Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:448/21.7BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:11/06/2025
Relator:MARIA JULIETA FRANÇA
Descritores:SUBSÍDIO DE DESEMPREGO
DECRETO-LEI N.º 220/2006
Sumário:
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Social
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SUBSECÇÃO SOCIAL DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:

I.RELATÓRIO


..., intentou ação administrativa contra INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P., na qual peticiona a anulação do ato administrativo que determinou a restituição da totalidade do montante atribuído à beneficiária AA, a título de subsídio de desemprego, ao abrigo do regime do artigo 10.º e 63.º do Decreto-Lei n. º220/2006.


Por Sentença proferida em 30.06.2022 o Tribunal Administrativo de Sintra julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu a Entidade Demandada dos pedidos.


Inconformada, a Autora, ..., interpôs recurso da Sentença para este Tribunal Central Administrativo Sul, terminando as alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem:


“1ª. O douto despacho saneador sentença refere ter sido indeferida a produção de prova testemunhal e a realização da audiência prévia “…Nos termos do despacho que antecede a presente decisão…”. Porém, a A. não foi notificada de qualquer despacho nesse sentido.


2ª A notificação do douto despacho saneador sentença não contém qualquer despacho antecedente quanto a essa matéria, desconhecendo-se a fundamentação do mesmo.


3ª. Só com a notificação do despacho saneador sentença é que a Recorrente tomou conhecimento da alegada dispensa da realização da audiência prévia, bem R BB como da alegada dispensa da inquirição das testemunhas, pelo que o presente recurso é a sede própria para invocar tais nulidades processuais.


4ª A falta de douto despacho no sentido constitui nulidade de sentença, já que é proferido saneador sentença com fundamento num despacho inexistente, sendo que para tal prolação necessário se tornava que o tribunal emitisse despacho nesse sentido, designadamente, para que a A. pudesse do mesmo recorrer.


5ª. Assim, o douto saneador sentença padece da nulidade prevista no artigo 615º, alínea d), primeira parte, que se invoca.


6ª. “In casu”, com a prolacção do saneador sentença, o processo finda com o conhecimento imediato do mérito da causa, sem ter havido audiência prévia.


7.ª Assim, entendendo o Meritíssimo Juiz “a quo” que poderia conhecer, em sede de despacho saneador, acerca do mérito da ação, deveria, em cumprimento do prescrito na alínea b), do nº. 1, do artigo 87º-A do CPTA, convocar audiência prévia, sendo que, não o tendo feito, incorreu em omissão de um acto processual expressamente prescrito na lei, pois a não realização da audiência prévia deve ser sempre fundamentada.


8ª. Acresce que, a douta decisão recorrida, não tendo proferido despacho fundamentado sobre a realização da audiência prévia, também não o fez relativamente à produção da prova testemunhal arrolada pela Recorrente, quando a Recorrente até alegou matéria controvertida.


9ª. A própria decisão recorrida refere que não foram carreados para os autos provas da suspensão ou interrupção do subsídio de desemprego, o que assume carácter superveniente relevante para a boa decisão da causa, e podia ter sido invocado e colmatado em sede de audiência prévia, pelo que a douta decisão recorrida incorre em mais uma nulidade, que se argui para os devidos efeitos legais.


10ª. Embora as partes tenham sido ouvidas quanto à dispensa da audiência prévia, só perante a ausência do requerimento de alguma das partes a requerer a realização da audiência prévia, fica a mesma dispensada no processo, podendo o juiz decidir do mérito da causa.


11ª. Porém, manifestando a parte interesse na realização da audiência prévia e discordando da sua não realização, o tribunal deve convocar a sua realização, sob pena de nulidade processual, que se invoca.


12ª. Salvo o devido respeito, que muito é, afigura-se-nos que, “in casu”, o limite de rescisões por mútuo acordo ao abrigo do disposto no art.º 10º nº 4 alínea b) do Dec. Lei 220/2006 de 3 de Novembro não é de 11, como considerou a douta decisão recorrida, mas sim de 80 em cada triénio.


13ª. As rescisões por mútuo acordo são um processo dinâmico em contraposição com o despedimento coletivo, pelo que o triénio se inicia na data da primeira cessação a que se poderão seguir outras, até ao limite de 80, durante os três anos seguintes.


14.ª A Recorrente teve necessidade de recorrer a este tipo de cessação, por força da pandemia que parou, em absoluto, a sua atividade conexa com a da aviação, em 18/09/2020, data em que se iniciou a contagem de um novo ciclo de três anos, sendo que no mês anterior, isto é, em Agosto de 2020 a empresa tinha ao seu serviço 913 trabalhadores.


15ª. Pela dinâmica da atividade económica e a falta de retoma da prestação de serviços e consequente influência negativa, isto é, impeditiva da prestação de serviços desta empresa, a necessidade de continuar as cessações do contrato por mútuo acordo continuou no triénio, entretanto, iniciado, e a mesma foi concretizada, entre outros, com a trabalhadora “sub judice”.


16º. Afigura-se, assim, absurda e injusta em face do caso concreto e das reais circunstâncias que ditaram as cessações, a interpretação efetuada pela douta decisão recorrida, de fazer retroagir o triénio, “in casu”, a data anterior, uma vez que, nessa altura, e, desde essas datas, até 18/09/2020, não houve qualquer cessação de contrato por mútuo acordo, pelo que não se pôde iniciar o decurso de qualquer triénio para os efeitos do art.º 10º nº 4, alínea b) do Dec. Lei 220/2006 de 3 de Novembro.


17.ª Também não se afigura como critério, contar um triénio para cada uma das cessações de contrato efetuada em dias diferentes, como faz a douta decisão recorrida, pois nunca seria possível, como prevê a lei, que em cada triénio se pudesse preencher a quota de 80 cessões de contrato, pelo que, como já foi referido, só faz sentido contar o início do triénio em 18/09/2020 e términus em 18/9/2023.


18ª. Aliás, considerar o cômputo do triénio como faz a douta decisão recorrida determinaria para as empresas e, designadamente, para a Recorrente, um peso incomportável em face da sua total paralisação em virtude da pandemia Covid 19.


19ª. Assim, ao contrário do decidido pela douta decisão recorrida, os actos impugnados ao aferirem a contagem do triénio nos termos em que o fizeram, incorreram em vício de violação de lei, quer por erro nos pressupostos de facto, quer por erro nos pressupostos de direito, devendo ser anulados, tendo a douta decisão recorrida violado o artigo 10º, n.º 4, alínea b) e n.º 5, do D. L. n.º 220/20062.


20.ª Acresce que, a interpretação do n.º 5, do artigo 10º, do Dec. Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro efectuada pela douta decisão recorrida, no sentido de que o triénio aí referido se inicia três anos antes da cessação do contrato em apreço, se afigura inconstitucional, já que viola o artigo 86º da Constituição da República Portuguesa (CRP), pois sendo incumbência do Estado incentivar a actividade empresarial, não devendo intervir na gestão de empresas privadas, no caso em apreço, a referida interpretação do artigo 10º, n.º 5, configura uma gritante ingerência na gestão dos recursos humanos da empresa, sendo que se tal interpretação vingar pode asfixiar a actividade empresarial da Autora/Recorrente, o que contraria o disposto no artigo 86º da CRP.


21ª. Mas mesmo que se contasse o triénio como faz a douta sentença recorrida, o que não se concede, e se considerasse como critério mais favorável o critério dos 25% do quadro do pessoal da Recorrente, a verdade é que, então, o número de trabalhadores de referência para os efeitos da alínea a), do n.º 4, do artigo 10º do D. L. 220/2006, não se cifraria em 11, mas sim em 12.


22ª. De acordo com a legislação aplicável, o vencimento das prestações de desemprego não é instantâneo, nem o seu pagamento ao beneficiário é efectuado de uma só vez (v. artigo 50º e se1gs. do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3/11), pelo que, ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, tal exigência ao abrigo do artigo 63º do D. L. 220/2006, é prematura, extemporânea e excessiva, incorrendo o acto em vício de violação de lei, tendo a douta sentença recorrida violado as referidas disposições legais.


23.ª Trata-se de aferir se a responsabilidade a que se refere artigo 63º reveste carácter sancionatório ou indemnizatório, sendo a indemnização igual ao valor dispendido pela Segurança Social no pagamento de subsídios de desemprego.


24.ª Ora, o art.º 63º é o único artigo da Secção I do capítulo X do DL nº 220/2006, 3/11, Capítulo esse intitulado “ responsabilidade e regime sancionatório”, sendo que a Secção I (art.º 63º) se refere à Responsabilidade, enquanto a Secção II (“Contra ordenações”, art.º 64º a 67º) se refere ao regime sancionatório, e, se, durante muito tempo a jurisprudência oscilou e manteve uma interpretação sancionatória do art.º 63º, tal como decidiu a douta sentença recorrida, a verdade é que se mostra hoje indubitável que o reembolso à Segurança Social se reporta, apenas, aos valores que esta efetivamente desembolsou, em relação a cada trabalhador (V. Acórdão do STA de 19/06/2014, Processo nº 01308/13 e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21/04/21, proc.º n.º 108/11.7...), pelo que, ao contrário do decidido, a Segurança Social apenas pode exigir a quantia que desembolsou a título de subsídio de desemprego, pelo que se impunha a anulação dos Despachos impugnados, tendo a douta sentença recorrida violado o referido artigo 63º.


25.ª Aliás, muito recentemente esta questão foi objecto de acórdão do Pleno do STA, de 25/3/21proferido no processo nº 2550/17.0..., que uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos:


“A responsabilidade do empregador pelo pagamento das prestações de desemprego estabelecida pelo art.º 63.º, do DL n.º 220/2006, de 3/11, na redacção resultante do DL n.º 64/2012, de 15/3, abrange apenas o reembolso à Segurança Social das prestações de desemprego efectivamente pagas ao trabalhador e não daquelas que corresponderiam à totalidade do período de concessão.”.


26.ª Nesta medida, acatando o acórdão uniformizador, ao contrário do decidido, conclui-se que a responsabilidade da Autora/Recorrente pelo pagamento das prestações de desemprego estabelecida pelo art.º 63.º do DL n.º 220/2006 apenas abrange o reembolso à Segurança Social das prestações de desemprego efectivamente pagas aos trabalhadores, pelo que ao decidir em sentido contrário, a douta sentença recorrida violou o referido dispositivo legal, bem como os artigos 483º, 562 e 334º, todos do Código Civil.


27ª. As prestações de desemprego são liquidadas com o decurso do tempo e encontram-se sujeitas às situações que determinam a sua suspensão e ou cessação (cfr. Artigo 50º e segs. do D. L. 220/2006, de 3/11), e atento o disposto no artigo 7º do D. L. n.º 133/88, de 20 de Abril, a lei apenas permite que se exija a restituição e ou reposição de quantias efectivamente pagas, pelo que ao decidir em sentido contrário, a douta decisão recorrida violou os referidos normativos, pois devia ter considerado os actos administrativos em apreço eivados de vício de violação de lei, porque prematuros, extemporâneos e excessivos, já que a Segurança Social não dispunha, ainda, de todos os elementos e circunstâncias de facto em ordem à sua correcta e legal prolacção.


28ª. Assim, a douta sentença recorrida, ao considerar que a Segurança Social podia, nos termos do artigo 63º do D. L. n.º 220/2006, exigir o pagamento da totalidade do montante das prestações deferidas, como se de uma sanção/imposto se tratasse, viola os artigos 29º, 30º e 32º da Constituição da República Portuguesa, pois o legislador, ao consagrar o regime previsto no D. L. 220/2006 não dispunha de autorização legislativa da Assembleia da República para criar tal sanção/penalização.


29ª. Deste modo, os acto administrativos “sub judice” encontram-se, igualmente, feridos de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, devendo ser anulado, ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida.


30.ª. A interpretação efectuada pela douta sentença recorrida do artigo 10º, n.º s 4 e 5, do D. L. n.º 220/2006, de 3/11, relativamente à contagem do triénio, conjugadamente com o artigo 63º, do mesmo diploma legal, no sentido propugnado pela entidade recorrida, de que o não respeito dos limites de quotas naquele previstos, sem mais, isto é, o excesso formal das mesmas, conduz à obrigação do pagamento de todas as prestações de desemprego atribuídas à trabalhadora, é inconstitucional, por violação dos princípios da proporcionalidade e adequabilidade, justiça e razoabilidade e igualdade, previstos, respectivamente, nos artigos 7º, 8º e 6º, do Código de Procedimento Administrativo, e nos artigos 13º e 266º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, pois acaba por ser injusto, desproporcional, inadequado e desrazoável, tratar por forma igual situações desiguais, isto é, situações empresariais antes da pandemia e em plena pandemia.


31.ª Assim, em face do actual circunstancialismo por que passa a Recorrente, a interpretação de que o preenchimento formal das quotas determina o pagamento de todas as prestações de desemprego, como considerou a douta sentença recorrida, constitui uma enorme injustiça e falta de adequação à situação real, isto é, ao caso concreto, que não se curou de apurar.


32ª. A legislação Covid 19 não adaptou as normas constantes dos artigos 63º e 10º, n.ºs 4 e 5, do D. L. 220/2006, de 3/11, à situação emergente e provocada pela pandemia Covid 19, com reflexos muito graves nas empresas, o que acaba por determinar a aplicação de normas que foram criadas para serem aplicadas a situações de absoluta normalidade, para o que estão vocacionadas, e não para uma situação de estado de emergência, pelo que, ao não fazer uma interpretação actualista dos referidos dispositivos legais, a douta sentença recorrida violou os princípios administrativos e constitucionais referidos, bem como, a violação do princípio da boa fé previsto no artigo 10º, do CPA e consagrado no artigo 266º, n.º 2, da CRP.


33ª. A interpretação efetuada pela douta sentença recorrida, viola uma adequada leitura teleológica e o espírito das normas contidas nos artigos 10º, n.ºs 4 e 5, e 63º, do D. L. 220/2006, atendendo à evidente e notória alteração das circunstâncias em que as empresas vivem e têm que subsistir actualmente em face da pandemia Covid 19, e designadamente a Recorrente que tem como única actividade a vigilância aeroportuária.


34ª. Deste modo, a douta sentença recorrida violou os princípios da proporcionalidade e adequabilidade, justiça e razoabilidade, igualdade e boa-fé.


35ª. Conforme exsuda do artigo 34º, n.º 1, do CPTA, o valor da causa é apenas considerado indeterminável quando este respeite a bens imateriais e a normas emitidas ou omitidas no exercício da função administrativa, o que, manifestamente, não é o caso, já que o valor atribuído à presenta acção na petição inicial é, indubitavelmente, a utilidade económica imediata do pedido, devendo ser mantido, pois o douto despacho recorrido violou o artigo 306º, 1 e 2 do CPC, e os artigos 31º e 34º, do CPTA.


Nestes termos e nos melhores de direito, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser considerado totalmente procedente, e, em consequência, serem consideradas as invocadas nulidades processuais, com as legais consequências e/ou, ser a douta sentença recorrida revogada e anulado o acto em crise, atentos os vícios alegados, de que padece.”


*


Notificado o Recorrido, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 144.º do CPTA apresentou contra-alegações, formulando as Conclusões, que também se transcrevem:


“a) Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra no dia 30 de junho de 2022 a qual julgou totalmente improcedente a ação e, em consequência, absolveu o Réu dos pedidos;


b) O requerimento de recurso deve enunciar quais os vícios imputados à Sentença – nº 2 do artigo 144º do C.P.T.A.


c) Sendo que a Recorrente se limita imputar-lhe os vícios que já havia assacado ao ato administrativo impugnado, designadamente que ambos “violaram os princípios da proporcionalidade e adequabilidade, justiça e razoabilidade, igualdade e boa-fé”.


d) Diz-se na Sentença Recorrida que: “Ora, antes de mais, cumpre referir que a autora lavra em erro interpretativo quanto às normas em causa, partindo de um raciocínio errado, quanto à contagem dos triénios, porquanto, conforme se sumariou no Acórdão do TCAS, n.º51/12.0..., de 24-09-2020, “[a] aferição dos limites introduzidos no n.º 4 do art. 10.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, faz-se por referência ao triénio anterior à cessação do contrato de trabalho (do trabalhador visado) e pelo número de trabalhadores que a empresa detém no mês anterior ao início desse triénio, ou seja, no mês anterior do período retrospectivo de três anos”.


e) Dispõe o n.º 4 do art.º 10º que: “(…) são ainda consideradas as cessações do contrato de trabalho por acordo fundamentadas em motivos que permitam o recurso ao despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho, tendo em conta a dimensão da empresa e o número de trabalhadores abrangidos, nos termos seguintes:

a) Nas empresas que empreguem até 250 trabalhadores, são consideradas as cessações de contrato de trabalho até três trabalhadores inclusive ou até 25% do quadro de pessoal, em cada triénio”.

b) Nas empresas que empreguem mais de 250 trabalhadores, são consideradas as cessações de contrato de trabalho até 62 trabalhadores inclusive, ou até 20% do quadro de pessoal, com um limite máximo de 80 trabalhadores em cada triénio.

f) Mais dispondo o nº 5 do mesmo artigo que” os limites estabelecidos no número anterior são aferidos por referência aos três últimos anos, cuja contagem se inicia na data da cessação do contrato, inclusive, e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data do início do triénio, com observância do critério mais favorável.


g) Os triénios são móveis e não fixos, e a data da cessação do contrato por acordo corresponde à data fim do triénio, pelo que terá que se contar três anos para trás para conseguir identificar o mês de início do triénio e, consequentemente, o mês anterior ao do início do triénio, que é o mês relevante para aferição do número de trabalhadores para efeito das quotas.


h) Resulta da matéria de facto dada como provada que:


Com efeitos reportados a 25 de Setembro de 2020, por acordo, AA e a Autora cessaram o contrato de trabalho que entre ambas vigorava desde 12/11/2019 – cfr. fls. fls. 2 e 3 do PA;


(…)


Em Setembro de 2017, a Autora possuía 45 (quarenta e cinco) trabalhadores sob contrato - cfr. fls. 12 e 13 do processo administrativo;


No período de 25 de Setembro de 2017 a 25 de Setembro de 2020, a autora cessou o contrato a 21 trabalhadores (cfr. fls. 12 do PA);


A cessação do contrato de trabalho de AA, foi a 22.º cessação (cfr. fls. 12 do PA);


i) À data da cessação do contrato celebrado com AA, em 2020/09/25, a Recorrente já havia excedido o limite das quotas disponíveis ao abrigo da alínea a) do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 03/11.


j) A cessação do contrato de trabalho ocorreu em 2020/09/25, pelo que a data do início do triénio se verificou em 2017/09/26, sendo este o triénio considerado para apuramento do limite de cessações.


k) O mês anterior ao da data de início do triénio é agosto de 2017, no qual a Recorrente tinha 45 trabalhadores, pelo que o valor da quota disponível para cessar os contratos de trabalho por acordo, ao abrigo da legislação supra mencionada, era de 11, uma vez que nas empresas que empreguem até 250 trabalhadores, são consideradas as cessações de contrato de trabalho até três trabalhadores, inclusive, ou até 25% do quadro de pessoal, em cada triénio.


l) Não obstante a A. entender que “é absurda e injusta em face do caso concreto e das reais circunstâncias que ditaram as cessações, a interpretação efetuada pela douta decisão recorrida, de fazer retroagir o triénio, in casu, a uma data anterior”, é inquestionável que a mesma decorre da letra da Lei e não viola, de todo, o artigo 86º da CRP ou qualquer outro preceito legal.


m) Neste sentido veja-se o Acórdão do TCAS de 24-09-2020.


n) A interpretação sui generis (contagem do triénio para o futuro!) da Recorrente não tem qualquer sustentação, quer na letra, quer no espírito da Lei.


o) Por outo lado, dispõe o artigo 63º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de novembro que: “Nas situações em que a cessação do contrato de trabalho por acordo teve subjacente a convicção do trabalhador, criada pelo empregador, de que a empresa se encontra numa das situações previstas no n.º 2 do artigo 10.º ou de que se encontram preenchidas as condições previstas no n.º 4 do mesmo artigo e tal não se venha a verificar, o trabalhador mantém o direito às prestações de desemprego, ficando o empregador obrigado perante a segurança social ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.”


p) A análise cuidada do art.º 63° do Decreto-Lei n.º 220/2006, feita no estrito respeito do art.° 9.º do Código Civil, não admite outra interpretação que encontre correspondência verbal na letra do preceito que não seja a devolução de montante equivalente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.


q) A Douta Sentença recorrida fez, assim, uma correta interpretação e aplicação da Lei e não merece qualquer censura.


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Notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, emitiu Parecer concluindo:


“(…) Deste modo, e pelas razões já enunciadas, não havendo qualquer certeza quanto ao período em que a trabalhadora esteve desempregada e recebeu subsídio de desemprego da Segurança Social, não vislumbramos motivos para anular o acto impugnado e condenar a Recorrida a praticar acto que exija ao Recorrente apenas o valor das prestações que, de facto, suportou.


Termos em que, sem necessidade de outras considerações, se entende que o presente recurso não merece provimento.”


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Com dispensa de vistos, nos termos do disposto no n. º4 do artigo 657.º do CPC, após envio prévio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo à conferência para julgamento.


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II. Objeto do Recurso


Das conclusões formuladas resulta que o recurso não incide sobre a matéria de facto fixada.


A questão a decidir é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento, como invocado, em virtude de não ter decretado a anulação do ato, quando este sofre do vício de violação de lei quer por erro nos pressupostos de facto, quer por erro nos pressupostos de direito, mais se impondo verificar se a interpretação do artigo 10°, n° 5 do Decreto-Lei n.º 220/2006 não pode deixar de ter em consideração a finalidade e o espírito da lei sendo que o legislador terá querido evitar o recurso compulsivo à cessação de contratos de trabalho por acordo, mais vindo suscitado que a decisão administrativa objeto de impugnação incorreu em violação de lei, por falta de fundamento legal, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos artigos 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artigo 140º CPTA, importando verificar, designadamente, erro de interpretação e aplicação da lei.


III. Fundamentação


A. DE FACTO (probatório da sentença recorrida)


1)Com efeitos reportados a 25 de Setembro de 2020, por acordo, AA e a Autora cessaram o contrato de trabalho que entre ambas vigorava desde 12/11/2019 – cfr. fls. fls. 2 e 3 do PA;


2) No âmbito da cessação, por mútuo acordo, do contrato de trabalho a que se reporta a alínea anterior do probatório, a Autora emitiu declaração, na qual pode ler-se, entre o mais, que “ A cessação do contrato de trabalho enquadra-se na previsão do n.º4 do art.º10.º do Decreto Lei n.º220/2006 de 3 de Novembro, tendo sido o trabalhador informado de que não estão ultrapassados os limites previstos na alínea b), do mesmo artigo do citado Decreto-Lei, uma vez que a empresa tem 867 trabalhadores” (cfr. fls. 3 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);


3) A 6/08/2020, AA requereu o pagamento das prestações de desemprego no Centro de Emprego da Covilhã, o qual foi deferido por despacho de 14 de Outubro de 2020, referente a um período de 450 dias, no montante diário de €15,85 (cfr. fls. 15 e 16 do PA)


4) A 15/10/2020, através do ofício n. º..., da Direção da Unidade de Prestações e Contribuições, a autora foi notificada do projecto de decisão tendente à restituição do subsídio de desemprego atribuído a AA, no valor de 7.132,79 euros, para efeitos de audiência prévia (cfr. fs. 15 a 17 do PA);


5) A 26/10/2020, a autora pronunciou-se em sede de audiência prévia (cfr. fls. 18 e 19 do PA);


6) A 10/11/2020, por ofício n. º..., a autora foi notificada da decisão final, no sentido projectado (cfr. fls. 20 a 24 do PA).


7) A 21/04/2021, a autora interpôs recurso hierárquico, pugnando pela revogação do acto a que se reporta a alínea anterior do probatório (cfr. fls. 27 a 41);


8) Em Setembro de 2017, a Autora possuía 45 (quarenta e cinco) trabalhadores sob contrato - cfr. fls. 12 e 13 do processo administrativo;


9) No período de 25 de Setembro de 2017 a 25 de Setembro de 2020, a autora cessou o contrato a 21 trabalhadores (cfr. fls. 12 do PA);


10) A cessação do contrato de trabalho de AA, foi a 22.º cessação (cfr. fls. 12 do PA);


B. DE DIREITO


Sendo o objeto do recurso delimitado pelas respetivas alegações, importa conhecer da pretensão recursiva formulada e que se prende em saber se a decisão do Centro Distrital de Castelo Branco que decidiu, exigir ao Recorrente o pagamento de € 7.132,79 (sete mil, cento e trinta e dois euros e setenta e nove cêntimos) correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecido à beneficiária AA, devia ter sido anulada, com os fundamentos de vício de violação de lei, quer por erro nos pressupostos de facto, quer por erro nos pressupostos de direito.


Vejamos.


A Recorrente, enquanto Autora impugna o despacho de 04 de Novembro de 2020, proferido pelo Diretor Distrital de Segurança Social, do Centro Distrital de Castelo Branco que decidiu, quanto à beneficiária AA (NISS ...), exigir o pagamento de € 7.132,79 (sete mil, cento e trinta e dois euros e setenta e nove cêntimos) correspondente ao período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecido à beneficiária, tendo considerado que, no âmbito da pronúncia realizada em sede de audiência prévia dos interessados, as alegações apresentadas não foram consideradas relevantes para obstar à alteração do despacho anterior.


A Sentença recorrida veio manter o ato do Recorrido INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL que exigia da Recorrente/Autora ..., a reposição da totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego da sua ex-trabalhadora AA.


A questão a decidir tem predominantemente a ver com a interpretação do artigo 10. ° n.º 4 do DL n.º 220/2006 de 3 de novembro, quanto aos limites aí estabelecidos e do artigo 63. ° do mesmo diploma, relativamente ao dever de restituição nele mencionado, de modo que se possa concluir se a restituição a operar, deverá incidir sobre da totalidade das prestações, correspondentes a todo o período de prestação de subsídio de desemprego ou apenas face ao efetivamente pago aos trabalhadores.


Quanto à delimitação do “triénio”, há que ter em conta que o n.º 5 do artigo 10° dispõe que os limites estabelecidos no número anterior são aferidos por referência aos três últimos anos, cuja contagem se inicia na data da cessação do contrato, inclusive, e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data do início do triénio, com observância do critério mais favorável.


O Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, veio estabelecer o Regime Jurídico de Proteção Social da eventualidade de desemprego dos trabalhadores por conta de outrem, tendo revogado os Decretos-Leis nºs 119/99, de 14 de abril, e 84/2003, de 24 de abril.


O artigo 2.º do citado Diploma, no seu n.º 1, prescreve que “é considerado desemprego toda a situação decorrente da inexistência total e involuntária de emprego do beneficiário com capacidade e disponibilidade para o trabalho, inscrito para emprego no centro de emprego”, constituindo uma medida passiva a atribuição do subsídio de desemprego – vide artigo 3.º.


O artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 citado, sob a epígrafe “Cessação por acordo”, prescreve:


“1 - Consideram-se desemprego involuntário, para efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo anterior, as situações de cessação do contrato de trabalho por acordo, que se integrem num processo de redução de efetivos, quer por motivo de reestruturação, viabilização ou recuperação da empresa, quer ainda por a empresa se encontrar em situação económica difícil, independentemente da sua dimensão.


2 - Para efeitos de aplicação do número anterior considera-se:


a) Empresa em situação de recuperação ou viabilização, aquela que se encontre em processo especial de recuperação, previsto no Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e Falência, bem como no Código da Insolvência e Recuperação de Empresa, ou no procedimento extrajudicial de conciliação;


b) Empresa em situação económica difícil, aquela que assim seja declarada nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 353-H/77, de 29 de agosto;


c) Empresa em reestruturação, a pertencente a sector assim declarado por diploma próprio nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 251/86, de 25 de agosto, e no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 206/87, de 16 de maio;


d) Considera-se, ainda, empresa em reestruturação aquela que assim for declarada para os efeitos previstos no presente decreto-lei através de despacho favorável do membro do Governo responsável pela área do emprego, consultado o Ministério da Economia, após apresentação de projeto que demonstre inequivocamente que a dimensão da reestruturação da empresa, necessária à sua viabilidade económica e financeira, determina a necessidade de ultrapassar os limites quantitativos fixados no n.º 4 do presente artigo.


3 - A consulta ao Ministério da Economia prevista na alínea d) do número anterior pode ser efetuada, designadamente, através do Gabinete de Intervenção Integrada de Reestruturação Empresarial (AGIIRE), criado pelo Decreto Regulamentar n.º 5/2005, de 12 de julho, salvaguardando-se em qualquer dos casos a audição dos parceiros sociais sobre a situação económica e do emprego no sector em causa.


4 - Para além das situações previstas no n.º 2 são, ainda, consideradas as cessações do contrato de trabalho por acordo fundamentadas em motivos que permitam o recurso ao despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho, tendo em conta a dimensão da empresa e o número de trabalhadores abrangidos, nos termos seguintes:


a) Nas empresas que empreguem até 250 trabalhadores, são consideradas as cessações de contrato de trabalho até três trabalhadores inclusive ou até 25% do quadro de pessoal, em cada triénio;


b) Nas empresas que empreguem mais de 250 trabalhadores, são consideradas as cessações de contrato de trabalho até 62 trabalhadores inclusive, ou até 20% do quadro de pessoal, com um limite máximo de 80 trabalhadores em cada triénio.


5 - Os limites estabelecidos no número anterior são aferidos por referência aos três últimos anos, cuja contagem se inicia na data da cessação do contrato, inclusive, e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data do início do triénio, com observância do critério mais favorável.


6 - Para efeitos dos nºs 4 e 5 são consideradas as pessoas singulares e coletivas, independentemente da sua natureza e das finalidades que prossigam, que beneficiem da atividade profissional de terceiros prestada em regime de trabalho subordinado ou situações legalmente equiparadas para efeitos de segurança social”.


Neste normativo estão contidos os pressupostos legais para o empregador fazer cessar contratos de trabalho por mútuo acordo, garantindo a esses trabalhadores o acesso às prestações sociais por desemprego, determinando as situações e os moldes em que a cessação por acordo dos contratos de trabalho são consideradas “desemprego involuntário”, requisito para a atribuição de prestações de desemprego.


Da matéria fáctica dada como provada constata-se que em 25 de Setembro de 2020 a Recorrente /Autora cessou o contrato de trabalho que mantinha com a ex-trabalhadora


AA, desde 12 de novembro de 2019, sendo que tinha 867 trabalhadores (cfr. pontos 1 e 2 da matéria fáctica assente)


Cessação resultante de acordo entre as partes (cfr pontos 1 e 2 da matéria fáctica assente), pelo que face à alínea b) do n.º 4 do citado artigo 10.º a Recorrente /empregadora aplicou o limite máximo de 80 trabalhadores por cada triénio.


O n.º 5 do deste artigo 10.º, vem em abono, precisamente, com aquela alínea b) do n.º 4, que prescreve: ”Nas empresas que empreguem mais de 250 trabalhadores, são consideradas as cessações de contrato de trabalho até 62 trabalhadores inclusive, ou até 20% do quadro de pessoal, com um limite máximo de 80 trabalhadores em cada triénio”, estabelecer a referência aos três últimos anos, cuja contagem se inicia na data da cessação do contrato, inclusive, e pelo número de trabalhadores da empresa no mês anterior ao da data do início do triénio, com observância do critério mais favorável.


A data de início do triénio relevante corresponde à que resulta da contagem de três anos para trás da data acima referidas, correspondente à cessação, por acordo das partes, do contrato relativos à ex-trabalhadora supra identificada.


Do Sumário do Acórdão do TCA Sul, Processo nº 931/10.0..., de 17 de junho de 2021, in www.dgsi.pt, extrai-se: “2. De acordo com o disposto no artigo 88.º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de Novembro, o mesmo entrou em vigor no 1º dia do 2º mês seguinte ao da sua publicação, exceto o regime previsto na alínea d) do artigo 9.º e no artigo 10º que entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, ou seja, no dia 4.11.2006, sendo que as cessações do contrato de trabalho por acordo verificadas anteriormente à data prevista no número anterior não relevam para efeitos de preenchimento dos limites do número de trabalhadores referido no nº 4 do artigo 10º [v. os nºs 1, 2 e 3].


3. Nada constando sobre a eficácia retroativa do nº 2 deste artigo 88º, o mesmo dispõe apenas para futuro, e na fixação do sentido e alcance da lei, mormente das normas contidas nos nºs 4 e 5 do artigo 10º, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados [v. o nº 1 do artigo 12º e artigo 9º, do CC]”.


Sumariou o Acórdão do TCAN nº 00903/11.7... de 10.10.2014, que acompanhamos:


“1. Por força do que se dispõe no art.º 63.º do DL 220/2006, a entidade patronal não está obrigada a pagar à Segurança Social a totalidade das prestações devidas mesmo que – por qualquer razão – o trabalhador tenha perdido o direito à sua perceção e, por essa razão, aquele subsídio não tenha sido pago na sua totalidade.


2. Efetivamente o empregador só tem de compensar a Segurança Social pelo valor que esta efetivamente despendeu visto a responsabilidade ora em causa ser indemnizatória e não punitiva e, por essa razão, advir do prejuízo efetivamente sofrido pelo lesado e ter como medida o valor desse dano.


3. Assim, sendo ilegal ressarcir alguém de um prejuízo que ele não teve (art.º 483.º do CC), é forçoso concluir que se a Segurança Social, por qualquer razão, só pagou uma parte do subsídio de desemprego a que o trabalhador tinha direito a entidade responsável pelo ressarcimento dessa quantia só terá o dever de a compensar por esse valor visto, de outra forma, se estar a exceder o dever indemnizatório do empregador e a provocar um enriquecimento sem causa da Segurança Social.*


Entendimento este que veio a merecer a concordância do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STA n.º 02550/17.0..., de 25-03-2021, no qual se sumariou o seguinte:


“A responsabilidade do empregador pelo pagamento das prestações de desemprego estabelecida pelo art.º 63.º, do DL n.º 220/2006, de 3/11, na redação resultante do DL n.º 64/2012, de 15/3, abrange apenas o reembolso à Segurança Social das prestações de desemprego efetivamente pagas ao trabalhador e não daquelas que corresponderiam à totalidade do período de concessão.”


Na sequência o exposto entendemos existir violação ao disposto no artigo 10.º, n.º 4, alínea b), in fine, e 5.º do Decreto-Lei n.º 226/2006, de 3 de novembro, pelo que trazemos à colação o artigo 63.º do mesmo diploma, na redação resultante do DL n.º 64/2012, de 15/3, onde estabelece ser da responsabilidade do empregador o pagamento das prestações de desemprego, abrangendo apenas o reembolso à Segurança Social das prestações de desemprego efetivamente pagas ao trabalhador e não daquelas que corresponderiam à totalidade do período de concessão.


Da matéria factual apurada resulta que o Recorrido deferiu, por despacho de 14 de Outubro de 2020, o requerimento de prestações de desemprego apresentado, em 06 de agosto de 2020, pela trabalhadora em causa AA referente a um período de 450 dias, no montante diário de €15,85 (Ponto 3 da matéria fáctica assente)


No ato em crise, a Recorrida exigiu da Recorrente o pagamento do montante de 7.132,79 euros correspondente à totalidade do período de concessão da prestação de subsídio de desemprego da beneficiária AA (cfr. ponto 4, 5 e 6 da matéria fáctica assente).


Ora, o Recorrido só podia exigir da Recorrida, enquanto ex-entidade empregadora da beneficiária do subsídio de desemprego, o reembolso das prestações a que esta tiver efetivamente direito. E, da matéria fáctica assente não resultam factos que nos permitam saber que trabalhadores acordaram com a Recorrente a revogação dos seus contratos de trabalho, por extinção dos respetivos postos de trabalho e, em concreto, se a ex-trabalhadora AA manteve a situação de desemprego durante 450 dias, período em que lhe foi atribuído subsídio de desemprego pelo Recorrido, sendo que também nada foi alegado e comprovado sobre o efetivo período de tempo em que a referida ex-trabalhadora esteve efetivamente a receber subsídio de desemprego.


O Recorrido não juntou aos autos qualquer documento que evidencie qual foi o valor efetivamente pago á beneficiária em questão, a título de subsídio de desemprego.


Ora, ao contrário do decidido pelo tribunal recorrido, a Segurança Social apenas pode exigir a quantia que desembolsou a título de subsídio de desemprego, pelo que se impunha a anulação do despacho impugnado, tendo assim, a sentença a quo violado o artigo 63º do DL n.º 220/2006, de 3/11, na redação resultante do DL n.º 64/2012, de 15/3.


V. Decisão


Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam em conferência os juízes da Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao presente recurso e revogar a sentença recorrida.


Custas a suportar pela Entidade Demandada/Recorrida, em ambas as instâncias (artigo 527.º/1 e 2 do Código de Processo Civil).


Lisboa, 06 de novembro de 2025.


Maria Julieta França (relatora)


Teresa Caiado (1.ª adjunta)


Maria Helena Filipe (2.ª adjunta)