Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1057/13.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:05/23/2024
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
OFICIAL DE JUSTIÇA
Sumário:I– Tendo sido aberto concurso tendente à celebração de contratos Individuais de Trabalho, com vista ao exercício de funções correspondentes ao exercício de funções próprias de oficial de justiça, através de contrato a termo resolutivo certo, pelo período de um ano, e tendo o aqui Recorrente ficado integrado na lista dos suplentes, e tendo sido celebrado com o mesmo contrato entre 14.06.2010 a 31.08.2010, nos termos da Lei n.° 12-A/2008 e do RCTFP, e não obstante o contrato ter sido prorrogado por mais um ano, até 31.08.2011, quando o Recorrente intentou a presente Ação em 24.04.2013, já havia ocorrido a caducidade do direito, em função do art.° 133.º n.° 2, alínea f), do CPA.
II– Referindo-se na cláusula 10ª do contrato que “O presente contrato não está sujeito à renovação automática e não se converterá, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado”, inexiste qualquer possibilidade de conversão do contrato a termo certo em contrato por tempo indeterminado.
III- Também a letra do art.° 92.°, n.° 2, do RCTFP não suscita quaisquer dúvidas, ao afirmar que “O contrato a termo resolutivo não se converte, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo de duração previsto no presente Regime ou, tratando-se de contrato a termo incerto, quando deixe de se verificar a situação que justificou a sua celebração”.
IV- A nulidade constitui no nosso regime jurídico uma exceção reservada às situações mais gravosas, sendo pois a anulabilidade o regime regra.
À luz dos atuais artigos 161° a 163° do CPA (Anteriores Artº 133º a 135º CPA), designadamente do n° 1 deste último preceito, são anuláveis os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção.
Efetivamente, resulta do Código de Procedimento Administrativo, no seu atual art.° 161° (Anteriores Artº 133º a 135º CPA), que serão atos nulos, em função do que vem invocado, aqueles que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental ou que careçam em absoluto de forma legal, o que não é manifestamente o caso aqui em apreciação.
Com efeito, a existir vício no ato objeto de impugnação o mesmo geraria anulabilidade e não nulidade, em face do que se mostra ultrapassado o prazo para que a Ação pudesse ser intentada.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I Relatório
J..., no âmbito da Ação Administrativa intentada contra o Ministério da Justiça, tendente, em síntese, a declarar a nulidade do ato de celebração de contrato individual de trabalho para a função de oficial de justiça na categoria de escrivão auxiliar, substituindo-o por outro que nomeie o Autor para o cargo, inconformado com a Sentença proferida em 12 de fevereiro de 2020 no TAC de Lisboa que julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação e, em consequência, absolveu da instância a Entidade Demandada, veio em 30 de setembro de 2020, interpor recurso jurisdicional da referida decisão para este TCA Sul, formulando as seguintes conclusões:
“1°. O Recorrente recorre de uma decisão proferida em saneador sentença proferida no TAC de Lisboa que julgou procedente uma exceção de caducidade, absolvendo a entidade administrativa demandada, assente na interpretação segundo a qual não é cominado com nulidade o vício apontado pelo A. ao procedimento simplificado que o Ministério da Justiça abriu em 2010 e na sequência do qual contratou o Autor como oficial de justiça para praticar atos próprios de oficial de justiça.
2°. O Recorrente foi contratado para exercer as funções próprias de oficial de justiça, e que desempenhou durante mais de catorze meses com a categoria de escrivão auxiliar no Tribunal Administrativo Central de Lisboa, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, e na 1a Vara Criminal de Lisboa.
3°. A profissão de oficial de justiça que o habilita a praticar atos próprios de oficial de justiça está sujeita a um regime próprio de ingresso e contratação, do mesmo modo que tal acontece para outras profissões relacionadas com os poderes e funções de soberania do Estado tais como, por exemplo, agentes de forças de segurança, magistrados, diplomatas, etc., apenas para citar exemplos das áreas da segurança interna, da justiça e dos negócios estrangeiros.
4°. Tal especificidade legal acontece na medida em que as funções de oficial de justiça, tal como as funções de um magistrado, só podem ser exercidas por um oficial de justiça.
5°. E um oficial de justiça para o ser, enquanto tal, tem que ingressar no funcionalismo público pela via específica regular própria dessa categoria de profissionais nos tribunais.
6°. O Ministério da Justiça, através da DGAJ, em vez de optar por um procedimento regular e sustentado na lei para contratar o oficial de justiça, deitou mão de um procedimento simplificado nada condizente com as regras e procedimentos legais que se impõem dever ser cumpridas no recrutamento e contratação de oficiais de justiça.
7°. Razão pela qual é nulo o despacho de 11/6/2010 da subdiretora-geral da administração da justiça e nulo também o contrato de trabalho mandado celebrar ao abrigo desse despacho.
8°. A nulidade do ato administrativo proferido e do subsequente contrato por este autorizado, nestas circunstâncias, significou a preterição de forma legal exigível, nos termos em que são nulos os atos que careçam em absoluto de forma legal de acordo com o disposto na alínea f) do n° 2 do artigo 133° do velho CPA então em vigor (norma violada na sentença recorrida).
9°. Estando verificado um vício jus-administrativo cominado com nulidade, decorre dessa conclusão que o vício pode ser arguido a todo o tempo devendo pois improceder a invocada exceção de caducidade e levada a presente causa a competente julgamento nos termos peticionados pelo Autor e aqui Recorrente.
10°. O Recorrente foi contratado, e a termo certo, sem que essa contratação correspondesse a uma necessidade identificada e respaldada em lei para aqueles catorze meses de contrato, nem tão pouco tal causa justificativa do termo certo foi plasmada no despacho que autorizou a celebração do contrato.
11°. Mais uma vez do que antecede resulta o vício de nulidade apontado na Petição Inicial ao contrato de trabalho celebrado pela DGAJ e antecedido por um despacho de 11/6/2010 da subdiretora-geral da administração da justiça, que lhe dá causa, igualmente nulo, porque fundamenta a contratação do Recorrente em regime contra legem.
12°. Se no direito laboral privado a contratação de um trabalhador a termo certo sem termo justificativo à luz da lei conduz a um contrato definitivo, também no funcionalismo público à luz do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, à data em vigor, conduziria, por nulidade do termo, e não do contrato, a uma contratação definitiva, o que aqui não aconteceu (norma violada na sentença recorrida - artigos 93°, 94° e 95° todos do RCTFP aprovado pela Lei 59/2008).
13°. O recorrente foi despedido em 31 de Agosto de 2011, com o decurso do termo certo ilegalmente contratado pela DGAJ (Ministério da Justiça).
Termos em que, e nos mais de Direito, deve ser revogada a sentença proferida em 1 instância pelo TAC de Lisboa aqui recorrida por improcedência da alegada exceção de caducidade e levada a causa a julgamento de acordo com os pedidos do Recorrente e Autor expressos na sua Petição Inicial.”
O Recurso Jurisdicional foi admitido por Despacho de 16 de novembro de 2020.
O Recorrido/Ministério veio apresentar contra-alegações de Recurso em 14 de dezembro de 2020, concluindo:
“1.ª Bem andou o Tribunal a quo no saneador-sentença sob censura, que julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação e, em consequência, absolveu o R. da instância, nos termos do artigo 89.°, n.° 1, alínea h), do CPTA, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 02.10., não podendo ser outra a solução jurídica alcançada à luz do direito aplicável ao caso concreto.
2.ª Pois, à data da interposição da ação em 24.04.2013, há muito tinha sido ultrapassado o prazo de impugnação de atos relativo ao procedimento de contratação do Recorrente em regime de contrato de trabalho a termo (resolutivo) para o exercício de funções similares às de oficial de justiça, que decorreu entre 14.06.2010 e 31.08.2011.
3.ª Tal como já se encontrava esgotado o prazo da respetiva ação administrativa comum de anulação, total ou parcial, do contrato a qual só poderia ser intentada, no prazo de seis meses contado da data da sua celebração, nos termos do art.° 41°, n° 2, do CPTA, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 214- G/2015, de 02.10..
4.ª Tampouco se argumente, como o faz o Recorrente com a nulidade do ato administrativo/contrato em causa, por ter sido preterida a forma legal exigível (art.° 133.º n.° 2, alínea f), do CPA), por forma a interpor esta ação a todo o tempo, com base nos artigos 133°-2-f) e 134° do CPA/1991.
5.ª Na verdade, a posição que o Recorrente pretende fazer valer, visa colher benefícios de uma interpretação contra lei expressa, e de forma ínvia obter uma relação de emprego público duradoura, mas sem apoio quer na letra quer no espírito da lei.
6.ª O Recorrente foi contratado a termo resolutivo certo na sequência de um processo de recrutamento e seleção simplificado, ao qual foi opositor, destinado, de facto, à constituição de vínculos precários, pois visava o exercício transitório de funções similares às desempenhadas por oficiais de justiça, decorrente do aumento excecional da atividade dos tribunais pela criação das 3 comarcas piloto e, posteriormente, pela necessidade de substituição de trabalhador contratado, no caso do Recorrente, conforme ficou expresso no contrato deste.
7.ª Foram assim razões excecionais e enquadradas nas situações que a lei admitia para o recurso à contratação a termo certo, que ditaram a contratação do ora Recorrente.
8.ª Distinto, portanto, do exercício profissionalizado das funções de oficial de justiça, em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, que se concretiza, em regra, na sequência de concurso público de ingresso na carreira.
9.ª Assim sendo - como foi (!)- nem a lei nem o contrato celebrado pelo Recorrente, legitimavam (ou legitimam) expectativas diversas das que constavam do contrato e que veio colocar em causa na ação administrativa intentada e no presente recurso jurisdicional.
10.ª Contrariamente ao que o Recorrente vem propugnar - numa confusão de argumentos e de equívocos legais, pois tanto alega a nulidade do ato/contrato, como a seguir refere que apenas é nulo o termo, sendo o contrato válido - a lei impede a conversão do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado.
11.ª Sem esforço algum se pode constatar da simples leitura do art.° 92.°, n.° 2, do RCTFP que “O contrato a termo resolutivo não se converte, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo de duração previsto no presente Regime ou, tratando-se de contrato a termo incerto, quando deixe de se verificar a situação que justificou a sua celebração” (sublinhado nosso).
12.ª Pelo que, a impossibilidade de conversão do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado, era do conhecimento do Recorrente, que consciente e livremente outorgou o contrato, com ele se conformou e o cumpriu.
13.ª E ao longo dos meses em que decorreu a execução do contrato até à propositura da ação - o contrato caducou em 31.08.2011 e a ação foi intentada em 24.04.2013, o Recorrente agiu sempre como se o contrato fosse inteiramente válido.
14.ª Na verdade, em face da legislação vigente à época dos factos, o Recorrido cumpriu os formalismos legais conducentes à outorga de contrato de trabalho a termo (resolutivo) certo, o contrato foi reduzido a escrito, ou seja, revestiu a forma prescrita na lei, pelo que não se divisa a nulidade assacada pelo Recorrente que permita sustentar a improcedência da caducidade do direito de ação.
15.ª Nem, outrossim, se descortina qualquer ilegalidade do ato autorizador da contratação em causa - nem o Recorrente o logra demonstrar - que se projetasse no contrato, suscetível de ser sancionado com a nulidade.
16.ª A admitir-se - o que apenas por mero raciocínio se concebe - a existência de uma qualquer ilegalidade do ato autorizador, sempre se diga que a sanção seria a da anulabilidade, de acordo com o regime-regra do direito administrativo, e não a nulidade.
Logo, a ação foi intempestivamente proposta, como bem reconheceu o Tribunal a quo no despacho saneador/sentença, sob recurso.
Termos em que deve ser julgado totalmente improcedente o presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida, assim se fazendo, JUSTIÇA”.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 15 de janeiro de 2021, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Em função do Recurso apresentado, importa verificar se estão reunidos os pressupostos tendentes a ter sido declarada a caducidade do direito de Ação, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.
III – Fundamentação de Facto
Foi considerada a seguinte factualidade provada:
“A) Em 26/04/2013, o Autor deu entrada neste TAC da presente ação administrativa especial (cfr. consta do processo físico e do SITAF).
B) Por despacho n° .../08MEF, de 21/05/2008, foi autorizado, a título excecional, o início do procedimento administrativo para a celebração de 90 contratos de trabalho a termo resolutivo certo, para o exercício das funções próprias de oficial de justiça, pelo prazo de um ano, e por despacho de 5/06/2008, da Diretora-Geral da Administração da Justiça, foi autorizada a abertura de procedimento simplificado para a sua celebração, ao abrigo das disposições conjugadas da alínea h), do n° 1 e n°s 4 e 5, do artigo 9° e do artigo 5° da Lei n° 23/2004, de 22/06, despachos que dou aqui por reproduzidos (cfr. documentos n°s 1 e 2 juntos pelo Autor).
C) O Autor concorreu ao procedimento referido na alínea anterior (confissão do Autor e cfr. resulta dos documentos juntos aos autos).
D) Em 14/06/2010, o Autor celebrou contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo com o Estado, através da Direção-Geral da Administração da Justiça, contrato que dou aqui por integralmente reproduzido (cfr. documento n° 3 junto pelo Autor).
E) Em 12/08/2010, o Autor e o Estado, através da Direção-Geral da Administração da Justiça, celebraram uma adenda ao contrato de trabalho referido na alínea anterior, que dou aqui por integralmente reproduzida (cfr. documento n° 4 junto pelo Autor).
F) O Autor exerceu funções de oficial de justiça de 15/06/2010 a 31/08/2011 (cfr. documentos 5 a 15 juntos pelo Autor).


IV – Do Direito
Discorreu-se no discurso fundamentador da decisão recorrida:
“A Lei n° 23/2004, de 22/06, [entretanto revogada pela alínea f) do artigo 18.° da Lei n.° 59/2008, de 11/09, que aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, com exceção dos seus artigos 16.°, 17.° e 18.°, a partir de 1/01/2009] aprovou o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública.
O procedimento em causa (alínea B) do probatório) foi autorizado, a título excecional, ao abrigo da citada Lei n° 23/2004, cujo processo de seleção estava regulado no seu artigo 5° e as situações em que podia ser aposto termo resolutivo constavam do seu artigo 9°, não se encontrando o Estado impedido de celebrar contratos de trabalho (cfr. artigo 1°, n° 2 da Lei n° 23/2004), mesmo para o exercício de funções de oficial de justiça.
Realidade jurídica distinta, e que não se confunde com o procedimento ao qual o Autor concorreu, é o procedimento de admissão para ingresso nas carreiras de pessoal de oficial de justiça, nos termos do Estatuto dos Funcionários de Justiça [Decreto-Lei n° 343/99, de 26/08].
Em concreto, o que sucedeu foi que o Autor, por ter concorrido ao procedimento em questão e ter sido graduado em lugar de suplente, foi chamado, na sequência da publicação dos resultados do procedimento concursal para ocupação de 200 postos de trabalho da carreira de oficial de justiça, do movimento extraordinário de oficiais de justiça [publicado em 07/06/2010, no Diário da República, 2° série n° 109], do qual faziam parte 51 dos 90 contraentes dos contratos de trabalho celebrados a termo resolutivo certo, para, em substituição de contratado, que foi admitido ao movimento extraordinário de oficiais de justiça referido, celebrar contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo, para o desempenho de funções próprias de oficial de justiça, contrato que foi autorizado por despacho de 11/06/2010, da Subdiretora-Geral da Administração da Justiça, em substituição, e cuja duração dos contratos outorgados, na sequência da autorização pelo despacho n° .../08/MEF, de 21/05, do Ministro de Estado e das Finanças, foram objeto de renovação, também na sequência do despacho de 10/08/2009, do Secretário de Estado Adjunto e da Justiça.
No contrato celebrado entre o Autor e o Estado foi fixada uma duração pelo período de 15/06/2010 a 31/08/2010 e, na sequência do despacho do Diretor-Geral de 15/07/2010, foi renovada por um ano, ao abrigo do disposto nos artigos 103° e 104° do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (RCTFP), aprovado pela Lei n° 59/2008, de 11/09, e que nos termos do seu artigo 18°, alínea f) revogou a Lei n° 23/2004, de 22/06, com exceção dos seus artigos 16°, 17° e 18°.
No contrato de trabalho em funções públicas de 14/06/2010, por aplicação da Lei n° 12- A/2008, de 27/02 (só revogada em 2014, pela alínea c) do n° 1 do artigo 42° da Lei n° 35/2014, de 20/06, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, com exceção das normas transitórias abrangidas pelos artigos 88° a 115°) [cfr. artigos 2°, n° 1, 3°, n° 1, 21°, n° 1, 92°, n° 2 e 117°, n° 2, alínea b)], porque se mantinham os pressupostos de contratação inicial e respetiva renovação e por forma a salvaguardar os objetivos da contratação, o contrato foi celebrado com o Autor para a substituição do contraente que ingressou na carreira de oficial de justiça e apenas pelo período em falta [de 15/06/2010 a 31/08/2010], renovação que depois ocorreu nos termos já referidos.
No âmbito do procedimento a que o Autor concorreu não lhe assistia o direito de ser nomeado, por não estar em causa um movimento de oficiais de justiça, nos termos do Estatuto dos Funcionários de Justiça, pelo que não está em causa a impugnação de um ato nulo.
O Autor aceitou celebrar contrato com o Estado para o exercício de funções próprias de oficial de justiça e não resulta do probatório que tenha impugnado a decisão que autorizou a abertura do procedimento a que se candidatou, antes pelo contrário, exerceu as funções para que foi contratado até 31/08/2011.
Diga-se, por fim, que o preceito invocado pelo Autor (artigo 133°, n° 2, alínea f), do CPA - aprovado pelo Decreto-Lei no 442/91, de 15/11, alterado pelo Decreto-Lei n.° 6/96, de 31/01, que embora revogado pelo Decreto-Lei n° 4/2015, de 7/01, este diploma é inaplicável ao caso dos autos) apenas é aplicável a atos administrativos (artigo 120° do CPA) e o Autor identifica como ato administrativo o contrato de trabalho celebrado, que não é uma decisão da Administração, mas sim um acordo de vontades pelo qual é constituída uma relaão jurídica administrativa.
Assim, não estando em causa a impugnação de um ato nulo, quando o Autor intentou a presente ação, já há muito tempo que tinha caducado o direito de a intentar, nos termos do artigo 58°, n° 2, alínea b) e n° 3, do CPTA, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 214-G/2015, de 2/10.
Por outro lado, visando o Autor a anulação, total ou parcial, do contrato, a respetiva ação administrativa comum também só poderia ser intentada no prazo de seis meses contado da data da sua celebração, nos termos do artigo 41°, n° 2, do CPTA, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 214-G/2015, de 2/10, pelo que, na data em que a presente ação foi intentada, também se encontrava caducado o direito de a instaurar.
Fica, assim, prejudicada a apreciação da exceção perentória de abuso de direito oficiosamente suscitada.
Ante o exposto, julgo procedente a exceção de caducidade do direito de ação alegada e, em consequência, absolvo da instância a Entidade Demandada, ao abrigo do disposto no artigo 89°, n° 1, alínea h), do CPTA, na redação anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 214-G/2015, de 2/10.”


Importa agora analisar, ponderar e decidir suscitado:
Por despacho de 21.05.2008 o Ministro das Finanças autorizou a título excecional, a celebração de 90 contratos a termo certo, tendo em vista a instalação de três comarcas experimentais, pelo que, nessa sequência foi autorizada a abertura do procedimento simplificado de recrutamento dos contratados.


Em cumprimento do disposto no art.° 5.° da Lei n.° 23/2004, de 22 de junho, foi publicitada a correspondente oferta de emprego público visando a celebração de 90 contratos a termo resolutivo certo, pelo período de um ano, tendo por objeto o exercício de funções próprias de oficial de justiça.


O aqui Recorrente, foi candidato ao procedimento simplificado, tendo integrado a lista dos suplentes.


Concluída a seleção dos candidatos, foram celebrados os 90 contratos de trabalho a termo resolutivo certo, pelo prazo de um ano, pelo período de 01.09.2008 a 31.08.2009, tendo sido autorizada a sua renovação, por um ano, por despacho do Secretário de Estado Adjunto e da Justiça de 10.08.2009.


No movimento extraordinário de colocação de oficiais de justiça de abril de 2010, ingressaram na carreira de oficial de justiça 51 dos 90 contratados a termo resolutivo certo, na sequência do procedimento de admissão para ingresso nas carreiras do grupo de pessoal de oficial de justiça aberto pelo aviso n.° ...../2009, publicado no D.R., 2ª Série, n.° 200, de 15.10.2009.


Ulteriormente, por despacho de 11.06.2010 foi autorizada a celebração de contratos de trabalho a termo resolutivo certo pelo período de 14.06.2010 a 31.08.2010, nos termos da Lei n.° 12-A/2008 e do RCTFP, com os candidatos suplentes disponíveis, nos quais se incluía o aqui Recorrente, tendo o contrato sido prorrogado por mais um ano.


O Recorrente cessou funções em 31.08.2011 na sequência da caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo, tendo exercido funções correspondentes a oficial de justiça, em regime de contrato entre 14.06.2010 e 31.08.2011, sendo que a presente ação foi intentada em 24.04.2013.


Em função da factualidade vinda de evidenciar, importa verificar se se mostrarão preenchidos os pressupostos tendentes à declaração de caducidade do direito, declarada em 1ª Instância, em função do art.° 133.º n.° 2, alínea f), do CPA.


Refira-se, desde já, que se não vislumbra que a decisão recorrida mereça censura.
Efetivamente, o aqui Recorrente foi contratado a termo resolutivo certo na sequência de um processo de recrutamento e seleção simplificado, ao qual foi opositor, destinado à constituição de vínculos precários, visando o exercício transitório de funções similares às desempenhadas por oficiais de justiça, em decorrência do aumento excecional da atividade dos tribunais pela criação das 3 comarcas piloto.
Pretendesse a Administração ter constituído vínculos de emprego público de trabalho subordinado por tempo indeterminado, sempre poderia ter recorrido ao recrutamento por via de concurso público.


Não o tempo feito, terão daí de ser retiradas as devidas ilações, nomeadamente no que concerne à ausência expetativas relativamente à criação de um vinculo funcional duradouro.


É incontornável que, nomeadamente, a cláusula 10ª do contrato não suscita quaisquer duvidas, ao referir que “O presente contrato não está sujeito à renovação automática e não se converterá, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado”, inexistindo, assim qualquer possibilidade de conversão do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado.


Também a letra do art.° 92.°, n.° 2, do RCTFP não suscita quaisquer dúvidas, ao afirmar que “O contrato a termo resolutivo não se converte, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo de duração previsto no presente Regime ou, tratando-se de contrato a termo incerto, quando deixe de se verificar a situação que justificou a sua celebração”.


Assim, não se verifica no procedimento qualquer vicio que pudesse ter determinado uma qualquer nulidade suscetível de viabilizar a apresentação em juízo de ação para além dos 3 meses aplicáveis à impugnação de atos anuláveis.


Tal como decidido em 1ª instância, não se reconhece a verificação de qualquer vicio suscetível de determinar a nulidade do referido ato.


Com efeito, constitui ilegalidade determinante da verificação de vício de ato administrativo, a ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis, que poderá corresponder em abstrato à anulabilidade ou a nulidade.


A nulidade constitui no nosso regime jurídico uma exceção reservada às situações mais gravosas, sendo pois a anulabilidade o regime regra.


À luz dos atuais artigos 161° a 163° do CPA (Anteriores Artº 133º a 135º CPA), designadamente do n° 1 deste último preceito, são anuláveis os "atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção." (Cfr. neste sentido Mário de Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, vol. 1, pag. 247).


No mesmo sentido se pronunciaram Mário Esteves de Oliveira/Pedro Costa Gonçalves/J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 1ª ed. p. 656, onde afirmam que "A sanção geral da invalidade do ato ferido de ilegalidade - ou seja, o ato desconforme com o ordenamento jurídico, por ofensa ou dos princípios gerais de direito ou de normas jurídicas escritas constitucionais, internacionais, comunitárias, legais ou regulamentares (omitindo-se referência paralela às normas consuetudinárias, por não serem consideradas generalizadamente fontes formais de direito administrativo) ou, ainda, por ofensa de vinculações derivadas de ato jurídico ou contrato administrativo anterior - é a da anulabilidade".


Efetivamente, resulta do Código de Procedimento Administrativo, no seu atual art.° 161° (Anteriores Artº 133º a 135º CPA), que serão atos nulos, em função do que vem invocado, aqueles que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental ou que careçam em absoluto de forma legal, o que não é manifestamente o caso aqui em apreciação.


Com efeito, a existir vício no ato objeto de impugnação o mesmo geraria anulabilidade e não nulidade, em face do que se mostra ultrapassado o prazo para que a Ação pudesse ser intentada.


Acresce que o Recorrente não logrou demonstrar que o ato objeto de impugnação se mostrasse nulo, como circunstancialmente se mostra suficientemente evidenciado no discurso fundamentador da decisão recorrida, cujo teor aqui se acompanha.


Como se sumariou no Acórdão do Colendo STA, de 22/04/2015, no Procº n.º 061/15, “(...) II – Caducou o direito de impugnar um ato, aparentemente consolidado há anos, se os vícios que lhe foram atribuídos não eram potencialmente fautores da sua nulidade.


Por ouro lado, não se descortina qualquer ilegalidade do ato autorizador da contratação em causa que se projetasse no contrato, suscetível de ser sancionado com a nulidade, sendo que o Recorrente nem sequer logrou ensaiar qualquer tentativa argumentativa nesse sentido, que não através de afirmações meramente conclusivas.


Incontornavelmente o aqui Recorrente não cuidou atempadamente do exercício do seu direito de impugnação de atos anuláveis, apenas intentando a ação muito tempo depois de esgotado o prazo para o efeito – Cfr. Art.° 58.° do CPTA.


Note-se, que o contrato caducou, por ter atingido o seu termo em 31.08.2011 e a ação deu entrada em Tribunal em 24.04.2013, o que determinou, assim, a sua intempestividade, como bem reconheceu o Tribunal a quo.


Não merece, assim, censura a decisão recorrida, a qual aqui se confirmará.

* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a decisão recorrida.


Custas pelo Recorrente


Lisboa, 23 de maio de 2024

Frederico de Frias Macedo Branco

Maria Julieta França

Rui Pereira