Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 102/18.7 BCLSB |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 02/02/2023 |
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Relator: | JORGE CORTÊS |
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Descritores: | IMPUGNAÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL. OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO. ACÓRDÃO LAVRADO SEM VENCIMENTO. |
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Sumário: | Se a maioria dos membros do colectivo concorda com a decisão e com a fundamentação do Acórdão Arbitral, a qual é no sentido do reconhecimento da isenção de IVA às prestações dos profissionais de acupunctura a partir de certa data, o mesmo não incorre em contradição entre os fundamentos e a decisão, nem foi lavrado contra vencimento. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO I- Relatório Centro …………………, Lda. solicitou a constituição de tribunal arbitral e apresentou um pedido de pronúncia arbitral, com vista à anulação dos actos de liquidação adicional de IVA dos exercícios de 2012 a 2015 e respectivos juros compensatórios, bem como do acto de indeferimento da reclamação graciosa nº ……………195, requerendo ainda a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de indemnização, por garantia indevida. O Tribunal Arbitral, por acórdão de 24 de Setembro de 2018, proferido no âmbito do processo nº 638/2017-T, decidiu nos seguintes termos: “a) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, b) Anular (parcialmente) os atos de liquidação adicional de IVA objeto de impugnação identificados na alínea c) e d) do Ponto I..1., bem como as da alínea b) do mesmo ponto correspondentes a prestações de serviço posteriores a 2 de outubro de 2013; c) Anular todos os atos de liquidação de juros impugnados nos presentes autos (identificados nas alíneas e) a h) do ponto I.1. da presente decisão); d) Anular, nos precisos termos das alíneas anteriores, o ato de indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Requerente; d) Julgar procedente o pedido de indemnização por garantia indevida, quanto às liquidações anuladas, e condenar a Requerida a pagar a indemnização que for liquidada em execução de sentença, nos termos supra.” Inconformado com esta decisão na parte que lhe foi desfavorável, o Centro de ………………….., Lda., deduz a presente impugnação contra o acórdão arbitral em cujas alegações de fls. 1 e ss. (numeração em formato digital – sitaf) formulou as conclusões seguintes:” A) A presente ação de impugnação tem por objeto a decisão arbitral proferida no processo n.º638/2017-T, cujos termos correram junto do CAAD, e que julgou parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Impugnante relativamente aos atos tributários de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado ("IVA") dos anos de 2013 (períodos de Outubro a Dezembro) a 2015 e todos os actos de liquidação de juros compensatórios anos de 2012 a 2015. Sendo que o pedido de pronúncia arbitral tinha como objecto dos atos de liquidação adicional de IVA dos anos de 2012 a 2015 e respectivos juros compensatórios; B) Em traços gerais, os atos tributários em causa resultaram do facto de a AT ter entendido que as atividades desenvolvidas pela Impugnante (acupunctura), na área das terapêuticas não convencionais ("TNC"), não constituem prestações de serviços isentas, ao abrigo do disposto no artigo 9º do Código do IVA; C) Entendeu a AT, em sede de decisão final da Reclamação Graciosa apresentada, cujo indeferimento deu origem ao presente processo arbitral, que a isenção em apreço apenas se aplica a partir da entrada em vigor da Lei n.º 71/2013, de 2 de setembro, muito embora a Lei n.º1/2017 que aditou o artigo 8º A expressamente referisse o carácter interpretativo de tal isenção; D) Considerou, ainda, a AT que não pode a Impugnante beneficiar de tal isenção, na medida em que não apresentou as cédulas profissionais dos seus prestadores de serviços o que, segundo o seu entendimento, constitui pressuposto indispensável para a concessão da isenção de IVA na situação vertente; E) O Tribunal Arbitral acolheu parcialmente o entendimento da AT vertido no Relatório de Inspeção Tributária (adiante, "RIT") e, posteriormente, na decisão final em sede de Reclamação Graciosa apresentada, tendo julgado parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, considerando, contudo, que a isenção de IVA em apreço só se aplica a partir da entrada em vigor da Lei nº71/2013, de 2 de setembro, não tendo considerado que a detenção de cédulas fosse requisito para aplicação de tal isenção; F) É convicção da Impugnante que a decisão arbitral supra identificada padece de vício formal que determina a sua nulidade nos termos do disposto no artigo 125º, n.ºl do CPPT aplicável ex vi artigo 29º, n.º l, alínea a) do RJAT: contradição dos fundamentos com a decisão; G) A decisão arbitral impugnada padece, assim, do vício de contradição dos fundamentos com a decisão porquanto se sustenta numa coisa e, dados os votos dos Árbitros, decide outra (três votos são divergentes nos fundamentos como se demonstrará); Nulidade da decisão impugnada H) Com efeito, no caso em apreço, a decisão arbitral vem assinada por três árbitros: a Conselheira Maria Fernanda Maçãs, o Doutor Manuel Pires e o Doutor João Taborda da Gama; I) Em nota à assinatura do Doutor João Taborda da Gama pode ler-se "(…) parcialmente vencido. Teria julgado o pedido totalmente procedente, nos exatos termos da decisão do CAAD 111/2017-T. que subscrevi)" (sublinhado nosso); J) Já no que respeita à posição do Doutor Manuel Pires e, muito embora nada se refira em nota à sua assinatura (assina, fazendo parecer que concorda) é junta uma declaração de voto, de acordo com a qual os fundamentos invocados justificariam uma decisão de improcedência total do pedido. K) Assim sendo, parte dos fundamentos vertidos no corpo da decisão arbitral foram apenas subscritos pela Conselheira Maria Fernanda Maçãs, sendo o sentido da decisão decorrente das posições dos restantes Árbitros outro que não aquele que prevaleceu na decisão arbitral efetivamente proferida, inquinando a decisão arbitral de nulidade por ausência de maioria quanto ao sentido da decisão e aos respetivos fundamentos. Vejamos: Fundamentos da decisão arbitral impugnada L) De acordo com a decisão arbitral impugnada, a isenção de IVA é apenas aplicável a prestações de serviços realizadas por profissionais das TNC a partir da entrada em vigor da Lei n.º71/2013, de 2 de setembro, não abrangendo serviços prestados em períodos anteriores a essa data; M) Considerou o Tribunal Arbitral que a norma interpretativa constante da Lei nº1/2017, de 16 de janeiro apenas pode fazer parte da lei interpretada - que é a Lei n.º71/2013, de 2 de setembro - e não de uma qualquer outra lei (no caso, o Código do IVA) não nomeada pelo legislador. N) No que se refere à detenção das cédulas profissionais para que a isenção opere, a decisão arbitral determina, entre outros fundamentos, que "(…) nem se argumente com a entrada em vigor da Lei n.º1/2017, uma vez que este diploma se limitou a consagrar uma norma de isenção, sem qualquer referência a requisitos ou exigências de qualificação profissional, os quais como ficou dito, constam essencialmente da Lei n.º71/2013"; O) No tocante aos juros compensatórios, entendeu o Tribunal Arbitral ser de anular as liquidações de juros compensatórios, mesmo nos casos em que se concluiu serem devidos os montantes de IVA liquidados, porquanto a AT não deu a possibilidade à Impugnante de se pronunciar sobre a cobrança de juros nas liquidações adicionais a que procedeu; P) Em suma, a decisão arbitral considerou parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto às liquidações adicionais de IVA no que respeita aos anos de 2013 (a partir de outubro), 2014 e 2015, com a sua consequente anulação, tendo ainda anulado todas as liquidações de juros compensatórios, bem como a decisão de indeferimento da reclamação graciosa. Voto de vencido do Dr. João Taborda da Gama Q) A decisão proferida pelo Tribunal Arbitral em matéria tributária no âmbito do processo n.º111/2017-T (invocada no voto de vencido do Árbitro João Taborda da Gama) julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral deduzido relativamente a um conjunto de atos tributários de liquidação adicional de IVA, todos relativos a períodos de tributação do ano de 2012; R) por entender, em traços gerais, que o alcance prático do artigo 8.º-A da Lei n.º 1/2017 é esclarecer que, para efeitos de IVA, as profissões daqueles que se dediquem ao exercício das TNC referidas no artigo 2.º da Lei n.º 73/2013, entre as quais se inclui a acupunctura, são consideradas profissões paramédicas para efeitos de IVA; S) Para tal decisão foram indicados e transcritos os trabalhos preparatórios da Lei nº1/2017, bem como o entendimento a título conclusivo da Assembleia da República que pretendeu que a interpretação autêntica que foi efectuada pela Lei n.º1/2017 se aplicasse retroactivamente à actividade profissional de exercício das terapêuticas não convencionais a que se reporta a Lei n.º73/2013, com o sentido de lhe ser aplicável o mesmo regime de imposto sobre o valor acrescentado que era aplicado às profissões paramédicas, pelo menos a partir da entrada em vigor da Lei n,º 45/2003, de 22 de Agosto"; T) Na opinião do Doutor João Taborda da Gama, com base neste fundamento - que é substancialmente distinto daquele que foi adotado na decisão arbitral impugnada, de acordo com a qual o limite da retroatividade da norma interpretativa introduzida pela Lei n.º 1/2017 é a entrada em vigor da Lei n.º71/2013, não se aplicando por isso a isenção de IVA aí prevista a períodos que antecedam a sua vigência -, o pedido de pronuncia arbitral deduzido in casu deveria ter sido julgado totalmente procedente; U) Pelo que, inexiste, assim, qualquer coincidência entre os fundamentos adotados pela Arbitra Conselheira Maria Fernanda Maçãs e pelo Árbitro Doutor João Taborda da Gama; Declaração de voto (de vencido) do Dr. Manuel Pires V) Não obstante nada se referir em nota à assinatura do Doutor Manuel Pires, a verdade é que anexa à decisão arbitral encontra-se uma declaração de voto, que contradiz o sentido da decisão arbitral e diverge desta naturalmente nos respetivos fundamentos, tal como contradiz o sentido da decisão a declaração de vencido do Doutor João Taborda da Gama; W) Assim se concluindo que inexistiu, como devia, a maioria necessária à prolação da decisão arbitral com o sentido que lhe foi impresso - de procedência parcial do pedido de pronúncia arbitral, com base no entendimento de que a norma interpretativa contida na Lei n.º1/2017 tem como limite de retroatividade a entrada em vigor da Lei n.º71/2013 e na inaplicabilidade do requisito subjetivo referente à habilitação profissional dos profissionais de TNC. X) Com efeito, de acordo com a declaração de voto do Doutor Manuel Pires, o mesmo (aparentemente) concorda com a interpretação preconizada na decisão arbitral quanto ao âmbito temporal da lei interpretativa n.º1/2017, no sentido em que a mesma se aplica em conexão com a Lei n.º71/2013 e não com a Lei n.º45/2003, de 22 de agosto – diversamente do entendimento do Doutor João Taborda da Gama e em consonância com a Arbitra Maria Fernanda Maçãs -, Y) discordando já contudo no que respeita ao requisito subjetivo da isenção, afirmando que o mesmo deve ser incluindo na isenção e que por isso esta nunca poderá existir sem aquele, o que contradiz claramente o exposto na decisão. Z) No entendimento do Doutor Manuel Pires, importa atender ao facto de "(…) a Lei n.º1/2017, que estabeleceu o benefício dos profissionais, não existia por ocasião do RIT e, antes dela, a AT entendia e bem que o artigo 9.º nºl do CIVA não se aplicava. Estava-se, pois, apenas no domínio objectivo: se a prestação de serviços da acupunctura não beneficiava da isenção, não existia razão de integrar na discussão o aspecto subjectivo dos requisitos necessários aos respectivos profissionais. Só quando a lei, estabelecendo a isenção, surgiu, reconhecendo o profissional no domínio da isenção, tinha de ser também decisivo o requisito subjectivo". AA) Em traços gerais, entendeu este Árbitro que apenas com a entrada em vigor da Lei n.º1/2017 se colocou a questão do aspeto subjetivo da aplicação da isenção prevista no artigo 9º, nºl do Código do IVA aos profissionais das TNC, BB) concluindo que "[p]or tudo o que se escreveu, não correndo a prova dos necessários requisitos para a aplicação da isenção, o pedido em causa teria de ser julgado totalmente improcedente, atenta a inaplicabilidade da isenção ao mero exercício da acupunctura por qualquer pessoa com ausência das requeridas qualificações, ainda que uma entidade colectiva surja como sujeito passivo, mas exercendo obviamente a actividade através de pessoas que devem satisfazer os requisitos legais" (sublinhado nosso). CC) Do exposto resulta que o Árbitro Manuel Pires, não obstante não o fazer expressamente, se considera vencido relativamente à parte da decisão arbitral referente às liquidações adicionais de IVA; DD) Demonstrando, assim, uma discordância total com os fundamentos da Conselheira Maria Fernanda Maçãs que afasta diretamente a questão das cédulas no âmbito da isenção fiscal; EE) Por outro lado, ainda, e nos que aos juros compensatórios respeita, entende o mesmo Árbitro que "(…) mesmo que devesse haver procedência parcial, o que se admite apenas a benefício de raciocínio, deveriam ser devidos [os juros compensatórios] proporcionalmente ao não vencimento" (sublinhado nosso); FF) Considera este Árbitro que (i) é devido imposto, (ii) ocorreu retardamento do cumprimento da inerente obrigação, (iii) há imputabilidade do atraso à atuação (omissão) da Impugnante, o que implica o nexo de causalidade entre a atuação e o retardamento e consequente formulação do juízo de culpa; GG) Também, em suma, no tocante aos juros compensatórios, tem este Árbitro entendimento absolutamente distinto daquele vertido na decisão arbitral, o qual sustenta em argumentos naturalmente distintos também dos invocados na decisão arbitral impugnada; HH) motivo pelo qual a divergência que existe quanto aos fundamentos e sentido da decisão arbitral faz com a que a mesma não reúna a maioria exigida nos termos do artigo 22º do RJAT, sendo por esse motivo nula; II) Nos termos do disposto nos artigos 663º e 666º do CPC, subsidiariamente aplicáveis ao RJAT nos termos do artigo 29.º, n.ºl, alínea e) do RJAT, constitui nulidade do acórdão o facto de este ser lavrado sem o necessário vencimento; JJ) Acresce que, ainda que pudesse entender-se não ser este um dos fundamentos especificamente elencados no artigo 28.º do RJAT e, por conseguinte, insuscetível de constituir fundamento da impugnação da decisão arbitral, sempre se dirá o seguinte: a inexistência da maioria legalmente exigida para que os fundamentos e sentido da decisão arbitral possam ser aqueles com que a mesma foi lavrada, e constituindo a mesma uma nulidade dessa decisão (como constitui) não pode ser insuscetível de ser arguida; KK) sendo que, tais entendimentos diferentes dos árbitros configuram uma contradição entre os fundamentos e a decisão, que é um dos fundamentos da impugnação da decisão arbitral previstos na alínea b) do n.ºl do artigo 28º do RJAT; LL) Na verdade, no caso sub judice, apenas os fundamentos subscritos pela Arbitra Maria Fernanda Maçãs conduziriam ao resultado alcançado pela decisão arbitral; MM) Ora, se num tribunal coletivo como era o Tribunal Arbitral que proferiu a decisão impugnada, cada árbitro subscreve os seus fundamentos, que levam, separadamente, a soluções distintas entre si, não se cruzando as diferentes posições nem nos fundamentos nem no sentido da decisão, pode afirmar-se que não há coerência entre os fundamentos da maioria que se exige nos termos do artigo 22.º, n.º l do RJAT e a decisão que a final se chegou; NN) que é o mesmo que dizer que se verifica oposição entre os fundamentos e a decisão, devendo a decisão arbitral ser anulada em conformidade, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 27.º e 28.º do RJAT; OO) Por todos os motivos supra, deve este Venerando TCAS declarar a nulidade da decisão arbitral e ordenar a devolução do processo para que esta seja reformada pelo Tribunal Arbitral e proferida nova decisão de mérito em conformidade. X Não há registo de contestação.X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal foi notificado nos termos do artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, mas nada disse.X II- Fundamentação1. De Facto. A decisão arbitral recorrida fixou a matéria de facto provada nos seguintes termos:“ (i) A Requerente é uma sociedade por quotas com o objeto social de “Exploração de estabelecimento de consultas e de tratamentos de acupunctura, naturopatia, homeopatia e de outras terapias não convencionais, comercialização de produtos naturais, dietéticos e afins”, a cuja atividade corresponde o CAE 86906 – Outras actividades de saúde humana, desenvolvendo as atividades de acupunctura e tui ná; (ii) Ao abrigo das Ordens de Serviço n.ºs OI201600556, OI201600557, OI201600558, e OI201600559, a atividade da Requerente foi objeto de um procedimento de inspeção externo, que abrangeu os períodos de 2012, 2013, 2014 e 2015; (iii) Nessa sequência, a AT propôs uma alteração do enquadramento tributário da Requerente para efeitos de liquidação do IVA, por considerar que os serviços por ela prestados não preenchem os requisitos previstos para aplicação da isenção constante do artigo 9.º, n.º 1, do CIVA; (iv) O referido entendimento, conduziu a que fossem propostas correções em sede de IVA no valor global de €1.735.187,36 (um milhão, setecentos e trinta e cinco mil, cento e oitenta e sete euros e trinta e seis cêntimos), conforme resulta do seguinte quadro:
(v) A Requerente apresentou a sua resposta em sede de audição prévia ao Projeto de Relatório de Inspeção Tributária (RIT); (vi) Não obstante as razões aí aduzidas, a Requerente foi notificada do RIT, datado de 31 de Agosto de 2016, o qual manteve, na íntegra, as correções inicialmente projetadas pela AT; (vii) No RIT refere-se, com base em documentos fornecidos pela Requerente, que a atividade desta é desenvolvida por prestadores de serviços, dos quais lhe foram facultados os processos de quinze, nominativamente identificados, “com diplomas/certificados de habilitações respeitantes à formação académica de “Curso Superior de Acupunctura e Fitoterapia Tradicional Chinesa” ou “Licenciatura de Chengdu em Medicina Chinesa”, certificados pela Associação Portuguesa de Acupunctura e Disciplinas Associadas (APA-DA) e pelo Instituto Português de Medicina Tradicional Chinesa (IPMTC) e pela APPA ou pela Universidade de Medicina Chinesa Zhong Yi Da Xue, Lda (UMC)”; (viii) Tais cursos não são reconhecidos oficialmente em Portugal, mas quatro dos ditos prestadores de serviços tinham também habilitações em atividades paramédicas (Bacharelato em Fisioterapia; Curso de Especialização em Nutrição Clínica; Licenciatura em Análises Clínicas e Saúde Pública; Licenciatura em Ciências Farmacêuticas). (ix) A Lei n.º 71/2013, de 2 de Setembro – que remetia para portaria a definição das regras para a obtenção da cédula profissional exigível – determinou que, entre outras, a atividade de acupunctura estava dependente da titularidade do grau de licenciatura e da detenção de cédula profissional atribuída pela Administração Central do Sistema de Saúde, IP (ACSS); (x) O termo do prazo para cumprimento da obrigação constante na disposição transitória prevista no artigo 19.º da Lei n.º 71/2013 (reconhecimento dos profissionais que em 2 de Outubro de 2013 exercessem as atividades de Terapêuticas Não Convencionais - TNC) ocorreu 180 dias após a data de entrada em vigor da Portaria n.º 172.º-C/2015, de 5 de Junho, ou seja, em 2 de Dezembro de 2015; (xi) Em face dos fundamentos aduzidos no RIT, a AT fixou à Requerente correções em sede de IVA no valor total de € 1.735.187,36 (um milhão, setecentos e trinta e cinco mil, cento e oitenta e sete euros e trinta e seis cêntimos) como melhor referido em iv); (xii) Posteriormente, a Requerente foi notificada das correspondentes liquidações de imposto e juros que contesta nos presentes autos; (xiii) A Requerente não efetuou o respetivo pagamento, tendo apresentado, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 4 do artigo 52.º da LGT e do artigo 170.º do CPPT, um pedido de dispensa de prestação de garantia, o qual foi julgado procedente pelo Tribunal Central Administrativo Sul; (xiv) Paralelamente, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa dos atos de liquidação de IVA referentes aos anos de 2012 a 2015; (xv) Sobre esta, a AT emitiu decisão de improcedência; (xvi) Em 22 de novembro de 2016 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º3247201601255061, a que foram apensos os demais processos de execução fiscal; Na sequência do mesmo a AT emitiu penhora no montante de €1.944.276,75, tendo sido penhorado o saldo da conta da Requerente, no Banco ……….. B…, no valor de € 12.214,33, bem como de 1.433 títulos nominativos (doc n.º 13 junto com o Pedido); (xvii) Essas penhoras foram levantadas por despacho datado de 16.02.2017 e notificado através do Ofício n.º01319, por estar pendente pedido de apreciação de dispensa de prestação de garantia; (xviii) A Requerente apresentou reclamação graciosa dos atos de liquidação e respetivos juros, relativos aos anos de 2012 a 2015, em 14 de março de 2017; (xix) Em 14 de julho de 2017 a Requerente foi notificada do projeto de indeferimento da reclamação graciosa apresentada; (xx) Em 6 de setembro de 2017 a Requerente foi notificada do despacho de indeferimento da reclamação graciosa; (xxi) Relativamente à incidência do IVA, mas estando só em causa o ano de 2012, uma das sociedades do Grupo da Requerente que presta serviços de TNC, a Clinica ……………….., Lda., obteve decisão arbitral de procedência em 25 de outubro de 2017, com fundamento em que “a Assembleia da República pretendeu que a interpretação autêntica que foi efectuada pela Lei n.º1/2017 e aplicasse retroactivamente à actividade profissional de exercício de terapêuticas não convencionais a que se reporta a Lei n.º 73/2013, com o sentido de lhe ser aplicável do mesmo regime de imposto sobre o valor acrescentado que era aplicado às profissões paramédicas, pelo menos a partir da entrada em vigor da Lei n.º 45/2003, de 22 de Agosto.”; (xxii) Em 22 de março de 2017, dois prestadores de serviços de acupunctura obtiveram do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé o reconhecimento da isenção de IVA para os anos de 2010, 2011 e 2012, “nos termos do art. 9º nº 1 do CIVA e art. 8ª-A da Lei 1/2017”; (xxiii) A AT procedeu a uma inspeção externa à sociedade Policlínica Médico Esteta, Lda., outra das sociedades do Grupo da Requerente que presta serviços de TNC, quanto aos anos de 2013 a 2016, sendo que apenas efetuou correções ao ano de 2013, tendo considerado que a isenção de IVA para serviços de TNC seria aplicável aos restantes anos, i.e, aos anos posteriores à entrada em vigor da Lei n.º71/2013, de 2 de Outubro de 2013.” X “III.2. FACTOS NÃO PROVADOS // Inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.”X “III.3. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO // A factualidade provada teve por base os documentos que foram juntos aos autos pela Requerente, o processo administrativo junto pela Requerida, bem como a posição adotada pelas partes e livremente apreciada pelo Tribunal. //No caso do facto (xxi), alheio ao presente processo, a AT escusou-se a “confirmar o alegado”, mas deu “por adquirido que tal tenha acontecido” (artigo 57.º da sua Resposta).”X 2.2. De Direito.2.2.1. Nos presentes autos, é deduzida impugnação de Acórdão Arbitral, proferido pelo Centro de Arbitragem Administrativa que determinou a anulação dos actos de liquidação adicional de IVA de 2014, 2015 e as liquidações correspondentes a prestações de serviços ocorridas em data posterior a 2 de Outubro de 2013, mantendo na ordem jurídica as liquidações referentes a 2012 e de 2013, anteriores 2 de Outubro de 2013. A impugnante pretende a anulação do Acórdão Arbitral sob escrutínio, porquanto o mesmo terá incorrido no vício de contradição entre os fundamentos e a decisão. Mais invoca que o Acórdão Arbitral impugnado foi lavrado sem o necessário vencimento, em violação do disposto nos artigos 663.º e 666.º do CPC. 2.2.2. Enquadramento A oposição dos fundamentos com a decisão é motivo de anulação da decisão arbitral (artigo 28.º/1/b), do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – RJAT -, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01. Nos termos do artigo 615.º/1/c), do CPC, «É nula a sentença quando: // Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível». «A oposição (entre os fundamentos e a decisão) referida na alínea c) do n.º 1 do art. 668º do Código do Processo Civil só existe quando há contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às hipóteses de contradição aparente, ou seja, quando existe um vício real no raciocínio do julgador: a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente» (1). «O vício de nulidade a que se reporta a alínea c) do nº 1 do artigo 668º e o artigo 716º, n.º 1, do Código de Processo Civil é o que ocorre quanto os fundamentos de facto e de direito invocados conduzirem logicamente ao resultado oposto àquele que integra o respectivo segmento decisório» (2). A segunda parte do inciso do artigo 615.º/1/c), do CPC, «verificar-se-á quando o pensamento do juiz que se retira da análise da decisão se afigura incompreensível ou imperceptível ou quando o sentido da decisão não seja unívoco, por ser susceptível de diversas interpretações ou comportar vários significados ou sentidos» (3). No que respeita ao alegado vício de Acórdão lavrado sem o necessário vencimento (artigos 663.º e 666.º do CPC), o mesmo configura fundamento de anulação de Acórdão Arbitral, porquanto se trata de vício relativo à constituição e funcionamento do Tribunal Arbitral, enquadrável na situação de pronúncia indevida (artigo 28.º/1/c), do RJAT). Mais se refere que «[a] a decisão arbitral é tomada por deliberação da maioria dos seus membros, podendo esta ser decomposta para esse efeito em pronúncias parciais incidentes sobre as diversas questões suscitadas no processo, salvo nos casos de árbitro singular» (4) (artigo 22.º, n.º 1, do RJAT). «É aplicável à decisão arbitral o disposto no artigo 123.º, primeira parte, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, relativamente à sentença judicial» (5). «A decisão arbitral é assinada por todos os árbitros, identificando os factos objecto de litígio, as razões de facto e de direito que motivaram a decisão, bem como a data em que foi proferida, sendo remetido um exemplar assinado da decisão a cada uma das partes» (6). 2.2.3. Nenhum dos vícios apontados pela impugnante se mostram comprovados nos autos, pelo que a presente impugnação de decisão arbitral deve ser julgada improcedente. Vejamos porquê. A decisão arbitral impugnada julgou procedente, em parte, o pedido anulatório em causa, com base no entendimento de que a isenção de IVA, em relação às prestações de serviços efectuadas pelos profissionais de saúde, prevista no artigo 9.º/1, do CIVA, é de aplicar às prestações de serviços efectuadas pelos profissionais de terapêuticas não convencionais (como sucede com a Acupunctura), desde a data da entrada em vigor da Lei n.º 71/2013, de 2 Setembro - a qual procedeu à regulamentação da Lei n.º 45/2003, de 22/08 (7) - , ou seja, desde 02.10.2013. O quadro normativo em causa é o seguinte. Nos termos do artigo 9.º, n.º 1, do CIVA, «[e]stão isentas do imposto [a]s prestações de serviços efectuadas no exercício das profissões de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas» Em 22 de Agosto de 2003, foi publicada a Lei n.º 45/2003, que «estabelece o enquadramento da actividade e do exercício dos profissionais que aplicam as terapêuticas não convencionais, tal como são definidas pela Organização Mundial de Saúde». O diploma aplica-se a «todos os profissionais que se dediquem ao exercício das terapêuticas não convencionais nela reconhecidas» (artigo 2.º da Lei n.º 45/2003, citada). Através da Lei n.º 71/2013, de 2 de Setembro, a Lei n.º 45/2003, foi objeto de regulamentação. O diploma veio «regula[r] o acesso às profissões no âmbito das terapêuticas não convencionais, e o seu exercício, no setor público ou privado, com ou sem fins lucrativos». O mesmo aplica-se a todos os profissionais que se dediquem ao exercício das seguintes terapêuticas não convencionais: // a) Acupuntura; // b) Fitoterapia; // c) Homeopatia; // d) Medicina tradicional chinesa; // e) Naturopatia; // f) Osteopatia; // g) Quiropráxia». Entrou em vigor em 02.10.2013 (artigo 2.º do diploma). Por meio da Lei n.º 1/2017, de 16 de Janeiro, a Lei n.º 71/2013, citada, foi alterada, tendo sido aditado um artigo 8.º-A (“Regime de IVA”), com a redacção seguinte: «Aos profissionais que se dediquem ao exercício das terapêuticas não convencionais referidas no artigo 2.º é aplicável o mesmo regime de imposto sobre o valor acrescentado das profissões paramédicas.». Por seu turno, o preceito do artigo 3.º da Lei n.º 1/2017, de 16 de Janeiro, determinou que «[o] artigo 8.º-A da Lei n.º 71/2013, de 2 de setembro, aditado pela presente lei, tem natureza interpretativa». Perante o quadro normativo descrito, perfilaram-se as orientações interpretativas seguintes: i) A acolhida na decisão arbitral, proferida em 25/10/2017, no P. n.º 111/2017.T, no sentido de que a interpretação autêntica operada pela Lei n.º 1/2017, de 16 de Janeiro, implica o reconhecimento da isenção de IVA em relação às prestações efectuadas pelos profissionais de terapêuticas não convencionais, desde a entrada em vigor da Lei n.º 45/2003, de 22 de Agosto. Posição assumida também nos presentes autos arbitrais pelo Árbitro João Taborda da Gama, através da declaração de voto anexa. ii) A acolhida pelo Árbitro Manuel Pires, tal como resulta da declaração de voto anexa, no sentido de que a procedência do pedido anulatório das liquidações em causa depende de demonstração dos requisitos habilitacionais dos profissionais de acupunctura em apreço, o que na falta de tal aferição, determinaria a improcedência de tal pedido, por falta de preenchimento do elemento subjectivo da norma de isenção. iii) A acolhida no Acórdão Arbitral impugnado nos autos, no sentido de que a norma interpretativa da Lei n.º 1/2017, de 16 de Janeiro, apenas opera por referência à norma interpretanda, correspondente à Lei n.º 71/2013, de 2 de setembro, pelo que assume o arco temporal de vigência desta última, o que implica que a norma de isenção produz efeitos a partir de 02.10.2013. Perante os dados coligidos nos autos, verifica-se que o Acórdão em exame corporiza a orientação maioritária do colectivo que o proferiu, porquanto, seja a Árbitra-relatora, seja o Árbitro João Taborda da Gama, ambos estão de acordo em reconhecer a aplicação da isenção de IVA às prestações de serviço, desde 02.10.2013, para futuro. O mesmo já não será válido em relação à posição assumida pelo Árbitro Manuel Pires, o qual faz depender a aplicação da isenção da demonstração casuística da titularidade das habilitações necessárias por parte do profissional em causa. Pelo que não ocorreu o alegado lavramento de Acórdão contra o vencido ou sem o necessário vencimento. O mesmo se deve dizer em relação à alegada oposição entre os fundamentos e a decisão. A maioria que suporta a decisão arbitral em apreço subscreve o entendimento de que a isenção de IVA, em relação às prestações de serviços efectuadas pelos profissionais de acupunctura, é devida, pelo menos desde 02.10.2013. Pelo que tal maioria acordou no segmento decisório em exame no sentido da anulação das liquidações de IVA de 2014, 2015 e as liquidações de IVA correspondentes a prestações de serviços ocorridas em data posterior a 2 de Outubro de 2013, mantendo na ordem jurídica as liquidações referentes a 2012 e a 2013, anteriores 2 de Outubro de 2013. O iter cognoscitivo e valorativo que suporta a decisão é acessível ao destinatário médio, colocado na posição da impugnante, ou seja, a norma interpretativa da Lei n.º 1/2017, de 16 de Janeiro, apenas opera por referência à norma interpretanda, correspondente à Lei n.º 71/2013, de 2 de setembro, pelo que as liquidações que contrariam a isenção estabelecida na mesma, emitidas em data posterior ao seu início de vigência não podem manter-se na ordem jurídica. Não se apura, pois, qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão. Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente impugnação. Dispositivo Custas pela impugnante. Registe. Notifique. (Jorge Cortês - Relator) (1.ª Adjunta –Patrícia Manuel Pires) (2.º Adjunto–Vital Lopes) (1) Acórdão do STJ, de 06.05.2004, P. 04B1409. (2) Acórdão do STJ, de 30.09.2004, P. 04B2894. (3) Helena Cabrita, A sentença cível, Fundamentação de facto e de direito, Almedina, 2019, p.234. (4) Artigo 22.º, n.º 1, do RJAT. (5) Artigo 22.º, n.º 2, do RJAT. (6) Artigo 22.º, n.º 3, do RJAT. (7) Lei de enquadramento base das terapêuticas não convencionais. |