Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:100/09.1 BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:11/29/2022
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:CONTRATO DE EMPREITADA
RESPONSABILIDADE CIVIL
DANOS EM VIA MUNICIPAL
ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Sumário:I – À instância recursiva apenas caberá sindicar e modificar o decidido quanto à factualidade dada como provada e não provada, caso verifique a ocorrência de erro de apreciação, suscetível de determinar a viciação da decisão final, mormente enquanto erro de julgamento, patente, ostensivo palmar ou manifesto.
II - Em concreto, estando por demonstrar que os veículos pesados do consórcio tenham infringido qualquer regra, nomeadamente estradal, ao circular na controvertida via municipal e atendendo a que a obrigação de indemnizar que o Autor imputa ao Consórcio não encontra fundamento no instituto da responsabilidade civil extracontratual, afastada que está a sua culpa, importaria aferir se a obrigação de indemnizar se fundamentaria em facto danoso gerador de responsabilidade objetiva.
III - Se é o próprio Município que reconhece que tem de realizar anualmente reparações na controvertida via, tal significa que a mesma já se encontrava há muito em mau estado, pois que uma via devidamente pavimentada não carece de permanente e regular reparação.
Por outro lado, se se reconhece que os veículos do consórcio pelas suas sucessivas passagens no local contribuíram para o agravamento do estado do piso da via, não deixa de ser verdade que a via sempre esteve aberta a todos os veículos, pelo que não se mostra possível imputar a responsabilidade pelo agravamento do estado da via exclusivamente ao consórcio.
IV – Acresce que, tendo ficado por demonstrar que os veículos pesados do consórcio tivessem peso superior ao permitido legalmente ou por via da sinalética entretanto colocada, não é possível imputar-lhes, pelo menos em exclusivo, a responsabilidade pela deterioração da via.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
O Município de Ferreira do Alentejo, devidamente identificado nos autos, intentou ação administrativa comum contra a Massa Insolvente de M… L.T.O., Construções, S.A., a T… – Sociedade de Empreitadas, S.A., Ministério da Agricultura e Pescas – MAP e o Instituto de Desenvolvimento Rural e Hidráulica IDRH, tendente à condenação dos Réus a pagarem-lhe, solidariamente, a quantia de €35.950, acrescida de juros à taxa legal, desde a citação.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja proferiu sentença em 19 de dezembro de 2018, através da qual decidiu julgar a ação totalmente procedente, condenando o primeiro e segundo Réus a pagarem ao Autor a quantia de €35.950, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efetivo integral pagamento.
Inconformada com a sentença, veio a T…-Sociedade de Empreitadas, S.A. interpor recurso jurisdicional da referida decisão, em 7 de fevereiro de 2019, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, concluindo:
“A. A douta sentença apelada violou os artigos 483.º, 499.º, 562.º e 563.º do Código Civil;
B. Os factos dados como provados nas alíneas B), C), F), O) e P) foram incorretamente julgados;
C. Não ficou provado que a Estrada Municipal 1044 tenha sido reparada no verão de 2007, nem através de prova testemunhal, nem documental;
D.O facto provado B) deve ter a seguinte redação: “B) Anteriormente ao início da passagem dos camiões das RR, a EM1044 já era usada para o trânsito normal, designadamente para a circulação de veículos pesados agrícolas, com restrição atenta a (exígua) dimensão do caminho em causa”;
E. Ficou demonstrado que a execução de trabalhos de aterro (que implicava o uso de camiões) apenas começou em março de 2008, ou seja, na mesma data em que foi efetuado o Relatório por parte do Município, pelo que quando começaram a passar camiões já a estrada estava naquelas condições;
F. O facto provado C) deve ter a seguinte redação: “C) Em 2007-10-01 foi realizada a consignação da empreitada acima melhor identificada, tendo-se iniciado os trabalhos, propriamente ditos, em 2007-10-15, tendo os trabalhos de execução do aterro começado em março de 2008.”;
G. Não ficou provado que os danos na Estrada Municipal 1044 tenham sido provocados pela contínua passagem de camiões ao serviço dos 1.º e 2.º RR, tendo ficado demonstrado que a referida Estrada já apresentava danos antes do início da execução daqueles trabalhos, uma vez que era uma estrada muito antiga, com problemas estruturais, sendo necessário reparar todos os anos;
H. O facto dado como provado na alínea F) deve ter a seguinte redação: “F) Em março de 2008 o A. detetou que, o troço da EM1044, entre Olhas e a Aldeia do Rouquenho, apresentava destruição do pavimento (fendas, com gravilha, pedras e terra à superfície)”;
I. Não foi feita qualquer prova quanto à extensão dos danos;
J. O facto dado como provado na alínea O) deve ser dado como NÃO PROVADO;
K. Foi feito apenas um cálculo teórico de quanto valeria reparar aquela estrada municipal, não tendo ficado provado que o Autor tenha despendido aquele montante nas reparações;
L. O facto dado como provado na alínea P) deve ser dado como NÃO PROVADO;
M. Deve ser aditado à matéria de facto dado como provada o seguinte: “T) O Consórcio Empreiteiro adotou uma postura preventiva, de modo a evitar danos na Estrada Municipal 1044 desde o início da Empreitada.”;
N. Foi demonstrado que o Consórcio Empreiteiro adotou uma postura preventiva e que os camiões se fizeram sempre circular sem a carga completa, nunca tendo ultrapassado os limites legais;
O. Ficou provado que o sinal vertical de proibição de circulação de veículos com carga superior a 15 toneladas só foi colocado depois do início dos trabalhos, não tendo o Autor provado que qualquer camião tenha lá passado com um peso superior a esse;
P. Não ficou provado o nexo de causalidade entre a passagem dos camiões do consórcio e os danos na Estrada Municipal 1044;
Q. A obrigação de indemnizar restringe-se aos danos resultantes da violação;
R. Não estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual pelo risco previstos no artigo no artigo 499.º do Código Civil;
S. Não foi provado qualquer facto ilícito por parte da Apelante T…, nem os danos ficaram devidamente comprovados na sua extensão;
T. Deve ser revogada a sentença e substituída por outra que declare a ação totalmente improcedente e absolva a Apelante T… do pedido, como é de LEI e de JUSTIÇA!”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 8 de fevereiro de 2019.
O aqui Recorrido, Município de Ferreira do Alentejo, veio apresentar contra-alegações de Recurso em 14 de março de 2019, aí concluindo:
“A. A recorrente considera não merecer acolhimento a sentença que julgou a presente acção totalmente procedente e a condenou (2.ª Ré) tal como o 1º Réu a pagarem ao aqui apelado a quantia de €35.950, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
B. Para tanto, a recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto e, no pressuposto do sucesso dessa impugnação, a matéria de Direito, para concluir que a decisão do Tribunal a quo deve ser absolutória.
C. Para tanto, afirma a apelante que o Tribunal a quo fez uma incorreta apreciação da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, bem como uma errada aplicação do Direito aos factos em crise.
D. Pretende a recorrente que os factos B), C), F), O) e P) da matéria dada como não provada, sejam considerados dados como provados e, por isso, ser a apelante absolvida do pedido.
E. Mais pretende a recorrente que seja aditado o facto a designar pela letra T) à matéria de facto.
F. A recorrente suporta aquelas suas conclusões no facto de as alterações pretendidas na decisão em crise se deverem dar (…) “atendendo ao conjunto de toda a prova testemunhal, como da prova documental carreada para os autos com a contestação”.
G. E mais: “considera a Apelante que existem factos com interesse para a boa decisão da causa que deveriam ter sido considerados provados e assentes e não o foram”.
“6. Bem como existem factos que foram considerados assentes e provados que não deveriam ter sido, bem como houve factos considerados provados com incorreções, imprecisões e deficiências que prejudicam a boa apreciação e decisão da ação e consequentemente a boa realização da JUSTIÇA”.
H. Crê o aqui apelado que a decisão relativa à matéria de facto foi acertadamente tomada e fundamentada na sua globalidade e não há lugar a qualquer censura à decisão em crise.
I. O Tribunal a quo em síntese fundamenta a decisão da matéria de facto dada como provada, do seguinte modo:
“No que tange ao escopo dos factos, cumpre salientar que os depoimentos foram, na sua essência, consentâneos uns com os outros e com a demais prova documental apresentada. Acresce que todas as testemunhas demonstraram a sua razão de ciência tendo sido igualmente valiosos para a determinação dos factos provados e não provados o confronto entre os diferentes depoimentos (a par da segurança no depoimento, das hesitações, da convicção, dos silêncios e da linguagem corporal adotada por cada uma das testemunhas), bem como a existência de imprecisões e de pequenas contradições entre os testemunhos (v.g. quanto à data e às exatas condições do caminho municipal antes da execução da obra, etc) e entre estes e a prova documental, o que não foi ignorado, mas aceite e valorado, atenta a produção de prova apreciada no seu conjunto e o hiato temporal ocorrido desde a data dos factos em discussão nos presentes autos.
Na verdade, da apreciação global da prova produzida ficou o tribunal com a convicção dos factos dados como assentes e como não provados, em toda a sua extensão, não ignorando as características da própria prova testemunhal quando confrontada com a documental e ainda atento o hiato temporal entre a ocorrência dos factos e o momento da produção de prova – designadamente a testemunhal”.
J. Observa-se que a discordância da apelante genericamente se limita ao sentido da valoração da prova pela Mm.ª Juiz a quo.
K. Contudo, não pode substituir-se a convicção de quem tem de julgar pela convicção da Ré apelante, quando o Tribunal a quo descreve e fundamenta o seu iter formativo da sua convicção.
L. A apelante apenas sustenta o seu recurso a meios de prova sujeitos à livre apreciação (in casu, documentos particulares e testemunhas).
M. Sucede que o Tribunal a quo realizou o julgamento da matéria de facto e na sequência dos princípios da imediação, da oralidade e da concentração,
N. O tribunal apreciou livremente as provas, segundo a sua prudente convicção, art. 607º, nº 5, do CPC (princípio da livre apreciação da prova).
O. Após a produção da prova o julgador tirou as suas conclusões, em conformidade com as suas impressões recém-colhidas e com a convicção que através delas se foi gerando no seu espírito, de acordo com as regras da ciência, do raciocínio, e das máximas da experiência, que forem aplicáveis.
P. Como resulta patente da análise da motivação de facto supra transcrita, o tribunal a quo recorreu às regras de experiência e decidiu segundo uma apreciação crítica e selectiva de toda a prova produzida, assente em operações intelectuais válidas e justificadas e com respeito pelas normas processuais atinentes à prova e recorrendo ao uso de raciocínios lógicos e às regras da experiência.
Q. Apenas sucede que valorou a prova em sentido dissonante da opinião do recorrente.
R. Entende a Apelante que não devia ter ficado provado a parte final do inscrito no ponto B) da matéria de facto e, portanto, que a Estrada Municipal 1044 tenha sido reparada no verão de 2007.
S. A prova produzida não é de molde a permitir essa alteração.
T. A testemunha Á,,,, no trecho indicado pela Apelante nas suas alegações afirma de modo seguro e sem hesitações que no início do Outono, final de Verão a estrada deveria estar em condições normais de circulação (veja-se, melhor, ouça-se, a gravação áudio da audiência dos 8m20s a 8m29s).
U. A mesma testemunha afirmou que passou lá, depois da reparação.
V. Afirma também a recorrente que nem as testemunhas confirmaram a realização daquelas reparações e que isso teria que ser provado por documento.
W. Ora, esse facto não é necessariamente, nem obrigatoriamente provado de forma documental e, por outro lado, e a prova testemunhal é de molde a que o mesmo possa ser dado como provado.
X. Veja-se que a testemunha Á… é clara e directa a responder à questão de quando foram feitas as reparações na estrada:
Mandatária T… (30m49s a 30m53s):
Tem a certeza que no verão de 2007 foi feita a reparação?
Testemunha Á… (30m53s a 31m28s):
Sim. Normalmente é sempre todos os anos.
Y. Assim, não pode proceder o pedido pela apelante no sentido deste ponto de facto ser alterado.
Z. Em seguida, pretende a recorrente que se altere o ponto C) da matéria dada como provada, por forma a aditar-lhe o facto de os trabalhos de execução do aterro terem começado em março de 2008.
AA. Para tanto funda-se no depoimento das testemunhas H… e P….
BB. Ora, o depoimento da testemunha H… é vago quanto ao momento em que se verificaram os trabalhos de execução do aterro, pois apenas indica de modo inseguro e incerto que terá começado o aterro em março de 2008.
CC. Sucede que a testemunha H… insere no seu depoimento um elemento de insegurança e total incerteza, ao afirmar que salvo o erro… eu acho que o aterro da tubagem teve início em março (2h06m56s a 2h07m17s da gravação.
DD. Quanto ao depoimento da testemunha P… verifica-se que a recorrente não cumpre o ónus constante da alínea b) do n.º 1 do art. 640.º CPC, uma vez que não indica a passagem concreta, o trecho que infirma a decisão de facto tomada pelo julgador, pelo que nesta parte, não poderá ser usado tal depoimento para o fim pretendido pela apelante.
EE. Face a isso não se pode alterar o facto dado como provado.
FF.Quanto aos pontos F) e O) da matéria de facto dada como provada, entende a Apelante que não devia ter ficado provado que os danos na Estrada Municipal 1044 tenham sido provocados pela contínua passagem de camiões ao serviço dos 1.º e 2.º RR.
GG. Alega a apelante que o depoimento de Eng.º Á… implica conclusão diferente daquela a que chegou o Tribunal a quo.
HH. Mas assim não pode ser, pois essa testemunha afirmou ao Tribunal que passaria todos os anos naquela estrada pois a mesma integra o circuito de reparações do município.
II. Depois de ter sido confrontado com as fotografias juntas aos autos, designadamente como documentos como documentos 3 a 5 com a contestação das 1.ª e 2.ª R e 1 a 4 da PI (a partir dos 8m39s da gravação), foi questionada a testemunha sobre se os danos ocorreram antes ou depois do início da obra realizada pela apelante e a testemunha respondeu (11m48s a 13m07s da gravação): Terá ocorrido depois, de acordo com as informações que me foram prestadas. E continua (12m41s a 13m07s):
Mandatário do Autor: - Essa passagem desses veículos o que é que ocasionou? Teve alguma consequência? Não teve?
Testemunha Á…: É aquilo que eu disse ocasiona depois esta questão, abertura de buracos na estrada, danos quer na camada de desgaste, quer na camada resistente da estrada, danos esses que tiveram depois que ser reparados.
JJ. Daqui não resulta qualquer dúvida que a passagem dos camiões da apelante produziram danos na estrada, tal e qual está dado como provado no ponto F) da matéria dada como provada.
KK. Deste modo, não pode alterar-se tal decisão, assim como não se pode alterar o provado no ponto O) da matéria de facto, designadamente quando assenta que os camiões da apelante contribuíram para a destruição do pavimento.
LL. Na verdade, o tema de prova 4), correspondente a este facto, foi dado como provado pelos doc. 1 a doc. 4 juntos com a PI e doc. 3 a doc. 5 juntos com a contestação de fls. 31 a 63, e para além do mais, também pelo testemunho de Á…, que é claro e directo a confirmar a realidade deste facto.
MM. Por seu turno a testemunha J… também não depôs de modo infirmativo ao decidido pelo Tribunal.
NN. Diz ainda a apelante que já antes do início da execução da Empreitada a Estrada Municipal 1044 se encontrava em mau estado.
OO. Para tanto socorre-se, de novo, da prova testemunhal. Mas o sucesso dessa invocação deve ser nulo também, pois a testemunha que o refere não o faz de modo afirmativo e indubitável.
PP. Diz a testemunha H… (1h35m43s a 1h35m59s): - A estrada na altura apresentava alguns sinais de degradação, muito pouco, não lhe posso precisar neste momento, mas ela mostrava uma fraca conservação.
QQ. Ora, a resposta do depoente não é de molde a afectar a decisão do Tribunal a quo.
RR. Diz o depoente que a estrada apresentava alguns sinais de degradação, muito pouco…
SS. Ora, todo este depoimento é marcado pela insegurança e incerteza. Daí que este depoimento invocado pelo depoente não é passível de afastar a decisão em crise, pois o juiz a quo, com base na imediação da prova decidiu segundo a sua convicção, sem beliscar qualquer dos critérios de apreciação da prova.
TT.Quanto à causa produtora daqueles danos, verifica-se que se deu – e bem – como provado que a mesma foi a passagem dos camiões dos RR.
UU. Isso é confirmado pelo Eng.º Á…, pois ao lhe ser perguntado directamente como sabe que a causa dos danos foi a passagem dos camiões da apelante, o mesmo responde (13m10s a 14m40s) que: - Sabe por que foi… foram notificadas essas passagens pela fiscalização municipal e foi feita uma informação nesse sentido… e aliás, em consequência dessa informação foi notificado o dono de obra, eu recordo-me disso, para que se procedessem às reparações e o próprio dono da obra assumiu que já tinha notificado o empreiteiro ou os empreiteiros, neste caso o consórcio, e comunicou isso à Câmara Municipal que já tinha notificado o empreiteiro para proceder às reparações. Portanto, temos o dono da obra a assumir a responsabilidade pelos danos causados.
VV. Para além disso, os Doc. 4 e 5 da contestação do ministério da agricultura e pescas, também confirma o facto em causa.
WW. Ainda quanto ao ponto O) da matéria dada como provada, pretende a recorrente que não se dê como provado o mesmo.
XX. Como vimos a apelante não demonstra que se deva infirmar o ponto F), então os factos constantes do ponto O) da matéria são um corolário daqueles e, por isso, deve manter-se a decisão impugnada também nesta parte.
YY. Se ficou provado que os danos eram provocados pela contínua passagem de viaturas, ao serviço dos 1.º e 2.º RR., então é decorrência desse facto que: O) O peso dos camiões das RR. (com e sem carga), a sua dimensão e largura e o número de passagens realizadas para execução da obra, contribuíram para a destruição do pavimento, tornando a via intransitável, nas seguintes faixas e áreas da EM1044: (1) …… 530 m2; (2) …… 275 m2; (3) …… 5 m2; (4) …… 85 m2; (5) …… 75 m2; (6) …… 3 m2; (7) …… 275 m2; (8) …… 189 m2; (9) …… 1 m2.
ZZ.Na verdade, isso decorre dos documentos 1 a 4 com a PI e não é infirmado por qualquer outro meio de prova, pelo que não pode a recorrente querer afastar a convicção do juiz, formada directa e imediatamente perante a prova produzida em sede de julgamento.
AAA. Mais se diga, que este ponto de facto leva a concluir que aquelas passagens e circulação de veículos eram concorrentes para a destruição do pavimento, o que não é contrariado pela tese de que antes da acção danos da recorrente a estrada apresentava alguma degradação (mas nunca aquela produzida pela constante passagem de camiões e veículos pesados da recorrente).
BBB. A testemunha Á… referiu claramente que antes do início da obra a estrada tinha um estado de conservação normal (vide Á…(7m49s a 8m56s).
CCC. Destas conclusões é perfeitamente legítimo que o julgador se convença da bondade dos factos que acabou por dar como provados e que a apelante apenas quer ver infirmados por ter uma convicção diferente.
DDD. Para além disso, os documentos n.º 4 e n.º 5 com a contestação do Ministério da Agricultura confirmam e são de molde a dar-se como provados os factos impugnados pela apelante.
EEE. Ainda quer a recorrente fazer crer que os camiões apenas circulavam por um sentido da estrada carregados.
FFF. A estrada em causa é muito curta, no que há largura diz respeito, sendo perfeitamente possível os camiões circularem sem irem totalmente encostados à berma.
GGG. A própria apelante admite ser dado como provado o trecho do ponto B) da matéria de facto assente, onde se deu como provado que a o caminho em causa é de exígua dimensão.
HHH. A testemunha Á…(5m39s a 6m06s), diz que é uma estrada estreita, tem uma faixa de rodagem com uma largura de 4 metros apenas…”
III. A apelante afirma ainda que também não foi feita qualquer prova quanto à extensão dos danos, ou seja, dos factos constantes da parte final do ponto O) da matéria dada como provada.
JJJ. Sucede que não basta a apelante referir genericamente e sem qualquer sustentação contrária que não foi produzida prova sobre este facto.
KKK. Assim, verifica-se que o tema da prova 5 foi decidido de acordo com os documentos 1 a doc. 4 juntos com a PI e com a prova testemunhal, sobretudo testemunho de Á….
LLL. Nesse sentido, terá que se manter inalterada esta decisão sobre a matéria de facto e dar-se como provado os factos constantes nas alíneas F) e O) da matéria de facto por também aqui a apelante não cumprir o ónus de alegação que sobre si impende (art. 640.º, n.º 1, al. b) CPC).
MMM. A Apelante quer também que se dê como não provado que: ““P) A reparação das áreas danificadas, importou num total de €35.950,00: Faixa Área Custo: (1) 530 m2 13.250,00 €; (2) 275 m2 6.875,00 €; (3) 5 m2 125,00 €; (4 ) 85 m2 2.125,00 €; (5) 75 m2 1.875,00 €; (6) 3 m2 75,00 €; (7) 275 m2 6.875,00 €; (8) 189 m2 4.725,00 € e (9) 1 m2 25€”
NNN. E isto porque, diz a apelante, o Tribunal a quo não poderia fundar a sua convicção apenas na prova testemunhal.
OOO. Ora, no direito processual civil e no administrativo não há prova tabelada ou legal e a apelante não apresenta qualquer meio de prova que infirme a prova produzida, termos em que não cumpre o ónus que lhe cabe.
PPP. Dessa forma não pode querer ver-lhe ser deferido o benefício a quem cumpre o encargo.
QQQ. Assim sendo, não pode ser atendida a conclusão da apelante, pois que a quantificação dos danos foi realizada directamente e pessoalmente pela testemunha Á…, como decorre do seu depoimento a partir dos 20m23s até aos 21m30s da gravação e foi atendida pelo douto Tribunal a quo.
RRR. Sucede que a testemunha Á… (16m50s a 16m58s): Verificou pessoalmente a estrada e os seus danos e foi lá medir a área da estrada que estava danificada em vários sítios; assim como explicou claramente o método de cálculo desses valores (24m25s a 24m54s da gravação) e como é que chegou ao valor global dos danos.
SSS. Mais pretende a recorrente que seja aditado um ponto de facto dado como provado, a saber que: “T) O Consórcio Empreiteiro adotou uma postura preventiva, de modo a evitar danos na Estrada Municipal 1044 desde o início da Empreitada.”
TTT. O aqui apelado não pode concordar com a posição da apelante.
UUU. A testemunha Á…, do18m30s a 19m48s da gravação, a propósito dos veículos da apelante, diz o seguinte: - De qualquer facto, um veículo de transporte de terras de obra normalmente tem uma capacidade de caixa de 20 metros cúbicos se a gente considerar que as terras ou inertes tem aproximadamente, uma baridade de à volta de 2 toneladas por metro cúbico, seguramente que a carga que esses camiões transportava variaria entre as 30 e as 40 toneladas se fossem com a caixa cheia…
VVV. Mais afirma que: Agora, também não estou a ver, embora eu não possa afirmar isso, a fazerem transportes de terras com menos de metade da capacidade da caixa só para não ultrapassarem as 15 toneladas.
QQQ. Assim sendo, não pode ser atendida a conclusão da apelante, pois que a quantificação dos danos foi realizada directamente e pessoalmente pela testemunha Á…, como decorre do seu depoimento a partir dos 20m23s até aos 21m30s da gravação e foi atendida pelo douto Tribunal a quo.
RRR. Sucede que a testemunha Á… (16m50s a 16m58s): Verificou pessoalmente a estrada e os seus danos e foi lá medir a área da estrada que estava danificada em vários sítios; assim como explicou claramente o método de cálculo desses valores (24m25s a 24m54s da gravação) e como é que chegou ao valor global dos danos.
SSS. Mais pretende a recorrente que seja aditado um ponto de facto dado como provado, a saber que: “T) O Consórcio Empreiteiro adotou uma postura preventiva, de modo a evitar danos na Estrada Municipal 1044 desde o início da Empreitada.”
TTT. O aqui apelado não pode concordar com a posição da apelante.
UUU. A testemunha Á…, do18m30s a 19m48s da gravação, a propósito dos veículos da apelante, diz o seguinte: - De qualquer facto, um veículo de transporte de terras de obra normalmente tem uma capacidade de caixa de 20 metros cúbicos se a gente considerar que as terras ou inertes tem aproximadamente, uma baridade de à volta de 2 toneladas por metro cúbico, seguramente que a carga que esses camiões transportava variaria entre as 30 e as 40 toneladas se fossem com a caixa cheia…
VVV. Mais afirma que: Agora, também não estou a ver, embora eu não possa afirmar isso, a fazerem transportes de terras com menos de metade da capacidade da caixa só para não ultrapassarem as 15 toneladas.
EEEE. É certo que o caso se enquadra no âmbito do regime da responsabilidade civil extracontratual pelo risco, com base no disposto nos art. 499º e seguintes do Código Civil.
FFFF. Os pressupostos de tal responsabilidade estão preenchidos, como sejam:o facto, comportamento ativo ou omissivo (art. 486.º ex vi art. 499º ambos do CC); o dano, a lesão de ordem patrimonial ou moral, esta quando relevante (art. 503º e art. 508º do CC) e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, segundo a teoria da causalidade adequada (art. 483.º e seguintes do CC).
GGGG. E o Tribunal a quo não violou aquelas normas, nem tão pouco o art. 483º, art. 499º e art. 503º todos do CC.
HHHH. Na presença daqueles pressupostos nasce a obrigação de indemnizar.
IIII. Ela abrange os danos patrimoniais e não patrimoniais, bem como os danos já produzidos, nos termos gerais de direito: cfr. 483º e seguintes ex vi art. 499º todos do CC.
JJJJ. No caso concreto esses danos são os demonstrados nos autos.
KKKK. Da factualidade assente ficou ainda demonstrado que a reparação dos identificados danos importa em €35.950,00.
LLLL. Sendo os requisitos da obrigação de indemnização por responsabilidade civil extracontratual de natureza cumulativa e concluindo-se, como no caso concreto se conclui, pelo preenchimento de todos eles, assiste à A. o direito a ser indemnizada pelos danos reclamados.
MMMM. Termos em que nenhuma censura merece a sentença recorrida nesta parte.
NNNN. A douta sentença recorrida não violou quaisquer dispositivos legais, pelo que cumpriu o disposto nos artigos 483.º, 499.º, 562.º e 563.º todos do Código Civil.
Termos em que deve ser mantida a douta decisão recorrida, improcedendo o Recurso da apelante, e condenando-se as RR. no pedido, assim se fazendo JUSTIÇA!”
O Ministério Público, notificado em 2 de maio de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, que “o Tribunal a quo fez uma incorreta apreciação da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, bem como uma errada aplicação do Direito aos factos.”

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como Provada:
“A) Em 2006-10-25 o Consórcio, constituído pelo 1.º e 2.ºRR, acordou com os 3.º e 4.º RR. os termos do Contrato de Empreitada referente à “CONSTRUÇÃO DO ADUTOR DO APROVEITAMENTO HIDRO-AGRÍCOLA DO ROXO – 2.º TROÇO DO CANAL ADUTOR GERAL” que firmaram: cfr. doc. 1 e doc. 2 juntos com a contestação de fls. 31 a 63;
B) Anteriormente ao início da passagem dos camiões das RR, a EM1044 já era usada para o trânsito normal, designadamente para a circulação de veículos pesados agrícolas, com restrição atenta a (exígua) dimensão do caminho em causa, o que justificou a sua reparação, pela A., nomeadamente no verão de 2007: (tema de prova 1, 2 e 3) cfr. vide doc. 3 a 5 juntos com contestação de fls. 31 a 63 e testemunho de Á...; de J..., de H...e de P...;
C) Em 2007-10-01 foi realizada a consignação da empreitada acima melhor identificada, tendo-se iniciado os trabalhos, propriamente ditos, em 2007-10-15: cfr. doc. 2 junto com a contestação de fls. 64 a 128 e testemunho de Á..., de H...e de P...;
D) De fevereiro a março de 2008, durante a execução dos trabalhos de empreitada (terraplanagem), ocorreram fortes chuvadas: (tema de prova 9) cfr. testemunho de H...e de P...;
E) No decorrer da empreitada o Consórcio Empreiteiro, ora 1º e 2º RR., foi procedendo à manutenção dos caminhos e acessos, tendo até em casos pontuais procedido mesmo à recuperação e regularização de alguns troços que se iam danificando com a circulação do equipamento da obra: vide doc. 2 junto de fls. 64 a 128;
F) Em março de 2008 o A. detetou que, o troço da EM1044, entre Olhas e a Aldeia do Rouquenho, apresentava destruição do pavimento (fendas, com gravilha, pedras e terra à superfície), tendo apurado que as causas dos danos eram provocados pela contínua passagem de viaturas, (Suprimido o segmento seguinte – Artigo 662.º nº 1 CPC) (tema de prova 4) cfr. doc. 1 a doc. 4 juntos com a PI e doc. 3 a doc. 5 juntos com a contestação de fls. 31 a 63, testemunho de Á... e de J..., mas também de H...e de P...;
G) Em 2008-05-26 a DGADR foi informada pelo A. dos estragos que se verificavam no pavimento da EM1044, tendo comunicado ao Consórcio Empreiteiro o teor daquela reclamação: cfr. doc. 3 junto de fls. 64 a 128 e testemunho de P...;
H) Em 2008-06-26 a DGADR comunicou ao A. que tinha oficiado o Consórcio Empreiteiro, informando ainda o A. que a empreitada ainda não se encontrava concluída: cfr. doc. 4 junto de fls. 64 a 128;
I) Em 2008-07-31 já na fase final dos trabalhos da empreitada, a DGADR notificou mais uma vez aquele Consórcio em relação à reparação dos danos de pavimentação na EM1044, dando conhecimento deste facto ao A.: cfr. doc. 4 e doc. 6 juntos de fls. 64 a 128;
J) Posteriormente, aquando da receção provisória, a respetiva Comissão, nomeada pela DGADR procedeu à vistoria dos trabalhos, tendo, então, constatado no local que os caminhos e acessos usados se encontravam regularizados, à exceção da EM1044, que continuava com o pavimento degradado: vide PA;
K) Tendo sido rececionada provisoriamente a empreitada, de acordo com os art.º. 223.º e seguintes do DL n.º 59/99, de 2 de março, a DGADR solicitou ao A. a afixação do respetivo Édito, referente ao Inquérito Administrativo, de acordo com o previsto no art. 224.º do DL n.º 59/99, de 2 de março: vide PA;
L) Durante o período em que decorreu esse Inquérito Administrativo, apenas foi apresentada a reclamação do próprio A., tendo por único objeto os danos ocorridos na EM1044: vide PA;
M) A DGADR, dando cumprimento ao disposto no n.º 2 do art. 225.º do DL n.º 59/99, de 2 de março, deu conhecimento por carta registada com aviso de receção, ao Consórcio e à instituição de crédito, BANCO E…, S.A. (Departamento de Garantias), que garantiu as obrigações em causa para, no prazo de 15 dias, contestarem a reclamação recebida: cfr. doc. 7 a doc. 10 juntos de fls. 64 a 128;
N) E em conformidade com o disposto no n.º 3 do art. 225.º do DL n.º 59/99, de 2 de março, o Consórcio Empreiteiro apresentou a sua Contestação: cfr. doc. 11 junto de fls. 64 a 128;
O) O peso dos camiões das RR. (com e sem carga), a sua dimensão e largura e o número de passagens realizadas para execução da obra, contribuíram para a destruição do pavimento, tornando a via intransitável, nas seguintes faixas e áreas da EM1044: (1) …… 530 m2; (2) …… 275 m2; (3) …… 5 m2; (4) …… 85 m2; (5) …… 75 m2; (6) …… 3 m2; (7) …… 275 m2; (8) …… 189 m2; (9) …… 1 m2: (tema de prova 5) cfr. doc. 1 a doc. 4 juntos com a PI e cfr. prova testemunhal, sobretudo testemunho de Á...;
P) A reparação das áreas danificadas, importou num total de €35.950: Faixa Área Custo: (1) 530 m2 13.250€; (2) 275 m2 6.875€; (3) 5 m2 125€; (4 ) 85 m2 2.125€; (5) 75 m2 1.875€; (6) 3 m2 75€; (7) 275 m2 6.875€; (8) 189 m2 4.725€ e (9) 1 m2 25€: (tema de prova 7) cfr. testemunho de Á... e de J...;
Q) Por vezes, em dias de chuva os RR. faziam os seus camiões passar por um terreno da propriedade do sócio do 1ºRR: (tema de prova 6) cfr. testemunho de H...e de P...;
R) Só no decorrer da execução dos trabalhos é que foi colocado, pelo A., um sinal vertical, em local bem visível, que proibia a circulação de trânsito de veículos, com peso superior a 15 toneladas: (tema de prova 8) cfr. testemunho de Á...; de H...e de P...;
S) A Interveniente celebrou com o 1ºRR, um contrato de seguro do Ramo de Responsabilidade Civil, titulado pela Apólice n.º 54.205.387, com o capital seguro por sinistro de €1.500.000, tendo ficado acordada uma franquia de 10% sobre o valor da indemnização, com um mínimo de €1.000,00 e um máximo de €3.500,00: cfr. doc. 2 junto com a contestação de fls. 31 a 63.”

IV – Do Direito
No que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da Sentença de 1ª Instância:
“(…) Descendo ao caso concreto, resulta dos autos que a EM1044, nos troços melhor identificados nos autos, sofreu degradação pela contínua passagem de camiões dos 1º e 2º RR, camiões com mais de 15T que, durante o período de execução da empreitada de “CONSTRUÇÃO DO ADUTOR DO APROVEITAMENTO HIDRO-AGRÍCOLA DO ROXO – 2.º TROÇO DO CANAL ADUTOR GERAL” por ali reiteradamente passaram: cfr. alínea A) a S) supra.
Verifica-se pois facto, resultante de uma atividade, potencialmente, originador de responsabilidade civil: cfr. art. 483º, art. 499º e art. 503º todos do CC; alínea A) a S) supra.
Destarte, importa aferir agora se se verifica também, no caso, dano.
Novamente, a resposta mostra-se afirmativa: cfr. alínea A) a S) supra.
A obrigação de indemnizar abrange os danos patrimoniais e não patrimoniais, bem como os danos já produzidos, nos termos gerais de direito: cfr. 483º e seguintes ex vi art. 499º todos do CC.
Os danos patrimoniais são ressarcíeis nos termos gerais, decorrendo dos artigos arts. 562°, 564° e 566° do CC que deve seguir-se a chamada teoria da diferença entre aquilo que o lesado perdeu e o que, natural e previsivelmente, não teria perdido se não tivesse ocorrido o evento.
E que danos são esses no caso concreto?
Como decorre dos autos e o probatório elege, aquando da receção provisória empreitada de “CONSTRUÇÃO DO ADUTOR DO APROVEITAMENTO HIDRO-AGRÍCOLA DO ROXO – 2.º TROÇO DO CANAL ADUTOR GERAL” ficou consignado no auto de vistoria que os caminhos e acessos usados se encontravam regularizados, à exceção da EM1044, que continuava com o pavimento degradado (nomeadamente com destruição do betuminoso e segmentos de caminho intransitáveis), resultando ainda da factualidade assente que tais danos se verificavam nas seguintes faixas e áreas da EM1044: (1) …… 530 m2; (2) …… 275 m2; (3) …… 5 m2; (4) …… 85 m2; (5) …… 75 m2; (6) …… 3 m2; (7) …… 275 m2; (8) …… 189 m2; (9) …… 1 m2: cfr. alínea A) a S) supra.
Da factualidade assente ficou ainda demonstrado que a reparação dos identificados danos importa em €35.950: cfr. alínea A) a S) supra.
Por fim, e quanto ao nexo de causalidade, ressalta dos autos que a contínua passagem dos camiões do consórcio constituído pelos RR., e segurado pela Interveniente, durante o assinalado período de execução da empreitada, provocou os danos na EM1044 e o seu agravamento, foi assim causa sem a qual os supra identificados danos não teriam ocorrido: cfr. alínea A) a S) supra.
Ponto é que não tendo ocorrido caso fortuito ou de força maior (posto que, por um lado, as identificadas chuvas consubstanciam fenómeno expetável em empreitadas de tal natureza durante os meses de inverno e, por outro lado, mesmo que tendo os RR. optado por, em tais circunstâncias atmosféricas, passarem por caminho privado, não ficou provado se o mesmo era inteiramente alternativo à EM1044 e, mesmo que fosse, se já lá não passavam, exatamente, porque entretanto já a EM1044 se mostrava intransitável para camiões com a carga e com a tonelagem dos camiões em questão), ou culpa do lesado (posto que, por um lado a EM1044 havia sido intervencionada no verão de 2007 – o que indicia que no inicio da execução da empreitada, recorde-se março de 2008, não podia estar nas condições em que se apresentava no fim da referida empreitada, recorde-se julho de 2008, após a continua passagem dos identificados camiões - e, por outro lado tendo a A. procedido a colocação de sinal proibindo a circulação de veículos com mais de 15T denota com tal atitude ter oportunamente identificado a situação e ter adotado conduta com vista a obstar à continuação de prática que aumentasse os danos na EM1044) ou responsabilidade de terceiro (posto que nada foi trazido aos autos que se afigure como causa concomitante dos danos verificados) a identificada passagem contínua e reiterada dos camiões dos RR. naquele troço da EM1044 e durante aquele período de tempo, constitui facto e condição, que face à experiência comum, consubstancia causa adequada dos danos que se traduzem também em consequência normal, típica e provável de tal facto decorrente da utilização dos identificados camiões: cfr. art. 483º, art. 499º, art. 503º, art. 505º e art. 563º todos do CC e cfr. alínea A) a S) supra.
Sendo os requisitos da obrigação de indemnização por responsabilidade civil extracontratual de natureza cumulativa e concluindo-se, como no caso concreto se conclui, pelo preenchimento de todos eles, assiste à A. o direito a ser indemnizada pelos danos reclamados: cfr. alínea A) a S) supra.
DO QUANTUM INDEMNIZATÓRIO:
A indemnização há de ser fixada tendo em conta a reconstituição da situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, sendo fixada em dinheiro quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa: cfr. art. 562º do CC.
Revertendo ao caso sub judice recorde-se que o A. pede a condenação solidária dos RR. no pagamento da quantia de €35.950, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento, referente ao custo necessário à reparação das áreas, que compõem a EM1044, no identificado troço Olhas/Aldeia do Rouquenho por danos patrimoniais ali ocorridos e decorrentes da atividade profissional das RR. durante a execução da empreitada que levavam a cabo: cfr. alínea A) a S) supra.
Assim, estando, como estão, provados nos autos os danos patrimoniais e o montante desses danos, procede integralmente o pedido de condenação dos RR. e da Interveniente (que garante o pagamento das indemnizações exigidas ao seu segurado, ora 1ºRR) no pagamento ao A. da importância reclamada, acrescida de juros vencidos e vincendos: cfr. alínea A) a S) supra.”

Vejamos:
A Recorrente questiona a decisão proferida relativamente à matéria de facto (artigos 690.º-A e 712.º do Código de Processo Civil) e à matéria de Direito, para concluir que a decisão do Tribunal a quo devia ter sido absolutória, afirmando que o Tribunal a quo fez uma incorreta apreciação da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, bem como uma errada aplicação do Direito aos factos.

Da Matéria de Facto:
Pretende a recorrente que os factos B), C), F), O) e P) da matéria dada como não provada, sejam considerados dados como provados e, por isso, ser a apelante absolvida do pedido.

Mais pretende a recorrente que seja aditado o facto a designar pela letra T) à matéria de facto.

Em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida.

A alteração da matéria de facto por instância superior, sempre deverá ser considerada uma intervenção excecional.

Como se sumariou igualmente no acórdão do TCAN nº 01466/10.6BEPRT, de 04.11.2016, “À instância recursiva apenas caberá sindicar e modificar o decidido quanto à factualidade dada como provada e não provada, caso verifique a ocorrência de erro de apreciação, suscetível de determinar a viciação da decisão final, mormente enquanto erro de julgamento, patente, ostensivo palmar ou manifesto.”

Igualmente se sumariou no Acórdão deste TCAS nº 1635/08.9BELSB, de 21.04.2022, o seguinte:
“(…) II – O respeito pela livre apreciação da prova por parte do tribunal de primeira instância, impõe um especial cuidado no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto, e reservar as alterações da mesma para os casos em que ela se apresente como arbitrária, por não estar racionalmente fundada, ou em que seja seguro, de acordo com as regras da lógica ou da experiência comum, que a decisão não é razoável.
III – O recurso da matéria de facto não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas apenas uma reapreciação sobre a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal a quo relativamente à decisão sobre os pontos de facto que o recorrente considere incorretamente julgados, na base da avaliação das provas que, na indicação dos recorrentes, impusessem decisão diversa da recorrida.

Sem prejuízo da supressão de um segmento factual, como se descreverá infra, não se vislumbram, pois, razões para divergir do entendimento adotado em 1ª instância, mormente no que concerne à apreciação da prova testemunhal, tanto mais que o Tribunal de recurso está privado da oralidade e da imediação que determinaram a decisão de primeira instância.

A gravação da prova, por natureza, não fornece todos os elementos que foram diretamente percecionados por quem julgou em primeira instância e que ajuda na formação da convicção sobre a credibilidade do testemunho.

Como defende Antunes Varela, no Manual de Processo Civil, 2ª edição, página 657:
“Esse contacto direto, imediato, principalmente entre o juiz e a testemunha, permite ao responsável pelo julgamento captar uma série valiosa de elementos (através do que pode perguntar, observar e depreender do depoimento, da pessoa e das reações do inquirido) sobre a realidade dos factos que a mera leitura do relato escrito do depoimento não pode facultar”.

O respeito pela livre apreciação da prova por parte do tribunal de primeira instância, impõe um especial cuidado no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto, e reservar as alterações da mesma para os casos em que ela se apresente como arbitrária, por não estar racionalmente fundada, ou em que seja seguro, de acordo com as regras da lógica ou da experiência comum, que a decisão não é razoável.

O tribunal a quo socorreu-se, como lhe competia, do princípio da livre apreciação da prova produzida, para dar como assente a materialidade controvertida, em conformidade com o estatuído nos artigos 392.º e 396.º do Código Civil e 607°, n.º 5, do Código de Processo Civil.

Ao referido acresce que por força dos princípios da oralidade e da imediação, o julgador do tribunal recorrido dispõe de uma posição privilegiada para aquilatar da seriedade, credibilidade e fidedignidade dos depoimentos, juízo que o tribunal ad quem pode e deve sindicar, mas apenas quando ocorra manifesto erro na sua apreciação, que contamine e inquine a decisão final.

Importa, pois, reafirmar que o que mais releva é a convicção firmada pelo tribunal a quo, após a apreciação e ponderação do conjunto da prova produzida, designadamente testemunhal, e não simplesmente o teor de uma qualquer declaração descontextualizada proferida por testemunha.

Como igualmente se sumariou no Acórdão deste TCAN, em 17/04/2015, no Processo n.º 01995/07.9BEPRT, "1- Na reapreciação da matéria de facto o tribunal de recurso deve limitar-se ao controlo e eventual censura dos casos mais flagrantes de erro na apreciação efetuada pelo tribunal de 1.ª instância, como sejam aqueles em que o teor de algum ou alguns dos depoimentos prestados no tribunal "a quo" lhe foram indevidamente indiferentes, ou, de outro modo, eram de todo em todo inidóneos ou ineficientes para suportar a decisão a que se chegou ou impunham outra decisão.
2- De contrário, a decisão proferida pelo tribunal de 1.ª instância deve ser mantida, uma vez que aquele tribunal tem fatores de ponderação relevantes que o tribunal ad quem não possui, dos quais destacamos a imediação".

Em qualquer caso, sem prejuízo do referido, o recorrente não demonstra que os factos que pretende alterar e/ou incluir na matéria dada como provada, determinariam só por si a alteração do sentido decisório, sendo que, como se verá, sendo caso disso, nada obsta que com a factualidade dada como provada e não provada, não possa ser proferida decisão diversa.

De sublinhar ainda que alguma da factualidade que se pretende adicionar à matéria de facto dada como provada, comporta questões de direito, ou conclusivas, o que, igualmente por natureza, impede a sua inclusão na matéria dada como provada.

Não se vislumbra, pois, que, no essencial, mereça censura a decisão adotada relativamente à factualidade dada como provada, inverificando-se pois os suscitados vícios conexos com a matéria dada como provada.

Em qualquer caso, e para que não possam subsistir quaisquer duvidas, sempre se dirá, em concreto, o seguinte:
Deu-se como provado na sentença do Tribunal a quo que:
“B) Anteriormente ao início da passagem dos camiões das RR, a EM1044 já era usada para o trânsito normal, designadamente para a circulação de veículos pesados agrícolas, com restrição atenta a (exígua) dimensão do caminho em causa, o que justificou a sua reparação, pela A., nomeadamente no verão de 2007;
Entende a Recorrente que não devia ter ficado provado a parte final do inscrito neste ponto B), que a Estrada Municipal 1044 tenha sido reparada no verão de 2007.

Se é certo que o conjunto dos depoimentos apontam no sentido da estrada ser reparada todos os anos, não se vislumbram razões para alterar o segmento que se pretende suprimir, tanto mais que do mesmo resulta que a referida estrada não estaria já em bom estado, pois caso contrário não seria submetida a reparações regulares e anuais.

Mais pretende a recorrente que se altere o ponto C) da matéria dada como provada, por forma a aditar-lhe o facto de os trabalhos de execução do aterro terem começado em março de 2008.

Independentemente dos depoimentos prestados e assinalados, os quais não se mostram sequer perentórios no sentido a dar como provada a alteração proposta, o que é facto é que a mesma nada de substancial representaria para a decisão proferida ou a proferir.

Pretende a Recorrente que este Tribunal altere a decisão da matéria de facto e dê como não provado os pontos F) e O) da matéria de facto dada como provada.

Foi dado como provado como provado que:
F) Em março de 2008 o A. detetou que, o troço da EM1044, entre Olhas e a Aldeia do Rouquenho, apresentava destruição do pavimento (fendas, com gravilha, pedras e terra à superfície), tendo apurado que as causas dos danos eram provocados pela contínua passagem de viaturas, ao serviço dos 1.º e 2.º RR: (…) e que,
O) O peso dos camiões das RR. (com e sem carga), a sua dimensão e largura e o número de passagens realizadas para execução da obra, contribuíram para a destruição do pavimento, tornando a via intransitável, nas seguintes faixas e áreas da EM1044: (…)

Sem prejuízo de tudo quanto se afirmou, entende-se que o segmento final do facto F) se mostra conclusivo, pelo que se suprimirá a expressão “ao serviço dos 1.º e 2.º RR” (Cfr. Artigo 662.º nº 1 CPC) uma vez que a via se manteve aberta a toda a circulação, e outros veículos, nomeadamente pesados e agrícolas, atravessariam a referida via, contribuíndo de modo não mensurado e mensurável para a sua degradação.

Pretende ainda a Recorrente que se dê como não provado que: “P) A reparação das áreas danificadas, importou num total de €35.950: Faixa Área Custo: (1) 530 m2 13.250€; (2) 275 m2 6.875€; (3) 5 m2 125€; (4 ) 85 m2 2.125€; (5) 75 m2 1.875€; (6) 3 m2 75€; (7) 275 m2 6.875€; (8) 189 m2 4.725€ e (9) 1 m2 25€”.

Se é certo que o referido montante não deixa de ser uma estimativa, pela forma como foi calculado, ainda assim, não deixa de ser o único valor disponível, sendo caso disso, para calcular o custo da intervenção efetuada, em face do que deverá ser mantido.

Mais pretende a recorrente que seja aditado um ponto de facto dado como provado, a designar pela letra T) à decisão sobre a matéria de facto, a saber: “T) O Consórcio Empreiteiro adotou uma postura preventiva, de modo a evitar danos na Estrada Municipal 1044 desde o início da Empreitada.”

Dos elementos de prova disponíveis, não é possível fixar, com segurança, por falta de adequada prova, o referido facto como provado, sendo que o contrário igualmente se não pode provar, tanto mais que em momento algum terá sido feita a pesagem dos veículos pesados do consórcio que circulavam na referida via Municipal.

DO DIREITO
O “Direito” na presenta Ação denota insuficiências e perplexibilidades desde o início da Ação.

Desde logo na PI refere-se como “titulo” singelamente o seguinte:
“Ação Declarativa de condenação de responsabilidade Civil, sob a forma de Processo Ordinário”

Em momento algum da PI se refere a que titulo é peticionada a indemnização de 35.950€. Por facto licito, por facto ilícito, pelo Risco?

A Sentença proferida em 1ª instância, correspondentemente, afirmou que vem pedido o pagamento da quantia de €35.950, com base nos pressupostos da responsabilidade civil”, para afirmar no inicio do “Direito”, conclusivamente que “importa agora ter presente que o caso sub judice enquadra-se no âmbito do regime da responsabilidade civil extracontratual pelo risco: cfr. art. 499º e seguintes do Código Civil – CC; vide citados art. 1º n.º 1 e art. 4º n.º 1 al. h) e n.º 2 ambos do ETAF versus art. 259º e art. 260º do CPC ex vi art. 1º e art. 7º-A ambos do CPTA”.
Neste pressuposto, vejamos, predominantemente em abstrato, o seguinte:
A lei distingue, no campo mais geral da responsabilidade extracontratual, entre responsabilidade civil por factos ilícitos - art.º 483 e seguintes do Código Civil - e responsabilidade pelo risco - artºs. 499° a 510° do mesmo diploma - sem prejuízo de, a regulamentação desta, fazer frequentes apelos à culpa, como acontece nos artºs. 500° n.º 3, 503 n.º 3, e 506° todos do Código Civil, e de mandar cumprir, na parte aplicável e na falta de preceitos legais em contrário, as disposições que regulam a responsabilidade por factos ilícitos art.º 499° do Código Civil.

A responsabilidade por factos ilícitos, com base na culpa, é a regra, na medida em que só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei - art.º 483° n.º 2 do Código Civil - .

É ao lesado que incumbe provar todos os pressupostos fixados no n.º 1 do art.º 483°do Código Civil, designadamente, a culpa, salvo quando haja presunção legal de culpa - art.º 487° n.º 1 do Código Civil - pois é sabido que quem tem a seu favor presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz - art.º 350° n.º 1 do Código Civil - .

Na falta de outro critério legal, a culpa é apreciada pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso - art.º 487° n.º 2 do Código Civil - .

O elemento básico da responsabilidade é o facto do agente - um facto dominável ou controlável pela vontade, um comportamento ou uma forma de conduta humana - pois só quanto a factos dessa índole têm cabimento a ideia da ilicitude, o requisito da culpa e a obrigação de reparar o dano nos termos em que a lei a impõe, neste sentido, Antunes Varela, in, Das Obrigações em Geral, I, 9ª edição, página 545, mas, fundamental na responsabilidade por factos ilícitos, por culpa, além da ilicitude (elemento objetivo, o autor agiu objetivamente mal), é essencial concluir que a conduta do lesante se pode considerar reprovável, censurável.

Agir com culpa significa atuar em termos da conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo, neste sentido, Antunes Varela, in, Das Obrigações em Geral, I, 9ª edição, página 582.

Culpa efetiva, provada, e culpa presumida são uma e a mesma coisa, designadamente para afastar a indemnização devida pela responsabilidade pelo risco, pois, as presunções, enquanto “ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido” (art.º 349° do Código Civil) - podem resultar tanto da lei (art.º 350º do Código Civil) como das regras da experiência e da vida do julgador (art.º 351º do Código Civil), reconhecendo-se que a prova da inobservância de leis ou regulamentos faz presumir a culpa na produção dos danos dela decorrentes, dispensando a concreta comprovação da falta de diligência.

A ilicitude é sempre algo contrário ao direito, neste sentido, Pessoa Jorge, in, Pressupostos, página 61.

Integram-na, por isso, todos e quaisquer atos ou omissões, que violem disposições da lei, do interesse e ordens públicas, ou normativos destinados a proteger interesses de terceiros.

Em concreto, está por demonstrar que os veículos pesados do consórcio tenham infringido qualquer regra, nomeadamente estradal, ao circular na controvertida via.

Assim, atendendo a que a obrigação de indemnizar que o Autor imputa ao Consórcio não encontra fundamento no instituto da responsabilidade civil extracontratual, afastada que está a culpa do Consórcio, caberá aferir se a obrigação de indemnizar se fundamenta em facto danoso gerador de responsabilidade objetiva, porque incluído na zona de riscos a cargo de pessoa diferente do lesado.

A responsabilidade civil não se esgota com a verificação do dolo ou culpa dos intervenientes, pois que ela é objetiva no caso de risco.

Estatui o art.º 499º do Código Civil que “são extensivas aos casos de responsabilidade pelo risco, na parte aplicável e na falta de preceitos legais em contrário, as disposições que regulam a responsabilidade por factos ilícitos”.

Nota dominante da responsabilidade pelo risco, temo-la no facto de a lei prescindir daquele elemento subjetivo, da culpa.

O fundamento da responsabilidade não reside agora no propósito de um ato culposo, mas sim no controlo de um risco, ou talvez, com maior rigor, no controle de potenciais danos, aliado ao princípio da justiça distributiva, segundo a qual quem tiver o beneficio de uma certa coisa, deve suportar os correspondentes encargos - ubi commodum ibi incommodum - .

A 1ª Instância apontou, por iniciativa própria, no sentido da verificação de responsabilidade pelo Risco.

Aqui chegados, importa encarar o caso sub iudice (responsabilidade objetiva, nos termos previstos no art.º 503º do Código Civil) com especial enfoque na questão da eventual exclusão dessa responsabilidade.

Como se viu, entendeu o Tribunal a quo que “Uma vez desenhado o quadro fáctico ao qual se aplicará o direito, importa agora ter presente que o caso sub judice enquadra-se no âmbito do regime da responsabilidade civil extracontratual pelo risco: cfr. art. 499º e seguintes do Código Civil – CC; vide citados art. 1º n.º 1 e art. 4º n.º 1 al. h) e n.º 2 ambos do ETAF versus art. 259º e art. 260º do CPC ex vi art. 1º e art. 7º-A ambos do CPTA; alínea A) a S) supra.”

Mais afirmou a 1ª Instância que:
São pressupostos de tal responsabilidade:
a) o facto, comportamento ativo ou omissivo (art. 486.º ex vi art. 499º ambos do CC);
b) o dano, a lesão de ordem patrimonial ou moral, esta quando relevante (art. 503º e art. 508º do CC)
c) o nexo de causalidade entre o facto e o dano, segundo a teoria da causalidade adequada (art. 483.º e seguintes do CC).”

Em qualquer caso, e descendo ao concreto, atenta a matéria dada com provada, há desde logo um conjunto de questões incontornáveis, que não poderão deixar de ser atendidas.

Se é o próprio Município que reconhece que tem de realizar anualmente reparações na controvertida via, tal significa que a mesma já se encontrava há muito em mau estado, pois que uma via devidamente pavimentada não carece de permanente e regular reparação.

Por outro lado, se se admite e reconhece que os veículos do consórcio pelas suas sucessivas passagens no local contribuíram para o agravamento do estado do piso da via, não deixa de ser verdade que a via sempre esteve aberta a todos os veículos, pelo que não se mostra possível imputar a responsabilidade pelo agravamento do estado da via exclusivamente ao consórcio.

Com efeito, e em bom rigor, estamos perante uma via Municipal não portajada pelo que a circulação de veículos é livre, cabendo a responsabilidade pela sua manutenção e fiscalização ao Município.

Por outro lado, mesmo tendo presente que o Município já no decorrer da obra impediu, por via de sinalização vertical, a circulação na controvertida Estrada Municipal EM1044, de veículos com peso superior a 15 toneladas, o que é facto é que ficou por demonstrar que os veículos pesados do consórcio tivessem peso e carga em excesso relativamente ao limite imposto, pois que essa verificação não pode ser feita “a olho nu”, nem por estimativa.

Estão assim por preencher os pressupostos da Responsabilidade civil extracontratual pelo risco previstos no artigo no artigo 499.º do Código Civil.

Efetivamente, como referido, ficou por demonstrar que os veículos pesados do consórcio tivessem peso superior ao permitido legalmente ou por via da sinalética entretanto colocada, ainda que, igualmente, tivesse ficado por demonstrar que a Recorrente tenha adotado uma “atitude preventiva e que os camiões se fizeram sempre circular sem a carga completa (…)”.

Do mesmo modo, ficou por provar o necessário nexo de causalidade entre o facto e o dano, ou seja, entre a passagem dos camiões do consórcio e os danos ocorridos na Estrada Municipal 1044, atento até o seu estado de degradação pré-existente, e que justificava que o Município realizasse confessadamente obras de reabilitação e reparação anualmente.

Como afirmado já, estando a referida via Municipal aberta à circulação sem restrições, para o agravamento do seu estado, não pode ser excluída a passagem de todos os restantes veículos, que não apenas os detidos pela Recorrente, bem como quaisquer outras causas, nomeadamente de natureza climatérica.

Na própria Sentença Recorrida se afirma que:
São pressupostos de tal responsabilidade:
a) o facto, comportamento ativo ou omissivo (art. 486.º ex vi art. 499º ambos do CC);
b) o dano, a lesão de ordem patrimonial ou moral, esta quando relevante (art. 503º e art. 508º do CC)
c) o nexo de causalidade entre o facto e o dano, segundo a teoria da causalidade adequada (art. 483.º e seguintes do CC).

Com efeito, determina-se no artigo 483.º do Código Civil que a obrigação de indemnizar se restringe aos danos resultantes da violação, sendo, assim, um dos pressupostos da responsabilidade civil o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

Como refere A. Varela in RLJ, 104.º-271, “para que o agente seja obrigado a indemnizar certo dano, não basta que o facto ilícito por ele praticado seja considerado, em abstrato, causa adequada desse dano. É preciso que, além de ser causa adequada, o facto seja, também, causa concreta do dano”.
Na realidade, não se pode afirmar que tenha sido estabelecido um nexo causal entre os danos e a passagem dos camiões do Recorrente.

A sentença recorrida bastou-se com a afirmação singela e conclusiva, de acordo com a qual, “resulta dos autos que a EM1044, nos troços melhor identificados nos autos, sofreu degradação pela contínua passagem de camiões dos 1º e 2º RR, camiões com mais de 15T que, durante o período de execução da empreitada de “CONSTRUÇÃO DO ADUTOR DO APROVEITAMENTO HIDROAGRÍCOLA DO ROXO – 2.º TROÇO DO CANAL ADUTOR GERAL” por ali reiteradamente passaram”, não cuidando de fazer prova do necessário nexo de causalidade entre aquelas passagens e os danos efetivamente ocorridos.

Efetivamente, a esse respeito apenas se afirmou na Sentença Recorrida que quanto ao nexo de causalidade, ressalta dos autos que a contínua passagem dos camiões do consórcio constituído pelos RR., (…) durante o assinalado período de execução da empreitada, provocou os danos na EM1044 e o seu agravamento, foi assim causa sem a qual os supra identificados danos não teriam ocorrido”.

Como decorre do sumariado no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 28 de setembro de 2008:
“É ao lesado que cabe o ónus de provar o nexo de causalidade entre os danos alegados e o exercício pelo réu de uma atividade perigosa,” ónus manifestamente incumprido pelo Município, mormente em termos de responsabilidade exclusiva.

* * *

Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao Recurso, revogar a Sentença Recorrida, mais se julgando improcedente a Ação.

Custas pelo Recorrido

Lisboa, 29 de novembro de 2022
Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes (Voto Vencido)

Lina Costa

Voto de vencido:
Negaria provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida, essencialmente por considerar correto o julgamento da matéria de facto, o que determina a improcedência da impugnação da decisão de direito que a recorrente fundamentou no pressuposto do sucesso da impugnação do julgamento da matéria de facto.
Alda Nunes.