Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12527/15
Secção: CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:11/12/2015
Relator:NUNO COUTINHO
Descritores:AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE PORTUGUESA
CONDENAÇÃO PENAL
REABILITAÇÃO
Sumário:
I - O requisito previsto na al. d) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei da Nacionalidade, relativo à aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização, deve ser conjugado com o instituto da reabilitação legal ou de direito.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – Relatório

António…………………………………. interpôs no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra acção administrativa especial, visando despacho proferido por Conservador Auxiliar da Conservatória dos Registos Centrais, em 15 de Março de 2013, nos termos do qual foi indeferido pedido de concessão de nacionalidade portuguesa por naturalização, formulado ao abrigo do artigo 6º nº 1 da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro.

Por decisão datada de 18 de Setembro de 2014, o referido T.A.F. julgou improcedente a pretensão formulada, decisão da qual interpôs recurso o A., formulando as seguintes conclusões:

1.ª No crime de receptação, previsto e punido pelo artigo 231.º do Código Penal, existe uma prévia escolha, pelo legislador, entre a possibilidade de o mesmo ser punido com uma pena de prisão ou, em alternativa, com uma pena de multa, cabendo ao juiz optar, por uma ou por outra, nos termos previstos no artigo 70º do Código Penal, o que não se confunde com a posterior tarefa de determinação da medida concreta da pena, ao abrigo do disposto no artigo 71º do mesmo diploma legal ;
2.ª Olhando para a determinação concreta da pena, mormente para as circunstâncias que depuseram a favor do arguido, nomeadamente o facto de não ter antecedentes criminais, de ser de muito humilde condição económica e social, e as suas habilitações literárias (7º ano de escolaridade), tendo sido condenado numa pena de multa inferior ao limite máximo constante do artigo 231º, nº 2, do Código Penal, é mais seguro e razoável admitir que foi neste crime que foi condenado;
3.ª Além disso, ponderando a natureza do crime, os fins que o determinaram, a sua repercussão social, o tempo decorrido após a condenação sem ter praticado qualquer facto ilícito, e a reabilitação do requerente é de admitir, com segurança, que readquiriu a idoneidade necessária para lhe ser concedida a nacionalidade;
4.ª Em tais circunstâncias, a decisão de manter o indeferimento da naturalização do requerente choca com a concepção moderna do Direito Penal, que não aceita a incorrigibilidade dos delinquentes, bem como com a ressocialização (reeducação, readaptação e integração social) que prevalece sobre os fins expiatórios das penas, e choca ainda com a intenção do legislador subjacente às alterações introduzidas na LN, pela Lei Orgânica nº 2/2006, no sentido de facilitar a integração de estrangeiros imigrados cm Portugal.
5ª Tendo o requerente sido condenado, com trânsito em julgado, por um crime de receptação, punível com pena de multa nos termos do artigo 23lº, nº 1, do Código Penal, e a medida concreta dessa pena sido fixada em 100 dias de multa, não podia o Recorrido ter indeferido a pretensão do Autor, com fundamento em que se não verificava o requisito exigido pelo artigo 6º nº 1, d) da Lei de Nacionalidade, cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 5 de Fevereiro de 2013, rec. 76112;
6.ª Pelo exposto, salvo o devido respeito, a decisão impugnada está inquinada pelo vício de erro de julgamento por errada apreciação, interpretação e valoração da matéria de facto dada como provada, com a consequente violação do artigo 6º, nº 1, d ) da Lei nº 37/81 , de 3 de Outubro, na redacção introduzida pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril.

Contra alegou o recorrido, pugnando pela improcedência do recurso, tendo formulado as seguintes conclusões:

“1. Tendo o Autor sido condenado por sentença, transitada em julgado, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo superior a três anos, fica necessariamente afastada a possibilidade de lhe ser concedida a nacionalidade portuguesa, por naturalização.
2. O douto acórdão recorrido fez a interpretação mais correcta e respeitadora dos princípios do Direito da Nacionalidade, mormente da alínea d) do nº 1 do artº 6º da LN, o qual pela sua clareza e rigor conceptual, é juridicamente inatacável, não padecendo as suas conclusões de qualquer vício, designadamente de inconstitucionalidade.
3. A Conservatória dos Registos Centrais, ao indeferir o pedido de naturalização requerido pelo Autor, interpretou e aplicou correctamente a alínea d) do nº 1 do artº 6º da Lei da Nacionalidade, conforme ensinam a melhor doutrina e jurisprudência, não se verificando qualquer vício de violação de lei que afecte a validade da decisão que proferiu e que o acórdão impugnado acolheu.”

O M.P. emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

II – No Acórdão recorrido foram dados como provados os seguintes factos:
A)
1) O Autor [A], ANTÓNIO……………………………., nascido em Luanda, Angola, em 05/08/1973, de nacionalidade cabo-verdiana, reside na Rua …………………….., nº ….., Amadora – doc fls 9/ss do PA anexo.
2) O Autor reside em Portugal desde 14/11/2003 – certidão fls 15 a 18, e fls 64 do PA.
3) Em 30/06/2010, o Autor requereu a concessão da nacionalidade portuguesa por naturalização, nos termos do artigo 6-1, da Lei 37/81, de 03/10, com as alterações dadas pela Lei Orgânica 2/2006, de 17/04 [Lei da Nacionalidade (LN)].
4) Em Outubro de 1996, o Autor foi acusado pelo MP pela prática dum crime de receptação,
p. e p. pelo artigo 231-1, do CP, no Processo 35/96.6 SWLSB –fls fls 45/ss 68/ss.
5) Em 18/11/1997, pelo acórdão de fls 37/ss, transitado em julgado, no referido Processo 35/96.6 SWLSB, o Tribunal criminal de Lisboa (10ª Vara) condenou o arguido, ora Autor, na pena de «100 (cem) dias de multa à taxa diária de Esc 1000$00 na pena subsidiária de prisão de 66 (sessenta e seis) dias», «Pela prática de um crime de receptação».
6) Do Acórdão acabado de referir consta, quanto ao Autor, o seguinte que ora se destaca:
«Acordam os juízes que constituem o Tribunal (…)
I. o Ministério Público acusa os arguidos: (…) IX. ANTÓNIO………………………….: (a) um crime de receptação p. e p. pelo artigo 231º, nº 1 do C. Penal; nos termos da acusação de fls 901 a 914 que aqui se reproduz.
O arguido António…………………. defendeu-se nos termos da sua contestação escrita junta a fls 1129, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. Os restantes arguidos não apresentaram contestação. (…) o arguido António …………… sabia que o objecto que adquiriu ao Paulo ………… era proveniente de acto ilícito perpetrado contra o património de terceiros.
Visava obter um beneficio pecuniário correspondente à diferença entre o real valor do objecto e o preço pelo qual o adquiriu.
Todos os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente.
Sabiam que as suas condutas as suas condutas eram proibidas pela lei penal.
(…) Relativamente ao arguido António …………………… :
No exercício da sua actividade profissional aufere 5.500$00 por dia.
Vive com sua irmã e cunhada. Tem um filho menor. Como habilitações literárias tem o 7 º ano de escolaridade. É de muito humilde condição económica e social. Não tem antecedentes criminais.
Finalmente, e relativamente ao arguido António ……………… a matéria de facto assente como provada integra os requisitos objectivos e subjectivos de um crime de receptação. (…)
A favor dos arguidos (…) e António ………………… milita a ausência de antecedentes criminais e os seus estatutos económico-sociais muito humildes.
(…) DECISÃO. Por todo o exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal Colectivo em julgar parcialmente provada a acusação e em consequência: (…) Condenar o arguido António …………………. 1. – Pela prática de um crime de receptação na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de Esc 1.000$00 na pena subsidiária de prisão de 56 (sessenta e seis) dias. (…)» - Certidão judicial de fls 37/ss do PA.
7) Em 14/05/2009, o Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, no Processo Gracioso de Reabilitação Judicial nº 6899/08.5TXLSB, considerando o ora Autor readaptado, proferiu a seguinte «3. Decisão. Pelo exposto, nos termos do artº 16º nºs 1 e 2 da Lei 57/98, de 18 de Agosto, decido deferir o pedido de reabilitação judicial apresentado por António …………….. e, consequentemente, determinar o cancelamento no registo criminal do mesmo das condenações sofridas nos P. 35/96.6 SWLSB e 11/06.2 ZFFAR».
8) Em 15/03/2013, o Conservador-Auxiliar da CRC, por subdelegação, proferiu a decisão de indeferimento de fls 19, fls 115 do PA, «Ao abrigo do disposto no nº 11 do artº 27º do Regulamento da Nacionalidade, aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro e em face dos documentos aduzidos no parecer, indefiro o pedido de naturalização de António ……………………….. , com fundamento na falta de verificação do requisito previsto na alínea d) do nº 1 do artigo 6º da Lei da Nacionalidade. (...)» [acto impugnado]; cujo referido parecer consta de fls 15/ss e fls 111/ss do PA.
9) Em 20/03/2013 e 27/03/2013, o Réu, pela CRC, dirigiu ao Mandatário e ao Autor os ofícios de fls 116/ss do PA, pelos quais levou ao conhecimento doa mesmo a decisão de indeferimento acabada de referir.
10) O A deu entrada à presente acção no TAC de Lisboa em 11/06/2013 –fls 2 e 3.

III – Fundamentação jurídica

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do mesmo, importa analisar o ataque dirigido ao Acórdão recorrido e que se circunscreve a saber se o mesmo violou o artigo 6º, nº 1 alínea d) da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro, com a redacção introduzida pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril e, noutro plano, analisar as consequências da reabilitação judicial decidida pelo Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, em 14 de Maio de 2009.

O artigo 6º nº 1 da Lei da Nacionalidade tinha à data da prática do acto impugnado, a seguinte redacção:
“Artigo 6º
Requisitos
1 - O Governo concede a nacionalidade portuguesa, por naturalização, aos estrangeiros que satisfaçam cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Serem maiores ou emancipados à face da lei portuguesa;
b) Residirem legalmente no território português há pelo menos seis anos;
c) Conhecerem suficientemente a língua portuguesa;
d) Não terem sido condenados, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa

Por sua vez, o artigo 19º do Regulamento da Nacionalidade – aprovado pelo D.L. nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro - tem a seguinte redacção:
“Artigo 19.º
Naturalização de estrangeiros residentes no território português
1 - O Governo concede a nacionalidade portuguesa, por naturalização, aos estrangeiros quando satisfaçam os seguintes requisitos:
a) Sejam maiores ou emancipados à face da lei portuguesa;
b) Residam legalmente no território português há pelo menos seis anos;
c) Conheçam suficientemente a língua portuguesa, nos termos do disposto no artigo 25.º;
d) Não tenham sido condenados, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, segundo a lei portuguesa”

Prevêem os nºs 1 e 2 do artigo 231º do Código Penal:
“Artigo 231º
Receptação
1. Quem, com intenção de obter, para si ou para outra pessoa, vantagem patrimonial, dissimular coisa que foi obtida por outrem mediante facto ilícito típico contra o património, a receber em penhor, a adquirir por qualquer título, a detiver, conservar, transmitir ou contribuir para a transmitir, ou de qualquer forma assegurar, para si ou para outra pessoa, a sua posse, é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias.
2 – Quem, sem previamente se ter assegurado da sua legítima proveniência, adquirir ou receber a qualquer título, coisa que, pela sua qualidade ou pela condição de quem lhe oferece, ou pelo montante do preço proposto, faz razoavelmente suspeitar que provém de facto ilícito típico contra o património é punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 120 dias.”

Como bem é salientado no Acórdão recorrido, o recorrente foi condenado pelo crime de receptação previsto e punido pelo nº 1 do artigo 231º do Código Penal, e não, como sustentou o recorrente, no nº 2 do aludido preceito, conforme se pode concluir do Acórdão proferido pela 10ª Vara do Tribunal Criminal de Lisboa, no âmbito do Proc. 35/96.6 SWLSB do qual consta que “…o arguido António …………… sabia que o objecto que adquiriu ao Paulo …………… era proveniente de acto ilícito perpetrado contra o património de terceiros.
Visava obter um benefício pecuniário correspondente à diferença entre o real valor do objecto e o preço pelo qual o adquiriu.”, crime punível com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias, tendo o recorrente sido condenado na pena de 100 (cem) dias multa à taxa diária de 1.000$00 e na pena subsidiária de 56 dias de prisão.
Constitui entendimento deste Tribunal que o requisito supra transcrito não deixa dúvidas, conforme, aliás, decorre da utilização, em ambos dos preceitos supra transcritos, da palavra “punível”, sendo irrelevante saber qual a concreta pena que o Tribunal aplicou pela prática de crime abstractamente punível com pena de prisão igual ou superior a três anos, segundo a lei portuguesa, pelo que soçobra este primeiro fundamento de ataque ao Acórdão recorrido.

Contudo, questão diferente prende-se com a decisão de reabilitação proferida em 14 de Maio de 2009, no Processo Gracioso de Reabilitação Judicial nº 6899/08.5TXLSB, pelo Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, nos termos da qual foi determinado “…o cancelamento no registo criminal…das condenações sofridas nos P. 35/96.6SWLSB e 11/06.2ZFFAR”

Quanto a esta matéria importa recordar o teor de recente Acórdão proferido pelo S.T.A. em 21 de Maio de 2015 no âmbito do Proc. 0129/15, do qual se transcreve o seguinte passo:
(…)
“2.3.2. Atentemos agora no instituto da reabilitação. Deixando de parte as considerações históricas a seu respeito, pode afirmar-se que actualmente ocorre uma assimilação desta figura ao simples cancelamento do registo criminal. Dito de outro modo, “Do ponto de vista dos resultados práticos, equivale a reabilitação ao cancelamento do registo criminal” (vide A.M. Almeida Costa, O registo criminal. História. Direito comparado. Análise político-criminal do instituto, Coimbra, 1985, p. 217. Ver ainda J. Figueiredo Dias, Direito Penal Português. As consequências jurídicas do crime, Lisboa, 1993, p. 653).
A reabilitação legal ou de direito, contrariamente à reabilitação judicial e à administrativa (em que há uma indagação prévia sobre a reintegração social), opera de forma automática, impõe-se, bastando-se com o simples decurso do tempo e a ausência de novas condenações sobre o indivíduo (A.M. Almeida Costa, O registo criminal. História. Direito comparado. Análise político-criminal do instituto, Coimbra, 1985, pp. 217-8, e J. Figueiredo Dias, Direito Penal Português. As consequências jurídicas do crime, Lisboa, 1993, p. 655). Ela assenta na presunção de que o indivíduo se encontra reintegrado socialmente (cfr. A.M. Almeida Costa, O registo criminal. História. Direito comparado. Análise político-criminal do instituto, Coimbra, 1985, p. 218, nota 393).
A reabilitação é um direito, um verdadeiro direito do condenado já ressocializado, susceptível de ser feito valer em juízo (vide A.M. Almeida Costa, O registo criminal. História. Direito comparado. Análise político-criminal do instituto, Coimbra, 1985, pp. 214 e 223, e J. Figueiredo Dias, Direito Penal Português. As consequências jurídicas do crime, Lisboa, 1993, p. 655). Com a reabilitação cessa o estado de perigosidade e indignidade do réu ex-condenado e deixam de se justificar as considerações de necessidade de defesa social (A.M. Almeida Costa, O registo criminal. História. Direito comparado. Análise político-criminal do instituto, Coimbra, 1985, pp. 213-4).
No tocante especificamente ao cancelamento do registo criminal, o mesmo pode consistir na eliminação total ou parcial das inscrições contidas nos cadastros ou, pelo menos, na sua não comunicação às entidades que, de acordo com a lei, normalmente podem aceder a essas inscrições (A.M. Almeida Costa, O registo criminal. História. Direito comparado. Análise político-criminal do instituto, Coimbra, 1985, p. 204).
Como decorre do que atrás foi exposto relativamente aos preceitos da LIC, pode determinar-se o cancelamento para certos fins ou pessoas. Pode, por exemplo, vedar-se o acesso ao registo para fins não judiciais.
Por último, diga-se que as decisões judiciais canceladas ou cuja vigência cessou devem ser consideradas extintas, não se lhes devendo ligar quaisquer efeitos (cfr. A.M. Almeida Costa, O registo criminal. História. Direito comparado. Análise político-criminal do instituto, Coimbra, 1985, p. 378 – embora reportando-se especificamente à sua utilização como meios de prova para efeitos processuais). Isso mesmo é assinalado no parecer da Provedoria de Justiça, onde é sugerido que nada justifica um tratamento distinto em termos de utilização da informação cancelada para fins processuais e para fins de aquisição da nacionalidade (Processo R-5580/08 (A5), in www.provedor-jus.pt).

2.3.3. De forma igualmente breve, deve referir-se que a partir de 2006 a LN aligeirou as exigências ou requisitos de aquisição da nacionalidade por naturalização. Para o que agora releva, desapareceram os requisitos da idoneidade moral e civil e da suficiência dos meios de subsistência. Porventura, o legislador terá percebido que, se por um lado, o Estado tem o poder de determinar quem são os seus nacionais, por outro, as políticas da nacionalidade não devem ser discriminatórias.

2.3.4. Em síntese, tudo tem que ver com o modo como deve ser interpretada a alínea d) do n.º 1 do artigo 6.º da LN. Ora, uma adequada interpretação deste preceito deverá ter em conta não apenas o elemento textual, como de igual forma o racional e o sistemático. O resultado interpretativo obtido – vale por dizer, a aceitação da relevância da reabilitação legal ou de direito para efeitos de aquisição da nacionalidade –, por sua vez, é o que corresponde à solução mais rights friendly, na medida em que é o que confere mais plenitude ao direito à aquisição da nacionalidade e ao direito à reabilitação, bem assim como ao princípio da máxima efectividade.”

O Tribunal acolhe, na íntegra, os argumentos vertidos no Acórdão supra parcialmente transcrito, pelo que, tendo presente a decisão proferida pelo Tribunal de Execução de Penas de Lisboa em 14 de Maio de 2009, que deferiu o pedido de reabilitação judicial apresentado pelo ora recorrente, e atendendo à circunstância de a condenação deste pela prática do crime previsto e punido no nº 1 do artigo 231º do Código Penal ser o único fundamento para indeferir o pedido de concessão de nacionalidade português por naturalização formulado, deve não só proceder o presente recurso, como também ser o recorrido ser condenado a deferir o aludido pedido.

IV) Decisão

Assim, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul, em conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida condenando o recorrido a deferir a pretensão de concessão de nacionalidade portuguesa, por naturalização, formulada pelo recorrente.
Custas pelo recorrido, em ambas as instâncias.
Lisboa, 12 de Novembro de 2015

Nuno Coutinho

Carlos Araújo

Paulo Pereira Gouveia