Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:114/21.3BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:10/24/2024
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:DECISÃO ARBITRAL
EXCESSO E OMISSÃO DE PRONÚNCIA
CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS
Sumário:I - Ao contrário do que decorre do regime de recurso das decisões proferidas pelos tribunais tributários de 1.ª instância, o mérito das decisões proferidas pelos tribunais arbitrais tributários é sindicável num conjunto muito limitado de situações e nunca no âmbito da sua impugnação junto do Tribunal Central Administrativo.
II - Na impugnação da decisão arbitral junto do TCA, nos termos do art.º 27.º, n.º 1, do RJAT, tal decisão pode ser anulada, sendo que a impugnação pode ser apresentada considerando um dos fundamentos taxativamente elencados no n.º 1 do artigo 28.º do mesmo diploma, não podendo abranger qualquer erro de julgamento.
III - Se o juiz conhece de questão, que o Autor e Réu não lhe submeteram, ou condena em objeto diverso do pedido, a decisão enferma de vício, por excesso, pois o juiz exorbitou a sua atividade indo para além do seu pedido de parte (extra petitum).
IV-Não obstante o Tribunal não estar sujeito às alegações das partes, no que diz respeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cfr. artigo 5.º, nº 3, do CPC), a verdade é que em ordem ao consignado no artigo 609.º, nº1 do CPC, a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.
V - Se a fundamentação jurídica é ou não acertada, mormente, por desconformidade com a factualidade de facto e de direito contida no Relatório de Inspeção Tributária, e se o Tribunal Arbitral analisou com a devida propriedade e com acerto o litígio, mormente no domínio da divisibilidade do ato de liquidação, tal não integra nulidade da decisão, mas, tão-só, erro de julgamento o qual não pode ser analisado por este TCAS.
VI - A nulidade por não especificação dos fundamentos de facto e de direito abrange as situações de falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito.
VII - Verifica-se contradição real entre os fundamentos e a decisão proferida quando o discurso argumentativo constante da decisão arbitral impugnada conduza a uma decisão distinta da que foi proferida, não se confundindo a mesma com o erro de julgamento.
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO

D… - E…HEALTH CLUBS, S.A. (doravante Impugnante), deduziu impugnação ao abrigo dos artigos 27.º, e 28.º, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), dirigida a este Tribunal, visando a decisão proferida no processo 593/2020-T que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), e que julgou improcedente o pedido principal de anulação dos atos tributários de liquidação de Imposto sobre o valor Acrescentado (IVA), e os correspondentes Juros Compensatórios (JC), relativos aos períodos de janeiro de 2016 a julho de 2016, e de setembro de 2016 a dezembro de 2016, que perfazem o valor total de €170.128,42, e julgou parcialmente procedente o pedido subsidiário, anulando nessa proporção os atos de liquidação sindicados.


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A Impugnante termina a sua impugnação formulando as seguintes conclusões:

“(i) Vem a presente impugnação interposta da decisão arbitral que julgou improcedente o pedido principal de anulação dos atos tributários de liquidação de IVA e de juros compensatórios, referentes aos períodos de janeiro de 2016 a julho de 2016, bem como aos períodos de setembro de 2016 a dezembro de 2016 no valor total de €170.128,42 e julgou parcialmente o pedido subsidiário apresentado pela requerente anulando parcialmente os actos de liquidação sindicados.

(ii) A impugnante no seu pedido de pronúncia arbitral alegou que as liquidações em causa padeciam de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

(iii) Os fundamentos da ilegalidade resumiam-se às questões da efetividade dos serviços de nutrição e da não acessoriedade dos mesmos quando vendidos conjuntamente com pacotes de prestação de serviços e ginásio.

(iv) Fundamentos esses que foram repetida e reiteradamente formulados integralmente nos processos que correram seus termos também no tribunal arbitral sob os números: 169/2019-T ; 159/2019-T ; 170/2019-T ; 163/2019-T ; 373/2018-T ; 162/2019-T ; 164/2019-T ; 161/2019-T ; 160/2019-T ; 395/2020-T ; 399/2020-T ; 404/2020-T ; 408/2020-T ; 571/2020-T ; 549/2020-T ; 599/2020-T ; 519/2020-T ; 551/2020-T ; 477/2020-T.

(v) Onde apenas se distinguia o ano de liquidação e o sujeito passivo, embora todos os sujeitos passivos referidos nos processos supra mencionados façam parte do grupo H… Portugal.

(vi) Todos os pedidos de pronúncia arbitral, sem exceção, foram julgados procedentes e anuladas as respetivas notas de liquidação.

(vii) E em todos esses processos arbitrais, nomeadamente no Processo n.° 549/2020-T, em que foi Presidente do Tribunal o mesmo Juiz - Árbitro que julgou o processo arbitral cuja nulidade ora se peticiona, a questão- thema decidendum que o Tribunal enunciou como questão a decidir foi as únicas questões suscitada pela ora impugnante que se reconduzia ao único fundamento invocado pela Administração Tributária (AT) para emitir a liquidação, ou seja acessoriedade dos serviços de nutrição quando vendidos conjuntamente com serviços e ginásio

(viii) Não há, repita-se, no relatório de inspeção qualquer outro fundamento para a liquidação. E não foi suscitada pela ora Requerente qualquer outra a não ser ao transcrever decisões jurisprudenciais e diplomas legislativos.

(ix) Ora, salvo o devido respeito a referida decisão enferma de vícios de nulidade, e como tal enquadrável nos artigos 27.° e 28.° do RJAT.

(x) Desde logo, porquanto o Tribunal se pronunciou em excesso quanto à decisão que os serviços de nutrição não têm finalidade terapêutica quando prestados conjuntamente com os serviços de ginásio.

(xi) Na verdade, os fundamentos do RI que levaram às correções aritméticas fundaram-se na questão da acessoriedade dos serviços de nutrição quando estes eram vendidos conjuntamente com os serviços de ginásio e daí não beneficiarem da isenção nos termos do art.° 9° do CIVA.

(xii) Aliás, é esse o único "thema decidendum"

(xiii) Os relatórios de inspeção elaborados que deram azo ao PPA com o número de processo 549/2020-T é ipsis verbis o mesmo relatório arbitral produzido no processo que deu origem à decisão proferida nos autos 593/2020-T. Cfr. Doc. 3 e 4, e que ora se impugna.

(xiv) Os fundamentos de correção são exatamente os mesmos.

(xv) O fundamento de correção constante do relatório e nas suas conclusões baseia-se tão só na questão de acessoriedade das consultas de nutrição vendidas conjuntamente com os serviços do ginásio.

(xvi) Contudo, nos presentes autos o Tribunal para além de se pronunciar sobre tal questão, alargou o "thema decidendum" à questão de finalidade terapêutica das mesmas consultas.

(xvii) Ora, o PPA assentou na questão de acessoriedade na qual o relatório da Inspeção fundou as suas correções aritméticas e não na finalidade terapêutica, que a Impugnante também aflorou no seu PPA mas que não foi invocado como fundamento de correção (veja-se transcrição das alegações da requerente - páginas 4 e 5 da decisão que se impugna).

(xviii) Ou seja, a Impugnante no seu PPA pugnou que não estava em causa a questão de finalidade terapêutica das consultas de nutrição, mas tão só a acessoriedade.

(xix) Dúvidas não existem que o fundamento da correção foi o carácter acessório dos alegados serviços dietéticos e não a finalidade terapêutica dos mesmos.

(xx) Inclusivamente, o Tribunal considera a referida questão e conclui que "(...) estamos perante prestações de serviços autónomas, distintas e claramente independentes entre si" - página 66 da decisão (sublinhado nosso).

(xxi) Mas espante-se quando o Tribunal decide julgar parcialmente improcedente o pedido de anulação dos actos tributários de liquidação de IVA "por ausência de demonstração de que presidiu à realização de tais prestações de serviços uma finalidade terapêutica, ónus que impendia sobre a Requerente nos termos e em conformidade com o disposto no artigo 74.°, n.° 1 da LGT, mas também que a legalidade dos atos tributários se encontra corretamente fundamentada, do ponto de vista material, com base nessa falta de demonstração do fim terapêutico das prestações de serviços aqui em causa" - página 79 da decisão (sublinhado nosso).

(xxii) Conforme se tem vindo a reiterar, em causa estava apenas em discussão questão da acessoriedade até porque como resulta do RI a correção baseou-se na faturação de todos os serviços de nutrição vendidos com os serviços de ginásio ( códigos SDIET) e nunca na não efetividade desses serviços nem na qualidade desses serviços , aliás ficou provado que todos os serviços prestados pela Requerente na área da nutrição (tanto as consultas de nutrição efetuadas pelo código SDIET, como aquelas efetuadas pelo código SNUT), seguem o mesmo protocolo pelos mesmos paramédicos nutricionistas e não tinham qualquer diferença (conforme alínea DD da matéria dada como provada constante da folha 27 da Decisão): pelo que mal andou o tribunal a quo ao decidir com base em fundamentos não constantes do RI e que foram fundamento as notas de liquidação, sendo a decisão nula por excesso de pronuncia.

(xxiii) O Tribunal não pode, verificada a ilegalidade de um acto de liquidação, deixar de a declarar e substituir-se à Administração Tributária como forma de alterar o acto por esta praticado por um outro diferente com a fundamentação que adoptaria se a lei lhe atribuísse o poder de prosseguir o interesse público da cobrança de impostos (Cfr. Processo n.° 477/2020-T, que se junta como Doc. 5 cujo teor considera-se reproduzido para todos os efeitos legais).

(xxiv) Conforme resulta da jurisprudência e da legislação, compete ao Tribunal "a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de tributos" (Cfr. artigo 2.° do RJAT).

(xxv) Assim, por via do excesso de pronúncia, está a decisão arbitral ferida de nulidade nos termos do art.° 28° do RJAT, uma vez que a questão que se colocava perante o Tribunal Arbitral, que tinha por objeto "a declaração de ilegalidade do ato de liquidação tributária" (art.° 2° do RJAT), era de saber se estava ou não em sintonia com a Lei o entendimento da AT de que as consultas faturadas em conjunto com serviços de ginásio são partes acessórias deste e não a finalidade terapêutica das mesmas.

(xxvi) Também por excesso de pronúncia, a decisão da qual se recorre, anulou parcialmente as notas de liquidação ao considerar procedente o pedido subsidiário feito pela Recorrente e ao decidir que o Iva deveria ter sido liquidado por dentro e não como foi objeto.

(xxvii) A questão reside se não houve excesso de pronúncia no facto do tribunal arbitral anular parcialmente a liquidação.

Na verdade o Ac. do Pleno do STA no processo 10.04.2013 fixou jurisprudência no sentido afirmativo que a liquidação enquanto acto divisível é suscetível de anulação parcial.

(xxviii) Contudo restara saber se o tribunal arbitral tem ou não competência para anulação parcial da nota de liquidação.

(xxix) Nesses termos, acompanhamos a declaração de vencida e também várias decisões proferidas neste sentido em que é pacifico que a competência dos tribunais arbitrais está limitada aos pedidos de declaração de ilegalidade de atos tributários.

(xxx) Por outro lado, andou mal o Tribunal ao entender que o "thema decidendum" era a questão do fim terapêutico quando considerou provadas as conclusões do RI que assentavam na acessoriedade conforme excertos transcritos e também pelo fato de tal decisão estar em contradição com a matéria provada e quando decidiu diferentemente noutro processo fática e juridicamente igual .

(xxxi) Tendo em conta a matéria provada e a não distinção técnica e procedimental entre as consultas de nutrição vendidas, conjuntamente, com o pacote do ginásio e as consultas de nutrição avulsas, e tendo só havido correção às vendidas em pacote SDIET, nunca se poderia ter concluído que essas não tinham fins terapêuticos em contraposição com as vendidas avulsas, mesmo que hipoteticamente não sejam realizadas.

(xxxii) Vejamos, se o Tribunal considerou provado que "Todos os serviços prestados pela Requerente na área da nutrição são realizados da mesma forma e pelos mesmos paramédicos nutricionistas, nas respectivas consultas de nutrição, quer sejam outorgadas com os sócios através dos contratos de prestação de serviços dietéticos (duas consultas presenciais por ano) quer sejam vendidas isoladamente ou em pacotes de várias consultas., como pode o Tribunal considerar que não estão isentas e não beneficiam de isenção as consultas vendidas em pacote em contraposição com as vendidas avulso, se não pela via da acessoriedade, já que não existe qualquer outra distinção?

(xxxiii) Também por via da alínea c) do RJAT esta decisão está ferida de nulidade por contradição entre a matéria provada e a decisão.

(xxxiv) Admitindo que os vícios supra identificados não se verificam sempre existirá falta de fundamento e omissão de pronúncia quanto à legalidade dos juros compensatórios.

(xxxv) Vejamos, a impugnante invocou a existência de informação vinculativa sobre a mesma matéria (alínea LL) da matéria provada).

(xxxvi) Concluiu o Tribunal, ao reproduzir ipsis verbis tudo quanto a este propósito foi explicitado no Processo n.° 380/2020-T (que se junta como Doc. 7, cujo teor se considera reproduzido para todos os efeitos legais), que quanto à informação vinculativa página 52 da decisão: "Conclui-se que a factualidade que a informação assumiu como relevante é em tudo coincidente com a factualidade verificada na atividade da aqui requerente", e ainda mais à frente (na página 54), "E assim, deve-se concluir, que, em relação à Requerente a Autoridade Tributária atuou praticando os atos de liquidação impugnados, num sentido que é contrário à doutrina interpretativa veiculada peia mesma Autoridade Tributária através da informação vinculativa proferida no processo 9215".

(xxxvii) E, se assim poderá ser quanto às notas de liquidação, já não o poderá ser quanto aos juros compensatórios, sobre os quais o Tribunal não se pronunciou, nem fundamentou a sua posição apenas considerou o pedido improcedente quanto aos mesmos.

(xxxviii) Ora, conforme referido supra ficou provado que a impugnante atuou de acordo com a informação vinculativa sobre os mesmos fatos necessários para o enquadramento tributário (verificado na pág. 52 da decisão arbitral) pelo que nunca atendendo ao princípio da tutela da confiança poderiam serem liquidados juros compensatórios à mesma devendo ser declarada a ilegalidade das notas de liquidação .

Termos e que devera ser considerada procedente por provada a presente impugnação revogando-se a decisão arbitral.”


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O Digno Representante da Fazenda Pública (doravante Impugnado), devidamente notificado, optou por não apresentar contra-alegações.

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O Ilustre Magistrado do Ministério Público (IMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul, notificado nos termos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, aplicável ex vi artigo 27.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

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Foi o assegurado o contraditório das partes quanto ao parecer do DMMP, mantendo-se as mesmas silentes.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vêm os autos à conferência para decisão.

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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A decisão arbitral impugnada possui, na parte que, ora releva o seguinte teor:

“(…) II. THEMA DECIDENDUM:
22. Considera este Tribunal Arbitral Colectivo que o thema decidendum se reporta a saber:
22.1. Se a Requerida estava obrigada a seguir o entendimento administrativo sancionado na informação vinculativa n.º 9215, por despacho de 19.8.2015 do Subdirector-Geral do IVA, no que tange ao enquadramento em sede de IVA dos serviços dietéticos/nutrição realizados pela aqui Requerente?
22.2. Se as prestações de serviços realizadas pela Requerente aos seus Clientes, na parte referente aos serviços dietéticos/nutrição, devem ou não beneficiar da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9.º do CIVA?
22.3. Se a prestação de serviços da Requerente aos Clientes, no que a nutricionismo se refere, reveste autonomia em face da sua prestação de serviços aos Clientes no que à actividade
de ginásio se refere?
22.4. Qual o valor a tomar para base de cálculo do IVA a liquidar, ou seja, no pressuposto de que improcedem as pretensões anulatórias da Requerente relativamente aos actos tributários de IVA e JC sindicados, saber se o IVA se deveria retirar por dentro ou se, ao invés, o valor tributável relevante para efeitos de correcções deveria partir do valor das prestações de serviços de nutrição cuja isenção do n.º 1 do art.º 9º se deveria considerar inaplicável, fazendo-se acrescer ao mesmo a respectiva taxa de imposto?
22.5. A requerida actuou em litigância de má-fé? (…)
IV. DECISÃO:
27. Com relevo para a decisão são os seguintes os factos que se consideram provados:
A. O Grupo H…, no qual a Requerente se insere, existe actualmente em oito países e reúne mais de 275.000 sócios. Iniciou a sua actividade na Península Ibérica há 20 anos e no exercício de 2012 passou a integrar um grupo empresarial hoje denominado H… Portugal que é constituído por 16 empresas. Uma dessas empresas é a Requerente (Cfr. art.° 16° do PPA e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido).
B. A Requerente é uma sociedade anónima que tem por objecto a "Criação, promoção exploração de health clubs, gestão, formação e consultoria em desporto, manutenção física e bem estar, serviço de nutrição e outras atividades de saúde pública, incluindo tratamentos de fisioterapia, cedência de espaço de imóveis próprios ou alheios e serviços conexos; arrendamento, compra e venda de propriedades, Incluindo prédios e revenda dos adquiridos para esse fim, bem como a gestão, exploração e manutenção de imóveis; e ainda o comércio a retalho e de produtos médicos e ortopédicos em estabelecimentos especializados.” (Cfr. certidão permanente com o Código 0436-4302-4151, consultada em 17.8.2021 no sítio da internet seguinte: https://eportuaal.qov.pt/empresas/Services/Online/Pedidos.aspx?service:=CC P e ainda Relatório de Inspecção Tributária junto pela requerente como Documento n.° 2 e constante do PA).
C. A Requerente desenvolve a sua actividade societária no estabelecimento comercial (ginásio) que explora sob a insígnia H… Alvalade, no Estádio do S…, sito na Rua P…, Alvalade XXI, Pavilhão Multidesportivo em Lisboa. (Cfr. Ponto III.1.1.1, a fls. 14 do Relatório de Inspecção Tributária junto ao PA e artigo 18° do PPA).
D. No ginásio são colocadas à disposição dos sócios não apenas as instalações desportivas necessárias à prática da actividade física, mas, indo além da mera prática de exercício físico, proporciona aos seus clientes ainda outros serviços. O clube tem 4.130m2 e conta com ginásio, zona de treino funcional, 5 estúdios, uma piscina, saunas e banho turco, Zona de restauração, 2 gabinetes dedicados à Fisioterapia e 2 gabinetes de nutrição, (cfr. artigo 20° do PPA e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido);
E. A Requerente encontra-se registada no cadastro da Autoridade Tributária e Aduaneira com a atividade principal de “Outras actividades desportivas, N.E.” - CAE 93192), e com as seguintes atividades secundárias: i) outras atividades de saúde humana, N. E. (CAE secundário 1 - 86906); ti) institutos de beleza (CAE secundário 2 - 96022); iii) formação profissional (CAE secundário 3 - 85591) (Cfr. Ponto III.1.1.1, a fls. 14 [in fine] e 15 do Relatório de Inspecção Tributária junto ao PA e igualmente junto ao PPA como Documento n.° 2).
F. A Requerente é sujeito passivo de IVA e está enquadrada no regime normal de tributação, periodicidade mensal (Cfr. Ponto 11.3.1.2, a fls. 9 do Relatório de Inspecção Tributária junto ao PA e artigo 19° do PPA).
G. A Requerente dedica-se principalmente à actividade de ginásio e no exercício em causa prestou serviços de actividade física em ginásio (fitness), abrangendo um variado leque de aulas de grupo, treino personalizado, prestando ainda como actividade societária secundária serviços de estética, massagem, fisioterapia e nutrição (cf. artigo 20° do PPA e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido);
H. Os clientes da requerente que pretendessem aceder ao ginásio e usufruir dos serviços nele disponibilizados e de entre os quais os aqui em causa de nutrição ao abrigo do “Contrato de prestação de serviços dietéticos”, tinham de se tornar sócios do ginásio mediante a assinatura de contrato individual de adesão e proceder ao pagamento de uma “taxa de inscrição” e ao pagamento antecipado de uma mensalidade cujo valor é variável de acordo com o numero de frequências semanais e/ou serviços utilizados. (Cfr. Ponto III.1.1.1, a fls. 15 do Relatório de Inspecção Tributária junto ao PA).
I. A partir do ano de 2013, a Requerente, no âmbito da denominada campanha “move well, eat well e feel weli’’, passou a proporcionar aos seus sócios serviços de dietética e nutrição, mediante a subscrição de um contrato que se decidiu denominar “Contrato de Prestação de Serviços Dietéticos”. (Cfr. artigo 22° do PPA e ainda Considerando B) ínsito nas cópias dos contratos de prestação de serviços dietéticos que estão no Anexo 2 do Relatório de Inspeção junto aos autos pela Requerida no PA e igualmente junto pela Requerente como Doc. 2 anexo ao PPA);
J. Nem todos os sócios aceitaram a disponibilização dos serviços de nutrição. (Cfr. artigo 23° do PPA);
K. Pela celebração do “Contrato de Prestação de Serviços Dietéticos”, a Requerente obrigava-se a prestar serviços e aconselhamento dietético e nutricional, composto por duas sessões presenciais e dois acompanhamentos telefónicos anuais, a realizar por técnicos especializados, com vista à aplicação de conhecimentos de nutrição e dietética na saúde geral e na educação dos indivíduos, designadamente do domínio da promoção e tratamento e gestão de recursos alimentares. (Cfr. Cópias dos contratos de prestação de serviços dietéticos que estão no Anexo 2 do Relatório de Inspeção junto aos autos pela Requerida no PA e igualmente junto pela Requerente como Doc. 2 anexo ao PPA);
L. Como contraprestação pelos serviços de nutrição e dietética as partes acordavam o pagamento pelos sócios aderentes aos serviços de nutrição e dietética de 20,00 €, isento de IVA nos termos do art.° 9o do CIVA. (Cfr. Cópias dos contratos de prestação de serviços dietéticos que estão no Anexo 2 do Relatório de Inspeção junto aos autos pela Requerida no PA e igualmente junto pela Requerente como Doc. 2 anexo ao PPA);
M. Os sócios subscritores do “Contrato de Prestação de Serviços Dietéticos” viam aplicado um desconto comercial na mensalidade que se encontrava a ser paga pelo respectivo membro do clube referente à utilização das instalações desportivas. (Cfr. artigo 23° do PPA e ainda cópias dos contratos de prestação de serviços dietéticos que estão no Anexo 2 do Relatório de Inspeção junto aos autos pela Requerida no PA e igualmente junto pela Requerente como Doc. 2 anexo ao PPA e fls. 17 do RIT);
N. No ano a que se reportam os factos, ou seja, em 2016, esse desconto cifrava- se em 20,00 €, donde, rigorosamente coincidente com o valor da contraprestação fixada pelas partes para a disponibilização dos serviços de nutrição e dietética. (Cfr. artigo 23° do PPA e ainda cópias dos contratos de prestação de serviços dietéticos que estão no Anexo 2 do Relatório de Inspeção junto aos autos pela Requerida no PA e igualmente junto pela Requerente como Doc. 2 anexo ao PPA);
O. Sempre que os sócios pretendessem mais do que duas consultas de nutrição e dietética por ano, podiam adquirir consultas de nutrição, vendidas quer isoladamente, quer em pacotes de consultas, sendo as consultas prestadas pelos mesmos profissionais que prestam as consultas iniciais do contrato de prestação de serviços dietéticos. (Cfr. artigo 28° do PPA. Cfr. ainda RIT e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido);
P. Era ainda realizado o acompanhamento dos clientes através de e-mail, contabilizando-se estas como consultas realizadas (Cfr. Documento 6 junto ao PPA e ainda prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido);
Q. Os clientes podiam usufruir apenas da prestação de serviços de actividade física em ginásio sem adesão ao contrato de serviços dietéticos, donde, sem a disponibilização das consultas de nutrição e acompanhamento nutricional. O inverso era igualmente verdadeiro, i.e., era possível aceder aos serviços de nutrição sem se ser sócio da requerente, pesa-embora em condições financeiras menos favoráveis. (Cfr. artigo 29° do PPA. Cfr. ainda RIT e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido);
R. A expressão material dos serviços de nutrição contratados com quem não tinha o estatuto de sócio da Requerente era mínima ou nula. (Cfr. Prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido);
S. Os serviços de nutrição e dietética eram prestados em gabinetes individualizados, próprios para o efeito. Nesses gabinetes apenas eram realizadas consultas de nutrição, não servindo os mesmos para qualquer outro fim. Encontram-se ali máquinas com medidores de gordura corporal, ou seja, balanças de bioimpedância (tanitas). (Cfr. artigo 24° e 25° do PPA e Doc. 4 junto ao PPA pela Requerente);
T. A Requerente disponibilizou aos seus clientes os serviços na área da nutrição através de paramédicos, nutricionistas, que integram o seu quadro de pessoal. No exercício de 2016, a requerente tinha ao seu serviço 3 nutricionistas, a saber: i) I… Real; ii) I…; e iii) M…. Cada uma delas laborava segundo um período normal de trabalho semanal de 40 horas e tinham, igualmente cada uma delas, como remuneração base o montante de 782,91 €, ao qual acresciam o subsídio de refeição de 134,74 €e o subsídio por turno de 117,39 €. (Cfr. Doc. n.° 5 junto ao PPA pela Requerente);
U. A nutricionista, Dr.a I…, encontra-se inscrita na Ordem dos Nutricionistas, com o n.° de cédula profissional 0..; a nutricionista, Dr.a I…, encontra-se inscrita na O.N. com o n.° de cédula profissional 2…; e, finalmente, a nutricionista, Dr.a M…, encontra-se inscrita na O.N. com o n.° de cédula profissional 2… (cf. site da Ordem dos Nutricionistas in httDs://www.ordemdosnutrícionistas.pt/reaistoNacional.php , consultado em 28.5.2020).
V. O grupo H...em Portugal tem programas de estágios remunerados com base num protocolo firmado com a Ordem dos Nutricionistas, ao abrigo do qual são recebidos estagiários nos clubes da H...para aí completarem a sua formação. A Requerente recebeu, em 2019, uma estagiária que nas suas instalações cumpriu ao abrigo do protocolo com a O.N. o respectivo estágio profissional. A Requerente, em 2013, proporcionou a uma outra estagiária um estágio profissional no âmbito da Portaria n.° 225-A/2012, de 31 de Julho, alterada pela Portaria n.° 65-B/2013, de 13 de Fevereiro, que regulamentam a Medida Passaporte Emprego 0382/IE/13. O estágio iniciou em 15.11.2013 e terminou em 14.11.2014. à data a que se reportam os factos a Requerente não teve ao seu serviço qualquer estagiária. (Cfr. artigo 35° do PPA e Doc. n.°7 ali junto);
W. Nesse ano de 2016, o número médio de sócios da Requerente situou-se bem acima dos 3.500. (Cfr. artigo 31° do PPA);
X. Em 2016, a Requerente realizou 4.622 consultas de nutrição. Destas 4.077 (1.530 consultas denominadas de base presenciai e 2.547 consultas denominadas base send mail - as previstas no contrato de prestação de serviço dietéticos). Realizou ainda 545 consultas Premium. (Cfr. Documento 6 junto ao PPA);
Y. As consultas Premium representam 11,7% do total das consultas realizadas pela Requerente.
Z. Tendo a Requerente só realizado 1530 consultas denominadas de base presencial, há consultas que não foram realizadas, mas tão-só disponibilizadas, não tendo os respectivos beneficiários fruído das mesmas. (RIT e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido).
AA. Os serviços contratualizados com a outorga dos contratos de prestação de serviços dietéticos são facturados mensaimente a todos os signatários daqueles vínculos, independentemente de usufruírem ou não dos serviços contratualizados.
BB. A mera disponibilização dos serviços leva à facturação dos mesmos independentemente da sua efectiva realização. (RIT e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido).
CC. A prestação de serviços de nutrição era disponibilizada, podendo ser usufruída pelos clientes no momento que lhes fosse mais conveniente (RIT e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido).
DD. Todos os serviços prestados pela Requerente na área da nutrição são realizados da mesma forma e pelos mesmos paramédicos nutricionistas, nas respectivas consultas de nutrição, quer sejam outorgadas com os sócios através dos contratos de prestação de serviços dietéticos (duas consultas presenciais por ano) quer sejam vendidas isoladamente ou em pacotes de várias consultas.
EE. Alguns sócios subscreveram contratos de prestação de serviços dietéticos e fruíram as duas consultas de nutrição a que tinham direito nos termos daquele vínculo contratual (consultas base) e adquiriram posteriormente consultas adicionais de nutrição (consultas Premium). (Cfr. artigo 73° da PPA e Doc. n.° 10 anexo ao PPA);
FF. A disponibilização dos serviços de nutrição visa possibilitar aos clientes da Requerente melhor alcançar os objectivos que têm ao aderir ao ginásio (i.e., aos serviços de ginásio - fitness), a perda de peso é o principal desses objectivos e o serviço prestado pelo ginásio - fitness - faz sentido em conjugação com serviços de nutrição e de treino personalizado (Cfr. RIT e prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido);
GG. A Autoridade Tributária e Aduaneira iniciou e dirigiu procedimento inspectivo externo à Requerente, de âmbito parcial, IRC e IVA, fundado na Ordem de Serviço n.° 01201703466, tendo sido elaborado o correspondente Relatório de Inspeção Tributária (RIT) que consta no processo administrativo e ainda do PPA como Doc. n.° 2.
HH. Por Ofício da Requerida n.° 00010528, de 1.7.2020, foi a Requerente notificada do RIT no qual aquela concluiu que as prestações de serviços dietéticos realizadas pela impetrante, enquanto atividade de aconselhamento nutricional disponibilizada aos utentes que subscrevem um contrato de adesão ao ginásio, não reúnem as condições para beneficiar da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.° do Código do IVA, por não visarem “diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde” dos sócios, devendo ser consideradas acessórias em relação à prestação de serviços principal, constituída pela utilização das instalações desportivas (ginásio) ( Cfr. RIT que integra o Processo Administrativo e ainda do PPA como Doc. n.° 2).
II. O RIT, fundamentando os actos de liquidação entretanto emergentes e aqui sindicados, diz: III. - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL: 111.1- EM SEDE DE IVA: III. 1.1 - Do IVA não liquidado - (prestação de serviços dietéticos): III.1.1.1 Dos Factos: O SP tem como objeto social o exercício de gestão e exploração de health clubs, atividade, essa, que desenvolve no ginásio que explora sob a insígnia H...Alvalade, no Estádio do S…, sito na Rua P…, Alvalade XXI, Pavilhão Multidesportivo, Lisboa. Atualmente, nesse estabelecimento são colocadas à disposição dos sócios, não apenas as instalações desportivas necessárias à pratica de atividade física, mas também uma serie de outras valências, das quais os sócios podem usufruir caso estejam interessados, ou seja, para além da atividade principal (CAE), o SP desenvolve uma serie de atividades secundarias, a saber:

Quem pretender ser cliente daquele ginásio e usufruir dos serviços neles disponibilizados, tem de se tomar socio do ginásio explorado pelo SP mediante a assinatura de um contrato individual de adesão - Anexo 2, páginas _ a_ proceder ao pagamento de uma «taxa de inscrição» e ao pagamento antecipado de uma mensalidade cujo valor é variável de acordo com o número de frequências semanais e/ou serviços utilizados. Por outro lado, e a partir de dados recolhidos em acções inspectivas anteriores foi possível verificar que a partir de 2013, nos atos de inscrição como sócios, passou a haver a possibilidade dos clientes passarem a subscrever um «Contrato de Prestação de Serviços Dietéticos» (embora também possa ser subscrito à posteriori). Essa possibilidade é, contudo, extensível aos sócios que já se encontravam, àquela data, com contratos em vigor. Logo apos o início da Acão de inspecção, notificamos o sujeito passivo em 27/11/2019 - Anexo 3, solicitando o envio de diversos elementos e esclarecimentos [...]. Em resposta a esta notificação, o sujeito passivo enviou, em 27 de Dezembro de 2019 - Anexo 4 de duas páginas, os primeiros elementos de entre os solicitados, tendo-se procedido à respetiva analise, verificando-se a conformidade entre os ficheiros, as declarações periódicas e a contabilidade. Por outro lado, constatamos que a natureza das vendas e das prestações de serviços (facturação) se distribui, resumidamente, por três grandes áreas de actuação, a saber: > MSI - Facturação (anual); > Sporstudio (SS) - Loja (anual); > Sporstudio (GE) - Gestão de Espaços (anual);
> Agresso - Facturação intra-grupo. Da análise a todos estes ficheiros, concluímos sobre as actividades que o sujeito passivo desenvolve, bem como os respectivos enquadramentos em sede de IVA. 0 ficheiro «MSI-Facturação (anual)» engloba a disponibilização das instalações e equipamentos desportivos para a prática de exercício físico - Ginásio (atividade principal) - atividade sujeita a IVA e dele não isenta - e algumas outras atividades associadas, tais como a Nutrição (NUT) - atividade isenta de IVA. A título de exemplo, solicitámos algumas das faturas referentes às mensalidades (Anexo 2) e verificámos que nas faturas emitidas aos clientes que subscreveram o “Contrato de prestação de serviços dietéticos” para além da rúbrica “Utilização das instalações desportivas” (atividade sujeita e não isenta), podem surgir outras rubricas, tais como “Personal Training" (também atividade sujeita e não isenta). Contudo, a esta ou estas, surge sempre associada a rubrica “Prestação de Serviços Nutrição” à qual correspondem códigos tais como “SDIET”, “SIDIET1” e SIDIETB, consideradas pelo sujeito passivo como isentas de IVA nos termos da alínea 1), do artigo 9° do CIVA. Acontece que nas referidas faturas (as das mensalidades de quem subscreveu o contrato de prestação de serviços dietéticos), para além das duas rubricas - a referente à utilização das instalações desportivas e a referente à prestação de serviços dietéticos-surge, ainda, uma terceira rubrica. Trata-se de um desconto por subscrição deste serviço, ou seja: - “Utilização das instalações desportivas” (sujeita a IVA à taxa normal - 23%); - “Prestação de serviços dietéticos” (isenta de IVA nos termos da alínea 1) do Art.° 9.° do CIVA) Uma terceira rúbrica: - “Desconto por subscrição de acompanhamento dietético” (sujeito a IVA à taxa normal - 23%). Note-se que o SP sujeita o desconto à taxa normal, quando o faz depender da subscrição de um serviço que considera isento e quando ambos os valores são exatamente iguais o que, na prática, transforma este serviço num serviço gratuito. Ora, como se constata, o valor da prestação de serviços dietéticos, incluído na facturação, é considerado isento pelo sujeito passivo, nos termos da alínea 1) do art.° 9.° do CIVA, enquanto o desconto, de montante igual ao do serviço dietético, é objeto de regularização de IVA a favor do sujeito passivo à taxa de 23%, donde decorre que o valor de imposto a ser entregue ao Estado, proveniente da facturação ao cliente da atividade principal desenvolvida (utilização de instalações desportivas), sofre uma diminuição por via da regularização na fatura a favor do sujeito passivo, no valor de 23% aplicado ao montante faturado com isenção: “Prestação de serviços dietéticos”. Através da respetiva facturação, constata-se que o SP entende que todos os serviços que presta na área da nutrição se encontram isentos de iVA. Não é esse, contudo, o nosso entendimento. Efetivamente, na área da nutrição, o sujeito passivo desenvolve a sua atividade em duas vertentes: - Prestação de Serviços Dietéticos (SDiET); - Consultas de Nutrição, isoladas, ou em packs que podem ir até 6 consultas (vários códigos NUT). Se o próprio SP faz esta distinção (SDIET e NUT) é porque esses dois códigos encerram conteúdos diferentes e, de facto, de toda a análise efectuada, apurámos que o código NUT se refere a consultas de nutrição, enquanto o código SDIET se refere, unicamente, a “Prestação de Serviços Dietéticos”. Esta “Prestação de Serviços Dietéticos” surge sempre associada à “Utilização das Instalações desportivas”, constituindo, assim, uma atividade acessória a esta. A prová-lo, estão os “Contratos de Prestação de Serviços Dietéticos” (Anexo 2) de cujas clausulas, respetivamente, primeira e terceira, se retira o carácter “acessório” desta vertente dos serviços dietéticos, relativamente ao ginásio, já que o acesso à mesma só é “permitido” enquanto durar o “Contrato de Adesão»” (contrato para “Utilização das instalações desportivas” - Ginásio) (Anexo 2). Cláusulas 1.a e 3.a:
Carácter acessório:
“Pelo presente a primeira obriga-se a prestar serviços de aconselhamento dietético e nutricional, composto por duas sessões presenciais e dois acompanhamentos telefónicos anuais (...) - (in Clausula 1.a); “O termino do contrato de adesão referente à utilização de atividades desportivas implica automaticamente a cessação do presente contrato (...) - (in Clausula 3.a - ponto 3.3)
Note-se que é, exatamente, no carácter acessório destas prestações de serviços que focamos a nossa posição e não na falta de cumprimento dos requisitos para a prática das mesmas, uma vez que, nessa matéria, solicitámos elementos e pudemos assim comprovar a conformidade com os requisitos exigido s no Decreto-Lei n.° 261/93, de 24 de julho. Assim, é sobre a demonstração deste carácter acessório da “Prestação de serviços dietéticos” (por contraponto com as consultas de nutrição) e sobre os respetivos enquadramentos em sede de IVA, que nos iremos debruçar no ponto que se segue. III.1.1.2. Dos fundamentos das correcções meramente aritméticas: III.1.1.2.1 Enquadramento fiscal: III.1.1.2,1.1 Direito comunitário: > A Diretiva do IVA estabelece, no n.° 1 do seu artigo 132°, a isenção de determinadas prestações de serviços na área da saúde. > Beneficiam de isenção, nos termos da alínea b), “a hospitalização e a assistência medica, e bem assim as operações com elas estreitamente relacionadas, asseguradas por organismos de direito publico ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência medica e de diagnostico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos”.
> Por seu turno, a alínea c) isenta “as prestações de serviços de assistência efetuadas no âmbito do exercício de profissões medicas e paramédicas, tal como definidas pelo Estado Membro em causa”.
> A este respeito, o TJUE (Tribunal de Justiça da União Europeia) declarou que o conceito de prestações de serviços de assistência medica que figura na alínea c), do n.° 1, do artigo 132° da Sexta Diretiva 2006/112/CE, do Conselho de 28 de novembro de 2006, visa as prestações que tenham por finalidade “diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar doenças ou anomalias de saúde” (acórdão de 06-11-2006, Dornier, Processo C-45/01).
> A acepção de que a isenção prevista na alínea c), do no 1, do artigo 132o da diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de novembro de 2006 opera independentemente da forma jurídica do sujeito passivo que fornece as prestações medicas ou paramédicas, isto é, tanto é aplicável às pessoas singulares como às pessoas coletivas, decorre necessariamente da interpretação desta disposição imposta pelo TJUE. > No acórdão de 10 de Setembro de 2002, proferido no processo C-141/00 (caso Kugler, Colet. P. I- 6833, n.°26) é afirmado, a respeito dessa disposição comunitária, que a mesma tem um carácter objetivo, definindo as operações isentas em função da natureza dos serviços prestados, sem mencionar a forma jurídica do prestador, pelo que basta tratarem-se de prestações de serviços médicos ou paramédicos e que sejam fornecidas por pessoas que possuam as qualificações profissionais exigidas.
>Segundo a jurisprudência do TJUE, nomeadamente o referido Acórdão de 10 de setembro de 2002, proferido no processo c-141/00, referente ao caso Kugler, as alíneas b) e c), do n.° 1, do artigo 132°, da Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de novembro de 2006, embora visem regular a totalidade das isenções aplicáveis às prestações medicas em sentido estrito, têm âmbitos muito distintos. Assim, a alínea b), do no 1, do artigo 132 da Diretiva isenta todas as prestações efetuadas em meio hospitalar.
> Já a alínea c), do n.° 1, do artigo 132° da Diretiva, destina-se a isentaras prestações medicas fornecidas fora desse âmbito, tanto no domicilio privado do prestador como no domicilio do doente, ou em qualquer outro lugar, ou seja, aplica-se a prestações efetuadas fora de organismos hospitalares e no quadro de uma relação de confiança entre o paciente e o prestador de serviços, relação que normalmente tem lugar no consultório deste último.
III.1.1.2.1.2 Direito interno
> Aquelas isenções previstas nas alíneas c) e b), do n° 1, do artigo 132° da Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, foram transpostas para o Direito interno:
- Para a alínea 1), do artigo 9.° do CIVA (tendo por base a alínea c), do n.° 1, do artigo 132° da Diretiva 2006/112/CE) - FORA DE MEIO HOSPITALAR
- Para a alínea 2), do artigo 9.° do CIVA (tendo por base a alínea b), do n.° 1, do artigo 132.° da mesma Diretiva 2006/112/CE). - EM MEIO HOSPITALAR
>Na sequência dessa transposição, a alínea 1) do artigo 9° do CIVA, isenta do imposto, “As prestações de serviços efetuadas no exercício das profissões de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas.” - FORA DE MEIO HOSPITALAR
> A alínea 2, do mesmo artigo prevê ainda estarem isentas de imposto, "As prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estreitamente conexas efetuadas por estabelecimentos hospitalares, clinicas, dispensários e similares”.
> Daqui se retira que as isenções previstas nas alíneas 1) e 2), do artigo 9° do CIVA, respeitam a “atividades que tenham por objeto diagnosticar, tratar e, de possível, curar as doenças ou anomalias de saúde”.
> Ambas se aplicam independentemente de os serviços serem prestados por uma pessoa singular ou coletiva, assim como da finalidade lucrativa ou não do exercício dessas atividades.
> A alínea 2), do artigo 9.° do CIVA, destina-se a isentar os serviços de assistência efetuados no meio hospitalar.
> O sujeito passivo isenta as suas atividades de prestação de serviços dietéticos com base na alínea 1) do artigo 9.° do CIVA (fora do meio hospitalar), conforme se pode verificar pela inscrição em rodapé nas respetivas faturas (Anexo 2), pelo que nos vamos abster de dissecar aqui o conceito de estabelecimento hospitalar, dado não se aplicar a esta situação.
> Assim sendo, passamos a analisar a isenção aplicada pelo sujeito passivo à prestação de serviços de nutrição, com base na alínea 1) do artigo 9.° do CIVA.
> Ora estabelece a alínea 1) do artigo do CIVA que “estão isentas as prestações de serviços efetuadas no exercício das profissões de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas”.
> Uma vez que não existe no CIVA um conceito que defina o que são atividades paramédicas, teremos que nos socorrer de legislação avulsa para proceder ao seu enquadramento:
- Decreto-lei 261/93, de 24 de julho, que, basicamente, define os requisitos académicos exigidos para o exercício da função e
- Decreto-lei 320/99, de 11 de agosto, mais especificamente o n.° 1 do seu artigo 3.°, que refere o conteúdo funcional que terá de, necessariamente, compreender a “realização das atividades constantes do anexo ao já referido Decreto-Lei 261/93, de 24 de julho, tendo como matriz a utilização de técnicas de base científica com fins de promoção da saúde e de prevenção, diagnostico e tratamento da doença, ou de reabilitação. ” (dessa lista consta, designadamente, a atividade de «dietista»).
> Ainda a propósito do conceito de prestação de serviços médicos, previsto na alínea 1) do artigo 9.° do CIVA. importa relembrar que o Acórdão do TJUE, de 14 de setembro de 2000, Processo 384/98, considera como tais as que consistam em “prestar assistência a pessoas, diagnosticando e tratando uma doença ou qualquer outra anomalia de saúde’’ (Processo n.° 3251, despacho do SDG dos Impostos, substituto legal do Diretor- Gerai, em 2012-06- 28).
> E continua: “Tal significa que as prestações de serviços que não tenham este objetivo terapêutico (diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde) ficam excluídas do âmbito de aplicação da isenção, sendo sujeitas a imposto e dele não isentas.” (sublinhado nosso)
> Ora a isenção aqui aplicada à Prestação de Serviços Dietéticos, com base na alínea 1) do artigo 9.° do CIVA, não é lícita por não se tratar, efetivamente, de consultas de nutrição, procuradas pelo utente em razão de alguma necessidade que sinta nessa matéria, mas tão-só a «disponibilização» de um serviço com características de aconselhamento ao utente o qual apenas ocorre no caso de o utente «procurar» esse serviço. Caso não o procure, por dele não sentir necessidade, é-lhe igualmente faturado, nos termos em que já analisámos.
> Tal significa que as prestações de serviços que não tenham tal objetivo terapêutico, mesmo que efetuadas por paramédicos devidamente habilitados para o efeito, encontram-se excluídas do âmbito de aplicação da isenção. Enquadram-se aqui as atividades de mera elaboração de dietas integradas em planos alimentares. (Lembramos que o contrato prevê apenas «duas sessões presenciais» (e não consultas) e “dois acompanhamentos telefónicos anuais”, os quais surgem designados por “aconselhamento dietético”).
> De facto, se alguém necessitar de uma intervenção terapêutica ao nível nutricional, procurará um profissional nessa área, não se inscreverá num ginásio, isto é, o propósito da frequência de um ginásio (ou health club) não será, certamente, o de ser consultado por um nutricionista.
> A prová-lo está o facto de esse serviço ser faturado mensalmente a todos os utentes, sem excepcão. independentemente de usufruírem ou não da referida consulta, significando isso que todos os utentes veem uma parte da mensalidade que pagam pela frequência do ginásio estar sujeita a IVA à taxa normal e outra parte dessa mensalidade estar isenta de IVA, quando a generalidade desses utentes, durante o mês a que essa fatura respeita, não tem qualquer contacto com o nutricionista (embora lhe tenha sido informado que existe um ao seu dispor).
> Assim, a facturação da prestação de serviços de nutrição não beneficia da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9° do Código do IVA, estando sujeita a tributação nos termos gerais do CIVA, uma vez que os serviços de aconselhamento nutricional, disponibilizados em complemento da atividade física, não se enquadram no conceito de prestações de serviços médicos nem visam a assistência medica, diagnostico, tratamento de doenças ou quaisquer anomalias de saúde.
> Ora não sendo aplicável a isenção prevista na alínea 1) do art.° 9° do CIVA, daqui resulta que não pode ser separado na fatura a prestação de serviços de ginásio, da prestação de serviços de nutrição, uma vez que estes últimos fazem parte da prestação de serviços do ginásio, devendo-lhe ser aplicada a liquidação do imposto à taxa normal.
> Efetivamente, o serviço de nutrição é um serviço acessório da prestação de serviço principal que constitui o serviço de ginásio, nos termos a seguir desenvolvidos.
Prestação principal vs acessória
> Decorre do espírito da redacção do artigo 2.°, n.° 1, c) da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, que cada prestação de serviços deve ser normalmente considerada distinta e independente e de que a prestação constituída por um único serviço, no plano económico, não deve ser artificialmente decomposta para não alterar a funcionalidade do IVA.
> Na esteira deste entendimento vem a jurisprudência comunitária confirmar que uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar de melhores condições do serviço principal prestado. Assim, quando existem prestações de serviços que visam melhorar as finalidades prosseguidas pelos ginásios, tornam-se susceptíveis de constituir operações «puramente acessórias» ou «estreitamente conexas».
Este conceito resulta da jurisprudência comunitária nos seguintes acórdãos:
- Acórdão de 22 de outubro de 1998 “T.P.Madgett, R.M, Baldwin e The Howden Court Hotel”, Processos apensos C-308/96 e C-94/97, onde o Tribunal considerou que poderia haver prestações que, embora relacionadas com a prestação principal, “não constituem (...) um fim em si, mais um meio de beneficiar das melhores condições do serviço principal.”, concluindo nesse contexto que se trata de “prestações (...) puramente acessórias relativamente às prestações [efetuadas a título principal.)”.
- Acórdão de 25 de fevereiro de 1999, “Card Protection Plan Ltd”, Processo C-349/96, através do qual o TJCE firmou o entendimento de que “uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar nas melhores condições do serviço principal do prestador»”
- Acórdão de 27 de setembro de 2012, “Fieid Fisher Waterhouse LLP”, processo C- 392/11, o Tribunal de Justiça declarou que se está em presença de uma prestação única quando uma ou varias prestações constituem uma prestação principal e a outra ou as outras prestações constituem uma ou varias prestações acessórias, a que se aplica o tratamento fiscal da prestação principal. Em particular, uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si mesmo, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador. Neste sentido, vide os seguintes acórdãos: a) CPP - Processo n.° C-349/96, Colet, p. 1-973, n.° 30, de 25 de Fevereiro de 1999; b) Part Service, C-425/06, Colet, p. i-897, n.° 52 de 21 de Fevereiro de 2008; c) Bog e outros, Processos n.°s C-497/09, C-499/09, C-501/09 e C-502/09, Colet, p. 1-1457, n.° 54, de 10 de Março de 2011).
- Acórdão de 17 de Janeiro de 2013, “BGZ Leasing Sp.z o.o” Processo C-224/11, onde se refere que está “em causa uma operação única, nomeadamente, quando dois ou vários elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo ao cliente estão tao estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria um carácter artificial” e que “a operação constituída por uma única prestação no plano económico não deve ser artificialmente decomposta para não alterar a funcionalidade do sistema do IVA”. Continua, ainda, referindo que “para determinar se as prestações fornecidas constituem várias prestações independentes ou uma prestação única, importa averiguar os elementos característicos da operação em causa», designadamente «uma determinada conexão entre si”.
Ainda segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, designadamente no n.° 30 deste acórdão que se vem referindo (processo C-224/11), “uma prestação é considerada acessória em relação a uma prestação principal, nomeadamente, quando não constitua para a clientela um fim em si, mas sim um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador”.
Este acórdão é particularmente relevante, na medida em que reforça a ideia de que, para determinar se as prestações fornecidas constituem várias prestações independentes ou uma prestação única, importa averiguar os elementos característicos da operação em causa.
III.1.1.3 Da análise dos factos
No âmbito da presente Ordem de Serviço, e como já foi referido, verificou-se que nas faturas emitidas pelo sujeito passivo aos seus clientes (os quais efetuam contratos de adesão e, acessoriamente, contratos de prestação de serviços dietéticos), para além da rubrica “Utilização das instalações desportivas” (atividade sujeita), podem surgir outras rubricas, tais como “Personal Training” ou “Ginástica em Grupo” (atividade também sujeita), contudo, surge sempre associada a rubrica “Prestação de Serviços Dietéticos”, à qual correspondem códigos tais como «SDIET», «SDIET1», consideradas pelo sujeito passivo como isentas de IVA nos termos da alínea 1), do artigo 9.° do CIVA. Surge, ainda, uma terceira rúbrica: “Desconto por subscrição de acompanhamento dietético»” (sujeito a IVA à taxa normal - 23%). Ainda tendo em conta o enquadramento fiscal dos serviços de dietética e nutrição (Pontos lll.1.1.2.1.1/2 - Comunitário e Interno), é de salientar que a atividade de “Dietética”, não obstante estar prevista no ponto 5 da lista anexa ao D.L n.° 261/93 de 24.07, esse facto determina, tao só, que se trata de uma atividade paramédica cuja isenção está prevista na alínea 1) do artigo 9.° do CIVA, desde que o seu exercício tenha como objetivo terapêutico diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar (génese da alínea c) do artigo 132.° da diretiva do IVA que, por transposição, deu origem à alínea 1) do artigo 9.° do CIVA, esta sim, determinante das condições de aplicabilidade de isenção de IVA em matéria de prestação de serviços de saúde).
Assim sendo, é determinante para a aplicação da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.° do CIVA, que estejam em causa serviços que se consubstanciem na administração direta dos cuidados de saúde ao utente, pressupondo que os mesmos sejam efetivamente realizados. Caso os serviços não se insiram no conceito de prestações de serviços médicos definido na jurisprudência comunitária, ou seja, se tais serviços não tiverem em vista a assistência a pessoas, a elaboração de diagnósticos e o tratamento das doenças ou de qualquer anomalia de saúde, mas apenas a disponibilização do direito de usufruir de um conjunto de serviços (nos quais se podem inserir os serviços médicos ou paramédicos), os mesmos ficam afastados do campo de aplicação da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9° do CIVA, configurando operações sujeitas a imposto e dele não isentas, passíveis de tributação à taxa normal prevista no artigo 18° do CIVA.
Ora, de facto, a referência, na fatura, à prestação de serviços médicos ou paramédicos como fazendo parte do valor de uma mensalidade previamente contratualizada, independentemente de os mesmos serem prestados, ou não, demonstra que não estamos perante serviços prestados no âmbito da assistência medica.
Da análise a diversos ‘‘Contratos de Adesão’’ e “Contratos de Prestação de Serviços Dietéticos” (Anexo 2) se retira, designadamente a partir das suas clausulas primeira, terceira e quinta, que o acesso aos serviços dietéticos só é possível enquanto existir o contrato de adesão para a utilização das instalações desportivas. De facto, e não obstante a cláusula quinta estabelecer que a extinção do contrato de prestação de serviços dietéticos não implica a anulação do contrato de adesão para a utilização das instalações desportivas, nem qualquer alteração às condições subscritas pelo utente, já o inverso, ou seja, o fim do contrato de adesão referente à utilização de atividades desportivas implica automaticamente a cessação de contrato de prestação de serviços dietéticos, o que confere um carácter acessório à prestação de serviços em causa, uma vez que a mesma nunca está dissociada do contrato de adesão que tem em vista a utilização das instalações desportivas (ginásio).
Ora, uma prestação é considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua, para a clientela, um fim em si mesmo, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador. Assim, considerando a analise efetuada à atividade efetivamente exercida pela entidade, nomeadamente por via da analise dos contratos, da facturação e face aos critérios enunciados no presente relatório sobre o enquadramento fiscal das operações praticadas, considera-se que as consultas de nutrição “avulso”, faturadas diretamente ao utente, deverão ser consideradas isentas de IVA, nos termos da alínea 1) do artigo 9.° do CIVA, enquanto os serviços dietéticos disponibilizadas aos utentes, faturados enquanto uma rubrica da fatura referente à mensalidade do ginásio não merecem acolhimento na isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.° do CIVA, por se tratar de uma prestação de serviços acessória da prestação de serviços de ginásio, sendo de lhes aplicar o tratamento fiscal da prestação principal.
Fica assim demonstrado o carácter acessório da “Prestação de serviços dietéticos” (identificada pelo sujeito passivo por diversos códigos como; «SDIET») enquanto atividade de aconselhamento nutricional disponibilizada aos utentes que subscrevem um contrato de adesão ao ginásio, em oposição às consultas de nutrição, efetivamente prestadas por profissionais especializados. Estas consultas são adquiridas pelos utentes, isoladamente ou em pacotes que podem ir até 6 consultas, sendo que, nestes casos, estamos perante situações que visam, claramente, “diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde» daqueles sócios do sujeito passivo que sentem fragilidades ou mesmo problemas ao nível físico que podem estar relacionados com questões nutricionais e de alimentação e que recorrem à compra deste serviço que lhes é faturado através do código «NUT» ou variantes do mesmo, conforme o número de consultas adquiridas.
Assim, o sujeito passivo deveria ter procedido à liquidação de IVA sobre a “Prestação de Serviços Dietéticos” (códigos “SDIET”), uma vez que, relativamente às mesmas - e tao só a essas - não se mostram reunidas as condições para beneficiar da isenção prevista na alínea 1) do art.° 9.° do CIVA.
III.1.1.4 Das propostas de correcção (ao IVA não liquidado)
Como já foi referido ao longo deste relatório, a nossa análise baseou-se nos elementos e esclarecimentos que nos foram facultados.
Para determinação do valor a corrigir, em sede de IVA, resultante da não consideração da “Prestação de serviços dietéticos” como atividade isenta nos termos da alínea 1) do artigo 9.° do CIVA, foi trabalhado, o ficheiro “ALV III f) Prest Serv 2016»“ evidenciando-se os códigos dos artigos relativos àquela prestação de serviços (códigos «SDIET»). Estes ficheiros incluem as mensalidades pagas pelos utentes peia utilização das instalações desportivas e serviços secundários relacionados.
[...]
Relembramos que, por vezes, ao invés do Artigo: “SDIET” surgem designações tais como: “SDIET1”, ou outras, todas elas significando “Prestação de Serviços Dietéticos”.
De tudo o exposto, elaboramos os quadros que se seguem, os quais servem de base às correcções propostas:
(1) - Valores retirados do ficheiro SAFT da facturação MSI fornecido pelo sujeito passivo
* A taxa de IVA de 23%, nos termos do art.° 18.° do CIVA, tendo sido calculado imposto a liquidar documento a documento (fatura a factura), estando os cálculos que serviram de base ao quadro supra constantes de ficheiro informático anexo (anexo 5).
JJ. O ponto lll. 1.2 do RIT, a fls. 26, tem por epígrafe: “Do IVA dedutível nos Inputs (Prestação de Serviços Dietéticos)”. Depois de ali se discorrer sobre o direito à dedução em sede de IVA e de se explicitar a metodologia de cálculo do IVA dedutível levada à prática pelo sujeito passivo, para o exercício de 2016, foi apurado IVA dedutível adicional a favor da Requerente (ligado à realização das actividades de nutrição e que no entender da AT não podiam beneficiar da isenção de IVA prevista no n.° 1 do art.° 9º do CIVA, donde, tributadas e não isentas, conferindo tal possibilidade de dedução do imposto suportado a montante para a sua realização) que se cifrava em 2.506,98 €, importância que foi deduzida ao montante da proposta de correcção do IVA não liquidado de 150.356,93 €, cifrando-se a correcção global ao valor do IVA devido pela Requerente no montante líquido de 147.849,95 €. (Cfr. RIT que integra o Processo Administrativo e ainda do PPA como Doc. n.° 2).
KK. Na sequência da inspecção, foram emitidas e notificadas à Requerente as seguintes liquidações adicionais (imposto e juros compensatórios), que perfazem no total 170.128,42 €, sendo o IVA de 147.850,03 e os Juros Compensatórios de 22.278,39 €, com data limite para pagamento voluntário, todas, até 31.8.2020: - Liquidação n.° 2020 032501156, e respetiva demonstração de Liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/01; - Liquidação n.° 2020 032501162, e respetiva demonstração do liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/02; - Liquidação n.° 2020 032501171, e respectiva demonstração do Liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/03; - Liquidação n.° 2020 032501179, e respetiva demonstração de Liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/04; - Liquidação n.° 2020 032501188, e respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/05; - Liquidação n.° 2020 032501191, e respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/06; - Liquidação n.° 2020 032501209, e respetiva demonstração de Liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/07; - Liquidação n.° 2020 032501216, e respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/09; - Liquidação n.° 2020 032501233, e respetiva demonstração de Liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/10; - Liquidação n.° 2020 032501239, e respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/11; - Liquidação n.° 2020 032501241, e respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios, referente ao período 2016/12;
LL. Os Serviços do IVA, com despacho concordante do Subdiretor-Geral, de 19 de Agosto de 2015, emitiram uma informação vinculativa (processo n.° 9215) que conclui que os serviços prestados no âmbito do aconselhamento de nutrição, podem beneficiar da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.°do CIVA, desde que sejam assegurados por profissionais habilitados para o seu exercício nos termos da legislação aplicável (cf. Documento 9 junto ao PPA).
MM. Em 4.11.2020, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo (Cfr. Sistema de gestão Processual do CAAD).”
***
A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:
“NN. Não ficou provado que os serviços de nutrição prestados tivessem fins terapêuticos, além dos objetivos genéricos de promoção da saúde. Da prova produzida resultou que os destinatários das consultas de nutrição visavam com a sua efectiva disponibilização, em geral e quando muito, finalidades de perda de peso e de alimentação saudável, sem que inerente às mesmas estivesse o tratamento ou a cura de uma concreta doença ou a prevenção de uma doença específica.
OO. Não existem outros factos alegados com relevo para a decisão que devam considerar-se não provados.”
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A motivação da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte:
“PP. Ao Tribunal cabe seleccionar, de entre os alegados pelas Partes, os factos que importam à apreciação e decisão da causa, perspectivando as hipotéticas soluções plausíveis das questões de direito (v. art.° 16.°, al. e) e art.° 19.° do RJAT e, ainda, art.° 123.°, n.° 2 do CPPT e art.° 596.° do CPC), abrangendo os seus poderes de cognição factos instrumentais e factos complemento ou concretização dos que as Partes alegaram (cf. art.° 13.° do CPPT, 99.° da LGT, 90.° do CPTA e art.° 5.°, n.° 2 e 411.° do CPC).
QQ. Os factos foram dados como provados e/ou como não provados com base: i) nos documentos juntos aos autos, incluindo com o PPA; ii) nos Requerimentos supervenientes enviados aos autos pela Requerente; e ainda iii) no Processo Administrativo (“PA”), tendo sido criticamente apreciados todos documentos que se dão por integralmente reproduzidos, e, bem assim, provados com base nas posições manifestadas pelas Partes nas alegações orais, bem como na prova testemunhal produzida no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido e criticamente apreciada.
RR. No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se, essencialmente, na análise crítica da prova documental junta aos autos. Foram, de igual modo, tidos em conta, os depoimentos prestados no Processo Arbitral Tributário n.° 161/2019-T cujo aproveitamento foi peticionado e deferido.
SS. Em relação ao facto dado como provado no ponto Z. do probatório, o Tribunal Arbitral Colectivo considerou que acaso todos os seus clientes (em média mais de 3.500 mensais) houvessem fruído das duas consultas de nutrição a que teriam direito por outorga do contrato de prestação de serviços dietéticos no ano de 2016 e no pressuposto, inverosímil, de que todos os clientes se vincularam assinando o aludido contrato, a Requerente teria de ter realizado 7.000 consultas de nutrição. Inferindo-se daqui que tendo a Requerente só realizado 1530 consultas denominadas de base presencial, há consultas que não foram realizadas, mas tão-só disponibilizadas não tendo os respectivos beneficiários fruído das mesmas.
TT. Não se deram como provadas ou não provadas alegações das Partes apresentadas como factos, mas consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja validade será de aferir em face da matéria de facto considerada assente.
V.D) DO DIREITO:
V.D.1) ORDEM DO CONHECIMENTO DOS VÍCIOS IMPUTADOS ÀS LIQUIDAÇÕES SINDICADAS:
30. O art.º 124.º do CPPT estatui: “1 – Na sentença, o tribunal apreciaraì prioritariamente os vícios que conduzam aÌ declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam aÌ sua anulação. 2 – Nos referidos grupos a apreciação dos vícios eì feita pela ordem seguinte: a) No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos; b) No segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Publico ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior.”
31. Tal normativo estabelece regras sobre a ordem de conhecimento de vícios em processo de impugnação judicial, que são subsidiariamente aplicáveis ao processo arbitral, por forca do que dispõe o artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
32. No caso de vícios geradores de anulabilidade (como os que estão em causa nos presentes autos), a alínea b) do n.º 2 daquele art.º 124.º do CPPT refere que se deve atender prioritariamente aÌ ordem indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade
33. A Requerente imputa aos actos de liquidação sub judicio, como visto, vícios suscetíveis de determinarem a respetiva anulação e já não vícios que conduzam aÌ declaração de inexistência ou nulidade dos actos impugnados.
34. A Impetrante, no PPA apresentado e até no requerimento superveniente onde peticiona a ampliação do pedido ali formulado, não estabeleceu, em termos de relação de subsidiariedade, qualquer ordem de prioridade quanto ao respetivo conhecimento.
35. Assim sendo, cabe iniciar a apreciação jurídica das questões submetidas a julgamento pelo vício ou vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, a mais estável ou eficaz tutela dos interesses pretensamente ofendidos, tal como resulta da aplicação conjugada da parte final da alínea b) do n.º 2 do art.º 124º do CPPT com a alínea a) do n.º 2 do mesmo normativo
36. E partindo daquele critério entende o Tribunal arbitral dever começar a análise dos vícios apontados nos articulados apresentados pela Requerente pela questão da eventual ilegalidade dos atos de liquidação por contradição com o conteúdo da informação vinculativa tirada no Processo n.º 9215, averbada com despacho concordante do Subdirector-Geral de 19.8.2015 e referida no ponto LL) do probatório, por ser aquele que, verificando-se, assegura mais estável e eficaz tutela dos interesses ofendidos como se torna prejudicial ao conhecimento dos restantes vícios apontados.
V.D.2) DA (I)LEGALIDADE DOS ACTOS DE LIQUIDAÇÃO POR CONTRADIÇÃO COM O CONTEÚDO DA INFORMAÇÃO VINCULATIVA TIRADA NO PROCESSO N.º 9215, AVERBADA COM DESPACHO CONCORDANTE DO SUBDIRECTOR-GERAL DE 19.8.2015 E REFERIDA NO PONTO LL) DO PROBATÓRIO:
37. Neste ponto e porque não descortinamos razão para divergir (ou aditar o que quer que seja) da decisão prolatada no Processo n.º 380/2020-T que tramitou no CAAD e foi junta aos autos pela requerida com as alegações finais, vamos reproduzir ipsis verbis tudo quanto a tal propósito foi ali doutamente explicitado.
38. Diz a dado passo a aludida decisão arbitral: “A Requerente refere na sua petição a existência de uma informação vinculativa – Ficha Doutrinária emitida por despacho de 19.08.2015 do Diretor-Geral do IVA, no processo de informação vinculativa n.º 9215 – emitida a pedido não da Requerente mas de uma empresa do mesmo grupo – Grupo B...– ao qual pertence a Requerente e em que a Autoridade Tributária declara o seu entendimento de que “os serviços prestados no âmbito do aconselhamento de nutrição, faturados pela requerente aos seus clientes, podem beneficiar da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, desde que sejam assegurados por profissionais habilitados para o seu exercício nos termos da legislação aplicável (Decretos-Lei n.ºs 261/93 de 24 de julho e 320/99, de 11 de agosto)”. O regime das informações vinculativas está previsto no artigo 68.º da LGT. Em particular, releva o n.º 14 deste preceito, que estabelece que “[A] administração tributária, em relação ao objeto do pedido, não pode posteriormente proceder em sentido diverso da informação prestada, salvo em cumprimento de decisão judicial.” Conforme a jurisprudência tem destacado, a consequência resultante de a AT proceder em sentido diferente do definido pela informação vinculativa é a configuração de um específico vício de violação da lei, gerador de anulabilidade do ato praticado (acórdão arbitral de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019 e a jurisprudência aí citada: TCA Sul de 22.11.2011, proc. n.º 03013/09 e de 10.07.2014, proc. n.º 07558/14, onde se diz: “se a Fazenda Pública proceder de forma diversa do sentido que constar de informação vinculativa prestada, o ato que praticar enfermará de vício de violação de lei, sendo gerador da sua anulabilidade”; v. ainda o acórdão proferido no proc. n.º 474/2019-T do CAAD). Para que uma atuação desconforme com uma informação vinculativa da AT se traduza no específico vício de violação de lei previsto no n.º 14 do artigo 68.º, é necessária uma identidade objetiva da situação fáctica, ou seja, é necessário que os atos ou factos sobre os quais a informação vinculativa se pronunciou sejam iguais aos atos ou factos sobre os quais incidiu a atuação da administração tributária, isto de acordo com os n.ºs 1, 3, 8, 9, 12 e 14 do artigo 68.º (Decisão arbitral de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019). Conforme se diz no acórdão do TCA Sul de 22.11.2011, proc. n.º 03013/09, citado no acórdão arbitral de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019, a informação vinculativa tem “dois termos de referência. Por um lado, ela reporta-se aos factos enunciados pelo contribuinte; por outro, reporta-se ao enquadramento jurídico que deles fazem os serviços. Assim, a informação prestada perde qualquer validade se os factos ocorrerem em termos diversos daqueles que foram apresentados aos serviços, nomeadamente se ocorrerem com contornos que lhe tenham sido ocultados. Do mesmo modo, a informação prestada perde validade se as normas jurídicas que serviram à qualificação tributária dos factos vierem, entretanto, a ser alteradas” (no mesmo sentido se pronunciaram os acórdãos do TCA Sul de 10.07.2014, proc. n.º 07558/14 e do TCA Norte de 10.5.2018, proc. n.º 00101/2002.TFPRT.21, ambos citados no acórdão arbitral de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019). Deixando para ponto ulterior da análise a questão subjetiva, ie, a questão da intocabilidade, por parte da Requerente, da informação vinculativa aqui em causa, analisemos para já o aspeto da identidade objetiva entre a situação fáctica que deu origem à liquidação impugnada e a situação considerada na “Informação Vinculativa”. “Informação Vinculativa” descreve do seguinte modo os factos a enquadrar: “1.A requerente eì uma sociedade comercial, sob a forma de sociedade anonima, que tem como objeto social, entre outros, a exploração e gestão de health clubs, clubes de fitness e ginásios. 2.Pretendendo prestar serviços de aconselhamento nutricional nos estabelecimentos que explora já procedeu, conforme se verifica pela análise aÌ certidão permanente (cujo código facultou), aÌ alteração do seu objeto social, tendo incluído a "prestação de serviços e consultas de nutrição". 3.Com a implementação destes serviços a requerente tem como objetivo garantir uma diminuição do número de cancelamentos das inscrições nos clubes e ginásios que, de acordo com os dados constantes em duas tabelas referentes aos anos de 2013 e 2014, que anexa ao presente pedido, ocorrem em número mais elevado nos meses de Verão, resultando numa diferença negativa entre o número de adesões e o de cancelamentos. 4.Assim, perspetivando garantir, atraveìs da realização dos serviços de aconselhamento nutricional, o incremento da retenção de clientes, a requerente refere que estes serviços serão prestados atraveìs de profissionais contratados para o efeito, devidamente credenciados, ou seja, que detenham uma licenciatura em nutricionismo e se encontrem inscritos na Ordem dos Nutricionistas, ou licenciatura em dietética. 5.Vem, assim, solicitar esclarecimento acerca do enquadramento a conferir, em sede de imposto sobre o valor acrescentado (IVA), aos serviços de aconselhamento de nutrição e dietética, que pretende prestar, nomeadamente se os mesmos beneficiam da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do Código do IVA (CIVA).” A situação fáctica descrita é totalmente coincidente com a situação fáctica sobre a qual incidiram as liquidações impugnadas: − A Requerente dedica-se à exploração e gestão de health clubs, clubes de fitness e ginásios (ponto n.º 1 da “Informação Vinculativa” e facto provado A); − Presta serviços de aconselhamento nutricional nos estabelecimentos que explora e inclui essa prestação no seu objeto social (ponto n.º 2 da “Informação Vinculativa” e facto provado D); − Os serviços de aconselhamento nutricional são materialmente realizados por profissionais contratados para o efeito, devidamente credenciados, ou seja, detentores de uma licenciatura em nutricionismo e inscritos na Ordem dos Nutricionistas, ou possuidores de licenciatura em dietética (ponto n.º 4 da “Informação Vinculativa” e facto provado G). De acordo com o RIT que serve de fundamentação aos atos impugnados, e para o enquadramento das prestações de serviços de aconselhamento dietético como “não isentos”, foi considerado relevante pelos serviços de inspeção, como já se viu, que: − Os serviços em causa não são “consultas de nutrição, procuradas pelo utente em razão de alguma necessidade que sinta nessa matéria, mas tão só a «disponibilização» de um serviço com características de aconselhamento ao utente, o qual apenas ocorre no caso de o utente «procurar» esse serviço”; − As prestações de serviços não têm objetivo terapêutico, mesmo sendo efetuados por paramédicos devidamente habilitados para o efeito; Que as prestações de serviços não têm objetivo terapêutico, mesmo sendo efetuados por paramédicos devidamente habilitados para o efeito, é ainda indiciado pelas seguintes circunstâncias, sempre de acordo com o RIT: − Algumas prestações de serviços dietéticos traduzem-se na mera elaboração de dietas integradas em planos alimentares; − O contrato prevê apenas «duas sessões presenciais» e «dois acompanhamentos telefónicos anuais», os quais surgem designados por aconselhamento dietético; − Se alguém necessitar de uma intervenção terapêutica ao nível nutricional, procurará um profissional nessa área, não se inscreverá num ginásio; e o propósito da frequência de um ginásio não é o de ser consultado por um nutricionista; − O serviço é faturado mensalmente, a todos os utentes, sem exceção, independentemente de usufruírem ou não da referida consulta, significando isso que todos os utentes veem uma parte da mensalidade que pagam pela frequência do ginásio estar sujeita a IVA à taxa normal e outra parte dessa mensalidade estar isenta de IVA, quando a generalidade desses utentes a que essa fatura respeita não tem qualquer contacto com o nutricionista. Ora, dos aspetos elencados, nenhum é referido na “Informação Vinculativa” como sendo impeditivo da isenção que a mesma reconhece aos serviços em causa. Não é dito, especificamente, que os serviços devam ter uma “finalidade terapêutica”, e nem que, para que se verifique tal finalidade terapêutica, os mesmos devam ser procurados por parte dos utentes de forma autónoma e independente dos serviços de ginásio, health club e fitness club. Além disso, como referido na citada Informação (processo n.º 9215), no pedido que lhe serve de base é expressamente dito que: − A atividade a desenvolver se traduz na “prestação de serviços e consultas de nutrição”, o que pressupõe a prestação de serviços de nutricionismo ou dietética que não são “consultas de nutrição”; − A “implementação dos serviços tem como objetivo garantir uma diminuição do número de cancelamentos das inscrições nos clubes e ginásios”, e a “realização dos serviços de aconselhamento nutricional perspetiva garantir o incremento da retenção de clientes”, o que deixa patente que a atividade é organizada em relação de dependência das restantes prestações de serviços específicas dos clubes e ginásios. Em face da descrição que a “Informação Vinculativa” faz dos factos que lhe servem de base, conclui-se que a factualidade que a Informação assumiu como relevante é em tudo coincidente com a factualidade verificada na atividade da aqui Requerente. Conclui-se, assim, que, em termos objetivos, ie, entre a situação que serviu de base à “Informação Vinculativa” e a situação que deu origem às liquidações impugnadas nos presentes autos existe a identidade fáctica necessária para que o enquadramento tributário efetuado pela “informação” seja válido e aplicável à situação da Requerente. Quanto ao enquadramento dessa mesma situação fáctica em termos de tributação em IVA, a “Informação Vinculativa” diz o seguinte: “10. No que respeita às atividades paramédicas, dado que não existe no CIVA um conceito que as defina, háì que recorrer ao Decreto-Lei n.º 261/93 de 24 de julho, bem como ao Decreto-Lei n.º 320/99, de 11 de agosto (ambos do Ministério da Saúde), uma vez que são estes dois diplomas que contêm em si os requisitos a observar para o exercício das respetivas atividades. 11. Em conformidade com o estabelecido no preambulo do Decreto-Lei 320/99, de 11 de Agosto, ambos os diplomas visam prosseguir a protecção da saúde dos cidadãos, enquanto direito social constitucionalmente consagrado "(...) atraveìs de uma regulamentação das atividades técnicas de diagnostico e terapêutica que condicione o seu exercício em geral, quer na defesa do direito aÌ saúde, proporcionando a prestação de cuidados por quem detenha habilitação adequada, quer na defesa dos interesses dos profissionais que efetivamente possuam os conhecimentos e as atitudes próprias para o exercício da correspondente profissão". 12. Neste sentido determina o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 261/83, de 24 de julho, que as atividades paramédicas são as constantes da lista anexa ao citado diploma, do qual faz parte integrante, e compreendem a utilização de técnicas de base científica com fins de promoção de saúde e de prevenção, diagnostico e tratamento da doença, ou da reabilitação. 13. Eì, ainda, condição essencial para o exercício destas atividades profissionais de saúde e determinante para a atribuição da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, a verificação de determinadas condições, nomeadamente a titularidade de curso, obtido nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 320/99, de 11 de agosto. 14. A referida lista anexa ao Decreto-Lei n.º 261/83, de 24 de julho, prevê̂ no seu item 5, a atividade de Dietética. De acordo com a descrição aiì prevista, esta atividade compreende a "Aplicação de conhecimentos de nutrição e dietética na saúde em geral e na educação de grupos e indivíduos, quer em situação de bem-estar quer na doença, designadamente no domínio da promoção e tratamento e da gestão de recursos alimentares". 15. A atividade de nutricionista enquadra-se na descrição prevista para o exercício da atividade de "dietética" prevista nos Decretos-Lei anteriormente citados, pelo que, tem sido entendimento da AT que as prestações de serviços efetuadas por nutricionistas podem ser abrangidas pela isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, desde que estejam cumpridas as condições enumeradas nos referidos diplomas e se refiram a operações abrangidas pelo item 5 do Anexo ao Decreto-Lei n.º 261/93. 16. Nesse pressuposto, os serviços prestados por dietistas, bem como, por nutricionistas, quer sejam prestados diretamente ao utente quer sejam prestados a uma qualquer entidade com quem contratualizem os seus serviços, são abrangidos pela isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.o do CIVA. 17. Esta isenção refere-se ao exercício objetivo das atividades e não aÌ forma jurídica que o caracteriza, encontrando-se, assim, as atividades descritas, isentas ainda que desenvolvidas no âmbito das sociedades. Tal entendimento decorre da interpretação desta disposição legal pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), nomeadamente no Acórdão de 10 de setembro de 2002, proferido no âmbito do processo C-141/00 (caso Kugler, Colect. P. I- 6833, n.º 26), que resume o carácter objetivo da isenção no preenchimento de duas condições: se trate de serviços médicos ou paramédicos e que estes sejam fornecidos por pessoas que possuam as qualificações profissionais exigidas. 18. Deste modo, as prestações de serviços de nutrição que venham a ser realizadas pela requerente, sendo por esta faturados diretamente aos utentes, podem beneficiar da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, desde que sejam asseguradas por profissionais (dietistas e nutricionistas) habilitados para o exercício dessa atividade, nos termos da legislação aplicável. Neste caso, nas faturas a emitir aos utentes deve constar a referência aÌ citada isenção.“ Colocado em termos normativos, retira-se da “Informação Vinculativa” que estão isentas de IVA, pela al. 1) do artigo 9.º do CIVA, as prestações de serviços de aconselhamento nutricional, em estabelecimento de exploração e gestão de health clubs, clubes de fitness e ginásios, por entidades titulares desses estabelecimentos, consistindo tais serviços em “serviços e consultas de nutrição”, sendo tais atividades desenvolvidas em dependência dos serviços específicos dos ginásios, health clubs e clubes de fitness e de modo a reter os clientes destes últimos serviços, na condição de que tais “serviços e consultas de nutrição” sejam prestados por nutricionistas ou dietistas credenciados. E assim sendo, deve-se concluir que, em relação à Requerente, a Autoridade Tributária atuou, praticando os atos de liquidação impugnados, num sentido que é contrário à doutrina interpretativa veiculada pela mesma Autoridade Tributária através da Informação Vinculativa proferida no processo n.º 9215. Analisemos agora a questão da possibilidade de invocação da doutrina interpretativa constante da “Informação Vinculativa” por parte da Requerente. De acordo com o n.º 14 do artigo 68.º da LGT, já anteriormente citado, “[a] administração tributária, em relação ao objeto do pedido, não pode posteriormente proceder em sentido diverso da informação prestada, salvo em cumprimento de decisão judicial.” A jurisprudência tem, de forma consistente, interpretado este preceito no sentido de que a informação vinculativa apenas “vincula” a administração quanto ao mesmo sujeito passivo que a solicitou. Assim o diz acórdão arbitral que vimos citando (acórdão de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019), nos seguintes termos: “[O] regime da informação vinculativa, atento o disposto no citado n.º 14 do artigo 68.º da LGT, muito embora apenas em relação ao sujeito passivo beneficiário da informação prestada e aos atos e factos identificados no pedido (...) faz prevalecer a proteção da confiança e a segurança jurídica do sujeito passivo em causa sobre a exata interpretação da lei (...). A decisão arbitral cita, por sua vez, em apoio da mesma doutrina, os acórdãos do TCA Sul de 10.07.2014, proc. n.º 07558/14 e do TCA Norte de 13.10.2016, proc. n.º 00089/11.7BEBRG e de 10.5.2018, proc. n.º 00101/2002.TFPRT.21 em que se diz: “A Administração Tributária, com a emissão de uma informação vinculativa, não fica obrigada ao seu cumprimento em relação a todas as situações que se lhe colocam dentro do objeto dessa mesma orientação. Pelo contrário, a vinculação da Administração Tributária ao teor das mesmas é uma vinculação inter-partes, pois somente em relação ao caso em concreto objeto do pedido a Fazenda Pública não pode proceder em sentido diverso da informação prestada, ressalvado o cumprimento de decisão judicial”. Tomando em consideração esta orientação jurisprudencial, da qual este tribunal não vê razão para se afastar, a atuação da Autoridade Tributária no caso dos presentes autos, em contradição com a interpretação veiculada na “Informação Vinculativa”, não é de molde a originar o vício de violação de lei específico previsto no n.º 14 do artigo 68.º da LGT, uma vez que a informação vinculativa em causa não foi prestada à aqui Requerente.”
39. Apropriando-se do argumentário vindo de transcrever, o presente tribunal arbitral colectivo também considera que, in casu, a atuação da Autoridade Tributária em contradição com a interpretação sancionada na informação vinculativa tirada no Processo n.º 9215, averbada com despacho concordante do Subdirector-Geral de 19.8.2015 e referida no ponto LL) do probatório, não é de molde a originar o vício de violação de lei específico previsto no n.º 14 do artigo 68.º da LGT.
V.D.3) DA VALIDADE SUBSTANCIAL DA FUNDAMENTAÇÃO QUE ESTÁ A ANCORAR OS ACTOS DE LIQUIDAÇÃO SINDICADOS:
40. Neste ponto também não descortinamos razão para divergir (ou aditar o que quer que seja) da decisão prolatada no Processo n.º 380/2020-T que tramitou no CAAD e foi junta aos autos pela requerida com as alegações finais, pelo que, vamos reproduzir ipsis verbis tudo quanto a tal propósito foi ali doutamente explicitado.
41. Diz a dado passo a aludida decisão arbitral: “Cabe, neste âmbito, ao tribunal apreciar se o ato de liquidação se fundamenta na falta de finalidade terapêutica e o faz de modo suficientemente congruente e claro, de modo a possibilitar à Requerente, no momento apropriado, defender-se com base nessa fundamentação. Verificando-se esta primeira condição, cabe ao tribunal, em segundo lugar, apreciar se a Requerente logrou invalidar essa fundamentação, demonstrando que as prestações de serviços em causa tiveram finalidade terapêutica. Ora, apesar de alguma inconsistência, que, como já notámos anteriormente, se nos afigura encontrar-se na fundamentação do ato tributário, parece-nos poder-se afirmar que a Administração Tributária inequivocamente funda a liquidação na inexistência de fim terapêutico, quando diz: “(...) «Tal significa que as prestações de serviços que não tenham este objetivo terapêutico (diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde) ficam excluídas do âmbito de aplicação da isenção, sendo sujeitas a imposto e dele não isentas.» Ora a isenção aqui aplicada, com base na al. 1) do art.º 9.º do CIVA, não é lícita por não se tratar, efetivamente, de consultas de nutrição, procuradas pelo utente em razão de alguma necessidade que sinta nessa matéria, mas tão só a «disponibilização» de um serviço com características de aconselhamento ao utente, o qual apenas ocorre no caso de o utente «procurar» esse serviço. Caso não o procure, por dele não sentir necessidade, é-lhe igualmente faturado (...). (...) As prestações de serviços que não tenham (...) objetivo terapêutico, mesmo que efetuados por paramédicos devidamente habilitados para o efeito, encontram-se excluídas do âmbito de aplicação da isenção. Enquadram-se aqui as atividades de mera elaboração de dietas integradas em planos alimentares. (Lembramos que o contrato prevê apenas «duas sessões presenciais» e «dois acompanhamentos telefónicos anuais», os quais surgem designados por aconselhamento dietético. De facto, se alguém necessitar de uma intervenção terapêutica ao nível nutricional, procurará um profissional nessa área, não se inscreverá num ginásio, isto é, o propósito da frequência de um ginásio (...) não será, certamente, o de ser consultado por um nutricionista. A prová-lo está o facto de esse serviço ser faturado mensalmente, a todos os utentes, sem exceção, independentemente de usufruírem ou não da referida consulta, significando isso que todos os utentes veem uma parte da mensalidade que pagam pela frequência do ginásio estar sujeita a IVA à taxa normal e outra parte dessa mensalidade estar isenta de IVA, quando a generalidade desses utentes a que essa fatura respeita não tem qualquer contacto com o nutricionista (...). Nomeadamente, a administração tributária justifica a falta de finalidade terapêutica com o facto de o contrato de prestação de serviços dietéticos apenas disponibilizar a possibilidade de consulta, e o preço faturado o ser por causa dessa disponibilização, e não por causa de uma consulta efetiva; e também com o facto de essa disponibilização se verificar sempre em associação com um contrato de utilização de equipamentos desportivos, reforçando a ideia de que não terá uma finalidade autónoma. Ora, tendo sido notificada dos fundamentos que a Autoridade Tributária apresentava para os atos de liquidação, quer no projeto de relatório de inspeção, quer no relatório de inspeção definitivo, e assentando essa fundamentação na falta de finalidade terapêutica dos serviços de nutrição/dietética prestados, a Requerente não logrou provar a existência dessa finalidade terapêutica, pressuposto do regime de isenção que aplicou, tal como não o fez em sede de processo arbitral, no sentido em que tal termo foi interpretado pelo Tribunal de Justiça.”
42. Apropriando-se do argumentário vindo de transcrever, o presente tribunal arbitral colectivo também considera que, in casu, o ato de liquidação sub judicio se fundamenta na falta de finalidade terapêutica. Considera ainda que tal fundamentação foi feita de modo suficientemente congruente e claro, tendo possibilitado à Requerente, no momento apropriado, defender-se com base na ausência de finalidade terapêutica. O tribunal considera ainda que a Requerente não logrou provar a existência dessa finalidade terapêutica relativamente a todas as prestações de serviços de nutrição que realizou e cuja isenção aplicada ao abrigo do n.º 1 do art.º 9º do CIVA foi, entretanto, colocada em crise pela requerida.
V.D.4) ENQUADRAMENTO DAS PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE NUTRIÇÃO À LUZ DO ESTATUÍDO NO N.º 1 DO ART.º 9º DO CIVA:
V.D.4.1) ENUNCIAÇÃO DO QUADRO NORMATIVO QUE CONFORMA O ENQUADRAMENTO A DAR ÀS PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE NUTRIÇÃO:
43. O art.º 13. °, A, da Sexta Directiva tinha por fito isentar de imposto certas actividades de interesse geral, mas apenas as que nele são enumeradas e descritas de maneira muito detalhada .
44. O alcance da isenção aplicável a actividades nos domínios da medicina e da paramedicina, buscar-se-á na interpretação da alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA (tal como antes da sua revogação se deveria buscar na interpretação da alínea c) do n.º 1 do art.º 13. ° da Sexta Directiva), que deve ser determinada em respeito pela economia geral do sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado.
45. As isenções constituem noções autónomas do direito comunitário que devem ser inseridas no contexto geral do sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado são de interpretação estrita, dado que constituem derrogações ao princípio geral segundo o qual o imposto sobre o volume de negócios é cobrado sobre qualquer prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo .
46. Aquela disposição do instrumento legislativo comunitário vindo de referir exige que sejam preenchidas duas condições, a saber: i) que se trate de prestação de serviços de assistência e ii) que esta seja fornecida por uma pessoa que possua as qualificações profissionais exigidas para uma actividade médica ou paramédica. Neste sentido pode ver-se o Acórdão de 10 de Setembro de 2002, Kügler, Pº n.º C-141/00, considerando n.º 27, da respectiva fundamentação jurídica.
47. Prosseguindo a interpretatio legis tendente a esclarecer o alcance da isenção prevista alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA, i.e., da interpretação do conceito de “prestações de serviços de assistência”, ou seja, a condição enunciada em i).
47. Quanto à questão de saber se uma prestação de serviços médica ou paramédica está isenta de IVA ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA, o que releva, tal como resulta da jurisprudência anterior do TJCE relativa ao conceito de “prestações de serviços de assistência”, é o objectivo da actividade médica ou paramédica.
48. No Acórdão de 14 de Setembro de 2000, vulgarmente conhecido por Acórdão D., Pº n.º C-384/98, Colect., p. I-6795, o TJCE, nos seus considerandos 18 e 19 da respectiva fundamentação jurídica e com base numa comparação das diversas versões linguísticas daquela disposição, observou aquela Instituição comunitária que o conceito “não se presta a uma interpretação que inclua as intervenções médicas conduzidas com um objectivo que não o de diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde”.
49. Assim sendo, as prestações, “sem tal objectivo terapêutico” devem, tendo em conta o princípio da interpretação estrita de qualquer disposição que vise instituir uma isenção do imposto sobre o volume de negócios, ser excluídas do âmbito de aplicação da alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA. O Tribunal de Justiça confirmou esta jurisprudência no Acórdão Comissão/França, de 11 de Janeiro de 2001, Pº n.º C-76/99, Colect., p. I-249, considerando n.º 24 e Acórdão Kügler, de 10 de Setembro de 2002, Pº n.º C-141/00, considerandos n.ºs 38 e 39).
50. Resulta assim inequívoco da jurisprudência comunitária vinda de enunciar que o que é decisivo, visando saber se uma concreta prestação de serviços médicos ou paramédicos aproveita da isenção consignada no art.º 132º da Directiva IVA, é o objectivo da intervenção.
51. Donde se infere que a isenção não pode cobrir todas as actividades de um médico ou paramédico, mas, tão-somente, as que têm “objectivo terapêutico”.
52. Mostrando-se ainda assim adequado prosseguir na determinação do alcance do conceito de “prestações de serviços de assistência”, constante da alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA, devendo, doravante, atender-se à ratio legis da aludida isenção.
53. O estatuído nas alíneas b) e c) do art.º 132°, da Directiva IVA regulamenta in totum a isenção em sede de IVA aplicável às actividades médicas e paramédicas a realizar em meio hospitalar em ambulatório ou no domicílio.
54. Efectivamente, a alínea b) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA, tem aplicabilidade em relação às prestações efectuadas no meio hospitalar; ao passo que a alínea c) da disposição vinda de referir se aplica às prestações de serviços médicos e paramédicos efectuados fora desse âmbito, i.e., em ambulatório ou em regime de serviço domiciliário (A este propósito veja-se o Acórdão Kügler, de 10 de Setembro de 2002, Pº n.º C-141/00, considerando n.º 36).
55. Entre as actividades com “objectivo terapêutico” que devem ser consideradas prestações de serviços de assistência, donde, isentas de IVA nos termos das alíneas b) ou c) do art.º 132° da Directiva IVA, figuram também actividades que não têm por fito a cura, mas visam tão-só a prevenção. Isto mesmo foi confirmado pelo TJUE ao fixar como jurisprudência que podem beneficiar de isenção, ao abrigo do artigo 13. °, A, n.º 1, alínea c) da 6ª Directiva e numa interpretação actualista ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA, as actividades médicas (diríamos nós, bem como as paramédicas) efectuadas para fins de prevenção, de diagnóstico ou de cuidados (Cfr. Acórdão Kügler, de 10 de Setembro de 2002, Pº n.º C-141/00, considerando n.º 40).
56. A este propósito entendemos ainda adequado trazer-se aqui o referido nos considerandos n.ºs 57 e 58 do Acórdão do TJCE de 20.11.2003, Pº n.º C-307/01, Peter d’Ambrumenil, que referem: “57. Relativamente ao conceito de «prestações de serviços de assistência», o Tribunal já declarou, no n.º 18 do seu acórdão D., já referido, e reafirmou no n.º 38 do seu acórdão Kügler, já referido, que esse conceito não admite uma interpretação que inclua intervenções médicas efectuadas com uma finalidade diferente da de diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde. 58. Embora desta jurisprudência decorra que as «prestações de serviços de assistência» devam ter objectivo terapêutico, isto não implica necessariamente que a finalidade terapêutica de uma prestação deva ser entendida num sentido demasiado estrito (v., neste sentido, acórdão Comissão/França, já referido, n.º 23). Com efeito, do n.º 40 do acórdão Kügler, já referido, resulta que as prestações médicas efectuadas para efeitos de prevenção podem beneficiar de uma isenção ao abrigo do artigo 13. °, A, n.º 1, alínea c), da Sexta Directiva. Mesmo quando se revele que as pessoas que se submeteram a exames ou a outras intervenções médicas com carácter preventivo não sofrem de qualquer doença ou anomalia de saúde, a inclusão das referidas prestações no conceito de «prestações de serviços de assistência» está em conformidade com o objectivo de redução do custo dos cuidados de saúde, que é comum tanto à isenção prevista no artigo 13.°, n.º 1, alínea b), da Sexta Directiva como à prevista no mesmo número, alínea c) (v. acórdãos, já referidos, Comissão/França, n.º 23, e Kügler, n.º 29).
57. E já quanto à questão de saber se o facto do prestador dos serviços médicos ou paramédicos se apresentar como ente societário (e já não como profissional liberal) releva para efeitos da aplicabilidade da isenção prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA (e também do n.º 1 do art.º 9º do CIVA que é a norma que faz a transposição para o direito interno daquela disposição do direito comunitário), o que dizer?
58. Mais uma vez a letra lapidar do Acórdão do TJCE de 10.9.2002, Kügler, Pº n.º C-141/00, nos considerandos 26 a 31 que a seguir se transcreverão, aborda e resolve a questão vinda de enunciar: “26. (…) há que salientar que o artigo 13. °, A, n.º 1, alínea c), da Sexta Directiva define as operações isentas em função da natureza das prestações de serviço fornecidas, sem mencionar a forma jurídica do prestador. 27. Segundo uma interpretação literal, esta disposição não exige, para que as prestações médicas sejam isentas, que estas últimas sejam fornecidas por um sujeito passivo dotado de uma forma jurídica particular. Basta que sejam preenchidas duas condições, a saber, que se trate de prestações médicas e que estas sejam fornecidas por pessoas que possuam as qualificações profissionais exigidas. 28. Esta interpretação não é contrariada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual as isenções referidas no artigo 13. ° da Sexta Directiva são de interpretação estrita, dado que constituem derrogações ao princípio geral de que o IVA é cobrado sobre todas as prestações de serviços efectuadas a título oneroso por um sujeito passivo (v., nomeadamente, o acórdão SDC, já referido, n.º 20). 29. Com efeito, a isenção das prestações médicas fornecidas por pessoas colectivas está em conformidade com o objectivo de redução do custo dos cuidados médicos (v., neste sentido, acórdão de 11 de Janeiro de 2001, Comissão/França, C-76/99, Colect., p. I-249, n.º 23) e com o princípio da neutralidade fiscal inerente ao sistema comum de IVA, no respeito do qual as isenções previstas no artigo 13.° da Sexta Directiva devem ser aplicadas (v., nomeadamente, acórdão de 7 de Setembro de 1999, Gregg, C-216/99, Colect., p. I-4947, n.º 19). 30. Há que recordar, a este respeito, que o princípio da neutralidade fiscal se opõe, designadamente, a que operadores económicos que efectuem as mesmas operações sejam tratados diferentemente em matéria de cobrança do IVA. Daqui resulta que o referido princípio seria ignorado se a possibilidade de invocar o benefício da isenção prevista para as prestações de cuidados pessoais mencionadas no artigo 13. °, A, n.º 1, alínea c), da Sexta Directiva estivesse dependente da forma jurídica sob a qual o sujeito passivo exerce a sua actividade (v., neste sentido, acórdão Gregg, já referido, n.º 20). 31. Por conseguinte, há que responder à primeira questão que a isenção referida no artigo 13. °, A, n.º 1, alínea c), da Sexta Directiva não depende da forma jurídica do sujeito passivo que fornece as prestações médicas ou paramédicas nele mencionadas.”
59. Aceitamos, por isso, a aplicabilidade, in casu, do n.º 1 do art.º 9º do CIVA às operações realizadas pela Requerente e que se consubstanciam na realização de prestações de serviços de nutrição.
60. Trazendo agora à colação o quadro normativo nacional sobre a questão sub judice diga-se que face ao que dispõe o n.º 1 do art.º 9º do CIVA, beneficiam da isenção de imposto “As prestações de serviços efectuadas no exercício das (…) profissões de “Médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas.”
61. Acresce que o n.º 2 daquela disposição isenta igualmente de imposto “As prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estreitamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares.”
62. Atenta a circunstância do CIVA aludir expressamente às actividades paramédicas (subsumindo-as na isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º), mas não delimitar o respectivo conceito, impõe-se o recurso ao estatuído no Decreto-Lei n.º 261/93, de 24 de Julho, que regulamenta o exercício das actividades profissionais de saúde designadas por actividades paramédicas.
63. Tais actividades encontram-se elencadas na Lista Anexa ao referido diploma legal, que aqui se deve considerar reproduzida, sendo que quanto à dietética ali se diz o seguinte: “5. Dietética – Aplicação de conhecimentos de nutrição e dietética na saúde em geral e na educação de grupos e indivíduos, quer em situação bem-estar quer na doença, designadamente no domínio da promoção e tratamento e da gestão de recursos alimentares.”
64. Claro está que a dietética/nutrição é umas das actividades paramédicas ali identificadas, donde, do ponto de vista meramente objectivo, estaria, em princípio, justificada a aplicabilidade da isenção, certo sendo que, do ponto de vista subjectivo, bastaria que os respectivos prestadores ostentassem a titularidade de habilitação legal para o efeito e a aplicabilidade de qualquer uma das isenções explicitadas passaria a ser incontornável, aliás, tal como expressamente admitido pela doutrina administrativa firmada sobre a matéria e enunciada pela Requerente no seu Pedido de Pronúncia Arbitral.
65. Sendo que não há dissídio entre as parte quanto à questão de que aqui estamos perante prestações de serviços realizadas por nutricionista que é uma das profissões paramédicas que integra a lista anexa ao citado Decreto-Lei n.º 261/93, de 24 de Julho, donde, os requisitos de ordem subjectiva previstos naquela norma estão incontornavelmente cumpridos.
V.D.4.2) AS PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE NUTRIÇÃO COMO AUTÓNOMAS VERSUS ACESSÓRIAS DAS PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE ACTIVIDADE FÍSICA:
66. A Requerente considera que as prestações de serviços de nutrição são claramente autónomas relativamente às prestações de serviços de actividade física.
67. Para aquela as prestações de serviços aqui em causa são distintas e independentes entre si.
68. Já a Requerida, ao invés, sustenta que as primeiras são acessórias relativamente às segundas e que aquelas não constituem um fim em si para os seus destinatários, mas antes uma forma de beneficiarem nas melhores condições da prestação de serviços principal que é a prestação de serviços de actividade física em ginásio.
69. Retirando a Requerida a asserção de que estamos perante prestações de serviços únicas, cuja decomposição reveste um carácter artificial, nas quais o ginásio é a prestação principal e a nutrição é acessória daquela.
70. Na sua resposta, a Requerida diz a dado passo: “No entanto, não se pode deixar de notar que nos presentes autos, se por um lado, quanto ao objectivo, como refere a Requerente, o move well (ginásio) e o eat well (nutrição), conduzem a um fim comum (o feel well) e que, por outro lado, na óptica do destinatário dos serviços a que o TJUE manda atender, o peso ponderado do valor dos serviços de nutrição no valor global dos serviços, é de zero euros, porque, tendo em conta o desconto concedido, os serviços de ginásio, com ou sem serviços de nutrição, custa ao cliente o mesmo montante.”
71. Por nós entendemos que o facto da prestação de serviços de actividade física realizada em contexto de ginásio e da prestação de serviços de nutrição poderem conduzir a um fim comum, consubstanciado numa sensação de bem-estar físico que provavelmente sem a realização de tais prestações o respectivo destinatário não experienciaria, não leva, ipso facto, a que se tenha necessariamente de qualificar a prestação de serviços de nutrição como acessória da actividade física.
72. Ou seja, a finalidade comum das prestações não pode redundar na sua qualificação como prestações de serviços únicas, cuja decomposição reveste um carácter artificial, nas quais os serviços prestados em ginásio são a prestação principal e a nutrição é acessória daquelas.
73. O que releva eì a (in)existência de finalidade autónoma da prestação.
74. E se é certo que as prestações de serviços de nutrição contratadas mas não realizadas (e tão-só disponibilizadas aos respectivos destinatários que entendem não as fruir) não revelam a existência de qualquer finalidade autónoma, na medida em que os destinatários simplesmente delas prescindem, donde, não satisfazem qualquer necessidade daqueles, não constituindo para essa parte da clientela um fim em si mesmo, mas antes uma forma de beneficiarem da prestação de serviços de actividade física em condições mais favoráveis (que aliás e em face do probatório, nesse cenário, aparecem com uma contraprestação de valor inferior à alternativa que era contratualizar tão-só as prestações de serviços de actividade física sem a nutrição associada); já as contratadas e efectivamente realizadas, incontornavelmente, revelam a existência de tal finalidade autónoma.
75. Quanto ao argumento do peso ponderado do valor dos serviços de nutrição, por via do desconto concedido na prestação de serviços de actividade física corresponder exactamente ao valor dos serviços de nutrição e daí, para o destinatário das prestações, corresponder a zero euros, também não nos parece levar à qualificação dos serviços de nutrição como prestação acessória, desde logo, porquanto, independentemente da repartição da contraprestação pelas prestações realizadas e da forma como ela é determinada, o que é facto é que se não consegue perspectivar a existência de uma única prestação económica indissociável, mas antes e ao invés se perspetiva a existência incontornável de duas prestações de serviços que se justifica decompor para efeitos de enquadramento em sede de IVA.
76. Ademais e bem ao invés do que parece sustentar a Requerida, a forma como a Requerente concebeu e outorgou com os seus clientes a contraprestação pelas prestações que realiza não nos leva à conclusão de que a prestação de serviços de nutrição se cifra em valor zero na medida em que as partes contratualizaram um relevante valor para a realização ou mera disponibilização dos serviços de nutrição que só não redunda num relevante acréscimo de proveitos para a Requerente por via do desconto concedido na prestação de serviços de actividade física.
77. Isto dito, o Tribunal Arbitral Colectivo considera que, bem ao invés, estamos perante prestações de serviços autónomas, distintas e claramente independentes entre si.
78. E fá-lo ancorado no Acórdão do TJUE (Terceira Secção) de 4 de Março de 2021, Processo n.º C-581/19, disponível in https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=238466&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=6682245 que tal propósito aduz como segue: “37. Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que, quando uma operação económica eì constituída por um conjunto de elementos e de atos, háì que tomar em consideração todas as circunstancias em que se desenvolve a operação em questão para determinar se dela resulta uma ou mais prestações (v., neste sentido, Acórdão de 25 de fevereiro de 1999, CPP, C 349/96, EU:C:1999:93, n.º 28 e jurisprudência referida), especificando-se que, regra geral, cada prestação deve ser considerada uma prestação distinta e independente, como decorre do artigo 1.°, n.º 2, segundo paragrafo, da Diretiva 2006/112 [Acórdão de 2 de julho de 2020, Blackrock Investment Management (UK), C 231/19, EU:C:2020:513, n.º 23 e jurisprudência referida]. 38 Todavia, a título de excepção a esta regra geral, em primeiro lugar, a operação constituída por uma sóì prestação no plano económico não deve ser artificialmente decomposta para não alterar a funcionalidade do sistema do IVA. Eì por isso que existe uma prestação única quando dois ou mais elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo ao cliente estão tao estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria carácter artificial [Acórdão de 2 de julho de 2020, Blackrock Investment Management (UK), C 231/19, EU:C:2020:513, n.º 23 e jurisprudência referida]. 39 Para este efeito, como salientou a advogada geral nos n.ºs 22 a 33 das suas conclusões, háì que identificar os elementos característicos da operação em causa (Acórdãos de 29 de Março de 2007, Aktiebolaget NN, C 111/05, EU:C:2007:195, n.º 22, e de 18 de janeiro de 2018, Stadion Amsterdam, C 463/16, EU:C:2018:22, n. ° 30), da perspetiva do consumidor medio (Acórdão de 19 de julho de 2012, Deutsche Bank, C 44/11, EU:C:2012:484, n.º 21 e jurisprudência referida). O conjunto de indícios a que se recorre para esse objetivo inclui diferentes elementos, os primeiros, de ordem intelectual e de importância decisiva, destinados a demonstrar a indissociabilidade ou não dos elementos da operação em causa (Acórdão de 28 de fevereiro de 2019, Sequeira Mesquita, C 278/18, EU:C:2019:160, n.º 30) e o seu objetivo económico, único ou não [Acórdão de 2 de julho de 2020, Blackrock Investment Management (UK), C 231/19, EU:C:2020:513, n.º 34], os segundos, de ordem material e sem importância decisiva (v., neste sentido, Acórdão de 25 de fevereiro de 1999, CPP, C 349/96, EU:C:1999:93, n.º 31), que eventualmente vêm em apoio da analise dos primeiros elementos, como a acessibilidade separada (Acórdão de 17 de janeiro de 2013, BGŻ Leasing, C 224/11, EU:C:2013:15, n.º 43) ou conjunta (Acórdão de 8 de dezembro de 2016, Stock ’94, C 208/15, EU:C:2016:936, n.º 33) das prestações em causa ou a existência de uma facturação única (Despacho de 19 de janeiro de 2012, Purple Parking e Airparks Services, C 117/11, não publicado, EU:C:2012:29, n.º 34 e jurisprudência referida) ou distinta (Acórdão de 18 de janeiro de 2018, Stadion Amsterdam, C 463/16, EU:C:2018:22, n.º 27). 40 Em segundo lugar, uma operação económica constitui uma prestação única quando um ou mais elementos devem ser considerados como prestação principal, ao passo que, pelo contrário, outros elementos devem ser considerados uma prestação ou prestações acessórias que partilham do tratamento fiscal da prestação principal [Acórdão de 2 de julho de 2020, Blackrock Investment Management (UK), C 231/19, EU:C:2020:513, n.º 29 e jurisprudência referida]. 41 Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o primeiro critério a tomar em consideração a este respeito eì a inexistência de finalidade autónoma da prestação do ponto de vista do consumidor medio. Assim, uma prestação deve ser considerada acessória de uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si mesma, mas o meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador [Acórdão de 2 de julho de 2020, Blackrock Investment Management (UK), C 231/19, EU:C:2020:513, n.º 29 e jurisprudência referida]. 42 O segundo critério, que constitui, na realidade, um indício do primeiro, tem que ver com a tomada em consideração do valor respetivo de cada uma das prestações que compõem a operação económica, uma revelando-se mínima, ou mesmo marginal, relativamente aÌ outra (v., neste sentido, Acórdão de 22 de outubro de 1998, Madgett e Baldwin, C 308/96 e C 94/97, EU:C:1998:496, n.º 24). (...) 44 Quanto aÌ aplicabilidade a prestações como as que estão em causa no processo principal do primeiro tipo de excepção, referido no n.º 38 do presente acórdão, importa constatar, pela leitura da decisão de reenvio, que a recorrente no processo principal se dedica, entre outras, às atividades de gestão e exploração de instituições desportivas, bem como de manutenção e bem-estar físico, e que prestou, por intermédio de um profissional devidamente habilitado e certificado para esse efeito, serviços de acompanhamento nutricional nas suas instalações. 45. Além disso, resulta dos elementos indicados pelo órgão jurisdicional de reenvio que esses diferentes serviços prestados pela recorrente no processo principal eram objeto de facturação separada e que era possível usufruir de uns sem recorrer aos outros. 46. Assim, sob reserva de uma verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, afigura se que os serviços de manutenção e bem-estar físico, por um lado, e de acompanhamento nutricional, por outro, como prestados pela recorrente no processo principal, não estão indissociavelmente ligados na acepção da jurisprudência recordada nos n.ºs 38 e 39 do presente acórdão. 47. Por conseguinte, em princípio, háì que considerar que prestações como as que estão em causa no processo principal não constituem uma prestação única de carácter complexo. 48. Quanto aÌ aplicabilidade do segundo tipo de excepção, referido nos n.ºs 40 a 42 do presente acórdão, a prestações como as que estão em causa no processo principal, importa, no caso em apreço, salientar, por um lado, a finalidade autónoma da prestação de acompanhamento dietético do ponto de vista do consumidor medio. Mesmo que tais prestações de acompanhamento dietético fossem realizadas ou susceptíveis de o ser nas mesmas instituições desportivas que as prestações de manutenção e bem-estar físico, não eì menos verdade que a finalidade das primeiras não eì de ordem desportiva, mas sanitária e estética, não obstante o facto de uma disciplina dietética poder ter por efeito contribuir para a performance atlética. Por outro lado, como salientou a advogada geral no n.º 56 das suas conclusões, no processo principal, de acordo com a facturação da recorrente, 40 % do valor global mensal a pagar pelo cliente era imputado ao aconselhamento nutricional, percentagem que, manifestamente, não pode ser qualificada de mínima ou, a fortiori, de marginal. Prestações de acompanhamento dietético como as que estão em causa no processo principal não podem, portanto, ser consideradas acessórias em relação às prestações principais que são constituídas pelas prestações de manutenção e bem-estar físico. 49. Daqui decorre que, sem prejuízo de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, háì que considerar que prestações como as que estão em causa no processo principal são distintas e independentes umas das outras para efeitos da aplicação do artigo 2. °, n.º 1, alínea c), da Diretiva 2006/112.”
79. Em face da transcrição operada se conclui com meridiana clareza que a questão da acessoriedade das prestações aqui em causa está claramente resolvida na decisão tirada no Acórdão do TJUE (Terceira Secção) de 4 de Março de 2021, Processo n.º C-581/19, caso Frenetkexito, sendo que, no sentido da respectiva autonomização, donde, o Tribunal Arbitral Colectivo não acolhe a posição sustentada pela Requerida na sua defesa, negando estarmos perante prestações de serviços únicas nas quais a prestação de serviços de actividade física é a prestação principal e a prestação de serviços de nutrição é acessória daquela, revestindo a sua decomposição carácter artificial.
V.D.4.3) DO ENQUADRAMENTO PROPRIAMENTE DITO DAS CONSULTAS DE NUTRIÇÃO NA ISENÇÃO PREVISTA NO N.º 1 DO ART. 9.º DO CIVA:
80. A questão que agora importa trazer à colação e que foi colocada pela Requerida com muita acuidade é a de saber se, não obstante estarmos perante serviços prestados por nutricionista aos clientes da Requerente (que do ponto de vista meramente objectivo poderiam, em princípio e como visto, aproveitar a isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA), podem tais serviços beneficiar efectivamente daquela isenção, já que, tal como dito acima, só as prestações de serviços paramédicos que tenham finalidades terapêuticas podem subsumir-se na alçada da referida isenção.
81. Ou seja, garantido que esteja que as prestações que estão aqui em causa são levadas à prática com finalidades terapêuticas, teria de se admitir a aplicabilidade da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA àquelas operações ainda que elas se pudessem configurar, tão-só, como operações para fins de prevenção da saúde.
82. Vejamos então se as prestações realizadas pela Requerente são passiveis de se subsumirem à previsão da aludida norma de isenção prevista no art.º 9º do CIVA que tem por matriz a alínea c) do art.º 132º da Directiva IVA.
83. Tal como já aduzido, o Acórdão do TJUE de 10.9.2002, Kügler, Pº n.º C-141/00, não deixa de enfaticamente aludir à finalidade terapêutica que deve conformar as prestações que podem subsumir-se na previsão da alínea c), do n.º 1, ponto A, do art.º 13º do Sexta Directiva (numa interpretação actualista, alínea c) do art.º 132º da Directiva IVA), mas e isso não é de somenos, no caso sub judice, inclui também na alçada daqueles normativos as prestações de serviços que tenham por finalidade a prevenção da doença e já não somente a finalidade de diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar as doenças ou anomalias de saúde.
84. É claro que no que tange às prestações de serviços de nutrição como as que estão em causa no processo sub judice se pode colocar à dúvida sobre se elas prosseguem finalidades já não terapêuticas mas ao menos finalidades de prevenção da doença, não devendo olvidar-se, no entanto, que outros objectivos podem estar presentes quando se contratam tais prestações de serviços em contexto de ginásio, a saber, v.g.: i) relacionados com níveis de massa muscular; ii) relacionados com objectivos de perda de peso; iii) ou até relacionados com objectivos puramente estéticos e de imagem corporal.
85. E tal como está no Relatório de Inspecção os Serviços de Inspecção Tributária foram exactamente por aí concluindo no sentido de que os serviços de nutrição em causa nos autos estão sujeitos a IVA e dele não isentos por não se verificar quanto aos mesmos a finalidade terapêutica que constitui requisito para aplicação da isenção e partindo ainda da mera disponibilização dos serviços (não tendo a Requerente logrado demonstrar ter prestado todos os serviços que facturou e bem ao invés tendo até assumido não os ter prestado), advogam a inaplicabilidade da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA por não verificada a finalidade terapêutica que deve encerrar as prestações de serviços de nutrição que podem efectivamente beneficiar daquela isenção.
86. Claro está que a Requerida, na sua resposta, alinha pelo mesmo diapasão, ou seja, igualmente sustenta a ausência de finalidade terapêutica das prestações de serviços de nutrição em causa nos autos.
87. Adequado se mostrando trazer ainda à colação o Acórdão do TJUE (Terceira Secção) de 4 de março de 2021, Processo n.º C-581/19, disponível in
https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=238466&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=6682245 , sustentando-se que o mesmo versa sobre matéria de facto análoga à que está em apreciação no caso sub judice.
88. O referido Acórdão do TJUE, de 4 de Março de 2021, foi prolatado na sequência de pedido de decisão prejudicial, por decisão de 22.7.2019, firmado no Processo Arbitral que no CAAD tomou o n.º 504/2018-T é que deu entrada no TJUE em 30.7.2019.
89. O pedido de decisão prejudicial tinha por objeto a interpretação do art.º 2.º, n.º 1, alínea c), e do artigo 132. °, n.º 1, alínea c), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (Directiva IVA).
90. O Tribunal Arbitral decidiu suspender a instância e submeter ao TJUE as seguintes questões prejudiciais: “1) Nas hipóteses em que, como sucede nos autos, uma sociedade: a) se dedica, a título principal, a atividades de manutenção e bem estar físico e, a título secundário, a atividades de saúde humana, entre elas nutrição, consultas de nutrição e de avaliação física, bem como realização de massagens; b) disponibiliza aos seus clientes planos que incluem apenas serviços de fitness e planos que incluem serviços de fitness e nutrição, deveraì, para efeito do disposto no artigo 2.°, n.º 1, [alínea] c), da Diretiva [2006/112], considerar se que a atividade de saúde humana, designadamente nutrição, eì acessória da atividade de manutenção e bem estar físico, devendo, assim, ter a prestação acessória o mesmo tratamento fiscal da prestação principal ou deveraì considerar se, ao invés, que a atividade de saúde humana, designadamente nutrição, e a atividade de manutenção e bem estar físico são independentes e autónomas entre si, devendo ser lhes aplicável o tratamento fiscal previsto para cada uma dessas atividades? 2) A aplicação da isenção prevista no artigo 132. °, n.º 1, [alínea] c), da Diretiva [2006/112] pressupõe que os serviços aiì consignados sejam efetivamente prestados ou a mera disponibilização dos mesmos, de forma a que a sua utilização esteja unicamente dependente da vontade do cliente, eì suficiente para aplicação desta isenção?”
91. Como visto, o Tribunal Arbitral colocou a título prejudicial a questão da acessoriedade das actividades de saúde humana e de entre elas a nutrição, relativamente à actividade principal de manutenção e bem-estar físico e ainda a questão de saber se a aplicação da isenção prevista na alínea c) do artigo 132.°, da Directiva IVA, pressupunha que os serviços aiì consignados fossem efetivamente prestados ou a mera disponibilização dos mesmos, de forma a que a sua utilização estivesse unicamente dependente da vontade do cliente, era suficiente para efeitos de aplicabilidade da aludida isenção.
92. Ainda assim e não obstante quer o TJUE quer mesmo a Advogada-Geral, (as conclusões estão disponíveis in
https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=232743&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=6682245) vão além do pedido e pronunciam-se sobre a aplicabilidade da isenção prevista na alínea c) do art.º 132º da Directiva IVA e no n.º 1 do art.º 9º do CIVA às prestações de serviços de nutrição, discorrendo sobre se devem ou não ser qualificadas como prestações de serviços de assistência para efeitos daqueles normativos.
93. Diz dado passo a Advogada-Geral Juliane Kokott como segue: “59. Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, em substância, saber se a isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva IVA também se aplica quando o acompanhamento nutricional, embora tendo sido pago, não tenha sido utilizado. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio parte manifestamente do princípio de que as prestações de serviços de acompanhamento nutricional da requerente estão abrangidas pela isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva IVA. 60. Isto é, contudo, duvidoso em consonância com o entendimento da Comissão. Para beneficiar dessa isenção, seria necessário que se verificasse uma prestação de serviços de assistência (58). Só são abrangidas pelo conceito de prestações de serviços de assistência as prestações que tenham por finalidade diagnosticar, tratar e, na medida do possível, curar doenças ou problemas de saúde (59). É, portanto, condição que estas tenham uma finalidade terapêutica (60). 61. Isso não acontece num acompanhamento nutricional geral. É certo que o Tribunal de Justiça concebe a finalidade terapêutica de forma ampla, aceitando também medidas de prevenção destinadas a proteger ou a manter a saúde (61). Estas devem, todavia, destinar-se a impedir, evitar ou prevenir uma doença, uma lesão ou anomalias de saúde, ou detetar doenças latentes ou incipientes (62). Uma relação incerta, sem risco concreto de prejuízo para a saúde, é tão insuficiente neste caso (63) quanto uma finalidade puramente estética (64). Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se a prestação de serviços de acompanhamento visa a prevenção de determinadas doenças e o seu tratamento, ou se visa apenas o bem-estar geral ou a aparência (65). 62. A questão de saber se a isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva IVA exige que se usufrua efetivamente da prestação só excecionalmente será relevante. A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou, noutro contexto, que a apreciação, para efeitos de IVA, de uma prestação de serviços não depende da questão de saber se o prestador se limita a colocá-la à disposição ou se a fornece efetivamente (66). 63. No entanto, não é de modo algum evidente que esta jurisprudência possa ser transposta para a isenção específica prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva IVA. Com efeito, esta isenção pressupõe uma finalidade terapêutica da prestação, o que no contexto de um acompanhamento nutricional pago, mas não utilizado, se afigura bastante duvidoso. Esta questão pode ser deixada em aberto no presente processo. Só se colocaria se o órgão jurisdicional de reenvio tivesse chegado à conclusão, e explicasse porquê, de que o acompanhamento nutricional aqui em causa é uma prestação de serviços com finalidade terapêutica. Contudo, o órgão jurisdicional de reenvio não formula essa conclusão.”
94. Já o TJUE, nos pontos 20 e 21 da fundamentação do Acórdão, diz: “20. Antes de mais, há que observar que o órgão jurisdicional de reenvio, ao colocar as suas questões, parece ter partido da premissa de que um dos tipos de serviços prestados no processo principal, a saber, o serviço de acompanhamento nutricional, era suscetível de ser abrangido pelo âmbito de aplicação da isenção prevista no artigo 132. °, n.º 1, alínea c), da Diretiva 2006/112. 21. Importa, portanto, a título preliminar, verificar a exatidão desta premissa, defendida pela recorrente no processo principal, mas contestada pelo Governo português e atenuada pela Comissão Europeia.”
95. Inferindo-se daqui, com meridiana clareza que quer a Advogada-Geral quer o TJUE foram para além das questões prejudiciais colocadas.
96. Tal como acima referido, a Advogada-Geral afirmava nas suas conclusões que o órgão jurisdicional de reenvio partiu do pressuposto da aplicabilidade da isenção prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 132.º da Directiva IVA.
97. No entanto, a Advogada-Geral considerava duvidosa a verificação de tal pressuposto.
98. E partindo daí e tentando demonstrá-lo, chamou à discussão jurisprudência sobre a questão da interpretação que vem sendo dada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia sobre os contornos do conceito de assistência, dizendo que é condição que as respetivas prestações tenham finalidade terapêutica.
99. Admite, não obstante, que o tribunal vem interpretando o conceito de finalidade terapêutica de forma ampla, aceitando que ainda se podem subsumir naquele conceito operações de prevenção destinadas a proteger ou a manter a saúde.
100. Por outro lado, a Advogada-Geral diz ainda que o TJUE já declarou que a apreciação, para efeitos de IVA, de uma prestação de serviços não depende da questão de saber se o prestador se limita a coloca-la a disposição ou se a fornecê-la efetivamente.
101. E partindo daqui diz que não é de modo algum evidente que esta jurisprudência possa ser transposta para a isenção prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 132º da Directiva IVA.
102. Inferindo o Tribunal Arbitral Colectivo daqui que uma coisa é a questão da exigibilidade e do facto gerador do IVA; outra, bem distinta, é a transposição da regra da mera disponibilização para a aplicabilidade da isenção prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 132º da Directiva IVA e, portanto, a sua transposição para o direito interno, ou seja, para a isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA.
103. A questão da mera disponibilização das prestações de serviços de nutrição, i.e., a circunstância de alguns ou boa parte dos clientes da aqui Requerente não aceder sequer às prestações de serviços que lhes eram disponibilizadas, não pode deixar de ter reflexos na questão da avaliação sobre se em concreto a finalidade terapêutica associada às prestações de serviços de nutrição está ou não verificada.
104. Dito de outro modo, se as prestações de serviços de nutrição não são sequer realizadas, então, em princípio, não se lhes pode conferir finalidade terapêutica para efeitos da aplicabilidade da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA.
105. Ademais, dos considerandos nºs 30 e 31 da fundamentação do Acórdão no Tribunal de Justiça da União Europeia de 4 de Março de 2021, parece resultar que a finalidade terapêutica dos serviços de acompanhamento nutricional tem de ser convenientemente demonstrada e provada, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.
106. E em face do que está no probatório resultou clarividente para o Tribunal Arbitral Colectivo que a finalidade terapêutica das prestações em causa nos autos (todas) não ficou minimamente demonstrada.
107. Além de que do considerando n.º 32 da fundamentação do Acórdão resulta ainda que aquele tribunal (o TJUE) admite que há duas tipologias de serviços nutrição: i) Os prestados com uma finalidade terapêutica; ii) Os desprovidos de tal finalidade.
108. Sendo que os prestados como os que estão em causa no processo, ou seja, os prestados em ginásio (em instituições desportivas) e eventualmente no âmbito de planos que incluem igualmente serviços de manutenção e bem-estar físico, pertencem, no entendimento do TJUE, aos da segunda tipologia de serviços de nutrição identificados em ii).
109. Para o TJUE os serviços de acompanhamento nutricional como os prestados no processo C-581/19 não podem subsumir-se na isenção prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA.
110. Não devendo olvidar-se que a interpretação sancionada pelo TJUE claramente afronta a que é defendida pela Requerente, ancorada além do mais em pareceres que estão junto aos autos da autoria da Professora Doutora Clotilde Celorico Palma.
111. A questão de finalidade terapêutica associada à realização (ou não) das prestações de serviços de nutrição é a questão determinante que entende o Tribunal Arbitral Colectivo se pode retirar da jurisprudência Fernetikexito.
112. A Professora Doutora Clotilde Celorico Palma diz no seu parecer que cumpre aos nutricionistas devidamente habilitados, no exercício da sua profissão, assegurar a assistência aos seus pacientes dentro dos parâmetros de qualidade exigidos na lei, sendo tal exercício objeto de adequada fiscalização.
113. O Tribunal Arbitral Colectivo concorda rigorosamente com esta conclusão, no entanto, a questão que se coloca é saber como é que isto se compagina com a falta de realização dalgumas das consultas.
114. No parecer datado de 19.3.2021, diz-se a dado passo que a jurisprudência da União Europeia em matéria de IVA é muito extensa, devendo os aplicadores da lei segui-la quando seja suficientemente clara de forma a que não deixe dúvidas quanto à respectiva interpretação, o que, no entendimento daquela, não sucede com a jurisprudência resultante do caso Frenetikexito.
115. O Tribunal Arbitral colectivo discorda frontalmente desta asserção.
116. A conclusão que se pode extrair da jurisprudência Frenetikexito de que as prestações de serviços de nutrição como as que são realizadas nos presentes autos não caem na alínea c) do nº 1 do artigo 132º da Directiva IVA é suficientemente clara e não deixa grandes dúvidas de interpretação.
117. Naquele parecer de 19.3.2021, aduz-se ainda no sentido de que a atividade de aconselhamento/consultas de nutrição prestada em ginásios, quando realizada por profissionais devidamente habilitados que envolvam a prática de atos de prevenção e/ou de tratamento de patologias relacionadas com a saúde, em cumprimento do disposto na norma de atuação profissional da Ordem dos Nutricionistas (NOP 02/2019) 11, como o aconselhamento nutricional, a elaboração de um plano alimentar personalizado, análise da composição corporal, do historial clínico e do modo de vida do utente, bem como medições biométricas, só pode ser vista como acto terapêutico isento IVA nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 9º do código do IVA. Diz-se ainda só assim se pode respeitar o entendimento que tem vindo a ser adotado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia na área da saúde em geral, bem como pelos nossos tribunais e pela Administração Tributária, fazendo-se respeitar o princípio da neutralidade em sede deste imposto que nomeadamente postula que prestações de serviços idênticas devem ter um tratamento idêntico.
118. O Tribunal Arbitral Colectivo concorda em parte com a Doutora Clotilde Celorico Palma.
119. Diverge, no entanto, na parte em que para este Tribunal as consultas não realizadas possam beneficiar de tal enquadramento.
120. Fundados nas conclusões da Advogada-Geral e até no Acórdão tirado no caso Frenetikexito, a questão que se deve trazer à colação é a de saber onde é que, sendo assim, está demonstrada a finalidade terapêutica?
121. A Doutora Clotilde Palma refere expressamente no seu parecer que não é o facto de tais serviços serem prestados em ginásios ou até de não serem realizados pela circunstância de os utentes faltarem às consultas que as conclusões a extrair devem ser distintas.
122. Discordamos veementemente desta asserção, já que, para nós, se as consultas se não realizarem não pode ficar demonstrada a finalidade terapêutica associada a tais operações e, por isso mesmo, está em causa a aplicabilidade da isenção prevista no artigo 9º do código do IVA.
123. No parecer de 19.3.2021 diz-se ainda que em conformidade com interpretação que o Tribunal de Justiça da União Europeia tem vindo a fazer das regras vindas de enunciar da Diretiva IVA, regra geral, a partir do momento em que o serviço de nutrição é disponibilizado e faturado, deve, como tal, ser considerado como prestado, independentemente de o utente vir materialmente a utilizá-lo.
124. O Tribunal não pode deixar de concordar, mas a questão que se coloca é a de saber se a ausência de realização da consulta tem interferência na questão do objetivo terapêutico e do ponto de vista do Tribunal, as consultas de nutrição não realizadas não podem ter associada tal finalidade terapêutica.
125. A ausência de realização das consultas tem interferência na finalidade terapêutica e, por isso, coloca em causa, liminarmente, a aplicabilidade da isenção.
126. Remata a Doutora Clotilde Palma no parecer de 19.3.2021 como segue: “no caso de um utente não usufruir das consultas de nutricionismo não se poderá concluir que os serviços não foram prestados, recusando-se a aplicação da isenção. A partir do momento em que o serviço de nutrição é disponibilizado e faturado, deve, como tal, de acordo com as regras do IVA, ser considerado como prestado, independentemente de o utente não vir a frequentar alguma consulta.” O Tribunal até podia aceitar a conclusão, no entanto, dirá: só não se pode aplicar a isenção por não verificação do objectivo terapêutico associado à prestação de serviços realizada.
127. Isto dito se conclui no sentido de que se os serviços de acompanhamento nutricional, como os que estavam em causa no processo C-581/19, não podem, para o TJUE, subsumir-se na isenção prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA, donde, os que estão em causa nos presentes autos, porquanto rigorosamente iguais, não podem também subsumir-se na isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA.
128. E assim sendo o Tribunal Arbitral Colectivo não pode deixar de acompanhar tal asserção do TJUE, louvando-se, aliás, naquele arresto para decidir no sentido referido, ou seja, considerando também que os serviços de nutrição como os que estão em causa nos presentes autos não podem beneficiar da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA, por manifesta ausência de verificação do requisito objectivo da finalidade terapêutica.
129. Não devendo olvidar-se que as decisões do TJUE constituem fonte de direito imediata, logrando-se, com isso, a desejável uniformidade e harmonização na aplicação do direito comunitário no espaço físico da união europeia.
130. E também que a jurisprudência do TJUE (aqui chamada à colação) não pode deixar de beneficiar do chamado “precedente vinculativo” na medida em que vincula todos os tribunal nacionais do Estados-membros tal como resulta do acórdão do TJUE de 15 de Julho de 1964, Pº Costa/Enel – 6/64, disponível in https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:61964CJ0006&from=NL .
131. E ainda da vigência do princípio da interpretação conforme com o direito da União, que decorre da interpretação que o TJUE faz das disposições conjugadas dos artigos 4.º, n.º 3 do TUE e 288.º, n.º 3 do TFUE.
132. Tal princípio impõe que o intérprete ou aplicador do direito nacional atribua às disposições nacionais um sentido conforme ou compatível com as disposições do direito da União. E quanto ao sentido e alcance deste princípio, no acórdão Von Colson , o TJUE entendeu que a obrigação de interpretação da norma nacional que transpõe uma diretiva, em conformidade com o texto e objetivo daquela, obriga o juiz nacional a dar prioridade ao método – de entre os métodos de interpretação permitidos pela ordem jurídica interna – que lhe permita atribuir à disposição nacional em causa uma interpretação compatível com a Directiva.
133. Concluindo-se com meridiana clareza no sentido de que não apenas as prestações de serviços em causa não estão isentas de IVA, ao abrigo da al. 1) do artigo 9.º do CIVA, por ausência de demonstração de que presidiu à realização de tais prestações de serviços uma finalidade terapêutica, ónus que impendia sobre a Requerente nos termos e em conformidade com o disposto no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, mas também que a legalidade dos atos tributários se encontra corretamente fundamentada, do ponto de vista material, com base nessa falta de demonstração do fim terapêutico das prestações de serviços aqui em causa.
V.E) PEDIDO SUBSIDIÁRIO:
134. Improcedendo o pedido de pronúncia arbitral quanto ao pedido principal, há que apreciar o pedido subsidiário formulado pela Requerente.
135. De harmonia com o preceituado no artigo 554.º, n.º 1, do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, «diz-se subsidiário o pedido que é apresentado ao tribunal para ser tomado em consideração somente no caso de não proceder um pedido anterior».
136. A Requerente entende que o imposto liquidado adicionalmente pela Requerida deveria ter sido liquidado por dentro em conformidade com o disposto no art.º 49.º do CIVA.
137. O valor correspondente foi determinado pela Requerente como segue: “(...) o apuramento da base tributável correspondente seria obtido através da divisão do valor recebido dos clientes por 123 (taxa normal de IVA de 23%) e multiplicando o quociente por 100. Assim, teríamos: Base Tributável = [valor recebido dos utentes/123] x 100, ou seja, Base Tributável = [€ 653.725,75 Euros /123] x 100 = € 531.484,35, sendo o montante global do IVA devido de € 122.241,40 (€ 531.484,35 x 23%) e não € 150.356,92.”
138. Fundamentando tal posição interpretativa alinham o seguinte argumentário: i) Os serviços de nutrição foram prestados a consumidores finais e, como tal, o valor cobrado pela Requerente aos seus clientes constituiu o preço final que retribui as referidas prestações de serviços; ii) aplicando-se IVA sobre o preço final cobrado aos clientes, os respectivos consumidores finais teriam de suportar o imposto liquidado adicionalmente, criando distorções ao nível do seu bem-estar económico com o emergente encargo adicional; iii) em termos práticos essa repercussão de imposto para os consumidores finais seria impossível; iv) a Requerente teria de suportar a final o IVA liquidado adicionalmente, o que violaria os mais elementares princípios de funcionamento do imposto, nomeadamente o da neutralidade.
139. Sobre esta questão já se pronunciou o TJUE em decisão tirada nos processos n.ºs C-249/12 e C-250/12, caso Tulicã e Plavoºin, Acórdão do TJUE de 07.11.2013, cujo sumério diz: “A Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, nomeadamente os seus artigos 73.º e 78.º, deve ser interpretada no sentido de que, quando o preço de um bem tenha sido determinado pelas partes sem menção do imposto sobre o valor acrescentado e o fornecedor do referido bem seja o devedor do imposto sobre o valor acrescentado devido sobre a operação tributada, e caso o fornecedor não tenha a possibilidade de recuperar junto do adquirente o imposto sobre o valor acrescentado reclamado pela administração fiscal, se deve considerar que o preço convencionado já inclui o imposto sobre o valor acrescentado.”
140. Os pontos 32. a 38 da fundamentação do aludido Acórdão dizem: “32. A esse propósito, importa recordar que resulta dos artigos 1.º, n.º 2, e 73.º da diretiva IVA que o princípio do sistema comum do IVA consiste em aplicar aos bens e aos serviços um imposto geral sobre o consumo exatamente proporcional ao preço destes e que o valor tributável inclui tudo o que constitui a contraprestação recebida ou a receber pelo fornecedor de bens ou pelo prestador de serviços em relação às operações pretendidas pelo adquirente, destinatário ou por um terceiro. O artigo 78.º dessa diretiva enumera certos elementos que devem ser incluídos no valor tributável. Segundo o artigo 78.º, alínea a), da referida diretiva, o IVA não é deve ser incluído no referido valor. 33. Em conformidade com a norma geral enunciada no artigo 73.º da diretiva IVA, o valor tributável numa entrega de um bem ou numa prestação de um serviço, efetuadas a título oneroso, é constituído pela contraprestação realmente recebida para esse efeito pelo sujeito passivo. Essa contraprestação constitui o valor subjetivo, a saber, realmente recebido, e não um valor estimado segundo critérios objetivos (v., nomeadamente, acórdãos de 5 de fevereiro de 1981, Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats, 154/80, Recueil, p. 445, n.º 13, e de 26 de abril de 2012, Balkan and Sea Properties e Provadinvest, C-621/10 e C-129/11, n.º 43). 34. Essa regra deve ser aplicada em conformidade com o princípio de base da referida diretiva, que reside no facto de o sistema do IVA ter como objetivo onerar unicamente o consumidor final (v., nomeadamente, acórdão Elida Gibbs, já referido, n.º 19, e despacho de 9 de dezembro de 2011, Connoisseur Belgium, C-69/11, n.º 21). 35. Ora, quando um contrato de compra e venda tiver sido celebrado sem menção do IVA, na hipótese de o fornecedor, segundo o direito nacional, não poder recuperar junto do adquirente o IVA posteriormente exigido pela administração fiscal, considerar que a totalidade do preço, sem dedução do IVA, constitui a base a que o IVA se aplica teria a consequência de o IVA onerar esse fornecedor e colidir, portanto, com o princípio de que o IVA é um imposto sobre o consumo, que deve ser suportado pelo consumidor final. 36. Essa tomada em consideração colidiria, por outro lado, com a regra segundo a qual a administração fiscal não poderá cobrar um montante de IVA superior ao que foi recebido pelo sujeito passivo (v., nomeadamente, acórdãos Elida Gibbs, já referido, n.º 24; de 3 de julho de 1997, Goldsmiths, C-330/95, Colet., p. I-3801, n.º 15, e Balkan and Sea Properties e Provadinvest, já referido, n.º 44).37. Em contrapartida, isso não sucederia se o fornecedor tivesse, segundo o direito nacional, a possibilidade de adicionar ao preço estipulado um suplemento correspondente ao imposto aplicável à operação e de o recuperar junto do adquirente do bem. 38. Além disso, importa sublinhar que uma das caraterísticas essenciais do IVA reside no facto de esse imposto ser exatamente proporcional ao preço dos bens e serviços em causa. Isso implica que todos os fornecedores contribuem para o pagamento do IVA na mesma proporção face à totalidade do montante recebido pelos bens vendidos.”
141. A decisão jurisprudencial vinda de transcrever tem claramente aplicação no caso sub judicio.
142. É que, não pode olvidar-se, a Requerente contratou com os seus clientes um preço global, IVA incluído, pelos serviços prestados, sendo que a liquidação do IVA “fora" da contraprestação viola frontalmente o conceito de "contraprestação recebida".
143. Os Serviços de Inspeção Tributária, no seu RIT, calculam o imposto considerado em falta, com base num preço que, de modo algum, reflete o que foi contratualizado e efetivamente pago pelo consumidor final, atento o princípio da liberdade contratual e da autonomia da vontade.
144. A matéria coletável na entrega de um bem ou na prestação de um serviço, efetuadas a título oneroso, é constituída pela contrapartida realmente recebida paro o efeito pelo sujeito passivo, como resulta dos artigos 273.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28.11.2006, e 16.º, n.ºs 2 e 4, e 49.º , n.º 2, do CIVA, sendo que o tribunal arbitral considera que as razões aduzidas para a impossibilidade de repercussão hoje do imposto liquidado adicionalmente pela AT são ponderosas e devem ser aceites.
145. Inclusivamente, tratando-se mensalidades periódicas cobradas pela Requerente, já terá transcorrido integralmente o prazo legal de prescrição de cinco anos, previsto no artigo 310.º, alínea g), do Código Civil, relativamente a boa parte das prestações em causa.
146. Pelo exposto, aplicando-se a referida jurisprudência do TJUE, deve proceder o pedido subsidiário, sendo de anular parcialmente as liquidações impugnadas.
147. O Acórdão do Pleno do STA de 10.4.2013, tirado no Processo n.º 0298/12, fixa jurisprudência no sentido de que o acto de liquidação enquanto acto divisível é susceptível de anulação parcial.
148. Inferindo-se daquela decisão que a anulação parcial dos actos tributários é juridicamente admissível quando aqueles enfermem de ilegalidade meramente parcial, ou seja, quando o fundamento da anulação se aplique apenas a uma parte do acto e não à sua totalidade.
149. In casu, a AT liquidou IVA relativamente às operações ligadas à nutrição que no seu entender não poderiam beneficiar da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA, mas, face à jurisprudência Tulicã e Plavoþin só parte do valor tributável levado em consideração poderia ter sido relevado, ou seja, a AT, tendo apurado o valor tributável ligado às operações de nutrição aqui em causa, deveria ter “retirado por dentro” o respectivo imposto, aplicando o art.º 49º do CIVA, i.e., dividindo o valor da contraprestação recebida pelo sujeito passivo por 1,23 e, apurado o respectivo valor tributável, só aplicando IVA a tal base tributável e não, como fez, considerando todo o valor recebido como contraprestação pelos serviços de nutrição, fazendo acrescer àquele valor recebido o correspondente IVA que está a ser sindicado nos autos.
150. Assim sendo, considera o tribunal arbitral que a ilegalidade que está a afectar os actos de liquidação sindicados não os afecta no seu todo.
151. A redução do valor tributável das operações em causa facilmente se pode apurar pela divisão por 1,23 das bases tributáveis consideradas pela AT, não exigindo a prática de novos actos de liquidação, aceitando-se como bons os cálculos acima explicitados e produzidos pela Requerente.
152. Tudo ponderado, decide-se pela procedência meramente parcial do pedido subsidiário apresentado pela Requerente e só pela anulação parcial dos actos de liquidação sindicados. Devendo anular-se as liquidações de IVA sindicadas em 28.115,52 € e proporcionalmente, em valor correspondente, as liquidações de juros Compensatórios igualmente aqui sindicadas.
V.F) QUESTÕES DE CONHECIMENTO PREJUDICADO:
153. Julgando-se improcedente o pedido principal e parcialmente o pedido subsidiário, tal como já se deixou antever, fica assegurada a tutela eficaz dos interesses da Fazenda, donde, fica prejudicada, por inútil, a apreciação da excepção da incompetência do tribunal suscitada pela Requerida para apreciar o pedido na parte relativa à anulação do processo executivo n.º ...2020... e Apensos e à anulação do processo contra-ordenacional n.º ...2020... em conformidade com o disposto nos artºs 130.º e 608.º, n.º 2 do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no art.º 29.º, n.º 1 do RJAT.
V.G) SOBRE O PEDIDO DE CONDENAÇÃO DA REQUERIDA COMO LITIGANTE DE MÁ-FÉ:
154. Neste ponto também não descortinamos razão para divergir (ou aditar o que quer que seja) da decisão prolatada no Processo n.º 380/2020-T que tramitou no CAAD e foi junta aos autos pela requerida com as alegações finais, pelo que, vamos reproduzir ipsis verbis tudo quanto a tal propósito foi ali doutamente explicitado.

155. Diz no seu ponto 4.3 a aludida decisão arbitral: “A LGT prevê̂ a condenação da AT em sanção pecuniária a quantificar de acordo com as regras sobre a litigância de maì-féì, em caso de actuação em juízo contra o teor de informações vinculativas prestadas aos interessados, ou quando o seu procedimento divirja do habitualmente adotado em situações idênticas (v. artigo 104.º, n.º 1 da LGT, ex vi artigo 29.º, n.º 1, al. a) do RJAT). No mais, o regime da litigância de maì-féì encontra-se regulado no Código de Processo Civil (“CPC”), subsidiariamente aplicável ao processo tributário e ao processo arbitral (v. artigo 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT, artigo 2.º, al. d) da LGT, artigo 2.º, al. e) do CPPT, e acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 8 de janeiro de 2020, processo n.º 0952/18.4BEPRT). De acordo com o disposto no artigo 542.º, n.º 2 do CPC, considera-se litigante de maì-féì quem: i) deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; ii) alterar a verdade dos factos ou omitir factos relevantes para a decisão da causa; iii) tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; iv) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão. No caso, a Requerente pede a condenação da Requerida em litigância de maì-féì, por considerar que esta invocou na sua Resposta factos novos, atinentes aÌ prova da finalidade terapêutica dos serviços de nutrição, que, não tendo constituído fundamento das liquidações, nem poderia sequer ser discutida nesta fase. Contudo, como atrás se salientou, a questão da ausência de fim terapêutico específico dos serviços de nutrição – acompanhamento nutricional e consultas – eì por diversas vezes mencionada no relatório de inspecção, pelo que não se trata de um argumento inovador, independentemente de existirem outros vertidos no mesmo relatório, como o tema da acessoriedade dos serviços de nutrição em relação aÌ atividade de exercício físico (ginásio). Por outro lado, a informação vinculativa invocada pela Requerente foi prestada a outra entidade, a um outro sujeito passivo, pelo que não existe a obrigação (prevista no artigo 68.º n.º 14 da LGT) de a Requerida agir em conformidade com essa informação. Deste modo, não se verifica a violação de deveres de verdade e probidade por parte da Requerida, quer por esta não ter prestado aÌ Requerente uma informação vinculativa que possa fundar a indemnização por litigância de maì-féì prevista no artigo 104.º, n.º 1 da LGT, quer por não se identificar uma actuação processual [da Requerida] passível de enquadramento em qualquer das situações tipificadas no artigo 542.º, n.º 2 do CPC. Aliás, constando do relatório de inspecção diversas passagens alusivas ao facto de, no entender da Requerida, os serviços de nutrição em questão não terem objetivos terapêuticos, encontrando-se, por isso, excluídos do âmbito de aplicação da isenção de IVA, como resulta da transcrição parcial do mesmo na matéria de facto supra, o desvio da pauta da boa féì, a existir, seria da Requerente e não da Requerida.”
156. Assim sendo e apropriando-se mais uma vez o presente Tribunal Arbitral colectivo do argumentário esgrimido na decisão acima melhor identificada, não pode deixar de improceder também o pedido de condenação da Requerida como litigante de maì-féì.
VI. DECISÃO:
face ao exposto, acordam os árbitros deste tribunal arbitral em:
a) julgar improcedente o pedido principal de anulação dos actos tributários de liquidação de iva e de juros compensatórios supra identificados, com as legais consequências;
b) julgar parcialmente procedente o pedido subsidiário apresentado pela requerente, anulando-se parcialmente os actos de liquidação sindicados;
c) julgar improcedente o pedido de condenação da requerida como litigante de má-fé. (…)
declaração de voto
Acompanhando o Tribunal em tudo o mais, votei, no entanto, vencida quanto à decisão relativa ao pedido subsidiário e à respetiva consequência em matéria de custas.
Na verdade, a apesar de também acompanhar o Tribunal quanto à formula que a AT deveria ter adoptado para o apuramento do IVA nas correções efectuadas, i.e., que a AT, que a AT deveria ter “retirado por dentro” o respectivo imposto, aplicando o art.º 49º do CIVA, , dividindo o valor da contraprestação recebida pelo sujeito passivo por 1,23 e, apurado o respectivo valor tributável, só aplicando IVA a tal base tributável, considero que também este pedido deveria ter improcedido na totalidade, por entender que a respetiva procedência implica a prática de um ato de liquidação.
Na verdade, embora a anulação com este fundamento não inviabilize a emissão de novas liquidações, em sede de execução de julgados a anulação das liquidações impugnadas tem de ser total e os Tribunais têm de limitar-se a declarar a ilegalidade de actos, como decorre do artigo 2.º, n.º 1, do RJAT.
Por isso, quando os actos assentam num fundamento ilegal, deve ser declarada a sua anulação, cabendo à Administração Tributária, em sede de execução do julgado, no âmbito do preceituado no artigo 24.º, n.º 1, do RJAT, decidir se pode e deve ou não praticar novos actos com uma fundamentação diferente, assegurando aos contribuintes todos os direitos de defesa que a lei lhes reconhece e se não tiver, entretanto, sido ultrapassado o prazo de caducidade que a lei fixa para o exercício desse direito.
Não pode o Tribunal Arbitral substituir-se à Administração Tributária, mantendo parcialmente na ordem jurídica esses actos com uma fundamentação diversa daquela que neles consta, o que equivaleria à emissão de novos actos de liquidação com supressão da possibilidade de invocação pelo contribuinte de todos os meios de impugnação administrativa e contenciosa que lhe são assegurados pela lei.”

***

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Impugnante não se conforma com a decisão arbitral proferida no âmbito do processo nº593/2020-T, datada de 13 de setembro de 2021, que julgou improcedente o pedido principal de anulação dos atos tributários de liquidação de IVA e de JC, referentes aos períodos de janeiro de 2016 a julho de 2016, bem como aos períodos de setembro de 2016 a dezembro de 2016 no valor total de €170.128,42 e julgou parcialmente procedente o pedido subsidiário anulando, em conformidade e parcialmente os aludidos atos de liquidação.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto, no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações da impugnação definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões da impugnação cumpre apreciar se a decisão arbitral padece de nulidade por:

· Excesso de Pronúncia;

· Contradição entre os fundamentos e a decisão;

· Omissão de Pronúncia e falta de fundamentação.

Apreciando.

Em termos de regime da arbitragem voluntária em direito tributário, introduzido pelo Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT), o expediente processual de reação à decisão dos Tribunais Arbitrais para os Tribunais Centrais Administrativos, consiste na dedução de impugnação, consagrada no artigo 27.º, com os fundamentos enunciados, taxativamente, no artigo 28.º, nº 1 e que infra se enumeram:

a-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

b-Oposição dos fundamentos com a decisão;

c-Pronúncia indevida ou omissão de pronúncia;

d-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16.º, nº 2 .

Ora, subsumindo-se as arguidas nulidades, no citado normativo, concretamente, nas alíneas b), e c), vejamos, então, se as mesmas procedem.

Comecemos, então, pelo Excesso de Pronúncia.

Como visto, a aludida nulidade integra o elenco taxativo constante no artigo 28.º, nº1, alínea c), do RJAT, sendo que a mesma se encontra, igualmente, contemplada no artigo 125.º do CPPT, sob a epígrafe de “nulidades da sentença” do qual resulta que: “ 1 Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.”

Sendo, outrossim, de convocar o plasmado no artigo 615.º alíneas d) e e) do CPC, em obediência ao preceituado no n.º 2 do artigo 608.º do CPC, o qual dispõe que é nula a sentença quando: “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento” e bem assim quando “o juiz condene em quantidade superior ou objeto diverso do pedido”.

Ab initio, importa relevar que a nulidade por excesso de pronúncia ocorre sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido, ou seja, ela ocorre sempre que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes, quando o tribunal condene ou absolva num pedido não formulado, bem como quando conheça de pedido em excesso parcial ou qualitativo, mormente, quando, utilizando fundamentos admissíveis, aprecie de um pedido que é quantitativa ou qualitativamente distinto daquele que foi formulado pela parte, condenando em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido (1-Vide José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora: 2008, pág.61 e 62; vide, designadamente, Ac. TCA Sul, 02.07.2013, processo 6505/13.).

Nessa medida, se o juiz conhece de questão, que o Autor e Réu não lhe submeteram, ou condena em objeto diverso do pedido, a decisão enferma de vício, por excesso, pois o juiz exorbitou a sua atividade indo para além do seu pedido de parte (extra petitum).

Note-se que, não obstante o Tribunal não estar sujeito às alegações das partes, no que diz respeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cfr. artigo 5.º, nº 3, do CPC), a verdade é que em ordem ao consignado no artigo 609.º, nº1 do CPC, a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.

Neste particular, importa, ainda, relevar que o conceito de pronúncia indevida previsto na primeira parte da alínea c), do nº1, do artigo 28.º do RJAT como fundamento de impugnação da decisão arbitral é mais abrangente que o excesso de pronúncia previsto no citado artigo 615.º, e bem assim do normativo 125.º do CPPT. Com efeito, no aludido regime jurídico o legislador pretendeu abranger duas situações, uma primeira que compreende as situações em que o tribunal arbitral conhece de questões de que não podia conhecer, ou seja, ultrapassando os limites do princípio do dispositivo a nível decisório, condenando além do pedido-excesso de pronúncia e outra sempre que o Tribunal Arbitral conhece sem o poder ter feito, por existir um vício que inquinou a sua constituição ou porque decidiu fora das suas competências (2-Vide, designadamente, Ac. TCAS, processo nº 09286/16, de , 28.04.2016.).

Feitos estes considerandos, importa apreciar da bondade da pretensão da Impugnante.

A Impugnante evidencia, desde logo, que a decisão arbitral incorreu em excesso de pronúncia, quanto à decisão de que os serviços de nutrição não têm finalidade terapêutica quando prestados conjuntamente com os serviços de ginásio, porquanto essa não foi, efetivamente, a fundamentação contemporânea constante no Relatório de Inspeção Tributária.

Densifica, para o efeito, que os fundamentos do aludido Relatório de Inspeção Tributária coadunam-se apenas com a questão da acessoriedade dos serviços de nutrição quando estes eram vendidos conjuntamente com os serviços de ginásio e daí não beneficiarem da isenção nos termos do artigo 9.º do CIVA. Conclui, assim, que foi alargado o “thema decidendum” à questão de finalidade terapêutica das mesmas consultas.

Advoga, ainda a propósito do excesso de pronúncia, que a AT anulou parcialmente as notas de liquidação ao considerar parcialmente procedente o pedido subsidiário da Recorrente sem que, no entanto, tenha competência para o efeito.

Ora vejamos.

In casu, a decisão incorrida não incorreu na arguida nulidade, visto que em nada ultrapassou os seus poderes de cognição.

Com efeito, mediante uma leitura atenta da decisão arbitral visada, conjugada com a petição inicial, verifica-se que em ordem às causas de pedir elencadas na petição inicial, e ao concreto pedido, o Tribunal Arbitral em nada exorbitou o pedido e o seu âmbito de atuação.

In casu, a questão sindicada coadunava-se com o enquadramento em sede de IVA dos serviços dietéticos/nutrição realizados pela aqui Impugnante, tendo esta sindicado a ilegalidade das correções por entender que a AT tinha incorrido em errónea apreciação dos pressupostos de facto e de direito, porquanto as aludidas prestações de serviços realizadas aos seus clientes, deviam beneficiar da isenção prevista no n.º 1 do artigo 9.º do CIVA.

Sendo que, subsidiariamente e por mera cautela, advoga um erro quanto ao próprio cômputo e que intitula como “liquidação do IVA por dentro”.

Ora, atentando na decisão visada verifica-se que o Tribunal Arbitral começa por indicar a ordem do conhecimento dos vícios imputados às liquidações sindicadas, e depois corporiza essa abordagem de acordo com a seguinte estrutura: ilegalidade dos atos de liquidação por contradição com o conteúdo da informação vinculativa constante no processo n.º 9215, averbada com despacho concordante do Subdiretor-Geral, de 19 de agosto de 2015.

Ulteriormente, analisa a validade substancial da fundamentação dos atos, mediante o devido enquadramento das prestações de serviços de nutrição à luz do estatuído no n.º 1 do artigo 9.º do CIVA, com a devida enunciação do quadro normativo e do enquadramento a dar às prestações de serviços de nutrição, bipartindo e segmentando essa análise das prestações de serviços de nutrição como autónomas versus acessórias de atividade física, estabelecendo, in fine, o enquadramento propriamente dito das consultas de nutrição na isenção prevista no n.º 1 do artigo 9.º do CIVA, terminando, para o efeito, com a improcedência do pedido principal.

Face a tal juízo de entendimento e cominação, passa à abordagem do pedido subsidiário, inerente, como visto, ao apuramento do IVA por dentro, concluindo, pela procedência parcial e inerente cominação na exata proporção.

Logo, se o Tribunal a quo apreciou tais questões e se a mesmas foram, expressamente, convocadas inexiste a arguida nulidade.

Note-se que, não é passível de confusão conceptual o erro de julgamento com o excesso de pronúncia, na medida em que o primeiro resulta de uma distorção da realidade factual (erro de facto) ou na aplicação do direito (erro de direito), de forma a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa, enquanto o excesso de pronúncia verifica-se quando o Tribunal conhece e emite pronúncia sobre questões de que não deveria conhecer, e que não eram de conhecimento oficioso.

Daí que, a alegação da Recorrente concatenada com a consideração de fundamentos de facto e de direito não contemporâneos do Relatório Inspetivo, em nada traduz excesso de pronúncia, podendo, quando muito, redundar em erro de julgamento.

Com efeito se a fundamentação jurídica é ou não acertada, mormente, por desconforme com a factualidade de facto e de direito contida no Relatório de Inspeção Tributária, e se o Tribunal Arbitral analisou com a devida propriedade e com acerto o litígio, já não integra nulidade da decisão, mas, tão-só, erro de julgamento o qual, como é consabido, não pode ser analisado por este Tribunal.

Com efeito, a propositura da impugnação da decisão arbitral não confere a este órgão jurisdicional o poder de se pronunciar sobre o objeto do litígio, e isto porque a ação de anulação tem efeitos puramente cassatórios ou rescisórios, não atribuindo competência substitutiva ao tribunal, dado que o objeto da ação é, tão-só, a decisão arbitral e não a situação material litigada, ela mesma. (3-cfr. artigo 25.º, do RJAT; Acórdão T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2015, processo nº 8224/14; Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, pág.237 e seguintes.).

Não podemos, porém, confundir uma fundamentação, alegadamente, desconforme com um excesso de pronúncia, sendo que o peso que, na solução adotada, o tribunal arbitral confere a determinada factualidade é questão que excede a impugnação da decisão arbitral, na qual apenas se cuida das nulidades taxativamente elencadas no RJAT.

Destarte, dir-se-á que a Impugnante pode, naturalmente, discordar da procedência, ainda que parcial, ajuizada pelo Tribunal Arbitral, ou até considerar que é desacertada a extrapolação atinente à fundamentação das liquidações, mormente, quanto à falta de prova da finalidade terapêutica das consultas de nutrição, mas não pode propugnar, de forma procedente, que a decisão em crise é nula por excesso de pronúncia.

Por outro lado, há que ter presente que não logra, igualmente, mérito o aduzido quanto a uma eventual extrapolação ao nível da anulação parcial do ato tributário.

Senão vejamos.

Atentemos, para o efeito, na conclusão constante no artigo 152.º da petição inicial da qual resulta o seguinte:

“Por conseguinte, e por todo o exposto, tendo sido demonstrado que todos os serviços de nutrição prestados pela Requerente cumprem os requisitos para serem contemplados na isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do Código do IVA, devem as notas de liquidação e respectivos juros compensatórios ser totalmente anuladas, com todas as consequências legais. Subsidiariamente, caso assim não se entenda, deve o IVA ser liquidado por dentro nos termos supra expostos.”

Constando, expressamente, do pedido constante na petição inicial, que “requer-se a V. Exa que se digne declarar a ilegalidade dos atos de liquidação de IVA supra identificados e respectivos juros compensatórios, com a sua consequente anulação (…)”.

Ora, tendo presente o supra exposto, e tendo o Tribunal Arbitral após considerar improcedente o pedido principal atinente à isenção das prestações de serviços sindicadas, procedido à análise do pedido subsidiário e concluído pela sua procedência parcial e inerente anulação dos atos na exata proporção do que ajuizou em nada pode ser convocado o excesso de pronúncia.

Com efeito, o Tribunal Arbitral, esteou a procedência parcial da seguinte forma:

“143. Os Serviços de Inspeção Tributária, no seu RIT, calculam o imposto considerado em falta, com base num preço que, de modo algum, reflete o que foi contratualizado e efetivamente pago pelo consumidor final, atento o princípio da liberdade contratual e da autonomia da vontade.

144. A matéria coletável na entrega de um bem ou na prestação de um serviço, efetuadas a título oneroso, é constituída pela contrapartida realmente recebida paro o efeito pelo sujeito passivo, como resulta dos artigos 273.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28.11.2006, e 16.º, n.ºs 2 e 4, e 49.º , n.º 2, do CIVA, sendo que o tribunal arbitral considera que as razões aduzidas para a impossibilidade de repercussão hoje do imposto liquidado adicionalmente pela AT são ponderosas e devem ser aceites.

145. Inclusivamente, tratando-se mensalidades periódicas cobradas pela Requerente, já terá transcorrido integralmente o prazo legal de prescrição de cinco anos, previsto no artigo 310.º, alínea g), do Código Civil, relativamente a boa parte das prestações em causa.

146. Pelo exposto, aplicando-se a referida jurisprudência do TJUE, deve proceder o pedido subsidiário, sendo de anular parcialmente as liquidações impugnadas.

147. O Acórdão do Pleno do STA de 10.4.2013, tirado no Processo n.º 0298/12, fixa jurisprudência no sentido de que o acto de liquidação enquanto acto divisível é susceptível de anulação parcial.

148. Inferindo-se daquela decisão que a anulação parcial dos actos tributários é juridicamente admissível quando aqueles enfermem de ilegalidade meramente parcial, ou seja, quando o fundamento da anulação se aplique apenas a uma parte do acto e não à sua totalidade.

149. In casu, a AT liquidou IVA relativamente às operações ligadas à nutrição que no seu entender não poderiam beneficiar da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA, mas, face à jurisprudência Tulicã e Plavoºin só parte do valor tributável levado em consideração poderia ter sido relevado, ou seja, a AT, tendo apurado o valor tributável ligado às operações de nutrição aqui em causa, deveria ter “retirado por dentro” o respectivo imposto, aplicando o art.º 49º do CIVA, i.e., dividindo o valor da contraprestação recebida pelo sujeito passivo por 1,23 e, apurado o respectivo valor tributável, só aplicando IVA a tal base tributável e não, como fez, considerando todo o valor recebido como contraprestação pelos serviços de nutrição, fazendo acrescer àquele valor recebido o correspondente IVA que está a ser sindicado nos autos.

150. Assim sendo, considera o tribunal arbitral que a ilegalidade que está a afectar os actos de liquidação sindicados não os afecta no seu todo.

151. A redução do valor tributável das operações em causa facilmente se pode apurar pela divisão por 1,23 das bases tributáveis consideradas pela AT, não exigindo a prática de novos actos de liquidação, aceitando-se como bons os cálculos acima explicitados e produzidos pela Requerente.

152. Tudo ponderado, decide-se pela procedência meramente parcial do pedido subsidiário apresentado pela Requerente e só pela anulação parcial dos actos de liquidação sindicados. Devendo anular-se as liquidações de IVA sindicadas em 28.115,52 € e proporcionalmente, em valor correspondente, as liquidações de juros Compensatórios igualmente aqui sindicadas.”

Consignando, depois, no respetivo dispositivo o seguinte:

“a) julgar improcedente o pedido principal de anulação dos actos tributários de liquidação de iva e de juros compensatórios supra identificados, com as legais consequências;

b) julgar parcialmente procedente o pedido subsidiário apresentado pela requerente, anulando-se parcialmente os actos de liquidação sindicados;”

Ora, face ao supra expendido é por demais evidente que a decisão arbitral não incorreu em excesso de pronúncia, em nada se podendo, outrossim, advogar uma pronúncia indevida em termos de concreta anulação parcial dos atos de liquidação. Com efeito propugnando que só, em parte, procede o pedido subsidiário, naturalmente, que há que refletir essa anulação proporcional quanto aos visados atos de liquidação. Note-se, ademais, que só existiria uma condenação para além do pedido se fosse peticionada a anulação meramente parcial do ato, e o Tribunal decretasse, em clara desconformidade com o pedido, a sua anulação total.

Mais importa evidenciar, neste e para este efeito, que se era possível, no caso vertente e em concreto, essa anulação meramente parcial, ou seja, se existiu uma errónea ponderação da divisibilidade do ato a mesma em nada traduzirá a advogada nulidade por excesso de pronúncia, quando muito erro de julgamento.

E por assim ser, improcede o arguido excesso de pronúncia.

Prosseguindo, ora, com a nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão.

Convoca, neste particular, contradição com a matéria provada, visto que, por um lado, decidiu diferentemente noutro processo fática e juridicamente igual, e por outro lado, atenta a matéria provada e a não distinção técnica e procedimental entre as consultas de nutrição vendidas, conjuntamente, com o pacote do ginásio e as consultas de nutrição avulsas, e tendo só havido correção às vendidas em pacote SDIET, nunca se poderia ter concluído que essas não tinham fins terapêuticos em contraposição com as vendidas avulsas, mesmo que hipoteticamente não sejam realizadas.

Mais adensa que, inexistindo fundamento que permita fundar e legitimar a conclusão formulada na decisão impugnada, porquanto a alegação da falta de finalidade terapêutica das consultas de nutrição consubstancia fundamentação a posteriori, tal implica que a mesma esteja eivada de nulidade por contradição com os fundamentos da mesma.

Mas, mais uma vez, não lhe assiste razão. Senão vejamos.

No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125, nº.1, do CPPT (4-cfr.Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.361 e seg.; Ac.S.T.A-2ª.Secção, 18/2/2010, processo nº 1158/09; Ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/4/2014, processo nº 7435/14.) e no RJAT, está, como visto, expressamente regulado no artigo 28.º, nº1, alínea b).

Sendo que, o artigo 615.º nº.1, alínea c), do CPC, preceitua, igualmente, que é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Concatena-se, assim, com a necessidade de um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artigo 154.º, nº.1, do CPC.

Com efeito, o vício em análise, tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adotada (5-vide Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985.).

No caso sub judice, não vislumbra este Tribunal que a decisão recorrida padeça da nulidade em análise, uma vez que atentando no seu teor conclui-se que a mesma não comporta nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que, tendo decidido pela improcedência do pedido principal, e pela procedência parcial do pedido subsidiário, a fundamentação jurídica de tal peça processual vai no mesmo sentido.

De reiterar e sublinhar, neste concreto particular, que são realidades díspares e não confundíveis a nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão e a mera discordância com a fundamentação jurídica.

In casu, cotejando a fundamentação da decisão supra expendida, resulta que o decisor enuncia a factualidade que reputa de relevante, estabelecendo uma concreta delimitação da lide, convocando o regime normativo, e depois mediante transposição para o caso vertente conclui no sentido de que as prestações realizadas pela Requerente não são passiveis de se subsumirem à previsão da norma de isenção prevista no artigo 9.º do CIVA que tem por matriz a alínea c), do artigo 132º da Diretiva IVA.

Concluindo, mediante convocação do probatório, de Jurisprudência do TJUE e inclusive de doutrina convocada para o efeito, o seguinte:

“O Tribunal Arbitral Colectivo concorda em parte com a Doutora Clotilde Celorico Palma.
119. Diverge, no entanto, na parte em que para este Tribunal as consultas não realizadas possam beneficiar de tal enquadramento.
120. Fundados nas conclusões da Advogada-Geral e até no Acórdão tirado no caso Frenetikexito, a questão que se deve trazer à colação é a de saber onde é que, sendo assim, está demonstrada a finalidade terapêutica?
121. A Doutora Clotilde Palma refere expressamente no seu parecer que não é o facto de tais serviços serem prestados em ginásios ou até de não serem realizados pela circunstância de os utentes faltarem às consultas que as conclusões a extrair devem ser distintas.
122. Discordamos veementemente desta asserção, já que, para nós, se as consultas se não realizarem não pode ficar demonstrada a finalidade terapêutica associada a tais operações e, por isso mesmo, está em causa a aplicabilidade da isenção prevista no artigo 9º do código do IVA.
123. No parecer de 19.3.2021 diz-se ainda que em conformidade com interpretação que o Tribunal de Justiça da União Europeia tem vindo a fazer das regras vindas de enunciar da Diretiva IVA, regra geral, a partir do momento em que o serviço de nutrição é disponibilizado e faturado, deve, como tal, ser considerado como prestado, independentemente de o utente vir materialmente a utilizá-lo.
124. O Tribunal não pode deixar de concordar, mas a questão que se coloca é a de saber se a ausência de realização da consulta tem interferência na questão do objetivo terapêutico e do ponto de vista do Tribunal, as consultas de nutrição não realizadas não podem ter associada tal finalidade terapêutica.
125. A ausência de realização das consultas tem interferência na finalidade terapêutica e, por isso, coloca em causa, liminarmente, a aplicabilidade da isenção.
126. Remata a Doutora Clotilde Palma no parecer de 19.3.2021 como segue: “no caso de um utente não usufruir das consultas de nutricionismo não se poderá concluir que os serviços não foram prestados, recusando-se a aplicação da isenção. A partir do momento em que o serviço de nutrição é disponibilizado e faturado, deve, como tal, de acordo com as regras do IVA, ser considerado como prestado, independentemente de o utente não vir a frequentar alguma consulta.” O Tribunal até podia aceitar a conclusão, no entanto, dirá: só não se pode aplicar a isenção por não verificação do objectivo terapêutico associado à prestação de serviços realizada.
127. Isto dito se conclui no sentido de que se os serviços de acompanhamento nutricional, como os que estavam em causa no processo C-581/19, não podem, para o TJUE, subsumir-se na isenção prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 132º da Directiva IVA, donde, os que estão em causa nos presentes autos, porquanto rigorosamente iguais, não podem também subsumir-se na isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA.
128. E assim sendo o Tribunal Arbitral Colectivo não pode deixar de acompanhar tal asserção do TJUE, louvando-se, aliás, naquele arresto para decidir no sentido referido, ou seja, considerando também que os serviços de nutrição como os que estão em causa nos presentes autos não podem beneficiar da isenção prevista no n.º 1 do art.º 9º do CIVA, por manifesta ausência de verificação do requisito objectivo da finalidade terapêutica.
129. Não devendo olvidar-se que as decisões do TJUE constituem fonte de direito imediata, logrando-se, com isso, a desejável uniformidade e harmonização na aplicação do direito comunitário no espaço físico da união europeia.
130. E também que a jurisprudência do TJUE (aqui chamada à colação) não pode deixar de beneficiar do chamado “precedente vinculativo” na medida em que vincula todos os tribunal nacionais do Estados-membros tal como resulta do acórdão do TJUE de 15 de Julho de 1964, Pº Costa/Enel – 6/64, disponível in https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:61964CJ0006&from=NL .
131. E ainda da vigência do princípio da interpretação conforme com o direito da União, que decorre da interpretação que o TJUE faz das disposições conjugadas dos artigos 4.º, n.º 3 do TUE e 288.º, n.º 3 do TFUE.
132. Tal princípio impõe que o intérprete ou aplicador do direito nacional atribua às disposições nacionais um sentido conforme ou compatível com as disposições do direito da União. E quanto ao sentido e alcance deste princípio, no acórdão Von Colson , o TJUE entendeu que a obrigação de interpretação da norma nacional que transpõe uma diretiva, em conformidade com o texto e objetivo daquela, obriga o juiz nacional a dar prioridade ao método – de entre os métodos de interpretação permitidos pela ordem jurídica interna – que lhe permita atribuir à disposição nacional em causa uma interpretação compatível com a Directiva.
133. Concluindo-se com meridiana clareza no sentido de que não apenas as prestações de serviços em causa não estão isentas de IVA, ao abrigo da al. 1) do artigo 9.º do CIVA, por ausência de demonstração de que presidiu à realização de tais prestações de serviços uma finalidade terapêutica, ónus que impendia sobre a Requerente nos termos e em conformidade com o disposto no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, mas também que a legalidade dos atos tributários se encontra corretamente fundamentada, do ponto de vista material, com base nessa falta de demonstração do fim terapêutico das prestações de serviços aqui em causa.”

Conclui-se, assim, que o sentido da decisão não se encontra em contradição ou oposição com os fundamentos, visto que os fundamentos expressos pelo Tribunal Arbitral não conduziriam a uma solução de sentido antagónico, o mesmo é dizer que a proposição final (conclusão) revela-se compatível com as proposições logicamente antecedentes (fundamentos), inexistindo, assim, vício de raciocínio, donde nulidade.

Sendo que, em nada pode relevar neste e para este efeito, a alegada disparidade e existência de decisões antagónicas, enquanto fundamento que possa redundar na aduzida contradição.

De relevar, in fine, que a falta de corporização no probatório de realidades que, alegadamente, relevariam para a decisão do litígio não traduz, outrossim, qualquer nulidade da decisão recorrida, mormente, a advogada pela Impugnante. É certo que, tal poderá inquinar a decisão arbitral de erro de julgamento, mas não a vicia de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão. E erros de julgamento, reitera-se, não são, de todo, sindicáveis em sede de impugnação da decisão arbitral

Destarte, perceciona-se que a Impugnante, sob a “veste” de nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão arguiu um erro de julgamento, visto que, rigorosamente, não assaca uma concreta oposição, mas apenas uma desconformidade com o sentido jurídico adotado na decisão impugnada, na medida em que interpretou, erradamente, a decisão proferida sobre a matéria de facto no sentido de a AT ter efetuado as correções com base em diferentes fundamentos, incorrendo, por conseguinte, em erro de julgamento na anulação, ainda que parcial, das liquidações, plasmada, em total conformidade, no dispositivo.

E por assim ser improcede a aludida nulidade.

Atentemos, ora, na omissão de pronúncia.

A nulidade da decisão por omissão de pronúncia sucede apenas quando a mesma deixe de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal.

Dir-se-á, neste particular e em abono da verdade que, as questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. De notar para o efeito que, as questões não são passíveis de qualquer confusão conceptual com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa preceituada no citado normativo 615.º, nº 1, alínea d), do CPC.

Conforme doutrinado por ALBERTO DOS REIS (6-Código de Processo Civil anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143) “[s]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”.

Neste concreto particular, argui omissão de pronúncia quanto à legalidade dos juros compensatórios, visto que invocou a existência de informação vinculativa sobre a mesma matéria (alínea LL) da matéria provada), e nada foi dito sobre a mesma.

Evidencia, adicionalmente, que tendo ficado provado que a Impugnante atuou de acordo com a informação vinculativa sobre os mesmos factos necessários para o enquadramento tributário nunca atendendo ao principio da tutela da confiança não poderiam serem liquidados juros compensatórios.

Ora, vejamos.

De facto, atentando na petição inicial existe, desde logo, uma identificação do ato tributário objeto do pedido de pronúncia arbitral, e no mesmo são, efetivamente, convocadas as liquidações de juros compensatórios, e existe alusão a Informações Vinculativas, ainda que sem uma concreta particularização no domínio dos juros compensatórios, e sem que, no entanto, seja assacado um vício próprio atinentes às mesmas.

Nesta conformidade, a Decisão Arbitral enuncia no âmbito das questões a decidir, de forma expressa, que o thema decidendum se reporta a saber: “Se a Requerida estava obrigada a seguir o entendimento administrativo sancionado na informação vinculativa n.º 9215, por despacho de 19.8.2015 do Subdirector-Geral do IVA, no que tange ao enquadramento em sede de IVA dos serviços dietéticos/nutrição realizados pela aqui Requerente?”

Estruturando, depois, um item epigrafado de “ilegalidade dos actos de liquidação por contradição com o conteúdo da informação vinculativa tirada no processo n.º 9215, averbada com despacho concordante do subdirector-geral de 19.8.2015 e referida no ponto LL) do probatório”, do qual se extrata, designadamente, o seguinte:
“37. Neste ponto e porque não descortinamos razão para divergir (ou aditar o que quer que seja) da decisão prolatada no Processo n.º 380/2020-T que tramitou no CAAD e foi junta aos autos pela requerida com as alegações finais, vamos reproduzir ipsis verbis tudo quanto a tal propósito foi ali doutamente explicitado.
38. Diz a dado passo a aludida decisão arbitral: “A Requerente refere na sua petição a existência de uma informação vinculativa – Ficha Doutrinária emitida por despacho de 19.08.2015 do Diretor-Geral do IVA, no processo de informação vinculativa n.º 9215 – emitida a pedido não da Requerente mas de uma empresa do mesmo grupo – Grupo – ao qual pertence a Requerente e em que a Autoridade Tributária declara o seu entendimento de que “os serviços prestados no âmbito do aconselhamento de nutrição, faturados pela requerente aos seus clientes, podem beneficiar da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, desde que sejam assegurados por profissionais habilitados para o seu exercício nos termos da legislação aplicável (Decretos-Lei n.ºs 261/93 de 24 de julho e 320/99, de 11 de agosto)”. O regime das informações vinculativas está previsto no artigo 68.º da LGT. Em particular, releva o n.º 14 deste preceito, que estabelece que “[A] administração tributária, em relação ao objeto do pedido, não pode posteriormente proceder em sentido diverso da informação prestada, salvo em cumprimento de decisão judicial.” Conforme a jurisprudência tem destacado, a consequência resultante de a AT proceder em sentido diferente do definido pela informação vinculativa é a configuração de um específico vício de violação da lei, gerador de anulabilidade do ato praticado (acórdão arbitral de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019 e a jurisprudência aí citada: TCA Sul de 22.11.2011, proc. n.º 03013/09 e de 10.07.2014, proc. n.º 07558/14, onde se diz: “se a Fazenda Pública proceder de forma diversa do sentido que constar de informação vinculativa prestada, o ato que praticar enfermará de vício de violação de lei, sendo gerador da sua anulabilidade”; v. ainda o acórdão proferido no proc. n.º 474/2019-T do CAAD). Para que uma atuação desconforme com uma informação vinculativa da AT se traduza no específico vício de violação de lei previsto no n.º 14 do artigo 68.º, é necessária uma identidade objetiva da situação fáctica, ou seja, é necessário que os atos ou factos sobre os quais a informação vinculativa se pronunciou sejam iguais aos atos ou factos sobre os quais incidiu a atuação da administração tributária, isto de acordo com os n.ºs 1, 3, 8, 9, 12 e 14 do artigo 68.º (Decisão arbitral de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019). (…) Deixando para ponto ulterior da análise a questão subjetiva, ie, a questão da intocabilidade, por parte da Requerente, da informação vinculativa aqui em causa, analisemos para já o aspeto da identidade objetiva entre a situação fáctica que deu origem à liquidação impugnada e a situação considerada na “Informação Vinculativa”. (…) A situação fáctica descrita é totalmente coincidente com a situação fáctica sobre a qual incidiram as liquidações impugnadas: − A Requerente dedica-se à exploração e gestão de health clubs, clubes de fitness e ginásios (ponto n.º 1 da “Informação Vinculativa” e facto provado A); − Presta serviços de aconselhamento nutricional nos estabelecimentos que explora e inclui essa prestação no seu objeto social (ponto n.º 2 da “Informação Vinculativa” e facto provado D); − Os serviços de aconselhamento nutricional são materialmente realizados por profissionais contratados para o efeito, devidamente credenciados, ou seja, detentores de uma licenciatura em nutricionismo e inscritos na Ordem dos Nutricionistas, ou possuidores de licenciatura em dietética (ponto n.º 4 da “Informação Vinculativa” e facto provado G). De acordo com o RIT que serve de fundamentação aos atos impugnados, e para o enquadramento das prestações de serviços de aconselhamento dietético como “não isentos”, foi considerado relevante pelos serviços de inspeção, como já se viu, que: − Os serviços em causa não são “consultas de nutrição, procuradas pelo utente em razão de alguma necessidade que sinta nessa matéria, mas tão só a «disponibilização» de um serviço com características de aconselhamento ao utente, o qual apenas ocorre no caso de o utente «procurar» esse serviço”; − As prestações de serviços não têm objetivo terapêutico, mesmo sendo efetuados por paramédicos devidamente habilitados para o efeito; Que as prestações de serviços não têm objetivo terapêutico, mesmo sendo efetuados por paramédicos devidamente habilitados para o efeito, é ainda indiciado pelas seguintes circunstâncias, sempre de acordo com o RIT: − Algumas prestações de serviços dietéticos traduzem-se na mera elaboração de dietas integradas em planos alimentares; − O contrato prevê apenas «duas sessões presenciais» e «dois acompanhamentos telefónicos anuais», os quais surgem designados por aconselhamento dietético; − Se alguém necessitar de uma intervenção terapêutica ao nível nutricional, procurará um profissional nessa área, não se inscreverá num ginásio; e o propósito da frequência de um ginásio não é o de ser consultado por um nutricionista; − O serviço é faturado mensalmente, a todos os utentes, sem exceção, independentemente de usufruírem ou não da referida consulta, significando isso que todos os utentes veem uma parte da mensalidade que pagam pela frequência do ginásio estar sujeita a IVA à taxa normal e outra parte dessa mensalidade estar isenta de IVA, quando a generalidade desses utentes a que essa fatura respeita não tem qualquer contacto com o nutricionista. Ora, dos aspetos elencados, nenhum é referido na “Informação Vinculativa” como sendo impeditivo da isenção que a mesma reconhece aos serviços em causa. Não é dito, especificamente, que os serviços devam ter uma “finalidade terapêutica”, e nem que, para que se verifique tal finalidade terapêutica, os mesmos devam ser procurados por parte dos utentes de forma autónoma e independente dos serviços de ginásio, health club e fitness club. Além disso, como referido na citada Informação (processo n.º 9215), no pedido que lhe serve de base é expressamente dito que: − A atividade a desenvolver se traduz na “prestação de serviços e consultas de nutrição”, o que pressupõe a prestação de serviços de nutricionismo ou dietética que não são “consultas de nutrição”; − A “implementação dos serviços tem como objetivo garantir uma diminuição do número de cancelamentos das inscrições nos clubes e ginásios”, e a “realização dos serviços de aconselhamento nutricional perspetiva garantir o incremento da retenção de clientes”, o que deixa patente que a atividade é organizada em relação de dependência das restantes prestações de serviços específicas dos clubes e ginásios. Em face da descrição que a “Informação Vinculativa” faz dos factos que lhe servem de base, conclui-se que a factualidade que a Informação assumiu como relevante é em tudo coincidente com a factualidade verificada na atividade da aqui Requerente. Conclui-se, assim, que, em termos objetivos, ie, entre a situação que serviu de base à “Informação Vinculativa” e a situação que deu origem às liquidações impugnadas nos presentes autos existe a identidade fáctica necessária para que o enquadramento tributário efetuado pela “informação” seja válido e aplicável à situação da Requerente. Quanto ao enquadramento dessa mesma situação fáctica em termos de tributação em IVA, a “Informação Vinculativa” diz o seguinte: “10. No que respeita às atividades paramédicas, dado que não existe no CIVA um conceito que as defina, háì que recorrer ao Decreto-Lei n.º 261/93 de 24 de julho, bem como ao Decreto-Lei n.º 320/99, de 11 de agosto (ambos do Ministério da Saúde), uma vez que são estes dois diplomas que contêm em si os requisitos a observar para o exercício das respetivas atividades. 11. Em conformidade com o estabelecido no preambulo do Decreto-Lei 320/99, de 11 de Agosto, ambos os diplomas visam prosseguir a protecção da saúde dos cidadãos, enquanto direito social constitucionalmente consagrado "(...) atraveìs de uma regulamentação das atividades técnicas de diagnostico e terapêutica que condicione o seu exercício em geral, quer na defesa do direito aÌ saúde, proporcionando a prestação de cuidados por quem detenha habilitação adequada, quer na defesa dos interesses dos profissionais que efetivamente possuam os conhecimentos e as atitudes próprias para o exercício da correspondente profissão". 12. Neste sentido determina o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 261/83, de 24 de julho, que as atividades paramédicas são as constantes da lista anexa ao citado diploma, do qual faz parte integrante, e compreendem a utilização de técnicas de base científica com fins de promoção de saúde e de prevenção, diagnostico e tratamento da doença, ou da reabilitação. 13. Eì, ainda, condição essencial para o exercício destas atividades profissionais de saúde e determinante para a atribuição da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, a verificação de determinadas condições, nomeadamente a titularidade de curso, obtido nos termos do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 320/99, de 11 de agosto. 14. A referida lista anexa ao Decreto-Lei n.º 261/83, de 24 de julho, prevê̂ no seu item 5, a atividade de Dietética. De acordo com a descrição aiì prevista, esta atividade compreende a "Aplicação de conhecimentos de nutrição e dietética na saúde em geral e na educação de grupos e indivíduos, quer em situação de bem-estar quer na doença, designadamente no domínio da promoção e tratamento e da gestão de recursos alimentares". 15. A atividade de nutricionista enquadra-se na descrição prevista para o exercício da atividade de "dietética" prevista nos Decretos-Lei anteriormente citados, pelo que, tem sido entendimento da AT que as prestações de serviços efetuadas por nutricionistas podem ser abrangidas pela isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, desde que estejam cumpridas as condições enumeradas nos referidos diplomas e se refiram a operações abrangidas pelo item 5 do Anexo ao Decreto-Lei n.º 261/93. 16. Nesse pressuposto, os serviços prestados por dietistas, bem como, por nutricionistas, quer sejam prestados diretamente ao utente quer sejam prestados a uma qualquer entidade com quem contratualizem os seus serviços, são abrangidos pela isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA. 17. Esta isenção refere-se ao exercício objetivo das atividades e não aÌ forma jurídica que o caracteriza, encontrando-se, assim, as atividades descritas, isentas ainda que desenvolvidas no âmbito das sociedades. Tal entendimento decorre da interpretação desta disposição legal pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), nomeadamente no Acórdão de 10 de setembro de 2002, proferido no âmbito do processo C-141/00 (caso Kugler, Colect. P. I- 6833, n.º 26), que resume o carácter objetivo da isenção no preenchimento de duas condições: se trate de serviços médicos ou paramédicos e que estes sejam fornecidos por pessoas que possuam as qualificações profissionais exigidas. 18. Deste modo, as prestações de serviços de nutrição que venham a ser realizadas pela requerente, sendo por esta faturados diretamente aos utentes, podem beneficiar da isenção prevista na alínea 1) do artigo 9.º do CIVA, desde que sejam asseguradas por profissionais (dietistas e nutricionistas) habilitados para o exercício dessa atividade, nos termos da legislação aplicável. Neste caso, nas faturas a emitir aos utentes deve constar a referência aÌ citada isenção.“ Colocado em termos normativos, retira-se da “Informação Vinculativa” que estão isentas de IVA, pela al. 1) do artigo 9.º do CIVA, as prestações de serviços de aconselhamento nutricional, em estabelecimento de exploração e gestão de health clubs, clubes de fitness e ginásios, por entidades titulares desses estabelecimentos, consistindo tais serviços em “serviços e consultas de nutrição”, sendo tais atividades desenvolvidas em dependência dos serviços específicos dos ginásios, health clubs e clubes de fitness e de modo a reter os clientes destes últimos serviços, na condição de que tais “serviços e consultas de nutrição” sejam prestados por nutricionistas ou dietistas credenciados. E assim sendo, deve-se concluir que, em relação à Requerente, a Autoridade Tributária atuou, praticando os atos de liquidação impugnados, num sentido que é contrário à doutrina interpretativa veiculada pela mesma Autoridade Tributária através da Informação Vinculativa proferida no processo n.º 9215. Analisemos agora a questão da possibilidade de invocação da doutrina interpretativa constante da “Informação Vinculativa” por parte da Requerente. De acordo com o n.º 14 do artigo 68.º da LGT, já anteriormente citado, “[a] administração tributária, em relação ao objeto do pedido, não pode posteriormente proceder em sentido diverso da informação prestada, salvo em cumprimento de decisão judicial.” A jurisprudência tem, de forma consistente, interpretado este preceito no sentido de que a informação vinculativa apenas “vincula” a administração quanto ao mesmo sujeito passivo que a solicitou. Assim o diz acórdão arbitral que vimos citando (acórdão de 05-09-2020, proc. n.º 740/2019), nos seguintes termos: “[O] regime da informação vinculativa, atento o disposto no citado n.º 14 do artigo 68.º da LGT, muito embora apenas em relação ao sujeito passivo beneficiário da informação prestada e aos atos e factos identificados no pedido (...) faz prevalecer a proteção da confiança e a segurança jurídica do sujeito passivo em causa sobre a exata interpretação da lei (...). A decisão arbitral cita, por sua vez, em apoio da mesma doutrina, os acórdãos do TCA Sul de 10.07.2014, proc. n.º 07558/14 e do TCA Norte de 13.10.2016, proc. n.º 00089/11.7BEBRG e de 10.5.2018, proc. n.º 00101/2002.TFPRT.21 em que se diz: “A Administração Tributária, com a emissão de uma informação vinculativa, não fica obrigada ao seu cumprimento em relação a todas as situações que se lhe colocam dentro do objeto dessa mesma orientação. Pelo contrário, a vinculação da Administração Tributária ao teor das mesmas é uma vinculação inter-partes, pois somente em relação ao caso em concreto objeto do pedido a Fazenda Pública não pode proceder em sentido diverso da informação prestada, ressalvado o cumprimento de decisão judicial”. Tomando em consideração esta orientação jurisprudencial, da qual este tribunal não vê razão para se afastar, a atuação da Autoridade Tributária no caso dos presentes autos, em contradição com a interpretação veiculada na “Informação Vinculativa”, não é de molde a originar o vício de violação de lei específico previsto no n.º 14 do artigo 68.º da LGT, uma vez que a informação vinculativa em causa não foi prestada à aqui Requerente.”

Ora, face ao supra expendido é, por demais evidente, que existiu uma análise da convocada Informação Vinculativa constante na alínea LL) do probatório, e à luz dos atos de liquidação impugnados, ou seja, quer no âmbito da liquidação de imposto e de juros compensatórios, e mediante, ademais, adesão à fundamentação jurídica constante noutra decisão arbitral.

É certo que, não conclui no sentido pretendido pela Impugnante, mas tal não comporta qualquer nulidade, e muito menos a aduzida omissão de pronúncia, quando, ademais, inexiste, como já evidenciado anteriormente e nesse concreto particular, qualquer específica cominação e individualização no atinente à liquidação de juros compensatórios.

No fundo, infere-se que a Impugnante não se conforma com a irrelevância da Informação Vinculativa na apreciação que o Tribunal Arbitral fez, nomeadamente, da questão dos juros compensatórios liquidados por referência às liquidações adicionais de imposto impugnadas. Aliás, esta discordância no sentido decisório, que conflui, como visto, com o erro de julgamento, é notória quando advoga, de forma expressa, nas alegações, designadamente, que: “será lícito à AT tributar e liquidar juros compensatórios à Impugnante?”, chamando à colação e juntando, para o efeito, um Aresto deste TCAS que reputa de relevo e favorável à sua pretensão.

Sucede, porém, que tais alegações redundam em erro de julgamento, ou seja, se o Tribunal Arbitral decidiu acertadamente e de acordo com o regime normativo, mormente, da concreta interpretação e alcance do artigo 68.º da LGT, e bem assim em oposição com a jurisprudência deste TCAS, tal nunca inquinaria a sentença de nulidade por omissão de pronúncia.

Uma nota final para evidenciar que não se perceciona o alcance da aduzida falta de fundamentação, porquanto não devidamente substanciada, sendo certo que sempre se dirá a nulidade por não especificação dos fundamentos de facto e de direito apenas abrange as situações de falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito, o que, de todo, sucede in casu.

Ademais, as alegações supra expendidas em nada poderiam redundar em falta de fundamentação ou contraditória fundamentação com a decisão, mas sim de erro de julgamento, vício, portanto, como temos vindo a sublinhar não é sindicável em sede de impugnação da decisão arbitral.

Destarte, conclui-se que na decisão recorrida, vêm discriminados os fundamentos de facto e de direito em que assentou o juízo de improcedência quanto às informações vinculativas, percecionando-se, de forma clara, as razões subjacentes à inexistência de qualquer contradição com a interpretação veiculada na “Informação Vinculativa”, não sendo, portanto, de molde a originar o vício de violação de lei específico previsto no n.º 14 do artigo 68.º da LGT, donde a concreta manutenção dos atos.

Improcede, assim, a arguida nulidade por omissão de pronúncia e falta de fundamentação.

No mesmo sentido, e em situações similares à dos autos vide Acórdãos proferidos por este TCAS, no âmbito dos processos 12/22 BCLSB, 26/22 BCLSB, e 122/21 BCLSB, de 16.03.2023, e 20.04.2023, respetivamente, sendo que nos últimos dois Arestos a, ora, Relatora interveio como 2ª Adjunta.


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IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em JULGAR IMPROCEDENTE A PRESENTE IMPUGNAÇÃO.

Condena-se a Impugnante em custas.

Registe. Notifique.



Lisboa, 24 de outubro de 2024

(Patrícia Manuel Pires)

(Maria da Luz Cardoso)

(ângela Cerdeira)