Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 203/16.6BECTB |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 02/06/2025 |
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Relator: | MARIA DA LUZ CARDOSO |
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Descritores: | IMPUGNAÇÃO PRAZO |
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Sumário: | I - O prazo de impugnação judicial é um prazo de natureza substantiva, de caducidade e perentório, que se conta nos termos do artigo 279º do Código Cível [ex vi artigo 20º do CPPT] e ao qual não se aplicam as disposições legais previstas para os prazos processuais ou judiciais. |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | I - RELATÓRIO J...... e I...... , (doravante Recorrentes), vieram recorrer da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco no dia 20.02.2024, na impugnação por si apresentada contra a liquidação de IRS do ano de 2009, que julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação e, em consequência, absolveu a Fazenda Pública (doravante Recorrida) do pedido. Com o requerimento de interposição do recurso, a Recorrente apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: “CONCLUSÕES I. Na sentença recorrida, o Tribunal a quo julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação, justificando que, à data da apresentação da presente impugnação, em 04/05/2016, havia decorrido há muito o prazo de três meses previsto no artigo 102.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, sendo irrelevante que a impugnação se fundamente em factos supervenientes ao ato de liquidação e ao termo do prazo legal de pagamento voluntário da mesma. II. Ora, os Recorrentes insurgem-se precisamente contra o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, no que concerne à previsão legal acolhida e, outrossim, à irrelevância da superveniência dos factos que fundamentam a impugnação em causa. III. Com efeito, o artigo 99º do CPPT elenca uma lista meramente numerativa e não taxativa dos fundamentos da impugnação, pelo que, qualquer ilegalidade abstrata ou concreta, mesmo que aí não prevista, é impugnável. IV. Por outro lado, visando a impugnação judicial a obtenção da anulação de um ato tributário da liquidação quando o mesmo se encontra ferido de ilegalidade, que afeta a sua validade ou existência, o recurso a tal meio processual não está dependente tão somente do termo do prazo para o pagamento voluntário, mas, também, de qualquer facto que surja a posteriori. V. Nesta conformidade, ao abrigo do disposto na alínea f) do nº 1 do artigo 102º do CPPT, o conhecimento de qualquer ato lesivo dos interesses legalmente protegidos, que conduza, porventura, a uma errónea quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários, nos termos da alínea a) do artigo 99º do CPPT, pode, sim, ser impugnado no prazo de três meses a contar desse conhecimento. VI. E é exatamente isso que sucede in casu. VII. Na realidade, e conforme a própria decisão aqui em crise deu como provado na alínea P) dos factos provados, só a partir do dia 16/02/2016, data em que a quota social em apreço reingressou à titularidade dos Recorrentes e, consequentemente, se acordou que estes nada receberiam pela anterior cessão da quota a A...... , é que surgiu o indiscutível fundamento legal para a presente impugnação judicial. VIII. Destarte, aquando da instauração da presente impugnação judicial (04/05/2016), o prazo de três meses que a lei determina para o efeito ainda se encontrava em curso. IX. Ademais, não se aceita nem se concebe que seja coartado aos Recorrentes a possibilidade de agir contra um ato tributário de liquidação quando, em virtude da ocorrência posterior de determinados factos, tal ato é inválido ou inexistente. X. E o que é certo é que os Impugnantes, pela cessão da quota que o J...... detinha na sociedade S...... , Lda à A...... , tinham direito a reclamar e receber desta a quantia de € 750.000,00 mas, fruto do reingresso da referida quota à sua titularidade, tal direito ficou totalmente precludido. XI. E, nessa medida, o ato tributário que, na sequência da correção ao IRS dos Impugnantes, relativo ao ano de 2009, fixou o imposto em € 74.002,14, é ilegal, porquanto é manifesta a divergência entre a matéria de facto utilizada como pressuposto da prática do ato e o que, na realidade, se veio a concretizar. XII. Note, ainda, que, se a própria reclamação oficiosa, que pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial, permite que, em caso de documento ou sentença superveniente, o prazo para a sua apresentação se conte a partir da data em que se tornou possível ao reclamante obter o documento ou conhecer o facto (Cfr. nº 1 e 4 do artigo 70º do CPPT), por maioria de razão, o prazo para a dedução de impugnação judicial, baseada nos mesmos factos, também se deve contar a partir do seu conhecimento ou existência. XIII. O Tribunal a quo ao defender que é “irrelevante que a impugnação se fundamente em factos supervenientes ao ato de liquidação e ao termo do prazo legal de pagamento voluntário da mesma”, baseou-se numa premissa errada, inequivocamente atentatória do mais elementar princípio da proteção jurídica, constitucionalmente garantido a todos os contribuintes, e do mais basilar princípio da participação dos contribuintes na sua relação com a administração fiscal. XIV. Sem prescindir nem tergiversar, e apenas por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá, XV. Sublinhou, ainda, o Tribunal a quo que os Recorrentes não aguardaram pela decisão do procedimento de revisão do ato, tendo optado por deduzir a presente impugnação judicial, identificando como objeto da impugnação o ato de liquidação do tributo, não fazendo sequer alusão ao procedimento de revisão. XVI. Diga-se, em primeiro lugar, que os Recorrentes não aguardaram pela decisão do procedimento de revisão e nem a ele aludiram porque nem sequer o tinham de fazer. XVII. Com efeito, o procedimento de revisão do ato não contende com o da impugnação judicial, sendo os respetivos pressupostos, prazos e fundamentos, em certos casos, bastantes díspares. XVIII. Não obstante, nos termos do nº 1 do artigo 57º da Lei Geral Tributária, o indeferimento tácito do pedido de revisão do ato, originado pelo decurso dos quatro meses, permite a sua impugnação judicial, tal como o permite o indeferimento tácito da reclamação oficiosa. XIX. Neste segmento, e atenta a similitude de situações, convoca-se aqui o entendimento perfilhado pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão do STA de 28/10/2009, Processo nº 0595/09, cujas transcrições foram expressamente feitas no artigo 28º das Alegações e cujo teor se dá aqui por reproduzido e integrado. XX. No caso sub judice, é totalmente legítimo considerar que, mesmo que se entendesse que o direito de ação já havia caducado, o que não se aceita, nem se concebe, e só por mera hipótese académica se admite, sempre haveria que abraçar o disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 102º do CPPT e atender a que o prazo de impugnação judicial se ampliou até três meses após o decurso dos quatro meses que a Administração Tributária tinha para concluir o procedimento tributário de revisão do ato. XXI. uma vez que, face à inexistência de expressa decisão da revisão oficiosa, o ato de liquidação é o único cuja legalidade pode e deve ser analisada no processo de impugnação judicial, não obstando, a tanto, o facto de a presente impugnação judicial ter sido deduzida antes da formação da presunção de indeferimento tácito. XXII. Por tudo o exposto, não se conformam, então, os Recorrentes com a douta decisão em crise, por entenderem que, no caso, a exceção de caducidade do direito de ação deveria ter sido julgada totalmente improcedente. Termos em que, nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de Vªs Exªs, deve ser julgada a Apelação totalmente procedente, concedendo-se, provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se integralmente a decisão recorrida e ordenando-se o prosseguimento dos autos para apreciação do mérito da impugnação. Assim se fazendo, como sempre, a tão consumada Justiça.” * A Recorrida, devidamente notificada da admissão do recurso, apresentou contra-alegações, tendo as suas conclusões o seguinte teor: “EM CONCLUSÃO, entendemos que: 1.º As alegações formuladas A TÍTULO PRINCIPAL no presente recurso não devem ser atendidas, uma vez que a verificação, em 2016, do reingresso, na titularidade dos recorrentes, da quota social por estes anteriormente alienada, não é suscetível de constituir um facto superveniente, para os efeitos da al. f) do n.º 1 do art. 102.º do CPPT, por não poder determinar um juízo de ilegalidade sobre um ato de liquidação de IRS, efetuado em 2013, relativo à cessão onerosa da quota, que ocorreu em 2009; 2.º As alegações formuladas A TÍTULO COMPLEMENTAR no presente recurso não devem ser atendidas, uma vez que, no âmbito do procedimento de revisão oficiosa do ato tributário, apresentado pelos ora recorrentes em 13-04-2016, não houve lugar à formação de qualquer presunção de indeferimento tácito, uma vez que, em conformidade com o n.º 3 do art. 111.º do CPPT, muito antes do decurso do prazo de quatro meses (referido no n.º 1 do art. 57.º da LGT), a tramitação foi suspensa, no estado em que se encontrava por ter sido apresentada, em 29-04-2016, a PI na presente impugnação, para aí ser considerado, para todos os efeitos, o procedimento de revisão. 3.º Dão-se aqui por integralmente reproduzidas as razões e fundamentos constantes da douta sentença recorrida, e que não merece censura alguma. 4.º Pelo que, julgando improcedente o Recurso e mantendo na íntegra a decisão recorrida farão V. Ex.ªs a costumada JUSTIÇA.” * O Digno MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. * Colhidos os vistos legais (artigo 657º, n. º2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), cumpre apreciar e decidir. * Delimitação do objeto do recurso Em ordem ao consignado no artigo 639º do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282º do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir: * II. FUNDAMENTAÇÃO II.1- De facto A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “3. Fundamentação 3.1. De facto Com interesse para a decisão, considera-se provada a seguinte factualidade constante dos autos: A) Por escrito assinado em 19/11/2009 denominado «Contrato de Cessão de Quota» os Impugnantes declararam ceder a A...... , e esta declarou aceitar a cessão, uma quota na sociedade “S...... , Lda”, pelo preço de 9.975,95€ correspondente ao seu valor nominal [cf. fls. 11 a 14 dos presentes autos]. B) Em 20/11/2009 A...... assinou o documento denominado «Confissão de Dívida» nos termos do qual declarou ser devedor aos Impugnantes da quantia de 750.000,00€ e que a memsa constitui uma contrapartida pela cedência da quota na sociedade “S...... , Lda”, com o valor nominal de 9.975,95€ [cf. fls. 15 dos presentes autos]. C) Em 13/04/2010 os Impugnantes submeteram a declaração modelo 3 de IRS relativa ao ano de 2009, sem junção do anexo G [cf. fls. 72-verso a 74 dos presentes autos]. D) A declaração mencionada na alínea anterior deu origem à liquidação de IRS n.º .........19, no valor a reembolsar de 5.359,69€ [cf. fls. 74-verso dos presentes autos]. E) Em 13/01/2012 os Impugnantes apresentaram no Tribunal Judicial da Sertã requerimento executivo contra A...... visando a cobrança da quantia exequenda de 525.000,00€, do qual se destaca o seguinte teor: «(…) “(texto integral no original; imagem)” (…)» [cf. fls. 16 a 19 dos presentes autos]. F) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI201300280 emitida em 10/07/2013, os serviços de inspeção da Direção de Finanças de Castelo Branco iniciaram, em 06/09/2013, uma ação de inspeção tributária aos Impugnantes, de âmbito parcial, em sede de IRS, com extensão ao ano de 2009 [cf. fls. 24 dos presentes autos]. G) Em 04/11/2013 foi elaborado o projeto de relatório de inspeção tributária, cujo teor aqui se dá como reproduzido, com proposta de correções meramente aritméticas à matéria tributável, no montante de 740.024,05€, em sede de IRS do ano de 2009 [cf. fls. 25 a 29 dos presentes autos]. H) Em 12/11/2013 os Impugnantes submeteram a declaração modelo 3 de IRS de substituição relativa ao exercício de 2009 tendo declarado no quadro 8 do respetivo Anexo G a alienação da participação social mencionada em A) pelo valor de realização de 750.000,00€ e pelo valor de aquisição de 9.975,95€ [cf. fls. 76-verso a 78 dos presentes autos]. I) Com base na declaração mencionada na alínea anterior foi emitida aos Impugnantes, em 22/11/2013, a liquidação de IRS n.º …….75, relativa ao ano de 2009, no valor de 78.919,05€, do qual o montante de 10.253,93€ corresponde a juros compensatórios, dando origem à nota de cobrança n.º ……75, de cuja compensação resulta um saldo a pagar de 84.278,75€, com data limite de pagamento até 02/01/2014 [cf. fls. 78-verso e 116 a 118 dos presentes autos]. J) Em 26/11/2013 foi elaborado o relatório final da inspeção tributária, cujo teor aqui se dá como reproduzido, do qual se destaca o seguinte teor: «(…) III – Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável Como já houve oportunidade de referir, no dia 19.11.2009, foi outorgado um Contrato de Cessão de Quota, no qual figuram como vendedores os sujeitos passivos J...... e I...... e como compradora a contribuinte A...... , NIF (…) O objeto do referido contrato foi uma participação social correspondente a 40% do capital social da sociedade denominada S...... Lda., NIPC (…), sendo que, no contrato, consta que as partes atribuíram à quota transmitida um valor equivalente ao respetivo valor nominal, ou seja, € 9 975,95. Em quitação daquela importância terá sido emitido o cheque nº. 6343187490, de valor equivalente ao declarado no contrato de cessão de quota, o qual foi sacado sobre o M........, cfr. requerimento de abertura da instrução entregue pela mandatária da contribuinte A...... , no processo nº. 71/12.7 TASRT, cfr. cópia que se junta como anexo 2. A venda daquela participação social preenche as normas de incidência previstas nos artº.s 1º - nº 1, 9º - nº. 1 – alínea a) e 10º nº. 1, alínea b) do CIRS (Código do IRS – Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares), pelo que, nos termos do artº. 57º - nº. 1 alínea a) do mesmo código, deveria ter sido junta à declaração de rendimentos entregue pelos contribuintes um Anexo G, de forma a declarar aquele facto tributário. (…) Não foi contudo, junto o anexo G à declaração de rendimentos apresentada relativamente ao ano de 2009. Sendo assim, haverá que proceder à determinação do rendimento líquido resultante da alienação onerosa da participação social anteriormente detida pelo contribuinte J...... , na sociedade S...... Lda. (…) VI – Regularizações efetuadas pelo sujeito passivo no decurso do procedimento inspetivo No prazo concedido para efeitos de audição prévia, os contribuintes promoveram a regularização voluntária da situação tributária, mediante a apresentação de uma declaração de substituição para o ano de 2009, na qual foi incluído um anexo G, cfr. print que se segue. (…) No quadro 8 do anexo G da declaração apresentada, consta a alienação onerosa de partes sociais descrita no capítulo III do presente Relatório de Inspeção, sendo os valores declarados coerentes com os valores supra referidos (…) «[cf. fls. não numeradas do procedimento de revisão que integra o PA apenso]. K) Sob o relatório de inspeção tributária recaiu despacho com o seguinte teor: «Considerando que no decurso da acção inspetiva o sp regularizou a situação em falta, conforme lhe foi proposto. Arquivar após notificar» [cf. fls. não numeradas do procedimento de revisão que integra o PA apenso]. L) O Impugnante foi notificado do resultado da ação inspetiva através de ofício expedido por correio registado em 28/11/2013 [cf. fls. não numeradas do procedimento de revisão que integra o PA apenso]. M) Em 29/01/2014 foi instaurado contra os Impugnantes o processo de execução fiscal n.º ……43 para cobrança coerciva da liquidação de IRS do ano de 2009 mencionada em I) [cf. fls. 52 e 53 dos presentes autos]. N) Em 06/06/2014 o Diretor de Finanças de Castelo Branco proferiu despacho a deferir o pedido de pagamento em 60 prestações da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º …..43 [cf. fls. 55 a 56 dos presentes autos]. O) Em 16/02/2015, entre A...... e os Impugnantes, foi outorgada escritura pública denominada «Cessão de Quota e Penhor», cujo teor aqui se dá como reproduzido, nos termos da qual a primeira declarou ceder ao Impugnante, e este declarou aceitar, a quota por si detida na sociedade “S...... , Lda.”, pelo preço de 9.975,95€ correspondente ao seu valor nominal [cf. fls. 60 a 62 dos presentes autos]. P) Em 16/02/2016 foi assinado o escrito denominado «Acordo de Reingresso da Quota Social», outorgado entre os Impugnantes e A...... , cujo teor aqui se dá como reproduzido, nos termos do qual os outorgantes acordaram que, na sequência da escritura de cessão de quota efetuada no dia 16 de fevereiro de 2016, A...... não fica com qualquer encargo pela aquisição da quota social da Sociedade “S...... , Lda.”, adquirida em 19 de novembro de 2009 [cf. fls. 57 a 58 dos presentes autos]. Q) Em 16/02/2016, no âmbito da ação executiva mencionada em E), foi proferida sentença a homologar o pedido de desistência da pretensão executiva formulada pelos Impugnantes contra a executada A...... e a declarar extinto o crédito exequendo [cf. fls. 21 a 22 dos presentes autos]. R) Em 13/04/2016 deu entrada na Direção de Finanças de Castelo Branco um pedido de revisão em nome dos Impugnantes, nos termos do artigo 78.º da LGT, cujo teor aqui se dá como reproduzido, a solicitar a revisão do ato tributário relativo ao IRS do ano de 2009, dando origem ao procedimento de revisão oficiosa n.º 0671201602000032 [cf. fls. 1 a 8 do procedimento de revisão que integra o PA apenso]. S) A presente impugnação judicial foi rececionada no Serviço de Finanças da Sertã em 04/05/2016 [cf. fls. 1 dos presentes autos].” * Factos não provados“Com interesse para a decisão nada mais de provou.” * Motivação “A decisão da matéria de facto efetuou-se com base nos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo (PA) apenso, conforme discriminado em cada uma das alíneas dos factos provados.” * II.2 - De direito In casu, os Recorrentes não se conformam com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco na impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação de IRS de 2009, que julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação (suscitada em sede de contestação pela Fazenda Pública) e, em consequência, absolveu a Fazenda Pública do pedido. Discordam os Recorrentes do teor da sentença recorrida, que no seu entender incorreu em erro de julgamento ao considerar irrelevante que a impugnação se fundamente em factos supervenientes ao ato de liquidação e ao termo do prazo legal de pagamento voluntário da mesma e, consequentemente, considerou verificada a exceção de caducidade do direito de ação. Em sede de contestação, a Fazenda Pública invoca a exceção de caducidade do direito de ação, alegando que a liquidação impugnada foi emitida com base na declaração modelo 3 de IRS de 2009 apresentada pelos Impugnantes com vista à regularização voluntária da situação tributária no decurso da ação inspetiva, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 02/01/2014, pelo que tendo a presente impugnação sido deduzida em 11/05/2016, a mesma é intempestiva. Contrapõem os Impugnantes alegando que apenas na sequência do reingresso da quota à titularidade dos Impugnantes é que houve fundamento para requerer a anulação do ato tributário, pelo que o prazo de noventa dias previsto no artigo 102º, alínea a), do CPPT, conta-se a partir de 16/02/2016, data em que teve lugar o reingresso da quota à titularidade dos Impugnantes, pelo que a impugnação apresentada em 11/05/2016 deu entrada dentro do prazo legal. * A questão que vem colocada no recurso reconduz-se em saber se a ação de impugnação deve ou não ser considerada tempestiva. Vejamos se assiste razão aos Recorrentes. De relevar, ab initio, que os Recorrentes não procederam à impugnação da matéria de facto em ordem ao consignado no artigo 640º do CPC, nada requerendo em termos de aditamento ou supressão do competente acervo probatório, razão pela qual a mesma se encontra devidamente estabilizada. Pretendem os Recorrentes que não deve proceder a exceção de caducidade do direito de ação, defendendo que se deve considerar como facto superveniente relevante, para efeitos de apresentação de impugnação judicial, a verificação do reingresso, na sua titularidade, da quota social por estes anteriormente alienada. Por entenderem que tal reingresso seria enquadrável na al. f) do n.º 1 do artigo 102º do CPPT, que determina o início da contagem do prazo de impugnação a partir do “Conhecimento dos actos lesivos dos interesses legalmente protegidos não abrangidos nas alíneas anteriores.” Defendem os Recorrentes nas suas alegações de recurso, que ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo “…baseou-se numa premissa errada, inequivocamente atentatória do mais elementar princípio da proteção jurídica, constitucionalmente garantido a todos os contribuintes, e do mais basilar princípio da participação dos contribuintes na sua relação com a administração fiscal.”. Requerem, por isso, que seja “…julgada a Apelação totalmente procedente, concedendo-se, provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se integralmente a decisão recorrida e ordenando-se o prosseguimento dos autos para apreciação do mérito da impugnação. julgada a Apelação totalmente procedente, concedendo-se, provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se integralmente a decisão recorrida e ordenando-se o prosseguimento dos autos para apreciação do mérito da impugnação.” Atenhamo-nos aos factos que relevam para a apreciação do objeto do recurso: - Constitui objeto exclusivo da presente impugnação judicial a liquidação de IRS do ano de 2009, emitida em 22/11/2013, com data limite de pagamento voluntário até 02/01/2014 [cf. alínea I) do probatório]. - Os Impugnantes (ora Recorrentes) apresentaram, em 13/04/2016, um pedido de revisão do ato de liquidação junto da Administração Tributária, nos termos do artigo 78º da LGT [cf. alínea R) do probatório]. * Comecemos por estabelecer o respetivo enquadramento normativo. À data dos factos que para aqui importa, deve considerar-se o artigo 102º do CPPT, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro. É a seguinte a redação de tal preceito legal: “Artigo 102.º Impugnação judicial. Prazo de apresentação 1 - A impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir dos factos seguintes: a) Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte; b) Notificação dos restantes actos tributários, mesmo quando não dêem origem a qualquer liquidação; c) Citação dos responsáveis subsidiários em processo de execução fiscal; d) Formação da presunção de indeferimento tácito; e) Notificação dos restantes actos que possam ser objecto de impugnação autónoma nos termos deste Código; f) Conhecimento dos actos lesivos dos interesses legalmente protegidos não abrangidos nas alíneas anteriores. 2 - Em caso de indeferimento de reclamação graciosa, o prazo de impugnação será de 15 dias após a notificação. 3 - Se o fundamento for a nulidade, a impugnação pode ser deduzida a todo o tempo. 4 - O disposto neste artigo não prejudica outros prazos especiais fixados neste Código ou noutras leis tributárias”. Temos, pois, que, no caso, os Impugnantes dispunham do prazo de três meses para deduzir impugnação judicial do ato tributário de liquidação de IRS contestado. Tal prazo de três meses, nos termos da alínea a) transcrita, conta-se a partir do termo do prazo para pagamento voluntário da prestação tributária legalmente notificada ao contribuinte, o que, no caso em análise, corresponde ao dia 31/08/13, tal como resulta da alínea d) do probatório. O prazo de impugnação dos atos de liquidação de tributos está previsto no artigo 102º, n.º 1, alínea a) do CPPT, sendo de três meses contado do termo do prazo para o pagamento voluntário das prestações tributárias. O prazo de impugnação judicial é um prazo de natureza substantiva, de caducidade e perentório, que se conta nos termos do artigo 279º do Código Cível [ex vi artigo 20º do CPPT] e ao qual não se aplicam as disposições legais previstas para os prazos processuais ou judiciais [cf. entre outros, os acórdãos do STA de 22-09-2010, no Proc.º 0269/10, de 14-03-07, no Proc.º 831/06 e de 06-07-05, no Proc.º 585/05, todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt]. Trata-se de um prazo perentório, pois o decurso do mesmo extingue o direito de praticar o ato [cf. artigo 139º, n.º 3 do CPC] e de caducidade, porque aparece como extintivo do direito potestativo de impugnar judicialmente a liquidação. Dúvidas não restam, que os ora Recorrentes apresentaram a presente impugnação judicial contra a liquidação de IRS n.º ……..75, relativa ao período de 2009, no valor de €78.919,05, que foi efetuada na sequência da apresentação, pelos sujeitos passivos, em 12-11-2013, de declaração de IRS de substituição [cf. alínea H) do probatório]. Que correspondeu à regularização voluntária efetuada pelos sujeitos passivos, após a emissão de projeto de Relatório de Inspeção, no âmbito do procedimento de inspeção tributária credenciado pela Ordem de Serviço n.º OI201300280, emitida em 10-07-2013, que teve a sua origem na omissão da declaração da mais-valia (anexo G da declaração de IRS) referente à alienação onerosa da quota social que os recorrentes detinham na sociedade “S...... , Lda”. Acresce que, não basta a existência de um facto superveniente para que seja reaberto o prazo de impugnação judicial da liquidação. É ainda necessário que esse facto seja suscetível de determinar a ilegalidade do ato de liquidação, considerando o quadro fáctico e jurídico existente na data em que esta foi efetuada. Ora, o reingresso da quota da sociedade “S...... , Lda” na titularidade dos Recorrentes, outorgado por escritura de 16-02-2016, assim como o acordo da mesma data, que estipula a assunção pelos Recorrentes da dívida da sociedade, e a desoneração da anterior titular da quota, não são suscetíveis de poder determinar um juízo de ilegalidade sobre um ato de liquidação de IRS, efetuado e notificado aos recorrentes no ano de 2013, relativo à cessão onerosa da quota, que ocorreu em 19-11-2009. O juízo sobre a legalidade de um ato tributário, verificado em certa data, não pode atender a factos posteriores que apenas produzem efeitos para futuro, como é o caso do referido reingresso da quota na titularidade dos recorrentes. Pelo que entendemos que tal reingresso não pode ser considerado como facto superveniente nos termos da al. f) do n.º 1 do artigo 102º do CPPT, pelo que, acompanhamos o Tribunal a quo, quando conclui que “No caso dos autos é manifesto que à data da apresentação da presente impugnação, em 04/05/2016 [cf. alínea S) do probatório], havia decorrido há muito o prazo de três meses previsto no artigo 102.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, sendo irrelevante que a impugnação se fundamente em factos supervenientes ao ato de liquidação e ao termo do prazo legal de pagamento voluntário da mesma.” Pelo que improcedem as alegações de recurso quanto a este argumento. Pretendem ainda os Recorrentes que não deve proceder a exceção de caducidade do direito de ação, por defenderem que, na sequência da apresentação do pedido de revisão oficiosa contra a liquidação supra identificada, se verificou o indeferimento tácito do procedimento de revisão, por incumprimento do prazo previsto no n.º 1 do artigo 57º da LGT, o que abriria o prazo de apresentação da impugnação judicial, nos termos do n.º 5 do mesmo artigo. Vejamos. Em 13-04-2016, os ora Recorrentes apresentaram um pedido de revisão do ato tributário (Proc. n.º 0671201602000032), com fundamento em injustiça grave ou notória (n.º 3 do art. 78º da LGT), cf. consta do comprovativo de entrega do pedido de pedido de revisão, junto ao processo administrativo instrutor nos presentes autos [cf. alínea R) do probatório]. Assiste aos contribuintes o direito de impugnar judicialmente a decisão expressa ou tácita do procedimento de revisão oficiosa, nos termos do artigo 95º n.º 1, alínea d) da LGT, sendo que, nestes casos, a impugnação judicial terá por objeto imediato a decisão expressa ou tácita do procedimento de revisão e por objeto mediato o ato de liquidação. Sucede que, in casu, os ora Recorrentes não aguardaram pela decisão do procedimento de revisão, tendo optado por deduzir a presente impugnação judicial, em 04/05/2016, identificando como objeto da impugnação o ato de liquidação do tributo, não fazendo sequer alusão ao procedimento de revisão, num momento em que, por um lado, já havia decorrido o prazo de impugnação previsto no artigo 102º, n.º 1, alínea a) do CPPT e, por outro, não se havia ainda esgotado o prazo de quatro meses para que a Administração Tributária se pronunciasse sobre o pedido de revisão [artigo 57º, n.º 1 da LGT]. Pelo que mais uma vez não assiste razão aos Recorrentes. Deste modo, nenhum reparo há a fazer à decisão recorrida, quando concluiu que “Deste modo, não tendo a impugnação judicial sido deduzida dentro do prazo legalmente estabelecido caducou o direito de ação, extinguindo-se o direito de impugnar judicialmente o ato de liquidação [artigos 298.º, nº 2 e 331.º, n.º 1 do Código Civil], exceção perentória, determinante da absolvição do pedido, nos termos do artigo 576º, n.º 3 do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, o que se decidirá a final.” Pelo que, a sentença que assim decidiu não padece de qualquer erro de julgamento, devendo, por isso, ser confirmada. * III. DECISÃO Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em: - Negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida. Custas pelos Recorrentes. Registe e notifique. Lisboa, 6 de fevereiro de 2025. ---------------------------------- [Maria da Luz Cardoso] ---------------------------------- [Margarida Reis] ------------------------------ [Rui A.S. Ferreira] |