Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juizes da Secção de Contencioso Tributário (2ª Secção) do Tribunal Central Administrativo do Sul:
O Recorrente, inconformado com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loures (Lisboa 2) que lhe julgou improcedente o recurso apresentado da decisão do Director Geral dos Impostos que, ao abrigo do disposto no artigo 63º - B, n.º 2, al. c) da LGT, na redacção vigente à data do tempo dos factos, autorizou que funcionários da Inspecção Tributária, devidamente credenciados, pudessem aceder directamente a todas as contas bancárias e documentos bancários existentes em instituições bancárias portuguesas em nome do Recorrente, vem recorrer para este Tribunal, para o que o Recorrente apresenta as seguintes:
CONCLUSÕES
I. Considera-se na sentença que não ocorreu preterição de formalidade essencial por não lhe ter sido facultada a possibilidade de exercer o seu direito de audição prévia antes da derrogação do sigilo bancário.
II. Como suscitado pelo recorrente, aquando da sua apresentação a juízo, a DGCI só após o exercício do direito de audição originário, isto é aquele em que se projectava a derrogação do sigilo bancário, trouxe ao procedimento 3 (três) mapas de onde supostamente resultam as ditas vantagens patrimoniais obtidas pelo recorrente em sede de IRS, IRC e Imposto Municipal de Sisa.
III. Ao recorrente apenas foi facultado o exercício do direito de audição em relação à pretensão de derrogação com base em duas escrituras em que, alegadamente, tinha ocorrido omissão na declaração de valores.
IV. Ocorreu preterição de formalidade essencial por não ter sido concedida ao recorrente a faculdade de exercer o seu direito de audição antes da derrogação efectuada, ou seja, o acto de derrogação foi praticado e notificado sem que ao seu destinatário tenha sido dada oportunidade de pronunciar-se no decurso do procedimento no que tange aos ditos mapas; E tal era um dever que se impunha à DGCI, por força, quer do artigo 63° - B, n.º 3 da Lei Geral Tributária, quer do artigo 100.°, do Código de Procedimento Administrativo.
V. Mas se é como supra realçado evidente se torna que da projectada derrogação que foi notificada ao recorrente, e da qual deviam constar todos os factos que interessavam para a decisão do procedimento bem como estar concluída a instrução, não constavam afinal de contas todos os elementos em relação aos quais o recorrente tinha o direito de se pronunciar.
VI. Ora no presente caso foi precisamente tal omissão que ocorreu pois que a DGCI carreou para o procedimento elementos novos que não constavam do projecto de derrogação; Pelo que teria, em relação aos mesmos, de se abrir uma nova fase sendo nela facultada ao recorrente o direito de exercer o seu direito de audição.
VII. Atento aquilo pelo que o recorrente sempre se bateu (que não lhe tinha sido concedido antes da decisão o direito de audição em relação aos mapas e conclusões deles extraídas pela DGCI) e considerando ainda o aditamento ao probatório por que aqui se pugna, manifesto se torna que, atento o que supra se alega, esta condenação não se pode manter.
VIII. Também não assiste razão à sentença quando refere que a fundamentação notificada ao recorrente para a derrogação do sigilo bancário era adequada pois que tal questão se entrelaça com a fundamentação que foi inicialmente notificada e não qualquer outra ulteriormente aditada em sede de decisão propriamente dita pois que a que tem de relevar é a primeira.
IX. Em relação a este aspecto, a DGCI sustenta, com acolhimento na sentença, que foi feita a demonstração inequívoca da existência de factos concretos gravemente indiciadores da falta de veracidade dos valores declarados para efeitos de tributação, que a comprovarem-se resultam na prática de crime doloso em matéria tributária tipificado no artigo 103° do RGIT.
X. Para tal, e conforme constante do ponto 6 do probatório no texto da sentença, foi dado como provado que teria existido uma escritura pública de compra e venda outorgada com Sílvia Alexandra Pedro Martins, na qual, supostamente, teria havido uma discrepância entre o valor declarado nas mesmas e o valor real pago pela adquirente da fracção de € 32.421,87.
XI. Daí se sufragando o entendimento de que existia uma omissão de declaração de rendimentos, para efeitos de IRC e de IRS e de valores, para efeitos de Imposto Municipal de Sisa.
XII. Em primeiro lugar a fundamentação é tanto ou tão pouco suficiente que até a sentença revela não perceber bem a situação em causa bastando para aquilatar de tal ver o ponto 2 do probatório pois que do mesmo resulta que o valor declarado na escritura foi de € 79.807,66.
XIII. Ora assim sendo, e ocorrendo ocultação de valores o que não se concede, a diferença entre o valor real e o declarado não era de € 32.421,87 mas sim de € 19.572,44. (66.958,24 + 32.421,86 - 79.807,66).
XIV. Por outro lado entendeu-se na sentença que o recorrente havia recusado duas vezes a autorização do acesso às informações e documentos bancários de que era titular.
XV. Tal é completamente insustentável e terá de levar à alteração do probatório fixado no sentido de passarem a não provados os factos constantes dos pontos 8, 9 e 14, pois que a procuração junta ao processo e emitida a terceiro apenas dava poderes a este para prestar esclarecimentos à administração fiscal.
XVI.A sentença após elencar os 3 requisitos para que o acto de representação seja válido e eficaz, entenda-se se repercuta na esfera do representado, aborda apenas o primeiro deles ignorando os demais; Ou seja ignora-se na sentença que os 3 requisitos são cumulativos e não alternativos.
XVII. Em relação à segunda recusa incorre também a sentença em erro de julgamento da matéria de facto pois que na verdade não ocorreu qualquer recusa.
XVIII. O que o recorrente suscitou foi se encontrava incapacitado (motivo grave) e de que necessitava da nomeação de um curador, motivo grave este que o recorrente invocou e que a DGCI nem sequer capacidade tem para apreciar, apesar de o ter feito de forma totalmente rudimentar, uma vez que só pode ser aquilatado pela ciência médica; Pelo que se impunha a nomeação de um representante legal ao recorrente ou, eventualmente, de um curador provisório.
XIX. Tudo isto a sentença ignorou fazendo-a incorrer em errada fixação do probatório a ser merecedora de revogação nessa parte com a inerente alteração do probatório de modo a dar como não provados os factos atrás referidos.
XX. Não se encontravam preenchidos os requisitos legais que permitem a derrogação do sigilo bancário pois que o primeiro deles, recusa de autorização (e como já atrás referido) não se verificou.
XXI. O segundo requisito, o de a existência de indícios da prática de crime doloso em matéria tributária, também não ocorre.
XXII. Aliás a sentença nesta matéria chega a acrescentar o argumento de que tendo a empresa de que o recorrente é gerente como objecto social a compra e venda de imóveis se deve concluir pela existência de uma prática reiterada de ocultação de valores declarados e consequentes rendimentos (sic).
XXIII. A dita vantagem patrimonial, a existir, o que não se concede, não pode, sob pena de vir a dar lugar a intolerável situação de dupla tributação, ser considerada em simultâneo para efeitos de IRC e de IRS.
XXIV. Na verdade, o enriquecimento do património, gerador de capacidade contributiva, ou se daria na esfera da sociedade ou na do recorrente e não simultaneamente nas duas.
X
XV. Por outro lado, para efeitos de Imposto Municipal de Sisa a alegada vantagem patrimonial a existir, o que também não se concede, não seria do recorrente mas da adquirente do imóvel pois é sabido que este imposto tem como sujeito passivo o adquirente e não o alienante.
XXVI. Pelo que nenhum sentido fará pretender imputar a vantagem patrimonial ao recorrente de modo a artificiosamente criar um fundamento para a derrogação do dever de sigilo bancário em relação a si.
XXVII. Pelo que forçoso será de concluir que a DGCI não tipifica em concreto, como é seu dever, qual a moldura fáctica do crime supostamente cometido, daí subsumindo a sua aplicação ao Direito, ou se é que algum foi.
XXVIII. Por tudo quanto vem de se alegar violou a sentença os artigos 77°, 60°, 63o- B, n° 2 al. c) e n° 3 da LGT, 100° do CPA, 267°, n° 5 da CRP, 7°, n° 2, 45°, n°s 2 e 3 do CPPT, 3°, n° 3 do CPC, 262° e ss do Código Civil, mais devendo ser alterado para não provados os factos constantes dos pontos 8, 9 e 14 do probatório fixado.
Termos em que, nos melhores de Direito, deverá o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser revogada a decisão ora recorrida, tudo o mais com as consequências legais.
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O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito mera meramente devolutivo (fls. 123).
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O Recorrido contra-alegou, formulando as seguintes:
CONCLUSÕES
1. Verificam-se integralmente os requisitos do artigo 63º-B da LGT para que, por decisão fundamentada do Director-Geral dos Impostos, os Serviços possam aceder às contas bancárias do recorrente, derrogando-se legalmente o dever de sigilo bancário a que as instituições de crédito estão legalmente obrigadas;
2. Com efeito, vem provado como primeiro requisito que o recorrente, nem através de procurador nem por si, apesar de estar provado que foi pessoalmente notificado, autorizou voluntariamente a Administração Fiscal a aceder às suas contas bancárias;
3. Não vem provado, contrariamente ao alegado, que o recorrente se encontrava incapacitado de receber tal notificação, porque a prova dessa incapacidade é insuficiente, por ser realizada por documentos idóneos para tal;
4. A cominação dessa falta de prova só pode ser a de que, por falta de resposta à notificação, se considerou recusado o pedido de autorização que a DGCI lhe fez naquele sentido;
5. Em seguida, vem abundantemente provado que a compradora entregou 2 cheques para pagamento de uma fracção, cuja soma (99 380,10 €) é superior à do valor declarado em escritura como sendo o preço da transacção (79807,66€) e que um desse cheques, no valor de 32 421,86€, foi passado à ordem do recorrente e, posteriormente, por ele recebido, apesar de não ser o vendedor;
6. Também vem provado que nem a contabilidade da empresa vendedora, de que o recorrente é gerente, nem a declaração de IRS dele próprio, acusam o recebimento daquela importância;
7. Vem também provado que a compradora pagou sisa adicional pelo valor daquele cheque;
O que, como doutamente reconhece a sentença recorrida, se configura como um conjunto de factos concretos gravemente indiciadores de que houve intenção de ocultar e, com isso, omitir parte do preço, como forma de diminuir a tributação quer em relação ao comprador, que já regularizou a situação, quer em relação à vendedora, que omitiu parte do valor da transacção dos seus proveitos, quer ainda em relação ao recorrente que também não incluiu na respectiva Decl. Mod. 3 os valores por ele auferidos, presume-se que, indevidamente.
9. Este conjunto de factos prefigura os elementos do tipo de uma infracção fiscal dolosa, o que constitui o crime fiscal previsto e punido no art.° 103° da RCPIT;
10. Estão, portanto, face à douta sentença e ao que se encontra provado nos autos, verificados inequivocamente as condições ou requisitos na alínea c) do n.º 3 do art. 63º-B da LGT e, ao contrário, inexistem as violações de lei imputadas à decisão recorrida.
Face ao que, com o melhor suprimento das questões de direito por parte do tribunal ad quem, se deve manter a decisão recorrida, com as consequências legais, com a rejeição do presente recurso.
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Os autos foram com vista à DPGA junto deste Tribunal, que deu o seguinte douto parecer a fls. 144:
“” A sentença recorrida não merece censura.
Com efeito, em face dos documentos juntos aos autos parece-nos estabelecida correctamente a matéria factual. E, em face dela, a decisão não podia ser outra.
Na verdade, tal como consta do despacho de Director Geral dos Impostos, não só o recorrente apresentou documentação clínica relativa a cerca de três anos antes e após esses episódios de doença praticou actos notariais, como se encontrava representado no procedimento por procurador com poderes especiais para o acto.
Assim, tendo o seu representante recusado declarado recusar o acesso, esta recusa reflecte-se na sua esfera jurídica.
Não nos parece, tal como consta da sentença, existir a falta de audição prévia. O recorrente
não só foi ouvido como inclusivamente se pronunciou. E o despacho posterior teve em conta a pronúncia do recorrente. Não se verifica, pois, falta de audição prévia.
Em relação à existência de indícios de crime doloso, remetemos para o que consta da
sentença, Os factos aí descritos constituem indícios suficientes da prática de crime daquela natureza.
Somos de parecer que o recurso não merece provimento. “”
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Por se tratar de processo urgente, nos termos do disposto no artigo 707º, n.º 2 do CPC, ex vi artigo 2º, al. e) do CPPT, dispensam-se os vistos aos Exmos Adjuntos.
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B - FUNDAMENTAÇÃO
A questão a decidir é se, no caso dos autos, se encontravam preenchidos os pressupostos legais para a derrogação do sigilo bancário e se os mesmos foram, indiciariamente imputados ao Recorrente.
OS FACTOS
Na douta sentença recorrida deram-se como provados e como não provados os seguintes factos:
“ Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com interesse para a sua decisão:
1-Em 2001, o recorrente, J..., com o n.i.f. 138 965 579, era sócio-gerente da sociedade "Sopalmeira – Empreendimentos Imobiliários, L.da.", com o n.i.p.c. 501 996 265 (cfr. documentos juntos a fls.12 a 14 do processo administrativo apenso; relatório da A. Fiscal junto a fls.2 a 8 do processo administrativo apenso);
2-Em 2/10/2001, a sociedade "Sopalmeira - Empreendimentos Imobiliários, L.da.", enquanto vendedora, realizou escritura de compra e venda de fracção autónoma designada pela letra "C", parte integrante de imóvel urbano constituído por dez fracções e sito na freguesia de Famões, concelho de Odivelas, actualmente inscrito na matriz da mesma freguesia sob o artigo 4018, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Odivelas sob o n.º.1598, da freguesia de Famões, surgindo como comprador do mencionado imóvel Sílvia Alexandra Pedro Martins, venda esta realizada pelo valor de € 79.807,66 (cfr. relatório da A. Fiscal junto a fls.2 a 8 do processo administrativo apenso; documentos juntos a fls.12 e 25 do processo administrativo apenso);
3-Em virtude da transacção identificada no n.º 2, a adquirente Sílvia Alexandra Pedro Martins emitiu dois cheques, ambos datados de 2/10/2001, sacados sobre o "Banco Comercial Português, S.A.", titulando um o montante de €
66.958,24 (n.º 9650726928) e o outro a quantia de € 32.421,86 (n.º 9650726831), os quais foram posteriormente endossados pela identificada Sílvia Alexandra Pedro Martins (cfr. relatório da A. Fiscal junto a fls.2 a 8 do processo administrativo apenso; documentos juntos a fls.26 a 29 do processo administrativo apenso);
4-O cheque que titulava o montante de € 66.958,24 (n.º 9650726928), foi endossado à ordem da sociedade "Sopalmeira - Empreendimentos Imobiliários, L.da.", sendo o título de crédito que titulava a quantia de €. 32.421,86 (n.º 9650726831) endossado à ordem do recorrente J..., o qual levantou a quantia titulada pelo mesmo cheque (cfr. relatório da A. Fiscal junto a fls.2 a 8 do processo administrativo apenso; documentos juntos a fls.26 a 29 do processo administrativo apenso);
5-Em 30/4/2002, o recorrente apresentou nos serviços competentes da Administração Fiscal a declaração, modelo 3, de I.R.S, relativa ao ano fiscal de 2001, na qual somente fez constar, a título de rendimentos enquadrados na categoria A, a importância de € 15.659,11, auferidos enquanto sócio-gerente da sociedade "Sopalmeira - Empreendimentos Imobiliários, L.da." (cfr. documento junto a fls.19 e 20 do processo administrativo apenso; termo de declarações junto a fls.15 a 18 do processo administrativo apenso);
6-Em 26/10/2004, a adquirente da fracção autónoma identificada no n.º 2, Sílvia Alexandra Pedro Martins, efectuou o pagamento de sisa adicional incidente sobre o montante de € 32.421,87, quantia a mais que desembolsou pela aquisição do referido imóvel (cfr. documentos juntos a fls.30 a 33 do processo administrativo apenso; relatório da A. Fiscal junto a fls.2 a 8 do processo administrativo apenso);
7-Na sequência das diligências entretanto realizadas, em 22/4/2005, o recorrente foi notificado pela A. Fiscal no sentido de prestar esclarecimentos relativos ao ano fiscal de 2001, nomeadamente no que diz respeito aos rendimentos declarados para efeitos de I.R.S. (cfr. documentos juntos a fls.9 a 11 do processo administrativo apenso);
8-Em 9/5/2005, o recorrente passou procuração a favor de Eurico Ascenso Pereira com vista à prestação de esclarecimentos sobre a sua situação tributária referente ao ano de 2001 e junto da Direcção de Finanças de Lisboa, tudo conforme documento cuja cópia se encontra junta a fls.22 do processo administrativo apenso e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido;
9-Em 16/5/2005, na Direcção de Finanças de Lisboa foi lavrado termo de declarações do recorrente, representado por Eurico Ascenso Pereira, no qual confirmou o montante de rendimentos auferidos no ano de 2001 e identificados no n.º 5 supra, negou o recebimento de quaisquer outras quantias e não autorizou o acesso da A. Fiscal a informações e documentos bancários de que fosse titular (cfr. termo de declarações junto a fls.15 a 18 do processo administrativo apenso);
10-Em 6/6/2005, na sequência das declarações identificadas no n.º 9, a A. Fiscal estruturou a informação cuja cópia se encontra a fls.2 a 8 do processo administrativo apenso e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, na qual se conclui pela falta de veracidade da declaração de rendimentos, para efeitos de I.R.S., apresentada pelo recorrente e relativa ao ano de 2001, assim se considerando reunidos os pressupostos para efectuar o pedido de acesso a informação bancária ao abrigo do art.º 63-B, n.º 2, al. c), da L. G. Tributária;
11-Em 13/7/2005, além do mais, concordando com a informação identificada no n.º 10, foi elaborado o projecto de decisão do Sr. Director Geral dos Impostos no âmbito do procedimento de levantamento do sigilo bancário que se encontra junta a fls.44 do processo administrativo apenso e se dá aqui por integralmente reproduzida;
12-Em 2/8/2005, o recorrente foi notificado pessoalmente do projecto de decisão identificado no n.º 11 e com vista ao exercício do direito de audição prévia nos termos do art.º 60, da L. G. Tributária (cfr. documentos juntos a fls.45 a 47 do processo administrativo apenso);
13-O recorrente deu cumprimento ao exercício do direito de audição prévia através de requerimento cuja cópia que se encontra junta a fls.48 a 57 do processo administrativo apenso e se dá aqui por integralmente reproduzida;
14-Em 9/9/2005, o recorrente foi notificado pessoalmente pela A. Fiscal para, no prazo de dez dias, conceder autorização de acesso a informações e documentos bancários de que seja titular, sendo que a ausência de resposta implicava a recusa de autorização (cfr. documentos juntos a fls.58 a 60 do processo administrativo apenso);
15-Em 16/11/2005, o Sr. Director Geral dos Impostos estruturou decisão de levantamento do sigilo bancário incidente sobre as contas e documentos bancários de que é titular o recorrente J..., concordando com informações e pareceres prévios, tudo conforme despacho que se encontra junta a fls.71 do processo administrativo apenso e se dá aqui por integralmente reproduzida;
16-Notificado da decisão identificada no nQ.15, em 12/12/2005, J... apresentou junto deste Tribunal o recurso que deu origem ao presente processo (cfr. carimbo de entrada aposto a fls.1 destes autos).
X
Factos não Provados
X
Dos factos constantes do recurso deduzido e da oposição formulada pela A. Fiscal, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
X
Motivação da Decisão de Facto
X
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos e apenso constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório. “”
*****
Nos termos do disposto no artigo 712º, n.º 1 a) do CPC, aditam-se os seguintes factos:
17 – Entre a Sopalmeira – Empreendimentos Imobiliários, Ld.ª, representada pelo Recorrente, e Sílvia Alexandra Pedro Martins foi celebrado um acordo escrito em 2 de Julho de 2001, pelo qual a primeira prometia vender e a segunda prometia comprar, pelo preço total de 22.500.000$00 (112.229,52 €) a fracção autónoma identificada no n.º 2 supra, conforme documento de fls. 31 a 33 do processo administrativo;
18 – O pagamento do preço acordado para a prometida compra e venda seria feito do seguinte modo:
a) No acto da assinatura do contrato promessa, a título de sinal e princípio de pagamento do preço da prometida venda, a quantia de 1.500.000$00 (7.481,97 €), de que a promitente compradora recebeu logo quitação;
b) O remanescente do preço ainda em dívida Esc. 21.000.000$00 (104.747,55 €) relativo à prometida venda, seria pago no acto da celebração da escritura pública de compra e venda – 3ª cláusula;
19 – O cheques identificados no ponto n.º 4 supra foram emitidos, respectivamente, em nome da Sopalmeira, o n.º 9650726928, de 13.423.922$00 (66.958,24 €) e em nome do Recorrente o n.º 9650726831, de 6.500.000$00 (32.421,87 €), sendo ambos endossados pelo Recorrente, o primeiro cheque para ser depositado na conta 6 – 5616505 e o segundo para ser depositado na conta 8 – 0864331, conforme documentos de fls. 26 a 29 do processo administrativo;
20 – Pela procuração outorgada pelo Recorrente a Eurico Ascenso Pereira e indicada no ponto n.º 8 supra, foram concedidos os seguintes poderes: “” prestar esclarecimentos sobre a situação tributária referente ao ano de dois mil e um, nos termos do n.º 4, do art.º 59º da LGT e art.º 9º do RCPIT, junto da Direcção de Finanças de Lisboa. …. “”, conforme documento de fls. 21 a 22 do processo administrativo;
21 – O projecto de decisão referido no ponto n.º 11 supra tem o seguinte teor:
“” Projecto de decisão
1. Nos termos e com os fundamentos constantes da presente Informação da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, bem como com os respectivos parecer e despacho concordantes, verificando-se os condicionalismos previstos na alínea c) do n.° 2 do artigo 63.° - B da Lei Geral Tributária, notifique-se J..., com o NIF 138.965.579, dando-lhe cópia integral das peças processuais aqui referidas com vista ao exercício do direito de audição, previsto no n.° 3 do citado normativo, informando-o que caso não exerça o referido direito ou, exercendo-o, as informações prestadas, naquele âmbito, forem consideradas insuficientes ou inconclusivas, será autorizado a inspectores tributários, devidamente credenciados, o acesso aos documentos bancários existentes nas instituições bancárias portuguesas, relativos às contas de que seja titular.
2. Devolva-se o processo à Direcção de Finanças de Lisboa para efeitos do prosseguimento do procedimento de levantamento do segredo bancário. (…) “”, conforme documento de fls. 44 do processo administrativo;
22 – No requerimento referido no ponto n.º 13 supra, pelo qual o Recorrente exerceu o direito de audição prévia, o mesmo alegou, em síntese, que a DGCI jamais solicitou ao recorrente autorização para aceder aos seus documentos bancários, pelo que não houve da sua parte recusa e que inexistem indícios da prática de crime doloso por parte do Recorrente, conforme articulado de fls. 48 a 57, do processo administrativo;
23 – A notificação referida no ponto n.º 14 supra tem o seguinte teor:
“” (…) CARTA REGISTADA COM AR
Assunto: Pedido de autorização para consulta/acesso a informação e documentos bancários
(art.° 63-B, n.° 2 da Lei Geral Tributária)
No seguimento da V/ exposição, no âmbito do exercício do direito de audição, sobre o Projecto de Decisão referente à derrogação do dever de sigilo bancário nos termos do n.° 2 do artigo 63.°-B da L.G.T, e após análise dos factos apresentados, fica V.Exa notificado para, no prazo de 10(dez) dias (contados a partir da data de assinatura do aviso de recepção), informar este serviço se autoriza a consulta/acesso a informação e documentos bancários nos termos do n.° 2 do artigo 63.°-B da L.G.T. .
Na hipótese de autorizar, solicita-se ainda que devolva a este serviço, no prazo indicado, a declaração que se junta, devidamente preenchida e assinada, acompanhada de fotocópia do bilhete de identidade e do cartão de contribuinte.
No caso de ausência de resposta no prazo referido, entender-se-á recusa de autorização, pelo que se prosseguirá com as diligencias necessárias para o acesso da administração tributária a todos os documentos e informações bancárias nos termos do artigo 63.°-B da L.G.T. .
Com os melhores cumprimentos, (…) , conforme documentos de fls. 58 a 60 do processo administrativo;
24 – O Ilustre Mandatário do recorrente foi também notificado nos seguintes termos:
“” (…)CARTA REGISTADA COM AR
Assunto: Pedido de autorização para consulta/acesso a informação e documentos bancários
(art.° 63-B, n.° 2 da Lei Geral Tributária)
No seguimento da V/ exposição, no âmbito do exercício do direito de audição, sobre o Projecto de Decisão referente à derrogação do dever de sigilo bancário nos termos do n.° 2 do artigo 63.°-B da L.G.T, e após análise dos factos apresentados, fica V.Exa notificado, nos termos do artigo 40° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na qualidade de mandatário de J..., NIF/138 965 579, que este foi notificado para, no prazo de 10(dez) dias (contados a partir da data de assinatura do aviso de recepção que acompanhou o oficio anexo), informar este serviço se autoriza a consulta/acesso a informação e documentos bancários nos termos do n.° 2 do artigo 63.°-B da L.G.T.
Mais se refere, que o sujeito passivo ficou também notificado que, no caso de ausência de resposta no prazo referido, entender-se-á recusa de autorização, pelo que se prosseguirá com as diligências necessárias para o acesso da administração tributária a todos os documentos e informações bancárias nos termos do artigo 63.°-B da L.G.T. .
Junta-se cópia da notificação referida, realizada através do oficio n.° 55878, datado de 07/09/2005.
Com os melhores cumprimentos, (…), conforme documentos de fls. 61 a 63 do processo administrativo;
25 – Em resposta às notificações indicadas nos números antecedentes, o Recorrente apresentou, em 2005-09-22, o requerimento onde alegava não estar em condições físicas e psíquicas de responder à notificação nem dela tomar conhecimento cabal, ao qual juntou, para além de fotocópia do B.I. e do n.º de contribuinte, fotocópia de um documento do Hospital Pulido Valente onde se atesta que o recorrente esteve internado de 3/11/01 a 10/11/01 no mesmo estabelecimento com o diagnóstico, em síntese, de AVC, bem como fotocópia de um documento, onde se lê:
“”INSTITUTO
CARDIOVASCULAR
DE LISBOA Prof. Dr. f. Fernandes e Fernandes, M.D., PhD, FACS
Exm°(a)Sr(a).
JoaquimAscenso
28-5-2002
ANGIODINOGRAFIA CÉREBRO-VASCULAR
O exame efectuado mostra a presença de sinais de oclusão completa da carótida interna esquerda.
À direita observaram-se placas de ateroma que determinam estenoses moderadas sem repercussão hemodinâmica.
As artérias vertebrais estão permeáveis. (…), tudo conforme documentos de fls. 64 a 70 do processo administrativo;
26 – Na sequência do exercício do direito de audição pelo Recorrente foi feita nova informação, sobre a qual recaiu parecer e sobre os dois recaiu despacho, este com data de 2005-11-14, sobre os quais recaiu a decisão do Director-Geral dos Impostos referida no n.º 15 supra e que tem o seguinte teor:
“” Decisão
1. Nos termos e com os fundamentos constantes da presente Informação e da Informação da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, que sustentou o Projecto de Decisão, bem como com o teor dos pareceres e despachos que sobre as mesmas recaíram, analisada a argumentação do contribuinte expressa em sede de direito de audição, verificando-se os condicionalismos do artigo 63.°- B, n.° 2, alínea c), da Lei Geral Tributária, com a redacção ao tempo dos factos, ao abrigo da competência que me é atribuída pelo actual n.º 4 do referido normativo, autorizo que funcionários da Inspecção Tributária, devidamente credenciados, possam aceder directamente a todas as contas bancárias e documentos bancários existentes em instituições bancárias portuguesas em nome de J..., com o NIF 138965579.
2. Devolva-se o processo à Direcção de Finanças de Lisboa, com vista ao prosseguimento do procedimento de levantamento do segredo bancário.
Em 05.11.16
O Director-Geral (…) “”, tudo conforme documentos de fls. 71 a 80 do processo administrativo;
27 – O adquirente da fracção “J” do mesmo prédio, cuja compra e venda teve lugar por escritura pública de 2001/11/28, no 11º Cartório Notarial de Lisboa, auto denunciou um novo valor de venda/aquisição da fracção, no montante de 25.000.000$00/124.699,47€, traduzido numa omissão no montante de 7.000.000$00/34.915,85 €, procedendo também ao pagamento da respectiva sisa, conforme informação de fls. 72 a 80, escritura de fls. 36 a 42 e cópia do Termo de Declaração para efeitos de Sisa de fls. 43, todos do processo administrativo;
28 – Na informação para a qual remete a decisão atrás transcrita lê-se, de fls. 75 a 76:
“” (...) Não obstante considerarmos que a vantagem patrimonial indevida apenas deve ser considerada para efeitos punitivos, realça-se, que os factos já concretamente identificados, determinam uma vantagem obtida pelas partes superior a 7500 €;
- Em sede de IRS:
b) - Em sede de IRS: 10 594,52 é > 7500 €
Valores em euros
1- Total de IRS apurado (de acordo com os valores declarados pelo sujeito passivo) 2 | -1389,85 |
2-Total de IRS simulado (com inclusão dos rendimentos omitidos) 3 | 9204,67 |
3-Vantagem patrimonial obtida. (2)-(1) | 10594,52 |
Nota: Atendendo a que os rendimentos foram auferidos no ano de 2001, considerou-se o crédito de imposto por dupla tributação económica em vigor à data.
Em sede de IRC: 23 712,57 é> 7500 é
Valores em euros
1- Lucro tributável declarado 4 | 78492,87 |
2-0missão de proveitos detectada | 67337,71 |
3- Lucro tributável corrigido (1)+(2) | 145830,58 |
4- Prejuízos Fiscais | O |
5- Matéria Colectável (3)-(4) | 145830,58 |
6- Taxa de IRC | 32% |
7- Colecta Corrigida (5)*(6) | 46665,79 |
8- Total das Deduções | 1 097,61 |
9- IRC Liquidado Corrigido (7)-(8) | 45568,18 |
1 O-Retenções na fonte | 61,31 |
11-Pagamentos por Conta | O |
12-IRC a Pagar (9)-(10)-(11) | 45506,87 |
13-Derrama 10%*(7) | 4550,69 |
14-Total a Pagar (12)+(13) | 50057,55 |
15-Total de IRC pago de acordo com a | 26344,98 |
autoliquidação feita pela sociedade |  |
16-Vantagem patrimonial obtida (14)-(15) | 23712,57 |
- Em sede de imposto municipal de sisa: 10 946,97 é > 7500€
Valores em euros
| . | Omissão auto denunciada pelos | Imposto em falta |
 |  | adquirentes |  |
|  | 32421,86 | 4 630,29 |
|  | 34915,85 | 6 316,68 |
Total da vantagem patrimonial obtida |  | 10946;97 |  |
VANTAGEM PATRIMONIAL TOTAL = 45 254,06 €
2 Ver print da liquidação da Decl Mod. 3/IRS do ano de 2001 apresentada pelo sujeito passivo, cfrjls.81/91
3 Ver simulação considerando que os rendimentos omitidos deverão ser tipificados como rendimentos da categoria E- adiantamento por conta de lucros nos termos da al. H) do artigo 5.º do Código do IRS, cfr. fls.82/91
4 Ver print da Decl. Mod. 22/IRC do ano de 2001 apresentada pela sociedade cfr. fls. 83/91 a 85/91 (...) “”
29 – Do prédio em causa, com dez fracções autónomas, foram vendidas em 2001, pelo menos, oito fracções, duas das quais as acima referidas “J” e “C”, conforme fls. 74.
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O DIREITO
Fixados os factos, importa aplicar-lhes o direito.
Está em causa a decisão proferida pelo Mmo. Juiz a quo que indeferiu o recurso interposto pelo Recorrente da decisão do Director Geral dos Impostos de 2005-11.16, que autorizou o acesso às suas contas bancárias.
Apreciando:
Comecemos pelas conclusões I a VII, já que todas elas respeitam à mesma matéria, ou seja, ao direito de audição prévia e respectivo exercício, entendendo o recorrente que houve preterição de formalidade legal porque não lhe foi dado, de novo, o direito de audição prévia no seguimento da apreciação do alegado pelo recorrente em sede de exercício de direito de audição, sendo certo que teriam sido trazidos aos autos novos elementos, nomeadamente três mapas de onde supostamente resultam as vantagens patrimoniais obtidas pelo Recorrente.
O Mmo. Juiz a quo, em relação a tal questão fundamentou a sua decisão nos seguintes termos:
“” O recorrente começa por alegar a existência de preterição de formalidade legal que consistiu na falta de audição prévia do recorrente antes da decisão de derrogação do sigilo bancário, a qual se encontra prevista no artº 60º, da L. G. Tributária.
Consagra o art.º 267, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela lei constitucional n.º 1/2001, o direito de todos os cidadãos participarem na formação das decisões ou deliberações da Administração que lhes disserem respeito. A lei ordinária, concretizou inicialmente este direito no art.º 100, do C. P. Administrativo, aprovado pelo Dec-Lei 442/91, de 15/11, estando actualmente tal direito expressamente previsto no art.º 60, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12.
O direito de audiência prévia de que goza o administrado incide sobre o objecto do procedimento, tal como ele surge após a instrução e antes da decisão. Estando em preparação uma decisão, a comunicação feita ao interessado para o exercício do direito de audiência deve dar-lhe conhecimento do projecto da mesma decisão, a sua fundamentação, o prazo em que o mesmo direito pode ser exercido e a informação relativa à possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita (cfr. ac.ST.A.-2ª Secção, 25/1/2000, rec.21244, Ac. Dout., n.º 466, pág.1275 e seg.; ac.S.T.A.-2ª Secção, 2/7/2003, rec.684/03; Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 1999, pág.201 e seg.).
A falta de audição prévia do contribuinte, nos casos consagrados no art.º 60, n.º.1, da Lei Geral Tributária, constitui um vício de procedimento susceptível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada (cfr. Diogo Leite de Campos e outros, ob. cit., pág.205).
Somente nos casos previstos no art.º 60, n.º 2, da Lei Geral Tributária, é possível dispensar a audição prévia do contribuinte, mais exactamente nos casos em que a liquidação se basear na declaração apresentada pelo contribuinte, tal como nos casos em que a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe for favorável (cfr. Diogo Leite de Campos e outros, ob. cit., pág.203).
No caso "sub judice", conforme se retira da matéria de facto provada (cfr.nss.12 e 13 da matéria de facto provada), não houve preterição da formalidade legal alegada pelo recorrente, sendo manifesto que este deduziu fundamento de recurso cuja falta de razão não podia ignorar. “”
Concordamos com o entendimento do Mmo. Juiz a quo em como no caso dos autos não houve violação da formalidade legal invocada pelo Recorrente.
Com efeito, o Recorrente foi notificado para exercer, querendo, o direito de audição tendo-lhe sido remetido não só o projecto de decisão como, ainda, a informação dos serviços, o parecer que recaiu sobre a mesma bem como o despacho que recaiu sobre os dois e para os quais remete o projecto de decisão. Na decisão final, tem de se tomar posição sobre as alegações do contribuinte em sede de exercício do direito de audiência prévia, conforme obriga o disposto no artigo 60º, n.º 7 da LGT. Mas, de forma alguma, o contribuinte volta a ser notificado para se pronunciar sobre a fundamentação da decisão final. Aliás, se fosse como o Recorrente pretende, acabaria por nunca haver uma decisão final, haveria tão só projectos de decisão porque o contribuinte estaria sempre a pronunciar-se sobre os sucessivos projectos. O legislador consagrou o direito de audição prévia, que consiste, como o Mmo. Juiz bem diz, no direito de todos os cidadãos participarem na formação das decisões ou deliberações da Administração que lhes disserem respeito. Todavia, esse é um direito que se exerce uma vez em relação à mesma decisão, não mais, antes de tomada a mesma decisão, final. Depois desta, o contribuinte tem o direito ao recurso da decisão definitiva.
Por outro lado, os alegados 3 mapas, que só podem ser os constantes a fls. 76 do processo administrativo, e fazem parte integrante da decisão final, foram elaborados com os elementos/valores que já constavam do projecto da decisão, ainda que apresentado de forma diferente, pelo que não constituem elementos novos, até porque não foram carreados novos elementos para o processo. Só lhe foi dada, em parte, uma apresentação diferente relativamente ao que consta dos referidos mapas mas, a substância é exactamente a mesma. Aliás, no que respeita ao IRS, o Recorrente sabe muito bem os valores declarados, tal como sabe os valores que se presume tenham sido omitidos e que estão em causa nos autos de derrogação do sigilo bancário, porque lhe foi notificado o projecto de decisão onde os valores em causa estão indicados, inclusivamente quanto à compra e venda da fracção “J” e o mesmo se diga quanto à sisa relativamente às duas fracções.
Deste modo, improcedem as conclusões I a VII.
Quanto às conclusões VIII a XIII, no que se refere à falta de fundamentação da decisão do Director-Geral, o Mmo. Juiz entendeu que:
“” O recorrente, seguidamente, imputa ao despacho objecto do presente recurso o vício de falta de fundamentação, assim violando o disposto no art.º 63-B, n.º 3, da L. G. Tributária.
Existe vício de forma sempre que na formação ou na declaração de vontade traduzida no acto tributário, enquanto acto administrativo, foi preterida alguma formalidade essencial. É jurisprudência e doutrina assente que toda a formalidade prescrita por lei é essencial, isto é, tem de ser observada para que o acto seja válido (cfr. M. Caetano, Manual de D. Administrativo, l, 10a.edição, Coimbra, 1991, pág.471; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, Almedina, 3a. edição, 1997, pág.323; ac.S.T.A.-2B. Secção, 13/2/85, Acórdãos Doutrinais, ns.284/285, pág.947).
A fundamentação dos actos tributários ou «praticados em matéria tributária» que «afectem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes» estava consagrada nos arts.19, al. b), 21, 81 e 82, do C. P. Tributário (cfr.artes.63-B, n.º 3, e 77, da L. G. Tributária).
Tal necessidade de fundamentação decorria já, quer do art.1, n.º 1, als. a) e c) do dec. lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho, quer do próprio art.º 268, n.º 3, da C. R. Portuguesa, na redacção introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/89 (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pág.936 e seg.; Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos, 1990, pág.53 e seg.).
Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr.ac.S.TJ.26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág.57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2§. edição, 1985, pág.687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág.139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cf. por todos, ac.S.T.A-1ã.Secção, 6/2/90, A.D., ne.351, pág.339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável – uma pessoa normal – colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Por outro lado, a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação "per relacionem" - cfr.arts.125, do C.P.Administrativo).
Mais, deve fazer-se a destrinça entre a fundamentação do acto administrativo e, questão diferente, a notificação da fundamentação, realidades diversas, apenas a primeira constituindo vício de forma determinante da anulabilidade do acto (cfr.ac.S.T.A-2ª Secção, 9/9/99, rec.23773).
A mera falta de notificação da fundamentação de um acto de liquidação não gera a invalidade deste, antes dando direito ao sujeito passivo de requerer a notificação da fundamentação ou a passagem de certidão que a contenha (cfr. arte.22, ne.1, do C.P.Tributário; arta.37, do C.P.P.Tributário). "In casu", entende o Tribunal que o despacho objecto do presente recurso se encontra suficientemente fundamentado, tendo a mesma fundamentação sido levada ao conhecimento do recorrente (cfr.n.ºs.11 a 15 da matéria de facto provada). E tanto assim é, que o próprio recorrente a tal factualidade alude na p. i. do presente processo.
Conclui-se, pois, que não ocorre a alegada falta de fundamentação do acto administrativo-tributário objecto do presente processo, pelo que o recurso se tem que julgar improcedente também quanto a este fundamento. “”
No geral, concordamos com o Mmo. Juiz. No entanto, o que o Recorrente pretendia, salvo melhor opinião, é que a fundamentação da decisão final fosse exactamente igual à do projecto de decisão que lhe foi notificado, como parece resultar da conclusão VIII, na qual o Recorrente conclui que: “” Também não assiste razão à sentença quando refere que a fundamentação notificada ao recorrente para a derrogação do sigilo bancário era adequada pois que tal questão se entrelaça com a fundamentação que foi inicialmente notificada e não qualquer outra ulteriormente aditada em sede de decisão propriamente dita pois que a que tem de relevar é a primeira. “”
Todavia, o Recorrente não tem razão, até pelo simples facto de que, na decisão final, o autor do acto tem de se pronunciar, obrigatoriamente, sobre o que o contribuinte, destinatário do acto, alega em sede de exercício de audição prévia. Ora foi o que o autor do acto fez no caso dos autos. A fundamentação há-se ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao administrado ou contribuinte um conhecimento concreto da motivação do acto, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a actuar como actuou, e congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão.
Podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anterior parecer, informação ou proposta, que, neste caso, constituirão parte integrante do respectivo acto (fundamentação por adesão; ou remissão).
Pelo que, em tal caso, o despacho integra nele próprio o parecer, informação ou proposta que, assim, em termos de legalidade, terão de satisfazer os mesmos requisitos da fundamentação autónoma. (cfr. Acórdão STA, de 06.11.96, in Ciência e Técnica Fiscal, 385/338).
Ora no caso dos autos, a decisão está bem fundamentada porque, está expressa, clara, coerente e suficiente e o facto de a informação, para a qual a decisão remete, estar apresentada um pouco diferente da do projecto, porque nela se discutiram os argumentos do Recorrente, não a torna numa fundamentação desgarrada da do projecto de decisão que foi notificada ao Recorrente e sobre a qual ele se pronunciou, pelo que a fundamentação da decisão final não tem de ser, nem deve ser, uma cópia fiel da do projecto de decisão. A informação sobre para a qual se remeteu na decisão final tem todos os elementos que constam do projecto de decisão só que estão apresentados de modo diferente e, por isso, se mostram mais destacados. É certo que na informação final se faz uma liquidação simulada de IRS tendo em conta os valores não declarados pelo Recorrente e em causa nestes autos. Todavia, os valores já constavam da informação para a qual remeteu o projecto de decisão, pelo que bastava ao recorrente, que está representado por Advogado, aplicar a respectiva taxa aos valores encontrados depois de somados os 32.421,86€ aqui em causa.
Também não constava o mapa onde se simula a liquidação de IRC tendo em conta os valores não entrados nem registados na contabilidade da sociedade. Todavia, o problema é o mesmo. Os valores já estavam indicados naquela primeira informação e, como tal, era só pegar neles e simular a liquidação, aplicando-se a respectiva taxa. O mesmo se diga em relação à sisa que, contudo, os compradores das duas fracções acima identificadas.
Deste modo, as conclusões em causa não podem deixar de improceder.
Por outro lado, o Recorrente procura abalar a fundamentação da decisão recorrida concluindo na conclusão XII que “ Em primeiro lugar a fundamentação é tanto ou tão pouco suficiente que até a sentença revela não perceber bem a situação em causa bastando para aquilatar de tal ver o ponto 2 do probatório pois que do mesmo resulta que o valor declarado na escritura foi de € 79.807,66.” e na conclusão XIII em que conclui que “” Ora assim sendo, e ocorrendo ocultação de valores o que não se concede, a diferença entre o valor real e o declarado não era de € 32.421,87 mas sim de € 19.572,44. (66.958,24 + 32.421,86 - 79.807,66) “”.
Salvo melhor opinião, o Recorrente também não tem razão. Com efeito, a escritura pública da compra e venda da fracção “C”, em que foi compradora Sílvia Alexandra Pedro Martins, foi efectivamente celebrada pelo valor de 16.000.000$00/79.807,66 €, como resulta não só da decisão final, tal como do respectivo projecto, como ainda da cópia do termo de Declaração do Imposto Municipal de Sisa de fls. 30 e da relação apresentada pelo respectivo Notário, conforme documento de fls. 12 do p.a., sendo certo que o valor pelo qual foi celebrado o negócio foi de 22.500.000$00 como resulta do contrato promessa de compra e venda e das declarações da promitente compradora, que se apresentou voluntariamente a pagar a diferença de sisa, conforme referida cópia do termo de Declaração do Imposto Municipal de Sisa de fls. 30. Se o valor da compra e venda não tivesse sido o constante do contrato promessa, decerto que a compradora não pagaria sisa pela diferença de 6.500.000$00 como pagou.
Por outro lado, o facto de a AT se referir apenas aos dois cheques cujas fotocópias fazem fls. 26 a 29, não significa que a compradora tenha pago apenas as importâncias constantes dos mesmos. Quanto mais não seja, sempre existiria o sinal e princípio de pagamento pago antes da celebração da escritura pública. O que interessa, para o caso dos autos, é que um dos cheques emitidos pela compradora para pagamento da fracção autónoma que comprou à sociedade de que o Recorrente é gerente, foi entregue ao Recorrente, o de 6.500.000$00, pois foi emitido em seu nome e foi ele que o endossou para depósito em conta bancária diferente daquela onde foi depositado o cheque de 13.423.922$00, emitido em nome da vendedora. Deste modo, não existe qualquer divergência na fundamentação da decisão recorrida. Esta está bem fundamentada, de forma clara e coerente e, como se disse acima, não apresenta fundamentação com substância diferente da constante do projecto da decisão. Ela só apresenta algumas diferenças, porque se discutiram as alegações do Recorrente em sede de direito de audição prévia, nomeadamente quanto à recusa de acesso às contas bancárias do mesmo, e em cuja decisão/informação se faz a demonstração inequívoca da existência de factos concretos gravemente indiciadores da falta de veracidade dos valores declarados pelo Recorrente para efeitos de tributação, que a comprovarem-se resultam na prática de crime doloso em matéria tributária tipificado no artigo 103° do RGIT, inclusive quanto ao montante da vantagem patrimonial ilegítima resultante da conduta do Recorrente..
Improcedem, assim, as conclusões VIII a XIII.
Quanto às conclusões XIV e XV, em que o recorrente conclui que é insustentável que se verifique recusa por parte do procurador de acesso às contas bancárias do recorrente, uma vez que o mesmo não tinha poderes para permitir esse acesso , entendemos que, salvo melhor opinião, o Recorrente tem razão.
Pela procuração outorgada pelo Recorrente a Eurico Ascenso Pereira e indicada no ponto n.º 8 dos factos provados, foram concedidos os seguintes poderes: “” prestar esclarecimentos sobre a situação tributária referente ao ano de dois mil e um, nos termos do n.º 4, do art.º 59º da LGT e art.º 9º do RCPIT, junto da Direcção de Finanças de Lisboa. …. “” (ponto n.º 20 dos factos provados). Será que nestes poderes estão incluídos os de permitir o acesso às contas bancárias do recorrente? Entendemos que não! Isto é, entendemos que a autorização para o acesso à informação constante das contas bancárias vai muito para além dos esclarecimentos a que se referem os artigos 59º, n.º 4 da LGT e 9º do RCPIT e, como tal, para que o procurador tivesse poderes para dar tal autorização, teria de ter poderes expressos para tal, o que não aconteceu no caso dos autos.
Assim, não se poderá falar em recusa imputável ao recorrente quando o procurador afirmou não autorizar o acesso da AT às contas bancárias do recorrente. Aliás, se o procurador tivesse autorizado, porque não tinha poderes expressos para tal, poderia vir a ser demandado pelo Recorrente por ter excedido os poderes conferidos. Aliás, a própria AF entendeu isso e só assim se compreende que, depois, tenha notificado expressa e pessoalmente para o efeito o próprio Recorrente, por carta registada com A/R.
De qualquer modo, o Recorrente já não tem razão quanto à chamada “segunda” recusa a que se referem as conclusões XVII, XVIII a XX.
Nestas conclusões o recorrente conclui que “ Em relação à segunda recusa incorre também a sentença em erro de julgamento da matéria de facto pois que na verdade não ocorreu qualquer recusa”, que “ o que o recorrente suscitou foi se encontrava incapacitado (motivo grave) e de que necessitava da nomeação de um curador, motivo grave este que o recorrente invocou e que a DGCI nem sequer capacidade tem para apreciar, apesar de o ter feito de forma totalmente rudimentar, uma vez que só pode ser aquilatado pela ciência médica; Pelo que se impunha a nomeação de um representante legal ao recorrente ou, eventualmente, de um curador provisório “, que “ tudo isto a sentença ignorou fazendo-a incorrer em errada fixação do probatório a ser merecedora de revogação nessa parte com a inerente alteração do probatório de modo a dar como não provados os factos atrás referidos “ e que, portanto, “não se encontravam preenchidos os requisitos legais que permitem a derrogação do sigilo bancário pois que o primeiro deles, recusa de autorização (e como já atrás referido) não se verificou.”
Também salvo melhor opinião, entendemos que a atitude do Recorrente não pode deixar de se considerar como sendo de recusa para autorizar o acesso da AT à informação constante das suas contas bancárias. O Recorrente foi notificado para, em dez dias, informar se “”autoriza a consulta/acesso a informação e documentos bancários nos termos do n.º 2 do artigo 63º-B da LGT, e ainda para, na hipótese de autorizar, devolver ao respectivo serviço, no mesmo prazo, a declaração que se juntava, devidamente preenchida e assinada, acompanhada de fotocópia do B.UI. e do cartão de contribuinte, com a cominação de que, na ausência de resposta no referido prazo, se entenderia como recusa de autorização “”– ver fls. 58 do p.a.
Ora o Recorrente respondeu, mas para alegar que não se encontrava em condições físicas e psíquicas de responder à notificação, nem tão pouco de tomar dela cabal conhecimento.
Antes de mais, não se percebe como é que o Recorrente pôde tomar conhecimento, até então, de todo o procedimento e, agora, de repente, deixou de o poder fazer. Por outro lado, o Recorrente não faz a mínima prova de que “” se encontrava incapacitado (motivo grave) e de que necessitava da nomeação de um curador “”. É que, o Recorrente, na sequência da notificação para declarar se autorizava o acesso às suas contas bancárias, limitou-se a apresentar com o requerimento de fls. 65 a 66 do p.a. e a juntar ao mesmo um “relatório de alta” do Hospital Polido Valente onde o Recorrente esteve hospitalizado em 2001, durante o período de 3/11 a 10/11, e a juntar cópia do relatório de uma angiodinografia cérebro-vascular que fez em Maio de 2002 cujos elementos, sem mais, não podem sequer indiciar que o recorrente não possa entender o sentido da notificação, já que, o que consta de tal angiodinografia é que: “ O exame efectuado mostra a presença de sinais de oclusão completa da carótida interna esquerda.
À direita observaram-se placas de ateroma que determinam estenoses moderadas sem repercussão hemodinâmica.
As artérias vertebrais estão permeáveis. (…) “, tudo conforme documentos de fls. 64 a 70 do processo administrativo. Se há situações em que a pessoa que sofreu um AVC fica incapacitado, a verdade é que, em muitas outras essa pessoa pode fazer a sua vida normal e, no caso dos autos, o que resulta do processo é que é o caso do Recorrente, ainda que com alguns problemas de saúde.
Aliás, se o Recorrente não pudesse entender o sentido das notificações não poderia, sequer, constituir mandatários e, no caso do Recorrente, o mesmo apresentou-se perante o Segundo-Ajudante do Cartório Notarial de Loures, em Maio de 2005, para constituir mandatário, como se vê pelo documento de fls. 21 a 22. Ora, se não estivesse em condições de entender o acto, o referido oficial nunca aceitaria a prática do acto pelo Recorrente. E, por outro lado, se o Recorrente estava nas condições por si invocadas, então também não estaria em condições de constituir mandatário para apresentar o presente recurso. Antes teriam sido tomadas outras providências, nomeadamente visando eventualmente a sua interdição, o que não se mostra feito.
Assim, se o Recorrente tem capacidade para determinados actos, incluindo relacionados com este processo, tem de se entender que tem capacidade para os restantes, cabendo ao mesmo o ónus de provar o contrário. Não tendo feita essa prova, nomeadamente com a junção de pareceres dos respectivos especialistas, a sua conduta tem de ser tomada como sendo de recusa de autorização para a consulta/acesso a informação e documentos bancários nos termos do n.º 2 do artigo 63º-B da LGT pela Administração Tributária.
Deste modo, porque o Recorrente não deu autorização expressa para a AT ter acesso às contas, para cujo efeito deveria devolver a declaração enviada apela AT, sabendo que o não envio da mesma equivalia a recusa, tem de se entender que, efectivamente, houve recusa do Recorrente em autorizar a consulta/acesso a informação e documentos bancários nos termos do n.º 2 do artigo 63º-B da L.G.T. e, sendo assim, está verificado um dos requisitos para a derrogação do sigilo bancário.
Quanto às conclusões XXI a XXIV, sobre os indícios da prática de crime, o Mmo. Juiz entendeu que:
“” Alega, por último, o recorrente que o despacho padece do vício de violação de lei, dado que não se verificam os pressupostos legais consagrados no art.º 63-B, n.º 2, al.c), da L. G. Tributária, para que o mesmo possa ser estruturado. Assim é, porquanto, a derrogação do sigilo bancário, ao abrigo da norma em análise e na redacção aplicável ao caso dos autos, tem que se basear sempre na existência de indícios da prática de crime doloso em matéria tributária, o que não se verifica no caso dos autos.
(...) o sigilo bancário não se apresenta hoje, na ordem jurídica portuguesa, com carácter absoluto, podendo sofrer compressões impostas pela necessidade de salvaguardar determinados direitos ou princípios (v.g. combate à fraude e evasão fiscais de que é expoente a Lei 30-G/2000, de 29/12).
"In casu", a decisão de revogação do sigilo bancário objecto do presente processo foi efectuada ao abrigo do art.º 63-B, n.º 2, al. c), da L. G. Tributária, na redacção da Lei 30-G/2000, de 29/12, a aplicável ao caso "sub judice" (cfr. arts.12, do C. Civil).
É a seguinte a redacção do preceito em análise:
Artigo63.º-B
"Acesso a informações e documentos bancários"
1- …
2-A administração tributária tem o poder de aceder a todos os documentos bancários, excepto as informações prestadas para justificar o recurso ao crédito, nas situações de recusa de exibição daqueles documentos ou de autorização para a sua consulta:
…
c) Quando existam indícios da prática de crime doloso em matéria tributária, designadamente nos casos de utilização de facturas falsas, e, em geral, nas situações em que existam factos concretamente identificados gravemente indiciadores da falta de veracidade do declarado.
Refira-se, antes de mais, que o conceito de documento bancário utilizado pelo preceito se encontra previsto no art.º 63-B, n.º 10, da L. G. Tributária.
De acordo com a doutrina e jurisprudência dos Tribunais Superiores, a aplicação da norma supra identificada gera a necessidade de verificação simultânea dos seguintes vectores constantes da sua previsão:
1 -Recusa de autorização por parte do visado;
2-Existência de indícios da prática de crime doloso em matéria tributária;
3-Factualidade concretamente identificada gravemente indiciadora da falta de veracidade do declarado (cfr. ac. S.T.A -2-.Secção, 13/10/2004, proc.950/04; ac.S.T.A-2.º Secção, 16/2/2005, proc.35/05; ac.T.C.A.Sul-2.ª Secção, 16/3/2005, proc.485/05; Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 3a. Edição, 2003, pág.319 e seg.).
A nova redacção dada à norma em apreciação pelo arte.40, da Lei 55-B/2004, de 30/12, a qual aponta no sentido da alternatividade dos pressupostos n9s.2 e 3 supra, vem pôr em causa esta interpretação jurisprudencial e doutrinal, embora o novo regime somente se possa aplicar a factualidade ocorrida após Janeiro de 2005 (cfr.63-B, nQ.9, da L. G. Tributária).
Haverá, portanto, que analisar se estão reunidos os pressupostos legais da decisão objecto do presente recurso, de acordo com o regime previsto no aludido art.º 63-B, da L. G. Tributária, na redacção da Lei 30-G/2000, de 29/12.
Dir-se-á, antes de mais, que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr. art.º 9, do C. Civil; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4a. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, n.º 174, 1996, pág.363 e seg.).
Começando pelo primeiro dos requisitos a que se alude supra, recusa de autorização por parte do visado, é óbvia a conclusão de que o mesmo se encontra provado conforme já referido acima (cfr. n.º 9 e 14 da matéria de facto provada).
Mais se dirá, que o recorrente, no âmbito da análise deste pressuposto da derrogação do sigilo bancário chama à colação a alegada falta de fundamentação do despacho que decide o acesso à informação bancária. Conforme se analisou supra, tal despacho encontra-se devidamente fundamentado.
Concluindo, atenta a matéria de facto provada, encontra-se preenchido o primeiro dos requisitos para a derrogação do sigilo bancário no caso dos autos e que consiste na recusa de autorização por parte do visado.
Passemos à análise do segundo dos requisitos previstos na norma, o relativo à existência de indícios da prática de crime doloso em matéria tributária.
Indício consiste na circunstância certa através da qual se pode chegar, por indução lógica, a uma conclusão acerca da existência ou inexistência de um facto que é objecto de prova. O convencimento indiciário fundamenta-se num esquema silogístico. Neste, a premissa maior, de natureza problemática, é constituída pelas máximas da experiência e pelo senso comum; a premissa menor, que deve revestir características de certeza, é constituída pela circunstância indiciante; a conclusão, finalmente, conjuga logicamente a premissa menor, concreta e certa, com a premissa maior, abstracta e problemática, assim constituindo o designado "argumentum demonstrativum
delicti" (cfr. Germano Marques da Silva, Do Processo Penal Preliminar, Lisboa, 1990, pág.346 e seg.).
Consideram-se suficientes os indícios sempre que dos mesmos resultar uma possibilidade razoável de, ao arguido e em sede de julgamento, vir a ser aplicada uma pena ou uma medida de segurança, ou, por outras palavras, quando seja de considerar mais provável a condenação do que a absolvição do agente da infracção (cfr.art.º 283, n.º 2, do C.P.Penal). A lei não estabelece, nem nunca o poderia fazer com rigor, o que sejam indícios suficientes, remetendo o aplicador do Direito para a referida "possibilidade razoável".
Ao contrário do que acontece em sede de julgamento, durante o qual a condenação deve basear-se numa certeza da prática do ilícito imputado, buscada numa cimentada e sã apreciação crítica da prova, quando esta não é vinculada (v.g.art.ºs.163 e 169, do C.P.Penal), o mesmo rigor não é reclamado pelo legislador nas fases da acusação ou pronúncia, conforme já mencionado.
Estamos, portanto, perante questão (a análise da suficiência de indícios) que a lei deixa, na maior parte das situações (todas aquelas em que a prova não é vinculada), ao prudente critério do aplicador do Direito e que, em cada caso, deve ser analisada e decidida ponderadamente (cfr. J. Figueiredo Dias, D. Processual Penal, l, pág.133; ac.R.Coimbra 31/3/93, C.J., 1993, II, pág.65).
"In casu", de acordo com a matéria de facto provada, no despacho objecto do presente recurso, através da remissão operada para as informações e pareceres que o fundamentam, concretiza-se factualidade indiciadora do crime de fraude fiscal previsto no art9.103, do R.G.I.T. (cfr.n-s.1 a 6 da matéria de facto provada).
Da factualidade referida retira-se a existência de fortes indícios de omissão de valores declarados na escritura de compra e venda da fracção autónoma adquirida pela identificada Sílvia Alexandra Pedro Martins, omissão essa praticada em benefício de todos os intervenientes no mencionado negócio jurídico. Tal benefício traduz-se em vantagens patrimoniais indevidas para o recorrente (em sede de I.R.S.), para a sociedade vendedora (em sede de I.R.C.) e para a adquirente (em sede de Sisa, ao tempo), todos vendo a sua carga tributária diminuída em virtude do valor declarado da transacção em análise. Mais deve vincar-se que, sendo o objecto social principal da sociedade vendedora a compra e venda de imóveis, da mesma sendo o recorrente sócio-gerente, se deve concluir pela existência de indícios de uma prática reiterada de ocultação de valores declarados e consequentes rendimentos (relembre-se que a fracção autónoma vendida integrava um conjunto de 10 fracções pertencentes ao mesmo imóvel constituído em propriedade horizontal - cfr.n.º 2 da matéria de facto provada), assim visando a presente derrogação do sigilo bancário, além do mais, precisamente a análise e aprofundamento da existência dos aludidos indícios. E recorde-se que a norma em análise (art.º 63-B, n.º 2, al.c), da L.G.Tributária) se basta com a existência de indícios, não exigindo a prova da existência do ilícito criminal em causa. Mais se dirá que tais indícios igualmente abarcam a condição objectiva de punibilidade prevista no arts.103, n.º 2, do R.G.I.T., atenta a prática reiterada de tal conduta que resulta do carácter profissional e empresarial das transacções desenvolvidas pela sociedade de que o recorrente é sócio-gerente conforme se alude acima.
Concluindo, entende o Tribunal, contrariamente ao que defende o recorrente, que a factualidade constante dos presentes autos contém fortes indícios da prática de crime (s) doloso (s) em matéria fiscal.
Por último, óbvio se torna a conclusão de que igualmente se encontra provada factualidade que permite pôr em causa a presunção de veracidade da declaração de rendimentos, em sede de I.R.S., apresentada pelo recorrente e relativa ao ano de 2001 (cfr.n.ºs.4 e 5 da matéria de facto provada), pelo que se encontra preenchido o terceiro requisito da norma citado supra (factualidade concretamente identificada gravemente indiciadora da falta de veracidade do declarado) “” (…).
Concordamos com a fundamentação transcrita, não só porque se entendeu acima que efectivamente se verificou recusa por parte do Recorrente em autorizar o acesso à informação e documentos bancários – ainda que por fundamentação diversa da do Mmo. Juiz – mas também porque da decisão proferida pelo Director-Geral dos Impostos consta a descrição de factualidade concreta que, a provar-se, preenche todos os elementos do específico tipo do crime fiscal imputado ao Recorrente, fraude fiscal, descrevendo-se os factos e individualizando a norma concreta incriminadora que a AF julga preenchida, ou seja a do artigo 103º do RJIT.
Dispunha esta norma à data dos factos que:
1- Constituem fraude fiscal, (….) as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias. A fraude fiscal pode ter lugar por:
a) Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável;
b) Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária;
c) Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas.
2 – Os factos previstos nos números anteriores não são puníveis se a vantagem patrimonial ilegítima for inferior a € 7.500.
3 - .....
A “vantagem patrimonial ilegítima” a que se refere a norma transcrita é constituída pelo montante dos impostos que deveriam ter sido e não foram entregues nos cofres do Estado em virtude da conduta do suspeito. Ora, como se vê pela matéria de facto provada, da decisão do Director Geral dos Impostos, que remete para a informação dos serviços e, como tal faz parte da própria decisão, constam todos os elementos do crime de fraude fiscal p.p. pelo artigo 103º do RJIT, incluindo a condição de punibilidade prevista no n.º 2, uma vez que, também como se vê pela matéria de facto dada como provada, e ainda que se considerasse que a vantagem patrimonial ilegítima a ter em conta é apenas a que foi obtida pelo Recorrente, ainda assim a mesma, no caso dos autos, é superior ao montante de 7.500€, como se vê pela liquidação simulada pela AF (fls. 76 e 81 a 82) e isto sem ter em conta que no ano de 2001 foram vendidas oito fracções do mesmo prédio e que, em duas delas, as acima identificadas “J” e “C”, se declararam nas respectivas escrituras públicas valores inferiores aos que realmente os compradores entregaram para pagamento das referidas fracções, o que efectivamente leva a concluir pela existência de uma prática reiterada de ocultação de valores declarados e consequentes rendimentos.
Contudo, convém não esquecer que a AF deixou de receber IRC em virtude da conduta do Recorrente, uma vez que qualquer dos dois cheques não deram entrada nos cofres da vendedora, nem aí foram registados, pelo que houve omissão de proveitos, que a AF também liquidou por simulação (fls. 76).
No que respeita ao Imposto Municipal de Sisa, também foram omitidos valores e, como tal, deixaram de produzir Sisa e embora a mesma seja a pagar pelos compradores, a verdade é que foi a conduta do Recorrente que contribuiu para que tais valores não fossem manifestados atempadamente e só o foram posteriormente porque os compradores das fracções “C” e “J” se apresentaram voluntariamente a liquidar Sisa pelas diferenças de preços que tinham omitido e que respeitavam aos cheques entregues por fora. O Estado acabou por receber, no caso destas duas fracções, o respectivo imposto, mas mesmo assim foi mais tarde do que poderia receber e poderia até nem o ter recebido se não fosse detectada a situação.
Sobre situações idênticas e no sentido da posição aqui defendida, cfr. Ac. do TCAN de 20/12/2005, Proc. 00494/04, de 01/12/2005, Rec. 00496/05; Ac. deste TCAS de 17/01/2006, Rec. 00899/05, de 2006/03/07, Rec. 1066/06, de 29/11/2005, Rec 00846/05 e de 03/08/2005, Rec. 00511/05 e Ac. do STA de 19/4/2009, Rec. 0276/06.
Por outro lado, também convém recordar que qualquer um dos dois compradores aqui identificados efectuou o pagamento da sisa respeitante à parte do preço omitida nas escrituras de compra e venda, o que torna fortíssimos os indícios de ocultação de rendimentos sujeitos a impostos.
Para além disso, o prédio em causa tem dez fracções, oito das quais foram vendidas em 2001, sendo que em duas, as fracções “C” e “J”, foram omitidos valores, de 6.500.000$00 e 7.000.000$00, respectivamente. Como tal, indicia-se que o mesmo terá ocorrido com as restantes seis fracções, o que aumenta a vantagem patrimonial ilegítima. Ora o montante total dos impostos efectivamente em falta como consequência da conduta do Recorrente - vantagem patrimonial ilegítima - só pode ser quantificado depois de se aceder às contas bancárias porque só então existem elementos para se determinarem as matérias colectáveis pelo que, para efeitos de verificação da condição de punibilidade, também devem ser tomadas em consideração as fracções autónomas do mesmo prédio vendidas e ainda não fiscalizadas.
Ora todos estes factos, como muito bem defende a ERFP, prefiguram os elementos do tipo de uma infracção fiscal dolosa e que constitui o crime fiscal previsto e punido pelo artigo 103º do RGIT.
Face a todo o exposto, improcedem, assim, as conclusões XXI a XXVIII, devendo manter-se, assim, a sentença recorrida, ainda que com fundamentação diferente quanto à recusa do Recorrente.
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C) DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida e, em consequência, acorda-se em não se anular a decisão do Director-Geral dos Impostos de 2005-07-13, pela qual autorizou os funcionários da Inspecção Tributária devidamente credenciados a aceder directamente a todas as contas bancárias e documentos bancários existentes em instituições bancárias portuguesas de que seja titular o aqui Recorrente J..., contribuinte n.º 138965579.
Custas pelo Recorrente.
Lisboa, 2006-05-30
Ivone Martins
Jorge Lino
Pereira Gameiro
Feito e imprimido por meios mecanográficos, com versos em branco (art. 138º, 5 do CPC) |