Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:295/20.3BEBJA
Secção:CT
Data do Acordão:06/05/2025
Relator:VITAL LOPES
Descritores:ADUANEIRO
CONTROLO ADUANEIRO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
VALOR ADUANEIRO
DIREITO DE AUDIÇÃO
APROVEITAMENTO DO ACTO
Sumário:i) A administração aduaneira, nas decisões que profira, está obrigada ao respeito pelo dever de fundamentação, respeito esse fundamental para assegurar o direito de defesa do administrado e, dessa forma, assegurar a tutela jurisdicional efectiva.

ii) Não está cabalmente fundamentada a decisão proferida pela administração aduaneira (na sequência da qual foi emitida liquidação de direitos e IVA, por existirem dúvidas sobre o valor aduaneiro declarado), quando nessa decisão não resulta cabalmente explanada a motivação subjacente à existência de dúvidas fundadas, à não consideração dos elementos adicionais apresentados pelo administrado e ao motivo pelo qual foi tomada uma determinada opção em termos de método adoptado, não sendo suficientes meras fórmulas conclusivas.

iii)A falta de fundamentação só pode ser considerada como irregularidade não invalidante quando for possível concluir, com a certeza exigível, que a decisão seria sempre a mesma, o que não ocorre quando nem se conseguem alcançar os pressupostos de base da actuação da administração.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SUBSECÇÃO COMUM DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I. RELATÓRIO

A Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada, vem interpor recurso da decisão proferida pelo TAF de Beja em 15.06.2022 na qual foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida por M……… ………….. Trade, S.A., na sequência do acto tácito de indeferimento que se formou sobre a reclamação graciosa oportunamente apresentada contra o acto de liquidação de direitos e outros encargos, , no valor de €16.365,96 , praticado pelo Sr. Chefe da Delegação Aduaneira de Sines, no âmbito da declaração de importação nº…………………034, de 01/07/2019.

Apresentou alegações que culmina com as seguintes e doutas conclusões: «
A) Vem o presente recurso interposto da douta sentença datada de 15-06-2022, que julgou procedente a impugnação supra identificada, por ter entendido que a liquidação impugnada, objecto mediato da presente impugnação, padecia de falta de fundamentação, o que determinava a sua anulação e prejudicava a apreciação das demais questões e dos demais vícios nos termos do art.° 124.° n.° 2 b) do CPPT;

B) Com a devida vénia não pode a Fazenda conformar-se com tal sentido decisório, considerando que existe erro, quer quanto à apreciação da matéria de facto, quer de direito, entendendo que, na sua perspetiva, não existem razões válidas para julgar a impugnação procedente.

C) Com efeito, existe erro de julgamento quanto à matéria de facto, porquanto a douta sentença faz uma errada valoração e apreciação da prova carreada para os autos, na medida em que suporta conclusões em factos do probatório, factos esses que não permitiriam retirar tais ilações. Pelo contrário!

D) Existe erro de julgamento em matéria de direito por errada aplicação e interpretação do disposto nos artigos 22.° n.°6 do CAU e artigos 60.° n.° 7 e 77.°, n.° 1, da LGT, artigos 70.° e 74.° do CAU e artigos 140.° e 144.° do AE-CAU, não se conformando a Fazenda Pública com a interpretação e conclusões daquele douto tribunal;

E) Desde logo, porque resulta da prova carreada para os autos, que a Administração cumpriu o dever de fundamentação do ato de liquidação notificado à impugnante.

Do erro de julgamento da matéria de facto e errada valoração da prova:

F) Analisados os elementos de suporte para onde remete a decisão em causa, verifica-se que a fundamentação da decisão da DAS é clara e congruente e permite à impugnante ora recorrida, a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela Administração Tributária.

G) Na verdade, a fundamentação que é dada a conhecer à recorrida, consta do probatório nomeadamente através do ofício n.° 295/2019 (que consta da alínea b) da matéria de facto provada), da informação para o exercício do direito de audição (informação n.° 050/APV/19 que consta da al. g) da matéria de facto provada) e da notificação de cobrança (que consta da alínea k) da matéria de facto provada);

H) São factos que foram relevados no probatório, e que se mostram suficientes para que a impugnante, aqui recorrida, pudesse ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na génese da liquidação.

I) Os referidos documentos, nomeadamente a informação n.° 050/APV/19 que consta da al. g) da matéria de facto provada), contêm os elementos bastantes para que a recorrida tenha - ao contrário do que concluiu o douto tribunal a quo - conhecimento do porquê do valor declarado ter sido considerado pela DAS como excecionalmente baixo, tenha conhecimento do valor base AMT proposto ou "valores médios” e valor declarado (melhor identificados no ponto 11 das alegações), e da "fonte” desse valor proposto;

J) Encontram-se ainda indicadas [no ponto 8 daquela informação n.° 050/APV/19 que consta da al. g) da matéria de facto provada) a taxa de direitos, a taxa de IVA, o montante dos direitos apurados (pela "diferença” entre o valor declarado e o valor proposto), a base tributável do IVA e o montante de IVA (calculado pela "diferença”).

K) Dos elementos levados ao probatório, nomeadamente a informação n.° 050/APV/19 que consta da al. g) da matéria de facto provada) consta ainda que o cálculo é efetuado pela diferença, apurada pela dedução do valor declarado ao valor proposto AMT, sendo este conjunto de elementos suficiente, para o cabal esclarecimento sobre a motivação da liquidação e para sindicar o seu cálculo por mera operação aritmética.

L) Considerou o douto Tribunal a quo que, não obstante a documentação e as explicações dadas pela Impugnante, aqui recorrida, não se extrai da fundamentação da liquidação o porquê desses elementos não serem esclarecedores. Ora,

M) A motivação das razões pelas quais as explicações e documentos não foram suficientes para afastar as dúvidas da DAS, quer quanto ao valor declarado, quer quanto à aplicação do método de determinação do valor aduaneiro, encontra-se devidamente explanada na informação n.° 050/APV/19 que consta da al. g) da matéria de facto provada).

N) Nesta informação que foi levada ao probatório, complementada pelo ofício n.° 295/2019 (que consta da alínea b) da matéria de facto provada) remetido pela recorrente, são expressas as razões, pelas quais a recorrida não conseguiu afastar as “dúvidas fundadas” que, nos termos do disposto no n.° 2 do art.°140.° do AE-CAU, legitimam a Administração Tributária a decidir que o valor das mercadorias, não pode ser determinado de acordo com o artigo 70.°, n.°1 do Código Aduaneiro da União.

O) De igual forma, a Administração Tributária informou a ora recorrida, que a apresentação de documentos autênticos que atestassem o valor transacional declarado não invalidava que as autoridades aduaneiras mantivessem as dúvidas fundadas «caso esses documentos não permitam justificar o valor transacional declarado.»

P) Ora, sendo certo que a impugnante não juntou prova bastante para justificar o preço declarado para a mercadoria em questão face ao valor AMT correspondente, nem esclareceu, sem margem para qualquer dúvida, a razão de tal preço, não se vislumbra que outras considerações adicionais poderiam ter sido formuladas pela DAS relativamente às explicações dadas pela Impugnante ora recorrida.

Q) Considerou ainda a douta sentença recorrida que não se consegue compreender o porquê de ter sido excluída a aplicação do método de determinação do valor aduaneiro baseado no valor transacional e a necessidade de adotar métodos secundários, com o argumento de que não foi possível aceder às características das mercadorias;

R) Em relação a este aspeto importa, ter presente que, ao contrário do que conclui o douto tribunal, consta do ponto 7 da informação para o exercício do direito de audição já acima referida (que consta da al. g) da matéria de facto provada), o motivo: por um lado, a impossibilidade de aceder às características das mercadorias (que não, as abrangidas pela declaração aduaneira aqui em causa) e por outro, o facto da descrição dos itens das faturas ser demasiado genérica o que impedia uma caracterização objetiva das mercadorias.

S) Deveras, a AT não dispunha de outros elementos com vista a estabelecer um valor de substituição, que não fosse o recurso aos valores médios constantes das bases de dados disponibilizados na ferramenta AMT.

T) Posto isto é forçoso concluir, que a fundamentação usada pela DAS para efeitos da rejeição do método do valor transacional, encontra-se plenamente realizada e é percetível para o administrado "colocado na posição de um destinatário normal”.

U) Concluiu ainda o douto tribunal a quo que a Administração não ponderou nem se pronunciou, sobre o exercício do direito de audição exercido pela ora recorrida. Vejamos,

V) Segundo jurisprudência assente, o cumprimento dos direitos de defesa por parte das Administrações dos Estados membros (sempre que tomem decisões que recaem no âmbito de aplicação do direito da União) basta-se com a observância do prazo decorrido entre o momento em que a Administração em causa recebeu as observações da pessoa ou empresa em causa em sede de audição prévia e a data em que tomou a sua decisão, mas já não, que tenha em conta nas suas decisões as observações suscitadas;

W) Por outra via, a legislação aduaneira da União estabelece regras próprias em matéria de audição prévia do interessado antes de ser tomada uma decisão, pelas autoridades aduaneiras, que tenha consequências adversas para o interessado, veja-se o disposto no artigo 22.°, n.° 6 do CAU (aplicável no contexto da cobrança de uma dívida aduaneira em face do que dispõe o artigo 29.° do CAU), nos artigos 8.° a 10.° do AD-CAU e nos artigos 8.° e 9.° do AE-CAU.

X) Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma violação dos direitos de defesa, só implica a anulação da decisão se, na inexistência dessa irregularidade, o procedimento pudesse conduzir a um resultado diferente.

Y) Em face do acima exposto, a audição prévia do interessado, no quadro de uma ação de cobrança de uma dívida aduaneira, deve atender ao regime legal consagrado no Direito da União, o qual deve ser interpretado à luz do principio fundamental do direito da União do respeito dos direitos de defesa, e a forma como esse princípio é interpretado pela jurisprudência designadamente do Tribunal de Justiça da União Europeia.

Z) Termos em que, é forçoso concluir que a Administração Tributária não violou o disposto nessa norma.

AA) Por outra via, no âmbito do exercício do direito de audição, face aos requerimentos (anteriormente) apresentados pela recorrida, apenas foi trazido um elemento novo, ou seja, a recorrida contesta o facto da DAS arguir que não teve a possibilidade de aceder às mercadorias quando as mesmas foram objeto de controlo físico. Ora este elemento novo apresentado assenta no pressuposto errado de que a DAS se refere às mercadorias que constam da declaração aduaneiro objeto de liquidação.

BB) Por outro lado, esse argumento é apenas uma conclusão, pelo que, não se impunha, em face do que dispõe o n.° 7 do artigo 60.° da LGT, que a DAS tivesse de se pronunciar quanto à mesma em sede da fundamentação do ato de liquidação.

CC) Por fim, no cenário hipotético de se vir a concluir que as autoridades aduaneiras violaram o disposto no n.° 7 do artigo 60.° do LGT, sempre seria de considerar a jurisprudência do Tribunal de Justiça suprarreferida, que dita que o Tribunal nacional não deve, ainda assim, anular o ato de liquidação, já que, e pelas razões acima indicadas, se na ausência dessa alegada irregularidade, o procedimento não conduziria a um resultado diferente.

DD) Daí que não se acompanhe a sentença recorrida quando conclui pela não fundamentação do ato de liquidação.

EE) Pelo exposto, entende a Fazenda Pública que a douta sentença errou no seu julgamento, sendo imperioso concluir que a liquidação em apreço não padece do apontado vício de falta de fundamentação, impondo-se a revogação da sentença aqui em escrutínio.

Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, com todas as legais consequências.»

Notificada da interposição de recurso, a Impugnante, ora Recorrida, apresentou contra-alegações, concluído como segue: «

1. As presentes Contra-Alegações têm por objeto o Recurso interposto pela Fazenda Pública da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja ("TAF de Beja"), em 15/06/2022, no processo n.° 295/20.3BEBJA, a qual julga procedente a Impugnação Judicial apresentada pela aqui Recorrida do ato de liquidação praticado pela DAS no montante global de € 16.365,96 (dezasseis mil, trezentos e sessenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos), relativo a direitos aduaneiros e IVA, entendendo que tal ato de liquidação não se encontra devidamente fundamentado,

2. O que por sua vez, determina a anulação do mesmo, obstando ao conhecimento dos demais vícios invocados pela Recorrida em sede de Impugnação Judicial.

3. Em concreto, decorre da Sentença Recorrida que tal falta de fundamentação é particularmente evidente nos seguintes aspetos: por que motivo a documentação apresentada pela Recorrida não foi suficientemente esclarecedora para dissipar as dúvidas sobre o preço pago; por que motivo o valor faturado (i.e., preço pago pelas mercadorias que corresponde ao valor declarado na importação) é considerado excecionalmente baixo e com base em que critérios; por que motivo não foi possível aplicar um outro método alternativo para determinação do valor aduaneiro; e por que motivo não foram os argumentos invocados pela Recorrida em sede de audição prévia tidos em consideração pela DAS.

4. Em primeiro lugar, alega a Fazenda Pública que o ato de liquidação impugnado se encontra devidamente fundamentado uma vez que a DAS indicou o valor (alegadamente, um valor médio estatístico AMT/THESEUS) com o qual terá comparado o valor declarado pela Recorrida na importação, o qual corresponde, tal como já referido e demonstrado inúmeras vezes, ao preço que pagou pela aquisição das mercadorias em causa (valor transacional).

5. Ora, a este respeito, sempre se dirá que, não obstante tal valor médio AMT/THESEUS ter sido indicado, onde claramente a DAS falhou na fundamentação do ato de liquidação em crise foi na indicação das normas legais que alegadamente justificariam e permitiriam que a suposta diferença entre o valor transacional declarado pelo importador (considerado "excecionalmente baixo") e um "valor médio AMT" constante de uma base de dados de exclusivo conhecimento da Autoridade Aduaneira, poder ser, por si só, suficiente e legítimo para que a DAS desconsidere o valor transacional como método de determinação do valor aduaneiro, não obstante o importador ter demonstrado que o valor declarado corresponde inequivocamente à totalidade do preço de compra negociado e pago ao fornecedor e, em consequência.

6. Da mesma forma, e na sequência do que se acaba de referir, não indicou igualmente a DAS quais normas legais que alegadamente permitem e legitimam a substituição do valor transacional declarado pelo importador pelo referido valor médio da ferramenta AMT para efeitos de determinação do valor aduaneiro da importação.

7. Sendo certo que a justificação para esta ausência de referência às normas legais que legitimassem o entendimento da DAS é simplesmente o facto de tais normas não existirem, uma vez que a legislação aduaneira, e muito em particular os artigos 70.° e seguintes do Código Aduaneiro da União (CAU), são muito claros no que toca a estabelecer que a determinação do valor aduaneiro para efeitos de cálculo das imposições devidas pela importação de mercadorias é feita, regra geral, com base no valor transacional das mesmas, isto é, com base no preço pago pelo importador ao vendedor, independentemente de tal preço ser reduzido ou não.

8. Em segundo lugar, continua a Fazenda Pública, nas suas Alegações de Recurso, a desconsiderar e ignorar em absoluto o teor e valor probatório da informação e documentação fornecidas pela Recorrida para dissipar as alegadas dúvidas das autoridades aduaneiras.

9. Ora, tal como amplamente demonstrado nos presentes autos e confirmado pela Sentença Recorrida, ao longo do procedimento de liquidação foi junta pela Recorrida documentação diversa (incluindo Ordem de Compra e comprovativo de pagamento), bem como informação sobre os contornos da negociação com o fornecedor, assim se justificando que o valor declarado corresponde efetivamente ao valor pago pelas mercadorias.

10. Sucede que, nas Alegações de Recurso, continua a Recorrente a referir apenas que a Recorrida "não juntou prova bastante para justificar o preço declarado para a mercadoria em questão face ao valor AMT correspondente, nem esclareceu, sem margem para dúvida fundada, a razão de tal preço".

11. Ora, a este respeito importa esclarecer que não existe, no direito internacional, nem no direito da União Europeia, e menos ainda no direito nacional, qualquer norma que imponha aos importadores o dever/obrigação de explicarem às autoridades aduaneiras uma diferença entre o valor transacional declarado (correspondente ao preço por si negociado e pago - e, assim conhecido) e um "valor estatístico médio da União Europeia para a importação de mercadorias similares" que naturalmente desconhecem.

12. O que a legislação prevê é apenas a obrigação de os importadores, sempre que instados a tal, demonstrarem às autoridades aduaneiras que o valor transacional declarado nas importações corresponde ao preço efetivamente pago,

13. Sendo que, para este efeito, podem os importadores - tal como fez a aqui Recorrida - e tendo em vista a cabal demonstração da circunstância de terem efetivamente pago o valor (transacional) que declararam, procurar explicar às autoridades aduaneiras o modo como o preço das mercadorias foi negociado, bem como fornecer todos os documentos e informações inerentes a tal negociação, como sejam as ordens de compra, as fichas técnicas dos produtos e os comprovativos de pagamento.

14. Ora, fornecida que foi toda esta documentação e informação e, adicionalmente, mantida à disposição das autoridades os registos contabilísticos para a consulta e verificações que se identifiquem adicionalmente necessárias. não concebe a Recorrida que a Recorrente entenda não ter sido junta "prova bastante",

15. Sendo ainda certo que a DAS, em momento algum, solicitou qualquer informação ou documento em concreto que não tenha sido fornecido, ou mesmo procurou aceder aos registos contabilísticos da Recorrida, aos quais pode aceder a todo o momento.

16. Por fim, não se aceita também a argumentação invocada pela Fazenda Pública no que respeita à impossibilidade de utilização de outro método de determinação do valor aduaneiro que não seja o método do último recurso, com utilização dos valores médios estatísticos AMT.

17. Desde logo porque, em primeiro lugar, tendo em consideração as circunstâncias do caso em apreço, não podem as autoridades aduaneiras simplesmente recusar a aplicação do método do valor transacional dado que os pressupostos de tal afastamento não se encontram reunidos.

18. Em segundo lugar, ainda que tais pressupostos efetivamente se verificassem no caso em discussão - o que não se admite e apenas se equaciona por cautela de patrocínio -, sempre seriam as autoridades aduaneiras obrigadas a realizar todas as diligências necessárias à utilização dos outros métodos, não se limitando a remeter tal obrigação para o importador, como aconteceu neste caso.

19. Em conformidade é o próprio TJUE que refere que "tendo em conta essa obrigação de diligência que lhes é imposta na aplicação dessa disposição, as autoridades aduaneiras são obrigadas a consultar todas as fontes de informação e bases de dados de que dispõem",

20. O que aparentemente não aconteceu na importação em crise, ou se aconteceu, tal não foi demonstrado pela DAS.

21. Por tudo o que se acaba de expor, não resta outra conclusão que não seja a de se confirmar o teor da Sentença Recorrida, e manter a decisão de anulação do ato de liquidação impugnado.

Subsidiariamente à cautela,

22. Caso assim não se entenda, o que apenas se admite por cautela de patrocínio, e na eventualidade deste Tribunal vir a dar razão à Recorrente, e bem assim determinar que o ato de liquidação que impugnado se encontra efetivamente bem fundamentado, à luz dos princípios do direito administrativo, fiscal e aduaneiro aplicáveis, sempre se dirá que, nos termos do disposto no artigo 665.°, n.° 2 do CPC, subsidiariamente aplicável ao processo tributário (nos termos do artigo 2.°, e) do CPPT), se impõe a apreciação dos restantes vícios invocados pela Recorrida em sede de Impugnação Judicial, designadamente:

a. Da ilegalidade da recusa do Método do Valor Transacional (artigos 72.° a 93.° da petição inicial)

b. Da ilegalidade da interpretação da ATA do artigo 140°, do AE-CAU ao caso em apreço (artigos 94.° a 155.° da petição inicial)

c. Da ilegalidade da utilização dos valores médios (artigos 156.° a 177.° da petição inicial)

d. Da ilegalidade da aplicação do Método do Último Recurso (artigos 178.° a 230.° da petição inicial)

e. Da inconstitucionalidade e da ilegalidade resultantes da ingerência das autoridades aduaneiras nos negócios celebrados entre privados (artigos 231° a 261.° da petição inicial)

NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO APLICÁVEIS, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO TOTALMENTE IMPROCEDENTE E, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, DECIDINDO-SE PELA PROCEDÊNCIA DO RECURSO QUANTO À INEXISTÊNCIA DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO ATO DE LIQUIDAÇÃO, DEVERÃO SER APRECIADOS OS VÍCIOS ARGUIDOS PELA RECORRIDA EM SEDE DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, CONCLUINDO-SE PELA ILEGALIDADE DO ATO DE LIQUIDAÇÃO EM APREÇO E A CONSEQUENTE ANULAÇÃO DO MESMO, COM TODAS AS DEMAIS E LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.
ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!».

O Ministério Público no Tribunal recorrido também apresentou contra-alegações, culminando com as seguintes conclusões:«

1. Não se conformando com a douta sentença proferida nos autos, vem a Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) interpor o presente recurso alegando, em síntese, que a sentença recorrida sofre do vício de erro de julgamento em matéria de facto por errada valoração da prova e do vício de erro de julgamento por errada aplicação e interpretação do disposto nos artigos 22.º n.º 6 do CAU e artigos 60.º n.º 7 e 77.º, n.º 1, da LGT, artigos 70.º e 74.º do CAU e artigos 140.º e 144.º do AE-CAU; da prova carreada para os autos resulta que a ATA cumpriu o dever de fundamentação do acto de liquidação notificado à impugnante.

2. No âmbito da declaração aduaneira de importação nº ……………..034 de 01.07.2019 foi a Impugnante M …………………. TRADE, S.A. notificada do Ofício n.º 295 de 2.07.2019, do Exmo. Senhor Chefe da Delegação Aduaneira de Sines através do qual lhe foi solicitada “informação adicional que justifique o valor transacional extremamente baixo declarado” na importação das mercadorias importadas uma vez que se terão suscitado dúvidas sobre se o valor declarado no mencionado DAU corresponde de facto ao preço efetivamente pago ou a pagar pelas ditas mercadorias.

3. Na sequência deste ofício, a Impugnante disponibilizou diversa documentação, designadamente, ordens de encomenda, faturas comerciais, ficha técnica dos artigos e comprovativos de pagamento, todos devidamente referenciados, a qual, no seu entender, não deixa margem para dúvidas quanto ao facto de o valor aduaneiro declarado corresponder efetivamente ao valor pago pelos bens importados.

4. A Impugnante procedeu então ao envio atempado de um novo requerimento ao qual juntou a factura comercial, a ordem de compra e o comprovativo de pagamento, como objectivo de dissipar quaisquer dúvidas que pudessem ter restado sobre a absoluta correspondência do valor aduaneiro constante da declaração aduaneira de importação supramencionada com o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas.

5. Considerando a ATA que “o valor transacional deve refletir o valor económico real de uma mercadoria” (…) decidiu “afastar o preço declarado das mercadorias importadas e recorrer aos métodos secundários de determinação do valor aduaneiro das mesmas mercadorias”, e como consequência, decidiu a AT “na impossibilidade de aplicação dos métodos previstos no artigo 70.º e nos números 1 e 2 do artigo 74.º do CAU, o valor aduaneiro deverá ser calculado através do método previstos no n.º 3 do artigo 74.º daquele Regulamento Comunitário, que assim se assume como o método de último recurso”.

6. A Impugnante discordou de tal entendimento aquando do exercício do seu direito de audiência prévia mas foi entretanto notificada do Ofício nº 623 de 13.11.2019 através do qual foi informada de que a “AT mantém fundadas dúvidas sobre o valor aduaneiro declarado pelo que aplicará o método do último recurso previsto no n.º 3 do artigo 74.º do Código Aduaneiro da União” exigindo o pagamento do montante de 16.365,96 €, que resulta da correcção do valor aduaneiro inicialmente declarado, nos termos descritos no ponto antecedente.

7. Os actos tributários estão sujeitos a fundamentação conforme decorre o disposto no artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, no artigo 77.º da Lei Geral Tributária e no artigo 152.º do Código do Procedimento Administrativo.

8. Nos termos do estatuído no artigo 77.º da LGT, a decisão de procedimento deve ser fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.

9. De acordo com o artigo 153.º, n.º 1 do CPA, “a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso, parte integrante do respetivo ato”, completando o n.º 2 do mesmo preceito, “equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato”.

10. Embora o art.º 77º, nº 2 da LGT estabeleça que “A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária” não deixa de exigir que essa fundamentação sumária contenha “as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”.

11. De entre os vários vícios apontados à liquidação impugnada, a Impugnante alega que tal decisão sofre de falta de fundamentação.

12. A douta sentença recorrida analisou o primeiro dos vícios alegados pela Impugnante, a falta de fundamentação do acto tributário, uma vez que, a verificar-se, tornava inútil a apreciação dos restantes vícios invocados.

13. É hoje entendimento jurisprudencial pacífico que equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência não esclareçam concretamente a motivação do acto e, desse modo, não seja perceptível para um homem médio colocado na situação concreta do destinatário o raciocínio do emitente do acto e que o conduziu a essa decisão e não a uma outra.

14. Salvo o devido respeito por opinião contrária, o acto de liquidação ora impugnado não se encontra devidamente fundamentado, não cumprindo as exigências legais supra mencionadas pois, apesar de a Impugnante ter junto documentos quando tal lhe foi solicitado pela ATA para justificar os valores da mercadoria por si declarados e que a ATA considerou excepcionalmente baixos, a ATA não fez constar das suas decisões ao longo do procedimento porque considerou tais documentos insuficientes para suportar tal justificação, limitando-se a afirmar “o valor aduaneiro declarado para as mercadorias importadas se encontrar excecionalmente baixo, em comparação com o valor estatístico médio da União Europeia, para a importação de mercadorias similares”.

15. Em momento algum do procedimento anterior à Impugnação a Administração Tributária cumpre o dever de fundamentação esclarecendo que documentos ou outros elementos deveria a Impugnante apresentar para afastar definitivamente tais dúvidas, nem identifica ou quantifica os elementos concretos a que recorreu nas operações de cálculo da liquidação que realizou, ou seja, a que valores médios concretos dos valores AMT recorreu de entre os dados estatísticos do comércio externo da União Europeia, recolhidos a partir das declarações aduaneiras apresentadas nos 28 Estados-Membros;

16. Além de não concretizar tais operações ao longo do procedimento e no acto de liquidação, a AT afasta a aplicação dos métodos do valor transacional das mercadorias idênticas ou similares por considerar que a descrição dos itens das facturas é demasiado genérica o que impede uma caracterização objectiva o que, a nosso ver, se encontra em contradição com a fundamentação do cálculo de liquidação, ou seja, se a AT desconhece a caracterização objectiva dos artigos não se percebe como sem esse conhecimento recorreu aos valores AMT para, comparando a relação artigo-preço de produtos similares, concluir que os preços declarados daqueles artigos são excepcionalmente baixos.

17. Todos as expressões utilizadas pela ATA na sua fundamentação, como excepcionalmente baixos, desproporcionalmente baixos, produtos ou mercadorias similares, valores médios, traduzem conceitos abstractos que não são preenchidos com factos concretos, como deveriam ser até porque, como a própria ATA refere, procedeu ao controlo físico da mercadoria com recolha de amostras podendo ter integrado tais conceitos com dados concretos relativos à qualidade do material, da confecção ou do design dos produtos, o que não fez.

18. Nos termos do disposto no art.º 153.º do CPA “Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto”.

19. Esta exigência da lei quanto à clareza e suficiência dos fundamentos dos actos da Administração destina-se a assegurar o pleno exercício do direito de defesa dos visados nesses actos pois só conhecendo na íntegra as motivações do acto e o raciocínio que conduziu à sua decisão final pode contra ele reagir.

20. O vício da fundamentação legalmente exigida constitui fundamento para a impugnação ao abrigo do disposto no art.º 99º, alínea c) do CPPT e conduz à anulação do acto.

Por todo o exposto, deverá ser negado provimento ao recurso e mantida nos seus precisos termos a douta Sentença recorrida.

Fazendo-se JUSTIÇA!».

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto, neste Tribunal, emitiu douto parecer concluindo que o recurso não merece provimento devendo, consequentemente, a sentença recorrida manter-se na ordem jurídica por não enfermar dos vícios que lhe são assacados.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.


II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cf. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, analisadas as conclusões das alegações do recurso, a questão que importa decidir reconduz-se a indagar se existe na sentença erro de julgamento em matéria de direito por errada aplicação e interpretação do disposto nos artigos 60.º n.º 7 e 77.º, n.º 1, da LGT.

III. FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS

Na sentença recorrida deixou-se factualmente consignado: «

a) A Impugnante importou mercadorias ao abrigo da declaração de importação n.° ………………..034, de 18.10.2019, apresentada na Delegação Aduaneira de Sines, a qual foi objecto de verificação aduaneira, documental e fisicamente; admitido, doc 2 junto à petição inicial, docs constantes do processo administrativo, nomeadamente, informações oficiais dos serviços e auto de recolha de amostras de fls 91 do processo administrativo.

b) Em 02.07.2019, na sequência de procedimento de verificação dessa operação, os serviços da Delegação Aduaneira de Sines solicitaram à Impugnante informação adicional, através do ofício n.° 295/20219, com o seguinte teor:

Assunto: PEDIDO INFORMAÇÃO ADICIONAL - DU Nº2019PT00067063253034 DE 01/07/2019

1. As autoridades aduaneiras têm dúvidas fundadas de que o valor transacional declarado na Declaração Aduaneira nº……………..034, de 01 de Julho, corresponde, de facto, ao preço efetivamente pago ou a pagar.

As razões dessas dúvidas fundadas são as seguintes.

A autoridade aduaneira considerou que o valor transacional declarado para a mercadoria referida na Adição 1, p.p.6108920000, “Deshabilles, Roupões de banho, Robes de quarto e semelhantes de Fib.Sintéticas " ,da Declaração Aduaneira acima referida é excecionalmente baixo em relação ao valor estatístico médio da União Europeia para a importação de mercadorias similares.

Esse valor estatístico médio é disponibilizado às autoridades aduaneiras através da ferramenta de monitorização automática (AMT), implementada numa parceria entre o OLAF e o Joint Research Centre (JRC). A AMT é uma ferramenta de tecnologia de informação que usa métodos estatísticos avançados, através de um algoritmo estatístico, para a deteção de padrões relevantes de fraude aduaneira (Cfr. https://ec.europa.eu/jrc/en/publication/estimation-fair-prices-traded-goods-outlier-free-trade-data- documento THE ESTIMATION OF FAIR PRICES OF TRADED GOODS FROM OUTLIER-FREE TRADE DATA - ISBN …………….).

2. Em função dessas dúvidas fundadas, importa obter informação adicional que justifique o valor transacional extremamente baixo declarado, nos termos do artigo 15º do Código Aduaneiro da União [Regulamento (UE) nº 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho], conjugado com o n° 1º do artigo 140º do Ato de Execução desse Código [Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão],

Determina-se assim que seja disponibilizada, por escrito, uma explicação para o facto do valor transacional declarado ser extremamente baixo, devendo essa explicação ser fundamentada mediante a apresentação de provas adicionais para a Decl. imp. nº.63253034de 01/07/2019.

Na medida em que sejam passíveis de suportar essa fundamentação, poderão ser apresentados designadamente os seguintes documentos:

o Contratos, designadamente o de compra e venda

o Cópia da declaração de exportação apresentada no país terceiro,

o Recibos relativos às despesas de transporte a seguro,

o Ordens de encomenda,

o Registos contabilísticos,

o Recibos de pagamentos,

o Preço de revenda,

o Qualquer outro documento útil para a correta determinação do valor aduaneiro.

Refira-se que a apresentação de alguns desses documentos - ainda que os mesmos sejam autênticos e atestem o valor transacional declarado - não invalida que as autoridades aduaneiras mantenham as dúvidas fundadas sobre esse valor, caso esses documentos não permitam justificar o valor transacional declarado (Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 16 de junho de 2016 no Processo C-291/15, aplicável por analogia),

A ii formação deve ser apresentada no prazo de 10 dias a contar da data deste oficio, sob pena de violação legal do dever de cooperação. Na falta de resposta, dentro daquele prazo, considera-se nos termos do nº2 do Artigo 140° do AE-CAU que as dúvidas fundadas suscitadas não foram dissipadas pelo que o valor transacional será rejeitado. Com os melhores cumprimentos.

Cfr doc de fls 13 do processo administrativo, e doc 2 junto à petição inicial

c) Em 09.07.2019, os serviços da Delegação Aduaneira de Sines remeteram à Impugnante o ofício n.° 309/2019, com o seguinte teor:

Analisada a documentação relativa à declaração aduaneira de introdução em livre prática e consumo n° …………………..034 de 01/07/2019 (Adição n° 1, p.p.6108920000, solicitada a coberto do nosso ofício n° 295/2019, de 02 de julho, informa-se V. Exas que a mesma não foi considerada esclarecedora para a determinação do correto valor aduaneiro da mercadoria em causa.

Considera esta Estância Aduaneira, nos termos do artigo 140° n° 2 do AE-CAU, que a documentação apresentada não veio trazer qualquer esclarecimento adicional, ou clarificar as dúvidas existentes, dado que os elementos apresentados não justificam o facto do valor faturado das mercadorias importadas, se encontrar excecionalmente baixo, em comparação com os valores médios, para mercadorias da mesma classificação pautai importadas em território nacional, nos últimos 6 meses, continuando a persistir as dúvidas fundadas quanto ao valor aduaneiro declarado.

Assim, no prazo de 14 dias, deverá ser apresentada justificação para os preços desproporcionalmente baixos ou fornecer dados que permitam passar â aplicação dos sucessivos métodos secundários de determinação do valor aduaneiro, previstos no art º 74 ° n.°2 do CAU.

No entanto, dada a natureza urgente do procedimento, poderá ser dada autorização de saída à mercadoria em causa, nos termos do artigo 195° do CAU, desde que o operador preste garantia suficiente, nos termos do artigo 89° e seguintes do CAU, para cobrir as eventuais diferenças resultantes dos elementos da declaração e aquele a que as mercadorias poderão, em definitivo, ficar sujeitas, até à apresentação da prova do seu efetivo valor aduaneiro.

Mais se informa, que o montante proposto para a garantia da 1ª. adição da Decl. de Importação n° ……………….034 de 01/07/2019, será calculado com base na diferença entre a divida apurada face aos valores AMT1 e os valores declarados.

1ª Adição:

Valor declarado: 21,683,39 Euros

Valor proposto (base: Valor AMT): 65.025,45 Euros

Taxa de Direitas: 12%

Taxa de IVA: 23%

Direitos pela diferença: 5 201,05 Euros

Iva pela diferença: 11.164,91 Euros

Base tributável de IVA pela diferença: 48.543,11 Euros

Total da garantia: 16.365,96 Euros

Cfr doc de fls 14 e 15 do processo administrativo e doc 4 junto à petição inicial.

d) A Impugnante respondeu a estes ofícios através de requerimento escrito com o teor que consta do documento 5 junto à petição inicial, e de fls 16 a 23 do processo administrativo, do qual consta, além do mais, o seguinte:


1.º

A Requerente foi, através do seu Despachante Oficial, notificada do Ofício n.º295 de 2 de julho de 2019, através do qual foi informada de que " as autoridades aduaneiras têm dúvidas fundadas de que o valor transacionai declarado na Declaração Aduaneira nº ……………………034, corresponde, de facto, ao preço efetivamente pago ou o pagar".


Porém, antes sequer de resultar possível à Requerente responder a esse oficio, foi a mesma informada, através de um segundo Oficio n.º309 de 9 de julho de 2019, novamente através do seu Despachante Oficial, de que a documentação relativa ao DAU n.º…………………….034 " não foi considerada esclarecedora para a determinação do correto valor aduaneiro da mercadoria em causa" (...) dado "que a documentação apresentada não veio trazer qualquer esclarecimento adicional, ou clarificar as dúvidas existentes, dado que os elementos apresentados não justificam o facto de o valor aduaneiro declarado para os mercadorias importadas, se encontrar excecionalmente baixo, em comparação com os valores médios, para mercadorias da mesma classificação pautai importadas em território nacional, nos últimos 6 meses, continuando a persistir as dúvidas fundadas quanto ao valor aduaneiro declarado".

3.º

Nesta sequência, vem a Requerente disponibilizar, em anexo, a documentação (designadamente, fatura comercial - Anexo 1, Ordem de Compra - Anexo 2 e comprovativo de pagamento - Anexo 3, todos devidamente referenciados) que, no seu entender, não deixa margem para dúvidas quanto ao facto de o valor declarado corresponder efetivamente ao valor negociado e pago pelos bens em discussão e que corresponderá à documentação mencionada pela DAS no seu Ofício n.º309 de 9 de julho de 2019. 

4.º

Adicionalmente, e tendo em consideração que as alegadas dúvidas fundadas resultam do facto de a autoridade aduaneira ter considerado que "o valor transacional declarado para as mercadorias referidas no Adição 1 da Declaração Aduaneira acima referida é excecionalmente baixo em relação ao valor estatístico médio do União Europeia para a importação de mercadorias similares", acredita a Requerente ser conveniente providenciar a esta alfândega uma breve explicação sobre a relação comercial e negocial que, em concreto, justifica os preços de compra acordados para as mercadorias em crise, a ver:

(...)

36.º


Pelo que, e sem conceder tudo quanto supra ficou exposto, procederá desde já a Requerente à prestação da garantia pelo valor de dívida adicional de direitos aduaneiros e IVA constante do Ofício n.º 309 de 9 de julho de 2019, tendo em vista a obtenção da autorização de saída das mercadorias em apreço, mas não prescindido de ser notificada do projeto de decisão, devidamente fundamentado, indicativo do valor aduaneiro que esta Delegação Aduaneira entende ser o legalmente exigido.

Nestes termos, vem a Requerente solicitar a V Exa.:

i) Se digne conceder a autorização de saída das mercadorias importadas ao abrigo do DAU n.º………………..034, mediante a garantia que será prestada nos moldes indicados no Ofício n.º309 de 9 de julho de 2019.

ii) Se digne notificar a Requerente do projeto de decisão para atribuição de valor aduaneiro que considera adequado às mercadorias a que se reporta a declaração de importação n.º…………………..034, bem como a respectiva fundamentação, nos termos legais.

e) A mercadoria foi submetida a controlo documental e físico pelos serviços da Delegação Aduaneira de Sines da Alfândega de Setúbal; admitido, documento de fls. 1 do processo administrativo, e auto de recolha de amostras de 05.07.2019, a fls 26 do PA.

f) Impugnante prestou garantia no montante que lhe foi exigido, tendo a mercadoria obtido autorização de saída; admitido.

g) Em 24.09.2019, os serviços da Delegação Aduaneira de Sines, emitiram a informação n.°05/APV19, respeitante à declaração aduaneira n.°………………034 de 01.07.2019, com o seguinte teor: 

I - FACTOS

1. Analisada a documentação relativa à Declaração Aduaneira de Introdução em Livre Prática e Consumo n° ………………034 de 01/07/2019, solicitada a coberto do nosso oficio n° 295/2019 de 2 de Julho (nomeadamente contratos, packing-list, etc.) informa-se que a mesma não foi considerada esclarecedora para a determinação do correto valor aduaneiro da mercadoria em causa.
Através do nosso oficio nº309/2019, de 09 de Julho, foi solicitada, novamente, justificação para os preços desproporcionalmente baixos, bem como a informação sobre a eventual aplicação sucessiva dos métodos secundários de determinação do valor aduaneiro, de acordo com o artigo 74° do CAU.

2. No que respeita ao carácter fundado das dúvidas em causa, importa salientar que considera esta Estância Aduaneira, que a documentação/informação apresentada não veio trazer qualquer esclarecimento adicional, ou clarificar as dúvidas existentes, dado que os elementos apresentados não justificam o facto do valor faturado das mercadorias importadas, se encontrar excecionalmente baixo, em comparação com os valores AMT '1* continuando a persistir as dúvidas fundadas quanto ao valor aduaneiro declarado,

3. Com efeito, o valor transacional deve refletir o valor económico real de uma mercadoria importada e ter em conta todos os elementos dessa mercadoria que apresentem um valor económico.

4. Nessas circunstâncias, há que considerar que uma diferença de preço como a constatada parece ser suficiente para justificar as dúvidas da autoridade aduaneira e a rejeição por parte desta do valor aduaneiro declarado das mercadorias em causa.

5. Cumpre referir que o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (Sexta Secção) de 16 de junho de 2016, proferido no âmbito do processo C-291/15, esclarece que “ quando o valor transacional declarado, comparado com a média estatística dos preços de compra na importação de mercadorias similares, for considerado desproporcionadamente baixo, sem que o importador tenha fornecido, em resposta a um pedido nesse sentido da autoridade aduaneira, elementos de prova ou informações adicionais para demonstrar a exatidão do valor transacional declarado das mercadorias, apesar de as autoridades aduaneiras não contestarem nem porem em causa por qualquer outra forma a autenticidade da fatura ou do certificado de transferência apresentados para justificar o preço efetivamente pago pelas mercadorias importadas".

6. Daqui resulta que as autoridades aduaneiras podem, para determinar o valor aduaneiro, afastar o preço declarado das mercadorias importadas e recorrer aos métodos secundários de determinação do valor aduaneiro das mesmas mercadorias, como previstos nos artigos 70° e 74° do CAU.

7. O operador foi notificado desta prerrogativa, através do já referido oficio n° 295/2019, de 2 de Julho. Não tendo sido possível determinar o valor aduaneiro por aplicação das disposições relativas ao método do valor transacional do Artigo 70° do CAU, determina o n° 1 do Artigo 74° do CAU, que devem ser utilizados os métodos previstos no n° 2 dos mesmos artigos, a saber:

a) Valor transacional de mercadorias idênticas, vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da União Europeia e exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar em momento muito próximo;

b) Valor transacional de mercadorias similares, vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da União Europeia e exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo;

c) Valor baseado no preço unitário que corresponde às vendas no território aduaneiro da União Europeia das mercadorias importadas ou de mercadorias idênticas ou similares importadas, totalizando a quantidade mais elevada, feitas a pessoas não coligadas com os vendedores;

d) Valor calculado, igual á soma do custo das matérias-primas e das operações de fabrico utilizadas para produzir as mercadorias importadas, de um montante representativo do lucro e de despesas gerais

Na impossibilidade da aplicação dos métodos previstos no artigo 70° e nos números 1 e 2 do artigo 74° do CAU, o valor aduaneiro deverá ser calculado através do método previsto no n° 3 do Artigo 74° daquele Regulamento Comunitário, que assim se assume como o método de último recurso.

No caso concreto do PAU n° ……………………..de 01/07/2019, há a referir o seguinte:

- Algumas das mercadorias importadas têm um preço de aquisição unitário por quilograma mais baixo, relativamente aos preços médios declarados para o mesmo tipo de mercadorias, no território nacional, nos últimos 6 meses face a data da declaração.

- Não é exequível a aplicação dos métodos referidos nas alíneas a), b) e c) do parágrafo anterior, uma vez que não existe a possibilidade de aceder às características das mercadorias importadas, o que permitiria obter o valor de mercadorias idênticas ou similares. Por outro lado, constata-se que a descrição dos itens das faturas é demasiado genérica o que impede uma caracterização objetiva.

- No que diz respeito ao método da alínea d), o mesmo não é passível de ser utilizado, porque não existe a possibilidade de apurar os custos das matérias-primas e das operações de fabrico, utilizadas para produzir na China as mercadorias importadas.

8. Assim, informa-se que é intenção desta Estância Aduaneira proceder à cobrança do montante, apurado com base nos valores AMT retirado o valor declarado, a multiplicar pela taxa aplicável, conforme demonstrado subsequentemente.

1ª Adição:

Valor declarado: 21.683,39 €

Valor proposto (base: valor AMT m): 65 025,45 €

Taxa de Direitos; 12%

Taxa de IVA: 23%

Direitos pela diferença: 5.201,05 €

Base Tributável IVA: 48.543,11 €

IVA pela Diferença: 11.164,91 €

9. Em 23/07/2019 foi dada autorização de saída das mercadorias em causa, de acordo com o disposto no artigo 195° do CAU.

II - CONCLUSÕES

Face à impossibilidade de recorrer aos métodos de determinação do valor aduaneiro das mercadorias, expostos no presente documento, a Administração Aduaneira irá aplicar o método do último recurso previsto no n° 3 do artigo 74° do CAU.

Nestas circunstâncias, informa-se que é intenção desta Estância Aduaneira proceder á liquidação do montante de 5.201,05 € (cinco mil, duzentos e um euros e cinco cêntimos) de Direitos Aduaneiros e de 11.164,91 € (onze mil, cento e sessenta e quatro euros e noventa e um cêntimos) de IVA, num total de 16.365,96 € (dezasseis mil, trezentos e sessenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos), apurados nos termos referidos no n° 8 do Ponto I da presente informação.

III - PROPOSTAS

Face ao exposto, propõe-se a notificação do operador para no prazo de 30 dias, nos termos do n° 6 do artigo 22° do CAU e n° 1 do artigo 8º do AD-CAU, se pronunciar sobre a intenção da autoridade aduaneira de liquidar o valor de 16.365,96 €, conforme cálculo supramencionado.

Cfr doc de fis 39 a 41 do processo administrativo

h) Com data de 24.09.2019, sobre essa informação foi aposto despacho do seguinte teor:
CONCORDO.

Face ao que vem informado, notifique-se o operador, nos termos do artigo 22° n°6 do CAU e do artigo 8º n° 1 do AD-CAU, para se pronunciar no prazo de 30 dias a contar do prazo de notificação da presente informação.

Cfr doc de fls 39 a 41 do processo administrativo

i) A Impugnante foi notificada para exercer o direito de audição sobre a proposta constante desta informação, através do ofício com o n.° 501 de 24.09.2019; Cfr doc 6 junto à petição inicial, e doc constante de fls 38 do processo administrativo.

j) A Impugnante exerceu o direito de audição sobre aquele projecto de decisão através de requerimento escrito, com o teor que consta do documento 7 junto à petição inicial e de fls 45 a 48 do processo administrativo, que aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta além do mais, o seguinte:

(…)
1.º
A Requerente foi, através do seu Despachante Oficial, notificada do Oficio nº 295 de 2 de julho de 2019, através do qual lhe foi solicitada "informação adicional que fundamente o valor aduaneiro declarado" na importação das mercadorias importadas ao abrigo do DAU nº …………………….034, uma vez que se terão suscitado dúvidas sobre se o valor declarado no mencionado DAU corresponde de facto ao preço efetivamente pago ou a pagar pelas ditas mercadorias.

2.º
Nesta sequência, a Requerente disponibilizou diversa documentação (designadamente, ordens de encomenda, faturas comerciais e comprovativos de pagamento, todos devidamente referenciados), a qual, no seu entender, não deixa margem para dúvidas quanto ao facto de o valor declarado corresponder efetivamente ao valor pago pelos bens em discussão.

3.º
Sucede que foi a Requerente notificada de um segundo Ofício n.s 309 de 9 de julho de 2019, nos termos do qual foi informada, novamente através do seu Despachante Oficial, de que a documentação apresentada alegadamente não logrou esclarecer as ditas dúvidas da DAS e, muito em particular, o facto de o valor faturado e declarado na importação das mercadorias importadas ser inferior aos "valores médios, para mercadorias da mesma classificação pautai importadas em território nacional, nos últimos 6 meses".
A Requerente procedeu então ao envio atempado de um novo requerimento, no qual acredita ter providenciado a informação suficiente para dissipar quaisquer dúvidas que pudessem ter restado sobre a absoluta correspondência do valor aduaneiro declarado no DAU supramencionado com o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas.

5.º
Em concreto e considerando toda a documentação/informação anteriormente enviada para esta estância aduaneira (e para a qual desde já se remete), a Requerente entende ter explicado detalhadamente os contornos das relações negociais e comerciais que possui com o fornecedor das mercadorias em causa,
(...)


Ora, por tudo o que se referiu anteriormente e em particular tendo em conta a documentação/informação providenciada (para qual, uma vez mais, se remete), a Requerente não pode concordar com o entendimento da DAS segundo o qual "a mesma não foi considerada esclarecedora para a determinação do correto valor aduaneiro da mercadoria em causa".

(...)
13.º
Acontece que no caso em discussão, as autoridades aduaneiras parecem não ter quaisquer incertezas de que o valor declarado corresponde ao valor efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias,

14.º
Possuindo antes algumas dúvidas de que o valor aduaneiro declarado reflete "o valor económico real” dos bens importados,

15.º
E justificando estas dúvidas com a circunstância de "os elementos apresentados não justific[am] o facto do valor faturado das mercadorias importadas se encontrar excecionalmente baixo, em comparação com os valores médios, para mercadorias da mesma classificação pautai importadas em território nacional, nos últimos 6 meses (…)”.

16.º
Valores esses que a Requerente não conhece, nem tem obrigação de conhecer, nem sabe se respeitam a mercadorias adquiridas em condições efetivamente semelhantes às que adquiriu os produtos em discussão (nomeadamente no que que toca a quantidades adquiridas e qualidade dos produtos).

(...)
20.º
Da mesma forma, não pode a Requerente concordar com a utilização dos métodos secundários e, muito em particular, com a utilização do método do último recurso.

21.º
Na verdade, a DAS não só recusou a aplicação do método do valor transacional com base em pressupostos legais errados, como também não esgotou - tal como seria o seu dever, e apenas na medida em que viesse a concluir, fundadamente, pela impossibilidade de aplicação do valor transaccional - todos os métodos alternativos legalmente prescritos até encontrar aquele que seria aplicável, optando por passar imediatamente para o método do último recurso,

22.º
Alegadamente por não existir "a possibilidade de aceder às características das mercadorias importadas, o que permitia obter o valor de mercadorias idênticas ou similares",

23º
Quanto a este ponto, é importante referir que a DAS procedeu a controlo físico e extração de amostras das mercadorias em causa,

24.º
Pelo que não se compreende a argumentação da DAS, quando invoca que não pôde aceder às características das mercadorias importadas,

25.º
As quais, de resto, se encontram descritas na fatura e detalhadas nos respetivos packing list e Ordem de Compra,

26.º
Não se apresentando qualquer outra explicação plausível para a alegada impossibilidade de utilização dos métodos secundários de determinação do valor. E sem que se encontre, previamente, fundamentada a decisão de não utilização do método do valor transaccional como método de determinação do valor aduaneiro.

27.º
Ainda a este propósito não pode a Requerente deixar de referir que a declaração de importação respeitante às mercadorias em apreço foi aceite no dia 1 de julho de 2019,

28.º
Tendo, no dia 2 de julho, a Requerente sido notificada do Ofício n.º295, através do qual, como se referiu acima, lhe foi solicitada "informação adicional que fundamente o valor aduaneiro declarado" na importação das mercadorias importadas ao abrigo do DAU n.2 2019PT00067063253034, uma vez que se terão suscitado dúvidas sobre se o valor declarado no mencionado DAU corresponde de facto ao preço efetivamente pago ou a pagar pelas ditas mercadorias.

29.º
Ora, só no dia 23 de julho de 2019 pôde a Requerente proceder ao levantamento das mercadorias e tão-somente porque para o efeito prestou uma garantia,

30.º
Tendo aquelas mercadorias permanecido vários dias sob fiscalização aduaneira e armazenadas nas instalações da DAS até serem libertadas mediante a prestação de uma garantia. 

31.º
Isto para concluir referindo ser inaceitável que a DAS entenda não ser possível recorrer-se a outros métodos de determinação do valor aduaneiro em resultado da "(im)possibilidade de aceder às características das mercadorias importadas",

32º
Por fim, não pode a Requerente deixar de referir que, em seu entender, o projeto de decisão está longe de se encontrar devidamente fundamentado, fundamentação esta que, como se sabe, consubstancia um dever que recai sobre qualquer entidade pública que tome uma decisão ao abrigo das leis de direito administrativo.

33.º
Ora, na ausência de justificação para os factos acima mencionadas, entende a Requerente que a DAS não pode, tal como pretende, proceder à correção do valor aduaneiro por si inicialmente declarado e, consequentemente, liquidar o montante adicional de 16.365,96 €, a título de direitos aduaneiros e IVA.

Pelo que, nos termos do supra exposto, vem a Requerente solicitar que V. Exa. ordene a anulação do projeto de decisão notificado à Requerente, aceitando o valor aduaneiro inicialmente declarado e, por conseguinte, procedendo à libertação da garantia entretanto prestada, nos termos legais.

k) Em 13.11.2019, o Chefe da Delegação Aduaneira de Sines enviou à Impugnante o ofício com o n.° 623, datado de 13.11.2019, com o seguinte teor:

Face à informação complementar / esclarecimentos recebidos em resposta aos nossos ofícios n°s 295/2019 e 309/2019, de 2 e 9 Julho, respectivamente, e tendo em conta o exercício do direito à Audição Prévia (na sequência do nosso ofício n° 501/2019, de 24 de Setembro), informa-se que a AT mantém fundadas dúvidas sobre o valor aduaneiro declarado pelo que aplicará o método do último recurso previsto no n° 3 do art° 74° do Código Aduaneiro Comunitário.

Face ao acima exposto, quanto à liquidação dos montantes relativos á Adição em causa após a reanálise do processo,

De acordo com o referido nos nossos ofícios nº 298/2019 e 330/2019, acima mencionados, ficam V Exas notificadas pelo presente oficio para, nos termos do artigo n°108° do CAU, procederem, junto à Tesouraria desta Estância Aduaneira, no prazo de dez dias a partir da data da recepção da presente notificação ao pagamento do montante de 5.201.05 € (cinco mil, duzentos e um euros e cinco cêntimos) de Direitos Aduaneiros e de 11.164.91 € (onze mil, cento e sessenta e quatro euros e noventa e um cêntimos) de IVA, num total de 16.365.96 € dezasseis mil, trezentos e sessenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos montante correspondentes aos Registo de Liquidação nºs 2019/0244259 e 2019/0244275.

Mais se refere que, decorrido o prazo de pagamento acima citado e dado que estamos perante uma garantia por depósito, o mesmo será liquidado para receita.

Do presente ato de liquidação, poderá apresentar reclamação graciosa, nos te mios dos artigos 68° e seguintes do Código de Procedimento e Processo Tributário, no prazo geral de 120 dias a contar do termo do prazo dos factos previstos no já referido n° 1 do artigo 102° do CPPT por força do artigo 70º n° 1 do CPPT ou requerer a constituição de tribunal arbitral, no prazo de 90 dias a contar da notificação da presente decisão, nos termos do artigo 10° do Decreto-Lei nº10/2011 de 20 de Janeiro, mediante requerimento a enviar exclusivamente por via eletrónica ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), através do respetivo sítio na Internet (http://www.caad.org.pt), nos termos do artigo 2° nº 2 do mesmo decreto-lei.

Poderá, ainda, recorrer contenciosamente para os Tribunais Tributários, nos termos do artigo 49° do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei nº13/02 de 19 de Fevereiro (Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada conforme mapa anexo ao DL 325/2003 de 29 de Dezembro aplicável por força do seu artigo 3º n° 2), através de impugnação judicial no prazo de 90 dias a contar de determinados factos, designadamente, os referidos no nº1 do artigo 102º do CPPT, nomeadamente da data da presente notificação.

Cfr doc 8 junto à petição inicial e doc de fls 51 do processo administrativo.

l) A Impugnante apresentou reclamação graciosa desta decisão, para o Director da Alfândega de Setúbal; Cfr doc 1 junto à petição inicial, e doc constante do processo administrativo.

m) Em 16.03.2020, os serviços da Delegação Aduaneira de Sines proferiam a informação DAS/2020/019/2020, sobre esta reclamação graciosa, com o teor que dos documentos que integram o processo administrativo, o qual aqui se dá por integralmente reproduzido, dele constando, além do mais o seguinte:


(...)

III. ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS

1.1 - Matéria de facto

1- No dia 01/07/2019, o declarante apresentou na Delegação Aduaneira de Sines, uma declaração de importação n°……………034 para introdução em livre prática e consumo com três adições com 9138,3 Kg de massa liquida com o valor declarado de USD54145,72

2- No dia 03/07/2019 a declaração foi submetida a controlo documental e foi oficiado ao declarante, no dia 03/07/2019 para apresentar documentação adicional justificando os preços declarados.

3- No dia 05/07/2019 a mercadoria foi submetida a controlo físico com recolha de amostras

4- No dia 19/07/2019 o declarante respondeu à primeira notificação, mas sem apresentar justificação para os valores declarados. Tendo sido oficiado para apresentar dados que permitissem a aplicação sucessiva dos diferentes métodos alternativos de determinação do valor aduaneiro. Foi-lhe ainda comunicado que se pretendesse a saída imediata da mercadoria deveria prestar uma garantia pelo valor da diferença entre os direitos e demais imposições obtidos pela aplicação do valor AMT e o valor por ele declarado.

5- No dia 19/07/2019, o declarante, informou que pretendia garantir por depósito os montantes propostos para pagar o valor aduaneiro.

6 - No dia 19/09/2019, garantiu por depósito os montantes propostos pela Delegação Aduaneira de Sines, tendo assim obtido a autorização de saída no dia 23/07/2019

1.2 - Parecer

1- A Delegação Aduaneira de Sines, considerou que os valores transacionais declarados para as mercadorias da declaração de importação n.° 034 de 01/07/2019, e após análise da documentação apresentada, é excecionalmente baixo para a primeira adição composta por Deshabilles, roupões de banho, robes de quarto e semelhantes de fibra sintética de uso feminino, em relação ao valor estatístico médio da União Europeia para a importação de mercadorias similares.

2- Este valor estatístico médio, é disponibilizado ás autoridades aduaneiras através da ferramenta de monitorização automática (AMT), ferramenta de tecnologia de informação que usa métodos estatísticos avançados, através de um algoritmo estatístico, para a deteção de padrões relevantes da fraude aduaneira, implementada numa parceria entre o OLAF e o Joint Research (JRC).

3- Em função destas dúvidas fundadas, importava obter informação adicional que classificasse os valores transacionais extremamente baixos declarados, nos termos do artigo 15° do Código Aduaneiro da União (Regulamento n.° 952/2013 de 9/10/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho), conjugado com o n.° 1, do artigo 140° n.° 1 do Regulamento de Execução (EU) 2015/2447 da Comissão

4- Em 15 de novembro, a Delegação Aduaneira de Sines, solicitou novamente ao importador justificação para os preços desproporcionalmente baixos, bem como informação sobre a eventual aplicação sucessiva dos métodos secundários de determinação do valor aduaneiro como previsto nos artigos 74° n.° 3 do CAU

5 - A documentação apresentada nos termos do artigo 140° n.° 2 do Regulamento de Execução (EU) 2015/2447 da Comissão, não veio trazer qualquer esclarecimento adicional, ou clarificar as dúvidas existentes, dado que, os elementos apresentados não justificavam o valor faturado das mercadorias importadas por se encontrar excecionalmente baixo, em comparação com o valor estatístico médio da União Europeia, para a importação de mercadorias similares

III. ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS

1.1- Matéria de facto

1- No dia 01/07/2019, o declarante apresentou na Delegação Aduaneira de Sines, uma declaração de importação n ………………..34 para introdução em livre prática e consumo com três adições com 9138,3 Kg de massa liquida com o valor declarado de USD54145.72

2- No dia 03/07/2019 a declaração foi submetida a controlo documental e foi oficiado ao declarante, no dia 03/07/2019 para apresentar documentação adicional justificando os preços declarados

3 - No dia 05/07/2019 a mercadoria foi submetida a controlo físico com recolha de amostras

4- No dia 19/07/2019 o declarante respondeu à primeira notificação, mas sem apresentar justificação para os valores declarados. Tendo sido oficiado para apresentar dados que permitissem a aplicação sucessiva dos diferentes métodos alternativos de determinação do valor aduaneiro. Foi-lhe ainda comunicado que se pretendesse a saída imediata da mercadoria deveria prestar uma garantia pelo valor da diferença entre os direitos e demais imposições obtidos pela aplicação do valor AMT e o valor por ele declarado.

5- No dia 19/07/2019, o declarante, informou que pretendia garantir por depósito os montantes propostos para pagar o valor aduaneiro.

6 - No dia 19/09/2019, garantiu por depósito os montantes propostos pela Delegação Aduaneira de Sines. tendo assim obtido a autorização de saída no dia 23/07/2019.

1.2 - Parecer

1 - A Delegação Aduaneira de Sines, considerou que os valores transacionais declarados para as mercadorias da declaração de importação n.° …………………..034 de 01/07/2019, e após análise da documentação apresentada, é excecionalmente baixo para a primeira adição composta por Deshabilles, roupões de banho, robes de quarto e semelhantes de fibra sintética de uso feminino, em relação ao valor estatístico médio da União Europeia para a importação de mercadorias similares.

2 - Este valor estatístico médio, é disponibilizado ás autoridades aduaneiras através da ferramenta de monitorização automática (AMT), ferramenta de tecnologia de informação que usa métodos estatísticos avançados, através de um algoritmo estatístico, para a deteção de padrões relevantes da fraude aduaneira, implementada numa parceria entre o OLAF e o Joint Research (JRC).

3 - Em função destas dúvidas fundadas, importava obter informação adicional que classificasse os valores transacionais extremamente baixos declarados, nos termos do artigo 15° do Código Aduaneiro da União (Regulamento n.° 952/2013 de 9/10/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho), conjugado com o n.° 1, do artigo 140° n.° 1 do Regulamento de Execução (EU) 2015/2447 da Comissão.

4 - Em 15 de novembro, a Delegação Aduaneira de Sines, solicitou novamente ao importador justificação para os preços desproporcionalmente baixos, bem como informação sobre a eventual aplicação sucessiva dos métodos secundários de determinação do valor aduaneiro como previsto nos artigos 74° n.° 3 do CAU.

5 - A documentação apresentada nos termos do artigo 140° n.° 2 do Regulamento de Execução (EU) 2015/2447 da Comissão, não veio trazer qualquer esclarecimento adicional, ou clarificar as dúvidas existentes, dado que, os elementos apresentados não justificavam o valor faturado das mercadorias importadas por se encontrar excecionalmente baixo, em comparação com o valor estatístico médio da União Europeia, para a importação de mercadorias similares.

6 - Não foi apresentada a justificação para os preços desproporcionalmente baixos nem apresentados dados que permitissem passar à aplicação dos sucessivos métodos secundários de determinação do valor aduaneiro, previstos no artigo 74° n.° 2 do Código Aduaneiro da União. Foi garantido, pelos depósitos n.°s 2019/23244/3 para o valor dos Direitos de €5.201,05 e 2019/23252/3 para o valor do IVA de €11.164,91, no total de €16.365,96. em 19/07/2019, o valor proposto com base nos valores médios (AMT) e a mercadoria teve autorização de saida em 23/07/2019, de cordo com o disposto nos artigos 89°e195° do CAU.

7-O valor transacional deve refletir o valor económico real da mercadoria importada e ter em conta todos os elementos dessa mercadoria que apresentem um valor económico.

8 - Não tem razão o reclamante no que concerne ao ponto de que os métodos alternativos não resultam de qualquer norma aduaneira comunitária nos termos do Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 16 de junho de 2016 no processo C-291/15, aplicável por analogia, porque não invalida que as autoridades aduaneiras mantenham as dúvidas fundadas sobre os valores apresentados nos documentos caso esses documentos não permitam justificar o valor transacional declarado, nos termos do artigo 74° n.° 2 do Código Aduaneiro da União.

III. CONCLUSÃO

Dado o argumentaria acima aduzido, considera-se que não foi apresentada justificação para os preços desproporcionalmente baixos.

Assim, face ao exposto, propõe-se o envio à DSTA com parecer de indeferimento.

Cfr doc constante do processo administrativo

n) Com data de 16.03.2020, sobre esta informação foi aposto despacho pelo chefe da Delegação Aduaneira de Sines, com o seguinte teor:

Cfr doc constante do processo administrativo


*

Não existem outros factos, alegados ou de conhecimento oficioso, relevantes para a decisão da causa, que devam ser considerados provados.

*

Motivação

A convicção do Tribunal sobre toda a matéria de facto resultou da análise crítica aos documentos juntos aos autos pela Impugnante, e aos documentos constantes do processo administrativo, nenhuns deles impugnados, tal como se foi fazendo referência em cada uma das alíneas da matéria de facto provada.»


B.DE DIREITO

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrida, contra o acto de indeferimento tácito da reclamação graciosa que teve por objecto o acto de liquidação de direitos aduaneiros no valor de €16.365,96, praticado pelo Sr. Chefe da Delegação Aduaneira de Sines, no âmbito da declaração de importação nº---------------------------034, de 01/07/2019.

A Fazenda Pública não se conforma com tal decisão, por considerar que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento porquanto a liquidação não padece de falta de fundamentação.

Trata-se de questão idêntica à apreciada no acórdão deste Tribunal de 05/12/2024 (proc. nº392/20.5BEBJA, em dgsi.pt, em que o relator é o mesmo deste), no qual, secundando entendimento que vem sendo reiterada e uniformemente sufragado no TAC Sul, nomeadamente no ac. de 01/24/2024, tirado no proc.º 303/21.0BEBJA, se negou provimento ao recurso.

Por não vermos razões para alterar o nosso entendimento, e outrossim tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito como preconizado no art.º 8.º, n.º 3 do Código Civil., passamos, a transcrever o discurso fundamentador do Arresto tirado no proc.º 303/21.0BEBJA, aplicável à situação dos autos com as devidas e necessárias adaptações.

No citado aresto deixou-se consignado, que: «A questão controvertida respeita a direitos aduaneiros e IVA respetivo.
Como decorre do art.º 3.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária (LGT), ambos são tributos, sendo, por isso, aplicado este diploma legal ao respetivo procedimento, sem prejuízo, naturalmente, das especificidades que decorram do direito da União Europeia, nomeadamente do Código Aduaneiro da União [CAU – Regulamento (UE) n. ° 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013] e respetivos atos delegados [cfr. designadamente o Regulamento Delegado (UE) 2015/2446 da Comissão, de 28 de julho de 2015] e de execução [cfr. designadamente o Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão, de 24 de novembro de 2015] – cfr. art.º 1.º, n.º 1, da LGT.
Nos termos do art.º 1.º, n.º 1, do CAU, este “determina as normas e procedimentos gerais aplicáveis às mercadorias à entrada ou à retirada do território aduaneiro da União”, sendo, em termos de procedimento, aplicável a legislação nacional naquilo que não esteja especificamente regulamentado na legislação da União Europeia.
Do ponto de vista da fundamentação, não pode, pois, deixar de se atentar nas exigências previstas no nosso ordenamento interno.
Assim, o dever de fundamentação dos atos administrativos em geral insere-se no princípio constitucionalmente consagrado, no art.º 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, nos termos do qual “os atos administrativos (…) carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos”.
Ao nível dos atos tributários, o dever de fundamentação formal encontra-se especificamente previsto no art.º 77.º da LGT, cujos n.ºs 1 e 2 determinam que:
“1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.
2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”.
“A fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão…” Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª Edição, Encontro da Escrita, Lisboa, 2012, p. 676., para que o respetivo destinatário consiga perceber o iter cognoscitivo e para que, por outro lado, seja possível o controlo, quer administrativo, quer jurisdicional, do ato em causa.
Deve ser, pois, clara, expressa, congruente e suficiente, de maneira a esclarecer inteiramente o seu destinatário, cumprindo, dessa forma, o desiderato constitucionalmente consagrado.
Apliquemos estes conceitos ao caso dos autos.
Compulsada a factualidade assente, não impugnada [a menção ao erro de julgamento quanto à matéria de facto, constante de F) das conclusões, não configura qualquer impugnação da mesma, mas tão-só discordância face ao decidido pelo Tribunal a quo considerando os factos assentes], designadamente o primeiro pedido de informação adicional remetido à Impugnante, a informação proferida após o exercício do direito de audição e a notificação de cobrança, conclui-se que:
a) No documento referido em F) do probatório, é feita menção à existência de um valor estatístico médio da União Europeia para a importação de mercadorias similares, disponibilizado através de ferramenta de monitorização automática (descrita genericamente, na primeira das informações, como “tecnologia de informação que usa métodos estatísticos avançados, através de um algoritmo estatístico, para a deteção de padrões de fraude aduaneira”); a) É indicada a existência de dúvidas fundadas que implicam a obtenção de informação adicional que justifique os valores transacionais extremamente baixos declarados;
b) São, nessa sequência, pedidos elementos adicionais para justificação de tal valor (provas adicionais);
c) Após a apresentação de elementos pela Impugnante, é proferida nova informação [cfr. facto L] [corresponde ao facto G) neste], na qual a administração aduaneira refere que a documentação / informação apresentada não veio trazer qualquer esclarecimento adicional ou clarificar as dúvidas existentes, dado que os elementos apresentados não justificam o facto de o valor faturado das mercadorias importadas ser bastante baixo, em comparação com os valores de referência;
d) A administração concluiu que continuavam a persistir as dúvidas fundadas quanto ao valor aduaneiro declarado;
e) Nessa sequência, após uma menção meramente conclusiva a conceitos de direito (cfr. seu ponto 3.), é referido que “uma diferença de preço como a constatada parece ser suficiente para justificar as dúvidas da autoridade aduaneira e a rejeição por parte desta do valor aduaneiro declarado das mercadorias em causa”;
f) No ponto 7. da referida informação, a administração menciona que a informação facultada pela Impugnante não permite determinar o valor aduaneiro por aplicação das disposições relativas ao método do valor transacional e descreve os diversos métodos existentes, para, a final, afirmar que se aplica o método previsto no art.º 74.º, n.º 3, do CAU, como método de último recurso;
g) Na sequência, e por referência ao concreto documento de importação, refere-se:

a. “Algumas das mercadoras importadas têm um preço de aquisição unitário por quilograma mais baixo, relativamente aos preços médios declarados para o mesmo tipo de mercadorias, no território nacional, nos últimos 6 meses…”;
b. Não são exequíveis os métodos referidos nas als. a) a c) do n.º 2 do art.º 74.º do CAU, por inexistir possibilidade de aceder às caraterísticas das mercadorias importadas, referindo-se, ainda, que a descrição dos itens das faturas é demasiado genérica;
c. O método previsto no art.º 74.º, n.º 2, al. d), do CAU não pode ser utilizado, porque não há possibilidade de apurar os custos das matérias-primas e das operações de fabrico, utilizadas para produzir na China as mercadorias importadas;
d. Conclui com um projeto de liquidação (…);
h) A Impugnante foi notificada para se pronunciar, o que fez;
i) Foi emitida a notificação de cobrança, na qual se refere que, face à informação complementar prestada pela Impugnante, se mantêm as fundadas dúvidas sobre o valor aduaneiro declarado, concluindo-se, como na informação precedente, pela aplicação do método previsto no art.º 74.º, n.º 3, do CAU e novamente reafirmando-se o valor de liquidação e garantia [cf. ponto P) da matéria assente, destes autos].
Considera a Recorrente que, quanto ao valor anormalmente baixo, tal fundamentação foi dada a conhecer à Recorrida, como decorre dos ofícios e decisão proferida [cfr. factos L) e P)].
O Tribunal a quo entendeu que a mera remissão para a fonte dos dados é insuficiente, sendo um juízo meramente conclusivo.
E de facto assim é.
Com efeito, compulsados todos os elementos juntos aos autos, verifica-se que a administração aduaneira se limita a fazer reiteradamente uma menção a valores estatísticos médios, que nunca densifica se não em termos de valor final global, ficando por perceber quais os elementos concretos e específicos de confronto, a amostragem considerada (se é que foi feita alguma amostragem) e por que motivo conclui como concluiu. Não nos estamos a referir ao cálculo final, que está claramente efetuado, mas sim nas premissas que o sustentaram, carecendo, pois, de pertinência o referido nas conclusões J) e K).
Por outro lado, entende a Recorrente que se encontra devidamente explanada a motivação pela qual as explicações e os documentos apresentados pela Recorrida não foram suficientes para afastar as dúvidas.
Sem razão.
Com efeito, a posição da administração surge de forma que nos parece claramente conclusiva. Não se consegue perceber por que motivo as explicações e os documentos apresentados são insuficientes, na medida em que não está expressa qualquer análise dos mesmos.
O exercício do direito de audição, quando traz ao procedimento novos elementos de facto ou de direito, como in casu, carece necessariamente de ser apreciado, apartando-os ou acolhendo-os. Daí que o art.º 60.º, n.º 7, da LGT, aplicável in casu, que respeita ao dever de fundamentação, ainda que sistematicamente esteja inserido em disposição legal atinente ao princípio da participação, refira expressamente que “[o]s elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão”.
E, naturalmente, essa tomada em consideração dos elementos apresentados pelo administrado tem de estar vertida na fundamentação do ato.
Apenas dessa forma o dever de fundamentação se pode considerar cabalmente cumprido.
Este dever não é uma mera formalidade a se; é por respeito ao mesmo que se deve sustentar de forma cabal a posição da administração para, dessa forma, levar ao conhecimento do administrado os fundamentos de facto e de direito que a suportaram na sua decisão.
Apenas o cumprimento deste dever assegura o adequado exercício do direito de defesa [princípio geral do direito da União Europeia – cfr., v.g., os Acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) de 18.12.2008, Sopropé, C‑349/07, EU:C:2008:746, n.ºs 36 a 38, e de 09.11.2017, Ispas, C-298/16, EU:C:2017:843, n.º 26] por parte do administrado (incluindo o de impugnação judicial), sendo fundamental para assegurar a tutela jurisdicional efetiva, garantida pela nossa lei fundamental, no seu art.º 20.º.
Não se põe em causa que pudessem subsistir dúvidas fundadas à administração. No entanto, essa subsistência tem de estar fundamentada. Ora, tal não sucede nos autos, dado que a administração se quedou, como referido, por fórmulas conclusivas, vazias de conteúdo.
Assistia à administração o dever de esclarecer por que motivos os elementos juntos pela ora Recorrida não eram suficientes. E tal não ocorreu.
Entende ainda a Recorrente, quanto à questão do método secundário que veio a ser adotado, que está perfeitamente esclarecida a opção tomada, na medida em que é convocada a impossibilidade de aceder às caraterísticas das mercadorias e o facto de a descrição das faturas ser demasiado genérica.
Ora, neste caso, a administração limita-se a elencar os diversos métodos e a concluir, sem o detalhe exigível, pela impossibilidade de não se aceder às caraterísticas das mercadorias e ao facto de haver uma descrição muito genérica das faturas, não explicando por que motivo os elementos apresentados pela Impugnante, designadamente as fichas técnicas das mercadorias importadas, não respondem ou não permitem ultrapassar as alegadas limitações.
Logo, a fundamentação usada não permite sustentar a rejeição do método do valor transacional.
Alega ainda a Recorrente que existem regras próprias em matéria de direito de audição.
Ora, in casu, tal não se põe em causa.
Com efeito, o art.º 22.º, n.º 6, do CAU (aplicável ex vi art.º 29.º do CAU) faz menção à obrigatoriedade de as autoridades aduaneiras ouvirem o requerente antes da decisão que pretendem tomar [cfr. igualmente o art.º 8.º do Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 e o art.º 8.º do Regulamento Delegado (UE) 2015/2446, ambos já referidos supra].
Ora, a decisão recorrida não vai no sentido de não ter sido ouvido o administrado. Vai, sim, no sentido de tal exercício não ter sido minimamente analisado (ou pelo menos externada essa análise), razão pela qual é convocado o disposto no art.º 60.º, n.º 7, da LGT [cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 28-11-2019 - Processo: 9032/15.3BCLSB]. Aliás, veja-se que o próprio n.º 3 do art.º 8.º do Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão, de 24 de novembro de 2015, vai no sentido de ser registada a posição do administrado tomada na sequência da sua audição, sendo que, tratando-se de procedimento decisório, é para nós exigência consentânea com essa menção a explicação em torno do afastamento dos argumentos, de facto ou de direito, esgrimidos.
Ou seja, a questão é que, como aliás já referido anteriormente, os elementos trazidos pelo administrado em sede de exercício de audição foram, ad limine, afastados, sem mais. Não há, como referimos, qualquer fundamentação a este respeito.
Finalmente, carece de razão a Recorrente, quanto ao referido nas conclusões KKK), [corresponde às Conclusões CC) neste recurso]onde, no fundo, se apela à teoria do aproveitamento do ato.
Sendo certo que a chamada teoria do aproveitamento do ato (há muito acolhida entre a doutrina e a jurisprudência) encontra consagração no art.º 163.º, n.º 5, do Código do Procedimento Administrativo, não se pode afirmar perentoriamente, in casu, que o conteúdo do ato não pudesse ser outro.
Ora, a inoperância da força invalidante do vício que inquina o ato, em virtude da preponderância do conteúdo sobre a forma, só ocorre se se puder afirmar inequivocamente que o ato só podia ter o conteúdo que teve em concreto. Assim, nestes casos, a invalidade não é operante, em virtude da conformidade substancial do ato praticado (3) Cfr. José Carlos Vieira de Andrade, O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Almedina, Coimbra, 2007, pp. 329 a 336. V. a este propósito o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 28.03.2019 (Processo: 24/08.0BELRS).
Neste sentido, aponta a jurisprudência do TJUE, segundo a qual a violação dos direitos de defesa, em particular do direito de ser ouvido, só implica a anulação da decisão tomada no termo do procedimento administrativo em causa se, na inexistência dessa irregularidade, o procedimento pudesse conduzir a um resultado diferente (cfr. os Acórdãos de 14.02.1990, França/Comissão, C-301/87, EU:C:1990:67; de 05.10.2000, Alemanha/Comissão, C-288/96, EU:C:2000:537, de 01.10.2009, Foshan Shunde Yongjian Housewares & Hardware/Conselho, C-141/08 P, EU:C:2009:598, de 10.09.2013, PPU - G. e R., C-383/13, EU:C:2013:553, de 03.07.2014, Kamino International Logistics e Datema Hellmann Worldwide Logistics, C-129/13 e C-130/13, EU:C:2014:94).A verdade é que, in casu, não se consegue, na concreta circunstância da causa, concluir com a certeza exigível que a decisão seria sempre a mesma, justamente por nem se conseguir alcançar os pressupostos de base da atuação da administração, nos termos já expressos supra.
Como tal, não assiste razão à Recorrente
(..)».
Com a fundamentação supra transcrita é, pois, de negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida, na improcedência dos erros que lhe são assacados pela Recorrente.

IV. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.

Lisboa, 05 de Junho de 2025

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Vital Lopes


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Isabel Silva


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Patrícia Manuel Pires