Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:156/25.0BEBJA
Secção:CT
Data do Acordão:10/30/2025
Relator:ISABEL VAZ FERNANDES
Descritores:PENHORA; RECLAMAÇÃO
CITAÇÃO
FORMALIDADES
Sumário:I – Nos termos do preceituado no nº1 do artigo 228 do CPC, a citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de recepção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artigo anterior e ainda a advertência, dirigida ao terceiro que a receba, de que a não entrega ao citando, logo que possível, o faz incorrer em responsabilidade, em termos equiparados aos da litigância de má fé.
II – Não sendo possível apurar se foi feita a advertência ao terceiro que recebeu a carta de citação é de concluir pelo incumprimento das formalidades prescritas na lei.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul
I – RELATÓRIO

.... , melhor identificada nos autos, veio recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, em 22 de julho de 2025, que julgou improcedente a Reclamação por si apresentada do acto de penhora de 1/3 do salário, ordenada no âmbito da execução fiscal com o nº 0201200900056138 e apensos, contra si instaurada e a correr termos na secção de processo executivo de Beja do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS, IP), por dívidas à Segurança Social, no montante global de €19.747,89, absolvendo o IGFSS, IP da instância, por verificada exceção de erro na forma processual.
Nas suas alegações recursivas, formulou as seguintes conclusões:

«A) O TRIBUNAL A QUO JULGOU IMPROCEDENTE A RECLAMAÇÃO QUANTO À INADMISSIBILIDADE DA PENHORA POR NULIDADE DA CITAÇÃO E DEU POR VERIFICADA A EXCEÇÃO DE ERRO NA FORMA PROCESSUAL, ABSOLVENDO O IGFSS, IP, DA INSTÂNCIA.

B) A RECORRENTE NÃO SE CONFORMA COM A DOUTA DECISÃO, COMO MELHOR SE EXPLANARÁ NAS SEGUINTES ALEGAÇÕES, POR PECAR, NOMEADAMENTE, NA ERRADA CONSIDERAÇÃO: A) DA NULIDADE DA CITAÇÃO E B) DA FORMA PROCESSUAL ADEQUADA, EM SEDE DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO.

C) ANALISANDO A DOUTA SENTENÇA E O PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTRUTOR, BEM SE VÊ QUE ANDOU MAL O DOUTO TRIBUNAL LÁ ONDE DIZ QUE A ORA RECORRENTE RECEBEU O AVISO, APONDO O SEU NOME.

D) É QUE, ESQUADRINHANDO O PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTRUTOR, LENDO OS AVISOS UM A UM, COTEJANDO DATAS E ASSINATURAS, BEM SE VÊ QUE O ÚNICO OFÍCIO RECEBIDO NA DATA DADA COMO PROVADA PELO DOUTO TRIBUNAL É O QUE SE COLOU SUPRA, NO QUESITO 10.


E) E, SE DÚVIDAS HOUVESSE, QUEIRA V. EXA. NOTAR QUE O DOUTO TRIBUNAL REFERE O RESPECTIVO N.º DO REGISTO, DESIGNADAMENTE O RP521772318PT.

F) ORA, ANALISANDO O DITO OFÍCIO, BEM SE VÊ QUE O MESMO NÃO FOI, CONTRARIAMENTE AO QUE SUSTENTOU O DOUTO TRIBUNAL, RECEBIDO E ASSINADO PELA ORA RECORRENTE, MAS PELA EXMA. SRA. .... , FUNCIONÁRIA DO ANTIGO ESTABELECIMENTO PARA ONDE O OFÍCIO FOI DIRIGIDO, E COM QUEM A ORA RECORRENTE NÃO TEM QUALQUER CONTACTO HÁ MAIS DE 15 ANOS.

G) SITUAÇÃO TÃO MAIS GRAVE QUANTO É CERTO QUE A MESMA ASSINOU ENQUANTO “DESTINATÁRIA”, RASURANDO O QUADRADO ERRADO E, COMO TAL, NÃO SE COMPROMETENDO A ENTREGAR A ADVERTÊNCIA À DESTINATÁRIA.

H) NO MAIS, É SOBREMANEIRA EVIDENTE QUE, AINDA QUE O OFÍCIO TIVESSE SIDO DEVIDAMENTE ASSINADO, I.E., AINDA QUE A SRA. SORAIA COSTA TIVESSE PREENCHIDO O CAMPO CORRECTO, COMPROMETENDO-SE A DAR CONHECIMENTO DA ADVERTÊNCIA À DESTINATÁRIA, AINDA ASSIM O DOUTO TRIBUNAL TERIA INCORRIDO EM MANIFESTO ERRO DE ANÁLISE, PORQUANTO SUSTENTA, DE FORMA TERMINANTE, QUE A ORA RECORRENTE APÔS O SEU NOME.


I) SE É CERTO QUE O PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTRUTOR É UM VERDADEIRO MISTIFÓRIO DE DOCUMENTOS ALHEIOS AO PRESENTE CASO, NÃO PODE O DOUTO TRIBUNAL ALIJAR AS SUAS RESPONSABILIDADES NEM TAMPOUCO EXIMIR-SE DO CRITÉRIO DE REDOBRADA EXIGÊNCIA A QUE SE ENCONTRA ADSTRITO, SOBRETUDO NUMA MATÉRIA TÃO MELINDROSA COMO A QUE ESTÁ EM CAUSA.

J) SENDO CERTO QUE “NOS CASOS EXPRESSAMENTE PREVISTOS NA LEI, É EQUIPARADA À CITAÇÃO PESSOAL A EFECTUADA EM PESSOA DIVERSA DO CITANDO, ENCARREGADA DE LHE TRANSMITIR O CONTEÚDO DO ACTO, PRESUMINDO-SE, SALVO PROVA EM CONTRÁRIO, QUE O CITANDO DELA TEVE OPORTUNO CONHECIMENTO”, TAL PRESUNÇÃO, PORQUE IURIS TANTUM, DEVE CEDER NOS CASOS EM QUE A PESSOA DIVERSA DO CITANDO NÃO SE COMPROMETEU A TRANSMITIR O CONTEÚDO DO ACTO, COMO SUCEDEU, INDUBITAVELMENTE, NO PRESENTE CASO.

K) DE FACTO, ATENTA A APOSIÇÃO DA ASSINATURA E O ERRADO PREENCHIMENTO DO AVISO, NÃO SE PODE SUSTENTAR, COM MÍNIMA SERIEDADE, QUE A CARTA FOI EFECTIVAMENTE ENTREGUE À DESTINATÁRIA E ORA RECORRENTE.

L) EVIDENTEMENTE QUE, ANALISADO O OFÍCIO, O DOUTO TRIBUNAL NÃO ESTAVA LEGITIMADO A SUSTENTAR QUE A) O DISTRIBUIDOR DO SERVIÇO POSTAL PROCEDEU À IDENTIFICAÇÃO DAQUELE A QUEM A CARTA FOI ENTREGUE; OU B) QUE A CITAÇÃO POSTAL FOI RODEADA DO CUMPRIMENTO RIGOROSO DAS FORMALIDADES LEGAIS.


M) DAÍ ABRANTES GERALDES REFERIR, NA MESMA OBRA, QUE “PROVADOS FACTOS INSTRUMENTAIS OU CIRCUNSTANCIAIS, O JUIZ DEVE BAIXAR O NÍVEL DA “FASQUIA” DA CONVICÇÃO (…)”.

N) EM TODO O CASO, A LEI DESIGNA OS CASOS EM QUE SE DEVE TER COMO VERIFICADA A FALTA DE CITAÇÃO (CFR. Nº 1 DO ARTIGO 195.º DO CPC ANTERIOR AO DE 2013 E, Nº 1, DO 188.º DO CPC DE 2013): “1 - HÁ FALTA DE CITAÇÃO: A) QUANDO O ATO TENHA SIDO COMPLETAMENTE OMITIDO; B) QUANDO TENHA HAVIDO ERRO DE IDENTIDADE DO CITADO; C) QUANDO SE TENHA EMPREGADO INDEVIDAMENTE A CITAÇÃO EDITAL; D) QUANDO SE MOSTRE QUE FOI EFETUADA DEPOIS DO FALECIMENTO DO CITANDO OU DA EXTINÇÃO DESTE, TRATANDO-SE DE PESSOA COLETIVA OU SOCIEDADE; E) QUANDO SE DEMONSTRE QUE O DESTINATÁRIO DA CITAÇÃO PESSOAL NÃO CHEGOU A TER CONHECIMENTO DO ATO, POR FACTO QUE NÃO LHE SEJA IMPUTÁVEL.”.

O) IN CASU, ESTAMOS EM CRER QUE, ESCRUTINADOS OS DOCUMENTOS À LUZ DAS REGRAS DA EXPERIÊNCIA, PODEMOS ESTAR PERANTE UM CASO DE ERRO DE IDENTIDADE DO CITADO, PORQUANTO PESSOA DIVERSA DO CITANDO ASSINOU O OFÍCIO NA QUALIDADE DE DESTINATÁRIA.

P) NO ENTANTO, AINDA QUE ASSIM NÃO SE CONSIDERASSE, A SITUAÇÃO SERIA, EM TODO O CASO, FACILMENTE ENQUADRADA NA ALÍNEA E) SUPRACITADA.


Q) CORROBORANDO ESTE ENTENDIMENTO, CITE-SE O ACÓRDÃO SUPRAMENCIONADO, NOMEADAMENTE QUANDO ESCREVE QUE “HÁ FALTA DE CITAÇÃO, SEGUNDO O CRITÉRIO PLASMADO NA LEI PROCESSUAL, DESIGNADAMENTE, NÃO SÓ QUANDO NÃO EXISTA QUALQUER APARÊNCIA DE CITAÇÃO (POR OMISSÃO COMPLETA DO ATO), QUANDO TENHA SIDO CITADA PESSOA DIVERSA DO CITANDO, OU DEPOIS DO SEU FALECIMENTO/EXTINÇÃO, OU, SE NO ATO SE TENHA EMPREGUE INDEVIDAMENTE A CITAÇÃO EDITAL.”

R) ADEMAIS, DIGA-SE, NA SENDA DO ACÓRDÃO SUPRAMENCIONADO, QUE “SE A CARTA FOR ENTREGUE A TERCEIRA PESSOA, DEVE ESTA SER ADVERTIDA DO NECESSÁRIO CUMPRIMENTO DO DEVER DE PRONTA ENTREGA AO CITANDO E DETETANDO-SE QUE O AVISO DE RECEÇÃO FOI ASSINADO POR TERCEIRO E A CARTA ENTREGUE A PESSOA DIVERSA DO CITANDO, HAVERÁ QUE REMETER CARTA REGISTADA AO CITADO, NOS TERMOS E COM AS PRESCRIÇÕES LEGAIS (CFR. ARTIGO 241.º DO CPC, ANTERIOR AO DE 2013 E ARTIGO 233.º DO CPC DE 2013).”

S) ORA, NÃO SE RECONHECE ESTA SEGUNDA CARTA, PELO QUE TAMBÉM AQUI SE VERIFICA A INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES LEGAIS.

T) DONDE, AINDA QUE SE ADMITA A ERRÓNEA ARGUMENTAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA EM SEDE DE RECLAMAÇÃO, SEMPRE SE DIRÁ QUE ESTAMOS PERANTE UM CASO DE NULIDADE DA CITAÇÃO, PORQUANTO NÃO FORAM OBSERVADAS AS FORMALIDADES PRESCRITAS NA LEI (CFR. N.º DO ARTIGO 198.º DO CPC ANTERIOR AO DE 2013 E, N.º 1, DO 191.º, DO CPC DE 2013).


U) ADEMAIS, DIGA-SE QUE, NO ÂMBITO DO PROCESSO Nº 0201201200033146 E APENSOS, FOI PROFERIDO DESPACHO DE PRESCRIÇÃO QUANTO À EXECUTADA REVERTIDA E ENTÃO RECLAMANTE, ORA RECORRENTE, BEM COMO INATIVADA A REVERSÃO DA EXECUÇÃO E CANCELADAS AS PENHORAS ORDENADAS, JUSTAMENTE PORQUE O IGFSS NÃO LOGROU FAZER PROVA DA CITAÇÃO.

V) OS CASOS, MALGRADO AS DIFERENÇAS, PARTILHAM ENTRE SI CERTA CONTIGUIDADE LÓGICA E CRONOLÓGICA, PELO QUE NÃO TERÁ SIDO UMA PRESUNÇÃO DESORBITADA JULGAR QUE O MESMO HAVIA SUCEDIDO NESTE CASO.

W) REITERE-SE QUE É SOBREMANEIRA EVIDENTE QUE A SITUAÇÃO DESCRITA NOS AUTOS É UM CASO FLAGRANTE DE FALTA DE CITAÇÃO.

X) POR FIM, NOTE AINDA V. EXA. QUE O QUE ORA SE CONTRADITA, ESTRIBADO NO OFÍCIO DOS CTT DO PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTRUTOR, NÃO É, EVIDENTEMENTE, UMA “QUESTÃO NOVA”, MAS TÃO-SOMENTE UM FACTO SUPERVENIENTE CUJA INVOCAÇÃO É PERFEITAMENTE ADMISSÍVEL.

Y) DE FEITO, A ORA RECORRENTE SÓ TOMOU CONHECIMENTO DO DITO OFÍCIO APÓS O ENVIO DA RECLAMAÇÃO, PELO QUE NÃO SE LHE PODIA EXIGIR QUE CARREASSE O MESMO PARA OS AUTOS.

Z) IN CASU, O FACTO SUPERVENIENTE PERTENCE À CATEGORIA DO SEGUNDO SUBTIPO, SENDO UM FACTO ANTERIOR DE QUE A PARTE SÓ TEVE CONHECIMENTO DEPOIS DE FINDO O PRAZO PARA A APRESENTAÇÃO DOS ARTICULADOS.

AA) PELO QUE SE REQUER, EM CONFORMIDADE, A CONSIDERAÇÃO DO MESMO POR PARTE DE V. EXAS.

BB) DE OUTRA BANDA, ANDARAM MAL O DOUTO TRIBUNAL E O IGFSS NA DESCONSIDERAÇÃO DA RECLAMAÇÃO PREVISTA NO ART. 276.º DO CPPT COMO MEIO PROCESSUAL ADEQUADO PARA A OPOSIÇÃO À PENHORA.

CC) TAL NÃO PODE CONSTITUIR SURPRESA ALGUMA, PORQUANTO É MATÉRIA JÁ CONSOLIDADA NA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS CENTRAIS ADMINISTRATIVOS E DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO.

DD) SE NÃO, VEJA-SE O ACÓRDÃO DO TCA SUL, DE 2009-07-15, PROLATADO NO ÂMBITO DO PROCESSO N.º 03043/09, LÁ ONDE REFERE QUE NO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL A OPOSIÇÃO À PENHORA É DEDUZIDA ATRAVÉS DA RECLAMAÇÃO PREVISTA NOS ART. 276 E SEGS. DO CPPT.”.

EE) NATURALMENTE, À DATA, A SITUAÇÃO DA ORA RECORRENTE NÃO SE SUBSUMIA A QUALQUER DAS ALÍNEAS AÍ PREVISTAS, PELO QUE A RECLAMAÇÃO ERA, NESSE MOMENTO, NÃO APENAS O MEIO MAIS ADEQUADO, SENÃO O ÚNICO DE QUE A ORA RECORRENTE DISPUNHA.


FF) OUTROSSIM, LANÇANDO MÃO DOS ARGUMENTOS JÁ AVENTADOS AQUANDO DA RECLAMAÇÃO, DIGA-SE QUE A PRÓPRIA LEI N.º 41/98, DE 4 DE AGOSTO, QUE AUTORIZOU O GOVERNO A APROVAR A LGT, RECONHECE, NA ALÍNEA 29) DO ARTIGO 2.º UM “DIREITO DOS PARTICULARES DE SOLICITAR A INTERVENÇÃO DO JUIZ NO PROCESSO”.

GG) NESTE CONSPECTO, ATENTA A SUPREMACIA DA LGT, RECONHECIDA NO ARTIGO 1.º DO CPPT, E DA NECESSIDADE DE CONFORMAÇÃO DOS PRECEITOS DAQUELA COM A LEI DE AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA QUE É CONDIÇÃO DA SUA CONSTITUCIONALIDADE ORGÂNICA, DEVE, NA SENDA DE JORGE LOPES DE SOUSA, SER RECONHECIDO O DIREITO GLOBAL DE OS INTERESSADOS RECLAMAREM PARA O JUIZ DE TODOS OS ACTOS QUE OS LESEM, TENHAM OU NÃO A CONFIGURAÇÃO OU A DESIGNAÇÃO DE “DECISÕES”.

HH) MAIS SE ACRESCENTA QUE A IMPUGNAÇÃO DE QUAISQUER DECISÕES OU ACTOS ADMINISTRATIVOS LESIVOS, INDEPENDENTEMENTE DA SUA FORMA, CONSTITUI GARANTIA CONSTITUCIONAL, CONSIGNADA NO ARTIGO 268.º, N.º 4, DA CRP.

II) E FOI PRECISAMENTE A OBSERVÂNCIA DESSA GARANTIA CONSTITUCIONAL QUE INSPIROU A LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA – LGT E CPPT – QUE CONFERIU AOS INTERESSADOS O DIREITO DE RECLAMAÇÃO PARA O TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DAS DECISÕES DE ACTOS MATERIALMENTE ADMINISTRATIVOS LESIVOS DOS SEUS DIREITOS E INTERESSES LEGÍTIMOS, PRATICADOS PELO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL.

JJ) DO EXPOSTO, RESULTA SOBREMANEIRA EVIDENTE QUE A RECLAMAÇÃO DO ARTIGO 276.º É UMA VERDADEIRA VÁLVULA DE ESCAPE DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, PELO QUAL É RECONHECIDO AOS PARTICULARES O DIREITO DE SOLICITAREM A INTERVENÇÃO DO JUIZ NO PROCESSO RELATIVAMENTE A QUAISQUER ACTOS LESIVOS PRATICADOS NO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA.

KK) EM TODO O CASO, AINDA QUE A ARGUMENTAÇÃO ORA AVENTADA NÃO SEJA JULGADA PROCEDENTE, O QUE APENAS POR CAUTELA DE PATROCÍNIO SE ADMITE, SEMPRE SE DIRÁ QUE, DATA MAXIMA VENIA, O DOUTO TRIBUNAL NÃO TINHA RAZÕES PARA NÃO PROCEDER À CONVOLAÇÃO PROCESSUAL.

LL) EM PRIMEIRO LUGAR, NÃO É VERDADE QUE A CONVOLAÇÃO ERA INVIÁVEL À DATA DA APRESENTAÇÃO DA RECLAMAÇÃO.

MM) DE FACTO, SE NOS É PERMITIDO LANÇAR MÃO DE UM ARGUMENTO A FORTIORI, SE RECLAMAÇÃO APRESENTADA NÃO FOI EXTEMPORÂNEA, POR MAIORIA DE RAZÃO A OPOSIÇÃO TAMBÉM NÃO SERIA, PORQUANTO O PRAZO DA PRIMEIRA É, COMO V. EXA. SABE, SIGNIFICATIVAMENTE MAIS CURTO (10 DIAS)…

NN) DE FACTO, NÃO SE COMPREENDE QUAL POSSA SER A ALEGADA EXTEMPORANEIDADE MENCIONADA PELO IGFSS.


OO) EM SEGUNDO LUGAR, SEMPRE SE DIRÁ, CITANDO A JURISPRUDÊNCIA DE DESTE DOUTO TRIBUNAL, NOMEADAMENTE O ACÓRDÃO PROLATADO NO ÂMBITO DO PROCESSO N.º 106/09.0BEBJA, DE 10-02-2022, QUE “A CONVOLAÇÃO PROCESSUAL SURGE COMO UM PODER/DEVER E SÓ DEVE SER AFASTADA QUANDO SE MOSTRE INVIÁVEL PERANTE A INIDONEIDADE DA PETIÇÃO INICIAL, A MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO OU A EXTEMPORANEIDADE DA PETIÇÃO EM FUNÇÃO DO MEIO PROCESSUAL ADEQUADO.”.

PP) E, BEM ASSIM, “SE O PEDIDO FORMULADO NA PETIÇÃO É ADEQUADO À FORMA PROCESSUAL IDÓNEA PARA O EFEITO, NÃO SENDO MANIFESTA A IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO E SENDO TEMPESTIVA A PETIÇÃO, IMPÕE-SE AO TRIBUNAL AD QUEM ORDENAR A CONVOLAÇÃO PARA O PROCESSO REPUTADO COMO PRÓPRIO, SENDO, ALIÁS, UMA DECORRÊNCIA DO PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO FORMAL E DO PRO ACTIONE OS QUAIS DEVEM PAUTAR E NORTEAR A ATUAÇÃO DOS JULGADORES, VISANDO-SE, DESSA FORMA, A OBTENÇÃO DE UMA SOLUÇÃO GLOBAL E JUSTA DO LITÍGIO.”.

QQ) TAMBÉM COMO DECORRÊNCIA DO DEVER DE GESTÃO PROCESSUAL, DEVE O JUIZ PROMOVER OFICIOSAMENTE O SUPRIMENTO DA FALTA DE PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS SUSCEPTÍVEIS DE SANAÇÃO, DETERMINANDO A REALIZAÇÃO DOS ATOS NECESSÁRIOS À REGULARIZAÇÃO DA INSTÂNCIA OU, QUANDO A SANAÇÃO DEPENDA DE ATO QUE DEVA SER PRATICADO PELAS PARTES, CONVIDANDO-AS A PRATICÁ-LO.


RR) DONDE, É SOBREMANEIRA EVIDENTE QUE A AVALIAÇÃO DO DOUTO TRIBUNAL QUANTO À VERIFICAÇÃO DE ERRO NA FORMA PROCESSUAL É ERRÓNEA, PORQUANTO (I) A RECLAMAÇÃO DEDUZIDA ERA O MEIO PROCESSUAL ADEQUADO; E (II) AINDA QUE ASSIM NÃO SE ENTENDA, IMPENDIA SOBRE O DOUTO TRIBUNAL O DEVER DE CONVOLAR A PEÇA PROCESSUAL (QUE, NÃO SENDO EXTEMPORÂNEA, NÃO ERA INVIÁVEL).

PELO QUE SE PETICIONA O PROVIMENTO DO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE A DECISÃO ORA RECORRIDA, ASSIM SE FAZENDO A DEVIDA E COSTUMADA JUSTIÇA.»


*

O Recorrido apresentou contra-alegações tendo formulado as conclusões seguintes:
«A) O recurso apresentado pela recorrente foi deduzido contra a sentença proferida em 22/07/2025, que julgou integralmente improcedente a Reclamação quanto à inadmissibilidade da penhora por nulidade da citação e deu por verificada a exceção de erro processual, absolvendo o IGFSS.I.P. da instância;
B) A aludida Douta Sentença proferida pelo tribunal a quo não violou qualquer preceito legal, sendo certa e pertinente, na argumentação e fundamentação, bem como nas considerações em que se baseia, quer quanto à matéria de facto quer de direito;
C) A reclamação que deu origem à douta sentença, ora recorrida, foi perfeitamente delimitada no seu objeto e causas de pedir pela reclamante ora recorrente;
D) É ineficaz a tentativa da recorrente de pretender ampliar o objeto da presente ação por falta de base legal;
E) A enunciação de factos pela recorrente, que serve de base às alegações de recurso, padecem de evidentes irregularidades, falta de rigor e imprecisões, que subvertem os factos e o direito plasmados na Douta Sentença e nos autos;
F) A recorrente invocou a nulidade da citação como fundamento da inadmissibilidade da penhora, contudo, o tribunal a quo analisou a questão em profundidade e concluiu, que a recorrente foi regularmente citada.
G) Acresce, que a recorrente teve conhecimento do processo de execução e da dívida em causa, o que se prova pela sua própria conduta, tanto que em 01-06-2010, a recorrente apresentou um requerimento para pagamento em prestações, validando tacitamente a citação e a existência da dívida. A execução prosseguiu para a penhora apenas depois do incumprimento do plano prestacional que lhe foi deferido.
H) A recorrente inovou em sede de recurso, ao juntar um ofício dos CTT. Tal documento, justificado como um facto superveniente, não pode ser apreciado por este Tribunal, uma vez que não foi apresentado na fase processual adequada e constitui um facto novo.
I) O Tribunal a quo agiu corretamente ao absolver o IGFSS da instância, por ter verificado a exceção de erro na forma processual.
J) A reclamação apresentada pela recorrente carece dos elementos essenciais e obrigatórios de uma Oposição à Execução, a ausência de tais requisitos impede o tribunal de sanar o erro, tornando a convolação legalmente inviável.
Nestes termos, e nos mais de direito, deve o presente recurso ser considerado improcedente, mantendo-se na integra, a sentença recorrida, fazendo-se assim a habitual, JUSTIÇA.»
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O DMMP junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão.

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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«Com relevo para a decisão a proferir resultam provados nos autos os seguintes factos:

A) Em 19/11/2009 foi instaurado na secção de processo executivo de Beja, do IGFSS, IP, o processo de execução fiscal com o nº 0201200900056138 contra a ora Reclamante para cobrança de dívida ao ISS, IP - cfr. processo administrativo;

B) No âmbito do supra citado processo foi expedido ofício de citação, dirigido ao seu domicílio fiscal, sito em Rua .... , sob o registo RP521772318PT - cfr. processo administrativo;

C) O ofício referido na alínea que antecede esta foi recebido em 30/11/2009 - cfr. processo administrativo;

D) A executada apresentou, pelo seu punho, requerimento para pagamento em prestações, em 01/06/2010 o qual foi deferido - cfr. processo administrativo;

E) Por ofício de 15/09/2010 foi remetida notificação de incumprimento do referido requerimento prestacional - cfr. processo administrativo;

F) Sucedeu-se a instauração, contra a mesma executada de diversos outros processos de execução por dívida ao ISS, IP, designadamente os registados sob os nºs:

- 020120100072311 e apensos, para o qual citada por ofício postal registado de 19/09/2010, recebido no seu domicilio em 28/08/2010 - cfr. processo administrativo;

– 0201201100017183 e apensos, para o qual foi citada por ofício postal registado de 19/03/2011, recebido no seu domicilio em 24/03/2011 - cfr. processo administrativo;

- 0201201100037397, para o qual foi citada por ofício postal registado de 13/05/2011, recebido no seu domicilio em 20/05/2011 - cfr. processo administrativo;

- 0201201100047112 e apensos, para o qual foi citada por ofício postal registado de 21/05/2011 - cfr. processo administrativo;

- 0201201100077356 e apensos, para o qual foi citada por ofício postal registado de 17/08/2011, recebido em 25/08/2011, que assinou o aviso de receção - cfr. processo administrativo;


- 0201201200003751 e apensos, para o qual foi citada por ofício postal registado de 25/02/2012, recebido em 12/03/2012, assinando a mesma o aviso de receção - cfr. processo administrativo;

G) Em data não apurada foram os processos de execução supra indicados apensos entre si, especificamente ao indicado na alínea A) o nº 201200900056162, o 201201000072311, o 201201000072320, o 201201100017183, o 201201100017191, o 201201100037397, o 201201100047112, o 201201100047120, 0 201201100047139, o 201201100047147, o 201201100077356, o 201201100077364, o 201201200003751, o 201201200003760, o 20120120003778, o 201201200003786, o 201201300073067, o 201201300073075, o 20120150068586 e o 201201500068616, no valor global de 23.194,75 € - cfr. processo administrativo;

H) Nos anos de 2012 e 2013 o órgão de execução fiscal penhorou o reembolso de IRS da executada, assim como o IVA apurado a restitui[r]-lhe, determinando ainda a penhora de vencimento, créditos e contas bancárias - cfr. processo administrativo;

I) Em 05/04/2014 a executada apresentou junto do órgão de execução fiscal requerimento a solicitar o pagamento em prestações da dívida em cobrança dos processos contra si pendentes e apensos, com o mesmo oferecendo como garantia veículo automóvel e juntando cópia do seu cartão de cidadão - cfr. processo administrativo;

J) Em 15/04/2014 a mesma executada apresentou pedido de anulação do requerimento antes referido - cfr. processo administrativo;

K) Em 23/03/2021 a executada apresentou junto do órgão de execução fiscal pedido de reconhecimento da prescrição da dívida contra si pendente em execuções fiscais, referentes a períodos decorrentes entre 2007 e 2015, no valor global de 58.960,16 euros - cfr. processo administrativo;

L) Por despacho de 31/03/2021 foi indeferido o requerimento mencionado na alínea que antecede esta, reportando-se aos processos de execução referidos em A) e F), além de outros instaurados originariamente contra a executada - cfr. processo administrativo;

M) Em 22/06/2022 a executada apresentou, junto do processo referido em A) e demais contra si pendentes que ao mesmo foram apensos, pedido de revisão do ato tributário, versando sobre a dívida em cobrança, aludindo à falta de citação e à prescrição da mesma - cfr. processo administrativo;

N) No processo de execução fiscal, e apensos, com o nº 0201201400052990, foi remetida citação em reversão dirigida à executada para cobrança de dívida ao ISS, IP, em cobrança pela mesma secção de processo de Beja do IGFSS, IP - cfr. processo administrativo;

O) No processo de execução fiscal nº 0201201200033146 e apenso é executada revertida a aqui executada, sendo devedora originária a sociedade comercial “.... , Lda” - cfr. processo administrativo;

P) No processo de execução fiscal nº 0201201200033146 e outros foi determinada a penhora de vencimento e salário da aí executada, ora Reclamante, na proporção de 1/3 do salário - cfr. processo administrativo;

Q) Penhora que foi comunicada pelo órgão de execução fiscal à entidade patronal da executada, por ofício datado de 05/07/2024, a sociedade comercial .... , Lda - cfr. processo administrativo;

R) No processo de execução fiscal nº 0201200900056138 e outros foi determinada a penhora de vencimento e salário da aí executada, ora Reclamante, na proporção de 1/3 do salário até cobrança do valor de 19.682,18 € - cfr. processo administrativo e doc. junto com a petição inicial;

S) Penhora que foi comunicada pelo órgão de execução fiscal à entidade patronal da executada, por ofício datado de 05/07/2024, a sociedade comercial .... , Lda – cfr. processo administrativo e doc. junto com a petição inicial;

T) Em 19/07/2024 a executada deu entrada à petição inicial que deu origem aos presentes autos - cfr. fls.1 do processo digital;

U) Em 12/05/2025 os autos foram apresentados neste Tribunal Tributário – cfr. fls.1 do processo digital.»


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Factos não provados

Nada foi consignado, na decisão recorrida, quanto a factos não provados.

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Motivação da decisão de facto

«Os factos dados como provados resultam dos documentos constantes do processo.»


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Por pertinente para a decisão, altera-se o conteúdo do facto constante da alínea c), que passará a ter a seguinte redacção:

C) O ofício referido na alínea que antecede esta foi recebido em 30/11/2009 por Soraia Costa, que assinou o aviso - cfr. documento constante do PEF junto aos autos, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto do recurso que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Ora, lidas as conclusões das alegações de recurso, resulta que está em causa saber se o Tribunal a quo errou no seu julgamento ao julgar improcedente a reclamação quanto à inadmissibilidade da penhora por nulidade da citação e verificada a excepção de erro na forma processual, absolvendo o IGFSS, IP da instância.

A presente reclamação foi apresentada contra o acto de penhora de 1/3 do salário da ora Recorrente, no âmbito do PEF que corre termos por dívidas ao IGFSS,IP.

A sentença recorrida, no que à penhora diz respeito, julgou improcedente a reclamação deduzida ao abrigo do artigo 276º e seguintes do CPPT, por inexistência de causa de pedir, já que, para a sentença, não foram apontados vícios ao acto reclamado.

No segmento decisório, que peca por falta de clareza - diga-se - foi dito o seguinte

“Pelo exposto, conclui-se que improcede a reclamação na parte dirigida ao processo de execução fiscal a que respeita o acto impugnado e no demais incorreu a Reclamante em erro na forma de processo em razão do que, por se afigurar tratar-se de uma excepção dilatória, absolve-se consequentemente o IGFSS, IP da instância – cfr. art. 576º, nºs 1 e 2 do CPC:”

Da leitura da sentença parece-nos que o que ali se concluiu e conduziu à decisão de improcedência da reclamação, no que diz respeito à legalidade do acto de penhora reclamado, foi que a ali Reclamante não incluiu na petição inicial nenhum argumento alinhado contra este, não tendo invocado nenhum vício que o pudesse afectar.

O que levou à conclusão de que inexistia causa de pedir, no que respeita ao acto de penhora reclamado e que culminou na decisão de improcedência da reclamação quanto à inadmissibilidade da penhora - se bem compreendemos o segmento decisório.

Pretende a Recorrente que deveria a sentença recorrida procedido à convolação no meio processual adequado.

Importa dizer que a sentença recorrida peca por falta de clareza, já que não se compreende, nem com esforço, quais foram os motivos que conduziram à conclusão de julgar verificada a excepção de erro na forma de processo.

Como vimos já, a primeira parte do segmento decisório respeita ao acto reclamado (embora ali se mencione impugnado) e que julgou improcedente a reclamação.

No que concerne à parte final daquela decisão, reiteramos, não se vislumbram os motivos para a conclusão da verificação de erro na forma de processo.

Se se pretendeu referir à alegação em torno do despacho de reversão, mal se compreende a conclusão de erro na forma de processo, já que a sentença concluiu que tal alegação não tinha razão de ser relativamente ao processo de execução fiscal aqui em causa, uma vez que a Recorrente é, ela própria, a executada, inexistindo qualquer reversão.

Na circunstância de se referir ao conhecimento da alegada falta de citação, não se pode considerar que haja tal erro.

Isto porque, como é jurisprudência reiterada dos tribunais superiores, quando a falta de citação é invocada como vício invalidante do próprio acto reclamando ao abrigo do artigo 276.º do CPPT, deve ser analisada por constituir fundamento da ilegalidade do despacho reclamado, sendo do conhecimento oficioso e pode ser arguida até ao trânsito em julgado (artigo 165.º, n.º 4 do CPPT) – cfr. Acórdão do TCAS de 29/09/2022, processo nº 24/22.7.

Veja-se, neste sentido, o Acórdão do STA de 02/04/2014, proferido no processo n.º 0217/14, transcrevendo-se a parte relevante do sumário:

“I - Se a nulidade do processo executivo por falta de citação do executado é invocada como um dos vícios geradores da invalidade do acto reclamado, e não como fundamento autónomo de reclamação judicial, pode ser apreciada na reclamação deduzida ao abrigo dos artigos 276.º e seguintes do CPPT sem que antes tenha sido arguida perante o órgão de execução fiscal.” (No mesmo sentido vide Acs. do STA de 31/10/2012, processo n.º 0843/12 e de 24/07/2013, processo n.º 1211/13; Ac. do TCAN de 13/09/2013, processo n.º 02508/12.6BEPRT).

Assim sendo, devia o Tribunal a quo conhecer da falta de citação por ter sido arguida enquanto ilegalidade do acto reclamado de penhora de pensão, não se vislumbrando qualquer erro na forma de processo.

Isto dito, a verdade é que, aparentemente, em contradição ao que consta no segmento decisório, a sentença recorrida pronunciou-se quanto à invocada falta de citação, tendo concluído que a Recorrente foi efectivamente citada.

Assim sendo, a conclusão a que se chega é a de que não se verifica erro na forma de processo, nem se alcança a fundamentação da sentença para ter entendido o contrário.

Da nulidade da citação

A Recorrente dissente do entendimento vertido na sentença recorrida de que foi recebido por si, e assinado, o ofício de citação para a execução aqui em causa.

Refere que o recibo foi assinado por outra pessoa que não a Recorrente, e que essa pessoa assinou o aviso enquanto destinatária e não se comprometeu a entregar a advertência à destinatária, sendo certo que a Recorrente não apôs o seu nome, contrariamente ao afirmado na sentença recorrida.

Conclui não poder sustentar-se que a carta foi efectivamente entregue à Recorrente, na qualidade de destinatária, reiterando que estamos perante um caso de nulidade de citação.

Afirma que esta questão é um facto superveniente já que apenas tomou conhecimento do ofício de citação após o envio da reclamação.

Da leitura da sentença recorrida extrai-se que esta não cuidou de apreciar as implicações de a citação ter sido recebida por terceiro, circunstância que lhe cabia levar em consideração, por constar do documento em que se estribou o facto dado como provado na alínea c) do probatório.

Por outro lado, fez afirmações que não correspondem à factualidade dada como provada, nomeadamente quando refere que a Recorrente apôs o seu nome nos avisos a que se referem as alíneas B), C), D) e F).

Vejamos, então.

Do probatório resulta que a sentença recorrida considerou matéria de facto assente que foi expedido ofício de citação, sob registo, dirigido ao domicílio fiscal da Recorrente – Cfr. alínea b).

E que, tal ofício foi recebido em 30/11/2009 – Cfr. alínea C).

É verdade, como refere a Recorrente, que na sentença recorrida se afirmou o seguinte:

“(…) Porém, o que se constata é que a executada foi efectivamente citada para o processo contra o qual se vem insurgir, veja-se o vertido na matéria assente em B), C), D) e F), mediante ofício registado com aviso de recepção dirigido para o seu domicílio[s] fiscal e que a própria recebeu, apondo o seu nome nesses avisos. Dando assim cumprimento ao disposto no nº 3 do art. 35º do CPPT em termos de forma pela qual a citação deve ser efectivada.(…)”

Ora, compulsados os autos, especificamente a documentação que consta do PEF remetido pelo Exequente, a verdade é que não se pode retirar da documentação de suporte que a Recorrente tenha recebido, ela própria, o ofício registado, nem que tenha aposto o seu nome no aviso.

De resto, a nova redacção dada por nós à alínea C) do probatório espelha tal conclusão.

Tem, pois, razão a Recorrente quando afirma que a carta foi recebida por terceiro (Soraia Costa).

Vejamos, agora, se houve incumprimento das formalidades legais, como afirma a Recorrente.

A sentença recorrida, como vimos, concluiu que a Recorrente foi citada, nada tendo dito relativamente ao facto de o aviso de citação ter sido assinado por terceiro. Mais entendeu a sentença recorrida que a Recorrente tinha aposto a sua assinatura no aviso de recepção.

Já vimos que da factualidade por nós alterada resulta que a citação foi recebida por terceiro e não pela Recorrente.

A questão a resolver é a de saber se é válida a citação realizada em pessoa diversa da Recorrente, que assinou o aviso, no qual foi preenchido o quadrado correspondente ao destinatário e não o quadrado destinado ao terceiro.

Afirma a Recorrente que a citação não se pode considerar válida uma vez que a signatária apôs a sua assinatura no campo destinado à “destinatária”, rasurando o quadrado errado e, como tal, não se comprometendo a entregar a advertência à Destinatária.

De acordo com a alínea a) do nº1 do artigo 165º do CPPT a falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado, constitui uma nulidade insanável do processo de execução fiscal.

A falta de citação ocorre, para além dos casos em que ela é omitida, também nas situações previstas no artigo 195º do CPC, na redacção aqui aplicável, ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT, a saber:

“a) quando o acto tenha sido completamente omitido; b) quando tenha havido erro de identidade do citado; c) quando se tenha empregado indevidamente a citação edital; d) quando se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade; e) quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável.”

Como é entendimento pacífico e reiterado da doutrina e da jurisprudência, distintas das situações de falta de citação, são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando a citação tenha sido efectuada, mas sem que tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (vide - artigo 198º, nº 1 do CPC).

Como consta do probatório, para chamar a Recorrente à execução fiscal, o Exequente remeteu carta registada com aviso de recepção para o domicílio fiscal daquela (sendo que a morada não vem posta em causa nos autos), mostrando-se o aviso de recepção que acompanhava a correspondência assinado por uma terceira pessoa, que não a executada - Cfr. alínea c) do probatório.

Analisada a cópia do aviso assinado que consta dos autos, verifica-se que é perfeitamente legível o nome da signatária, sendo que se encontra assinalado com um (V) o quadrado destinado ao destinatário.

Sendo certo que assim é, a verdade é que não se sabe se foi a pessoa que assinou que o terá preenchido, ou se foi o funcionário dos CTT que o fez.

Compulsados os autos e a matéria de facto dada como assente, a verdade é que não há indícios de ter sido emitida qualquer declaração da pessoa a quem foi entregue a citação, no sentido de que se encontrava em condições de a entregar prontamente ao destinatário citando.

Acresce que não sabe se foi feita ao terceiro a advertência expressa, pelo distribuidor postal, de que tinha o dever de prontamente entregar ao destinatário a correspondência que recebeu, o que nos leva a concluir que estamos perante irregularidades que podem ter prejudicado a defesa do citando.

De salientar que a citação constitui um acto processual essencial, já que visa assegurar o direito do executado a defender-se.

De acordo com o previsto no artigo 228.º do CPC:

“1 - A citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de recepção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artigo anterior e ainda a advertência, dirigida ao terceiro que a receba, de que a não entrega ao citando, logo que possível, o faz incorrer em responsabilidade, em termos equiparados aos da litigância de má fé.

2 - A carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de recepção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando.

3 - Antes da assinatura do aviso de recepção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos constantes do cartão do cidadão, bilhete de identidade ou de outro documento oficial que permita a identificação.

4 - Quando a carta seja entregue a terceiro, cabe ao distribuidor do serviço postal adverti-lo expressamente do dever de pronta entrega ao citando.”

No caso concreto, não existem dúvidas que o aviso de recepção foi entregue a uma pessoa que não a Recorrente/Executada.


E, como alega a Recorrente, não se mostra assinalada a quadrícula do aviso de recepção destinada a indicar se o aviso foi assinado por terceiro, concluindo-se que não foi pelo destinatário apenas na medida em que os nomes não coincidem.

Nesta medida, concluímos pela não observância de formalidades essenciais a constar do aviso de recepção, já que não é possível aferir se foi efectuada, pelo distribuidor do serviço postal a advertência prevista no nº4 do artigo supra referido.

Sublinhe-se que só a observância cabal das formalidades previstas para o acto de citação permite fazer operar a presunção de entrega a que se refere o artigo 230.º do CPC.

Nesta medida, concluindo-se pela não observância das referidas normas processuais, com carácter de essencialidade, não há que aferir se a Recorrente logrou ou não ilidir a presunção de que a carta lhe foi entregue e que teve conhecimento da citação que lhe foi dirigida, uma vez que tais considerações dependem da existência (prévia) de uma citação válida e regular.

Conclui-se, assim, que a citação é nula, por ter sido realizada sem as formalidades que se encontram prescritas na lei, o que justifica a procedência do recurso e a revogação da sentença que entendeu ter sido efectuada a citação válida da Recorrente.

Atento o exposto, considera-se que, apesar da aposição da assinatura no aviso de recepção, por terceiro, não estão, neste caso, reunidas as condições para que se considere presumida a citação/notificação pessoal do recorrido.

Procedendo o recurso e revogada a sentença recorrida, temos que verificada a nulidade da citação justifica-se a procedência da reclamação, e, por conseguinte, a anulação do acto de penhora reclamado.


III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a reclamação, assim se anulando o acto de penhora reclamado.

Custas pelo Recorrido.

Registe e Notifique.

Lisboa, 30 de Outubro de 2025

(Isabel Vaz Fernandes)

(Luísa Soares)

(Lurdes Toscano)