Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 302/09.0BELRA |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 07/15/2025 |
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Relator: | MARIA DA LUZ CARDOSO |
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Descritores: | IRC AUDIÇÃO PRÉVIA PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES LEGAIS INEXISTÊNCIA DO FACTO GERADOR DO IMPOSTO |
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Sumário: | I - Do disposto no n.º 7 do artigo 60° da LGT depreende-se uma intenção legislativa no sentido de conferir aos contribuintes uma efetiva participação na formação das decisões que lhes digam respeito, impondo-se que a AT tenha obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão final os elementos novos suscitados na audição pelo contribuinte. II - Contudo, se esses elementos novos são meras conclusões de facto ou factos que não eram antes desconhecidos, inexistindo o aporte de factos pertinentes suscetíveis de prova, tendo a decisão final afastado a consideração desses elementos na mesma com tal fundamento, não existe falta de fundamentação, nem violação do disposto no artigo 60º, n.º 7 da LGT. III - A fundamentação formal, deve esclarecer concretamente a motivação do ato, não podendo sofrer de qualquer obscuridade, contradição ou insuficiência, pois nesse caso o ato considera-se não fundamentado. IV - A ineficácia dos negócios jurídicos não obsta à tributação, no momento em que esta deva legalmente ocorrer, caso já se tenham produzido os efeitos económicos pretendidos pelas partes - cfr. artigo 38º da LGT. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO A I..... Limited (doravante Recorrente) veio recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria a 16.12.2016, que julgou improcedente a impugnação judicial por si intentada, contra o ato de liquidação de IRC n.º 20....... referente ao exercício de 2004, no valor de €77.801,24. * Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formulou, a final, as seguintes conclusões: “I. Os presentes autos estão feridos de invalidade adveniente da omissão de fundamentação constante na decisão por parte da AT, designadamente no que concerne aos factos alegados em sede de Audiência Prévia, e não tomados em consideração pela mesma. II. Da Douta Sentença ora em recurso consta que a AT não se encontra sujeita à obrigação de fundamentar a sua decisão, em mais do que aquilo que a mesma fundamentou. III. No entanto, e salvo o devido respeito, entende-se existir nos presentes autos uma clara violação das formalidades legais expressamente consagradas, designadamente no artigo 60° da LGT, porquanto estabelece o regime legal não apenas a obrigação de a AT comunicar ao sujeito passivo o projecto da decisão e sua fundamentação, bem como a adstrição a ter obrigatoriamente em conta nessa fundamentação da decisão os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes. IV. Ora neste caso em apreço, consideramos estar patente a inexistência de fundamentação na decisão dos factos novos trazidos pela ora Recorrente em sede de audiência prévia, pelo que se verifica a preterição de uma formalidade legal na decisão da AT que se considera essencial à garantia de defesa dos direitos do contribuinte, e que se repercute numa expressa violação das disposições legais, pelo que comporta obrigatoriedade a anulabilidade da decisão em causa, V. Aliás, como se manifesta ter sido tomado em consideração pelos Tribunais Superiores, quando se depararam com semelhantes situações. VI. Pelo que a preterição de formalidades legais e a falta de fundamentação enfermam os presentes autos e comportam necessariamente a anulabilidade da decisão por violação do regime legalmente consagrado na Lei Fiscal, que tutela o direito de garantia de defesa do contribuinte, implicando o prejuízo da defesa do mesmo, mormente o n° 5 e n° 7 do art. 60° da LGT. VII. Tendo, e salvo o devido respeito, julgado mal o Douto Tribunal a quo ao não declarar a invalidade da decisão, a qual desde já se reitera e invoca, impondo-se a revogação da Douta Sentença. VIII. Por outro lado, acresce que considerou o Douto Tribunal a quo que a declaração de nulidade da doação é ineficaz em relação ao adquirente, pelo que assim não tem qualquer relevância fiscal, mantendo-se a substancia económica dos factos tributários. IX. Acontece que, legalmente, qualquer negócio jurídico declarado nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, não podendo, pois, ter substância económica ou de qualquer outra natureza, Pelo que, não pode a Oponente ser tributada em sede de IRC ou de mais-valias geradas por imóveis que estavam na sua esfera por via de uma doação que veio a ser declarada nula. X. Nos termos fiscais, a transmissão implica uma transferência real ou efectiva dos bens, sendo que a declaração de nulidade colocou em causa e impediu essa transferência real e efectiva, não podendo pois os actos nulos gerarem tributação. XI. Mais, não pode a Oponente ser tributada em sede de impostos pela propriedade e alienação de imóveis, quando tais bens não eram sua propriedade e apenas estiveram titulados em seu nome por um negócio simulado, sob pena de violação do art. 39° da LGT. XII. Por outro lado, a simulação em causa não visou reduzir a tributação, antes pelo contrário, foi o negocio jurídico simulado e declarado nulo que gerou a tributação, XIII. Acresce, ainda, que a declaração de nulidade dos negócios foi suscitada por um terceiro e o adquirente interveio nos autos judiciais em que a nulidade foi declarada. XIV. Em suma, no caso sub iudice pretendeu a Administração Fiscal e agora o Douto Tribunal a quo, salvo o devido respeito, aplicar precisamente o contrário do que a norma legal prevê, pois pretendem manter a tributação de um acto simulado e que sabem não ser real, quando o acto simulado não visou a redução da tributação (ao invés, gerou a mesma). Nestes termos e nos melhores de Direito, deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser revogada a Douta Decisão proferida pelo Tribunal a quo, julgando-se procedente a oposição apresentada, verificando a anulação da decisão tomada pela AT por preterição de formalismos legais ou, no limite, por violação do regime legal aplicável.” *** A Fazenda Pública (doravante Recorrida),notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações. *** O Ministério Público neste Tribunal Central Administrativo Sul, emitiu parecer no sentido de ser julgada verificada a incompetência absoluta deste TCA, em razão da hierarquia, porquanto o mérito do recurso é exclusivamente de direito, sendo competente para a sua apreciação a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. *** Notificadas do aludido parecer, apenas a Recorrente se pronunciou, pugnando pela competência do Tribunal Central Administrativo Sul para conhecer o recurso, por considerar que os fundamentos do recurso assentam em factos materiais e ocorrências factuais e não matéria exclusiva de direito, que apelam apenas a normas ou princípios jurídicos que possam ter sido violados na interpretação e aplicação do direito. *** Colhidos os vistos legais (artigo 657º, n. º2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), cumpre apreciar e decidir. *** Delimitação do objeto do recurso Em ordem ao consignado no artigo 639º do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282º do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, cumpre, em primeiro lugar, apreciar a questão prévia da competência deste Tribunal para conhecer do presente recurso em razão da hierarquia, aqui suscitada pelo Ministério Público e contestada pela Recorrente. Em caso de improcedência da questão da incompetência, ponderando o teor das conclusões de recurso, cumpre aferir: - se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar não verificada a preterição de formalidades legais e a falta de fundamentação; - se a decisão recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do direito, ao considerar que a declaração de nulidade da doação e da compra e venda não afeta a tributação de mais-valias. *** II. FUNDAMENTAÇÃO II.1- De facto “A) A Impugnante é uma sociedade não residente sem estabelecimento estável em território nacional, com sede em Guernsey - cfr. fls. 76 do Processo Administrativo (PA) apenso aos Autos e fls. 138 do Processo de Reclamação apenso aos Autos; B) Em 3/06/1993, foi outorgado entre J......... e mulher e Dr. D........., em representação da “I..... Limited", o instrumento junto a fls. 25 a 31 do Processo Administrativo apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, intitulado “Doação”, ali identificados, respectivamente, como Primeiros Outorgantes e Segundos Outorgantes, através do qual o primeiro outorgante, declarou doar ao segundo os prédios constantes da relação elaborada em anexo; C) Conjuntamente com o instrumento referido na alínea anterior, foi elaborada a relação de bens constante a fls. 32 a 53 do Processo Administrativo apenso aos Autos, e onde consta o prédio urbano sito em S. Pedro de Moel, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9.........; D) Em 11/11/2004, foi outorgado entre a Impugnante e J......... o instrumento junto a fls. 56 a 58 do Processo Administrativo apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, intitulado “Compra e Venda”, ali identificados, respectivamente, como Primeiros Outorgantes e Segundos Outorgantes, através do qual o primeiro outorgante, declarou vender ao segundo, pelo preço de 80.000,00€ o prédio urbano sito em S. Pedro de Moel, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9.........; E) Em 15/05/2006, em cumprimento da Ordem de Serviço n.° OI200600534, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Leiria da DGCI, desencadearam à Impugnante a acção de inspecção relativamente ao exercício de 2004, em sede de IRC, no âmbito da qual procederam a correcções à matéria tributável, com recurso a correcções meramente aritméticas, no valor de 311.204,99€ - cfr. fls. 74 do Processo Administrativo apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; F) Em 20/07/2006, foi remetido pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Leiria para a Impugnante, por carta registada, o instrumento constante a fls. 1 do PA apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, e onde consta que a Impugnante poderá exercer o direito de audição por escrito ou oralmente, sobre o projecto de correcções do Relatório da Inspecção referida na alínea anterior; G) Em 4/08/2006, foi elaborado pelos Serviços da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Leiria o instrumento constante a fs. 75 a 83 Processo Administrativo apenso aos Autos, denominado de “Relatório de Inspecção Tributária", cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos e onde consta o seguinte: « (...) III. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável III.1- Em sede IRC No dia 3 de Junho de 1993, J......... com NIF: 1......... e a mulher, L........., com NIF: 1….., ambos residentes na Rua ......... - Leiria fizeram uma doação à sociedade " I..... Limited" numero duzentos mil cento e cinquenta e seis, com sede em D…, Dublin dois, República da Irlanda de 46prédios e direitos constantes da relação elaborada nos termos do artigo setenta e oito do código do Notariado, com exclusão da verba número quinze à referida sociedade, cujo procurador foi Dr. M......... tendo-lhe sido conferido na "Procuração " os mais amplos poderes forenses em direito permitidos, anexo n° 2. No dia 5 de Junho de 2002, compareceu no Serviço de Finanças de Pombal 2 o Sr. Dr. N........., com o NIF: 1……., na qualidade de gestor de negócios da firma I..... Limited para pagar a Sisa N° 654/1322/2002, referente à aquisição por parte desta sociedade dos prédios com o artigo matricial n° 1......... (urbano) e 1......... (rústico) a J........., com o NIF 1…... Porém estes dois prédios fazem parte da lista dos 46 prédios que foram doados por J......... e sua mulher L......... à referida sociedade em 1993, anexo n° 3. No dia 6 de Junho de 2002, compareceu no Serviço de Finanças de Pombal 2 o SR. P........., com o NIF: 1….., na qualidade de gestor de negócios da firma J…… SA, NIPC: 50….., para pagar a Sisa N° 661/1332/2002, referente à compra dos dois prédios acima mencionados ( 1......... e 1.........) à firma I..... Limited, pelo preço de 53 634,15€para o prédio rústico 1......... e de 67 027,74, para o prédio urbano 1........., anexo n° 4. Da consulta ao sistema informático da DGCI - consulta ao património, em nome da sociedade apenas consta no exercício de 2002 um prédio rústico com o artigo 'matricial n° 1…. e no exercício de 2003 dois prédios, um rústico com o artigo matricial n° 1…. e um urbano com o artigo matricial n°9........., anexo n°5. Deslocámo-nos aos Serviços de Finanças de Pombal 2, a fim de obter elementos relacionados com a sociedade I..... Limited tendo-nos sido transmitido por um funcionário que em virtude de não ter sido feita a transferência matricial para a referida sociedade os prédios que lhe foram doados permanecem em nome de J......... (entidade doadora) e não em nome da sociedade, com excepção dos dois prédios acima referidos. O prédio rústico acima mencionado com o artigo matricial n? 1…., doado à Sociedade I..... Limited em 1993, foi alienado a J….. SA com o NIPC 50….. em 1998/03/24, Sisa n° 328198, anexo n° 6. O prédio urbano também acima referido com o artigo matricial n° 9........., também doado à Sociedade, foi alienado a J......... com o NIF 11….. em 2004/11/11- 2° C.N. Lisboa, anexo n° 7. Da consulta ao sistema informático da DGCI, verificámos que a sociedade não tinha • representante fiscal em IRC nem entregou qualquer declaração de rendimentos modelo 22 e a correspondente declaração anual previstas nos artigos 109°, 112° e 113° do CIRC. A sociedade não designou um representante fiscal a que estava obrigada nos termos do artigo 118° do IRC:" as entidades que não tenham sede nem direcção efectiva em território nacional, e aí não possuam estabelecimento estável, mas nele obtenham rendimentos, são obrigados a designar uma pessoa singular ou colectiva com residência, sede, ou direcção efectiva naquele território, para as representar perante a administração fiscal, quanto às suas obrigações em sede de IRC". As obrigações de designação de representante fica assim dependente do facto de os prédios em questão gerarem rendimento sujeito a tributação. Nos termos do n° 3 do artigo 118° "na falta de designação de representante fiscal, independentemente da penalidade que ao caso couber, não há lugar às notificações previstas neste Código, sem prejuízo de os sujeitos passivos poderem tomar conhecimento das matérias a que as mesmas respeitariam junto da D.G.C.I." A morada da sede da sociedade I..... Limited constante do sistema informático (Rua ......... - Leiria) é também a morada da residência de J......... ( entidade doadora), anexo n°8. Face ao anteriormente exposto no dia 29 de Maio de 2006, foi notificada por escrito a Sociedade I..... limited na pessoa de J......... para comparecer no dia 06/06/2006 na Direcção de Finanças de Leiria a fim de prestar esclarecimentos relacionados com a sociedade. Apesar de não ter comparecido à notificação, enviou uma carta à informar que não era representante fiscal da referida sociedade. Também foi novamente notificada por escrito a sociedade na pessoa do Sr. J......... para efectuar a prova nos termos previstos no n°3 do artigo 51° do CIRC referente e ao prédio urbano com o artigo matricial n° 9.......... Apesar de o Sujeito Passivo não ter feito prova de que o imóvel não tivesse sido fruído ou se encontrasse devoluto, nos termos previstos no n03 do artigo 51° do CIRC, vem novamente reafirmar que não é representante fiscal. Foi ainda notificado o Sr. N........., na qualidade de gestor de negócios da sociedade I..... Limited a fim de exibir os elementos de escrita e prestar os esclarecimentos necessários sobre a actividade desenvolvida pela sociedade, já que nos termos do n° 1 do art°. 27° da LGT o gestor de negócios assume a " responsabilidade solidária com o Sujeito Passivo não residente por todas as contribuições e impostos deste último relativas ao exercício a seu cargo", sendo que nos termos do n° 2 daquele normativo legal se consideram " Gestores de bens ou direitos todas as pessoas singulares ou colectivas que assumam ou sejam incumbidas, por qualquer meio, da direcção de negócios • de entidade não residente em território português, agindo no interesse e por conta dessa entidade". Face ao exposto vamos efectuar as correcções relacionadas com os seguintes prédios fruídos e transmitidos pela sociedade I..... Limited: “(texto integral no original; imagem)” III.1.1 - Exercício de 2002 O rendimento tributável em sede de IRC será determinado da seguinte forma: 1- Mais valia não declarada Na sequência do já referido no ponto 111.1, os prédios com os artigos matriciais 1......... e 1......... foram doados por parte de J......... à sociedade (I..... Limited 1993) com o valor patrimonial global de 32 537,67€, tendo sido alienados ambos por esta sociedade em 2002 a J......... SA pelo valor de 120 661,89€ (53 634,15€ para o prédio rústico e 67 027,74€ para o prédio urbano). Donde a mais-valia fiscal calculada e não declarada será determinada da seguinte forma: Mais Valia Fiscal = Valor de realização - (Valor de aquisição X coeficiente de correcção monetária) nos termos do art°. 50° n° 1 do CIRS por remissão do art° 51° do CIRC. 120 661,89€- (32 537,67€ X 1,3) = 78 362,92 €. 2- Correcção nos termos do Art° 51° do IRC Conforme já foi referido anteriormente, dado que o sujeito passivo foi notificado para fazer prova prevista nos termos do art° 51° do CIRC relativamente ao prédio urbano com o artigo matricial n° 9......... e dado a mesma não ter sido feita, nos termos dos n°s 2 e 3 do art° 51° do CIRC, não se encontrando o prédio urbano arrendado nem afecto a uma actividade económica e não tendo sido demonstrado que o mesmo se encontrava devoluto, considera-se como rendimento predial bruto para cada período de tributação (exercício) o montante correspondente a 1/15 do respectivo valor patrimonial. Rendimento Predial Bruto = 1/15 x Valor Patrimonial Valor patrimonial do prédio n° 9......... em 2002 54 171,83€ Valor a corrigir: 1/15 do valor patrimonial (54 171,83€ x 1/15) 3611,46€ III.1.2. - Exercício de 2003 Valor patrimonial do prédio n° 9......... em 2003 54 171,83€ Valor a corrigir: 1/15 do valor patrimonial (54 171,83€ x 1/15) 3611,46€ III.1.3. - Exercício de 2004 1-Mais valia não declarada De acordo com o exposto anteriormente o prédio com o artigo matricial 9......... foi doado à sociedade (1993) com o valor patrimonial global de 9 442,13€, tendo sido alienado em 11/11/2004 a J......... (entidade doadora) pelo montante de 80 000,00€. Porém o prédio foi avaliado nos termos do IMT pelo valor patrimonial de 321 320, 00€, anexo n° 9. De acordo com o disposto no art° 58° A do CIRC e art°s 31° - A e art° 50 n° 1 do CIRS, por remissão do art° 51° do CIRC, para determinação do lucro tributável sempre que o valor do contrato seja inferior ao valor patrimonial definitivo do imóvel, o valor a considerar pelo alienante e adquirente, será o último. Donde a mais-valia fiscal calculada e não declarada será determinada da seguinte forma: Mais Valia Fiscal = Valor de realização - (Valor de aquisição X coeficiente de correcção monetária) 321 320,00€- (9 442,13 x 1,39) = 321 320,00 - 13 124,56 = 308 195,44 2- Correcção nos termos do Art° 51° do IRC Valor patrimonial do prédio antes da avaliação 54 171,83€ Valor a corrigir: 1/15 do valor patrimonial ((54 171,83€ x 1/15)/12x10a)) 3 009,55€ a) Nota: Só se tributa 10 meses, pois o prédio foi alienado no mês de Novembro Em resumo temos as seguintes correcções propostas em Sede de IRC: Descrição 2002 2003 2004 Correcções propostas Mais-valia fiscal não declarada (Cat. G) 78 362,92 308 195,44 Correcções da Categoria F 3611,46 3611,46 3 009,55 Lucro Tributável Proposto 81 974,38 3611,46 311 204,99 III.2-BAO -Início de actividade/cessação de actividade Para efeitos de tratamento dos documentos de correcção referentes aos exercícios de 2002, 2003 e 2004 procedeu-se à elaboração do B.A.O. com início de actividade em 01/01/2002 e cessação oficiosa para efeitos de IRC a 30/11/2004 nos termos do n° 6 do art° 8 do CIRC. (…)»; H) Em 17/11/2006, foi emitida pela Administração Fiscal em nome da Impugnante, a liquidação de IRC n.° 20......., referente ao exercício de 2004, no valor de 77.801,24€ - cfr. fs. 109 do PA apenso aos Autos; I) Em 7/03/2008, foi proferido pelo Tribunal Judicial de Leiria a homologação da transacção do processo n.° 7837/07.8 TBLRA, nos seguintes termos: «Nos presentes autos de acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário que T......... instaurou contra J........., L......... e I..... Limited acordaram as partes pôr termo aos autos, mediante transacção subordinada às cláusulas constantes de fls 101. Atenta a disponibilidade dos direitos em causa e a qualidade dos intervenientes, homologo a transacção de fls 101 e consequentemente declaro a nulidade da escritura de doação outorgada no dia 03.06.1993 identificada em 14° da p.i e da escritura de compra e venda outorgada no dia 11.11.2004 no 2° Cartório Notarial de Lisboa, referida no art° 48° da p.i, reconhecendo os Réus J........., L......... proprietários dos imóveis descritos na cláusula terceira com o consequente cancelamento dos registos mencionados na cláusula quarta.» - cfr. fls. 23 do Processo Administrativo apenso aos Autos; J) Em 9/09/2008, a Impugnante apresentou junto do SF de Leiria 1 a Reclamação Graciosa da liquidação referida na alínea anterior - cfr. fls. 2 do Processo de Reclamação apenso aos Autos; K) Em 31/12/2008, foi elaborado o projecto de decisão constante a fls. 113 a 116 do Processo de Reclamação apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; L) Em 14/01/2009, foi remetido pela Direcção de Finanças de Leiria para a Impugnante, por carta registada, o instrumento constante a fls. 117 do Processo de Reclamação apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, e onde consta que a Impugnante poderá exercer o direito de audição por escrito ou oralmente, sobre o projecto de indeferimento da reclamação graciosa referida em J); M) Em 23/01/2009, a Impugnante apresentou junto da Direcção de Finanças de Leiria, a resposta à audição prévia constante a fls. 119 a 124 do Processo de Reclamação apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; N) Em 27/01/2009, a Reclamação referida na alínea anterior foi indeferida - cfr. fls. 137 do Processo de Reclamação apenso aos Autos; O) Em 2/02/2009, a Direcção de Finanças de Leiria remeteu para a Impugnante, por carta registada e com aviso de recepção, sob o ofício n.° 00151, o instrumento constante a fls. 141 do Processo de Reclamação apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, e onde consta a notificação do indeferimento da reclamação graciosa referida na alínea anterior; P) O “Aviso de recepção’" referido na alínea anterior foi assinado a 3/02/2009 - cfr. fls. 143 do Processo de Reclamação apenso aos Autos; Q) A PI deu entrada no TAF de Leiria, por correio registado de 18/02/2009 - cfr. fls. 1 e 154 dos Autos.” *** Factos não provados “Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.” *** Motivação “A convicção que permitiu dar como provados os factos acima descritos assentou no teor dos documentos constantes nos Autos e nos Processos Administrativos apensos aos mesmos, conforme discriminado em cada uma das alíneas dos Factos Assentes, bem como, nos depoimentos das testemunhas arroladas. Todavia, não foi tido em conta o depoimento de T…….., filha do Sr. J........., porque não presenciou os factos em questão, tendo também o Tribunal sentido que a mesma não prestou um depoimento por forma a concluir-se estar imbuído do distanciamento necessário para ser isento, não logrando, por isso, convencer o tribunal da sua veracidade. Quanto ao depoimento de C......... - Inspectora Tributária - veio confirmar os factos relatados no Relatório da Inspecção.” *** Ao abrigo do disposto no artigo 662º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, acorda-se em alterar as alíneas M), N) e O) da matéria de facto dada como provada, densificando-a, para melhor inteligibilidade, nos termos que se seguem: M) Em 23/01/2009, a Impugnante apresentou junto da Direcção de Finanças de Leiria, a resposta à audição prévia constante a fls. 119 a 124 do Processo de Reclamação apenso aos Autos, com o seguinte teor: “(texto integral no original; imagem)”
“(texto integral no original; imagem)”
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N) Em 27/01/2009, a Reclamação referida na alínea anterior foi indeferida, com a seguinte fundamentação:
“(texto integral no original; imagem)”
- cfr. fls. 137 do Processo de Reclamação apenso aos Autos; O) Em 2/02/2009, a Direcção de Finanças de Leiria remeteu para a Impugnante, por carta registada e com aviso de recepção, sob o ofício n.° 00151:
“(texto integral no original; imagem)”
- cfr. fls. 141 do Processo de Reclamação apenso aos Autos.
*** II.2 - De direito Tendo presente a delimitação do objeto do recurso e a relação de prejudicialidade que existe para a apreciação das restantes questões se for dada resposta afirmativa à questão de incompetência hierárquica, é, naturalmente, por esta questão que iniciaremos o nosso julgamento. E, fazendo-o, recordamos, antes de mais, que embora a questão da competência hierárquica, no caso, tenha sido suscitada pelo Exmo. Procurador-Geral-Adjunto no seu douto parecer, a sua apreciação impor-se-ia sempre a este Tribunal Central Administrativo, por ser questão de ordem pública, prioritária em relação a qualquer outra, de conhecimento oficioso e suscetível de ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final [cfr. artigos 13º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 16º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)]. Vejamos, então, começando por realçar que nos termos do disposto nos artigos 26º, alínea b), e 38º, alínea a), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280º, n.º 1, do CPPT, a competência para conhecer dos recursos das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância em matéria de contencioso tributário, pertence à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo quando os recursos tenham por exclusivo fundamento matéria de direito, constituindo uma excepção à competência generalizada dos tribunais centrais administrativos, aos quais cabe conhecer «dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários, salvo o disposto na alínea b) do artigo 26.º» [art. 38º, alínea a), do ETAF]. Há, assim, para aferir da competência em razão da hierarquia do Supremo Tribunal Administrativo, que olhar para as conclusões da alegação do recurso e alegações que as suportam e verificar se, em face das mesmas, as questões controvertidas se resolvem mediante uma exclusiva atividade de aplicação e interpretação de normas jurídicas, ou, pelo contrário, essa resolução implica a necessidade de dirimir questões de facto - seja por insuficiência, excesso ou erro no apuramento da factualidade que foi dada por provada na decisão recorrida, quer por se entender que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer por se sustentar que a prova produzida foi incorretamente apreciada ou por se divergir das ilações de facto retiradas da facticidade apurada. *** Discorda a Recorrente do teor da sentença recorrida, porquanto considera existir erro de julgamento, por no seu entender, da prova produzida e levada aos autos, não se poderem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida. Na sua petição de impugnação, defendeu a Impugnante (ora Recorrente) em síntese, que a Administração Tributária não teve em consideração a sua pronúncia, onde alegou factos novos, supostamente impeditivos da tributação, em sede de audição prévia no âmbito do procedimento de reclamação graciosa. Mais argumentou que a preterição de tal formalidade implica a falta de fundamentação do ato decisório. Alegou ainda a Impugnante, que a liquidação de IRC em causa nos autos foi emitida atendendo à compra e venda que foi declarada nula, devendo por isso ser considerada inexistente. O Tribunal a quo entendeu que a razão não estava do seu lado. * A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, alegando em suma, que o Tribunal a quo errou ao considerou que a Administração Tributária não se encontra sujeita à obrigação de fundamentar a sua decisão, em mais do que aquilo em que a mesma fundamentou. Entende a Recorrente, que no caso em apreço, está patente a inexistência de fundamentação na decisão relativamente aos factos novos trazidos pela ora Recorrente em sede de audiência prévia exercida no procedimento de reclamação graciosa, pelo que se verifica a preterição de uma formalidade legal na decisão da Administração Tributária que se considera essencial à garantia de defesa dos direitos do contribuinte, e que se repercute numa expressa violação das disposições legais, pelo que comporta obrigatoriedade a anulabilidade da decisão em causa. Por outro lado, alega a Recorrente, que considerou o Tribunal a quo que a declaração de nulidade da doação é ineficaz em relação ao adquirente, pelo que assim não tem qualquer relevância fiscal, mantendo-se a substância económica dos factos tributários, o que no seu entender, não está correto, pois, qualquer negócio jurídico declarado nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, não podendo, pois, ter substância económica ou de qualquer outra natureza. Pelo que, não pode a ora Recorrente ser tributada em sede de IRC ou de mais-valias geradas por imóveis que estavam na sua esfera por via de uma doação que veio a ser declarada nula. Advoga ainda, que, não pode a ora Recorrente ser tributada em sede de impostos pela propriedade e alienação de imóveis, quando tais bens não eram sua propriedade e apenas estiveram titulados em seu nome por um negócio simulado, sob pena de violação do artigo 39° da LGT. Com tais fundamentos, entende a Recorrente, que deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser revogada a decisão proferida pelo Tribunal a quo. “INFORMAÇÃO / DECISÃO FINAL ASSUNTO: Reclamação Graciosa n.° 700 Reclamante: l…… Limited NIF: 9… Matéria Reclamada: IRC DOS FACTOS 1. Veio o sujeito passivo, acima identificado, em 9 de Setembro de 2008, deduzir reclamação graciosa contra a liquidação de IRC, respeitante ao exercício do ano de 2004, no montante de € 77.801,24, com as alegações que se dão por reproduzidas. 2. O reclamante goza de legitimidade (art.° 65° da Lei Geral Tributária) e o pedido é tempestivo. 3. Atentos os fundamentos da petição, procede-se, de seguida, à sua análise. DO DIREITO 4. Para um cabal esclarecimento, foi pedida informação aos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária. Dada a sua manifesta relevância, transcreve-se, para uma correcta apreciação do caso em apreço, o seguinte: "(...) 2. Análise da Petição (...) 2.1. Em 3-06-1993, foi celebrada escritura de doação em que J......... e L......... outorgaram como doadores do prédio urbano sito na R. ......... da freguesia da Marinha Grande, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9......... a favor da donatária "l…… Limited" NIPC 9….. com sede em P… Richmond House, ST. Annes Place, St. Peter Por, em Guernsey (...). 2.2. A sociedade reclamante é uma sociedade não residente sem estabelecimento estável em território nacional, sedeada na Ilha do Canal (Guernsey), território sujeito a um regime fiscal privilegiado claramente mais favorável, constante do n° 14 da lista aprovada pela Portaria n° 150/2004, de 13 de Fevereiro. 2.3. Em 11-11-2004 no segundo Cartório Notarial de Lisboa, foi celebrada uma escritura de compra e venda em que, pelo preço de oitenta mil euros, a sociedade I..... Limited vende a J........., o prédio sito na R ........., freguesia da Marinha Grande, inscrito na matriz predial sob o artigo 9......... com o valor patrimonial de 54 171,83 (...). 2.4. Em 14 de Junho de 2006 o sujeito passivo I......... Limited foi notificado para fazer a prova prevista no artigo 51° do CIRC (...) em relação ao prédio com o artigo matricial n° 9......... e dado que a mesma não foi feita nos termos do artigo 510 n° 2 e 3 do CIRC não se encontrando o prédio urbano arrendado, nem afecto a uma actividade económica e não tendo sido demonstrado que o mesmo se encontra devoluto, foi considerado como rendimento predial bruto para o exercício de 2002 o montante correspondente a 1/15 do respectivo valor patrimonial, ou seja, 54 171,83 X 1/15=3 611,46. 2.5. Relativamente ao exercício de 2004 a Inspecção Tributária apurou as seguintes correcções: 2.5.1. Correccão nos termos do artigo 51° do CIRC, O valor a corrigir resultou do cálculo de 1/15 do valor patrimonial, ou seja, 54 171,83 X 1/15, (tributando-se apenas 10 meses, pois o prédio foi alienado no mês de Novembro) no valor de 3009,55. 2.5.2. Mais valia não declarada O prédio urbano com o artigo matricial 9......... que foi doado à sociedade, foi alienado a J......... em 11/11/2004, pelo montante de 80 000,00. Porém, o prédio foi avaliado nos termos do IMT, pelo valor patrimonial de 321 320,00 (...). De acordo com o disposto no artigo 58° A do CIRC e art° 31° A e art° 50° n° i do CIRS, por remissão do art° 510 do CIRC, para determinação do lucro tributável sempre que o valor do contrato seja inferior ao valor patrimonial definitivo do imóvel, o valor a considerar pelo alienante e adquirente, será o último. Assim, a mais valia fiscal calculada e não declarada foi determinada da seguinte forma: Mais Valia Fiscal = Valor de realização — (Valor de aquisição X coeficiente de correcção monetária): 321 320,00— (9 442,13X 1,39) = 308 195,44. 2.6. Foram elaborados os Documentos de Correcção, modelo 22 de IRC para os exercícios de 2002 e 2004, (...), os quais originaram as liquidações n° 8310039357 referente ao exercício de 2002 (...) e n° 8310039422 referente ao exercício de 2004 (...). Porque não foram pagos no prazo legal, foram extraídas certidões de dívida que originaram processos de execução fiscal (...). 2.7. Por sentença judicial dos autos declarativos processo n° 7837/07.8 TBLRA do 2° Juízo Cível do Tribunal Judicial de Leiria, foi declarada a nulidade por simulação, da escritura de doação outorgada no dia 03-06-1993 no cartório Notarial de Óbidos e da escritura de compra e venda outorgada no dia 11-11-2004 no 2° Cartório Notarial de Lisboa, reconhecendo J......... e L......... proprietários do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 9......... com o consequente cancelamento dos registos averbados no referido prédio (...). 2.8. De acordo com o artigo 240° do Código Civil, "1. Se por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocia! e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado. 2. O negócio simulado é nulo" 2.9. Nos termos do artigo 286° do Código Civil, "a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal" 2.10. No entanto, nos termos do artigo 38° da Lei Geral Tributária "1. A ineficácia dos negócios jurídicos não obsta à tributação, no momento em que esta deva legalmente ocorrer, caso já se tenham produzido os efeitos económicos pretendidos pelas partes (...)" 2.11.Neste sentido, cite-se António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária Anotada, Rei dos Livros: "Não é fiscalmente relevante a anulação de um negócio jurídico visando evitar a produção de um efeito fiscal associado, desde que o seu resultado económico já tenha sido produzido. Não se produzem nessas circunstâncias os efeitos retroactivos prescritos em Direito Civil para a anulação dos negócios jurídicos, salvo, obviamente, nas relações entre as partes" 2.12 É assim fiscalmente indiferente a vontade real das partes da erradicação do mundo jurídico do negócio celebrado e segundo o autor acima referido, "(...) a situação em que os particulares praticaram um acto correspondente ao pressuposto de facto de um tributo e posteriormente procuram evitar o pagamento da obrigação correspondente por meio da destruição retroactiva dos efeitos desse acto, é uma situação próxima do abuso de direito em matéria fiscal". 2.13. No mesmo sentido, cite-se ainda, Lei Geral Anotada por Diogo Leite de Campos, "O artigo 380 tal como o artigo 390, integra-se numa certa vertente do realismo do Direito Fiscal. Determina-se a tributação dos efeitos económicos dos actos e negócios jurídicos, independentemente da eficácia ou validade dos negócios jurídicos que os visarem (..,)”. 2.14. Dado que a reclamante não apresenta provas de que não se verificaram os efeitos económicos pretendidos pelas partes, com a celebração da escritura de doação e com a celebração da escritura de compra e venda, nomeadamente provas relacionadas com os movimentos financeiros correspondentes às transacções sobre o imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9......... da freguesia da Marinha Grande, concluímos que as liquidações reclamadas estão conformes à legislação em vigor, tendo a doação efectuada em 03-06-1993 por J......... e L......... a favor de I......... Limited do prédio urbano acima identificado, produzido os efeitos económicos pretendidos pelos seus intervenientes, bem como a venda do mesmo bem imóvel efectuada em 11-11-2004 pela I......... Limited para J........., que também produziu os efeitosn económicos por eles pretendidos. Em resumo: Face ao exposto, não obstante os efeitos civis decorrentes da declaração de nulidade por simulação da doação e da venda efectuadas, consideramos que para efeitos fiscais devem manter-se as correcções efectuadas pela Inspecção Tributária, ou seja, as liquidações de IRC, correspondentes à correcção nos termos do artigo 51° n° 2 e 3 do ClRC, relativamente aos exercícios reclamados, bem como a tributação correspondente à mais valia au ferida no exercício de 2004, pela venda do prédio urbano artigo matricial 9......... da freguesia da Marinha Grande, nos termos dos artigos 50° n° 1 do CIRS por remissão do artigo 51°n° 1 do CIRC. (...)". 5. Com referência ao projecto de decisão, veio a reclamante, na pessoa do seu mandatário, exercer o direito de audição que lhe é conferido pelo disposto no artigo 600 da Lei Geral Tributária, com as alegaçôes que se dão por reproduzidas, não adiantando, em relação à reclamação inicial, nada de novo que faça modificar a sustentação do acima exposto. CONCLUSÃO 6. Atento o informado pelos Serviços de Inspecção, supra transcrito, entendo que a presente reclamação deve ser indeferida.” [alínea N) dos factos provados]; - Em 2/02/2009, a Direcção de Finanças de Leiria remeteu para a Impugnante, por carta registada e com aviso de recepção, sob o ofício n.º 00151, o instrumento constante a fls. 141 do Processo de Reclamação apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, e onde consta a notificação do indeferimento da reclamação graciosa referida na alínea anterior [alínea O) dos factos provados]. * Ora, diga-se antes de, mais, que dos factos elencados, levados ao probatório, resulta que a ora Recorrente foi notificada para o exercício do direito de audição antes do indeferimento da Reclamação Graciosa. A sentença recorrida considerou não existir qualquer violação de formalidades legais, designadamente no que concerne aos factos alegados em sede de Audiência Prévia e alegadamente não tomados em consideração pela AT. Efetivamente, da leitura atenta da pronúncia da ora Recorrente no âmbito da audição prévia no procedimento da reclamação graciosa e da decisão da AT que recaiu sobre a mesma, claramente resulta que, nessa sede, não invocou factos novos. Limitou-se a aludir a circunstâncias que não podiam ser antes desconhecidas. Em sede de audiência prévia, a Impugnante limitou-se a pronunciou-se sobre o projeto de decisão da reclamação graciosa, alegando a não aplicação do artigo 38º e 39º da LGT aos presentes autos. Tendo a AT decidido fundamentadamente com base nesses normativos. Diga-se, que além do mais, a Recorrente, não indica quais os factos novos que invocou no exercício de tal direito. Constata-se que não o fez, ou seja, não invocou factos novos em relação aos quais a AF ainda não se tivesse pronunciado ou tivesse o dever de se pronunciar, nos termos do artigo 60º, n.º 1, alínea e) e n.º 3 do mesmo artigo. Com efeito, do documento de resposta por si remetido à entidade impugnada quando decorria o prazo para o exercício do direito à audição prévia, relativo ao projeto de indeferimento da Reclamação Graciosa, segundo o que consta destes Autos e do PA apenso, não é acompanhado de qualquer documento nem ali é alegada qualquer factualidade ou circunstância que a AT não tivesse tido em conta e que possa alterar a sua situação tributaria e respetiva quantificação já constante do mesmo. Acresce, que como entendeu o Tribunal a quo, embora não seja essa a situação em análise, apesar do princípio da audiência prévia ser, como acima se referiu, uma garantia de defesa dos direitos do contribuinte, situações há em que a preterição dessa formalidade de audiência pode degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que daí resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do ato. Assim, bem andou o Tribunal a quo ao considerar que: “Por conseguinte, é de concluir que a AF não estava obrigada a pronunciar-se mais do que se pronunciou em sede de audição prévia.” (…) Face ao exposto conclui-se que, neste particular, não ocorreu a alegada violação do direito de audição, improcedendo, por isso, também nesta parte, a presente impugnação.” Por maioria de razão, também não se verifica a alegada violação do dever de fundamentação dos factos novos trazidos pela Recorrente em sede de audiência prévia, sendo que, tais factos, como se disse, não foram alegados. Por imperativo constitucional, artigo 268º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP), os atos administrativos carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legitimamente protegidos, pelo que a decisão de correção da matéria tributável não pode deixar de se mostrar acompanhada da correspondente fundamentação. Os contornos dessa fundamentação recolhem-se na lei ordinária, artigo 77º da LGT que determina que ela se revista de uma sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo. Importa, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a atuar como atuou, as razões em que fundou a sua atuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do ato; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do ato, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta atuação administrativa. Distinguindo a dimensão formal e a dimensão substancial do dever de fundamentação, Vieira de Andrade, in “O dever de fundamentação expressa de actos administrativos”, Almedina, 2003, pág. 231, refere que a diferença está «em que o dever formal se cumpre pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis; enquanto a fundamentação material exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo». Estamos ainda cientes, de que a fundamentação dos atos administrativos visa, além do mais, dar a conhecer as razões por que foi decidido de uma maneira e não de outra, de molde a permitir aos seus destinatários uma opção consciente entre a sua aceitação e a sua impugnação contenciosa. É, conforme jurisprudência unânime do STA, um conceito relativo, que varia em função do tipo legal de ato, dos seus antecedentes e de todas as circunstâncias com ele relacionadas, designadamente as típicas condutas administrativas, que permitam dar a conhecer o iter cognoscitivo e valorativo que levou a que fosse decidido dessa maneira e não de outra, estando suficientemente fundamentado quando um destinatário normal se aperceba das razões de ser da decisão. Para se atingir aquele objetivo basta uma fundamentação sucinta, mas que seja clara, concreta, suficiente, congruente e que se mostre contextual. Note-se que a fundamentação do ato administrativo é suficiente se, no contexto em que foi praticado, e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão. Ora, atento o acima descrito e o exarado na sentença recorrida, adianta-se desde já e no que concerne a esta matéria, que não assiste qualquer razão à Recorrente. Relembre-se que não foram identificados os alegados novos factos a que a ora Recorrente faz em abstrato referência, ter suscitado no âmbito do exercício do seu direito de audição prévia no procedimento de reclamação graciosa. Com efeito, e como bem salienta o Tribunal a quo: «No caso em apreço, face à pretensão manifestada pela Impugnante, o que o Tribunal tem que avaliar, como já ficou dito, é a fundamentação subjacente à emissão do acto e que é, assim, sua contemporânea, ou seja, aquela que foi externada com o próprio acto. Trata-se, pois, da fundamentação formal, que como vimos, deve esclarecer concretamente a motivação do acto, não podendo sofrer de qualquer obscuridade, contradição ou insuficiência, pois nesse caso o acto considera-se não fundamentado. No caso presente, a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, fez-se acompanhar da respectiva informação elaborada pelos Serviços, o que quer dizer que o acto administrativo, nos termos em que se encontra efectuado está suficientemente fundamentado de facto e de direito, no sentido de permitir à Impugnante, seu destinatário, aperceber-se das razões que levaram à sua prática, pois a fundamentação existe, porquanto foi feita por remissão para o relatório inspectivo e, por outro lado, que o destinatário não deixou de a apreender, como bem demonstra através do alegado na presente petição de impugnação, razão pela qual inexiste a alegada falta de fundamentação da notificação da liquidação impugnada.» Pelo que improcede o recurso quanto a este fundamento. *** Em sede recursória, a Recorrente argumenta que não podia ser tributada em sede de IRC ou de mais-valias geradas por imóveis que estavam na sua esfera por via de uma doação que veio a ser declarada nula. Salientando que, não pode ser tributada em sede de impostos pela propriedade e alienação de imóveis, quando tais bens não eram sua propriedade e apenas estiveram titulados em seu nome por um negócio simulado, sob pena de violação do artigo 39° da LGT. *** Improcedem, por isso, as conclusões de recurso. Pelo que, a sentença que assim decidiu não padece de qualquer erro de julgamento, devendo, por isso, ser confirmada. * III. DECISÃO Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida. Custas pela Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 15 de julho de 2025. ---------------------------------- [Maria da Luz Cardoso] ---------------------------------- [Rui A. S. Ferreira] ------------------------------ [Teresa Costa Alemão] |