Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1462/09.6BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:09/25/2025
Relator:MARIA HELENA FILIPE
Descritores:LEI Nº 38-A/2023, DE 2 DE AGOSTO (LEI DA AMNISTIA)
SANÇÃO DISCIPLINAR DE ADVERTÊNCIA REGISTADA
AMNISTIA PRÓPRIA E IMPRÓPRIA
EFICÁCIA EX-TUNC
A IMPOSSIBILIDADE DA INSTÂNCIA IMPLICA A ANULAÇÃO DO ACTO DISCIPLINAR, MAS NÃO ABRANGE A CONDENAÇÃO POR DANOS MORAIS
CONHECIMENTO DOS PRESSUPOSTOS, CUMULATIVOS, DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL PREVISTOS NO RRCEEEP.
Sumário:I - Perfilando-se a Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, que veio estabelecer
Perdão de Penas e Amnistia de Infracções assentando a sua
ratio legis na realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude com a presença de Sua Santidade o Papa Francisco, sendo que vigora relativamente a um determinado período temporal, abrangendo sanções expressamente tipificadas, aplica-se in casu.
II - A amnistia respeita às infracções abstractamente consideradas, ‘apagando’ a natureza criminal do facto.
III - Prevê o nº 2 do artº 128º do Código Penal que “a amnistia extingue o procedimento criminal e, no caso de ter havido condenação, faz cessar a execução tanto da pena e dos seus efeitos como da medida de segurança” sendo que o nº 3 estatui que “o perdão genérico extingue a pena, no todo ou em parte”.
IV - A amnistia caracteriza-se, pois, como um pressuposto negativo da punição na medida em que obsta a que o arguido sofra a sanção que, ou lhe vai ser aplicada ou que, entretanto, já o foi.
V - A partir do momento em que o perdão genérico passou a ser contemplado no ordenamento jurídico, deixou de ter lugar a distinção entre amnistia própria e imprópria.
VI - A sanção disciplinar de suspensão por se encontrar amnistiada, implica necessariamente a cessação da sua execução, fosse qual fosse o resultado da causa, com eficácia ex-tunc.
VII - Revertendo o efeito da amnistia à data da aplicação da pena disciplinar implica o desaparecimento do acto impugnado, tornando inútil a instância quanto à anulação da decisão sancionatória;
VIII - Não obstante, a aplicação da amnistia à supracitada pena disciplinar não abrange a condenação da Recorrente no pagamento ao Recorrido, do pedido indemnizatório. Isto porque, este último, não veio, expressamente, desistir do pedido de condenação formulado para além da anulação do acto, pelo que a instância quanto àquele não perde a respectiva utilidade.
IX - Tal vale por dizer que se devem passar então a conhecer os pressupostos, cumulativos, da responsabilidade civil extracontratual previstos no RRCEEEP.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Social
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. Relatório

Ordem dos Revisores Oficiais de Contas vem interpor recurso de apelação da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC de Lisboa), datada de 25 de Junho de 2019, que julgou procedente a acção administrativa especial, contra si intentada por J......, que anulou o acto que lhe aplicou a pena disciplinar e a condenou no pagamento de uma indemnização por danos morais no valor de 2.000€.
Para tal, apresentou as respectivas alegações e conclusões, a fls 289 sendo que foram deduzidas as contra-alegações e conclusões, a fls 320.
O recurso foi admitido pelo despacho de 7 de Outubro de 2019.
As partes foram notificadas para, querendo, se pronunciarem sobre a aplicação in casu da Lei da Amnistia aprovada pela Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, e não se pronunciaram – vide fls 408.
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Notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, não emitiu parecer.

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Prescindindo-se dos vistos legais, mas com prévia remessa do projecto de acórdão aos Senhores Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à conferência desta Subseção da Administrativa Social da Secção do Contencioso Administrativo para julgamento.
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II. Objecto do recurso

Antes da apreciação e decisão das questões colocadas pela Recorrente, delimitadas pelas conclusões das respectivas alegações, em harmonia com o disposto no artº 5º, no artº 608º, no nº 4 do artº 635º e nos nºs 1, 2 e 3 do artº 639º, todos do CPC ex vi do nº 1 do artº 140º do CPTA, importa aferir da aplicação, ao caso concreto, da invocada Lei da Amnistia – Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto – vide Acórdão deste TCA Sul, Processo nº 80/23.0BCLSB, de 23 de Novembro de 2023; artº 7º-A do CPTA e artº 130º do CPC ex vi do artº 1º do CPTA.
Mais releva apreciar se a aplicação da amnistia à pena disciplinar abrange a condenação do pagamento, no valor de 2.000€, a título de danos morais.
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III. Factos (dados como provados na decisão recorrida):

“A) Em 15.11.2007 foi aprovada a acta n.º 73 da M........, SA, com o seguinte teor:
“(…)
Em consequência da deliberação tomada, foi ainda deliberado alterar a redacção do n.º 2 do art.º 13.º do pacto social que passa a ter a seguinte redacção:
(…)
Artigo 15.º
Um – A fiscalização da sociedade, bem como a revisão das suas contas, competem ao Fiscal Único ou um Conselho Fiscal, composto por três membros efectivos e um suplente, eleitos pelos accionistas, por um mandato com a duração anual, podendo ser reeleitos uma ou mais vezes.
Passando de imediato à análise, discussão e votação do ponto três da ordem de trabalhos, e uma vez que foi deliberado alterar a duração dos mandatos dos órgãos sociais para anuais, foi deliberado e aprovado por unanimidade eleger os seguintes órgãos sociais para o ano de 2007, em substituição dos anteriores:
(…)
Fiscal Único
Efectivo: Diz, S........, Sociedade de Revisores Oficiais de Contas Suplente: Dr. J........ (…).” (dado como provado com base em fls. 11 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
B) Em 27.02.2008, a Diz, S........, Sociedade de Revisores Oficiais de Contas elaborou um ofício, dirigido à A........, F.........., com o seguinte teor:
“(…)
Fomos recentemente contactados para assumir o exercício de funções de Revisor Oficial de Contas/Fiscal Único da Sociedade M........, SA. Nestas circunstâncias, e nos termos do n.º 3 do art.º 10.º do Código de Ética e Deontologia Profissional, solicitamos que nos informem se conhecem quaisquer razões de ordem profissional que desaconselhem a aceitação da referida nomeação e se os vossos honorários foram pagos por aquela Sociedade. (…).” (dado como provado com base em fls. 8 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
C) Em 28.02.2008 foi aprovada a acta n.º 75 da M........, SA, com o seguinte teor:
“(…)
Declarada aberta a sessão e passando de imediato à análise, discussão e votação do ponto único da ordem de trabalhos, foi deliberado e aprovado por unanimidade eleger os seguintes órgãos sociais para o ano de 2008:
(…)
Fiscal único
Efectivo: Diz, S........, Sociedade de Revisores Oficiais de Contas (…) Suplente: Dr. J........ (…).” (dado como provado com base em fls. 12 do processo administrativo, em suporte de papel);
D) Em 07.03.2008, A.......... elaborou um ofício dirigido à Diz, S........, com o seguinte teor:
“(…)
Sobre o assunto a que se refere na vossa carta acima indicada, recebida em 4 do corrente mês, vimos informar, o que certamente é do vosso conhecimento, que a designação de Fiscal Único da Sociedade M........, SA, conforme Certidão da Conservatória do Registo Comercial de 12/02/08, incidiu sobre a Sociedade de Revisores Oficiais de Contas A.........., F.........., cujo duração do mandato é o triénio 2006-2007-2008, de acordo com a deliberação de 19/04/06. Julgamos que esta informação irá de encontro ao esclarecimento solicitado, assim como o desaconselhamento da referida nomeação indicada na vossa carta, tendo em atenção o estabelecido no Estatuto dos Revisores Oficiais de Contas. (…).” (dado como provado com base em fls. 9 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
F) J......, aqui Autor, subscreveu a seguinte declaração:
“(…) Dando cumprimento ao estabelecido no n.º 7 do art.º 50.º do Decreto-Lei n.º 487/99, de 16 de Novembro, Diz, S........, Sociedade de Revisores Oficiais de Contas, (…) representada pelo seu sócio-administrador J......, (…) declara ter aceite a nomeação como fiscal único efectivo da sociedade M........, SA, para o exercício de 2007, efectuada por acta da Assembleia Geral de 15 de Novembro de 2007.” (dado como provado com base em fls. 256 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
G) J......, aqui Autor, subscreveu a seguinte declaração: “Dando cumprimento ao estabelecido no n.º 7 do artigo 50.º do Decreto-Lei n.º 487/99, de 16 de Novembro, eu, Joaquim Santos Silva, (…) declaro ter aceite a nomeação como fiscal único suplente da sociedade M........, SA, para o exercício de 2007, efectuada por acta da Assembleia Geral de 15 de Novembro de 2007.” (dado como provado com base em fls. 257 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
H) Em 18.07.2008, o Autor remeteu para a Entidade demandada, o seguinte documento:
“(…)
Assunto: M........, SA – CLC/2007
A sociedade em epígrafe alterou o pacto social a 15/11/2008.
Entre as alterações, os mandatos dos órgãos sociais passaram a ser anuais e não trimestrais. E foram logo ali nomeados os novos órgãos sociais, entre os quais esta SROC representada pelo ROC signatário. Os novos órgãos sociais não substituíram os anteriores, mas sucederam-lhe em mandato diferente.
Como em relação ao final do exercício de 2007 a SROC anterior já não constava dos Estatutos, não lhe foram presentes as contas, pelo que esta emitiu uma declaração de impossibilidade de certificação, A nós, a mesma sociedade apresentou as contas, pelo que agora já estamos em condições de emitir a CLC. Se nada nos for dito em contrário pela OROC, emiti-la-emos até ao próximo dia 31, data-limite para apresentação do processo do alvará. A manutenção deste alvará é condição de sobrevivência da sociedade em epígrafe. (…).” (dado como provado com base em fls. 264 do processo administrativo em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
I) A.......... e associados enviou para o Presidente do Conselho de Administração da M........, SA um documento, datado de 22.08.2008, com o seguinte teor:
“Assunto:
Honorários vencidos e já comunicados
Implicações legais e contratuais
(…)
Sintetiza-se os factos descritos, complementando com situações vindas a conhecimento e que são relevantes para a atitude assumida, por esta Sociedade de Revisores:
1.Damos como transcritos os pontos 1 a 5 da Declaração de Impossibilidade de Certificação Legal de Contas, datada de 12/06/08, assim como o seu último período;
2.A SROC Diz S........ enviou a carta datada de 27/02/08, recebida nos escritórios da nossa SROC em 4/03/08, sobre a consulta da M........, SA para o desempenho de Fiscal Único, por força do Código de Ética da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, de que se junta fotocópia, apesar de ser já do seu conhecimento.
Em 70/03/2008, seguindo o Código de Ética, esta SROC respondeu, conforme fotocópia da nossa carta que se junta.
3.Na sequência do descrito em 2. foi enviada carta ref. 3772 à SROC Diz, S........, solicitando informação sobre a posição evolutiva em relação ao assunto que nos tinha apresentado (junta-se fotocópia da nossa carta).
4.Perante a atitude assumida pela M........, SA, cuja Presidência do Conselho de Administração é do Sr. M........, ao consultar a SROC, Diz, S.......... para o desempenho de Fiscal Único do M........, SA, constatámos uma atitude profissional algo confusa, no que respeita aos direitos e obrigações contratuais inerentes ao mandato de 2006 a 2008 já referido, e registado na Conservatória do Registo Comercial de Lagoa em 20/04/2006.
5. No artigo 54.º do Decreto-Lei n.º 487/99 (inamovibilidade) estabelece que os Revisores Oficiais de Contas designados para o exercício da Revisão Legal de Contas são inamovíveis, antes de terminado o mandato, salvo com o expresso acordo manifestado por escrito, ou verificada justa causa arguível, nos termos previstos no Código das Sociedades Comerciais.
6.Esta Sociedade de Revisores não só estava obrigada à Revisão e Certificação Legal de Contas, como sempre procedeu junto da Sociedade M........, SA, com lealdade, imparcialidade e respeito, designadamente em relação às contas do exercício de 2006, registadas na Conservatória do Registo Comercial de Lagoa, pelo que a atitude incorrecta do Órgão de Gestão originou, não só a Declaração de Impossibilidade, como ainda a renúncia, com justa causa, ao cargo de Fiscal Único, nos termos da carta enviada em 12 de Junho de 2008, tanto mais que existem incumprimentos de matéria técnica e jurídica, já anteriormente citados, como ainda se encontram em dívida os honorários oportunamente apresentados de todo o ano de 2006 e 2007.
7.Chegou ao nosso entendimento fotocópias das Actas n.ºs 73 e 75, que se anexam, da Assembleia Geral de accionistas de M........, SA, que constam na Conservatória do Registo Comercial de Lagoa. A acta n.º 73, do mês de Novembro de 2007, e a acta n.º 75, de Fevereiro de 2008, evidenciam a falta de lealdade para com o Fiscal Único, com mandato de 2006 a 2008, pelo que reforça a atitude assumida por esta Sociedade de Revisores que, inclusivamente, reserva o direito de tomar providências de salvaguarda do seu bem nome e reputação e de exigir, em relação ao último ano do mandato, isto é o ano de 2008, a aplicação do artigo 564.º do Código Civil, o que corresponde a indemnização como dano concretamente sofrido.
Assim, mais uma vez se insiste no pagamento dos honorários já apresentados desde o início do ano de 2006, até 31 de Dezembro de 2007, devendo ter-se em consideração a aplicação do artigo 564.º do Código Civil, pela quebra intencionalmente provocada do mandato.” (dado como provado com base em fls. 3 e segs. do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
J) Em 19.08.2008, a A.........., F........., Sociedade de Revisores Oficiais de Contas enviou para a Entidade demandada, um ofício com o seguinte teor:
“Assunto:
Sociedade Comercial M........, SA
(…)
Existindo processo em curso de rescisão unilateral por justa causa, em relação à Sociedade em referência, por incumprimento das obrigações legais e contratuais, vimos transmitir a Declaração de Impossibilidade de Certificação que entretanto foi enviada, onde constam os fundamentos da mesma.
(…)
Declaração de impossibilidade de Certificação Legal de Contas
(…) tem com a sociedade comercial M........, SA (...) um contrato de prestação de serviços e um mandato para o cargo de Fiscal Único, renovado por deliberação de 19 de Abril de 2006, para o triénio de 2006-2008, conforme consta da certidão do Registo Comercial da sociedade M........, SA (…)
Entretanto, nos termos e para os efeitos dos artigos 420.º, 65.º e 376.º, todos do Código das Sociedades Comerciais, a esta sociedade de Revisores Oficiais de Contas não foi facultado e permitido o exame das Demonstrações Financeiras do exercício findo a 31 de Dezembro de 2007 da Sociedade M........, SA, em conformidade com as Normas Técnicas e as Directrizes de Revisão/Auditoria da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas e como de seguida se descreve:
1.A análise efectuada à documentação do 1.º trimestre de 2007, recebida em Agosto de 2007, evidenciou o agravamento da situação da sociedade pelo que foi diligenciada uma reunião com o Sr.M........, Presidente do Conselho de Administração. Por impossibilidade do próprio Sr. R......... a reunião foi efectuada com a Dra. S........., Administradora Financeira. A 13 de Novembro de 2007 analisámos as contas reportadas a 30 de Junho de 2007 e como no balancete de M........, SA facultado a 13 de Janeiro de 2008, através de email verificaram-se movimentos que justificavam uma circularização que foi promovida através da n/carta ref.ª 3745 enviada para o faxe n.º 2......... de M........ SA a 23 de Janeiro de 2008 com as minutas e listas correspondentes a depósitos bancários, empréstimos, clientes e fornecedores e por carta registada a 25 de Janeiro de 2008.
2. Nas diligências levadas a efeito para análise dos suportes documentais inerentes ao último balancete reportado a 30.10.07 formos informados telefonicamente a 23.01.08 de que Administração pretendia realizar uma reunião com o Dr. A.........., o que foi prontamente atendido no sentido da mesma se efectuar no dia 24.01.08, pelas 17h30, nos escritórios da empresa sitos em Portimão.
3.Na reunião realizada no dia 24.01.08 estiveram presentes para além do Sr. M........, Presidente do Conselho de Administração, a Dra. S........., Administradora Financeira e um Advogado que se apresentou como legal representante de um investidor, e o representante do Fiscal Único, Dr. A...........
Nessa reunião, foi transmitido pelo Sr. M........, Presidente do Conselho de Administração, que tinham havido alterações relevantes na sociedade, justificando de seguida o atraso da informação prestada.
4.Na verdade, na supra referida reunião foram feitas considerações apenas verbais e genéricas de eventuais alterações que, até à presente data, nunca foram efectivamente comunicadas à Sociedade Revisores Oficiais de Contas nem suportadas documentalmente o que contraria o dever de informação imposto pelas disposições legais, designadamente o Código das Sociedades Comerciais.
5.Após diligências frustradas para a obtenção de respostas foi enviada nova carta – Ref.ª 3774 – no sentido de que “(…) leva-nos a insistir nos esclarecimentos solicitados no seu ponto 6, porquanto, certamente têm implicações nas contas do exercício que, devendo já estar encerradas, ainda não nos foram transmitidas. Assim, vimos insistir no seu envio com urgência, do conjunto inerente às contas a certificar, porquanto estamos obrigados à sua revisão legal e certificação, quer do ano de 2007, quer do ano de 2008. Informamos que esta Sociedade de Revisores não só está obrigada ao desempenho citado, como pretende levar a efeito aquilo que se comprometeu.
Nestas condições, e uma vez que não nos foram, até esta data, enviadas as Demonstrações Financeiras – balanço, contas de resultados, anexo inerente e relatório de gestão – a que a empresa está obrigada pelo Código das Sociedades Comerciais declaramos, de acordo com o referido Código e Normas Técnicas e as Directrizes de Revisão/Auditoria da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, a impossibilidade de emitir a Certificação legal das contas da M........, SA. (…).”
(dado como provado com base em fls. 13 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
K) Em 15.09.2008 foi exarado o seguinte despacho:
“Apreciando o assunto, foi deliberado abrir processo de inquérito (c/ o n.º 19/2008), sendo nomeado instrutor o (…) M.......... Participante: A.................. (…) Participado: Diz, S........, SROC.” (dado como provado com base em fls. 1 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
L) Em 16.09.2008, a Entidade demandada elaborou o seguinte documento: “Certificado do registo disciplinar
Para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 44.º do Regulamento Disciplinar da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, certifica-se que no registo disciplinar da Sociedade de Revisores Oficial de Contas, Diz, S........ SROC inscrita nesta Ordem em 3/12/93 sob o n.º 1……, nada consta.” (dado como provado com base em fls. 16 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
M) Em 22.09.2008, a Entidade demandada elaborou um ofício dirigido a Diz, S........ SROC, com o seguinte teor:
“Assunto: Processo de inquérito n.º 19/2008
(…)
No âmbito das averiguações para instrução do inquérito acima identificado, venho convocar a vossa sociedade para estar presente, através de representante legal, no dia 9 de Outubro de 2008, às 10 horas, na sede da Ordem, a fim de prestar declarações relacionadas com a mudança de revisor/fiscal único da sociedade M........, SA.” (dado como provado com base em fls. 17 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
N) Em 23.09.2008 foi assinado o aviso de recepção da carta de envio do ofício referido na alínea antecedente (dado como provado com base em fls. 21 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
O) Em 23.09.2008, o aqui Autor enviou para a Entidade demandada uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “(…) Recebi a convocatória anexa e venho pedir que a reunião para que fui convocado no dia 9/10/2008, de manhã, seja transferida para a parte da tarde. É que de manhã terei aulas de pós-graduação (PDE/AESE) a que não devo faltar… (…)”. (dado como provado com base em fls. 18 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
P) Em 23.09.2008, a Entidade demandada enviou ao Autor uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor:
“(…)
Encarrega-me o Dr. M........., Instrutor do Processo n.º 19/2008, que a convocatória marcada para o dia 9/10/2008 às 10 horas passa para as 14h30m, conforme solicitado no s/email (…).” (dado como provado com base em fls. 19 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Q) Em 25.09.2008, a Entidade demandada elaborou um ofício dirigido à M........, SA, com o seguinte teor:
“Assunto: Registo do início de funções da Diz, S........, SROC, como fiscal único na M........, SA
Em resposta à V/carta, acima referenciada, venho, depois de examinada a documentação disponibilizada com interesse para a apreciação do caso, informar o seguinte:
1.A Assembleia geral das sociedades não dispõe de poderes para alterar, com efeitos imediatos, os mandatos, ainda a decorrer, conferidos aos membros dos respectivos corpos sociais, designadamente ao ROC/SROC (art. 50.º, n.ºs 1 e 3 do Estatuto da Ordem, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 487/99, de 16/11 – EO e art.º 415.º do Código das Sociedades Comerciais – CSC). Ao ROC é, aliás, garantida a inamovibilidade (art.º 54.º do EO) a qual implica a impossibilidade de ser afastado do respectivo cargo no decurso do mandato, a não ser com base no seu acordo expresso manifestado por escrito ou com fundamento em justa causa arguível nos termos do art.º 419.º.
2.O que significa que, contrariamente ao que sucede com os gerentes e administradores, que podem ser destituídos por deliberação da assembleia geral, em qualquer momento (art.ºs 257.º, n.º 1 e 403.º, n.º 1 do CSC) os ROC designados para o exercício de funções de interesse público de revisão legal das contas somente podem ser removidos, antes do termo do respectivo mandato, desde que ocorra um dos dois pressupostos indicados.
Pelo que, não se tendo verificado um destes requisitos, em 15/11/2007, data da reunião da assembleia geral dessa Empresa, para um ano, o mandato dos corpos sociais, tal alteração não era oponível à A.........., F.........., SROC; porque, em relação a esta, a eficácia dessa deliberação (na parte respeitantes à designação da nova SROC, a Diz, S........) apenas teria início, em 01/01/2009, sabido que dispunha de mandato conferido, em 19/04/2006, para o triénio 2006/2006. Devendo, por isso, ter-lhe sido apresentada, pela Empresa, a documentação indispensável à emissão da certificação legal das contas do exercício de 2007.
3.Tal alteração veio precipitar a emissão, pela A.........., F........., da declaração de impossibilidade de certificação legal das contas, com data de 12/06/2008, bem como do envio, da carta ao Presidente do Conselho de Administração dessa Empresa na qual se informa a “renúncia, com justa causa”, a partir de 12/06/2008, do cargo do fiscal único, “com as consequências daí decorrentes”. Todavia, e de acordo com informação prestada pelo Serviço de Controlo de Actividades, nesta data, aquela SROC ainda não comunicou à Ordem a cessação do contrato de prestação de serviços decorrente da impropriamente designada “renúncia”.
4.Mas, os termos em que esta foi apresentada pela SROC não deixam quaisquer dúvidas de que aquela manifestou, através do seu representante e de forma expressa, a vontade de se desvincular da relação de serviço que mantinha com essa Empresa. Posição que vai ao encontro da declarada intenção da Sociedade de prescindir dos serviços da SROC em causa, que se colhe da carta, de 18/08/2008. Por tais motivos ter-se-á de aceitar que ocorreu uma cessação antecipada do mandato da referida SROC por acordo expresso entre as partes (art.º 54.º do EO).
E, por conseguinte, de reconhecer a eficácia da designação da Diz, S........, SROC para o mandato relativo ao exercício de 2007. E, com ela, o registo do início de funções da mesma SROC como fiscal único da M........, SA.
5.Quanto aos comentários que essa Empresa se permitiu tecer acerca das razões que justificariam o afastamento da A.........., F.........., SROC, importará tão só referir que as mesmas se revelam, no mínimo, inoportunas, tendo em atenção que, existindo um processo específico para a discussão de tal matéria – o processo de destituição por justa causa – caberia a essa Empresa a iniciativa desse processo, sem prejuízo da intervenção da Ordem e dos Tribunais competentes, onde tais questões teriam de ser tratadas (art.ºs 54.º e 55.º do EO e art.º 419.º do CSC).” (dado como provado com base em fls. 27 a 29 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
R) Em 29.09.2008, a Entidade demandada elaborou um ofício dirigido à Diz, S........, SROC, com o seguinte teor:
“Assunto: Registo do início de funções da Diz, S........, como fiscal único da M........, SA
(…)
Junto envio para v/ conhecimento, cópia da carta AJ/102/08, de 25 do corrente, que o Conselho Directivo da Ordem remeteu à M........, SA.” (dado como provado com base em fls. 26 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
S) Em 06.10.2008, a Entidade demandada elaborou o ofício dirigido a A........., A.......... e F........., SROC, com o seguinte teor:
“Assunto: Processo de inquérito n.º 19/2008
(…)
No âmbito das diligências para instrução do processo de inquérito acima identificado, venho convocalo para comparecer no dia 13 de Outubro de 2008, às 11:30 horas, na sede da Ordem, a fim de prestar declarações relacionadas com a mudança de Revisor/Fiscal Único da sociedade M........, SA. (…).” (dado como provado com base em fls. 22 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
T) Em 09.10.2008 foi elaborado o auto de declarações do aqui Autor, com o seguinte teor:
“(…) procedeu-se à audição de Dr. J...... (…), na qualidade de inquirido e em representação da sociedade, Diz, S........, SROC no presente processo, que jurou pela sua honra que há-de dizer toda a verdade. Questionado sobre a sua nomeação para o cargo de fiscal único e revisor oficial de contas da sociedade M........, SA declarou que foi eleito na assembleia geral de 15 de Novembro de 2007 para o mandato desse mesmo ano de 2007 sendo que nessa mesma assembleia se procedeu à alteração dos estatutos da mesma sociedade, na parte que tem a ver com o mandato dos corpos sociais, mandato esse que nos termos da nova redacção dada ao art.ºs 12.º, 13.º e 15.º do contrato da sociedade, passou a ser anual em vez de trienal, conforme acta n.º 73 da dita sociedade que se encontra junta ao processo. Quanto ao facto da comunicação à SROC substituída, A........., F.........., ter sido feita e, 27 de Fevereiro de 2008, conforme carta junta ao processo, declarou que só o fez nessa data porque só nessa altura teve conhecimento que havia sido nomeado, sendo os elementos de identificação da sua SROC apostos pelos accionistas na acta, provenientes de relações existentes com outras empresas do grupo. Questionado sobre se tinha assinado o contrato de prestação de serviços com a Empresa declarou que não o tinha feito porque o processo de substituição se encontrava pendente de clarificação pela OROC, designadamente por razões que tinham a ver com a carta da SROC substituída, datada de 7 de Março de 2008 junta ao processo, na qual se encontra expressa a referência ao desconhecimento por parte do inquirido da situação da SROC substituída. Por idênticas razões, disse, que não comunicou à OROC a sua nomeação para o cargo, mas sim a situação em questão. Questionado sobre o facto de não ter respondido à carta da SROC substituída, datada de 24 de Março de 2008, junta ao processo declarou que não o fez em virtude nessa mesma data o assunto já se encontrar na esfera da OROC para apreciação. Uma eventual resposta a essa carta seria inócua uma vez que o processo se encontrava já obre averiguação da OROC. Perguntado sobre a posição que tinha quanto ao mandato (3 anos, 2006/2008) a decorrer da SROC substituída e o novo mandato (1 ano, 2007) para o qual foi eleito, declarou que desconhecia o teor dos estatutos, bem como os mandatos e as alterações realizadas ao mesmo, uma vez que disse, as alterações efectuadas foram feitas pelos accionistas unilateralmente sem o seu conhecimento.
Reafirmou ainda que não assinou o contrato nem sequer subscreveu a declaração de aceitação. Questionado sobre a emissão da certificação legal das contas de 2007, declarou que não a emitiu, pelas razões já mencionadas (processo em apreciação na OROC) dizendo todavia que tal emissão irá ser feita oportunamente uma vez que a empresa M........, SA recebeu já a informação da OROC por carta datada de 29 de Setembro de 2008 na qual é proferido o entendimento de que a SROC que o inquirido representa pode efectivamente assumir o mandato relativo ao exercício de 2007, conforme cópia da carta que apresentou que fica a fazer parte integrante do presente auto. Prometeu juntar cópia da versão anterior da sociedade no prazo de 8 dias a contar da presente data. Declarou por fim que a sua conduta no presente processo se pautou pelo cumprimento e normas da OROC designadamente na vertente ética e no relacionamento com a SROC substituída.” (dado como provado com base em fls. 24 e 25 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos);
U) Em 13.10.2008 foi elaborado o auto de declarações de A........., na qualidade de participante, com o seguinte teor:
“(…) procedeu-se à audição do Dr. A......... (…) na qualidade de participante e em representação da sociedade A.......... e F.........., SROC no presente processo, que jurou pela sua honra que há-de dizer toda a verdade. Declarou que face à situação financeira da sociedade M........, SA, já sentida desde 2005 mas que foi mais notória a partir do primeiro semestre de 2007, designadamente a dívidas ao fisco e segurança social, procurou com base nas contas que lhe foram apresentadas relativas a 31 de Outubro de (…), as quais só chegaram à sua posse em Janeiro de 2008, fazer uma circularização.
Depois de vários contactos com a empresa a que se seguiu uma reunião com o Presidente da Administração, na qual esteve presente o participante, sentiu da parte da Empresa uma atitude de bloqueio a esse trabalho sendo notório nessa reunião, na qual também estava presente o advogado representante do novo investidor, estavam em curso alterações à estrutura da sociedade. Seguiu-se a insistência do pedido de informações sobre a reestruturação da Empresa, bem como o pedido de apresentação das contas relativas a 2007, o que não aconteceu.
Entretanto, com data de Fevereiro de 2008, a sociedade Diz, S........, SROC, indaga junto da SROC A......... e F.........., SROC substituída sobre motivos que possam impedir a sua nomeação para o cargo de fiscal único/ROC da M........, SA à qual respondeu a SROC A.......... e F......... e Associados, por carta de 7 de Março de 2008, um e outro documento constantes do presente processo. Posteriormente, a SROC A.......... e F.........., SROC insistiu junto da SROC Diz, S........, por carta de 24 de Maio de 2008, informação sobre a situação, mas não obteve resposta, doc. também junto ao processo. Por em 30 de Maio de 2008 ainda não tinha sido recebidas as contas do exercício de 2007 reportadas a 31/12/2007, face a esta situação de impasse que estava a inviabilizar o cumprimento das suas obrigações de fiscal único e revisor oficial de contas, sem que houvesse condições para cumprir esses deveres sentiu-se forçado a, em nome e representação da sociedade A.......... e F.........., SROC, a emitir a “Declaração de Impossibilidade de Certificação Legal das Contas” datada de 12 de Junho de 2008.” (dado como provado com base em fls. 30 e 31 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
V) Em 13.10.2008, a A.........., F.......... elaborou um documento dirigido à Entidade demandada, com o seguinte teor:
“Assunto:
Processo de Inquérito n.º 19/2008
V/ carta ref.ª CDis/114/08 de 6/10/08
(…)
Na sequência da vossa carta acima referida, juntamos fotocópias da seguinte documentação:
. Acta n.º 66 da Sociedade M........, SA, datada de 19 de Abril de 2006, referente à nomeação desta SROC para os exercícios de 2005/2008, bem como Declaração de aceitação desta SROC e correspondente registo na Conservatória do Registo Comercial, conforme Certidão anexa de 12/02/08;
. Carta ref.ª 863/ADM/99, de 9/06/99, referente à nomeação desta SROC como Fiscal Único para o triénio 1999/2001;
. Contrato de prestação de serviços desta SROC com a Sociedade M........, SA;
. Comunicação à OROC, conforme mapas de Actualização do Processo Profissional remetidos em 8/11/00;
. Estatutos da Sociedade M........, SA, conforme Certidão anexa da escritura lavrada no 2.º Cartório Notarial de Faro, em 26/10/99;  Nossa carta ref.ª 3811, de 14/08/08 para a OROC, que anexava a Declaração de Impossibilidade de Certificação das Contas da Sociedade M........, SA;
. Nossa carta ref.ª 3814, de 22/08/08 para a OROC, que anexava cópia da correspondência remetida à Sociedade M........, SA (carta ref.ª 3813 dessa data)
. Nossa carta ref.ª 3749, de 31/01/08, dirigida ao Presidente do Conselho de Administração da Sociedade M........, SA;
. Certidão completa da Conservatória do Registo Comercial de Lagoa-Algarve, datada de 24/07/08.” (dado como provado com base em fls. 32 a 110 do processo administrativo, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
W) Em 14.10.2008, a Diz, S........ elaborou e enviou um documento, dirigido à Entidade demandada, com o seguinte teor:
“Assunto: M........, SA – CLC/2007
Ref.ª C_OROC_14-10-2008_1
Exmo. Senhor
De acordo com o combinado, junto versão dos Estatutos da M........, SA, antes das alterações introduzidas pelos accionistas em Assembleia Geral de 15 de Novembro de 2007. (…)”. (dado como provado com base em fls. 111 a 123 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
X) Em 14.10.2008, a Diz, S........ elaborou o documento “Certificação legal das contas”, relativo a M........, SA (dado como provado com base em fls. 259 a 262 do processo administrativo, junto aos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Y) Em 23.10.2008, a A........., F.......... elaborou e enviou um documento dirigido à Entidade demandada com o seguinte teor:
“(…)
Tendo sido ouvido pelo instrutor do Processo 114/08, Dr. O........., sobre assuntos versados no Código de Ética e Deontologia Profissional, cuja audição deu origem ao Auto de declarações efectuado em 13/10/08, vimos transmitir, para conhecimento, a nossa carta ref.ª 3832, de 20 de Outubro de 2008, que versa matérias relacionadas com a audição efectuada e que, estando de acordo com a carta recebida do Conselho Directivo nos pontos 1, 2 e 3 da mesma, evidencia a sua discordância, através de posição clarificadora, no que respeita à problemática do mandato para 2006, 2007 e 2008 da Sociedade M........, SA e interfere com o Código de Ética e Deontologia Profissional em relação à Sociedade de Revisores Oficiais de Contas Diz, S.........
A suportar a nossa carta para o Conselho Directivo, foi anexada toda a correspondência relacionada com esta situação que pode pôr em causa a validade do Código de Ética e Deontologia Profissional, desprestigiando a nossa Ordem de Revisores Oficiais de Contas.
Deve referir que tive ocasião de pessoalmente intervir, por nomeação oficial, no grupo que preparou o Decreto-Lei n.º 519-L2/79 de 29 de Dezembro, da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas à data, que foi muito discutido em várias sessões da Assembleia Geral até à sua entrega ao Governo, e que instituiu o conceito de inamovibilidade através do seu artigo 12.º que, presentemente, está inserido no Decreto-Lei n.º 487/99, no seu art.º 54.º.
Esta carta, enviada por fax, vai igualmente ser enviada por correio registado, com toda a documentação.” (dado como provado com base em fls. 125 a 153 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Z) Em 06.11.2008, o Presidente do Conselho Directivo da Entidade demandada enviou para o Presidente do Conselho Disciplinar da Entidade demandada, um ofício com o seguinte teor:
“(…)
O Conselho Directivo reconheceu que as sociedades Diz, S........, SROC e A.........., F.........., SROC, não observaram as normas de ética e deontologia profissional no processo de substituição de fiscal único na M........, SA, nem assim no acompanhamento da actividade desta empresa, pelo que se remete o processo para o Conselho Disciplinar no sentido de decidir em conformidade.” (dado como provado com base em fls. 154 a 250 do processo administrativo, junto aos autos, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
AA) Em 11.11.2008 foi exarado, no ofício referido na alínea antecedente, o seguinte despacho:
“Remeta-se cópia da presente e documentação anexa ao Dr. O........., para ter em consideração, se for o caso, no âmbito do processo de inquérito n.º 19/2008 de que é Instrutor.” (dado como provado com base em fls. 154 do processo administrativo, junto aos autos, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
BB) Em 04.12.2008 foi preenchida a ficha sobre ROC/SROC, intitulada “Comunicação (em cumprimento dos artsº 53.º, n.º 1 e 58.º do Decreto-Lei n.º 487/99, de 16/11)”, na qual consta “Dados sobre o ROC/SROC”: “Roc ou SROC” “Diz, S........”, “Sócio responsável” “J......”, “membro suplente”, “ROC ou SROC” “J........”, “Dados sobre a Empresa”: “Denominação/firma” “M........, SA”, “Data do contr” “02-07-2008” (dado como provado com base em fls. 258 do processo administrativo, em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
CC) Em 30.12.2008, a A.........., F.......... elaborou um documento, dirigido ao Presidente do Conselho Disciplinar da Entidade demandada, com o seguinte teor:
“Assunto:
(…)
Processo de inquérito n.º 19/2008
(…)
Sobre o processo relacionado com a Sociedade de Revisores Oficiais de Contas, Diz, S........, juntamos fotocópia de Certidões do Registo Comercial em anexo:
Anexo 1 – Certidão emitida em 2008/02/12 com o registo do mandato de 2006 a 2008 da nossa Sociedade;
Anexo 2 – Correspondência com a Sociedade Diz, S........ e a nossa Sociedade de Revisores (já oportunamente enviada à Ordem);
Anexo 3 – Carta da nossa advogada de 14 de Novembro de 2008 para a Conservatória do Registo Comercial de Lagoa, chamando a atenção para registos incorrectos na Certidão da Conservatória de Lagoa, emitida em 12/02/2008; Anexo 4 – Certidão da Conservatória narrativa com a extracção das páginas 9/18, sequencialmente até 18/18, sendo a Declaração de Aceitação do ano de 2007 a página 17/18, e a do exercício de 2008, a página 16/18, que, não tendo datas, foram recebidas na Conservatória e anotadas, conforme consta da certidão anexa, que faz referência a uma Assembleia Geral da Sociedade M........, SA de Novembro de 2007.” (dado como provado com base em fls. 267 a 300 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
DD) Em 14.01.2009 foi elaborado o Relatório do Processo de Inquérito n.º 19/2008, com o seguinte teor:
“(…)
I - ANTECEDENTES
1. Por deliberação do Conselho Disciplinar, de 15 de Setembro de 2008, foi aberto o presente processo de inquérito, na sequência de uma participação dirigida à Ordem dos Revisores Oficiais de Contas pela sociedade A.........., F.........., SROC (N° 4), através de cartas datadas, uma de 14 de Agosto de 2008 (fls. 13 a 15 do processo) e outra de 22 de Agosto de 2008 (fls. 3 a 7 do processo).
2. A SROC participante, A.........., F.........., representada por A......... (ROC N° 186) foi eleita para o cargo de Fiscal Único da sociedade M........, S.A., com sede em Lagoa, para o triénio 2006/2008, conforme extracto de certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lagoa (fls. 39 do processo).
3. Pela assembleia geral da M........, S.A., realizada em 15 de Novembro de 2007, conforme Acta n° 73 junta ao processo (fls. 11), foi alterado o pacto social da mesma, compreendendo-se nessa alteração, entre outras, a do artigo 13° que estabeleceu o período anual do mandato dos órgão sociais, incluindo o Fiscal Único, em vez do mandato de um triénio, com vigorava até então.
4. Na sequência dessa alteração do pacto social e ainda na mesma assembleia, procedeu-se à eleição de novos corpos sociais, para o mandato anual de 2007, tendo nela sido eleita para o cargo de Fiscal Único outro revisor, a SROC Diz, S........, representada por J...... (ROC N° 3.........).
5. Na participação feita à OROC, a SROC A.........., F.......... junta cópia de correspondência diversa dirigida à M........, S.A, na qual aborda diversas questões inerentes às suas funções de Fiscal Único da Empresa, nomeadamente: (i) contesta o afastamento da SROC antes do termo do mandato, invocando o regime da inamovibilidade previsto no artigo 54° do Estatuto da OROC, (ii) reclama da Empresa a apresentação de contas do exercício de 2007, (iii) insurge-se contra o impedimento ao exercício das suas funções de fiscalização, o qual decorre da não disponibilização das contas relativas ao exercício de 2007 e (iv) refere que a não disponibilização das contas deixa transparecer a intenção de bloqueio por parte da Empresa, circunstância que motivou a emissão de uma “Declaração de Impossibilidade de Certificação das Contas” do exercício de 2007, emitida com data de 12 de Junho de 2008. II- AVERIGUAÇÕES
6. Na assembleia geral da sociedade M........, S.A., realizada em 15 de Novembro de 2007, a SROC Diz, S........ foi eleita Fiscal Único Efectivo, para o ano de 2007, e J........ (ROC N° 383), como Fiscal Único Suplente, conforme cópia da acta junta ao processo (fls. 11); na assembleia geral da mesma sociedade, realizada em 28 de Fevereiro de 2008, foram eleitas, agora para o ano de 2008, a identificada SROC e o indicado ROC para idênticas funções, conforme consta de cópia da respectiva acta, também junta ao processo (fls. 12).
7. Na assembleia geral da sociedade M........, S.A., realizada em 19 de Abri! de 2006, a SROC A.........., F.......... havia sido eleita para o mandato do triénio 2006/2008, conforme consta do registo da Conservatória do Registo Comerciai de Lagoa (fls. 39 do processo).
8. Por carta de 27 de Fevereiro de 2008 (fls. 8 do processo), a SROC eleita, Diz, S........, representada por J......, indagou junto da SROC A........., F.........., sobre a existência de razões de ordem profissional que obstassem à aceitação do cargo, bem como sobre o pagamento de honorários Em resposta, por carta de 7 de Março de 2008 (ffs. 9 do processo), a sociedade A.........., F.........., SROC, desaconselha a aceitação, com fundamento no facto de se encontrar a decorrer o mandato do triénio 2006/2008, para o qual ela havia sido eleita. Mais tarde, por carta de 24 de Abril de 2008, esta mesma SROC questiona a sociedade Diz, S........, SROC sobre a sua posição sobre o assunto, mas esta não deu qualquer resposta.
9. A SROC A.........., F.........., por carta de 12 de Junho de 2008 enviada à sociedade M........, S.A., a que faz referência no ponto 6 da sua carta de 22 de Agosto de 2008 (fls. 3 a 7 do processo), dirigida ao Presidente do Conselho de Administração da mesma sociedade, comunica a sua "renúncia, com justa causa, ao cargo de Fiscal Único”, com fundamento no incumprimento, por parte da Empresa, de matéria jurídica e técnica, bem como pelo não pagamento dos honorários de 2006 e 2007.
10. Na sequência de consulta formulada pela sociedade M........, S.A., a OROC estudou o assunto e proferiu um parecer (fls, 27 a 29 do processo) que remeteu à dita sociedade, por carta de 25 de Setembro de 2008, e cujo teor, nos seus aspectos mais relevantes para o processo, se transcreve a seguir:
11. "1. A assembleia geral das sociedades não dispõe de poderes para alterar, com efeitos imediatos, os mandatos, ainda a decorrer, conferidos aos membros dos respectivos corpos sociais, designadamente ao ROC/SROC (art.° 50 n°s 1 e 3 do Estatuto da Ordem, aprovado pelo Decreto-Lei n° 487/99, de 16/11 - EO e art.° 415o do Código das Sociedades Comerciais - CSC). Ao ROC ê, aliás, garantida a inamovibilidade (art. 54° do EO) a qual implica a impossibilidade de ser afastado do respectivo cargo no decurso do mandato, a não ser com base no seu acordo expresso manifestado por escrito ou com fundamento em justa causa arguivel nos termos do art. 419°.
1.O que significa que, contrariamente ao que sucede com os gerentes e administradores, que podem ser destituídos por deliberação da assembleia geral, em qualquer momento (art°s 257° n° 1 e 403° n° 1 do CSC) os ROC designados para o exercício de funções de interesse público de revisão legal das contas somente podem ser removidos, antes do termo do respectivo mandato, desde que ocorra um dos dois pressupostos indicados. Pelo que, não se tendo verificado um destes requisitos, em 15/11/2007, data da reunião da assembleia geral dessa Empresa, para um ano, o mandato dos corpos sociais, tal alteração não era oponível à A.........., F.........., SROC; porque, em relação a esta, a eficácia dessa deliberação (na parte respeitante à designação da nova SROC, a Diz, S........) apenas teria início, em 01/01/2009, sabido que dispunha de mandato conferido, em 19/04/2006, para o triénio 2006/2008. Devendo, por isso, ter-lhe sido apresentada, pela Empresa, a documentação indispensável à emissão da certificação legal das contas do exercício de 2007.
2.Tal alteração veio precipitar a emissão, pela A........., F.........., de declaração de impossibilidade de certificação legal das contas, com data de 12/06/2008, bem como do envio, da carta ao Presidente do Conselho de Administração dessa Empresa na quai se informa a “renúncia, com justa causa”, a partir de 12/06/2008, do cargo do fiscal único, “com as consequências daí decorrentesTodavia, e de acordo com informação prestada pelo serviço de Controlo de Actividade, nesta data, aquela SROC ainda não comunicou à Ordem a cessação do contrato de prestação de serviços decorrente da impropriamente designada “renúncia”.
3. Mas, os termos em que esta foi apresentada pela SROC não deixam quaisquer dúvidas de que aquela manifestou, através do seu representante e de forma expressa, a vontade de se desvincular da relação de serviço que mantinha com essa Empresa. Posição que vai ao encontro da declarada intenção da Sociedade de prescindir dos serviços da SROC em causa, que se colhe da carta, de 18/08/2008. Por tais motivos ter-se-à de aceitar que ocorreu uma cessação antecipada do mandato da referida SROC por acordo expresso entre as partes (art. 54 do EO). E, por conseguinte, de reconhecer a eficácia da designação da Diz, S........, SROC para o mandato relativo ao exercício de 2007. E, com ela, o registo do início de funções da mesma SROC como fiscal único da M........, SA.
(…)
12. Posteriormente e a propósito do registo de funções da Diz, S........, SROC, como Fiscal Único da sociedade M........, S. A., o Conselho Directivo da OROC expressou, em 20 de Novembro de 2008, a seguinte posição (fls 244 do processo):
“1. Reconhecer a eficácia da deliberação da Assembleia Geral da Empresa, de 15/11/2007, na parte relativa à redução da duração do mandato dos membros dos órgãos sociais e à designação de nova SROC (Diz, S........) que não poderia razoavelmente desconhecer as alterações estruturais ocorridas, veio rescindir, com justa causa, apenas em 12/06/2008, o contrato de prestação de serviços que a vinculara à Empresa, com as consequências daí decorrentes. E que, com tal atitude, aliada às alterações estruturais se consumou a cessação antecipada do mandato conferido à SROC substituída (art.° 54° do EO). Pelo que, com tal rescisão, a SROC cessante já não dispunha de poderes para emitir declaração de impossibilidade de certificação legal das contas do exercício de 2007.
2. A nova SROC reúne condições para emitir a CLC de 2007, na sequência do respectivo registo como fiscal único da Empresa.
3. A defesa dos eventuais direitos e interesses da SROC substituída, relativamente à cessação antecipada do mandato por virtude das alterações estruturais verificadas e da rescisão unilateral do contrato, é matéria que diz respeito apenas à mesma SROC."
13. O ROC J......, na qualidade de representante da SROC Diz, S........, foi ouvido em 9 de Outubro de 2008, tendo sido lavrado o competente auto de declarações (fls. 24 a 25 do processo). Das suas declarações destacam-se as seguintes informações relevantes para avaliar a sua conduta, enquanto representante da dita SROC:
Comunicou à SROC A.........., F.......... a sua nomeação para o cargo de Fiscal Único da M........, S.A., apenas em 27 de Fevereiro de 2008, porque só nessa altura teve conhecimento de que foi nomeado para o cargo;
Disse que não tinha outorgado o contrato de prestação de serviços, nem subscrito a declaração de aceitação do cargo, em virtude de as dúvidas sobre a substituição do ROC se encontrarem em apreciação pela OROC;
Por idêntico motivo, disse, não respondeu à segunda carta, datada de 24 de Abril de 2008, da SROC A.........., F.........., em que esta indagava a sua posição sobre o assunto.
14. Na altura da audição, apresentou cópia da carta de 25 de Setembro de 2008, que a OROC endereçou à Administração da sociedade M........, S.A., cópia essa que lhe foi enviada pela OROC, na qual é expresso o entendimento de que a designação da SROC Diz, S........ para o mandato de 2007 é eficaz.
15. O ROC A........., na qualidade de representante da SROC A.........., F. declarações (fls. 30 e 31 do processo). Das suas declarações destacam-se as seguintes informações relevantes para o presente processo:
Que face à situação financeira da M........, S.A., mais notória a partir do primeiro trimestre de 2007, designadamente quanto a dívidas ao Fisco e à Segurança Social, procurou, com base nas contas de 31 de Outubro de 2007, fazer uma círcularização;
Depois de vários contactos por escrito e de uma reunião com o Presidente do Conselho de Administração sentiu, da parte da Empresa, uma atitude de bloqueio a esse trabalho;
Fez vários pedidos à M........, S.A para que lhe fossem facultadas as contas de 2007, mas nunca foi atendido, o que criou uma situação de impasse que inviabilizou o cumprimento das suas obrigações de Fiscal Único e Revisor Oficial de Contas, circunstância que o forçou a emitir a “Declaração de Impossibilidade de Certificação Legal das Contas”, relativa às contas do ano de 2007, datada de 12 de Junho de 2008.
16. A nomeação da SROC Diz, S........ para o mandato de 2007 encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial da Lagoa em 3 de Julho de 2008, conforme extracto de registo constante do processo (fls. 262)
17. Foi solicitada e obtida da dita Conservatória cópia da declaração de aceitação do cargo, emitida pela SROC Diz, S........, para o exercício de 2007, nos termos do n.° 7 do artigo 50° do Estatuto da OROC, declaração essa que não contém data (fls. 249 do processo).
18. Por carta de 25 de Novembro de 2008, foi solicitada à SROC Diz, S........ e recebida, em 31 de Dezembro 2008, a seguinte documentação (fls. 252 a 262 do processo):
Cópia do contrato de prestação de serviços, relativo à revisão legal das contas do exercício de 2007, outorgado com a sociedade M........, S.A., datado de 2 de Julho de 2008;
Cópia da declaração de aceitação do cargo, a qual não contém data;
Cópia da comunicação à OROC, datada de 2 de Julho de 2008;
Cópia da certificação legal das contas, relativa a 2007, datada de 14 de Outubro de 2008;
Cópia do registo na Conservatória do Registo Comercial de Lagoa, donde consta o registo da nomeação da SROC com data de 3 de Julho de 2008.
19. Esta documentação foi entregue na OROC pela SROC Diz, S........, apenas em 30 de Dezembro de 2008, cerca de um mês depois do prazo que lhe havia sido fixado para a entrega.
III – APRECIAÇÃO
20. A eleição de um novo Fiscal Único deu-se na sequência da modificação do pacto social da sociedade M........, S.A., que teve lugar na assembleia geral desta sociedade, realizada em 15 de Novembro de 2007, conforme acta (fls. 11 do processo), modificação que consistiu, entre outras, na alteração do período de mandato dos órgão sociais, que deixou de ser trienal para passar a ser anual.
21. A OROC em momentos diferentes e com argumentos também diferentes considerou eficaz a eleição da SROC Diz, S........ para o cargo de Fiscal Único da M........, S.A, para o exercício de 2007. Tais argumentos encontram-se enunciados nos parágrafos 11 e 12 deste relatório e podem sintetizar-se assim:
(a) Um argumento, expresso na carta de 25 de Setembro de 2008, dirigida à sociedade M........, S.A., sustentado no facto de a SROC substituída A, M. Calado Cortes, F.......... ter renunciado ao mandato (parágrafo 11);
(b) Outro argumento, consubstanciado na caducidade do mandato do Fiscal Único (parágrafo 12), decorrente da alteração dos estatutos da sociedade, alteração essa que consistiu na modificação do mandato do Fiscal Único.
22.Conclui-se, assim, que, quanto à substância da questão - substituição do Fiscal Úníco/ROC, não colhem as razões invocadas pela SROC substituída A.........., F.........., uma vez que a OROC reconheceu a substituição como válida.
23. Diferente pode ser o entendimento quanto à legitimidade e pertinência do direito que assiste à mesma SROC de ser ressarcida do prejuízo sofrido com o seu afastamento, relativamente não só ao ano de 2007, mas também 2008, cuja ocorrência se deu por iniciativa e interesse exclusivo de uma das partes, ou seja, da M......... S. A. Esta é, todavia, matéria de responsabilidade civil contratual, a discutir fora do presente processo, em foro que as parte entenderem apropriado à defesa dos seus interesses.
24. Importa agora apreciar a conduta pessoal dos ROCs A......... (ROC N.° 186) e J...... (ROC N.° 327), representantes legais das respectivas SROCs efectivos protagonistas no presente processo, estatuto que, nos termos do N.° 2 do artigo 82° do Estatuto da OROC, faz recair sobre eles a responsabilidade pelos actos e omissões praticadas no desempenho das funções de Fiscal Único da sociedade M........, S.A.
25. Quanto ao ROC A........., participante no presente processo, como representante da SROC, compreende-se o empenho que coloca na defesa da SROC que representa. É também compreensível a posição que tomou ao emitir "Declaração da Impossibilidade de Certificação” relativa às contas de 2007.
26. Com efeito, na altura em que o participante emitiu aquela Declaração, em 12 de Junho de 2008, não era conhecida a posição da OROC sobre a legitimidade da substituição do Fiscal Único, posição essa que se veio a mostrar desfavorável à SROC A.........., F.......... e que foi proferida pela OROC em 25 de Setembro de 2008. De resto, este tipo de Declaração não constitui um pronunciamento (certificação ou não certificação) sobre as contas, constitui apenas e tão só uma declaração de impossibilidade de pronunciamento, por ausência material, ficando assim em aberto o campo para uma primeira opinião, a efectiva certificação da certificação legal das contas a emitir pelo revisor legitimado para o efeito.
27. Em coerência com o que entendia ser o seu direito ao cargo e face à situação de impasse a que chegou com a sociedade M........, S.A., a SROC A.........., F.......... apresentou a “renúncia, com justa causa, ao cargo de Fiscal Único”, por carta de 12 de Junho de 2008, dirigida ao presidente do Conselho da Administração da M........, S.A., compreendendo-se nessa atitude, a nosso ver, dois actos distintos embora concomitantes para o mesmo fim, um a renúncia ao cargo, outro a rescisão, com justa causa, do contrato de prestação de serviços.
28. Afigura-se-nos, assim, que o ROC A......... teve um comportamento aceitável nas circunstâncias.
29. Quanto ao ROC J......, assinala-se desde já o desfasamento de tempo que mediou entre a data em que a SROC que ele representa foi eleita para o cargo de Fiscal Único (assembleia geral de 15 de Novembro de 2007) e a data em que entrou em contacto com a SROC substituída (carta de 27 de Fevereiro de 2008). Nas suas declarações (v. parágrafo 13 deste relatório) ele justificou o atraso na comunicação com o desconhecimento que teve da nomeação, o que, sendo estranho, é do conhecimento geral que por vezes acontece na profissão. Por carta de 7 de Março de 2008, a SROC substituída respondeu à SROC Diz, S........, na qual desaconselhava a aceitação da nomeação. Posteriormente, por carta de 24 de Abril de 2008, a SROC substituída contactou novamente aqueloutra SROC, questionando-a sobre a sua posição sobre o assunto, mas esta não respondeu.
Nas suas declarações (v. parágrafo 13 deste relatório) o ROC inquirido, J......, afirmou que não respondeu a esta segunda carta, em virtude de existirem dúvidas sobre a substituição do ROC e o assunto se encontrar em apreciação pelo pela OROC.
As afirmações do inquirido padecem de alguma incongruência, uma vez que muito antes de a OROC se pronunciar sobre o assunto (25 de Setembro de 2008) já ele, como representante da SROC, assinou, em 2 de Julho de 2008, o contrato de prestação de serviços com a M........, S.A. e, na mesma data, comunicou à OROC a nomeação para o cargo. Até a declaração de aceitação do cargo, não obstante não conter data, terá sido emitida na mesma data, uma vez que é um documento que acompanha o pedido de registo comercial e esse registo está feito com data de 3 de Julho de 2008 na Conservatória do Registo Comercial de Lagoa. Todos os documentos mencionados foram apresentados pelo inquirido e encontram-se juntos ao processo (v. parágrafo 17 do presente relatório).
Neste contexto é de salientar a posição expressa na carta de 18 de Julho de 2008 (fls. 264 a 266 do processo), que a SROC Diz, S........ dirigiu à OROC, de que destacamos o seguinte enxerto que permite compreender as verdadeiras intenções do ROC J......, muito antes de saber a posição da OROC:
Como em relação ao final do exercício de 2007 a SROC anterior já não constava dos Estatutos, não lhe foram presentes as contas, pelo que esta emitiu uma declaração de impossibilidade de certificação.
A nós, a mesma sociedade apresentou as contas, pelo que agora estamos em condições de emitir a CLC". e a seguir faz um espécie de ultimato à OROC, nos seguintes termos:
“Se nada nos for dito em contrário pela OROC, emiti-la-emos até ao próximo dia 31, data-limite para a apresentação do processo do alvará. A manutenção deste alvará é condição de sobrevivência da sociedade em epígrafe", sendo que a data-limite ali referida é a de 31 de Julho de 2008
34. As afirmações do arguido padecem ainda de imprecisão grosseira, quando na audição realizada em 9 de Outubro de 2008 declarou que não tinha outorgado o contrato de prestação de serviços nem emitido a declaração de aceitação do cargo (v. parágrafo 17 deste relatório), quando tais formalismo tinha já sido por ele firmados em 2 de Julho de 2008, como ficou demonstrado no precedente parágrafo.
35. Consideramos que o comportamento do ROC J......, no seu relacionamento com o a SROC substituída, merece censura, pois não respondeu nem justificou fundadamente a omissão, e devia ter respondido, à segunda carta que recebeu da SROC A.........., F.........., o que contraria os deveres prescritos nas alíneas a) e b) do N.° 1 do artigo 10° do Código de Ética e Deontologia Profissional.
36. Constata-se ainda que, contrariamente aquilo que o mesmo ROC afirma, a formalização da aceitação do cargo pela SROC que ele representa não dependeu da posição da OROC, visto que a formalização foi concretizada em data que o inquirido livremente escolheu, sem depender da posição que a OROC veio a tomar mais tarde.
37. Temos assim que o argumento da dependência da decisão da OROC, invocado pelo ROC, é um mero expediente para justificar os incumprimentos dos deveres de outorga do contrato de prestação de serviços e de comunicação à OROC. Poderá dar-se como assente que, pelo menos desde 27 de Fevereiro de 2008 (data da carta dirigida à SROC substituída), o inquirido sabia que a SROC que representa estava designada para o cargo e, por tal motivo, cabia-lhe a ele cumprir, nos prazos legais, os citados deveres, o que não fez, sendo-lhe por isso imputável o incumprimento das seguintes disposições normativas:
N.° 1 do artigo 53° do Estatuto da OROC, que obriga à outorga do contrato de prestação de serviços no prazo de 45 dias a contar da data da designação; Artigo 58° do Estatuto da OROC e no N.° 4 do atrigo 12° do Código de Ética e Deontologia Profissional, que obrigam à comunicação de inicio dos contratos de prestação de serviços, no prazo de 15 dias, a contar do início dos mesmos.
38. Regista-se ainda o facto de o contrato de prestação de serviços assinado pelo ROC J......, em representação da respectiva SROC. (fls. 252 a 255 do processo), conter uma cláusula que não só colide com o modelo aprovado pela OROC, mas também com o requisito que a este respeito estabelece o Estatuto da OROC. Tal cláusula, a 9a do respectivo contrato, reza assim: “A título de remuneração dos serviços prestados, o Primeiro Outorgante pagará ao segundo Outorgante os honorários anuais que as partes convencionaram por escrito específico”.
39. Neste aspecto, o ROC J...... colocou-se à margem das disposições que regem a profissão, sendo-lhe, por isso, imputável o incumprimento do dever de adoptar o modelo de contrato estabelecido pela OROC, como impõe o N.° 2 do artigo 53° do Estatuo da OROC, o qual diz „Os contratos referidos no número anterior obedecerão ao modelo a fixar pela Ordem, especificando, pelo menos, a natureza do serviço, a sua duração e os honorários correspondentes”.
40. Por fim anota-se o facto de o ROC J...... não ter colaborado com o empenho a que estava obrigado nas diligências do presente processo, concretamente no atraso não justificado na entrega da documentação que havia sido solicitada à SROC que ele representa (v. parágrafo 19 do presente relatório), comportamento que contraria o dever de colaboração com a OROC, prescrito nos N.°. 2 do artigo 12° do Código de Ética e Deontologia Profissional.
IV - PROPOSTA
41. Face ao que antecede, propomos que, nos termos do disposto N.° 1 do artigo 70° do Regulamento Disciplinar, o presente processo de inquérito prossiga como processo disciplinar contra J......, Revisor Oficial de Contas N.° 3.......... (…)”. (dado como provado com base em fls. 302 a 314 do processo administrativo em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
EE) Em 14.01.2009 foi exarado despacho no Relatório referido na alínea antecedente, com o seguinte teor:
“Visto. Aprovado pelo Conselho Disciplinar, designadamente a abertura do processo disciplinar (com o n.º 1/2009) continuando a instrução a cargo do colega M..........” (dado como provado com base em fls. 302 do processo administrativo em suporte de papel, junto aos autos);
FF) Em 27.01.2009, a Entidade demandada elaborou um ofício dirigido ao Autor, com o seguinte teor:
“Assunto: Processo Disciplinar n.º 01/2009 – notificação de nota de culpa Colega,
Nos termos e para efeitos do artigo 57.º do Regulamento Disciplinar, junto envio cópia dos artigos de acusação, deduzidos no processo disciplinar que foi mandado instaurar contra si.
Mais informo que lhe foram concedidos vinte dias para a apresentação da defesa escrita que poderá entregar no local onde se encontra o respectivo processo para consulta dentro das horas normais de expediente.
Desde já devo também informar que a falta de resposta, no prazo que vai indicado, equivale à efectiva audiência para todos os efeitos legais, nos termos do artigo 57.º do citado Regulamento.
(…)
Conselho Disciplinar
Processo disciplinar n.º 1/2009
Arguido: J...... (…)
Nota de culpa
Vistos os autos e analisada a prova da fase instrutória apurada no Processo de Inquérito n.º 19/2008, deduzo contra J......, Revisor Oficial de Contas n.º 3........., a seguinte acusação:
Artigo primeiro
A sociedade Diz, S........, SROC (…) foi eleita para o cargo de Fiscal Único da sociedade M........, SA, para o exercício de 2007, e o arguido J......, representante legal daquela sociedade, não cumpriu integralmente os preceitos legais a que estava obrigado na sequência da eleição. Artigo segundo
Perante divergências existentes sobre a substituição, a SROC substituída pediu esclarecimentos à SROC substituta, por carta de 24 de Abril de 2008, mas o arguido não respondeu nem justificou a omissão.
Artigo terceiro
Pelo menos desde 27 de Fevereiro de 2008, o arguido sabia que a Diz, S........, SROC estava designada para o cargo e, para tal motivo, estava obrigado a outorgar o contrato de prestação de serviços no prazo de 45 dias, ou seja, até 12 de Abril de 2008, mas só o fez em 2 de Julho de 2008.
Artigo quarto
Verificou-se ainda que o arguido não comunicou à OROC o início do contrato de prestação de serviços no prazo de 15 dias, a contar do início do mesmo, ou seja, até 27 de Abril de 2008, mas só o fez em 2 de Julho de 2008.
Artigo quinto
O contrato de prestação de serviços outorgado pelo arguido em representação da Diz, S........, SROC não respeita os requisitos estabelecidos no Estatuto da OROC, uma vez que sobre honorários se limita a referir o seguinte: “A título de remuneração dos serviços prestados, o Primeiro Outorgante pagará ao segundo Outorgante os honorários anuais que as partes convencionaram por escrito específico”.
Artigo sexto
Verificou-se ainda que o arguido J...... só apresentou na OROC em 31 de Dezembro de 2008 os documentos que lhe haviam sido solicitados para serem entregues no prazo de 8 (oito) dias a contar da data da recepção da carta da OROC, datada de 25 de Novembro de 2008, nem justificou o atraso.
Artigo sétimo
Com tais condutas cometeu o arguido, em acumulação, cinco infracções disciplinares, pois violou os deveres de correcção, de urbanidade e de lealdade para com outro colega, prescritos nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 10.º do Código de Ética e Deontologia Profissional, não cumpriu o prazo legal de outorga do contrato de prestação de serviços, violando, assim, o dever estabelecido no n.º 1 do artigo 53.º do Estatuto da OROC, não comunicou à OROC, no prazo legal, a outorga do contrato de prestação de serviços, contrariando com essa omissão o dever estabelecido no artigo 58.º do Estatuto da OROC e no n.º 4 do artigo 12.º do Código de Ética e Deontologia Profissional, não adoptou o modelo de contrato de prestação de serviços, o qual obriga à especificação dos honorários, violando com esse incumprimento o dever prescrito no n.º 2 do artigo 53.º do Estatuto da OROC e, por fim, não apresentou na OROC, no prazo que lhe foi fixado, os documentos que lhe foram solicitados no âmbito do presente processo, comportamento que viola o dever de colaboração com a OROC, previsto no n.º 2 do artigo 12.º do Código de Ética e Deontologia Profissional.
Artigo oitavo
Os comportamentos referidos nos artigos segunda a sétimo desta Nota de Culpa constituem infracções disciplinares nos termos do artigo 80.º do Estatuto da OROC, previstas e punidas nos termos do n.º 3 do artigo 22.º do Regulamento Disciplinar e poderão dar lugar à aplicação de pena não superior à de censura, nos termos do artigo 13.º do Regulamento Disciplinar e do artigo 81.º do Decreto-Lei n.º 487/99, de 16 de Novembro, mas a censurar com uma pena disciplinar, nos termos a norma do n.º 1 do artigo 20.º do Regulamento Disciplinar.
Artigo nono
A acumulação de infracções praticadas pelo arguido constitui circunstância agravante, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 22.º do Regulamento Disciplinar. Não se verificam, por outro lado, circunstâncias atenuantes.
Nos termos do artigo 57.º do Regulamento Disciplinar, fixo o prazo de vinte dias para o arguido J...... deduzir a sua defesa, dentro deste prazo, examinar o processo, apresentar rol de testemunhas, juntar documentos e requerer diligências úteis, sob cominação de a falta de resposta dentro do prazo marcado valer como efectiva audiência do arguido para todos os efeitos legais.(…)”. (dado como provado com base em fls. 315 a 318 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
GG) Em 28.01.2009 foi assinado o aviso de recepção da carta de envio do ofício referido na alínea antecedente (dado como provado com base em fls. 320 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
HH) Em 17.02.2009, o Autor apresentou defesa no processo disciplinar, com o seguinte teor:
“(…)
Termos em que, e nos melhores de direito, deverá ser declarada a nulidade da notificação, e consecutivamente todo o processo subsequente.
Caso assim não se considere sempre deverá o presente processo ser julgado nulo por ilegitimidade passiva.
Do mesmo modo que sempre deverá ser declarada a nulidade do processo pela violação total das normas respeitantes à instrução do processo e pela falta de audiência do arguido.
Caso assim não se entenda, sempre deverá o processo ser julgado improcedente por não provado, devendo-se proceder ao arquivamento do processo disciplinar, e, em consequência, devendo apurar-se as efectivas responsabilidade decorrentes dos prejuízos causados, pelo presente processo, ao arguido.
Prova testemunhal:
Dr.ª S.........
Dr. T......... (ambas a apresentar)
Prova documental:
(…).” (dado como provado com base em fls. 321 a 357 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
II) Em 17.03.2009 foi elaborado o auto de inquirição de testemunha, S......... Quintas, com o seguinte teor:
“(…) procedeu-se à inquirição da Sr.ª Dr.ª S......... (…) na qualidade de testemunha no presente processo, que jurou pela sua honra dizer toda a verdade. Interrogado sobre a matéria dos autos afirmou:
Quanto ao art.º 3.º disse que o contrato de prestação de serviços só foi celebrado em 2 de Julho de 2008 devido ao facto de existirem divergências sobre a substituição da A.........., F.........., que levaram a que o assunto fosse colocado ao Roc circunstância que deferiu a concretização do contrato. Todavia disse com a renúncia apresentada pela citada SROC por carta de 12 de Junho de 2008, de que apresentou cópia para juntar ao processo, foi entendido que existiam condições para a assunção definitiva do cargo pela SROC Diz, S........ o que veio a acontecer e a ser formalizado pelo contrato de prestação de serviços outorgado em 2 de Julho de 2008.
Quanto ao facto de os honorários não estarem explicitados no contrato de prestação de serviços, afirmou que não só na Soc. M........, SA como noutras empresas do Grupo, das quais a SROC Diz, S........ é Revisor Oficial de Contas, é prática os honorários constarem de documento anexo ao contrato, dele fazendo parte integrante, peses embora tal documento ser designado como “aditamento”.
Quanto ao art.º 2.º afirmou que não era matéria que estivesse na sua esfera de conhecimento, pelo que nada responde. (…).” (dado como provado com base em fls. 359 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
JJ) Em 17.03.2009 foi elaborado o auto de inquirição de testemunha, T........., com o seguinte teor:
“ (…) procedeu-se à inquirição do Dr. T......... (…) na qualidade de testemunha no presente processo, que jurou pela sua honra que há-de dizer toda a verdade e aos costumes disse ser colaborador da sociedade, Diz, S........, SROC e estagiário de acesso à qualificação de ROC, sendo seu patrono o Dr. J.......
Interrogado sobre a matéria dos autos afirmou:
Quanto ao art.º 2.º da nota da culpa:
Não teve conhecimento do teor da carta, mas afirmou que sabia que o processo de substituição se encontrava suspenso, em virtude de divergências existentes entre aa empresa e a SROC substituída.
Quanto ao art.º 3.º da nota de culpa:
Disse que o contrato terá sido outorgado só e apenas depois de o arguido ter tido conhecimento de que a SROC A.........., F.......... havia renunciado ao cargo.
Nestes termos, disse, foi entendido que estavam afastados os impedimentos à aceitação do cargo e, consequentemente, não havia razão para que tal aceitação ficasse dependente da decisão da OROC.
Quanto ao art.º 4.º da nota de culpa:
Disse que a comunicação à OROC foi feita no prazo legal, aferido este à data do contrato de prestação de serviços datado de 2 de Julho de 2008.
Quanto ao art.º 5.º da nota de culpa:
Disse que a indicação dos honorários no contrato é feita através de um documento anexo ao contrato impropriamente designado de “aditamento”, mas que de facto faz dele parte integrante. Aliás, disse, que este não é um procedimento específico para este caso mas antes um procedimento institucionalizado na Empresa por razões de ordem prática. (…).” (dado como provado com base em fls. 360 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
KK) Em 17.04.2009, o instrutor do processo disciplinar elaborou o Relatório, com o seguinte teor:
“(…)
III – Defesa
9.O arguido foi ouvido em auto de declarações em 9 de Outubro de 2008 (fls. 24 e 25 do processo de inquérito) e respondeu à Nota de culpa, conforme documentos recepcionados na OROC, em 17 de Fevereiro de 2009 (fls. 321 a 352 do processo). Na resposta às acusações constantes da Nota de Culpa, sustenta o seguinte:
(…)
11.Com a defesa escrita, o arguido juntou duas testemunhas, mas não indicou os factos sobre os quais pretendia que elas fossem ouvidas. Tal omissão foi-lhe comunicada por carta de 23 de Fevereiro de 2009 (fls. 354 do processo), a que respondeu no prazo que lhe foi assinalado (fls. 354 e 355 do processo), tendo na resposta indicado os factos a serem objecto de inquirição às testemunhas.
IV – Factos provados
13. Das averiguações efectuadas e da documentação constante do processo resultam provados os seguintes factos:
(a) Perante divergências existentes sobre a substituição, a SROC A.........., F.......... pediu esclarecimentos, por carta de 24 de Abril de 2008, à SROC substituta, Diz, S........, da qual o arguido é sócio e representante legal no cargo Fiscal Único da M........, SA, mas o arguido J...... não respondeu nem justificou a omissão, comportamento que não se compagina com os deveres a que está sujeito nas relações com outro colega;
(b) O arguido, em representação SROC Diz, S........, outorgou o contrato de prestação de serviços com a sociedade M........, SA, em 2 de Julho de 2008, data esta posterior à data de renúncia ao cargo pela SROC A.........., F.........., comunicada por esta à M........, SA, por carta datada de 12 de Junho de 2008 (fls. 361 do processo), encontrando-se assim cumprido o prazo legal para a celebração do contrato de prestação de serviços;
(c) O arguido, em representação da SROC Diz, S........, comunicou à OROC o início do contrato de prestação de serviço na mesma data em que outorgou o dito contrato, ou seja, em 2 de Julho de 2008, conforme cópia da comunicação constante do processo (fls. 258), encontrando-se assim cumprido o prazo legal para a comunicação à OROC;
(d) A versão do contrato de prestação de serviços celebrado entre a SROC Diz, S........ e a M........, SA, apresentada pelo arguido (fls. 252 a 255 do processo de inquérito), não inclui uma cláusula com a indicação explícita dos honorários;
(e) O montante dos honorários consta de um documento designado “aditamento ao contrato de prestação de serviços de 2 de Julho de 2008”, o qual foi entregue juntamente com a defesa escrita (fls. 351 e 352 do processo);
(f) O arguido não entregou no prazo que lhe foi fixado a documentação solicitada pelo instrutor do presente processo, por carta de 25 de Novembro de 2008 (fls. 239 do processo), nem justificou o atraso de entrega de tal documentação.
V – Apreciação
14. Antes de nos debruçarmos sobre os factos materiais de que o arguido vem acusado no presente processo e da concomitante defesa por ele apresentada, importa analisar os aspectos formais processuais de que o arguido se socorre para invocar a nulidade do processo. Vejamos seguidamente cada um desses aspectos.
Quanto à alegada omissão dos motivos pelos quais vem o arguido acusado pela prática de actos da sociedade que representa.
A Nota de Culpa contém a acusação articulada, dela constando as infracções individualizadas, ou seja, discriminadas e acompanhadas de todas as circunstâncias de modo, lugar e tempo, e a indicação dos preceitos legais violados (art.º 31.º, n.º 1 do Regulamento Disciplinar e art.º 32.º, n.º 10 da Constituição da República Portuguesa), não tendo, por isso, havido qualquer omissão, ao contrário do que o arguido invoca.
Relativamente à alegada falta de motivação/fundamentação da imputação da responsabilidade disciplinar ao arguido
Nos termos do art.º 82.º do Estatuto da Ordem e do art.º 9.º do Regulamento Disciplinar da Ordem, cada sócio de uma sociedade de revisores responde pelos actos profissionais que praticar (ou omissões – art.º 80.º) e, apenas excepcionalmente, quando não seja possível identificar o infractor, se poderá responsabilizar disciplinarmente a sociedade.
Ora, efectivamente é a SROC que é designada para o cargo de Fiscal Único, mas por cada contrato de prestação de serviços no exercício de funções de revisão/auditoria às contas por força de disposições legais, estatutárias ou contratuais, será designado, pelo menos, um ROC a título individual ou como sócio de SROC, ou um ROC contratado, responsável pela orientação ou execução directa do seu cumprimento (art.º 57.º do Estatuto da Ordem). Assim, cabe ao sócio responsável dar cumprimento a todos os deveres inerentes aos contratos de prestação de serviços para os quais a SROC o designou como tal. Assim sendo, a responsabilidade disciplinar pelo incumprimento daqueles deveres caberá, naturalmente, ao sócio designado como responsável. No caso em apreço, essa responsabilidade impende sobre o arguido J....... Quanto à alegada supressão da fase de instrução do processo disciplinar
A deliberação do Conselho Disciplinar no sentido do processo prosseguir como disciplinar, nos termos do art.º 70.º do Regulamento Disciplinar, não implica uma cisão entre o processo de inquérito e o processo disciplinar, mas antes uma continuidade do mesmo processo, ficando, implicitamente, dispensada a instrução do processo disciplinar, por já estar feita no processo que lhe serviu de base, podendo, desde logo, o instrutor deduzir a respectiva acusação, seguindo-se os demais termos do processo disciplinar.
Não há aqui qualquer limitação ao direito de audição e defesa do arguido que poderá apresentar a sai defesa no momento próprio, a seguir à notificação da Nota de Culpa, dizendo de sua justiça o que tiver por conveniente e solicitando todas as diligências probatórias que se mostrem pertinentes.
Quanto à pretensão de circunscrever o processo disciplinar aos factos concretos da participação
O Conselho Disciplinar tem competência disciplinar, independentemente de participação, sempre que tome conhecimento de factos susceptíveis de integrar infracção disciplinar, nos termos do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento Disciplinar. A pretensão do arguido não tem, assim, qualquer fundamento.
15. Debruçar-nos-emos seguidamente sobre os factos materiais objecto do presente processo, apreciando simultaneamente os argumentos de defesa apresentados pelo arguido, com vista a concluir se as acusações formuladas ao arguido constituem, ou não, infracções disciplinares.
16.No que respeita à relação com o outro colega, diz o arguido que não estava obrigado a cumprir o disposto no n.º 1 do artigo 10.º do Código de Ética e Deontologia Profissional, pois só estaria obrigado a cumprir, e cumpriu, o dever de comunicar a sua nomeação ao colega, nos termos do n.º 3 do artigo 10.º do mesmo Código.
17.Discordamos do argumento, uma vez que: (i) existem divergências sobre a substituição; (ii) a SROC substituída comunicou à SROC substituta, representada pelo arguido, a existência de impedimentos à substituição, e (iii) a situação manteve-se em impasse durante largos meses. Perante tais circunstâncias é legítimo o pedido de informação da SROC substituída, ao qual o arguido não respondeu, como lhe era exigido, enquanto representante da SROC substituta.
18.Ao ignorar o pedido de informação, não respondendo à SROC substituída, o arguido teve uma conduta censurável, por desconforme com uma postura profissional de respeito devido a outro colega, como exige o n.º 1 do artigo 10.º do Código de Ética e Deontologia Profissional.
19.Quanto à data de celebração do contrato de prestação de serviços e a comunicação à OROC, considera-se adequado, nas circunstâncias, o comportamento do arguido. Na verdade, essas formalidades vieram a ser concretizadas depois de a SROC substituída ter renunciado ao cargo, em 12 de Junho de 2008, momento a partir do qual ficaram afastados os impedimentos à aceitação do cargo pela SROC que o arguido representa.
20.Ora, foi depois dessa data e só depois dela que o arguido, em representação da SROC substituta, assinou, em 2 de Julho de 2008, o contrato de prestação de serviços e comunicou à OROC a nomeação, na mesma data. Tem-se, assim, por cumpridos os prazos de serviços e comunicou à OROC a nomeação, na mesma data. Tem-se, assim, por cumpridos os prazos a que SROC substituta estava vinculada, por força do disposto nos artigos 53.º e 55.º do Estatuto da OROC, respectivamente, quanto ao contrato e quanto à comunicação à OROC, nada havendo a censurar, a este propósito, ao arguido.
21.Sobre o modelo de contrato que o arguido, como representante da SROC Diz, S........, é acusado de não respeitar, cumpre assinalar que ele apresentou documentos (fls. 351 e 352 do processo) que menciona o montante de honorários e contém a indicação de ser parte integrante do contrato, como concretização da cláusula 10.ª do mesmo, a que diz respeito a honorários.
22.O mencionado documento tem a designação de “aditamento ao contrato de prestação de serviços de 02 de Julho de 2008”, mas da sua forma e conteúdo retira-se a conclusão de que constitui, de facto, um anexo ao contrato de prestação de serviços.
23. Aliás, as duas testemunhas ouvidas a esta propósito foram coincidentes na informação de que era prática de SROC usar um documento anexo a explicar o valor dos honorários (…). Afigura-se-nos assim, que o procedimento adoptado pelo arguido, enquanto representante da SROC, na adopção do formato de contrato de prestação de serviços não constitui violação do que, a esse propósito, estabelece, o artigo 53.º, n.º 2 do Estatuto da OROC, antes constitui tão só uma imprecisão da formulação escrita do requisito legal.
24. Resta apreciar o comportamento do arguido na sua relação com a OROC, concretamente no atraso de entrega de documentação que lhe foi solicitada. Por carta de 25 de Novembro de 2008 (fls. 239 do processo de inquérito) foi solicitado ao arguido o envio à OROC de certa documentação relevante para o processo, tendo-lhe sido dado um prazo de 8 (oito) dias para a respectiva remessa, prazo que não foi cumprido, uma vez que a documentação só foi entregue na OROC em 31 de Dezembro de 2008.
25.O arguido vem agora argumentar que o prazo fixado para a apresentação dos documentos era curto, devido ao facto de, diz ele, a recolha de alguma documentação depender de terceiros. Para atendermos a este argumento, haveria que encontrar a razão pela qual o arguido não pediu a prorrogação do prazo ou, não o tendo feito porque não se dignou, pelo menos, justificar o atraso em momento próprio. Não encontrámos razão nem ele aduz qualquer outro argumento credível.
26. Fica assim demonstrado que nas suas relações com a OROC o arguido teve um comportamento a todos os títulos censurável, que constitui violação do dever de colaboração com a OROC, previsto no n.º 2 do artigo 2.º do Código de Ética e Deontologia Profissional.
27. Em resumo, das cinco infracções de que o arguido vinha acusado persistem as duas seguintes que constituem comportamento merecedor de sanção disciplinar: (a) A omissão da resposta devida a outro colega, ou seja, à SROC substituída, sendo-lhe, por isso, imputável a violação do dever consignado no n.º 1 do artigo 10.º do Código de Ética e Deontologia Profissional; e (b) O envio de documentação à OROC depois do prazo que lhe foi fixado, sem que tivesse justificado o atraso, o que constitui violação do dever de colaboração com a OROC, previsto no n.º 2 do artigo 12.º do Código de Ética e Deontologia Profissional.
28. Na fase de acusação, em que eram imputadas ao arguido cinco infracções disciplinares, ficou indicada a pena de censura como limite superior da sanção aplicável às infracções objecto de acusação. Provadas que estão apenas as duas infracções enunciadas no presente parágrafo 27, compreende-se e preconiza-se que ao menor número de infracções corresponde, por coerência, uma pena de grau adequado.
29. A acumulação de infracções constitui circunstância agravante, nos termos da alínea d) do artigo 22.º do Regulamento Disciplinar e, por outro lado, não se verificam circunstâncias atenuantes. Todavia, as infracções praticadas circunscrevem-se a relações internas à profissão e, de modo algum, afectam a imagem e prestígio da profissão, aspectos que deverão ser ponderados na determinação da medida da pena aplicar.
VI – Proposta
30.Face à natureza e gravidade das infracções provadas, ao grau de culpabilidade do arguido e considerando as circunstâncias agravantes, propõe-se ao arguido J...... (…), seja aplicada a pena única de advertência registada prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 81.º do Decreto-Lei n.º 487/99, de 16 de Novembro e na alínea b) do artigo 13.º do Regulamento Disciplinar, suspensa por 2 anos nos termos do artigo 24.º do Regulamento Disciplinar, por violação dos deveres estabelecido no n.º 1 do artigo 10.º e no n.º 2 do artigo 12.º, ambos do Código de Ética e Deontologia Profissional. (…).” (dado como provado com base em fls. 365 a 376 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
LL) Em 17.04.2009, o Conselho Disciplinar da Entidade demandada exarou a seguinte decisão:
“(…)
Processo Disciplinar n.º 1/2009
Acórdão
Examinado e apreciado o relatório apresentado pelo instrutor do processo em referência, acordam os membros do Conselho Disciplinar da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas em determinar a aplicação ao arguido José Joaquim
Afonso Diz, revisor oficial de contas (…), a pena única de advertência registada, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 81.º do Estatuto da OROC e da alínea b) do artigo 13.º do Regulamento Disciplinar, suspensa por 2 anos nos termos do artigo 24.º do Regulamento Disciplinar, por violação dos deveres estabelecidos no n.º 1 do artigo 10.º e no n.º 2 do artigo 12.º, ambos do Código de Ética e Deontologia Profissional.” (dado como provado com base em fls. 377 do processo administrativo, em suporte de papel, junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
MM) Em 09.07.2009, a PI da presente acção deu entrada no Tribunal (dado como provado com base em fls. 3 dos autos físicos);
*
Não provado que,
1. A Entidade demandada enviou ao Autor ofício de notificação da decisão de conversão do processo de inquérito em processo disciplinar, constante da al. EE) do Probatório”.
*

IV. De Direito
A Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, veio estabelecer
Perdão de Penas e Amnistia de Infracções
.
Ora, a palavra grega amnestia, assim transcrita em latim­, derivou para o português ‘amnistia’ e significava originaria­mente esquecimento.
Donde, a amnistia respeita às infracções abstractamente consideradas, ‘apagando’ a natureza criminal do facto.
Prevê o nº 2 do artº 128º do Código Penal que “a amnistia extingue o procedimento criminal e, no caso de ter havido condenação, faz cessar a execução tanto da pena e dos seus efeitos como da medida de segurança” sendo que o nº 3 estipula que “o perdão genérico extingue a pena, no todo ou em parte”.
Em abono de se qualificar a sua intrínseca vocação, traz-se à colação que Figueiredo Dias in Direito Penal Português, Parte Geral, II, Coimbra,
1993, pp 689 – 692, convoca que atrás da distinção constitucional entre o perdão genérico e a amnistia
“está ainda a concepção tradicional da distinção entre medidas de graça relativas ao facto ou ao agente por uma parte, e relativas à consequência jurídica por outra”.
A amnistia caracteriza-se, pois, como um pressuposto negativo da punição na medida em que obsta a que o arguido sofra a sanção que, ou lhe vai ser aplicada ou que, entretanto, já o foi.
Significa, assim, que não constitui um pressuposto negativo da punibili­dade, ou seja, não está relacionada com a falta de dignidade punitiva do facto.
A ratio legis da Lei da Amnistia assenta na realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude com a presença de Sua Santidade o Papa F…… e visa abranger um número de pessoas, vigora relativamente a um determinado período temporal e abrange sanções expressamente tipificadas, tornando-se essencial, no caso presente, se destrinçar o regime de perdão de penas do da amnistia de infracções instituídas.
Tal vale por dizer que, concretamente, cabe analisar o impacto e os efeitos da aplicação da amnistia às infracções disciplinares.
A doutrina, há tempo, ou seja, quando foram publicadas leis de amnistia, atentando no que dispunham nessa altura, os artºs 127º e 128º do Código Penal e, também, a jurisprudência dimanada então, diferenciava a amnistia em sentido próprio e em sentido impróprio, definindo-se as mesmas nestes termos:
i) amnistia em sentido próprio – a que ocorre antes da condenação, referente ao próprio crime, logo fazendo extinguir o procedimento criminal;
ii) amnistia em sentido impróprio – a que ocorre depois da condenação e que impede ou limita o cumprimento da pena aplicada, fazendo cessar ou restringindo a execução da pena principal e das penas acessórias.
A amnistia encontra-se regulada no artº 127º do Código Penal como uma das causas de extinção da responsabilidade criminal e, quanto aos efeitos jurídicos, dita o nº 2 do artº 128º do mesmo diploma que “A amnistia extingue o procedimento criminal e, no caso de ter havido condenação, faz cessar a execução tanto da pena e dos seus efeitos como da medida de segurança”.
É, portanto, uma providência que “apaga” o crime, o que implica uma abolição retroactiva do crime, no sentido em que a amnistia, operando ex tunc, incide não só sobre a própria pena, como também sobre o acto criminoso passado, que cai em “esquecimento”, é tido como não praticado e, consequentemente, eliminado do registo criminal.
Diferentemente, o perdão genérico é uma figura próxima da amnistia, caracterizado como uma providência de carácter geral, que se dirige a uma generalidade de delinquentes, e que “extingue a pena, no todo ou em parte”vide nº 3 do artº 128º do Código Penal – contudo, tão-só tem efeitos para o passado, nunca extingue o procedimento criminal e é aplicável em função da pena, ao invés do instituído para o regime da amnistia.
Este breve enquadramento tem em vista sinalizar que no âmbito das diferentes leis de amnistia que em tempos idos foram publicadas, a diferenciação entre a amnistia própria e a amnistia imprópria, era então coligida, sendo que nessa altura não existia a figura do perdão de genérico.
Com efeito, a partir do momento em que o perdão genérico passou a ser contemplado no ordenamento jurídico, em decorrência, deixou de ter lugar a distinção entre as duas amnistias supracitadas.
Convoca-se, pois, face aos artºs 127º e 128º do Código Penal, com a introdução do perdão genérico, que o conceito de amnistia imprópria foi absorvida pelo primeiro.
Ora, tal repercutiu que a amnistia se encontra contida no artº 127º, e os respectivos efeitos consignados no nº 2 do artº 128º, ambos daquele diploma legal.
Ora, a Lei da Amnistia que nos ocupa, implementou que a amnistia se aplica à infracções disciplinares – cfr artº 9º do Código Civil – aos trabalhadores que desempenham funções públicas e instaurados por entidades empregadoras públicas.
Preceitua o nº 1 do artº 2 º e o artº 4º deste diploma que a amnistia é concedida às infracções penais, praticadas até às 00h00 horas de 19 de Junho de 2023, por jovens, que tenham entre 16 e 30 anos de idade, à data da prática do facto, e cuja pena não seja superior a um ano de prisão ou a 120 dias de pena de multa.
Por sua vez, a alínea a) do nº 2 do referido artº 2º, à luz do disposto no artº 5º, no regime da amnistia estão abrangidas as sanções acessórias, relativas a contra-ordenações praticadas até às 00h00 horas de 19 de Junho de 2023, e cujo limite máximo de coima aplicável não exceda os 1000€.
Ademais, atenta a alínea b) do nº 2 do artº 2º e o artº 6º, sempre da Lei da Amnistia, as infracções disciplinares e as infracções disciplinares militares, praticadas até às 00h00 horas de 19 de Junho de 2023, que não constituam simultaneamente ilícitos penais não amnistiados pela presente lei, e cuja sanção aplicável, em ambos os casos, não seja superior a suspensão ou prisão disciplinar, são também amnistiadas, cabendo realçar que não se aplica a restrição relativa à idade.
Salientamos que a Lei da Amnistia, prevê providências de excepção e que, por isso, não comportam aplicação analógica, tal como estabelecido no artº 11º do Código Civil, nem tão pouco admitem interpretação extensiva ou restritiva.
Assim sendo, devem ser interpretadas nos exactos termos em que estão redigidas, com respeito pelo preceituado no artº 9º do Código Civil – cfr Boletim do Ministério da Justiça, nº 258, de 30 de Junho de 1976, p 138.
Note-se que a Lei da Amnistia não faz distinção entre infracções disciplinares executadas ou não executadas, nem entre procedimentos disciplinares findos ou não findos, suspensos ou activos, pelo que se não concebe essa diferenciação, também a não deve fazer o intérprete e aplicador do Direito.
Logo, aquela Lei harmoniza-se com os efeitos ex tunc da amnistia, determinados no nº 2 do artº 128º do Código Penal.
Traz-se, ainda, à colação que sufragamos in totum, o sumariado no Acórdão do STA, Processo nº 0262/12.0BELSB, de 16 de Novembro de 2023, in www.dgsi.pt “A amnistia faz cessar a responsabilidade disciplinar do arguido, pelo que, salvo disposição legal em contrário, tem eficácia ex-tunc, e faz desaparecer o objeto da ação que visa a anulação ou declaração de nulidade do ato que aplicou a pena disciplinar, determinando a inutilidade da respetiva lide”.
Com efeito, neste aresto escreveu-se que “é entendimento dominante na jurisprudência e na doutrina que a amnistia faz cessar a responsabilidade disciplinar do arguido, pelo que, salvo disposição legal em contrário, determina o «esquecimento» da infração, extinguindo os respetivos efeitos com eficácia ex-tunc.
Daqui decorre, necessariamente, que a amnistia faz desaparecer também – retroativamente - o objeto da ação que visa a anulação ou declaração de nulidade do ato que aplicou a correspondente pena disciplinar”
.
Segue idêntico entendimento o Acórdão do STA, Processo nº 0699/23.0BELSB, de 20 de Dezembro de 2023, in www.dgsi.pt.
Releva que Mariana Canotilho e Ana Luísa Pinto in As Medidas de Clemência na Ordem Jurídica Portuguesa, Estudos em Memória do Conselheiro Luís Nunes de Almeida, Coimbra, Coimbra Editora, 2007 pp 336 e 337, definem que “A amnistia serve para libertar o agente de um processo penal ainda em curso ou do cumprimento de uma pena, devida à prática de determinado crime.
Significa isto que alguns bens jurídicos, protegidos pela legislação penal, são considerados menos importantes, em determinados contextos (por exemplo, em caso de necessidade de pacificação social), razão pela qual a sua protecção pode ser sacrificada reotractivamente”.
In casu, ao Recorrido foi aplicada a pena única de advertência registada, suspensa por 2 anos, que se pauta pelo regime de amnistia, estipulado na alínea b) do nº 2 do artº 2º e no artº 6º da referida Lei, com os efeitos previstos no nº 2 do artº 128º do Código Penal, o que tem como desfecho a extinção da pena.
Donde, encontra-se amnistiada a infracção disciplinar sancionada pelo acto de 17 de Abril de 2009 do Conselho Disciplinar da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas.
Nesse sentido, a supracitada sanção disciplinar de advertência registada, suspensa por 2 anos, aplicada a J......, por se encontrar amnistiada, implica necessariamente a cessação da sua execução, fosse qual fosse o resultado da causa, com eficácia ex-tunc.
Naturalmente, revertendo o efeito da amnistia à data da aplicação da pena disciplinar implica o desaparecimento do acto impugnado, tornando inútil a instância quanto à anulação da decisão sancionatória.
Todavia, perfila-se apreciarmos se a aplicação da amnistia à supracitada pena disciplinar abrange a condenação daquele pagamento, no valor de 2.000€, a título de danos morais.

Vejamos.

Notificadas as partes por este TCA Sul quanto à aplicação da Lei da Amnistia nenhuma se pronunciou, sublinhando-se que o Recorrido, expressamente, não desistiu do pedido de condenação formulado para além da anulação do acto.
Neste enquadramento, in casu, a lide não perde a respectiva utilidade, porque a Recorrente se insurge contra a sua condenação, peticionada recursivamente – e concedida pela 1ª Instância – no pagamento ao Recorrido, a título de danos morais, no valor de 2.000€, sendo que – repetimos – se verifica que este último à mesma não veio renunciar explicitamente.
Sufragamos, a propósito da inutilidade superveniente da lide, mutatis mutandis, que no Acórdão do STA, Processo nº 0941/10, de 20 de Outubro de 2011, in www.dgsi.pt, designadamente, se reza que “(…) a extinção da instância por inutilidade da lide só podia declarada quando fosse certo que o seu provimento não traria quaisquer consequências para o Recorrente, designadamente não o colocando numa situação vantajosa. Sendo que esta tanto se podia traduzir na possibilidade da reconstituição natural da situação hipotética como na atribuição de uma indemnização pelos danos decorrentes da prática do acto ilegal como ainda, conjuntamente, pelas duas quando a referida reconstituição fosse insuficiente para a reparação integral dos prejuízos”.

Passamos a conhecer os pressupostos previstos no Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro (RRCEEEP), para saber se o acto punitivo os violou, começando pelo primeiro.

i) Da Ilicitude

Determina o nº 1 do artº 9º do RRCEEEP, que “Consideram-se ilícitas as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos”.

No Probatório da sentença recorrida, principiamos por destacar o seguinte:
“DD) Em 14.01.2009 foi elaborado o Relatório do Processo de Inquérito nº 19/2008, com o seguinte teor:
“(…)
I - ANTECEDENTES
1. Por deliberação do Conselho Disciplinar, de 15 de Setembro de 2008, foi aberto o presente processo de inquérito, na sequência de uma participação dirigida à Ordem dos Revisores Oficiais de Contas pela sociedade A.........., F.........., SROC (Nº 4), através de cartas datadas, uma de 14 de Agosto de 2008 (fls. 13 a 15 do processo) e outra de 22 de Agosto de 2008 (fls. 3 a 7 do processo).
2. A SROC participante, A.........., F.........., representada por A......... (ROC Nº 186) foi eleita para o cargo de Fiscal Único da sociedade M........, S.A., com sede em Lagoa, para o triénio 2006/2008, conforme extracto de certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lagoa (fls. 39 do processo).
3. Pela assembleia geral da M........, S.A., realizada em 15 de Novembro de 2007, conforme Acta nº 73 junta ao processo (fls. 11), foi alterado o pacto social da mesma, compreendendo-se nessa alteração, entre outras, a do artigo 13º que estabeleceu o período anual do mandato dos órgão sociais, incluindo o Fiscal Único, em vez do mandato de um triénio, com vigorava até então.
4. Na sequência dessa alteração do pacto social e ainda na mesma assembleia, procedeu-se à eleição de novos corpos sociais, para o mandato anual de 2007, tendo nela sido eleita para o cargo de Fiscal Único outro revisor, a SROC Diz, S........, representada por J...... (ROC Nº 3.........).
5. Na participação feita à OROC, a SROC A.........., F.......... junta cópia de correspondência diversa dirigida à M........, S.A, na qual aborda diversas questões inerentes às suas funções de Fiscal Único da Empresa, nomeadamente: (i) contesta o afastamento da SROC antes do termo do mandato, invocando o regime da inamovibilidade previsto no artigo 54° do Estatuto da OROC, (ii) reclama da Empresa a apresentação de contas do exercício de 2007, (iii) insurge-se contra o impedimento ao exercício das suas funções de fiscalização, o qual decorre da não disponibilização das contas relativas ao exercício de 2007 e (iv) refere que a não disponibilização das contas deixa transparecer a intenção de bloqueio por parte da Empresa, circunstância que motivou a emissão de uma “Declaração de Impossibilidade de Certificação das Contas” do exercício de 2007, emitida com data de 12 de Junho de 2008.
II - AVERIGUAÇÕES
6. Na assembleia geral da sociedade M........, S.A., realizada em 15 de Novembro de 2007, a SROC Diz, S........ foi eleita Fiscal Único Efectivo, para o ano de 2007, e J........ (ROC N° 383), como Fiscal Único Suplente, conforme cópia da acta junta ao processo (fls. 11); na assembleia geral da mesma sociedade, realizada em 28 de Fevereiro de 2008, foram eleitas, agora para o ano de 2008, a identificada SROC e o indicado ROC para idênticas funções, conforme consta de cópia da respectiva acta, também junta ao processo (fls. 12).
7. Na assembleia geral da sociedade M........, S.A., realizada em 19 de Abril de 2006, a SROC A.........., F.......... havia sido eleita para o mandato do triénio 2006/2008, conforme consta do registo da Conservatória do Registo Comerciai de Lagoa (fls. 39 do processo).
8. Por carta de 27 de Fevereiro de 2008 (fls. 8 do processo), a SROC eleita, Diz, S........, representada por J......, indagou junto da SROC A........., F.........., sobre a existência de razões de ordem profissional que obstassem à aceitação do cargo, bem como sobre o pagamento de honorários. Em resposta, por carta de 7 de Março de 2008 (ffs. 9 do processo), a sociedade A.........., F.........., SROC, desaconselha a aceitação, com fundamento no facto de se encontrar a decorrer o mandato do triénio 2006/2008, para o qual ela havia sido eleita. Mais tarde, por carta de 24 de Abril de 2008, esta mesma SROC questiona a sociedade Diz, S........, SROC sobre a sua posição sobre o assunto, mas esta não deu qualquer resposta.
9. A SROC A.........., F.........., por carta de 12 de Junho de 2008 enviada à sociedade M........, S.A., a que faz referência no ponto 6 da sua carta de 22 de Agosto de 2008 (fls. 3 a 7 do processo), dirigida ao Presidente do Conselho de Administração da mesma sociedade, comunica a sua “renúncia, com justa causa, ao cargo de Fiscal Único”, com fundamento no incumprimento, por parte da Empresa, de matéria jurídica e técnica, bem como pelo não pagamento dos honorários de 2006 e 2007.
10. Na sequência de consulta formulada pela sociedade M........, S.A., a OROC estudou o assunto e proferiu um parecer (fls, 27 a 29 do processo) que remeteu à dita sociedade, por carta de 25 de Setembro de 2008, e cujo teor, nos seus aspectos mais relevantes para o processo, se transcreve a seguir:
11. “1. A assembleia geral das sociedades não dispõe de poderes para alterar, com efeitos imediatos, os mandatos, ainda a decorrer, conferidos aos membros dos respectivos corpos sociais, designadamente ao ROC/SROC (art.° 50 n°s 1 e 3 do Estatuto da Ordem, aprovado pelo Decreto-Lei n° 487/99, de 16/11 - EO e art.° 415º do Código das Sociedades Comerciais - CSC). Ao ROC é, aliás, garantida a inamovibilidade (art. 54° do EO) a qual implica a impossibilidade de ser afastado do respectivo cargo no decurso do mandato, a não ser com base no seu acordo expresso manifestado por escrito ou com fundamento em justa causa arguivel nos termos do art. 419°.
(…)
16. A nomeação da SROC Diz, S........ para o mandato de 2007 encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial da Lagoa em 3 de Julho de 2008, conforme extracto de registo constante do processo (fls. 262)
17. Foi solicitada e obtida da dita Conservatória cópia da declaração de aceitação do cargo, emitida pela SROC Diz, S........, para o exercício de 2007, nos termos do n.° 7 do artigo 50° do Estatuto da OROC, declaração essa que não contém data (fls. 249 do processo).
18. Por carta de 25 de Novembro de 2008, foi solicitada à SROC Diz, S........ e recebida, em 31 de Dezembro 2008, a seguinte documentação (fls. 252 a 262 do processo):
(…)
19. Esta documentação foi entregue na OROC pela SROC Diz, S........, apenas em 30 de Dezembro de 2008, cerca de um mês depois do prazo que lhe havia sido fixado para a entrega.
(…)
29. Quanto ao ROC J......, assinala-se desde já o desfasamento de tempo que mediou entre a data em que a SROC que ele representa foi eleita para o cargo de Fiscal Único (assembleia geral de 15 de Novembro de 2007) e a data em que entrou em contacto com a SROC substituída (carta de 27 de Fevereiro de 2008). Nas suas declarações (v. parágrafo 13 deste relatório) ele justificou o atraso na comunicação com o desconhecimento que teve da nomeação, o que, sendo estranho, é do conhecimento geral que por vezes acontece na profissão. Por carta de 7 de Março de 2008, a SROC substituída respondeu à SROC Diz, S........, na qual desaconselhava a aceitação da nomeação.
Posteriormente, por carta de 24 de Abril de 2008, a SROC substituída contactou novamente aqueloutra SROC, questionando-a sobre a sua posição sobre o assunto, mas esta não respondeu.
Nas suas declarações (v. parágrafo 13 deste relatório) o ROC inquirido, J......, afirmou que não respondeu a esta segunda carta, em virtude de existirem dúvidas sobre a substituição do ROC e o assunto se encontrar em apreciação pelo pela OROC.
As afirmações do inquirido padecem de alguma incongruência, uma vez que muito antes de a OROC se pronunciar sobre o assunto (25 de Setembro de 2008) já ele, como representante da SROC, assinou, em 2 de Julho de 2008, o contrato de prestação de serviços com a M........, S.A. e, na mesma data, comunicou à OROC a nomeação para o cargo. Até a declaração de aceitação do cargo, não obstante não conter data, terá sido emitida na mesma data, uma vez que é um documento que acompanha o pedido de registo comercial e esse registo está feito com data de 3 de Julho de 2008 na Conservatória do Registo Comercial de Lagoa. Todos os documentos mencionados foram apresentados pelo inquirido e encontram-se juntos ao processo (v. parágrafo 17 do presente relatório).
Neste contexto é de salientar a posição expressa na carta de 18 de Julho de 2008 (fls. 264 a 266 do processo), que a SROC Diz, S........ dirigiu à OROC, de que destacamos o seguinte enxerto que permite compreender as verdadeiras intenções do ROC J......, muito antes de saber a posição da OROC: Como em relação ao final do exercício de 2007 a SROC anterior já não constava dos Estatutos, não lhe foram presentes as contas, pelo que esta emitiu uma declaração de impossibilidade de certificação. A nós, a mesma sociedade apresentou as contas, pelo que agora estamos em condições de emitir a CLC e a seguir faz um espécie de ultimato à OROC, nos seguintes termos:
“Se nada nos for dito em contrário pela OROC, emiti-la-emos até ao próximo dia 31, data-limite para a apresentação do processo do alvará. A manutenção deste alvará é condição de sobrevivência da sociedade em epígrafe”, sendo que a data-limite ali referida é a de 31 de Julho de 2008 34. As afirmações do arguido padecem ainda de imprecisão grosseira, quando na audição realizada em 9 de Outubro de 2008 declarou que não tinha outorgado o contrato de prestação de serviços nem emitido a declaração de aceitação do cargo (v. parágrafo 17 deste relatório), quando tais formalismo tinha já sido por ele firmados em 2 de Julho de 2008, como ficou demonstrado no precedente parágrafo.
35. Consideramos que o comportamento do ROC J......, no seu relacionamento com o a SROC substituída, merece censura, pois não respondeu nem justificou fundadamente a omissão, e devia ter respondido, à segunda carta que recebeu da SROC A.........., F.........., o que contraria os deveres prescritos nas alíneas a) e b) do N.º 1 do artigo 10° do Código de Ética e Deontologia Profissional.
36. Constata-se ainda que, contrariamente aquilo que o mesmo ROC afirma, a formalização da aceitação do cargo pela SROC que ele representa não dependeu da posição da OROC, visto que a formalização foi concretizada em data que o inquirido livremente escolheu, sem depender da posição que a OROC veio a tomar mais tarde.
37. Temos assim que o argumento da dependência da decisão da OROC, invocado pelo ROC, é um mero expediente para justificar os incumprimentos dos deveres de outorga do contrato de prestação de serviços e de comunicação à OROC. Poderá dar-se como assente que, pelo menos desde 27 de Fevereiro de 2008 (data da carta dirigida à SROC substituída), o inquirido sabia que a SROC que representa estava designada para o cargo e, por tal motivo, cabia-lhe a ele cumprir, nos prazos legais, os citados deveres, o que não fez, sendo-lhe por isso imputável o incumprimento das seguintes disposições normativas:

Nº 1 do artigo 53º do Estatuto da OROC, que obriga à outorga do contrato de prestação de serviços no prazo de 45 dias a contar da data da designação; Artigo 58º do Estatuto da OROC e no Nº 4 do atrigo 12º do Código de Ética e Deontologia Profissional, que obrigam à comunicação de início dos contratos de prestação de serviços, no prazo de 15 dias, a contar do início dos mesmos.

38. Regista-se ainda o facto de o contrato de prestação de serviços assinado pelo ROC J......, em representação da respectiva SROC. (fls. 252 a 255 do processo), conter uma cláusula que não só colide com o modelo aprovado pela OROC, mas também com o requisito que a este respeito estabelece o Estatuto da OROC. Tal cláusula, a 9a do respectivo contrato, reza assim: “A título de remuneração dos serviços prestados, o Primeiro Outorgante pagará ao segundo Outorgante os honorários anuais que as partes convencionaram por escrito específico”.
39. Neste aspecto, o ROC J...... colocou-se à margem das disposições que regem a profissão, sendo-lhe, por isso, imputável o incumprimento do dever de adoptar o modelo de contrato estabelecido pela OROC, como impõe o Nº 2 do artigo 53º do Estatuo da OROC, o qual diz “Os contratos referidos no número anterior obedecerão ao modelo a fixar pela Ordem, especificando, pelo menos, a natureza do serviço, a sua duração e os honorários correspondentes”.
40. Por fim anota-se o facto de o ROC J...... não ter colaborado com o empenho a que estava obrigado nas diligências do presente processo, concretamente no atraso não justificado na entrega da documentação que havia sido solicitada à SROC que ele representa (v. parágrafo 19 do presente relatório), comportamento que contraria o dever de colaboração com a OROC, prescrito nos Nº. 2 do artigo 12° do Código de Ética e Deontologia Profissional”.

Ora, no âmbito do processo de inquérito foi proposto que o mesmo “prossiga como processo disciplinar contra J......, Revisor Oficial de Contas Nº 3.......... (…)”, o que aconteceu, tendo sido notificado o Recorrido pelo ofício de 27 de Janeiro de 2009, que lhe havia sido instaurado o processo disciplinar nº 01/2009, anexando-lhe a inerente nota de culpa, que após a defesa do arguido culminou com a apreciação desta e a elaboração dos autos de inquirição de testemunhas, com a redacção do relatório e culminou com o acto de aplicação da pena única de advertência registada, suspensa por dois anos – cfr alíneas FF), HH), II), JJ), KK) e LL) do Probatório –.

Convocamos que o Decreto-Lei nº 487/99, de 16 de Novembro, aprovou o Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, que na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 224/2008, de 20 de Novembro, estabelece no artº 9º que “1 - São revisores oficiais de contas aqueles que se encontram obrigatoriamente inscritos na respectiva lista.
2 - O disposto no número anterior compreende também as sociedades de revisores oficiais de contas, abreviadamente designadas por sociedades de revisores”.
Aquele diploma prevê no artº 82º, sob a epígrafe ‘Responsabilidade disciplinar’ que “1 - Cada sócio de uma sociedade de revisores e revisor oficial de contas ao seu serviço nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 49º responde pelos actos profissionais que praticar e pelos dos colaboradores que dela dependem profissionalmente, sem prejuízo da responsabilidade solidária da sociedade.
2 - Excepcionalmente, constituem faltas disciplinares da sociedade de revisores as praticadas por qualquer dos seus sócios, revisor oficial de contas ao seu serviço nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 49.º ou colaborador, quando não seja possível identificar o infractor; neste caso, ser-lhe-ão aplicáveis as regras sobre responsabilidade disciplinar constantes da presente secção”.

Verificamos que o Recorrido incorreu com os actos, submetidos a escrutínio disciplinar, e que realizou enquanto ROC que foram enunciados no processo de inquérito e considerados no processo disciplinar, pelo que estando explicitamente identificado como arguido na prática de actos que implicam o cometimento de infracções disciplinares é ele o responsabilizado em consonância e não a sociedade de que é sócio.
A propósito, nada há a obstar à argumentação apresentada no ponto 14 do relatório do processo disciplinar pelo respectivo instrutor e que transcrevemos:
“Nos termos do art.º 82.º do Estatuto da Ordem e do art.º 9.º do Regulamento Disciplinar da Ordem, cada sócio de uma sociedade de revisores responde pelos actos profissionais que praticar (ou omissões – art.º 80.º) e, apenas excepcionalmente, quando não seja possível identificar o infractor, se poderá responsabilizar disciplinarmente a sociedade.
Ora, efectivamente é a SROC que é designada para o cargo de Fiscal Único, mas por cada contrato de prestação de serviços no exercício de funções de revisão/auditoria às contas por força de disposições legais, estatutárias ou contratuais, será designado, pelo menos, um ROC a título individual ou como sócio de SROC, ou um ROC contratado, responsável pela orientação ou execução directa do seu cumprimento (art.º 57.º do Estatuto da Ordem).
Assim, cabe ao sócio responsável dar cumprimento a todos os deveres inerentes aos contratos de prestação de serviços para os quais a SROC o designou como tal. Assim sendo, a responsabilidade disciplinar pelo incumprimento daqueles deveres caberá, naturalmente, ao sócio designado como responsável.
No caso em apreço, essa responsabilidade impende sobre o arguido J......”.
Assim, ao invés do que a sentença recorrida decidiu, ou seja, que “o acto impugnado deverá ser anulado por vício de violação de lei e por isso, esse acto constitui um acto ilegal (acto de aplicação de pena disciplinar de advertência registada suspensa por dois anos)”, entendemos que o acto em causa não padece daquele vício, dado que é escorreito e legal.

Assim, não se apura verificado o pressuposto legal da ilicitude preceituado no nº 1 do artº 9º do RRCEEEP.
Ora, como os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual são cumulativos, a falta do primeiro, coloca em causa a apreciação dos restantes.
Donde, não acompanhamos o expressado na sentença recorrida quanto ao pedido indemnizatório, isto é, da condenação da Recorrente no pagamento de uma indemnização por danos morais, no valor de 2.000€.

Em conclusão, a pena única de advertência registada, aplicada ao Recorrido à luz do previsto na alínea b) do nº 1 do artº 81º do Estatuto da OROC e da alínea b) do artº 13º, suspensa por 2 anos, ao abrigo do instituído no artº 24º, ambos do Regulamento Disciplinar, radicada na violação dos deveres estabelecidos no nº 1 do artº 10º e no nº 2 do artº 12º, ambos do Código de Ética e Deontologia Profissional, encontra-se amnistiada.
No entanto, não se verificando a ilicitude da conduta da Recorrente na aplicação daquela pena, a sentença recorrida no conspecto da atribuição do pedido indemnizatório não se pode manter, pelo que procede o recurso não havendo direito ao pagamento por aquela ao Recorrido do pedido indemnizatório.
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V. Decisão

Nestes termos, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção Administrativa Social da Secção de Contencioso Administrativo do TCA Sul em:

1. Declarar amnistiada a infração disciplinar sancionada pelo ato impugnado e julgar extinta, nessa parte, a presente instância de recurso, por impossibilidade superveniente da lide.
2. Revogar a sentença recorrida na parte relativa ao pedido indemnizatório e, em consequência, absolver a Entidade Demandada/Recorrente desse pedido.

Custas pela Recorrente e pelo Recorrido, na proporção de 1/3 e 2/3, respetivamente, em ambas as instâncias – cfr nºs 1 e 2 do artº 527º e nº 1 e alínea c) do nº 2 do artº 536º, todos do CPC.
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Lisboa, 25 de Setembro de 2025
(Maria Helena Filipe – Relatora)
(Teresa Caiado – 1ª Adjunta)
(Luís Borges Freitas – 2º Adjunto)