Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:182/22.0BEFUN
Secção:CA
Data do Acordão:05/09/2024
Relator:JOANA MATOS LOPES COSTA E NORA
Descritores:FACTO INSTRUMENTAL
INFORMATIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO
CERTIDÕES INDEPENDENTES DE DESPACHO
PRAZO DE EMISSÃO
Sumário:I - Sendo requerida a emissão de certidão ao abrigo do artigo 84.º do CPA, e prevendo o seu n.º 3 um prazo mais curto para a emissão caso o procedimento a que respeitam os documentos se encontre informatizado, constitui facto instrumental relevante para a decisão a informatização do procedimento administrativo em causa, pelo que, não tendo o mesmo sido alegado pela parte a quem aproveita, deve o Tribunal considerá-lo caso o mesmo resulte da instrução da causa.
II - A emissão de certidão, reprodução ou declaração autenticada de documentos que integram o procedimento administrativo depende de despacho da autoridade procedimental, salvo se respeitar a todos ou alguns dos elementos previstos no n.º 1 do artigo 84.º do CPA, correspondentes a dados elementares do procedimento (do seu início, do seu objecto, do seu estado, da sua decisão).
III - Assim, sendo requerida a emissão de certidão relativamente a todos os documentos que integram um procedimento administrativo – e não apenas aos elementos previstos no n.º 1 do artigo 84.º do CPA -, está a mesma sujeita a despacho da autoridade procedimental, não sendo o artigo 84.º aplicável a tal caso.
IV - O prazo para a emissão de certidão, reprodução ou declaração autenticada de documentos, é de dez dias – cfr. artigo 82.º, n.º 3 -, sendo de três dias apenas quando a emissão se reporte aos elementos referidos no n.º 1 do artigo 84.º (certidões independentes de despacho) e quando tais elementos “constem de procedimentos informatizados” – cfr. artigo 84.º, n.º 3.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção COMUM
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

Acordam, em conferência, os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul:


I – RELATÓRIO

J…, solteiro, maior, residente no Funchal, intentou intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, contra a Secretaria Regional das Finanças do Governo Regional da Madeira. Pede a condenação da entidade demandada a, no prazo máximo de 10 (dez) dias, proceder à passagem de certidão ou cópia/reprodução autenticada ou à competente certidão negativa, conforme solicitado no requerimento por si apresentado, mais requerendo a aplicação de sanção pecuniária compulsória.
Alega, para tanto e em síntese, que: (i) Em 07.07.2022, remeteu – por intermédio do seu mandatário – à Secretaria Regional das Finanças do Governo Regional da Madeira um requerimento para passagem de certidão ou cópia/reprodução autenticada dos documentos relativos ao processo de expropriação das parcelas n.ºs 6 e 7 referentes à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque, requerendo, ao abrigo das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 84.º do CPA e da alínea b) do n.º 1 do artigo 15.º da LADA, e no prazo máximo de 3 (três) dias: “A passagem de certidão ou de cópia autenticada da integralidade dos documentos que compõem o procedimento administrativo (de expropriação) onde é visado, nesses documentos se incluindo, mas sem limitação: i) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer atos em que se determinou a obra a ser realizada nas parcelas 6 e 7, com definição exata da natureza, configuração e implantação da obra; ii) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer deliberações, decisões ou despachos da Requerida quanto ao processo de expropriação e ao processo de aprovação de obra a ser executada sobre parcelas supramencionadas (6 e 7), caso sejam distintos; iii) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer informações ou outros atos preparatórios de deliberações, decisões ou despachos constantes do ou dos procedimentos onde se integrem os atos referidos nas alíneas i) e ii); iv) Cópia ou reprodução autenticada de todos os pareceres técnicos, jurídicos ou outros que digam respeito aos procedimentos administrativos acima vistos, em que o Requerente é visado; v) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer atos, informações ou em geral, escritos que sejam constantes dos procedimentos administrativos acima referidos relativos ao Requerente, ainda sempre que sejam de autoria de entidades externas, desde que constem dos referidos procedimentos ou que estejam em posse da Requerida ou possam ficar em posse da mesma por acesso a suporte que a mesma tenha por direito próprio; vi) Cópia ou reprodução autenticada de todas as notificações e comunicações emitidas, enviadas e/ou recebidas no âmbito dos procedimentos em que o Requerente é visado. Caso a Requerida não tenha em sua posse documentos de alguma ou algumas das categorias referidas nas alíneas i) a vi) do ponto anterior, deverá emitir uma certidão negativa quanto a tais documentos especificando que documentos não existem ou não tenha conhecimento, nos termos e para os efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 15.º da LADA.”; (ii) A Secretaria Regional das Finanças do Governo Regional da Madeira recepcionou o requerimento no dia 11.07.2022 mas não deu satisfação ao pedido; (iii) O requerente tem o direito a conhecer, na íntegra, todos os documentos relativos ao processo de Expropriação das parcelas n.ºs 6 e 7 referentes à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque, com vista ao apuramento de eventuais vícios e ilegalidades de que o mesmo padeça, e, em particular, se o mesmo está ou não concluído e se as parcelas em causa, nas quais está implantada a sua habitação (que também é local de trabalho) integra algum novo projecto público e, em qualquer caso, se tais parcelas são necessárias para fins do mesmo; (iv) Caso a entidade requerida não tenha qualquer documento na sua posse, deverá emitir a competente certidão negativa, conforme requerido.
A entidade demandada apresentou resposta, alegando, em síntese, que, (i) Em resposta ao requerimento apresentado pelo requerente a 11.07.2022, a solicitar a emissão de certidão ou de cópia/reprodução autenticada da integralidade dos documentos que compunham o procedimento administrativo em arquivo na Direcção Regional do Património, esta Direcção, em 25.07.2022, informou o requerente que se encontravam disponíveis para levantamento, mediante o pagamento da taxa pela prestação do serviço no montante 30,11€, as fotocópias autenticadas dos seguintes elementos: projecto de obra, requerimento de resolução de expropriar, requerimento de declaração de utilidade pública e autorização de posse administrativa, e que a consulta, emissão de certidão e/ou reprodução de fotocópias autenticadas relativamente a outros documentos que não estes, poderia ser requerida junto do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízo Central Cível, no qual correu termos o processo de expropriação litigiosa respeitante, sob o n.º 2422/08.0TBFUN, posto que os originais dos restantes documentos não disponibilizados integram o processo em questão que se encontra em arquivo no referido Tribunal; (ii) Em 27.07.2022 o requerente compareceu na Direcção Regional, tendo procedido ao pagamento da taxa devida e ao levantamento das fotocópias autenticadas; (iii) A todos os requerimentos apresentados pelo requerente foram concedidas as devidas respostas, em ofícios remetidos por correio registado, os quais foram devidamente recebidos pelo seu destinatário.
Pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal foi proferida sentença a determinar a absolvição da entidade requerida da instância por falta de verificação dos pressupostos processuais específicos de utilização do presente meio processual.
O requerente interpôs o presente recurso de apelação, cujas alegações contêm as seguintes conclusões:
“A. O presente Recurso vem interposto da Sentença proferida em 27.09.2022, pelo douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, encontrando-se o seu objeto restringido ao segmento decisório que julgou procedente a Exceção de Exceção denominada de “extemporaneidade do requerimento de intimação para prestação de informações e passagem de certidões” e/ou Exceção dilatória inominada de falta dos pressupostos processuais específicos de utilização do presente meio processual (cf. artigo 635.º, n.º 2, do CPC, aplicável, ex vi, artigo 140.º, n.º 1, do CPTA).
B. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de/na apreciação da matéria de facto quando não julgou como provado, com relevância para a decisão da causa, que a Entidade Recorrida dispõe de sistema informatizado (pelo menos desde 2018) e que o processo de expropriação sobre o qual o Recorrente requereu o seu pedido de certidão, reprodução ou cópia autenticada encontrava-se igualmente informatizado à data do pedido.
C. O facto de a Entidade Recorrida dispor de sistema informatizado pelo mesmos desde 2018, encontra-se cabalmente provado pelos documentos n.º 2 e 3 (Contrato de Aquisição de Sistema de Gestão Documental a que corresponde o Processo n.º 14/CPR/2018 e Arquivo Eletrónico e Relatório de Atividades da Direção Regional do Património relativo ao ano de 2018), juntos pelo Recorrente no seu Requerimento de 22.08.2022, não impugnados pela Entidade Recorrida;
D. E o facto de todo o Processo de Expropriação em causa se encontrar também igualmente informatizado não só resulta de tal prova, como resulta do facto de o mesmo ter sido distribuído em Tribunal e conhecido tramitação eletrónica na plataforma citius (Processo n.º 2422/08.0TBFUN), encontrando-se toda a documentação procedimental e processual junta ao mesmo, conforme reconhecido pela própria Exa. Sra. Diretora Exma. Regional do Património, naquele Ofício de Ref.ª SRF/9898/2022 (cf. Facto F), dado como provado).
E. Conforme demonstrado, impõe-se assim nos termos e para os efeitos do disposto na alínea c), do n.º 1, artigo 640.º, e do n.º 1, do artigo 662.º, ambos do CPC, a alteração da matéria de facto dada como provada, incluindo-se os seguinte Factos: “H) Desde pelo menos o ano de 2018 que a Direção Regional do Património, que integra a Secretaria Regional de Finanças, tem todos os seus procedimentos informatizados.” e, “I) O Processo de Expropriação das parcelas n.º 6 e 7 referente à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque encontra-se informatizado no sistema informático da Entidade Recorrida.”
F. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de/na apreciação da matéria de direito no que concerne à interpretação do regime do artigo 84.º, do CPA, restringindo o seu campo de aplicação apenas aos casos em que documentos requeridos digam respeito a procedimentos de iniciativa particular e não oficiosa, como era o caso dos presentes autos referente a um procedimento de expropriação de utilidade pública.
G. Tal entendimento foi sustentado numa mera opinião de Mário Esteves de Oliveira et alii, in comentário ao artigo 63.º, do Código de Procedimento Administrativo na redação dada ao Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro, nos termos do qual os mesmos referem que “em principio” nos procedimentos oficiosos não seria necessário transmitir informações relativas ao procedimento atendendo a tal se encontra legalmente previsto no artigo 55.º, do mesmo Código (“Comunicações aos interessados”).
H. Sucede que a previsão do referido artigo em nada colidia e/ou se sobrepunha aos regimes do direito à informação e passagem de certidão, reprodução e declaração autenticada de documentos, que se encontravam consagrados subsequentemente no artigo 61.º, e ss., daquele CPA, comportando antes um dever da Administração em comunicar o inicio dos procedimentos oficioso, com a indicação da Entidade que ordenou a instauração do mesmo, a data do seu início, o serviço onde corria termos e o seu respetivo objeto.
I. Como se evidenciou, a comunicação de tais elementos relativos ao inicio do procedimento, não só não encontravam correspondência com o teor das alíneas daquele artigo 63.º, do CPA (onde se previa um direito à passagem de certidão, reprodução ou declaração autenticada de elementos relativos a todas as fases do procedimento e não só o seu início), como também não impediam que o Particular de requerer posteriormente uma certidão, reprodução ou declaração autenticada contento aquelas mesmas informações sobre o início do procedimento e/ou sua subsequente (relacionadas precisamente com o seu “andamento” e/ou “desfecho”).
J. Tal entendimento, infundado, sempre seria passível de consubstanciar uma violação do direito de informação e acesso a documentos administrativos (cf. artigos 268.º, n.º 2, da CRP, e 61.º e ss. do CPA na redação do Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro),
K. E uma violação dos Princípios da Legalidade, da Boa-Administração, da Igualdade, da Proporcionalidade, da Imparcialidade, da Boa-Fé, da Colaboração com os Particulares e da Participação, previstos, respetivamente (cf. artigos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, do CPA na redação do Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro).
L. Na previsão do artigo 84.º, do CPA (na sua redação dada pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 07 de Janeiro) não se encontra qualquer restrição de aplicação do mesmo apenas a procedimentos particulares, sendo que o artigo 110.º, do mesmo código, veio dissipar quaisquer dúvidas que pudessem existir quando ao escopo de aplicação e conteúdo do anterior artigo 55.º, porquanto previsto sob a epígrafe “notificação do início do procedimento”.
M. De facto, o artigo 110.º, do CP, não garante o direito a informação e passagem de certidão, reprodução ou declaração autenticada relativa a documentos dos procedimentos iniciados oficiosamente, e nem o douto Tribunal a quo sequer o apreciou nesses termos.
N. Como é consabido e resulta da aplicação conjugadas dos artigos 37.º, n.º 1 e 2, 48.º, n.º 2 e 268.º, da CRP, e artigos 17.º n.º 1 e 82.º a 85.º, do CPA, e artigos 5 e 12.º a 15.º, da Lei n.º 26/2016, de 22 de Agosto, a regra geral é a de que deve ser permitido o acesso a todas as informações relacionadas com procedimentos administrativos, seja esta uma informação procedimental ou não procedimental, e tenham aqueles procedimentos sido ou não iniciados oficiosamente.
O. Termos em que, comprovado que se encontra que o Recorrente requereu a emissão de certidão, reprodução ou declaração autenticada de documentos relacionados com o Processo de Expropriação de que foi alvo, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 83.º, n.º 3 e 84.º, n.º 1, alíneas a) a d), e n.º 3, do CPA (cf. Factos A) e B), dados como provados), e que a Entidade Recorrida dispunha de sistema informatizado e que o processo expropriativo se encontrava integralmente informatizado (cf. Factos H) e I), que deverão ser dados como provados nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do artigo 662.º, do CPC), então constata-se que a mesma dispunha até dia 14.07.2022 para satisfazer o pedido rececionado a 11.07.2022 (cf. Facto D), dado como provado), conforme sustentado pelo Recorrente.
P. Ora, tendo a presente Ação dado entrada no dia 22.07.2022, consta-se que se encontram verificados os pressupostos consagrados no n.º 1 e 2, alínea a), do artigo 105.º, do CPTA, ao contrário do preconizado pelo douto Tribunal a quo.
Q. Em face de todo o exposto, deve a Sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão que julgue totalmente procedente o presente processo e condene a Entidade Recorrida no prazo máximo de 10 (dez) dias, proceder à passagem de Certidão ou Cópia/Reprodução autenticada peticionadas, ou, em alternativa à emissão da competente Certidão Negativa, nos termos solicitados no Requerimento que lhe foi apresentado pelo Recorrente.”
A entidade recorrida não respondeu à alegação do recorrente.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, não emitiu pronúncia.
Sem vistos dos juízes-adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. n.º 2 do artigo 36.º do CPTA), importa apreciar e decidir.


II – QUESTÕES A DECIDIR

As questões que ao Tribunal cumpre solucionar são as de saber se a sentença padece de:
a) Erro de julgamento de facto por não ter julgado como provados os seguintes factos: “H) Desde pelo menos o ano de 2018 que a Direção Regional do Património, que integra a Secretaria Regional de Finanças, tem todos os seus procedimentos informatizados.” e, “I) O Processo de Expropriação das parcelas n.º 6 e 7 referente à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque encontra-se informatizado no sistema informático da Entidade Recorrida.”;
b) Erro de julgamento de direito por ter entendido que o artigo 84.º do CPA não é aplicável ao caso.


III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida fixou os seguintes factos, que considerou provados:
“A) – Em 07.07.2022, foi enviado, por correio postal, o requerimento subscrito pelo advogado P…, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: “ASSUNTO: Passagem de Certidão ou de Cópia/ Reprodução Autenticada Processo de Expropriação das parcelas n.º 6 e 7 referentes à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque Exmo. Sr. Secretário Regional das Finanças, Por referência ao processo em epígrafe, e em nome e representação do nosso cliente Exmº Sr. Dr. J…, requeremos a V. Exa que dê entrada e autue o Requerimento de Passagem de Certidão ou de Cópia/Reprodução Autenticada em anexo à presente. A fim de nos ser devolvida uma cópia carimbada do mesmo, junto remetemos envelope previamente selado e endereçado. Mais somos a solicitar a V. Exa. que a referida certidão ou cópia/reprodução autenticada seja passada no prazo máximo de 3 (três) dias úteis desde receção da presente, conforme aos termos legais aplicáveis e que, caso exista algum custo a ser suportado sejam os signatários informados da mesma e da base jurídica, para que processem a sua liquidação. Por fim, solicitamos que uma vez emitida a certidão ou a cópia/reprodução autenticada, sejam os signatários informados desse facto, para efeitos do seu levantamento, com indicação do local em que a mesma será disponibilizada.” – Cfr. fls. 32-47 dos autos;
B) – Com o requerimento referido na alínea anterior, foi enviado, em anexo, o requerimento dirigido ao Secretário Regional das Finanças, subscrito pelo advogado P…, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: “J…, (…) vem, nos termos e para os efeitos do artigo 83.º, n.º 3 e do artigo 84.º, n.º 1, alíneas a) a d) e n.º 3, ambos do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro (“CPA”) e nos termos do artigo 5.º, n.º 1 e n.º 2, artigo 4.º, n.º 1, alínea a), artigo 12.º, n.º 1 e artigo 13.º, n.º 1, alíneas b) e c), da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos, aprovada pela Lei n.º 26/2016, de 22 de Agosto (“LADA”), requerer PASSAGEM de CERTIDÃO ou de CÓPIA ou REPRODUÇÃO AUTENTICADA Nos termos e com os seguintes fundamentos: 1. O Requerente tem a sua casa de habitação própria, que é também o seu local de trabalho no caminho da I…(S…) e teveconhecimento da Resolução n.º 1344/2006, de 17 de outubro de 2006, publicada no 2.º Suplemento, I Série, Número 134, do Jornal Oficial da Região Autónoma da Madeira, pela qual se declarou de utilidade pública a expropriação dos bens imóveis identificados e assinalados na lista anexa e na planta parcelar da “obra de arranjo urbanístico do Centro de São Roque”, nos quais se integrava o seu imóvel de habitação - parcelas n.º 6 e 7 referentes à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque (…). 2. Nos termos da Declaração de Utilidade Pública (…), o fim a que se destinaria a expropriação seria o de construção de novas vias de circulação, rotundas e respetivas derivações viárias, no centro da freguesia de São Roque, na cidade do Funchal (…). 3. A 9 de junho de 2008, no âmbito do processo judicial n.º 2422/08.0TBFUN, foi proferida sentença de adjudicação judicial das parcelas n.º 6 e 7 supramencionadas, mas depois de iniciadas as obras referentes ao arranjo urbanístico do Centro de São Roque, no município do Funchal, estas ficaram suspensas entre os anos de 2012 e 2017. 4. Por Ofício sob o n.º 2895, de 12.08.2014, da Direção Regional do Património (adiante “Requerida”), foi o Requerente informado de que houve lugar à desistência da expropriação quanto às parcelas 6 e 7, por haver desnecessidade das mesmas para fins da execução da obra subjacente à expropriação (…). 5. De facto, observados os trabalhos de construção já realizados e concluídos no local, verifica-se que tais parcelas não foram necessárias utilizar, com o que se justificou a desistência da sua expropriação como comunicada ao aqui Requerente. 6. A essa luz, as recentes comunicações datadas de 26.04.2022 e de 07.06.2022, de V. Exas para o Requerente, no sentido de ser retomada a expropriação quando a “Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque” se acha concluída sem necessidade destas parcelas foi colhida com surpresa pelo Requerente e coloca a intenção da Requerida em direta colisão com os fins constantes na Declaração de Utilidade Pública conhecida, por não ser possível que tais parcelas visem um fim já realizado, mais a mais quando a Requerida já afirmou de modo próprio, que desistia dessa expropriação por desnecessidade (…). 7. Ora, face ao acima explanado, torna-se necessário averiguar e analisar a legalidade dos atos e decisões em causa no processo de expropriação levado a cabo pela Declaração de Utilidade Pública (a citada Resolução n.º 1344/2006, de 17 de outubro de 2006), pois que as mais recentes comunicações são contraditórias com prévios atos notificados e cujos direitos constituídos podem estar a ser lesados, para o que o Requerente deve conhecer que atos existam no processo, 8. Sendo certo que o processo em causa visa diretamente o Requerente e os seus direitos fundamentais, com o que o mesmo tem interesse legítimo no exercício do direito à informação procedimental, sem necessidade de ulterior demonstração de interesse legítimo. 9. Mais ainda, estima conhecer o Requerente que a execução da obra agora em curso e para a qual o Governo Regional pretende a entrega das parcelas em causa, o que implicará a perda da sua habitação própria e local de trabalho, já não se refere ao arranjo urbanístico do centro de São Roque, como definido em Declaração de Utilidade Pública (…), mas sim a construção de um imóvel para po centro cívico de São Roque, obra que em nada se relaciona com o previsto na citada Declaração de Utilidade Pública acimavista, não se conhecendo a existência de qualquer outra para a nova obra, facto que levanta sérias dúvidas de legalidade quanto à atuação de V. Exas. 10. Atento o exposto, o Requerente tem legítimo interesse em conhecer a existência de quaisquer deliberações, pareceres, ou de um modo geral, quaisquer atos relativos aos seus procedimentos, dispensando-se ulterior demonstração de legitimidade procedimental, por o mesmo estar a exercer o direito à informação em procedimento em que é visado. 11. Assim, o Requerente solicita, nos termos e para os efeitos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 84.º do CPA e da alínea b) do n.º 1 do artigo 15.º da LADA: • A passagem de certidão ou de cópia autenticada da integralidade dos documentos que compõem o procedimento administrativo (de expropriação) onde é visado, nesses documentos se incluindo, mas sem limitação: i) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer atos em que se determinou a obra a ser realizada nas parcelas 6 e 7, com definição exata da natureza, configuração e implantação da obra; ii) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer deliberações, decisões ou despachos da Requerida quanto ao processo de expropriação e ao processo de aprovação de obra a ser executada sobre parcelas supramencionadas (6 e 7), caso sejam distintos; iii) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer informações ou outros atos preparatórios de deliberações, decisões ou despachos constantes do ou dos procedimentos onde se integrem os atos referidos nas alíneas i) e ii); iv) Cópia ou reprodução autenticada de todos os pareceres técnicos, jurídicos ou outros que digam respeito aos procedimentos administrativos acima vistos, em que o Requerente é visado; v) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer atos, informações ou em geral, escritos que sejam constantes dos procedimentos administrativos acima referidos relativos ao Requerente, ainda sempre que sejam de autoria de entidades externas, desde que constem dos referidos procedimentos ou que estejam em posse da Requerida ou possam ficar em posse da mesma por acesso a suporte que a mesma tenha por direito próprio; vi) Cópia ou reprodução autenticada de todas as notificações e comunicações emitidas, enviadas e/ou recebidas no âmbito dos procedimentos em que o Requerente é visado. • Caso a Requerida não tenha em sua posse documentos de alguma ou algumas das categorias referidas nas alíneas i) a vi) do ponto anterior, deverá emitir uma certidão negativa quanto a tais documentos especificando que documentos não existem ou não tenha conhecimento, nos termos e para os efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 15.º da LADA. 12. As cópias, reproduções autenticadas ou certidão a que se refere o número anterior deverão ser emitidas no prazo máximo de 3 (três) dias úteis desde receção da presente, atenta a circunstância de a Requerida ser possuidora de sistemas informáticos de arquivo informático de dados de procedimentos que tramita, de acordo com o exigido pelo artigo 84.º, n.º 3 do CPA. 13. O Requerente afirma-se disponível para os quaisquer custos administrativos incorridos na passagem de certidão, para tanto devendo ser-lhe indicadas as quantias e ométodo de cálculo da mesma, segundo prévio regulamento existente, cuja prova deve em tal caso ser prestada. 14. Mais indica o Requerente que as certidões em causa se destinam a uso de meios contenciosos ou graciosos pelas mesmas, incluindo, sem limitação, a impugnação de atos administrativos, o exercício de responsabilidade da pessoa coletiva e dos titulares dos seus órgãos e a instrução de processos junto de distintas jurisdições. 15. Nessa medida, a ausência de cumprimento ou de cumprimento atempado e integral do suscitado pelo Requerente implicará, findo o prazo legal concedido, o uso do respetivo meio contencioso para obter judicialmente a satisfação do pedido ora deduzido. 16. Solicita-se, por fim, que seja prestada resposta por email para o endereço de email do signatário (indicado abaixo) e que os originais lhe sejam remetidos por correio, para a morada indicada abaixo e repetida no email. Nestes termos, Deve o presente pedido de emissão de cópia ou de reprodução autenticada ou certidão ser admitido e satisfeito no prazo máximo de 3 (três) dias úteis desde receção do presente, nos termos e com os fundamentos acima mencionados, (…) Avenida A…, Edifício A…, 9…-0…Funchal, Portugal (…) E-mail: g…@a….pt” – Cfr. fls. 32-47 dos autos;
C) – Com o requerimento referido em A), foi enviado, em anexo, o instrumento intitulado “PROCURAÇÃO FORENSE”, subscrito pelo Requerente, com data de 28.06.2022, e de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: “J…, (…) constitui seus bastantes procuradores, o Senhor Dr. J…, o Senhor Dr. P…, o Senhor Dr. D…, Advogados e Sócios da Sociedade de Advogados “A…, M… e Associados, Sociedade de Advogados, S…, a Senhora Dra. M…, e a Senhora Dra. M…, Advogadas, todos com domicílio profissional na Avenida L…, Edifício A…,1…-1… Lisboa, e a Senhora Dra. P… e a Senhora Dra. I…, Advogadas, ambas com domicílio profissional na Avenida A…, Edifício A…, …, …, 9…-0… Funchal, Portugal, a quem confere os mais amplos poderes forenses em direito permitidos, para em conjunto ou separadamente, e com faculdade de substabelecer, representarem o Mandante, perante todos os Tribunais Portugueses ou Entidades Públicas ou Privadas, prosseguindo, se necessário, com as respectivas ações ou processos judiciais, administrativos ou de qualquer outra natureza, incluindo poderes especiais necessários para representar, confessar, desistir ou transigir, receber ou pagar qualquer quantia pagável, assinar recibos, dar as respectivas quitaçõese, de forma geral, para praticar todos os actos que se mostrem necessários, próprios ou convenientes aos mencionados fins.” – Cfr. fls. 75-81 dos autos;
D) – No dia 11.07.2022, os requerimentos e o instrumento referidos em A) a C) foram recebidos na Secretaria Regional das Finanças do Governo Regional da Madeira. – Cfr. fls. 48 e 75-81 dos autos;
E) – Em 22.07.2022, a petição inicial do presente processo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi submetida na plataforma do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais administrativos e fiscais, dirigida a este Tribunal. – Cfr. fls. 1-17 dos autos;
F) – Em 25.07.2022, foi registada, sob a referência n.º SRF/9893/2022, a saída do ofício subscrito pela Diretora Regional do Património, dirigido ao advogado P…, e enviado, por correio, para o endereço “Avenida A…, Edifício A…, …, …, 9…-0… Funchal”, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: “ASSUNTO: Emissão de fotocópias autenticadas Obra de “Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque” Parcelas de terreno n.º 6 e 7 Versando o assunto identificado em epígrafe, e na sequência do requerimento apresentado por V/Ex.ª, o qual mereceu a nossa melhor atenção, serve o presente para no estrito cumprimento do preceituado no n.º 1, alínea b) do art. 15.º da Lei n.º 26/2016 de 22 de agosto (LADA), informar V/Ex.ª do seguinte: 1. A respeito da pretensão formulada por V/Ex.ª, cumpre informar que as fotocópias autenticadas, dos elementos que de seguida se enumeram, estão disponíveis para levantamento junto do gabinete de atendimento desta Direção Regional no seu horário de funcionamento, nomeadamente das 09:00h às 12:00h e das 14:30h às 17:00h: Doc. 1 – “Projeto de Obra”; Doc. 2 – “Requerimento da Resolução de Expropriar”; Doc. 3 – “Requerimento de Declaração de Utilidade Publica e Autorização da Posse Administrativa”; Doc. 4 – “Certidão da Resolução n.º 1344/2006, de 09 de outubro de 2006”. 2. Não obstante, informamos que se V/Ex.ª considerar conveniente a consulta, emissão de certidão e/ou reprodução de fotocópias autenticadas relativamente a outros documentos, que não os ora disponibilizados, poderá para esse efeito requerer junto do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, Juízo Central Cível, no qual correram os termos do processo de expropriação litigiosa respeitante, com o n.º de processo2422/08.0TBFUN, posto que os originais dos restantes documentos integram os autos acima referenciados. 3. Por conseguinte, cumpre comunicar que o montante devido por conta das taxas a cobrar pela prestação do serviço é de 30,11€ (trinta euros e onze cêntimos), conforme previsto pelo art. 14.º da Lei n.º 26/2016 de 22 de agosto (LADA) em conjugação com o disposto no n.º 1 alínea 6) subalíneas a) e b) da Portaria n.º 2/2012 de 12 de janeiro da Vice-Presidência do Governo Regional e Secretaria Regional do Plano e Finanças, esse mesmo montante que deverá ser liquidado junto do mencionado gabinete. 4. Mais se informa que, o levantamento das pretendidas fotocópias autenticadas junto do citado gabinete nos termos anteriormente exarados, depende da prévia liquidação do montante referido no ponto anterior.” – Cfr. fls. 121-122 dos autos;
G) – Em 27.07.2022, foi pago, pela sociedade A…, M… & Associados, à Direção Regional do Património, a quantia de €30,11, indicada no ofício referido na alínea anterior, tendo sido levantadas as fotocópias autenticadas dos documentos aí mencionados. – Admitido por acordo; cfr. fls. 123 dos autos.”

*
O recorrente impugna a decisão sobre a matéria de facto, alegando que - com base nos documentos 2 e 3 juntos pelo mesmo no seu requerimento de 22.08.2022, e não impugnados, e no facto de o procedimento de expropriação ter sido distribuído em Tribunal e tramitado electronicamente na plataforma citius (Processo n.º 2422/08.0TBFUN), encontrando-se toda a documentação procedimental e processual junta ao mesmo, conforme reconhecido pela Directora Regional do Património no Ofício de Ref.ª SRF/9898/2022 (cf. Facto F), dado como provado) - deveriam ter sido julgados provados os seguintes factos: “H) Desde pelo menos o ano de 2018 que a Direção Regional do Património, que integra a Secretaria Regional de Finanças, tem todos os seus procedimentos informatizados.” e, “I) O Processo de Expropriação das parcelas n.º 6 e 7 referente à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque encontra-se informatizado no sistema informático da Entidade Recorrida.”.
Vejamos.
Sobre a relação entre o ónus de alegação das partes e os poderes de cognição do tribunal, dispõe o artigo 5.º do CPC, nos seus n.ºs 1 e 2, o seguinte: “1 - Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas. 2 - Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.” Nestes termos, o juiz só pode fundar a sua decisão nos seguintes tipos de factos: (i) nos factos essenciais (que constituem a causa de pedir e em que se baseiam as excepções invocadas), alegados pelas partes nos articulados; (ii) nos factos instrumentais, que resultem da instrução da causa; (iii) nos factos complementares ou concretizadores dos factos essenciais alegados pelas partes e que resultem da instrução da causa; (iv) nos factos notórios (que são do conhecimento geral e que não carecem de alegação nem de prova – cfr. artigo 412.º, n.º 1, do CPC ); e (v) nos factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções (que também não carecem de alegação – cfr. artigo 412.º, n.º 2, do CPC).
Ademais, se é certo que “(…) deve a sentença tomar em consideração os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam posteriormente à proposição da ação, de modo que a decisão corresponda à situação existente no momento do encerramento da discussão.”, “Só são, porém, atendíveis os factos que, segundo o direito substantivo aplicável, tenham influência sobre a existência ou conteúdo da relação controvertida.” – cfr. artigo 611.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Vejamos.
O primeiro facto que o recorrente entende que deveria ter sido dado como provado na sentença recorrida (“H) Desde pelo menos o ano de 2018 que a Direção Regional do Património, que integra a Secretaria Regional de Finanças, tem todos os seus procedimentos informatizados.”) não foi alegado na p.i., mas apenas no artigo 48 e do requerimento pelo mesmo apresentado em 22.08.2022, após a resposta, pronunciando-se sobre a mesma – cfr. fls. 145 do SITAF -, momento em que a sua alegação se mostra inadmissível, por extemporânea. Com efeito, a tramitação do processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, prevista no artigo 107.º do CPTA, apenas comporta os articulados da petição e da resposta, após a qual se segue a decisão, e entre a resposta e a decisão apenas se prevê a adopção de diligências necessárias à instrução do processo, não tendo cabimento legal a apresentação de qualquer outro articulado e, portanto, a alegação de factos novos. O segundo facto que o recorrente entende que deveria ter sido dado como provado na sentença recorrida (“I) O Processo de Expropriação das parcelas n.º 6 e 7 referente à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque encontra-se informatizado no sistema informático da Entidade Recorrida.”) nem sequer foi alegado.
Todavia, não se tratando de factos essenciais (tempestivamente) alegados pelas partes, estamos perante factos instrumentais, cuja relevância para a decisão da relação material controvertida advém da circunstância de o recorrente ter requerido a emissão de certidões ao abrigo do artigo 84.º do CPA, prevendo o n.º 3 do mesmo um prazo mais curto, de três dias, para a emissão sempre que os elementos pretendidos constem de procedimentos informatizados.
Acontece que tais factos instrumentais não resultam provados, nos termos em que o pretende o recorrente. É que os documentos 2 e 3 juntos pelo mesmo com o seu requerimento de 22.08.2022, não obstante não terem sido impugnados, não são aptos a fazer a prova que o recorrente intenta. O documento 2 corresponde a cópia de “contrato de aquisição de sistema de gestão documental e arquivo eletrónico para a vice-presidência do Governo Regional”, outorgado entre a Direcção Geral do Património e de Gestão dos Serviços Partilhados e a A… – i…, Lda; o documento 3 corresponde ao “Relatório de actividades 2018 da Direcção Regional do Património e Informática”. Ora, do teor de tais documentos não é, de modo algum, possível retirar que o concreto procedimento de expropriação em causa se mostra informatizado. Acresce que a circunstância de o procedimento de expropriação ter sido tramitado electronicamente na plataforma citius, no âmbito de processo judicial, também não milita nesse sentido, desde logo porque a eventual tramitação electrónica do processo de expropriação em Tribunal respeita ao processo judicial, e não ao procedimento administrativo que corre termos na entidade pública, sendo, obviamente, a este que se reporta a norma do n.º 3 do artigo 84.º do CPA.
Assim sendo, improcede a impugnação da matéria de facto.


IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

O recorrente alega que a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito por ter entendido que o artigo 84.º do CPA apenas se aplica aos casos em que os documentos requeridos digam respeito a procedimentos de iniciativa particular, e não oficiosa, como é o caso dos presentes autos, referente a um procedimento de expropriação de utilidade pública. Defende o recorrente que tal norma legal não colide nem se sobrepõe ao direito à informação, previsto no CPA, comportando, antes, um dever da Administração de comunicar o início dos procedimentos oficiosos, com a indicação da entidade que ordenou a instauração do mesmo, a data do seu início, o serviço onde corria termos e o seu respectivo objecto, dever este cujo cumprimento não impede o particular de requerer, posteriormente, uma certidão, reprodução ou declaração autenticada contendo aquelas mesmas informações. Mais defende que o artigo 110.º do CPA, prevendo a “notificação do início do procedimento”, esclarece que a previsão do artigo 84.º não se aplica apenas a procedimentos particulares. E, como resulta da aplicação conjugada dos artigos 37.º, n.ºs 1 e 2, 48.º, n.º 2, e 268.º da CRP, e 17.º, n.º 1, e 82.º a 85.º, do CPA, e 5.º e 12.º a 15.º da Lei n.º 26/2016, de 22 de Agosto, a regra geral é a de que deve ser permitido o acesso a todas as informações relacionadas com procedimentos administrativos, seja esta uma informação procedimental ou não procedimental, e tenham aqueles procedimentos sido ou não iniciados oficiosamente. Conclui que o entendimento vertido na sentença recorrida viola os direitos de informação e acesso a documentos administrativos, previstos nos artigos 268.º, n.º 2, da CRP, e 61.º e ss. do CPA), e os princípios da legalidade, da boa administração, da igualdade, da proporcionalidade, da imparcialidade, da boa-fé, da colaboração com os particulares e da participação, previstos nos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, do CPA.

A sentença recorrida determinou a absolvição da entidade requerida da instância por falta de verificação dos pressupostos processuais específicos de utilização do presente meio processual, assentando na seguinte fundamentação fáctico-jurídica:
“(…)
No requerimento que acompanhou o pedido de certidão, o mandatário do Requerente solicitou que “uma vez emitida a certidão ou a cópia/reprodução autenticada”, fossem “os signatários informados desse facto, para efeitos do seu levantamento, com indicação do local em que a mesma será disponibilizada”, e que a resposta fosse prestada “por email para o endereço de email do signatário (…) e que os originais lhe sejam remetidos por correio, para a morada indicada” [cfr. o facto assente em A)].
Ora, as informações, certidões, reproduções ou declarações autenticadas devem estar prontas, para entrega ou envio, no último dia, sendo sobre os interessados que, terminado esse prazo, recai o ónus de procurar a informação pretendida junto do serviço onde o procedimento se encontra, no caso necessitem urgentemente de tais informações.
Além disso, nas situações, como a dos presentes autos, em que o interessado remete o pedido de certidão por correio postal, o prazo de que a administração dispõe para cumprimento só se inicia com a receção do requerimento, dado que não é possível assegurar a emissão tempestiva da certidão num momento em que se desconhece o concreto objeto e alcance do pedido.
Na verdade, atribuir ao momento do envio o relevo de dies a quo significaria o encurtamento incomportável do prazo legal de que a Administração dispõe para cumprimento do dever informativo, maxime, atendendo a que se trata de um prazo apertado, de 3 ou 10 dias úteis. Tal solução seria suscetível de implicar que, aquando da receção do pedido, já houvesse decorrido o prazo legal da emissão da certidão, inviabilizando qualquer possibilidade de cumprimento.
Na situação em litígio, provou-se que o requerimento que fundamenta a pretensão formulada nos presentes autos – no qual foi solicitada a passagem de certidão ou de cópia autenticada da integralidade dos documentos que compõem o procedimento de expropriação dos imóveis correspondentes às parcelas identificadas na lista anexa e na planta parcelar da “Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque”, com os n.os 6 e 7 – foi recebido, por correio postal, na Secretaria Regional das Finanças do Governo Regional da Madeira, no dia 11.07.2022 [cfr. os factos assentes em A) a D)]. Provou-se também que a petição inicial do presente processo foi submetida na plataforma do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais administrativos e fiscais (SITAF), no dia 22.07.2022 [cfr. o facto assente em E)].
Ora, os documentos em relação aos quais o Requerente pretende que seja extraída certidão ou cópia autenticada referem-se a um procedimento de expropriação por utilidade pública, pelo que – tratando-se de um procedimento de iniciativa oficiosa (e não particular) – não tem aplicação, ao caso concreto dos autos, o prazo de 3 dias úteis estipulado no artigo 84.º, n.º 3, do CPA, mas o prazo regra de 10 dias úteis, seja por aplicação da disposição contida no artigo 82.º, n.º 3, do CPA ou da norma do artigo 15.º, n.º 1, da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto.
Assim, tendo presente que o requerimento que fundamenta a pretensão formulada nos presentes autos foi recebido, pela Secretaria Regional das Finanças do Governo Regional da Madeira, no dia 11.07.2021, é de concluir que, no dia em que foi intentado o presente processo de intimação, não tinha ainda decorrido o prazo, de 10 dias úteis, de que a Entidade Requerida dispunha para emissão das certidões requeridas, cujo termo ocorreu no dia 25.07.2022 – data em que foi enviado, ao mandatário do Requerente, o ofício referido na alínea F) dos factos assentes.
Nestes termos, não se verificando, no momento da propositura dos presentes autos, qualquer das situações elencadas no artigo 105.º, n.º 2, do CPTA, é de julgar verificada a exceção dilatória inominada de falta dos pressupostos processuais específicos de utilização do presente meio processual, sendo, por conseguinte, de absolver a Entidade Requerida da instância, nos termos do artigo 89.º, n.º 2, do mesmo Código, com prejuízo do conhecimento do mérito da causa.
(…)”
Ou seja, e em síntese, entendeu-se na sentença recorrida que, à data da instauração da presente intimação (22.07.2022), não havia ainda decorrido o prazo de que dispunha a entidade requerida para satisfazer o pedido do requerente, considerando que (i) tal pedido foi remetido por correio postal e recebido pela entidade requerida em 11.07.2022, e que (ii) o prazo para satisfação do mesmo é, nos termos dos artigos 82.º, n.º 3, do CPA e 15.º, n.º 1, da Lei n.º 26/2016, de 22 de Agosto, de dez dias úteis, uma vez que os documentos cuja certidão/cópia autenticada o requerente pretende se inserem num procedimento de expropriação por utilidade pública, que, como tal, é de iniciativa oficiosa, não sendo, por isso, aplicável ao caso o prazo de três dias úteis, previsto no n.º 3 do artigo 84.º do CPA.

Cumpre apreciar o invocado erro de julgamento.

Nos termos do n.º 1 do artigo 104.º e do n.º 1 do artigo 105.º do CPTA, quando não seja dada integral satisfação a pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a correspondente intimação contra a pessoa colectiva de direito público, o ministério ou a secretaria regional cujos órgãos sejam competentes para facultar a informação ou a consulta, ou passar a certidão. Acrescenta o n.º 2 do artigo 105.º que a intimação deve ser requerida no prazo de 20 dias, a contar da verificação de qualquer dos seguintes factos: a) Decurso do prazo legalmente estabelecido, sem que a entidade requerida satisfaça o pedido que lhe foi dirigido; b) Indeferimento do pedido; c) Satisfação parcial do pedido.
Sobre o “Direito dos interessados à informação”, dispõe o artigo 82.º do CPA, nos seus n.ºs 1 e 2, o seguinte: “1 - Os interessados têm o direito de ser informados pelo responsável pela direção do procedimento, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos procedimentos que lhes digam diretamente respeito, bem como o direito de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas. 2 - As informações a prestar abrangem a indicação do serviço onde o procedimento se encontra, os atos e diligências praticados, as deficiências a suprir pelos interessados, as decisões adotadas e quaisquer outros elementos solicitados.”
Nos termos do n.º 3 do artigo 83.º, “Os interessados têm o direito, mediante o pagamento das importâncias que forem devidas, de obter certidão, reprodução ou declaração autenticada dos documentos que constem dos processos a que tenham acesso.” Cumpre referir que “As certidões procedimentais são reproduções autenticadas, passadas por ordem ou despacho da autoridade procedimental (…), de documentos constantes do processo procedimental.” – cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO COSTA GONÇALVES E JOÃO PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo, 2.ª edição, Coimbra, 1997, p. 335.
Tratando-se, porém, de certidões, reproduções ou declarações autenticadas de documentos respeitantes a “a) Data de apresentação de requerimentos, petições, reclamações, recursos ou documentos semelhantes; b) Conteúdo dos documentos referidos na alínea anterior ou pretensão nestes formulada; c) Andamento que tiveram ou situação em que se encontram os documentos a que se refere o n.º 1; d) Resolução tomada ou falta de resolução.” – e só a estes elementos -, dispõe o n.º 1 do artigo 84.º do CPA que os serviços competentes são obrigados a passá-las aos interessados, “independentemente de despacho e no prazo máximo de 10 dias, a contar da apresentação do requerimento”. Estão em causa “certidões sobre dados elementares do procedimento (do seu início, do seu objecto, do seu estado, da sua decisão) e em relação às quais se justifica a adopção de um regime especial, não apenas porque são mais fáceis (de procurar e) emitir, mas também porque são aquelas de que os interessados mais carecem para saber como se situar face ao procedimento em curso.” – cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO COSTA GONÇALVES E JOÃO PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo, 2.ª edição, Coimbra, 1997, p. 337. Trata-se de um “regime especial” de emissão de certidões, que se distingue do “regime geral”, desde logo, por a emissão da certidão não depender do referido despacho da autoridade procedimental, como é a regra geral.
Neste “regime especial” de emissão de certidões, prevê ainda o n.º 3 do artigo 84.º que, quando tais elementos “constem de procedimentos informatizados”, as certidões, reproduções ou declarações autenticadas de documentos são passadas, com a devida autenticação, no prazo máximo de três dias, por via eletrónica ou mediante impressão nos serviços da Administração.
O prazo para a emissão de certidão, reprodução ou declaração autenticada de documentos, é de dez dias – cfr. artigo 82.º, n.º 3 -, sendo de três dias apenas quando a emissão se reporte aos elementos referidos no n.º 1 do artigo 84.º (certidões independentes de despacho) e tais elementos “constem de procedimentos informatizados” – cfr. artigo 84.º, n.º 3.
Volvendo ao caso em apreço, no presente recurso apenas está em causa saber se é aplicável ao caso o regime previsto no artigo 84.º do CPA, referente à emissão de certidões independentes de despacho. Como vimos, defende o recorrente que o é, a tal não obstando a circunstância de estar em causa um procedimento de expropriação, de iniciativa oficiosa. Entendeu-se na sentença recorrida que o não é, precisamente por essa razão.
Vejamos.
Dado que o artigo 84.º do CPA regula, em especial, a emissão de certidões independentemente de despacho para o efeito, a aplicabilidade de tal norma legal ao caso depende de estarmos perante um pedido de certidão respeitante a todos ou alguns dos seguintes elementos: “a) Data de apresentação de requerimentos, petições, reclamações, recursos ou documentos semelhantes; b) Conteúdo dos documentos referidos na alínea anterior ou pretensão nestes formulada; c) Andamento que tiveram ou situação em que se encontram os documentos a que se refere o n.º 1; d) Resolução tomada ou falta de resolução.”
O que o requerente recorrente pretende é a passagem de certidão ou de cópia autenticada da integralidade dos documentos que compõem o procedimento administrativo (de expropriação) das parcelas n.ºs 6 e 7 referentes à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque, “(…) nesses documentos se incluindo, mas sem limitação: i) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer atos em que se determinou a obra a ser realizada nas parcelas 6 e 7, com definição exata da natureza, configuração e implantação da obra; ii) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer deliberações, decisões ou despachos da Requerida quanto ao processo de expropriação e ao processo de aprovação de obra a ser executada sobre parcelas supramencionadas (6 e 7), caso sejam distintos; iii) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer informações ou outros atos preparatórios de deliberações, decisões ou despachos constantes do ou dos procedimentos onde se integrem os atos referidos nas alíneas i) e ii); iv) Cópia ou reprodução autenticada de todos os pareceres técnicos, jurídicos ou outros que digam respeito aos procedimentos administrativos acima vistos, em que o Requerente é visado; v) Cópia ou reprodução autenticada de quaisquer atos, informações ou em geral, escritos que sejam constantes dos procedimentos administrativos acima referidos relativos ao Requerente, ainda sempre que sejam de autoria de entidades externas, desde que constem dos referidos procedimentos ou que estejam em posse da Requerida ou possam ficar em posse da mesma por acesso a suporte que a mesma tenha por direito próprio; vi) Cópia ou reprodução autenticada de todas as notificações e comunicações emitidas, enviadas e/ou recebidas no âmbito dos procedimentos em que o Requerente é visado.” Mais requer que, caso a entidade requerida não tenha em sua posse documentos de alguma ou algumas das categorias referidas nas alíneas i) a vi) do ponto anterior, emita uma certidão negativa quanto a tais documentos especificando que documentos não existem ou não tenha conhecimento.
E, embora o requeira ao abrigo do artigo 84.º do CPA, o certo é que pretende, não apenas “certidões sobre dados elementares do procedimento (do seu início, do seu objecto, do seu estado, da sua decisão)”, mas – como o próprio o refere expressamente no seu requerimento -, certidão ou de cópia autenticada da integralidade dos documentos que compõem o procedimento administrativo (de expropriação) das parcelas n.ºs 6 e 7 referentes à Obra de Construção do Arranjo Urbanístico do Centro de São Roque.
Ora, como vimos, a emissão das certidões só é independente de despacho se respeitar aos dados elementares do procedimento (do seu início, do seu objecto, do seu estado, da sua decisão), não sendo esse, manifestamente, o caso, precisamente porque o requerente pretende certidão de todos os documentos que integram o procedimento administrativo de expropriação. Por esta razão, não estamos perante o pedido de emissão de certidões independentes de despacho, pelo que não é aplicável ao caso o disposto no artigo 84.º do CPA, designadamente a norma do seu n.º 3, que prevê um prazo mais curto (de três dias) para a emissão de certidão.
À mesma conclusão - no sentido da inaplicabilidade ao caso do disposto no artigo 84.º do CPA – chegou a sentença recorrida. No entanto, com um fundamento que não se mostra acertado. Efectivamente, ali se entendeu que o artigo 84.º do CPA não seria aplicável ao caso por os documentos requeridos respeitarem a um procedimento de expropriação por utilidade pública, de iniciativa oficiosa. No entanto, não decorre da norma em análise que a mesma só se aplique a procedimentos de iniciativa privada, pelo que mal andou o Tribunal a quo ao assim entender.
Deste modo, ainda que com diferente fundamentação, é de confirmar a não aplicação ao caso da norma do artigo 84.º do CPA, determinada na sentença recorrida, sem que isso ponha em causa – como alega o recorrente - os direitos de informação e acesso a documentos administrativos, previstos nos artigos 268.º, n.º 2, da CRP, e 61.º e ss. do CPA), e os princípios da legalidade, da boa administração, da igualdade, da proporcionalidade, da imparcialidade, da boa-fé, da colaboração com os particulares e da participação, previstos nos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, do CPA. Na verdade, a não aplicação ao caso do artigo 84.º não priva o recorrente de obter as certidões que pretende; não podem é as mesmas ser emitidas sem despacho prévio e a sua emissão está sujeita ao prazo de dez dias previsto no artigo 82.º, n.º 3, do CPA.
Termos em que se impõe julgar improcedentes os fundamentos de recurso invocados.
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Vencido, é o recorrente responsável pelo pagamento das custas, nos termos dos artigos 527.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.


V – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes da Subsecção comum da Secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso interposto e, ainda que com diferente fundamentação, confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 09 de Maio de 2024

Joana Costa e Nora (Relatora)
Pedro Nuno Figueiredo
Lina Costa