Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 258/25.2BELRA |
| Secção: | JUIZ PRESIDENTE |
| Data do Acordão: | 09/30/2025 |
| Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
| Descritores: | CONFLITO DE COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA JUÍZO DE EXECUÇÃO FISCAL E DE RECURSOS CONTRAORDENACIONAIS JUÍZO TRIBUTÁRIO COMUM |
| Sumário: | Constando da petição inicial de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal várias causas de pedir que são fundamentos próprios do contencioso associado à execução fiscal e sendo o pedido formulado no sentido da extinção da execução fiscal, independentemente de se estar perante erro na forma do processo, de modo algum se está no âmbito de competência do Juízo Tributário Comum, mesmo que, a latere, seja invocado um fundamento passível de ser considerado próprio de impugnação judicial. |
| Votação: | DECISÃO SINGULAR |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | Decisão [art.º 36.º, n.º 1, alínea t), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF)] I. Relatório O Senhor Juiz do Juízo Tributário Comum do Tribunal Tributário de Leiria [a funcionar agregado com o Tribunal Administrativo de Círculo de Leiria, sob a designação unitária Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, designação que adotaremos de ora em diante] veio requerer oficiosamente, junto deste TCAS, ao abrigo do disposto na alínea t) do n.º 1 do art.º 36.º do ETAF, a resolução do Conflito Negativo de Competência, em Razão da Matéria, suscitado entre si e Senhora Juíza do Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do mesmo Tribunal, uma vez que ambos se atribuem mutuamente competência, negando a própria, para conhecer da Reclamação Judicial prevista no Art.º 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), apresentada por Sociedade ………………………., Lda (doravante, Reclamante). Chegados os autos a este TCAS, foi dado cumprimento ao disposto no art.º 112.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC). As partes nada disseram. Foram os autos com vista à Ilustre Magistrada do Ministério Público (IMMP), nos termos do art.º 112.º, n.º 2, do CPC, que emitiu pronúncia no sentido de a competência ser atribuída ao Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais.
É a seguinte a questão a decidir: a) A competência para decidir os presentes autos cabe ao Juízo Tributário Comum do TAF de Leiria ou ao Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do mesmo Tribunal?
II. Fundamentação II.A. Para a apreciação do presente conflito, são de considerar as seguintes ocorrências processuais, documentadas nos autos: 1) Em 30.01.2025, foi proferido, no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º ………………….711, pela Chefe do Serviço de Finanças de Vila ………………., despacho de indeferimento da arguição de nulidade da citação (cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial). 2) Em 28.02.2025, foi remetida ao TAF de Leiria, pela administração tributária, petição inicial de “reclamação judicial” ao abrigo do art.º 277.º do CPPT, apresentada pela Reclamante, da qual consta designadamente o seguinte: “Sociedade ………………, Lda., pessoa coletiva n° ………….., mais bem identificada nos autos à margem indicados, vem, nos termos do artigo 277.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), apresentar RECLAMAÇÃO JUDICIAL contra Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), perante a execução fiscal n.° ……………….711, instaurada com base em um título executivo emitido pela Câmara Municipal de ………………………, uma vez que não fui notificado da decisão que recaiu sobre o meu direito de audição. o que faz com os seguintes fundamentos: Os factos: 1 A AT através do ofício n° 86 datado de 2025-01-30 (anexo DOC 1), diz anexar, a cópia autenticada, referida a final do 1º paragrafo, seja pelo que se entende do que vem escrito será copia autenticada da petição de oposição. 2 Acontece que tal documento não veio em anexo. 3 A AT no ponto 2.2 (dos factos) escreve: “De acordo com a certidão de dívida emitida pela Câmara municipal de …………………..,........, cuja cópia se anexa,................” 4 Tal cópia, também, não se apresenta anexa. 5 A AT, no ponto 2.4 escreve: “Ainda em 08.07.2024, foi emitida, no âmbito do PEF n° ……………………..711, a citação pessoal, cujo teor é o constante no documento junto a esta informação sob a designação “Citação PEF". 6 Também, aqui, nenhuma citação PEF veio junta 7 A AT, no ponto 2.7 escreve: “ Da citação mencionada no ponto anterior consta a informação de que os elementos relativos à divida podem ser consultados no portal das finanças ......inclusivamente o titulo executivo" 8 Ora, e fazendo-o agora a Reclamante, com cuidada atenção, verifica que se encontra tal inscrição no 2º paragrafo da Citação. 9 Porém, tal mostra-se muito vago e insuficiente que não permite ao comum dos cidadãos aceder a tal informação nem o caminho para aceder a tal. 10 Só após a Reclamante, agora, ter recorrido da ajuda do CC conseguiu aceder e obter a Certidão de Divida da Câmara, o que aconteceu nesta data. 11 Isto, apesar da AT referir do seu envio, o que reitere-se não sucedeu. 12 A Reclamante, verificou só nesta data a Certidão de Divida, emitida pela Câmara. 13 Verificando-se que a AT aplicou juros no montante de €480.64 não se percebendo o alcance da aplicação desses juros nem tão pouco os fundamentos, o que salvo melhor entendimento não poderá prevalecer. 14 Ademais, sequer a Certidão identifica a data da divida. 15 Entende a Reclamante, salvo melhor entendimento, que a Certidão de Dívida mostra-se com erros, nomeadamente porque refere “piscina executada" o que não é verdade, nada tendo sido executado. Acresce, aqui informar, que a Reclamante, no âmbito do Direito de Audição prestou todos os esclarecimentos junto da Câmara Municipal, e a final pediu cópia da notificação da decisão final (DOC 2) 16 Seja a Reclamante nunca foi notificada da decisão que recaiu sobre o direito de audição que exerceu. 17 QUANTO Á ACTUAÇAO DA CÂMARA A Câmara Municipal de Vila ………………….., utilizou o título executivo de forma que podemos considerar ilegal, ilícita e de má fé, porquanto: 1 - Já que esta entidade, ficou por responder a diversas interpelações e pedidos de esclarecimentos, conforme anexos, sendo os últimos datados de 8/11 /2024; 11/10/2024 (DOC 3 e4). 2- Seja, a reclamante desconhece a decisão final que recaiu sobre o direito de Audição exercido em prazo, 2021/10/07. 3- Interpelada esta entidade, para apresentação de certidão ou reprodução de documentos que comprovasse a notificação da dita decisão, nenhuma resposta obteve. 18 Existe por parte da entidade Câmara Municipal a obrigatoriedade de notificação das decisões administrativas -Artigo 56.° e seguintes do CPA 19 A Administração tem a obrigação legal de notificar os interessados sobre as decisões que afetem os seus direitos ou interesses. 20 Por consequência existe ilegalidade do processo executivo sem decisão final notificada - Artigo 268.°, n.° 3 da Constituição da República Portuguesa que garante o direito dos cidadãos à informação e notificação de atos administrativos. 21 Logo existe nulidade do ato administrativo -Artigo 161.º do CPA porque: i) Houve violação do direito de defesa e falta de notificação, a decisão do título executivo, deve ser considerada nula. 22 Não obstante essa omissão, a Reclamante foi surpreendida com a instauração de um processo executivo sem que fosse dada oportunidade de conhecer e impugnar a decisão, o que configura uma violação dos artigos 56.° e seguintes do CPA e do artigo 268.°, n.° 3 da Constituição da República Portuguesa. 23 Nos termos do artigo 161.° do CPA, a omissão da notificação da decisão final pode configurar nulidade ou anulabilidade do ato, tornando o processo executivo ilegal e passível de revogação. 24 Nestes termos, requer-se: 1) A suspensão imediata do processo executivo instaurado; 2) A notificação formal da decisão final proferida no âmbito do procedimento administrativo; 25 QUANTO À ACTUAÇAO DA AT Vejamos a Citação, e o cumprimento das formalidades (art° 190° conjugado com as alíneas a), c), d) e e) do n° 1 do artigo 163° ambos do CPPT. 26 Ou ser acompanhada de cópia do titulo executivo 27 Ora, com o devido respeito a citação, entende a Reclamante, que a mesma não contém nenhum dos elementos atrás descritos, limitando a escrever na rubrica Imposto = “taxas” e Período do imposto = “2020” e não se fez acompanhar de cópia do título executivo. 28 Logo, a citação está ferida de nulidade insanável: i) O artigo 39.° da Lei Geral Tributária (LGT) prevê a nulidade dos atos tributários quando ocorrem vícios de forma que afetem direitos fundamentais dos contribuintes. No caso específico da citação, a falta de cumprimento das formalidades essenciais pode levar à nulidade, conforme estabelecido no artigo 191.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). ii) Artigo 39.° da LGT-Nulidade dos atos tributários por vício de forma grave. iii) Artigo 191.° do CPPT-Nulidade da citação e seus efeitos nos atos subsequentes. iv) Artigo 198.° do Código de Processo Civil (aplicável subsidiariamente) - Regime geral da nulidade das citações AOS ANTECEDENTES DESTE PROCESSO 29 Atento a que sobre este mesmo assunto, aconteceu: Em 01.10.2024 a AT enviou ao TAF o PEF n° ……………………..038 que correu com o processo n° 1530/24.4BELRA Em, 18/11 /2024 o TAF veio a convolar o requerimento de Oposição em requerimento de arguição de nulidades processuais. 30 DO ENQUDARMENTO Legal De acordo com os artigos 268.°, n.° 3 da Constituição da República Portuguesa, 60.° da Lei Geral Tributária (LGT) e 36.° do CPPT, qualquer ato administrativo que afete um particular deve ser precedido de uma notificação formal. A ausência dessa notificação configura uma violação dos princípios do contraditório e da participação dos interessados, o que torna o título executivo ilegal. 31 A Reclamante exerceu o seu direito de audição junto da Câmara Municipal, conforme previsto no artigo 60.° da LGT. 32 No entanto, nunca recebeu qualquer notificação sobre a decisão final que recaiu sobre o referido procedimento. 33 Apesar de solicitada (DOC n° ). 34 A falta de notificação prévia invalida o título executivo, conforme disposto no artigo 36.° do CPPT e 148.°, n.° 1 do mesmo diploma, pois um título só pode ser exequível se o contribuinte tiver sido validamente notificado da decisão que lhe dá origem. Pedido: Assim, requer-se a anulação da execução fiscal supra identificada, com a consequente extinção do processo” (cfr. petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 3) Nos presentes autos, não foi proferido qualquer despacho de aperfeiçoamento (dos autos nada consta). 4) Foi proferido, a 17.03.2025, despacho liminar com o seguinte teor: “Recebo liminarmente a reclamação. Notifique o Exmo. Representante da Fazenda Pública para, querendo, no prazo de 8 dias, responder ao alegado no requerimento inicial, nos termos do n.º 2 do artigo 278.º do C.P.P.T.” (cfr. documento com o n.º de registo no SITAF neste TCAS 005738801). 5) Em requerimento apresentado pela Reclamante, de resposta à matéria de exceção suscitada pela administração tributária, consta designadamente o seguinte: “1. Do objecto da presente discordância Em 2025/02/17 , foi apresentada reclamação do ato administrativo referente à instauração pela AT do processo executivo nº ………………………711, com base em título executivo emitido pela Câmara Municipal de ………………….. , com base nos seguintes pontos: • A AT em parte alguma da sua Resposta esclarece quanto ao fato de que, apesar de exercido o direito de audição, pela requerente , não houve notificação formal da referida decisão final, o que contraria o devido processo no pontos 16 a 21 da PI. • A AT também na sua Resposta , demonstra ter realizado diligências suficientes para o apuro da verdade material , não indicando explicação sobre a ausência de documentos, conforme alegado no ofício nº 86 do Serviço de Finanças , que indicava a anexação de cópias de documentos que não foram fornecidas , conforme pontos nºs 1 a 6 da PI. • Em resposta, a AT alega que a informação pertinente está disponível na página da AT, mas não revela a forma de obtenção de tal informação, uma vez não fazer acompanhar a citação do t í tulo ou sobre a falta de diligências adequadas para a apuração da verdade material. • Pelo que a R só tomou conhecimento do título executivo após a oposição junto do tribunal. Logo não podia pronunciar-se sobre o mesmo mas sim sobre a citação. • No nº 21 da resposta da AT, escreve-se “ não vislumbramos que a petição da oposição à execução fiscal convolada em requerimento de arguição de nulidade se tenha suscitado a nulidade do titulo executivo ” – Ora resulta claro que na petição de oposição à execução o requerente pediu a nulidade do titulo executivo, aliás como consta nos números V a IX sendo que é entendível de todo o articulado que não se fazendo acompanhar do titulo executivo não era possível pedir a sua anulação. 2. Refutação dos Argumentos da AT • Ausência de Notificação da Decisão Final : A AT não contestou o fato de que a R. não foi notificada da decisão final relacionada ao direito de audição. Esta omissão prejudica gravemente o direito de defesa e de participação no processo. • Omissão de Diligências : A AT não fez qualquer diligência que permitisse a apuração da verdade material , o que demonstra falhas no procedimento administrativo. A falta de documentos e a ausência de explicações claras sobre a situação deixam evidente a falta de transparência e rigor na ação da AT. • Ademais, o artigo 98º nº 4 CPPT consagra que em caso de erro na forma do processo, este será convolado na forma do processo adequada, nos termos da lei , pelo que também aqui não se percebe o pretendido pela AT. 3. Argumentação sobre o Artigo 276º do CPPT A AT argumentou que o artigo 276º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais (CPPT) não seria adequado para solicitar a anulação da execução fiscal. Concorda-se que, para efeitos de anulação da execução fiscal, o artigo 276º do CPPT não é o mais indicado. No entanto, solicita-se a alteração do pedido para se adequar ao artigo 98º do CPPT, que trata da anulação de atos administrativos quando estes forem ilegais ou estiverem viciados por erro de facto ou de direito. Aqui chegados importa analisar o nº 23 da resposta da AT, que enuncia que a citação respeita o artigo 190º nº 1 do CPPT , em concreto os elementos referidos na alínea a), c), d) e e) do artigo 163º do CPPT., Ora, tudo isto é desconhecido da requerente, por não se apresentar junto à citação o titulo executivo, e não obstante isso, a citação deve conter os elementos previstos nas alínea a), c), d) e e) do artigo 163º do CPPT. o que não é o caso. (…) Finalmente: A reclamante, no âmbito do processo executivo em curso, exerceu o seu direito de defesa perante a Câmara Municipal, conforme previsto no artigo 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aguardando a decisão final sobre o referido direito. No entanto, a Câmara Municipal, na qualidade de entidade executante, não emitiu decisão final sobre o direito de defesa do reclamante e, em consequência, o processo executivo foi dado seguimento sem que tivesse sido cumprida essa formalidade A Autoridade Tributária, ao remeter o processo para o tribunal, não diligenciou para garantir que todas as etapas legais, incluindo a decisão final sobre o direito de defesa do contribuinte, tivessem sido cumpridas pela entidade executante, apesar de alertada, violando o dever de apurar a verdade material e o direito ao contraditório. (…) Conclusão A reclamante, em sede de petição entregue no Tribunal Fiscal, apresentou a reclamação referente ao processo executivo em que foi envolvido, alegando que não foi notificado da decisão final sobre o exercício do seu direito de audição, nos termos do disposto no artigo 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Aduz ainda que nenhuma diligência foi realizada para apurar a verdade, e que, ao limitar a sua atuação ao envio de documentos para o Tribunal, a Autoridade Tributária não exerceu a devida diligência para garantir que os factos fossem esclarecidos antes de dar seguimento ao processo executivo. Nos termos do artigo 276.º do CPPT, o exercício do direito de audição, tanto antes como após a decisão final, é uma garantia fundamental do contribuinte no contexto do procedimento tributário. O artigo 276.º dispõe, de forma clara, que, antes da prática de um ato administrativo que venha a afetar o direito do contribuinte, deve ser dada a possibilidade de exercício do direito de audição, com a devida notificação da decisão final. A ausência de notificação constitui uma falha processual grave, que compromete a legalidade e a regularidade do processo executivo. A Autoridade Tributária, ao remeter o processo para o tribunal, não diligenciou para garantir que todas as etapas legais, incluindo a decisão final sobre o direito de defesa do contribuinte, tivessem sido cumpridas pela entidade executante, violando o dever de apurar a verdade material e o direito ao contraditório. Nos termos do artigo 276.º do CPPT, a Administração Tributária deve assegurar que o direito de defesa do contribuinte seja efetivamente respeitado, o que inclui a decisão final sobre o exercício do direito de audição. Além disso, a AT tem o dever de apurar a verdade material e de diligenciar para garantir que todas as diligências legais sejam realizadas antes de permitir o prosseguimento do processo executivo, conforme estabelecido no artigo 60.º do CPPT e no artigo 33.º da Lei Geral Tributária (LGT). A Administração Tributária (AT), ao instaurar um processo executivo, tem o dever de apurar a verdade material e de realizar as diligências necessárias para garantir que o procedimento se desenvolva de acordo com os direitos do contribuinte, conforme estabelecido no artigo 60.º do CPPT, que consagra o dever de verificação e apuramento dos factos relevantes para a constituição da obrigação tributária. (…) Pedido Com face do exposto, venho por este meio alterar o pedido inicial da impugnação, requerendo a anulação do ato administrativo referente à execução fiscal, com base na ausência de notificação adequada da decisão final sobre o direito de audição e na omissão de diligências da AT para apurar a verdade material, nos termos do artigo 98º do CPPT. Nestes termos, requer-se a V. Ex.ª que, em face da alegada nulidade do processo executivo, por falta de notificação e de diligências para apurar a verdade, seja anulada a decisão administrativa que originou o processo executivo em questão por falta da devida observância dos direitos do contribuinte. Requer-se ainda a V. Ex.ª que determine a suspensão do processo executivo, até que sejam devidamente observadas as garantias legais do contribuinte, nomeadamente o direito de defesa e a emissão de uma decisão final sobre o exercício desse direito pela Câmara Municipal, sendo a AT responsável por diligenciar junto da entidade executante para garantir a regularidade do processo” (cfr. documento com o n.º de registo no SITAF neste TCAS 005738807). 6) Foi proferida decisão, no TAF de Leiria – Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, a 08.05.2025, da qual se extrai designadamente o seguinte: “A Fazenda Pública veio invocar o erro na forma do processo. Apreciando. Analisando a petição inicial apresentada, da mesma resulta que a Reclamante vem reagir contra a falta de notificação por parte do Município de Vila …………………. para o exercício do direito de audição prévia, concluindo que tal invalida o título executivo, peticionando a anulação da execução fiscal e a extinção do processo. Posteriormente, veio peticionar a alteração do pedido formulado, requerendo a anulação do acto administrativo referente à execução fiscal, com base na ausência de notificação adequada, tendo em conta a excepção de erro na forma de processo suscitada pela Fazenda Pública. Sucede que, nem sequer se compreende qual é então o acto cuja anulação veio requerer. Ou seja, daqui se depreende que a Reclamante apenas veio requerer a alteração de pedido na sequência do erro na forma do processo suscitado pela Fazenda Pública, obviando a verificação da referida excepção. Porém, lendo tanto a petição inicial, como o requerimento posterior da Reclamante, dos mesmos decorre inequivocamente que esta visa atacar uma vicissitude ocorrida no âmbito do procedimento administrativo, dirigido pelo Município de …………………….. – preterição do direito de audição prévia - e que no seu entender inquina de invalidade o título executivo. Ou seja, a Reclamante encontra-se a discutir a legalidade da dívida, não estando verdadeiramente a atacar qualquer acto em concreto, que nem sequer identifica, diga-se. Assim, independentemente da alteração do pedido, a presente forma processual não se mostra adequada à finalidade pretendida pela Reclamante, sendo correcto o meio processual de impugnação judicial (…) Nestes termos, convolo a petição inicial de oposição em petição inicial de impugnação judicial e determino a remessa dos presentes autos ao juízo Comum para distribuição e prossecução dos seus ulteriores termos” (cfr. documento com o n.º de registo no SITAF neste TCAS 005738814). 7) A decisão referida em 6) foi notificada às partes e ao IMMP e os autos foram distribuídos no Juízo Tributário Comum (cfr. documentos com os n.ºs de registo no SITAF neste TCAS 005738815 a 005738820). 8) Foi proferido, a 05.06.2025, despacho com o seguinte teor: “Considerando que: a. A 28/02/2025, deu entrada neste Tribunal petição inicial epigrafada “reclamação judicial”, em que a Autora pede “a anulação da execução fiscal supra identificada, com a consequente extinção do processo”, por falta de notificação da decisão final que determinou a liquidação do tributo liquidação (ref. 005951239); b. A 03/03/2025, os autos foram distribuídos ao Juízo de Execução Fiscal e de Recurso Contra-Ordenacionais deste Tribunal Administrativo e Fiscal; c. A 31/03/2025, a Autoridade Tributária e Aduaneira contestou, invocando, para além do mais, erro na forma do processo (ref. 005965118); d. A 22/04/2025, a Autora apresentou um requerimento em que pede o seguinte: “Nestes termos, requer-se a V. Ex.ª que, em face da alegada nulidade do processo executivo, por falta de notificação e de diligências para apurar a verdade, seja anulada a decisão administrativa que originou o processo executivo em questão por falta da devida observância dos direitos do contribuinte” (ref. 005973801); e. A 08/05/2025, o Juízo de Execução Fiscal e de Recurso Contra-Ordenacionais deste Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria proferiu sentença nos autos em que decide a convolação da “petição inicial de oposição em petição inicial de impugnação judicial e determino a remessa dos presentes autos ao juízo Comum para distribuição e prossecução dos seus ulteriores termos.” (ref. 005978982); f. A competência de um tribunal para conhecer da matéria determina-se em função do objecto do processo, ou seja, o nexo existente entre o pedido (efeito jurídico pretendido) e os factos jurídicos invocados que sustentam as pretensões (art. 581.º/3 e /4 CPC); g. O art. 204.º/1/i) CPPT estipula que é fundamento de oposição à execução fiscal “Quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título.”; h. A falta de notificação do acto administrativo que determina a liquidação de um tributo é fundamento de oposição à execução fiscal (Acórdão Pleno STA de 18/09/2013, Proc. n.º 0578/13); i. Consta do art. 49.º-A/1 ETAF: “1 - Quando tenha havido desdobramento em juízos de competência especializada, nos termos do disposto no artigo 9.º-A, compete: a) Ao juízo tributário comum, conhecer de todos os processos que incidam sobre matéria tributária e cuja competência não esteja atribuída ao juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, bem como exercer as demais competências atribuídas aos tribunais tributários; b) Ao juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, conhecer de todos os processos relativos a litígios emergentes de execuções fiscais e de contraordenações tributárias;” Pelo exposto, apenas são competência de conhecimento dos juízos tributários comuns as matérias que não estejam atribuídas aos juízos de execução e de contra-ordenações. A oposição à execução fiscal é da competência dos juízos de execução tributária e de contra-ordenações. Em conclusão: Resulta da petição inicial que a Autora pretende que se pronuncie sobre a legalidade de um processo de execução fiscal, para o que será competente o juízo de execuções fiscais e contra-ordenações tributárias. Este Juízo Comum perspectiva a possibilidade de se declarar materialmente incompetente, uma excepção dilatória de conhecimento oficioso e que precede todas as demais (arts. 13.º e 89.º/1, /2, /4/a) CPTA). Nesta circunstância, e tendo sido proferida sentença de incompetência material do Juízo de Execuções Fiscais e Contra-Ordenações Tributárias, transitada, colocar-se-á a possibilidade de existência de conflito negativo de competência, a ser dirimido pelo Presidente do Tribunal Central Administrativo Sul (art. 36.º/1/t) ETAF). Nestes termos, impõe-se dar contraditório às partes para, querendo, se pronunciarem” (cfr. documento com o n.º de registo no SITAF neste TCAS 005738822). 9) Foi apresentado requerimento, na sequência do mencionado em 8), do qual consta designadamente o seguinte: “1. A presente ação foi intentada com o objetivo de ver anulada a execução fiscal, por falta de notificação da decisão final, sobre o direito de audição exercido logo da notificação da liquidação do tributo, o que impede o exercício do contraditório e do direito de defesa, conforme alegado desde a petição inicial. 2. Tal fundamento corresponde ao previsto na alínea h) e i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, razão pela qual se configura como uma verdadeira oposição à execução fiscal, e não como impugnação da legalidade da liquidação. 3. Nesse sentido, reconhece-se que a competência material para apreciação da presente ação cabe ao Juízo de Execuções Fiscais e Contraordenações Tributárias, nos termos do artigo 49.º-A do ETAF. 4. Fundamento: Falta de notificação da decisão final relativa ao direito de audição → vício que contamina o título executivo; 5. Competência: Juízo de Execuções Fiscais do Tribunal Administrativo e Fiscal competente; 6. Como já existe título executivo e foi citado na execução fiscal, o meio processual mais eficaz é a Oposição À Execução Fiscal, nos termos do artigo 204.º, n.º 1, alínea i) do CPPT, com base na falta de notificação da decisão final após o exercício do direito de audição. 7. Objetivo: Obter a extinção da execução fiscal, com base na invalidade do título executivo. Nestes termos, e nos melhores de direito requer-se a V. Ex.ª que: • Se declare a competência do Juízo de Execuções Fiscais e Contraordenações Tributárias; • E se remetam os autos novamente a esse juízo, evitando-se o conflito negativo de competência.” (cfr. documento com o n.º de registo no SITAF neste TCAS 005738825). 10) Foi proferida decisão no TAF de Leiria – Juízo Tributário Comum, a 01.07.2025, da qual se extrai designadamente o seguinte: “Extrai-se da petição inicial que a Peticionante pretende que se pronuncie sobre a legalidade de um processo de execução fiscal, por não ter sido notificada do acto de liquidação (art. 295.º e 236.º/1 CC). Ou seja, matéria da competência do Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria. A incompetência material é uma excepção dilatória de conhecimento oficioso e que precede todas as demais (arts. 13.º e 89.º/1, /2, /4/a) CPTA). Este Juízo Comum declarar-se-á, assim, incompetente para conhecer da matéria” (cfr. documento com o n.º de registo no SITAF neste TCAS 005738827). 11) Quando os presentes autos chegaram a este Tribunal, ambas as decisões judiciais tinham transitado em julgado (cfr. plataformas SITAF e Magistratus). * II.B. Apreciando. Considerando o quadro processual descrito, cumpre decidir qual o juízo materialmente competente para o conhecimento dos autos, se o Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais, se o Juízo Tributário Comum. Vejamos, então. Nos termos do art.º 36.º, n.º 1, alínea t), do ETAF, compete ao Presidente de cada Tribunal Central Administrativo “conhecer dos conflitos de competência entre tribunais administrativos de círculo, tribunais tributários ou juízos de competência especializada, da área de jurisdição do respetivo tribunal central administrativo”, sendo que, no âmbito do contencioso administrativo e, subsidiariamente, tributário, os conflitos de competência jurisdicional encontram-se regulados nos art.ºs 135.º a 139.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA). Estabelece-se no n.º 1 do art.º 135.º do CPTA que a resolução dos conflitos “entre tribunais da jurisdição administrativa e fiscal ou entre órgãos administrativos” segue o regime da ação administrativa, com as especialidades resultantes das diversas alíneas deste preceito, aplicando-se subsidiariamente, com as necessárias adaptações, o disposto na lei processual civil (cfr. art.ºs 109.º e ss. do CPC). Por sua vez, o art.º 136.º do mesmo diploma estatui que “a resolução dos conflitos pode ser requerida por qualquer interessado e pelo Ministério Público no prazo de um ano contado da data em que se torne inimpugnável a última das decisões”. Entende-se (como tem sido pacífico na jurisprudência deste TCAS) que, apesar de o art.º 136.º do CPTA manter a redação originária, a mesma não afasta a aplicação da norma constante do n.º 1 do art.º 111.º do CPC, a qual deve ser também aplicada no contencioso administrativo e tributário, com as devidas adaptações, ex vi art.º 135.º, n.º 1, do CPTA. Ademais, a competência, designadamente em razão da matéria, dos tribunais administrativos e fiscais é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria (cfr. o art.º 13.º do CPTA e o art.º 16.º, n.º 2, do CPPT). É também de atentar no art.º 49.º do ETAF, nos termos do qual: “1 - Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, compete aos tribunais tributários conhecer: a) Das ações de impugnação: i) Dos atos de liquidação de receitas fiscais estaduais, regionais ou locais, e parafiscais, incluindo o indeferimento total ou parcial de reclamações desses atos; ii) Dos atos de fixação dos valores patrimoniais e dos atos de determinação de matéria tributável suscetíveis de impugnação judicial autónoma; iii) Dos atos praticados pela entidade competente nos processos de execução fiscal; iv) Dos atos administrativos respeitantes a questões fiscais que não sejam atribuídos à competência de outros tribunais; b) Da impugnação de decisões de aplicação de coimas e sanções acessórias em matéria fiscal; c) Das ações destinadas a obter o reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos em matéria fiscal; d) Dos incidentes, embargos de terceiro, reclamação da verificação e graduação de créditos, anulação da venda, oposições e impugnação de atos lesivos, bem como de todas as questões relativas à legitimidade dos responsáveis subsidiários, levantadas nos processos de execução fiscal; e) Dos seguintes pedidos: i) De declaração da ilegalidade de normas administrativas emitidas em matéria fiscal; ii) De produção antecipada de prova, formulados em processo neles pendente ou a instaurar em qualquer tribunal tributário; iii) De providências cautelares para garantia de créditos fiscais; iv) De providências cautelares relativas aos atos administrativos impugnados ou impugnáveis e as normas referidas na subalínea i) desta alínea; v) De execução das suas decisões; vi) De intimação de qualquer autoridade fiscal para facultar a consulta de documentos ou processos, passar certidões e prestar informações; f) Das demais matérias que lhes sejam deferidas por lei. 2 - Compete ainda aos tribunais tributários cumprir os mandatos emitidos pelo Supremo Tribunal Administrativo ou pelos tribunais centrais administrativos e satisfazer as diligências pedidas por carta, ofício ou outros meios de comunicação que lhe sejam dirigidos por outros tribunais tributário”. Por seu turno, nos termos do art.º 49.º-A do mesmo diploma: “1 - Quando tenha havido desdobramento em juízos de competência especializada, nos termos do disposto no artigo 9.º-A, compete: a) Ao juízo tributário comum, conhecer de todos os processos que incidam sobre matéria tributária e cuja competência não esteja atribuída ao juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, bem como exercer as demais competências atribuídas aos tribunais tributários; b) Ao juízo de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, conhecer de todos os processos relativos a litígios emergentes de execuções fiscais e de contraordenações tributárias”. A competência em razão da matéria é fixada em função dos termos em que a ação é proposta, isto é, a mesma tem subjacente a pretensão da, in casu, Reclamante e os fundamentos em que esta a alicerça [cfr. Acórdão do Plenário do Supremo Tribunal Administrativo, de 21.03.2012 – (Processo: 0189/11): “A competência (ou jurisdição) de um tribunal afere-se pelo quid decidendum, ou seja, pelos objectivos prosseguidos pelo autor, que são, no recurso de acto administrativo, anular este, ou declarar a sua nulidade, com fundamento nos vícios que se lhe apontem”]. Veja-se que o teor dos fundamentos em que a parte alicerça o seu pedido não tem a ver com a viabilidade que esses fundamentos têm para a procedência desse pedido. Daí que, por exemplo, seja possível indeferir liminarmente uma oposição por manifesta improcedência ou por “[n]ão ter sido alegado algum dos fundamentos admitidos no n.º 1 do artigo 204.º” [cfr. o art.º 209.º do CPPT; cfr. ainda o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11.05.2016 (Processo: 01395/13)]. Atenta a relação controvertida, tal como configurada pela Reclamante, decorre que foi instaurada contra si uma execução fiscal, que a mesma entende, desde logo e em primeira linha, face ao pedido principal que formula, que deve ser “anulada” [extinta, como refere no requerimento de esclarecimento que apresenta mencionado em 9)]. Nunca a Reclamante pediu a anulação da liquidação, como decorre da petição inicial e como é, posteriormente, por si esclarecido. A mesma visa atacar a execução fiscal. Aliás, veja-se que a Reclamante, na sequência do referido em 1), vem apresentar reclamação judicial, onde imputa, na causa de pedir, desde logo, diversas irregularidades da citação e falta de notificação da decisão final que esteve na origem da dívida exequenda. Ora, logo atentando nestas causas de pedir, verifica-se que as mesmas estão associadas ao contencioso inerente à execução fiscal, o que, considerando o pedido formulado, independentemente de existir ou não erro na forma do processo, evidencia que de modo algum se está no âmbito do Juízo Tributário Comum. Ainda que haja uma menção à audição prévia, a mesma é configurada a latere, na medida em que a Reclamante o que refere é que a decisão que deu origem à dívida exequenda nunca lhe foi notificada. Mais: ainda que fosse interpretado o alegado como invocação de violação do direito de audição, vício que, se associado à liquidação, pode ser invocado em sede de impugnação judicial, a causa de pedir é complexa e abrange fundamentos que, como já referido, são próprios do contencioso associado à execução fiscal. Como tal, conclui-se que a competência material, in casu, é do Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais [art.º 5.º e art.º 49.º-A, n.º 1, alínea b), ambos do ETAF; art.º 7.º, alínea d), do DL n.º 174/2019, de 13 dezembro, conjugado com a alínea f) do art.º 1.º da Portaria n.º 121/2020, de 22 de maio].
III. Decisão Face ao exposto, decide-se o presente conflito pela atribuição de competência para a tramitação e decisão do processo ao Juízo de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do TAF de Leiria. Sem custas. Registe e notifique. Baixem os autos. Lisboa, d.s. A Juíza Desembargadora Presidente, (Tânia Meireles da Cunha) |