Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 268/23.4BELLE |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 10/24/2024 |
| Relator: | HÉLIA GAMEIRO SILVA |
| Descritores: | ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO PRESCRIÇÃO |
| Sumário: | i. Face á prova produzida e aos elementos trazidos aos autos pelo Reclamante, não pode este tribunal aceitar como não provada a citação pessoal nos processos enunciados, quando o próprio Reclamante, também o não faz. A citação não apenas inutiliza para a prescrição o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo, como obsta ao início da contagem do novo prazo de prescrição enquanto o processo executivo não findar, nos termos do artigo 326.º, n.º 1, e do artigo 327.º, n.º 1, ambos do Código Civil |
| Votação: | Unanimidade |
| Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contra-Ordenacionais |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul 1 – RELATÓRIO E...Silva, melhor identificado nos autos, veio deduzir a presente reclamação da decisão proferida pela Chefe do Serviço de Finanças de Albufeira, datada de 15/02/2023, de não reconhecimento (na sua totalidade) da extinção do processo de execução fiscal n.º 1007- 2012/011789489 (e apensos) por prescrição. O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé, por decisão de 23 de fevereiro de 2024, julgou a reclamação procedente e, em conformidade declarou a inutilidade superveniente da lide quanto aos processos declarados prescritos e a prescrição das dívidas quanto aos processos em cobrança, do Serviço de Finanças de Albufeira. Inconformada, a Fazenda Publica (FP), veio recorrer, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões: «a) Decidiu o Meritíssimo Juiz “a quo” pela procedência dos autos de Reclamação, por considerar não se ter provado que o Reclamante tenha sido citado para os processos de execução fiscal n.º 1007- 2012/01179489 e apensos (…) não sendo alegadas quaisquer outras causas de interrupção; b) Considerou a douta sentença recorrida que “à mingua de qualquer elemento adicional, não é possível dar como provado a citação do Reclamante, para os processos em causa nos autos, por impossibilidade de relacionamento [e até a existência, à data] entre a eventual emissão de um ofício de citação, do seu envio para o Reclamante e a colocação na dissipabilidade de conhecimento quanto ao mesmo, por este.”; c) Com o sempre devido respeito, a Fazenda Pública não pode concordar com o decidido; d) Da informação prestada nos autos pelo Serviço de Finanças de Albufeira, em 15-02-2023, consta que “a citação foi pessoal e efetuada nos termos do art.º 192º do CPPT”; d) Foram juntos aos autos avisos de receção, todos com emissão em 2014-07-14, nos quais é possível identificar o número do registo, o nome e morada do destinatário (ora Reclamante), identificação do nome e morada da entidade a devolver o aviso (qual seja o serviço de Finanças de Albufeira e respetiva morada postal), bem como no canto inferior esquerdo um quadro destinado à identificação do documento civil (bilhete de identidade ou cartão de cidadão) do destinatário, nome deste último, data e assinatura; e) Dos mesmos documentos consta a natureza da carta a que se refere o AR (Citação) bem como o n.º do PEF; f) A citação inicial nos PEF’s foi efetuada por via postal simples, forma legal que não permite a confirmação do envio e receção pelo destinatário. Porém, foi efetuada penhora de bens pelo órgão da execução, à qual se seguiu uma citação pessoal legalmente exigida ao abrigo dos artigos 191º n.º 3 alínea c) e 193º n.º 2, ambos do CPPT; g) Pelo que, ao contrário do entendimento vertido na douta sentença recorrida, fica demonstrada possibilidade de relacionamento entre a emissão de um ofício de citação, o seu envio para o Reclamante e a colocação na disponibilidade de conhecimento do mesmo; h) Aliás, na douta P.I. o reclamante reconhece a citação em 2014-07-29, a título de exemplo, no art.º 79º da douta P.I. transcrito nas alegações supra. Tão só se insurgindo contra o efeito duradouro da citação que a AT, seguindo jurisprudência dos Tribunais Superiores quanto a esta matéria, atribui para justificar a não prescrição no despacho reclamado; i) Pelo que a citação pessoal sempre seria um facto provado por acordo das partes; j) Foi ainda informado pelo competente SF que os processos estiveram suspensos nos termos do Dec-Lei n.º 10-F/2020, desde 2020-03-31 a 2020-06-30 e desde 2021-01-01 a 2021-03-31, conforme Instrução de Serviço n.º 60 295/2021 – Série I – DSGCT, por despacho conjunto de 08-01-2021 de sua Exa. o Senhor Secretário de Estado Adjunto dos Assuntos Fiscais e Senhor Secretário de Estado da Segurança Social; l) Ao contrário do entendimento do Mmº juiz a quo, sempre estas causas legais de interrupção do prazo de prescrição teriam de ser levadas em conta, independentemente da sua invocação por parte da AT; Ao decidir pela procedência do pedido, incorreu o Mmº Juiz a quo em erro de julgamento e violou a douta sentença recorrida o disposto nos artº.48º e 49º da Lei Geral Tributária bem como legislação avulsa respeitante às medidas judiciais no âmbito da pandemia de Covid; Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida como é de inteira JUSTIÇA» »« A Recorrido, E...Silva, devidamente notificada para o efeito, apresentou contra-alegações tendo formulado as seguintes conclusões: «B) O tribunal “a quo” aderiu à posição defendida pelo Recorrido, ao ter considerado que não se provou que o Reclamante tenha sido citado para os processos de execução fiscal identificados na reclamação judicial (processo n.º 10072012201179489 e apensos / outros) e que não foram alegadas quaisquer outras causas de interrupção, o que deve ser confirmado. C) Porquanto, tendo a Recorrente sido notificada para proceder à junção de cópias dos ofícios de citação e correspondentes avisos de recepção, quanto aos processos que identificou como activos nos presentes autos, tal não sucedeu, ao invés disso a Recorrente somente procedeu à junção aos autos do texto das citações postais alegadamente remetidas ao Executado com a indicação de que não conseguia fazer prova do seu envio ou recebimento pelo citado. D) Face à invocação do Recorrido perante o órgão de execução fiscal e posteriormente perante o douto tribunal “a quo” da sua falta de citação impunha-se o seu reconhecimento, visto o ónus da prova da concretização da citação recair sobre a Recorrente que, como se viu, não conseguiu fazer prova da sua concretização 25. Não tendo o Recorrido sido citado, não pode considerar-se que a citação foi concretizada e, por conseguinte, andou bem o tribunal “a quo” ao ter reconhecido a falta de citação do Executado, com as inerentes consequências nos termos melhor peticionados na reclamação judicial apresentada, entre os quais se incluiu a circunstância de não poder considerar-se que se verificou a interrupção do prazo de prescrição aplicável e o reconhecimento da prescrição da totalidade da dívida nos processos nº 10072012201179489 e apensos / outros, todos objecto da reclamação. E) Ainda que assim não fosse, como o Recorrido invocou, todas as citações alegadamente remetidas ao Executado foram citações postais, nos termos melhor identificados no texto de cada um dos docs. 1 a 10 juntos pela Recorrente aos autos no requerimento por si apresentado onde a mesma indicou que foram remetidas citações postais, o que reiterou no artigo 11 das alegações de recurso por si apresentadas. F) Ora, a citação postal a que alude o artigo 191º do CPPT não é idónea a produzir uma interrupção duradoura do prazo de prescrição em curso, uma vez que não assume as características próprias e especificas da citação a que se referem os artigos 326º e 327º, n.º 1 do Código Civil e 49º, n.º 1 da LGT, sendo que é este o entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Administrativo (2) - Neste sentido, entre outros, vide, os Acórdãos proferido nos processos n.º 0203/17 de 11/10/2017, nº 0429/12.1BEPRT de 27711/2019 e, segundo o qual a citação mediante postal simples ou postal registado, prevista no artigo 191.º do CPPT, constitui uma citação provisória, que dispensa a citação definitiva até ao momento em que seja efectuada a penhora de bens, pelo que essa citação provisória, pela falta de segurança de que se reveste, não é susceptível de abrir o prazo para a defesa do executado, designadamente o prazo de oposição à execução fiscal ou o prazo para o exercício de outros direitos que hajam de ser exercidos dentro daquele prazo, como resulta inequivocamente do disposto no artigo 203.º, n.º 1, alínea, a), do CPPT. G) Assim, ainda que as citações tivessem sido efectivamente remetidas e recepcionadas pelo Executado, o que não se verificou, tais citações jamais teriam a virtualidade de interromper o prazo de prescrição com efeito duradouro, razão pela qual sempre se imporia o reconhecimento da prescrição da dívida tributária peticionada em cada um dos processos executivos a que respeitam tais citações, como bem decidiu o tribunal “a quo”, visto que, desde a data da sua alegada realização (29/07/2014) já havia decorrido o prazo de prescrição aplicável a cada um dos tributos, nos termos melhor invocados na reclamação apresentada, correspondente a 8 anos e 5 anos em função do tributo / coima em causa. H) Ao contrário do que alega a Recorrente no artigo 15º e 16º das alegações, não é verdade que o Recorrido tenha reconhecido a sua citação; o Recorrido limitou-se a referir que foram apresentados comprovativos da citação em alguns processos que identificou (nrs. 10072012201179489, 1007201301032933, 1007201301048678, 10007201301101625, 1007201301147706, 1007201401026771 e 1007201401084976), sendo que a Recorrente identificou encontrarem-se activos contra o Recorrido 45 processos de execução fiscal – cfr. requerimento apresentado com a ref.ª 219017. I) O facto de o Recorrido constatar que foram remetidos os comprovativos do envio da citação relativamente a 7 processos de execução fiscal (entre os 45 processos que correm termos contra o Executado) não pode ter a virtualidade de considerar-se a sua realização provada por acordo. J) E mesmo que a Recorrente tivesse conseguido fazer a prova que sobre si recaia da efectiva concretização da citação, o que não se verificou, a citação não pode ter a virtualidade pretendida de fazer interromper com efeito duradouro a contagem do prazo de prescrição e, por conseguinte, tendo a mesma alegadamente ocorrido em 29/07/2014, também por esta via sempre teria de ser reconhecida a prescrição da dívida, por se verificar que desde a data da alegada concretização da citação e a data da invocação da prescrição já tinham decorrido os prazos de prescrição aplicáveis. K) Ao contrário do que a Recorrente pretende levar a crer no articulado nos pontos 8º a 17º das alegações de recurso, a invocada citação pessoal e os avisos de recepção a que a Recorrente faz referência apenas respeitam a 7 processos de execução fiscal (nrs. 10072012201179489, 1007201301032933, 1007201301048678, 10007201301101625, 1007201301147706, 1007201401026771 e 1007201401084976) – e não à totalidade dos processos de execução fiscal, num total de 45. L) Em relação aos demais processos de execução fiscal a situação é diferente: como acima se procurou demonstra, em relação a 10 processos de execução fiscal apenas foi junta cópia do texto da citação postal (provisória), sem que tenha sido apresentado qualquer comprovativo de envio e recepção das citações e em relação aos restantes 28 processos não foi junta qualquer prova do texto da citação e muito menos do seu envio/recepção pelo Executado. M) Destarte, somente em relação aos processos nrs. 10072012201179489, 1007201301032933, 1007201301048678, 10007201301101625, 1007201301147706, 1007201401026771 e 1007201401084976 poderão valer os argumentos apresentados pela Recorrente nos artigos 8º a 17º das alegações, embora tais argumentos não permitam alterar a decisão do tribunal “a quo”, atentas as demais razões de facto e de direito supra aduzidas, designadamente por não poder ser atribuído carácter duradouro com efeito interruptivo à citação. N) Quanto à alegada suspensão do prazo de prescrição suscitada pela Recorrente no artigo 18º das alegações a mesma não pode, de igual modo, proceder na medida em que a Recorrente nem sequer procurou identificar os períodos de suspensão que entende serem aplicáveis em relação a cada processo de execução fiscal, tendo, inclusive, o Recorrido em sede de reclamação judicial afastado a aplicação de tal causa suspensiva no caso, conforme resulta dos artigos 81º a 111º da reclamação judicial. O) Entre as razões invocadas pelo Recorrido, foi alegado que a suspensão se cingia aos processos e procedimentos tributários em curso – e não aos casos em que não haja processo nem procedimento tributário em curso, como é o caso dos autos, na medida em que somente foram instaurados os processos de execução fiscal sem que haja sido apresentado qualquer meio procedimento ou processual para discussão de qualquer questão de legalidade ou exigibilidade – e ainda o facto de se ter vindo a entender que o prazo de suspensão aplicável ao abrigo da legislação da Covid-19 apenas previu o alargamento do prazos de caducidade e de prescrição cujo termo ocorreu na vigência da situação excepcional, e não para todos os prazos em curso, sendo que nos processos exexcutivos em causa nenhum dos prazos de prescrição ocorreu na vigência da situação excpecional. P) De qualquer forma, certo é que, como a Recorrente reconheceu, esta não invocou a aplicação de qualquer causa suspensiva do prazo prescricional perante o tribunal “a quo”, sendo que, se a Recorrente nem sequer conseguiu provar a citação no âmbito dos processos de execução fiscal em causa não pode a mesma pretender seguir com as diligências executórias nem fazer valer quaisquer causas suspensivas do prazo de prescrição. Q) Acresce que, a Recorrente apenas procedeu à junção de cópia de citações (provisórias) relativamente aos dez processos executivos que identificou no ponto 1 do requerimento que apresentou, não tendo assim procedido à junção dos comprovativos relativamente aos demais processos que invocou encontrarem-se activos contra o Executado (num total de 45 processos), pelo que sempre se imporia o reconhecimento da falta de citação relativamente aos demais processos com a consequências acima assinaladas – sem esquecer que quanto aos 10 processos em relação aos quais juntou cópia das citações (provisórias) não juntou qualquer prova da sua efectiva realização mediante comprovativo de envio e recepção, tendo inclusive admitido não ter tais elementos na sua posse. R) Por último, sempre se dirá que em relação aos processos que foram declarados em falhas, todos eles melhor identificados nos autos, sempre se imporia o reconhecimento da prescrição dos valores em dívida, na medida em que a declaração em falhas tem como efeito a cessação do efeito duradouro da citação e desde a data da declaração em falhas (05/02/2018) já decorreram os prazos de prescrição aplicáveis. S) Importando, por fim, reiterar a posição sufragada pelo Recorrido em sede de reclamação judicial no sentido de que, independentemente da data da declaração em falhas, impunha-se a que AT tivesse determinado a declaração em falhas de todos os processos de execução fiscal imediatamente após a alegada citação, atenta a insuficiência de bens do executado desde a data da instauração de qualquer um dos processos, ao invés de ter omitido o comportamento devido ou ter reconhecido a declaração em falhas com data posterior, impondo-se pois o reconhecimento da declaração em falhas com a mesma data da instauração dos respectivos processos, o que na prática determina o reconhecimento da prescrição de todos os valores peticionados por já ter decorrido prazo superior ao prazo de prescrição aplicável, tudo nos termos melhor aduzidos em sede reclamação e demais requerimentos posteriormente apresentados, o que deverá ser devidamente apreciado e decidido pelo tribunal “a quo” em caso de procedência (parcial) do presente recurso juntamente com as demais questões suscitadas pelo Reclamante, aqui Recorrido, em sede de reclamação judicial, entre as quais figura a atribuição (ou não) de efeito interruptivo com carácter duradouro à citação. Termos em que, deverá o recurso apresentado ser julgado improcedente, mantendo-se a sentença revivenda, como é de liminar Justiça!» »« O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal, proferiu parecer acompanhando os fundamentos alicerçados na sentença recorrida e manifestou-se no sentido da improcedência do recurso. »« Com dispensa de vistos legais, atento o carácter urgente dos presentes autos, vêm os mesmos submetidos à conferência desta Subsecção para decisão. »« 2 – OBJECTO DO RECURSO Antes de mais, importa referir que, independentemente das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões do recorrente nas alegações de recurso que se determina o âmbito de intervenção do tribunal (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho). Assim e constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo. Termos em que, atento o alegado, a questão sob recurso que, em concreto, importa conhecer é a de saber se a sentença recorrida errou ao decidir que a dívida exequenda exigível nos processos ativos, se encontra prescrita. A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: B) O reclamante dirigiu à Chefe do Serviço de Finanças de Albufeira, requerimento do qual se retira o seguinte excerto:
C) Com data de 21 de Março de 2023, foi comunicado ao Reclamante, atinente ao assunto “prescrição”, despacho da Chefe do Serviço de Albufeira, do qual se extrai o seguinte excerto: “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)”
“(texto integral no original; imagem)”
D) Por ofício datado de 18 de Abril de 2023, foi comunicado à mandatária do reclamante o teor do despacho acima referido – facto que emerge de fls. 339 dos autos, numeração SITAF; E) Com data de 20 de Novembro de 2023, a Fazenda Pública comunicou aos autos o seguinte estado da tramitação processual dos processos:
F) As dívidas em cobrança coerciva reportam a factos tributários dos anos 2012 a 2015, sendo o valor total da dívida em nome do Reclamante € 8.978,89 – facto que se extrai do documento n.º 1 junto com a petição inicial.» * II- B - DOS FACTOS NÃO PROVADOS Não se provou: A) Que o Reclamante tenha sido citado para os processos de execução fiscal n.° 1007-2012/01179489 e apensos.
Compulsados os autos, analisados os articulados e atenta a prova documental constante dos mesmos, não existem quaisquer outros factos com relevância para a decisão, atento o objecto do litígio, que devam julgar-se como não provados.
II- C - FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO Os factos acima enunciados encontram-se, todos eles, comprovados pelos documentos acima discriminados, que não foram impugnados pelas partes nem há indícios que ponham em causa a sua genuinidade, e foram tidos em consideração por haverem sido articulados pelas partes ou por deles serem instrumentais [cfr. artigo 5.°, n.° 2, alínea a), do Código de Processo Civil]. O facto dado como não provado resulta da consulta e análise dos referidos processos de execução fiscal, de todos os elementos juntos aos autos, bem como da posição assumida pela Fazenda Pública, que refere não se possível a prova do envio e do recebimentos dos ofícios de citação pelo Reclamante — cfr. fls. 565 dos autos, numeração SITAF. Assim, à mingua de qualquer elemento adicional, não é possível dar como provado a citação do Reclamante, para os processos em causa nos autos, por impossibilidade de relacionamento [e até a existência, à data] entre a eventual emissão de um ofício de citação, do seu envio para o Reclamante e a colocação na dissipabilidade de conhecimento quanto ao mesmo, por este.» »« Ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 662º do CPC, por se relevarem úteis para a boa decisão da causa e, ainda porque, se encontrarem documentalmente demonstrados nos autos, julga-se provado o seguinte facto: G) Com a petição inicial, como Doc. 1, a Doc. 7 – pag. 85 e seguintes dos SITAF - foram juntos os avisos de receção de correio CTT emitidos em 2014-07-14 que a seguir se enunciam e nos quais se identifica o número do respetivo registo, o nome e morada da pessoa a que se dirigem, bem como nome, assinatura e identificação do cartão de cidadão de recetor e data da receção e bem assim a indicação de que a missiva entregue corresponde a uma citação e ainda, com a indicação da correspondência do processo a que cada um dos documentos de aviso diz respeito, são eles: 1- Processo n.º 1007201201179489 “(texto integral no original; imagem)” 2- Processo n.º 1007201301032933 “(texto integral no original; imagem)”
3- Processo n.º 1007201301048678
“(texto integral no original; imagem)”
4- Processo n.º 1007201301101625 “(texto integral no original; imagem)” 5- Processo n.º 1007201301147706 “(texto integral no original; imagem)”
6 - Processo n.º 1007201401026771 “(texto integral no original; imagem)”
7 - Processo n.º 1007201401084976 “(texto integral no original; imagem)” Factos Não Provados Por este motivo, consideramos que se mostra relevada a pertinência da alteração alvitrada pela o Recorrente (FP), face aos documentos existentes nos autos e ao facto ora aditado e, bem assim, à circunstância de os documentos terem sido juntos os autos com a petição inicial, ou seja, inequivocamente assumidos pelo Reclamante que, em sede de contra alegações apresentadas no âmbito do presente recurso, explica que na p.i. se limitou “a referir que foram apresentados comprovativos da citação em alguns processos que identificou (nrs. 10072012201179489, 1007201301032933, 1007201301048678, 10007201301101625, 1007201301147706, 1007201401026771 e 1007201401084976), sendo que a Recorrente identificou encontrarem-se activos contra o Recorrido 45 processos de execução fiscal” (1) Conclusão H), sem, contudo, em momento algum, lograr aludir que as não recebeu. Termos em que se retifica o facto dado por não provado, passando o mesmo a ter a seguinte redação: A) Dos autos não resulta provado que o Reclamante tenha sido citado para os processos de execução fiscal que contra si correm no Serviço de Finanças de Albufeira apensos ao PEF n.º 1007-2012/01179489, não enunciados no ponto G) do probatório. »« De direito Em sede de aplicação do direito, o Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé julgou a reclamação procedente e, em conformidade declarou a inutilidade superveniente da lide quanto aos processos, entretanto, declarados prescritos, pelo Serviço de Finanças de Albufeira e, conhecendo da prescrição das dívidas em cobrança no processo de execução fiscal 1007-2012/011789489 e apensos, declarou a sua verificação. Dissente do decidido quanto à prescrição, a Fazenda Pública vem recorrer por considerar que ao contrário do que entendeu o Mmo. Juiz a quo “[F] foram juntos aos autos avisos de receção, todos com emissão em 2014-07-14, nos quais é possível identificar o número do registo, o nome e morada do destinatário (ora Reclamante), identificação do nome e morada da entidade a devolver o aviso (qual seja o serviço de Finanças de Albufeira e respetiva morada postal), bem como no canto inferior esquerdo um quadro destinado à identificação do documento civil (bilhete de identidade ou cartão de cidadão) do destinatário, nome deste último, data e assinatura;” donde resulta “demonstrada possibilidade de relacionamento entre a emissão de um ofício de citação, o seu envio para o Reclamante e a colocação na disponibilidade de conhecimento do mesmo.” – concl. d) e g) Com o que, segundo entendemos, pretende invocar erro de julgamento da matéria de facto na parte em que o Mmo juiz do TAF de Loulé deu como não provado que “o Reclamante tenha sido citado para os processos de execução fiscal n.° 1007-2012/01179489 e apensos”. Como temos vindo a assumir (2) Vide, entre outros, o Acórdão deste TCAS proferido em 30/11/2023 no processo n.º 410/23.5BELLE a decisão da matéria de facto pode ser impugnada, em sede de recurso, pelo recorrente, nos casos em que os elementos fornecidos no processo conduzam a uma decisão diversa insuscetível de ser destruída por qualquer outra prova . Da leitura que fazemos do texto recorrido damos conta que para decidir como o fez o Mmo Juiz avocou a falta de prova de que o Reclamante tivesse sido citado para os processo de execução fiscal n.° 1007-2012/01179489 (facto que deu por não provado), porém, a nosso ver, mal, como transcorre da alteração à matéria de facto levada a cabo em sede próprio do presente aresto para onde remetemos. Importa ainda dizer que este tribunal não desconhece nem desvaloriza os fundamentes em que se alicerçou o tribunal a quo ao dar por não provada a citação “para os processos de execução fiscal n.° 1007-2012/01179489 e apensos” já que, como resulta da motivação de julgamento de facto, a convicção do julgador sobressaiu “da consulta e análise dos referidos processos de execução fiscal, de todos os elementos juntos aos autos, bem como da posição assumida pela Fazenda Pública, que refere não ser possível a prova do envio e do recebimento dos ofícios de citação pelo Reclamante” – o destacado é nosso Com efeito, é a AT, na pessoa da Representante da Fazenda Pública que a instâncias do Tribunal vem, em 12 de fevereiro de 2024 dizer que “a) O SF de Albufeira remeteu o texto das citações postais que se juntam como Doc. N.º 1 a 10. Não obstante não é possível, pelo tipo de citação legalmente previsto, provar o seu envio ou recebimento pelo citado. As mesmas são respeitantes aos PEF’s 1007201301032933, 1007201301048678, 1007201301101625, 1007201301147706, 1007201401026771, 1007201401084976, 1007201801165534, 1007201801207857, 1007201901138065, 1007202101037447, todos objeto da presente Oposição;” - o destacado é nosso. Contudo, face á prova produzida e aos elementos trazidos aos autos pelo Reclamante, não pode este tribunal aceitar como não provada a citação pessoal nos processos supra enunciados, quando o próprio Reclamante, como se disse, também o não faz. Com efeito, o Reclamante, quedou-se, outrossim, desde a petição inicial com a afirmação de que “apenas foram remetidos comprovativos da realização da citação no que se refere aos processos nrs. 10072012201179489, 1007201301032933, 1007201301048678, 10007201301101625, 1007201301147706, 1007201401026771 e 1007201401084976 – não tendo sido remetida qualquer prova da alegada concretização da citação nos demais processos.” (ponto 79 da p.i.) – o sublinhado e destacado são nossos. Situação que, per si, oferece força capaz de inverter a decisão recorrida relativamente aos referidos processos, vejamos agora em que medida. Da prescrição Com efeito o regime de prescrição aplicável encontra-se vertido na Lei Geral Tributária que consagra nos artigos 48.º e 49.º onde se estipula, salvaguardando o disposto em lei especial, um prazo de oito anos (8) contados, no caso do imposto sobre o valor acrescentado (IVA), que é o que aqui releva a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. Este prazo pode ser suspenso ou interrompido, verificadas que sejam as circunstâncias a que se refere o artigo 49.º do mesmo compêndio legal. Contudo, da análise que fazemos ao regime da prescrição instituído na LGT temos vindo a dar conta de que esta não responde de forma cabal à totalidade das questões que neste domínio se tem vindo a colocar em matéria da dívida tributária, nomeadamente no que toca aos efeitos da interrupção da prescrição, e bem assim no que respeita ao efeito instantâneo e/ou duradouro dos respetivos atos (situação que aqui abordamos porque suscitada pelo recorrido em contra-alegações), mas que respondemos com a regulação encontrada no Código Civil aqui aplicável por remissão, expressa, da alínea d) do artigo 2.º da própria LGT. Acolhendo por facilidade e economia o que dissemos no acórdão deste TCA Sul que relatamos em 30/11/2023 no processo n.º 410/23.5BELLE, já aqui citado, dir-se-á que a questão em apreciação tem vindo a ser analisada pelos nossos Tribunais Superiores e consta hoje de jurisprudência consolidada, assim, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil), acolhemos a argumentação jurídica aduzida no acórdão proferido pelo STA em 16/09/2020 no processo n.º 071/20.3BESNT, uma vez que não vislumbramos justificação para dela nos afastarmos. Passamos, assim, a transcrever parcialmente o teor do referido aresto, aderindo a todo o seu discurso fundamentador, com as adaptações indispensáveis à situação jurídica em análise: “(…) A LGT, enunciando os factos interruptivos da prescrição no n.º 1 do art. 49.º da LGT, não prevê directamente os efeitos da interrupção da prescrição. Como bem ficou explicado no acórdão deste Supremo Tribunal de 13 de Março de 2019, proferido no processo com o n.º 1437/18.4BELRS ( ) – também citado pela Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé na sentença recorrida –, não fixando a LGT, na sua actual redacção e desde a alteração introduzida no art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, os efeitos dos actos interruptivos da prescrição das obrigações tributárias ( ), designadamente não definindo nem esclarecendo se tais actos têm apenas efeito instantâneo ou se podem também ter efeito duradouro, essa regulamentação deve buscar-se no CC, de acordo com a regra estabelecida no art. 2.º, alínea d), da LGT, pois é naquele Código, depositário dos princípios gerais de direito e que tem um regime acabado da prescrição das obrigações, que encontramos resposta legislativa às questões que o regime da prescrição das obrigações tributárias consagrado na lei tributária não regulou directamente ( ). Como ficou dito no acórdão deste Supremo Tribunal de 27 de Janeiro de 2016 proferido no processo com o n.º 1698/15 ( ), «[i]mporta lembrar que a Lei Geral Tributária não regula o instituto da prescrição – que é um instituto comum – na sua completude, antes apenas os aspectos que, atenta a natureza tributária da dívida, merecem nomeação especial em face do direito comum, a saber, em especial, o respectivo prazo, o termo inicial da sua contagem, os factos interruptivos e suspensivos do prazo, o conhecimento oficiosa da prescrição. // Não contém a lei tributária uma definição de prescrição, como nada diz quanto aos efeitos dos factos interruptivos e suspensivos do respectivo prazo, porquanto tal matéria pressupõe a aplicação do direito comum, atenta a unidade do sistema jurídico». Note-se que não se trata de colmatar uma lacuna da legislação tributária por recurso à analogia (cfr. art. 10.º, n.º 1, do CC), mas tão-só de interpretar e aplicar a lei subsidiária, nos termos por aquela previstos (cfr. arts. 11.º, n.º 2 e 2.º da LGT, respectivamente) ( ). Assim, quanto aos efeitos da citação enquanto facto interruptivo previsto no n.º 1 do art. 49.º da LGT, por falta de regulamentação dos respectivos efeitos na LGT, há que aplicar as normas contidas no CC, designadamente o n.º 1 do art. 326.º, que estabelece que «[a] interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte», bem como o n.º 1 do art. 327.º, que dispõe: «Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo». Em conclusão: quando, como no caso sub judice, o prazo de prescrição foi interrompido pela citação, a cessação da eficácia do facto interruptivo é diferida para a data da decisão que ponha termo ao processo, sem prejuízo de dever equiparar-se a essa decisão aquela que declare a execução fiscal em falhas ( ). (…)” – fim de citação - o destacado é nosso Do que se deixa dito forçoso se torna epilogar no sentido de que o apelo, em matéria da prescrição das obrigações tributárias, ao regime consagrado no Código Civil, assenta, como dissemos, além do mais, por expressa remissão da alínea d) do artigo 2.º da LGT, e, por conseguinte, não constitui qualquer atropelo legal às leis tributárias, pelo contrário, inclui-se nelas. Regressando ao caso dos autos temos que se mostra pacífico que os processos executivos em análise respeitam ao imposto e período temporal infra indicado e foram instaurados nas seguintes datas :
Tendo em todos os processos sido realizada citação pessoal e concretizada em 29/07/2014 – pontos G) do probatório por nós aditado. Face ao disposto no n.º 1 do artigo 49.º da LGT a citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição, esta interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar, no caso, a citação. Com as referidas citações deu-se não só o efeito interruptivo da prescrição, mas também o efeito suspensivo da mesma, uma vez que acompanhando a jurisprudência citada, que como dissemos, neste campo se mostra pacificada, a citação não apenas inutiliza para a prescrição o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo, como obsta ao início da contagem do novo prazo de prescrição enquanto o processo executivo não findar, nos termos do artigo 326.º, n.º 1, e do artigo 327.º, n.º 1, ambos do Código Civil (vide, por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 01463/17, de 17-01-2018, disponível em www.dgsi.pt). Atendendo à data em que a citação ocorreu em cada um dos processos e ao período de tributação a que corresponde cada uma das dívidas, verifica-se que aquelas (citações) foram efetuadas antes de decorrido o referido prazo de prescrição de oito anos previstos no n.º 1 do artigo 48.º da LGT. Assim sendo, como vimos que é, o prazo de prescrição das dívidas em cobrança coerciva nos processos enunciados interrompeu-se e ficou suspenso, conforme o artigo 326.º, n.º 1, e o artigo 327.º, n.º 1, ambos do Código Civil, termos em que, nos mesmos não se encontram prescritos. Dito isto, resta-nos concluir que tem razão a recorrente apenas, quanto a estes processos, sendo de revogar, nesta parte a sentença recorrida, ao que se disporá na parte do dispositivo do acórdão. 4 - DECISÃO Custas na proporção de decaimento Registe e Notifique. Lisboa, 24 de outubro de 2024 Hélia Gameiro Silva – Relatora |