesmo artigo define os prazos para as reclamações e impugnações. 7. Neste contexto, pelo estatuído no n? 4 do art. 140° do CIRS, "Os prazos de reclamação e de impugnação contam-se nos termos seguintes: a) A partir dos 30 dias seguintes ao da notificação da liquidação" (redacção dada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30/12). 8. No ponto 6 a reclamante vem citar o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 1995-06-14, Recurso n.º 18985, "O prazo para a reclamação graciosa de liquidação de IRS conta-se do termo do prazo do pagamento voluntário". 9. É de salientar a data do referido Acórdão (1995-06-14), em que a alínea a) do n° 4 art° 131° do CIRS (actual art. 140°) previa que a contagem dos prazos para a reclamação e impugnação fosse contada a partir do termo do prazo para pagamento voluntário do imposto, nos casos em que da liquidação final resultasse imposto a pagar. No entanto a Lei n° 60-A/2005, de 30-12 (Orçamento Geral do Estado para 2006), veio alterar a redacção do referido artigo, passando a contar os prazos para a reclamação a partir da data da notificação da liquidação. Tratando-se de uma liquidação com data de 2007-11-12 temos de nos reger pela legislação em vigor à data da sua emissão. 10, Na presente situação, a liquidação foi notificada à reclamante em 2007-11-23. Efectuando a contagem de prazos pela legislação vigente à data dos factos, concluímos o seguinte: • Data do registo da liquidação: 2007-11-20; • Data da notificação da liquidação: 2007-11-23; • Trigésimo dia seguinte ao da notificação da liquidação: 2007 -12-23 • Cento e vinte dias contados a partir do trigésimo dia seguinte ao da notificação: 2008-04-21 (termo do prazo para apresentação da reclamação). 11. A reclamante vem, no exercício do direito de audição, juntar o registo de envio da presente reclamação onde se confirma que esta foi remetida em 2008-04-23, tendo dado entrada no Serviço de finanças em 2008-04-24. Pelo que se aceita o alegado no ponto 10° do exercício do direito de audição "o acto se tem praticado no dia da sua expedição, a reclamação deve ter-se por praticada no dia 23 Abril de 2008". 12. No ficou explicado anteriormente, o terminus do prazo para apresentar a reclamação era a 2008-04-21, pelo que, a petição foi apresentada intempestivamente.” g) A 03/06/2009 foi notificada a decisão de indeferimento da RG (cfr. documentos de fls. 101 e 102 dos autos); h) A 18/06/2009 foi recebida PI relativa aos presentes autos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco (cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos); i) Na mesma data foi remetido pelo correio, PI dirigida a este Tribunal (cfr. documento de fls. 165 dos autos); (…) j) Aos 22/05/1995 compareceu perante notário o marido da aqui impugnante, como terceiro outorgante, perante quem declarou comprar terra de cultura e pastagem com macieira com a área de seis mil cento e sessenta metros quadrados sita ao M…, limite da freguesia dita da R…, inscrita na matriz sob o artigo 6…, mais adquirido terra de cultura, com área para arrumos, sita em M…, freguesia de R…, inscrito no artigo 6… (cfr. cópia de escritura de fls. 41 e ss. dos autos); k) A 11/07/2003 foi emitida certidão pela Câmara Municipal de Celorico da Beira nos termos seguintes (cfr. certidão de fls., 46 dos autos): “Certifica, em face do despacho exarado, no requerimento de I…, datado de onze de Julho de dois mil e três, que o edifício sito em M…, na freguesia de R…, concelho de Celorico da Beira, a confrontar de nascente com R…, de norte e sul com J… e de poente com A…, omisso na matriz predial, está dispensado de Licença de Utilização, por o mesmo ter sido construído antes do ano de mil novecentos e cinquenta e um, data de aprovação do Regulamento Geral de Edificações Urbanas no Concelho” l) O prédio inscrito na matriz predial rústica inscrita sob o artigo 6….º foi inscrito em 1975, com a descrição: “terra de cultura com oliveiras, com uma casa térrea pra arrumos” (cfr. cópia de certidão de teor, a fls. 48 dos autos); m) A 13/05/1997 foi entregue no Serviço de Finanças de Celorico da Beira, por R…, requerimento onde solicitou a anexação ao art.º 6… – uma casa de arrumos – conforme escritura anexa, datada de 28/06/1985 (cfr. cópia Modelo 129, de fls. 51 e ss. dos autos); n) A 03/07/2003 foi entregue declaração para inscrição de prédio com a descrição “uma casa de um único piso (térrea) destinada a habitação com um anexo para arrumos”, com área de 220 m2, sendo descrito o prédio como tendo quatro divisões assoalhadas, uma cozinha, uma casa de banho, um vestíbulo e corredor, uma despensa e arrumação (cfr. cópia de declaração, de fls. 52 e ss. dos autos); o) No ponto 8 da declaração a que se refere a alínea anterior está indicado como motivo que deu lugar à apresentação da declaração “Modificado” (cfr. cópia de Modelo 129, de fls. 51 e ss. dos autos); p) A 31/10/2003 perante o notário da Guarda compareceram a aqui impugnante e R…, perante quem declararam a venda de prédio misto, que consta de terra de cultura com oliveiras, casa de rés-do-chão, destinado a habitação, com um anexo de arrumos, sito em “M…”, freguesia de R…, Concelho de Celorico da Beira, inscrito na matriz rústica sob o artigo 6…, e parte urbana omissa na matriz, descrito na conservatória do Registo Predial de Celorico da Beira sob o número duzentos e cinquenta, da freguesia de R… (cfr. cópia da escritura pública de fls. 57 e ss. dos autos); q) A 09/10/2007 foi proferido projecto de decisão de alteração da fixação dos rendimentos da aqui impugnante e de R…, relativos ao ano de 2003, com o seguinte conteúdo (cfr. cópia de decisão de fls, 148 e ss. dos autos): Correcções por erros evidenciados na declaração de rendimentos - Categoria G, em resultado de fiscalização interna efectuada tendo por base as escrituras realizadas no ano de 2003: • O SP R…, NIF 1…, com domicílio na Rua A…, n… - Guarda, alienou em 31 de Outubro de 2003, através de escritura outorgada no Cartório Notarial da Guarda, ao contribuinte J…, NIF 1…, metade de um prédio misto, inscrito na matriz Rústica da freguesia da Ratoeira, concelho de Celorico da Beira, sob o artigo 6… e a parte Urbana omissa na matriz, pelo valor total de € 76. 00,00; • posteriormente foi efectuada uma liquidação adicional de SISA, onde é declarado pelo comprador que na realidade o valor da venda foi de € 129.000,00; • O valor sujeito a imposto é € 64.187,50, respeitante a metade da diferença entre o valor do prédio rústico, uma vez que foi adquirido em 1985-05-22, declarado na escritura acima referida (€ 625), e o valor da venda declarado na liquidação adicional de SISA (€ 129.000,00); • O valor de aquisição do prédio é de € 6.000,00, respeitante a metade do valor patrimonial inscrito na matriz, por ter sido apresentada declaração Mod. 129 para inscrição de uma casa para habitação em 03 de Julho de 2003, na qual é referido que a mesma provém de uma palheira existente no já referido prédio rústico n.º 6…; • Não há lugar a aplicação do coeficiente de desvalorização da moeda nos termos do artigo 50° do CIRS, por não terem decorrido 24 meses entre a data da aquisição e a data de realização; • Da referida alienação advém uma mais-valia de € 29.093,75, resultante de metade da diferença entre o valor de aquisição e o valor de realização, de harmonia com a alínea a) do n.º4 do artigo 10° e n.º 2 do artigo 43° ambos do CIRS; • Desta correcção resulta o rendimento líquido da categoria G no montante de € 29.093,75; • Não são efectuadas quaisquer correcções aos restantes rendimentos; Apesar de estarem obrigados a apresentar a declaração de rendimentos e nela fazer constar aqueles valores (artigos 1°, 10° n.º 1, 13° n.º 1 e 57° do CIRS), não o fizeram. Efectuou-se a notificação prevista no n.º 3 do artigo 65° do CIRS. Pelos motivos expostos, procede-se à alteração dos rendimentos líquidos, nos termos dos n.º 4 e 5 do artigo 65° do CIRS" considerando aquele rendimento. Notifiquem-se para exercer, querendo, o direito de audição, nos termos do artigo 60° da Lei Geral Tributária, enviando-lhe cópia do presente projecto de decisão.” r) A 19/10/2007 a impugnante pronunciou-se sobre o projecto de decisão (cfr. documento de fls. 66 dos autos); s) A 05/11/2007 foi proferido despacho com o assunto “Fixação do Conjunto dos Rendimentos Líquidos”, onde se lê: “Tendo sido exercido o direito de audição, mas não tendo sido acrescentados quaisquer elementos novos ao processo, converto em definitivo a projecto de decisão anterior e com os fundamentos nele expressos, nos termos do n.º4 do artigo 65.º do CIRS altero o conjunto dos rendimentos na quantia de €29.093,75 (…)” (cfr. despacho de fls. 153 dos autos); t) A construção existente no prédio rústico inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 6....º, tinha quatro divisões e não tinha quarto de banho (depoimento da primeira testemunha); u) Em 1966 a casa já existia (depoimento da primeira testemunha); v) A casa tinha janelas (depoimento da primeira, segunda e terceira testemunha) w) A casa tinha lareira antes de 1985 (depoimento da primeira e segunda testemunha);”
III.B. Refere-se ainda na sentença recorrida: “Não há factos alegados e não provados com interesse para a decisão da causa”.
III.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto: “Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e do depoimento das testemunhas, conforme se indica em cada alínea do probatório. A primeira testemunha depôs de forma convincente no sentido de conhecer o prédio em causa nos autos e da sua existência, onde viveu com seus pais, sendo estes os caseiros da quinta, mais referindo ter 52 anos e que aos oito anos foi viver para o prédio em causa nos autos, onde viviu até aos 19 anos. As demais testemunhas, no seu conjunto demonstraram igualmente conhecer a construção em causa nos autos, devendo ser dado particular relevo ao depoimento da testemunha R… que teve especial conhecimento do caso dos autos, por ter sido o adquirente do mesmo. Todos os depoimentos foram livre, prontos e credíveis, não obstante existir alguma desconformidade quanto a pormenores sobre os quais testemunharam, o que, analisado em conjunto, não abalou a credibilidade das testemunhas”.
III.D. Atento o art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, e considerando o disposto no art.º 249.º do Código Civil, corrige-se o lapso constante do facto j) supratranscrito, que passará a ter a seguinte redação: j) Aos 22/05/1985 compareceu perante notário o marido da aqui impugnante, como terceiro outorgante, perante quem declarou comprar terra de cultura e pastagem com macieira com a área de seis mil cento e sessenta metros quadrados sita ao M…, limite da freguesia dita da R…, inscrita na matriz sob o artigo 6…, mais adquirido terra de cultura, com área para arrumos, sita em M…, freguesia de R…, inscrito no artigo 6… (cfr. cópia de escritura de fls. 41 e ss. dos autos);
III.E. Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto Insurge-se a Recorrente contra a decisão proferida sobre a matéria de facto, entendendo que, face à prova testemunhal produzida, que identifica, deveriam ser dados como provados os seguintes factos: a) A casa era de terra batida; b) A casa não tinha água nem canalização; c) A casa não tinha isolamento; d) A Impugnante, para a tornar habitável, teve de efetuar obras. Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão (3-Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 169.). Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC]; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC]. Especificamente quanto à prova testemunhal, dispõe o n.º 2 do art.º 640.º do CPC: “2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”. Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo-se-lhe os ónus já mencionados (4-V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada.). Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus foram cumpridos, exclusivamente quanto aos mencionados factos, na medida em que foi indicada a prova testemunhal em que se sustentavam, constando das alegações as concretas passagens da gravação pertinentes. Com efeito, ao longo das alegações, a Recorrente vai discorrendo sobre a prova produzida, sem, muitas vezes, extrair qualquer conclusão quanto ao impacto da sua excursão em termos de decisão proferida sobre a matéria de facto, exceto nestas quatro situações, onde, apesar de forma sistematicamente pouco perfeita, é apreensível que factos pretende que sejam dados como provados e com base em que prova. Logo, nesta parte não acompanhamos a Recorrida quando refere que não estão, tout court, reunidos os requisitos previstos no art.º 640.º do CPC. Tudo o demais alegado em termos de prova não será por nós apreciado, por não ter sido, como referido, extraída qualquer conclusão entre o alegado e a sua consequência em termos de decisão sobre a matéria de facto. Vejamos, então. Como referido supra, considera a Recorrente que ficou provado que: a) A casa era de terra batida; b) A casa não tinha água nem canalização; c) A casa não tinha isolamento; d) A Impugnante, para a tornar habitável, teve de efetuar obras. Antes de mais, refira-se que há um conjunto de imprecisões na formulação proposta, que caberá a este Tribunal suprir, desde logo o facto de a Recorrente nem sequer ter circunstanciado minimamente no tempo os factos cujo aditamento propõe. Posto isto, o primeiro facto prende-se com o chão da casa em causa à data da respetiva aquisição (1985). Desde logo se diga que não se considera provado que o chão fosse de terra batida. Antes de mais, apenas a testemunha Â… (engenheiro agrícola, reformado, que era amigo dos pais da Impugnante e que conhece a zona, por força das suas funções, e, bem assim, se deslocou à propriedade para sugerir à Impugnante e ao seu então marido que tipo de árvores ali poderiam plantar) falou em chão de terra batida e apenas na zona onde estaria a lareira, dado que a própria testemunha referiu que não sabia se a casa à época tinha quartos (ou seja, não visitou a totalidade da casa). Tendo este Tribunal ouvido a prova testemunhal produzida integralmente verifica-se que a testemunha R…, primo da Impugnante, que visitou logo o imóvel na altura da aquisição, fala em chão de pedra. Por seu turno, R…, ex-marido da Impugnante, refere chão de madeira, já com sinais de humidade. Ou seja, não se pode afirmar com segurança que o chão fosse de terra batida, até sendo mais credível o depoimento da última testemunha ouvida, que foi o outro dos adquirentes e que, face ao que resultou do seu depoimento, se terá conformado com a parte da liquidação que lhe foi emitida. No entanto, e acima de tudo, essa circunstância é absolutamente irrelevante, in casu. Veja-se que estamos a falar de uma casa que era habitada pelos caseiros e respetivas filhas, que, como referiu a testemunha M… (operária fabril, que viveu naquela casa entre os anos 60 e os anos 70 do século XX), filha dos referidos caseiros, era uma casa que precisaria de obras de conservação. No entanto, como a testemunha afirmou de forma particularmente clara, os pais não as podiam fazer, quer por a casa não ser sua, quer por não terem condições financeiras para tal. Acrescente-se que a existência de casas com chão de terra batida nas zonas rurais portuguesas, particularmente na Beira Alta, era frequente, naquela altura, ainda num contexto de ultrapassagem de uma situação de grande pobreza da zona, como é do conhecimento geral. Mas não era essa circunstância que as descaraterizava como casas de habitação. Eram só casas de habitação pobres. Há aqui uma qualquer confusão da Recorrente, ao assumir que apenas casas com determinado tipo de condições podem ser consideradas de habitação, assumindo uma posição absolutamente desfasada da realidade histórica de profunda pobreza do nosso interior do país naquele período temporal. As exigências atuais, designadamente em termos de salubridade, não são as daquela altura e é só uma interpretação absolutamente alheia da realidade pode justificar a relevância dada a um facto que, reiteramos, nem sequer ficou provado. Quanto à inexistência de casa de banho e canalização, de facto, ficou provado que, por referência a 1985, a casa não as tinha. Foi o que resultou, desde logo, do depoimento das testemunhas M… (com a razão de ciência já mencionada), J… (amigo da Impugnante, que visitou o imóvel aquando da sua aquisição) e R… (com a razão de ciência já mencionada). No entanto, a ausência de casa-de-banho já resulta do facto t), pelo que se indefere o requerido nessa parte. Como tal, é de aditar o seguinte facto: x) Até 1985, a casa referida em u) não dispunha de água canalizada. Quanto à falta de isolamento, a verdade é que se trata de uma mera conclusão. O que ficou de relevante provado tem a ver com a natureza dos materiais que existiam na casa, que a poderiam isolar pior face a outros materiais. Falamos, por exemplo, na estrutura de tabique ou nas janelas e portas de menor qualidade. Não se pode, no entanto, dar como provados factos que conduzam à conclusão extraída pela Recorrente de que a casa não tinha isolamento. Como tal, indefere-se o requerido. Finalmente, quanto à afirmação de que a Impugnante teve de fazer obras para tornar a casa habitável, a mesma tem também um pendor conclusivo. O que pretenderá a Recorrente é alegar que, até à realização das obras, a casa não tinha condições de habitabilidade. Ora, isso não ficou provado e tanto assim era que ficou provado que a casa era habitada há largos anos e até à data da sua aquisição pela Recorrida e pelo ex-marido. Explicitemos. Ficou provado que: a) Pelo menos desde a década de 60 do século XX até 1985, viveram na casa mencionada em u) os caseiros da quinta e, durante parte desse período, as respetivas filhas, onde, designadamente, dormiam, cozinhavam e faziam as suas refeições – facto provado, face ao depoimento de M…, que, como referido, era filha dos caseiros da quinta e viveu naquela casa entre os 8 e os 19 anos, continuando a ir lá visitar os pais até à venda da quinta, e de Â… e R…, que também conheceram os caseiros e família; b) Em data não concretamente apurada, mas anterior a 31.11.1988, a Impugnante e o seu ex-marido substituíram o chão da casa referida em u), substituíram as suas portas e janelas, fizeram na mesma uma casa-de-banho e instalaram canalização – facto provado, face aos depoimentos conjugados de todas as testemunhas, que têm conhecimento das obras que foram feitas, para adaptar a casa ao gosto e comodidades que a Impugnante e o ex-marido entenderam ser as que respondiam às suas concretas necessidades; c) A Impugnante e o seu ex-marido mantiveram a estrutura da casa mencionada em u), não tendo aumentado a respetiva área – facto provado, face aos depoimentos conjugados das testemunhas J…, R… e R… (todos com a razão de ciência já referida), que salientaram, de forma coerente e congruente, que a estrutura da casa não foi mexida nem, de todo, ampliada, reiterando que foram apenas feitas obras interiores de melhoramento, nos termos já mencionados. Portanto, deste conjunto de factos, não se extrai a conclusão que a Recorrente extraiu no sentido de as obras terem sido feitas para tornar a casa habitável. A casa era habitável e habitada. No entanto, como, aliás, é comum quando alguém adquire uma casa, foram feitas obras nos interiores, para que a casa respondesse às exigências dos seus novos proprietários. Logo, indefere-se nesta parte o requerido e, adicionalmente, ao abrigo do art.º 662.º, n.º 1, do CPC, aditam-se os seguintes factos provados: y) Pelo menos desde a década de 60 do século XX até 1985, viveram na casa mencionada em u) os caseiros da quinta e, durante parte desse período, as respetivas filhas, onde, designadamente, dormiam, cozinhavam e faziam as suas refeições; z) Em data não concretamente apurada, mas anterior a 31.11.1988, a Impugnante e o seu ex-marido substituíram o chão da casa referida em u), substituíram as suas portas e janelas, fizeram na mesma uma casa-de-banho e instalaram canalização; aa) A Impugnante e o seu ex-marido mantiveram a estrutura da casa mencionada em u), não tendo aumentado a respetiva área.
III.F. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, acorda-se aditar a seguinte matéria de facto provada: bb) No ponto 10 da declaração a que se refere a alínea n) está indicado, como “outros elementos”, “03 – Data da omissão há mais 20 anos” (cfr. cópia de Modelo 129, de fls. 51 e ss. dos autos). cc) Foi registado, no sistema informático da administração tributária, que o registo postal n.º RY452952776PT, relativo à demonstração de liquidação de IRS de 2003 emitida em nome da Impugnante, datava de 21.11.2007 (cfr. documento junto com as alegações de recurso, fls. 1, 7 e 12).
IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO IV.A. Do erro de julgamento, quanto à tempestividade da reclamação graciosa Considera, desde logo, a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, no que respeita à intempestividade da reclamação graciosa, por várias ordens de razão. Por um lado, porque aceitou como correta a data invocada pela Impugnante, sem ter logrado levar a efeito as diligências necessárias para o apuramento da verdade material, ao arrepio do princípio do inquisitório. Por outro lado, porque a notificação foi feita a 20.11.2007, presumindo-se a mesma como efetuada a 23.11.2007. Vejamos, então. Compulsados os autos, verifica-se que, de facto, o Tribunal a quo, confrontado com divergência de posição entre as partes, quanto à data da notificação, não tendo notificado a FP do requerimento de resposta à matéria de exceção e dispondo de um processo administrativo mal instruído, não ordenou a junção aos autos dos elementos atinentes à notificação, como lhe era exigido, face ao princípio do inquisitório. Com efeito, o princípio do inquisitório é um dos princípios que enforma o processo tributário. Atento o mesmo, impõe-se que o juiz realize ou ordene todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade material. O mesmo encontra previsão expressa no n.º 1 do art.º 99.º da LGT, nos termos do qual “[o] tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer”, encontrando-se consagrado, em termos idênticos, no art.º 13.º do CPPT. O respeito pelo princípio do inquisitório implica, pois, que, sendo relevantes para a descoberta da verdade material, se levem a cabo diligências de prova, quer requeridas pelas partes, quer mesmo oficiosamente. O Tribunal a quo alicerçou-se na circunstância de não ser expressamente referida na contestação a data da notificação, o que corresponde à realidade. No entanto, tal data constava da reclamação graciosa, para a qual a contestação remete. Logo, considera-se que neste caso o Tribunal a quo deveria ter diligenciado no sentido de obter os elementos de prova atinentes à data da notificação. No entanto, face a essa irregularidade do Tribunal a quo, a própria Recorrente juntou os elementos de que dispunha sobre as notificações, documentos esses que, como referido supra, foram ora admitidos. Ou seja, foi, neste contexto, suprida a violação do princípio do contraditório e do inquisitório, sanando-se a irregularidade praticada, estando este Tribunal em condições de conhecer o alegado erro de julgamento, como pretendido pela Recorrente. Apreciemos, então. A verdade é que o afirmado pelo Tribunal a quo não está em desconformidade com os elementos documentais apresentados pela FP. Vejamos. Nos termos do então art.º 140.º do Código do IRS (CIRS): “4 - Os prazos de reclamação e de impugnação contam-se nos termos seguintes: a) A partir dos 30 dias seguintes ao da notificação da liquidação”. Logo, temos um prazo próprio que prevalece sobre o prazo geral previsto no art.º 102.º do CPPT, em termos de dies a quo. Ora, mesmo aceitando como corretos os elementos juntos pela AT [que, na verdade, não demonstram cabalmente a remessa via correio postal registado da notificação da liquidação, dado que se tratam ou de prints internos e de guias de expedição absolutamente globais que nada provam de concreto – cfr., neste sentido, a título ilustrativo, os Acórdãos deste TCAS de 15.04.2021 (Processo: 1435/09.9BESNT), de 07.05.2020 (Processo: 1737/13.0BELRS), de 08.05.2019 (Processo: 154/12.3BESNT)], tais dados permitem concluir pela tempestividade da reclamação graciosa, uma vez que: a) A demonstração de liquidação terá sido remetida via correio postal registado a 21.11.2007 (o que está registado como tendo, alegadamente, sido remetido a 20.11.2007 é a demonstração de compensação); b) Assim sendo, a presunção de notificação ocorreria no terceiro dia seguinte (art.º 39.º, n.º 1, do CPPT); c) Uma vez que o terceiro dia foi um sábado, transita para o primeiro dia útil seguinte a presunção de notificação, ou seja, para o dia 26.11.2007, data considerada pelo Tribunal a quo e que coincide com a alegada pela Impugnante; d) Logo, o termo do prazo de 120 dias para a apresentação da reclamação, que se conta a partir do decurso de 30 dias, considerando a data de notificação da liquidação, ocorreu a 24.04.2008, dia seguinte àquele em que a reclamação graciosa foi remetida [cfr. facto d)] e data em que a mesma foi rececionada [cfr. facto e)]. Assim, verifica-se que a administração tributária (AT) partiu de um pressuposto errado face aos elementos de que a própria dispunha, uma vez que a notificação da liquidação, mesmo dando como corretos os dados registados no seu sistema e mencionados em cc) dos factos provados, terá sido enviada a 21 e não a 20 de novembro de 2007. Logo, não assiste razão à Recorrente nesta parte.
IV.B. Do erro de julgamento Entende, por outro lado, a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, dado estarmos perante um prédio misto, que, quando foi adquirido, tinha uma casa térrea para arrumos e não uma casa para habitação, não sendo aplicável a norma de exclusão constante do art.º 5.º do DL n.º 442-A/88, de 30 de novembro. Vejamos, então. Cumpre, antes de mais, atentar no regime transitório constante do art.º 5.º do DL n.º 442-A/88, de 30 de novembro. Assim, nos termos de tal regime só seriam sujeitos a IRS (categoria G) aqueles rendimentos resultantes da alienação onerosa de bens que tivessem sido adquiridos após a entrada em vigor do CIRS (isto é, 1 de janeiro de 1989), no caso de se tratar de ganhos que não fossem sujeitos ao pretérito imposto de mais-valias. Ou seja, caso um bem tivesse sido adquirido antes de 1 de janeiro de 1989 e alienado já na vigência do CIRS, o mesmo não estaria sujeito a tributação pela Categoria G, caso o não estivesse face ao Código do Imposto de Mais-Valias (CIMV). Cumpre, pois, verificar o âmbito de incidência do IMV. Nos termos do art.º 1.º do pretérito CIMV, aprovado pelo DL n.º 46 373, de 09 de junho de 1965: “1. O imposto de mais-valias incide sobre os ganhos realizados através dos atos que a seguir se enumeram: 1.º Transmissão onerosa de terreno para construção, qualquer que seja o título por que se opere, quando dela resultem ganhos não sujeitos aos encargos de mais-valia previstos no artigo 17.º da Lei n.º 2 030, de 22 de junho de 1948, ou no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 41 616, de 10 de maio de 1958, e que não tenham a natureza de rendimentos tributáveis em contribuição industrial…”. No seu § 2 era facultado um conceito de terreno para construção, entendendo-se como tal “… os situados em zonas urbanizadas ou compreendidos em planos de urbanização já aprovados e os assim declarados no título aquisitivo”. Assim, como resulta deste enquadramento legal, resulta que nem todos os rendimentos resultantes da alienação de prédios, mesmo urbanos, estavam sujeitos a imposto sobre as mais-valias (5-V., a este propósito, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 23.06.2005 (Processo: 00149/04): “Tendo os impugnantes adquirido em 1975 um prédio urbano, cuja transformação em terreno para construção é posterior à transmissão económica que efectuaram em 1991, não pode deixar de concluir-se pela ilegalidade da liquidação adicional de IRS, por violação do disposto no art. 5º nº1 do DL nº 442-A/88, de 30 de Novembro, assim tendo de proceder a impugnação”.), sendo que o estariam os ganhos decorrentes de alienação de terrenos para construção. Por outro lado, como é jurisprudência pacífica nesta matéria, é elemento fundamental, para efeitos de aplicação ou não aplicação da mencionada norma de exclusão, a definição do momento temporal relevante para aferição dos pressupostos de facto da tributação. Tal momento situa-se no dia 31.12.1988, último dia de vigência do CIMV. Assim, a eventual ocorrência de factos modificativos do conteúdo do direito de propriedade que sejam ulteriores não relevam para efeitos de afastamento da aplicação da norma de exclusão (6-V. os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 12.01.2012 (Processo: 0529/11), de 02.07.2014 (Processo: 01396/13), de 10.09.2014 (Processo: 01381/13) e de 08.07.2015 (Processo: 0584/15) e ampla jurisprudência no mesmo citada.). Apliquemos estes conceitos ao caso dos autos. Do ponto de vista factual, temos de relevante o seguinte: a) A Impugnante e o seu então marido adquiriram, em 1985, logo, antes da entrada em vigor do CIRS, um prédio misto, o qual incluía, pois, uma edificação que, como resulta provado, já fora construída antes de 1951; b) O prédio estava descrito na matriz predial como sendo rústico, com uma casa térrea para arrumos; c) Essa casa tinha configuração de casa de habitação e era de facto habitada, pelo menos há 20 anos, à data da aquisição, sendo que a Impugnante e o seu então marido fizeram obras na mesma, antes de 1988, obras essas de melhoramento, mas que não alteraram a sua estrutura. In casu, não se coloca a questão de que o prédio não se tratava de um terreno para construção. O que se coloca em causa é se a casa de habitação existente no prédio misto em causa resultou de uma alteração já efetuada pela Impugnante e pelo seu então marido, já em momento ulterior ao da entrada em vigor do CIRS. Como vimos, a Impugnante adquiriu antes de 1989 e vendeu depois dessa data um prédio misto, sem que ele tenha perdido essa qualidade. Ou seja, não há dúvidas de que era um prédio misto, com uma edificação, e ficou provado que essa edificação, antes de 1989, estava destinada a habitação, como decorre da matéria de facto assente. Veja-se que, ao contrário do que parece sustentar a Recorrente, a Impugnante não tinha de vender o prédio no exato estado em que o encontrou em 1985, na medida em que estamos em falar em meras obras de melhoramento do edifício que não alteraram o seu fim. Reiteramos que a data pertinente de referência não é a data da aquisição. É pertinente, sim, a situação em 31.12.1988, para se aferir se seria ou não tributada em sede IMV (o que, como vimos, não se coloca in casu, dado nunca termos estado perante terrenos para construção). Ora, a esse respeito, a própria declaração 129 apresentada em 2003, com vista a suprir a omissão na matriz da parte urbana do prédio que, como bem refere a Recorrente, sempre foi misto, refere que se trata de omissão existente há mais de 20 anos. Tal nunca foi posto em causa pela AT nem nada foi demonstrado pela mesma em sentido distinto. Por outro lado, ainda que na modelo 129 tenha sido aposta a menção de que houve modificação do edifício, há dois aspetos a considerar: o primeiro, é de que ficou provado que a casa de habitação já existia antes de 1989 e que foi apenas objeto de melhoramentos; o segundo, é o de que foi aposta na referida declaração a circunstância de se tratar de tratar de omissão já existente há 20 anos. A realidade que ficou provada foi a de que estamos perante um edifício habitado desde momento bem anterior à própria aquisição que foi feita e com caraterísticas de edifício destinado a habitação. Escuda-se a FP em afirmações que revelam um profundo desconhecimento da realidade do país, designadamente na década de 80 do século XX, na beira interior, realidade essa do conhecimento geral, onde eram inúmeras as situações de casas de habitação sem água canalizada, simplesmente por ela não estar disponível à população, que se socorria de fontes públicas ou poços, por exemplo, ou sem chão que não o de terra batida (sendo que, nesta parte, como vimos, tal nem sequer resultou provado), porquanto as condições financeiras não permitiam que o chão fosse de outro material. Isso não descaraterizava o edifício como casa de habitação. Era simplesmente uma casa de habitação pobre. Portanto, de toda a prova produzida, nada permite concluir que a situação não fosse já existente a 31.12.1988, muito pelo contrário. Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 22.04.2015 (Processo: 01565/13): “O que é decisivo para a questão da tributação em IRS, dado que para saber se se verificam os pressupostos da tributação, releva a qualidade que o bem detinha no momento da entrada em vigor do CIRS, uma vez que, como se viu, no regime transitório estabelecido para a categoria G de IRS (regime previsto no n.º 1 do art. 5.º do citado Decreto-Lei n.º 442-A/88), se estabelece que os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais-valias, só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado depois da entrada em vigor deste Código”. É evidente que o circuito documental que existiu manifesta uma necessidade de atualizações de matrizes, situação de todo rara ao tempo, em que, como é facto público e notório, havia francas inconsistências entre a realidade fática e os elementos que amiúde estavam nas matrizes. Ademais, como já referido, a AT não logrou infirmar nada do que foi a posição da Impugnante, designadamente na própria modelo 129, onde se refere que a situação já existia há duas décadas. Mais, a correção feita pela AT é global, abrangendo parte rústica e urbana, não sendo sequer discernível a proporção respetiva. Aliás, calcula as mais-valias como se não houvesse, no todo, qualquer aplicação do regime transitório, quando sem dúvida que há uma parte que é rústica e que nunca seria sujeita a tributação. Adicionalmente, tudo o que a Recorrente agora pretende defender, que nem sequer ficou provado, não constituiu sequer fundamentação da liquidação impugnada. Como tal, não lhe assiste razão.
V. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em conferência na Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: a) Negar provimento ao recurso; b) Custas pela Recorrente; c) Registe e notifique. Lisboa, 19 de junho de 2024 (Tânia Meireles da Cunha) (Patrícia Manuel Pires) (Ana Cristina Carvalho) |