Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 960/25.9BELRS |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 10/30/2025 |
| Relator: | ÂNGELA CERDEIRA |
| Descritores: | INTIMAÇÃO PARA PASSAGEM DE CERTIDÃO ARTIGO 37º DO CPPT DEFESA POR EXCEPÇÃO CONTRADITÓRIO JUNÇÃO DE DOCUMENTOS |
| Sumário: | I – No âmbito da acção de intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões, a exigência de salvaguarda do princípio do contraditório reclama que seja concedida ao autor a possibilidade de se pronunciar quanto à matéria de exceção que na resposta da entidade demandada for invocada; II - Consequentemente, serão de admitir os meios de prova que se afiguram relevantes para a demonstração dos factos invocados nesse articulado suplementar. III - Nos casos em que o requerimento de passagem de certidão foi enviado por correio postal registado, para se aferir do cumprimento do prazo previsto no nº 1 do artigo 37º do CPPT, deverá atender-se à data do respetivo registo, sendo para este efeito totalmente irrelevante a data de receção do requerimento pelo destinatário. IV – Constituem requisitos do processo de intimação para passagem de certidões, não ter sido dada satisfação ao pedido formulado, no prazo de 5 dias (nos procedimentos e processos não informatizados) e a matéria objecto dos pedidos formulados não ter carácter secreto. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | I – RELATÓRIO
“ST. J... SCHOOL ASSOCIATION”, doravante Recorrente, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 12.08.2025, que, no âmbito de uma intimação para passagem de certidão, absolveu da instância a entidade requerida – Instituto da Segurança Social, IP – por ter considerado extemporâneo o pedido de passagem de certidão. Com o requerimento de interposição do recurso, a Recorrente apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES: A) Delimita-se o objeto do presente recurso à análise das seguintes questões: (i) Erro de julgamento na fixação da matéria de facto dada como provada e não provada na sentença recorrida, tendo em conta a prova carreada para os autos; (ii) Erro de julgamento quanto à alegada intempestividade do requerimento para passagem de certidão apresentado pela Recorrente e consequente caducidade do seu direito de ação; B) Os elementos probatórios juntos aos presentes autos – nomeadamente, o aviso de receção (cfr. documento n.º 1 junto com a réplica; fls. 41 do SITAF) – provam inequivocamente que a Recorrente apresentou junto do INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. o requerimento para passagem de certidão através de correio postal registado (RH705932847PT) com aviso de receção no dia 30 de junho de 2025; C) O Douto Tribunal a quo devia ter dado como expressamente provada a seguinte matéria de facto (a qual se encontra documentalmente demonstrada e por isso cabalmente provada no âmbito dos presentes autos), requerendo-se o referido aditamento a esse Douto Tribunal ad quem: «O requerimento para passagem de certidão foi remetido para o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. através de correio postal registado com aviso de receção no dia 30 de junho de 2025.»; D) Requer-se igualmente a eliminação da «matéria de facto não provada» do seguinte facto constante da sentença recorrida: «[O] pedido de passagem de certidão efetuado pela Autora foi enviado por correio.»; E) Em virtude do julgamento proferido pelo Douto Tribunal a quo, e na medida em que este embora tenha expressamente dado por provado no ponto 2 da matéria de facto provada que «Em 30.06.2025, a Autora apresentou junto ao ISS requerimento de passagem de certidão», acaba (inexplicavelmente) por concluir «com interesse para a decisão da matéria de exceção» que, não estando (alegadamente) demonstrado «que o pedido foi expedido por correio e (a ter sido) em que data é que tal aconteceu» e que não foi junta «sequer cópia dos envelopes onde a Autora enviou o pedido ou supostamente recebeu a cópia carimbada com a data de receção pelo serviço», o pedido de passagem de certidão foi apresentado intempestivamente, junta-se, ao abrigo do artigo 651.º, n.º 1, do CPC (i) cópia da informação emitida pelos CTT atestando a expedição do correio com o referido código de registo RH705932847PT (coincidente com o código aposto no aviso de receção já junto aos autos) e (ii) cópia do envelope remetido pelo INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. para a Recorrente com a cópia carimbada do requerimento para passagem de certidão por si apresentado por correio; F) A alteração da referida matéria de facto provada e não provada requerida é crucial para a boa decisão da causa, tendo em conta que, sendo inquestionável que a Recorrente apresentou o requerimento para a passagem de certidão no dia 30 de junho de 2025, esta alteração conduzirá necessariamente à prolação de uma pronúncia jurisdicional totalmente distinta, i.e. que se pronuncie no sentido da apresentação tempestiva do referido pedido pela Recorrente, e, consequentemente, intime o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. à passagem da certidão requerida; G) É manifesto o erro de julgamento de que padece a sentença recorrida quando, em clara violação do artigo 26.º, n.º 2, do CPPT, decidiu ser intempestivo o requerimento para passagem de certidão por considerar que a data relevante para efeitos de aferição da referida tempestividade corresponde à data da entrada do mesmo nos serviços do INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. – i.e. 1 de julho de 2025; H) A jurisprudência dos tribunais superiores e a doutrina são unânimes quando afirmam que, nos termos do artigo 26.º, n.º 2, do CPPT, no procedimento tributário a data juridicamente relevante da prática de atos cujos requerimentos sejam remetidos por correio registado é a data desse registo, independentemente do seu recebimento nos serviços; I) Tendo o referido pedido de passagem de certidão sido remetido através de correio postal registado enviado para os serviços do INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL e que está cabalmente provado que a data do respetivo registo corresponde ao dia 30 de junho de 2025, não pode senão concluir-se pela apresentação do referido requerimento naquela data e, consequentemente, dentro do prazo legal para o efeito, sendo, por isso, plenamente tempestivo; J) Assim, tendo em conta que (i) o pedido de passagem de certidão foi apresentado no dia 30 de junho de 2025; (ii) o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. não emitiu a referida certidão até ao dia 7 de julho de 2025 – como lhe era imposto pelo artigo 24.º, n.º 2, do CPPT; e (iii) a Recorrente apresentou a intimação para passagem de certidão no dia 23 de julho de 2025 – i.e. dentro do prazo de 20 dias previsto para o efeito no artigo 105.º, n.º 2, alínea a), do CPTA –, é manifesto que não se verificou a caducidade do direito de ação da Recorrente; K) A sentença recorrida assenta em erro de julgamento, devendo ser revogada e substituída por pronúncia jurisdicional desse Douto Tribunal ad quem que, julgando integralmente procedente o presente recurso, intime o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. à passagem de certidão com indicação dos meios de reação da decisão de indeferimento do pedido de restituição de contribuições e quotizações pagas indevidamente com referência à atribuição de prestações extraordinárias nos anos de 2020, 2021 e 2022, tudo com as demais consequências legais.
Nestes termos e nos demais de Direito que esse Douto Tribunal ad quem suprirá, requer-se que, com a reapreciação dos elementos probatórios juntos aos presentes autos, e consequente alteração da matéria de facto provada e não provada oportunamente enunciada supra, o presente recurso seja julgado totalmente procedente, revogando-se, com fundamento em erro de julgamento, a sentença recorrida nos termos e com os fundamentos supra expostos, tudo com as demais consequências legais, nomeadamente substituindo a pronúncia jurisdicional do Douto Tribunal a quo por outra que intime o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. à passagem de certidão com indicação dos meios de reação da decisão de indeferimento do pedido de restituição de contribuições e quotizações pagas indevidamente com referência à atribuição de prestações extraordinárias nos anos de 2020, 2021 e 2022. Requer-se ainda a esse Douto Tribunal ad quem, na exata medida da procedência do presente recurso, a condenação da Recorrida no pagamento das custas de parte, nos termos do artigo 26.º do Regulamento das Custas Processuais, tudo com as demais consequências legais.» A Entidade Recorrida apresentou contra-alegações, que sintetizou nas seguintes “B) CONCLUSÕES a) O requerimento da Autora para pedido de certidão nos termos do artigo 37.º CPPT, é extemporâneo, uma vez que deu entrada nos serviços do ISS, I.P., em 01.07.2025, após o prazo legal de 30 dias (que terminou em 30.06.2025); b) Não foi feita prova válida pela Autora da expedição postal do requerimento dentro do prazo legal, sendo inadmissível a junção de documentos em sede de recurso para suprir essa omissão; c) A junção de documentos em sede de recurso viola o artigo 651.º do CPC, bem como os princípios da preclusão, da segurança jurídica, da igualdade das partes e da boa-fé processual; d) A sentença recorrida não padece de erro de julgamento, tendo corretamente aplicado o artigo 37.º, n.º 3, do CPPT e o artigo 651.º do CPC; e) A pretensão da Recorrente implicaria uma interpretação extensiva e retroativa do artigo 26.º, n.º 2, do CPPT, em prejuízo da segurança jurídica e da igualdade de tratamento das partes; f) A atuação da Recorrente viola os princípios constitucionais da legalidade, da segurança jurídica, da proteção da confiança, do contraditório, da igualdade processual e do processo equitativo; g) A sentença deve ser mantida integralmente válida, respeitando a legalidade e a estabilidade das decisões judiciais; h) A Recorrente deve ser condenada nas custas por litigância sem fundamento legal.» *** O DIGNO MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. *** II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provados os seguintes factos, com relevância para a decisão da causa: 1. Em 29.05.2025, a Autora foi notificada, através de ofício da Unidade de identificação, Qualificação e Contribuições do ISS, nº UIQC/NR/GR1:2332/2024, de 26.05.2025 da decisão de indeferimento do pedido de restituição de contribuições e quotizações pagas com referência à atribuição de prestações extraordinárias nos anos de 2020, 2021 e 2022, de onde se extrai o seguinte: (imagem, original nos autos)
– Cf. Doc. 1 junto com a PI e ponto 1º da PI 2. Em 30.06.2025, a Autora apresentou junto ao ISS requerimento de passagem de certidão contendo os meios de defesa da Requerente à decisão de indeferimento do pedido de restituição de contribuições e quotizações pagas indevidamente com referência à atribuição de prestações extraordinárias nos anos de 2020, 2021 e 2022, de onde se retira, para além do mais que:
- Cf. Doc. 2 junto com a PI 3. Até à presente data a Autora ainda não foi notificada da passagem da certidão por si requerida – Cf. PI e Resposta
FACTOS NÃO PROVADOS Com interesse para a decisão da matéria de exceção, não se provou: 1. Que o pedido de passagem de certidão efetuado pela Autora foi enviado por correio. * O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na posição das partes assumida nos articulados e na análise crítica e conjugada dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo apenso, que não foram impugnados, para eles se remetendo nos factos considerados provados. A decisão da matéria de facto não provada fundamentou-se no facto de a Autora não ter produzido qualquer meio de prova adequado a demonstrar a veracidade dos factos por si alegados, designadamente a expedição do pedido por correio e a receção de cópia assinada pelo mesmo meio.»
III – APRECIAÇÃO DO RECURSO A Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que, no âmbito de uma intimação para passagem de certidão, absolveu da instância a entidade requerida – INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP – por ter considerado que o pedido de passagem de certidão foi apresentado após o prazo de 30 dias previsto no nº 1 do artigo 37º do CPPT. Sustenta, em síntese, que o Tribunal a quo fixou incorretamente a matéria de facto, não dando como provados factos de relevante interesse para a boa decisão da causa, constando, ao invés, tais factos erradamente da matéria de facto não provada. Por outro lado, a Recorrente discorda em absoluto do entendimento do Tribunal a quo de que a data relevante para efeitos de cumprimento de um prazo legal é a data de entrada do requerimento nos serviços, considerando ao invés que do artigo 26.º, n.º 2, do CPPT resulta indubitavelmente que, quando um requerimento é remetido por correio postal registado, a data relevante para esse efeito é a data do registo e não a data de receção pelo respetivo destinatário. Perante o exposto, delimita-se o objeto do presente recurso à análise das seguintes questões: (i) Erro de julgamento na fixação da matéria de facto dada como provada e não provada na sentença recorrida, tendo em conta a prova carreada para os autos; (ii) Erro de julgamento quanto à alegada intempestividade do requerimento para passagem de certidão apresentado pela Recorrente. Vejamos se assiste razão à Recorrente. DO ERRO DE JULGAMENTO DO DOUTO TRIBUNAL A QUO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO O Tribunal a quo entendeu considerar como não provado o seguinte facto: «[O] pedido de passagem de certidão efetuado pela Autora foi enviado por correio». Para motivação da sua decisão em matéria de facto, o Tribunal a quo afirma o seguinte: «O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na posição das partes assumida nos articulados e na análise crítica e conjugada dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo apenso, que não foram impugnados, para eles se remetendo nos factos considerados provados. A decisão da matéria de facto não provada fundamentou-se no facto de a Autora não ter produzido qualquer meio de prova adequado a demonstrar a veracidade dos factos por si alegados, designadamente a expedição do pedido por correio e a receção de cópia assinada pelo mesmo meio». Sustenta a Recorrente que é manifesto o erro do Tribunal a quo na análise da prova documental constante dos autos, na medida em que, ao contrário do que é afirmado na sentença, a Recorrente juntou aos presentes autos o aviso de receção – cfr. documento n.º 1 junto com a “réplica” a fls. 41 do processo eletrónico –, do qual resulta inequivocamente que (i) o requerimento para passagem de certidão foi apresentado através de correio postal registado (com aviso de receção) expedido no dia 30 de junho de 2025 e (ii) foi rececionado pelo INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. no dia seguinte (i.e., a 1 de julho de 2025). Contra-alega a Recorrida que tendo a Autora optado por apresentar os documentos apenas na “réplica”, sem qualquer justificação plausível, impõe-se a aplicação do princípio da preclusão, que visa assegurar a celeridade processual, a estabilidade da instância e a igualdade das partes, acrescentando que “inexoravelmente, a apresentação extemporânea de prova, sem fundamento legal ou factual, configura ainda violação dos princípios da boa-fé processual e da segurança jurídica, conforme tem sido reiteradamente afirmado pela jurisprudência dos tribunais superiores”. Importa, assim, a título de questão prévia, aferir da admissibilidade legal da junção do documento em causa pela Autora em sede de resposta à matéria de excepção suscitada na oposição do Réu. De acordo com o disposto no nº 1 do artigo 146º do CPPT, “[p]ara além do meio previsto no artigo seguinte, são admitidos no processo judicial tributário os meios processuais acessórios de intimação para a consulta de documentos e passagem de certidões, de produção antecipada de prova e de execução dos julgados, os quais serão regulados pelo disposto nas normas sobre o processo nos tribunais administrativos.” Relativamente à tramitação da intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, estabelece o Artigo 107.º do CPTA, o seguinte: Tramitação 1 - Deduzido o pedido de intimação, a secretaria promove oficiosamente a citação da entidade demandada e dos contrainteressados para responder no prazo de 10 dias. 2 - Apresentada a resposta ou decorrido o respetivo prazo e concluídas as diligências que se mostrem necessárias, o juiz profere decisão no prazo de cinco dias. Ora, embora não se encontre expressamente prevista a apresentação, por parte do autor/requerente, de qualquer articulado posterior à resposta, quando nesta seja deduzida defesa por exceção, dilatória ou peremptória, devendo o juiz fazer observar o contraditório ao longo de todo o processo, deve ser garantida ao requerente da intimação a possibilidade de, previamente à decisão da causa, se pronunciar sobre as exceções invocadas pelo requerido – cfr. acórdão deste TCA-Sul (secção de contencioso administrativo) de 18-06-2025, processo 472/24.8BEFUN, disponível em www.dgsi.pt. Sendo possível apresentar um novo articulado destinado a tomar posição sobre a excepção invocada, serão necessariamente de admitir os meios de prova que se afiguram relevantes para a demonstração dos factos invocados nesse articulado suplementar, como sucedeu no caso dos autos. Este entendimento decorre da exigência de salvaguarda do princípio do contraditório e do direito à prova. Ademais, sempre poderia/deveria, entenda-se enquanto poder/dever, o Juiz ao abrigo dos princípios do inquisitório e do “pro atione” requerer a junção de documento atinente à demonstração da factualidade alegada. Não se verifica, pois, qualquer violação do princípio da preclusão, pois o documento foi junto no momento processual adequado, assim como é de desatender a invocada violação dos princípios da boa-fé processual e da segurança jurídica, uma vez que a Autora se limitou a exercer as prerrogativas processuais que lhe são reconhecidas por força do referido princípio do contraditório. Resolvida que está a questão da admissibilidade da junção aos autos do documento em causa em sede de resposta à oposição, cumpre aferir se o mesmo tem relevância probatória nos termos invocados pela Recorrente ou se, como defende a Recorrida, “permitir a flexibilização do prazo sem prova inequívoca da expedição dentro do prazo legal seria inconstitucional, por violação dos princípios da legalidade tributária, da segurança jurídica e da igualdade (cf. artigos 2.º, 13.º e 103.º da Constituição da República Portuguesa)”. Analisado o documento em causa, incorporado a fls. 41 do processo eletrónico, verifica-se que se trata de aviso de recepção digitalizado, referente a correio postal registado expedido no dia 30 de junho de 2025 pela sociedade de advogados mandatária da Autora/Recorrente e rececionado pelo Instituto da Segurança Social no dia seguinte (i.e., a 1 de julho de 2025). Tal documento, ao contrário do que defende a Recorrida, constitui prova segura de que o requerimento para passagem de certidão foi remetido na referida data, via postal registada com aviso de recepção, não se vislumbrando qualquer violação dos princípios da legalidade tributária, da segurança jurídica ou da igualdade. Importa, assim, aditar aos factos provados, por se encontrar documentalmente demonstrada, a seguinte factualidade: 4. O requerimento para passagem de certidão foi remetido para o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. através de correio postal registado com aviso de receção no dia 30 de junho de 2025. E, em consequência, eliminar da «matéria de facto não provada» constante da sentença recorrida o seguinte facto: «[O] pedido de passagem de certidão efetuado pela Autora foi enviado por correio». Em face do exposto, resulta prejudicada a questão atinente à junção de documentos em sede de recurso, na medida em que os autos já reúnem todos os elementos necessários para o conhecimento do objecto do recurso, carecendo, por conseguinte, de qualquer materialidade, donde pronúncia, a questão inerente à sua admissão constante das contra-alegações da Recorrida. Prosseguindo com a análise da questão decidenda em matéria de direito, verifica-se que a mesma se reconduz à análise do erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo ao julgar verificada a exceção de caducidade do direito da Requerente de requerer a passagem de certidão em causa. No âmbito da sentença recorrida, o Tribunal de 1ª instância decidiu, em síntese, o seguinte: «Ora, resulta do ponto 1 do probatório que a Autora foi notificada no dia 29.05.2025, pelo que o prazo de trinta dias começa a correr no dia seguinte, isto é, no dia 30.05.2025 (artigo 279º do CC) e terminou em 28.06.2025, tendo transitado para o primeiro dia útil seguinte, ou seja, dia 30.06.2025. Tendo o pedido de passagem de certidão dado entrada nos serviços do ISS em 01.07.2025 é o mesmo extemporâneo, motivo pelo qual procede o argumento expendido pela entidade intimada, sentido em que adiante se decidirá. […] Nestes termos e com os fundamentos expostos, julgo a presente intimação para passagem de certidão totalmente improcedente por ter sido requerida após o prazo legalmente previsto para o efeito, absolvendo a entidade requerida da instância». Vejamos. De acordo com o artigo 26.º, n.º 2, do CPPT: «No caso de remessa pelo correio, sob registo, de requerimentos, petições ou outros documentos dirigidos à administração tributária, considera-se que a mesma foi efetuada na data do respetivo registo, salvo o especialmente estabelecido nas leis tributárias». Ou seja, nos casos em que o requerimento foi enviado por correio postal registado, para se aferir do cumprimento de um prazo legal, deverá atender-se à data do respetivo registo, sendo para este efeito totalmente irrelevante a data de receção do requerimento pelo destinatário. Conforme resulta da matéria de facto provada a Recorrente (i) foi notificada da decisão de indeferimento do pedido de restituição de contribuições e quotizações pagas indevidamente com referência à atribuição de prestações extraordinárias nos anos de 2020, 2021 e 2022, no dia 29 de maio de 2025 e (ii) apresentou o requerimento para passagem de certidão com indicação dos meios de reação daquela decisão no dia 30 de junho de 2025. Ora, dispondo a Recorrente de 30 dias para requerer a passagem de certidão com indicação dos meios de reação da referida decisão de indeferimento a contar da data da respetiva notificação (cfr. artigo 37.º, n.º 1, do CPPT), e contando-se os prazos em procedimento tributário de modo contínuo e transferindo-se o seu termo, quando terminem em dia em que os serviços estejam encerrados, para o primeiro dia útil seguinte (cfr. artigos 57.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária, 20.º, n.º 1, do CPPT e 279.º do Código Civil), tal prazo terminava no dia 30 de junho de 2025. Ou seja, a Recorrente podia ter apresentado o requerimento para passagem de certidão até ao dia 30 de junho de 2025 (inclusive), o que efetivamente fez. Com efeito, tendo em conta que, nos termos do artigo 26.º, n.º 2, do CPPT, o requerimento enviado através de correio postal registado enviado para os serviços do INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. se considera apresentado na data do registo e que está cabalmente provado que a data do respetivo registo corresponde ao dia 30 de junho de 2025, não pode senão concluir-se pela apresentação do referido requerimento naquela data e, consequentemente, dentro do prazo legal para o efeito, sendo, por isso, plenamente tempestivo. Resulta, pois, claro que andou mal o Tribunal a quo quando decidiu ser intempestivo o requerimento para passagem de certidão, por considerar que a data relevante para efeitos de aferição da referida tempestividade era o dia 1 de julho de 2025 – correspondente à data da entrada do mesmo nos serviços do INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. Em face do exposto, necessariamente se conclui que a sentença recorrida assenta em erro de julgamento, impondo-se como tal a respetiva revogação. Concluindo-se pela tempestividade do pedido de passagem de certidão, importa agora saber se a Autora tem direito às informações pretendidas e o Réu o dever de as facultar. Dispõe o art.º 104.º n.º 1 do CPTA que “quando não seja dada integral satisfação a pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a correspondente intimação, nos termos e com os efeitos previstos na presente secção.” Este processo urgente de intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões (art.º 104.º a 108.º do CPTA) compreende quer a tutela do direito à informação procedimental quer a tutela do direito à informação extra-procedimental, que consagra o direito de todos, independentemente de procedimento administrativo, acederem a arquivos e registos administrativos. No que concerne às restrições e limitações do direito de acesso à informação a Constituição da República Portuguesa, no n.º 2 do seu artigo 268º identifica-as expressamente quanto à vertente não procedimental (matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas (Cfr. ainda a citada Lei n.º 26/2016, de 22 de Agosto, que aprova o regime de acesso à informação administrativa e ambiental e de reutilização dos documentos administrativos, e o artigo 17º do Código do Procedimento Administrativo). O mesmo não se verifica relativamente ao direito de informação procedimental, cujas ressalvas, limites ou excepções foram previstas na lei, mormente no artigo 83º do CPA (documentos classificados – a interpretar no sentido de incidirem sobre matéria secretas ou confidenciais) ou que relevem segredo comercial, industrial, relativo à propriedade literária, artística ou científica; documentos que contenham dados pessoais relativos a terceiros (a interpretar no sentido de tais dados prejudicarem direitos fundamentais, mormente a intimidade das pessoas ou reserva da vida privada (Cfr. artigo 2º da Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro – Lei da protecção dos dados pessoais). Constituem, pois, requisitos do processo de intimação para passagem de certidões, no âmbito tributário: a) não ter sido dada satisfação ao pedido formulado, no prazo de 5 dias – n.º 2, do artigo 24º do CPPT («Nos procedimentos e processos não informatizados, as certidões e termos são passados mediante a apresentação de pedido escrito ou oral, no prazo máximo de cinco dias»); b) a matéria objecto dos pedidos formulados não ter carácter secreto – artigo 83º do CPA, aplicável por força do disposto na alínea d) do artigo 2º do CPPT. No caso em apreço, verificam-se reunidos os referidos pressupostos, os quais, aliás, não foram questionados nos autos pelo Réu, pelo que se impõe julgar procedente o pedido de intimação formulado pela Autora. Refira-se, por último, que tendo a Autora deduzido no articulado de resposta à oposição um pedido de condenação do INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. em litigância de má-fé, que assenta no facto de este ter alicerçando a sua oposição numa norma legal que não contém – e nunca conteve – a formulação por si invocada, a sentença também se deveria ter pronunciado sobre essa questão. Daí que, não tendo havido a pronúncia que se impunha, essa omissão seria suscetível de ser invocada em recurso, nos termos do nº 4 do artigo 615º do CPC. Não tendo o Recorrente reagido contra esse vício, que não é de conhecimento oficioso por este Tribunal, deve considerar-se que tal questão não integra o objeto do presente recurso. E, assim, formulamos as seguintes conclusões/Sumário: I – No âmbito da acção de intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões, a exigência de salvaguarda do princípio do contraditório reclama que seja concedida ao autor a possibilidade de se pronunciar quanto à matéria de exceção que na resposta da entidade demandada for invocada; II - Consequentemente, serão de admitir os meios de prova que se afiguram relevantes para a demonstração dos factos invocados nesse articulado suplementar. III - Nos casos em que o requerimento de passagem de certidão foi enviado por correio postal registado, para se aferir do cumprimento do prazo previsto no nº 1 do artigo 37º do CPPT, deverá atender-se à data do respetivo registo, sendo para este efeito totalmente irrelevante a data de receção do requerimento pelo destinatário. IV – Constituem requisitos do processo de intimação para passagem de certidões, não ter sido dada satisfação ao pedido formulado, no prazo de 5 dias (nos procedimentos e processos não informatizados) e a matéria objecto dos pedidos formulados não ter carácter secreto.
Decisão
Custas pela Entidade Recorrida.
Registe e notifique. Lisboa, 30 de outubro de 2025 (Ângela Cerdeira)
(Patrícia Manuel Pires)
(Rui A. S. Ferreira) Assinaturas eletrónicas na 1ª folha |