Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:262/14.6BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:07/11/2024
Relator:ANA CRISTINA DE CARVALHO
Descritores:IMT
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
PRAZO
OMISSÃO PARCIAL DE VALOR
Sumário:A liquidação de IMT em que foi parcialmente omitido o valor constante do balanço de prédio rústico que integrou o activo transmitido no âmbito de uma operação de concentração, mais concretamente de uma fusão por incorporação pode ser corrigida através da emissão de uma liquidação adicional desde que não tenham decorrido 8 anos contados da data da transmissão.
Votação:COM VOTO DE VENCIDO
Indicações Eventuais:Subsecção Tibutária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Subsecção Comum de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – Relatório

E…, S.A., inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada contra a liquidação adicional de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) n.º 160013022083703, no valor de € 24 807,40, veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo apresentando as suas alegações de recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«a) A sentença a quo aplicou erradamente norma jurídica por ter partido de premissa factual errada, já que considerou ter havido omissão de bens ou valores sujeitos a tributação, quando na verdade, a recorrente procedeu em conformidade com o determinado na lei, ao solicitar a liquidação de IMT através da competente declaração Modelo 1, fazendo dela constar os necessários elementos para a realizar correctamente.

b) A recorrente enquanto responsável pela iniciativa do pedido de liquidação do IMT procedeu em absoluta conformidade com o legalmente estabelecido (artigo 20º Código do IMT), identificando o imóvel, indicando o inicial valor patrimonial tributário e referindo explicitamente que se tratava de uma “fusão por incorporação” (secção II, nº 10 da declaração modelo 1 de IMT), cuja participação estava em poder daquele Serviço de Finanças desde 5.12.2008, facto dado como provado na sentença a quo.

c) De facto, estavam reunidos os elementos necessários para que o procedimento tributário, consubstanciado na liquidação de IMT, decorresse com toda a normalidade (artigo 21º CIMT).

d) Com efeito, não se compreende o inusitado comportamento do Serviço de Finanças de Loulé ao determinar incorrectamente a matéria colectável da liquidação inicial, desprezando os demais elementos que tinha na sua posse, sem diligenciar no sentido do cumprimento rigoroso do disposto na alínea g) do nº 5 do artigo 2º e na regra 13ª do nº 4 do artigo 12º, ambas as disposições do CIMT.

e) Entretanto, assinale-se que foi apurado com rigor que a liquidação impugnada reveste a natureza de liquidação adicional, tendo-se também demonstrado não ter havido qualquer omissão de bens ou valores por parte da recorrente, referindo-se ainda, ter-se precisado o conceito de erro de facto ou de direito.

f) Assim, não se tendo verificado omissão de bens ou valores, como sobejamente se demonstrou, e tendo a liquidação inicial de IMT ocorrido em 11.02.2009, a liquidação adicional em crise, teria de ser notificada ao contribuinte até ao dia 12.02.2013, ou seja, dentro do prazo de quatro (4) anos, nos termos do nº 3 do artigo 31º do CIMT.

g) A aludida liquidação adicional foi notificada à impugnante e ora recorrente, apenas em novembro de 2013, pelo que, tratando-se de um imposto de obrigação única, foi desta forma violado o prazo de caducidade do direito à liquidação de quatro (4) anos, atento o disposto no nº 4 do artigo 45º da LGT.

h) Tendo o imposto sido pago no prazo de cobrança voluntária e verificando-se que o foi indevidamente, devem ser pagos à recorrente os juros indemnizatórios legalmente previstos.

Nestes termos e nos demais de direito requer a V. Exas. que apreciem o presente recurso e lhe concedam provimento, declarando que a liquidação adicional em crise foi notificada fora de prazo, mandando, em consequência, anular a sentença do tribunal a quo por errada aplicação de lei.

Mais se requer a V. Exas. que seja a Administração Tributária condenada ao pagamento dos juros indemnizatórios, legalmente previstos.»


Notificado da admissão do recurso jurisdicional, a recorrida não usou da faculdade de contra-alegar.


O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal Central, emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa dos vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

II – Delimitação do objecto do recurso

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença recorrida efectuou errada apreciação dos factos quanto consideração de que ocorreu omissão de bens ou valores e se incorreu em erro de julgamento de direito por quanto à determinação do prazo de caducidade do direito à liquidação adicional de IMT aplicável ao caso dos autos.



*

III – FUNDAMENTAÇÃO

III. 1 – Fundamentação de facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«A) Em 11-02-2009, foi outorgada escritura de fusão, através da qual a sociedade “J…, S.A.”, foi incorporada na sociedade “E…, S.A.”, ora Impugnante, tendo sido transmitido o respectivo activo e passivo da sociedade incorporada (cfr. fls. 27 a 36 do Documento n.º 004192873 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);

B) Integrava o activo da sociedade J…, S.A., o prédio rústico denominado “S…”, situado em G…, freguesia de Almancil, Concelho de Loulé, inscrito na matriz predial rústica da mesma freguesia sob o artigo 2…, com o Valor Patrimonial Tributário (VPT) de €3.852,03 (cfr. fls. 35 a 36 e 38 do Documento n.º 004192873 tados autos, idem);

C) O prédio rústico identificado em B) supra, estava escriturado no Balanço da contabilidade da J…, S.A, pelo valor de €500.000,00 (cfr. fls. 79 do Documento n.º 004211374 e fls. 70 do Documento n.º 004211380 dos autos, ibidem);

D) Em 05-12-2008, a Impugnante apresentou no Serviço de Finanças de Loulé 1, declaração Modelo 1 de IMT, referente à fusão por incorporação do prédio identificado em B) supra, a qual tem o seguinte teor:



«Imagem em texto no original»



(cfr. fls. 100 do Documento n.º 004211380 dos autos, ibidem);

E) Com base na declaração identificada em D) supra, em 10-02-2009, foi emitida, em nome da Impugnante, a liquidação de IMT n.º 2619641, pela “Transmissão de bens Imóveis por fusão ou cisão de sociedades”, no valor de €192,60, que incidiu sobre o valor patrimonial tributário no montante de €3.852,02 (cfr. fls. 38 a 39 do Documento n.º 004192873 dos autos, ibidem);

F) Em 02-04-2013, teve início acção de inspecção externa, de âmbito geral, à ora Impugnante, relativamente ao ano de 2009, a coberto da Ordem de Serviço n.º OI201204565, de 20-09-2012, dos Serviços de Inspecção Tributária, da Direcção de Finanças de Lisboa, a qual terminou em 23-07-2013 (cfr. fls. 65 a 84 do Documento n.º 004211374 dos autos, ibidem);

G) Em 23-08-2013, foi elaborado Relatório Final de Inspecção Tributária, na acção de inspecção identificada em D) supra, do qual resulta, designadamente, o seguinte: “(…)



«Imagem em texto no original»




«Imagem em texto no original»


«Imagem em texto no original»



«Imagem em texto no original»



(…)” (cfr. fls. 65 a 84 do Documento n.º 004211374 dos autos, ibidem);

H) Em 13-11-2013, a Impugnante solicitou ao Serviço de Finanças de Loulé a emissão da liquidação adicional de IMT (cfr. admissão (artigo 6.º da PI) e fls. 24 a 25 do documento n.º 004192873 dos autos, ibidem);

I) Com base no Relatório de Inspecção Tributária identificado em G) supra, em 19-11-2013, foi emitida em nome da Impugnante, liquidação adicional de IMT, no valor de €24.807,40, a qual tem o seguinte teor: “(…)



«Imagem em texto no original»

*




(cfr. fls. 24 a 25 do documento n.º 004192873 dos autos, ibidem);

J) Em 29-11-2013, a Impugnante pagou o valor da liquidação identificada em I) supra (cfr. fls. 24 do Documento n.º 004192873 dos autos, ibidem);

K) Em 05-03-2014, a Impugnante apresentou no Serviço de Finanças de Loulé 1, Reclamação Graciosa contra a liquidação identificada em I) supra (cfr. fls. 5 a 13 e 61 do Documento n.º 004211374 dos autos, ibidem);

L) Em 21-04-2014, na Reclamação Graciosa identificada em K) supra, foi prestada informação pela Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Faro, com o seguinte teor: “(…)



«Imagem em texto no original»




«Imagem em texto no original»






(…)” (cfr. fls. 155 a 159 do Documento n.º 004211380 dos autos, ibidem);

M) Em 21-04-2014, na informação identificada em L) supra, foi aposto despacho pelo Director de Finanças de Faro (em regime de substituição), a indeferir a Reclamação Graciosa identificada em K) supra (cfr. fls. 155 do Documento n.º 004211380 dos autos, ibidem);

N) Por ofício n.º 7223, de 21-04-2014, da Divisão de Justiça Tributária, da Direcção de Finanças de Faro, foi a Impugnante notificada do indeferimento da Reclamação Graciosa, identificada em K) supra (cfr. fls. 160 a 161 do Documento n.º 004211380 dos autos, ibidem);

O) Em 30-04-2014, a Impugnante apresentou a presente Impugnação Judicial (cfr. registo aposto a fls. 3 dos autos em suporte papel, ibidem).»

Mais se fez constar na sentença recorrida o seguinte: «Factos não Provados

Inexistem outros factos, para além dos que foram dados como provados, com relevância para a decisão da causa, em face das possíveis soluções de direito.»

Quanto à motivação fez-se menção de que «A decisão da matéria de facto, dada como provada nos presentes autos, foi a considerada relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito e, assentou na prova documental junta aos autos, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»

III. 2 – Fundamentação de direito

A recorrente não se conforma com a sentença que julgou a acção improcedente por considerar que o Tribunal a quo partiu do pressuposto errado de que houve omissão de declaração de valores fazendo com que o valor da liquidação fosse inferior ao devido quando se limitou a apresentar o modelo 1 de IMT em conformidade com a lei.

Alega que indicou na aludida declaração todos os elementos essenciais para que fosse correctamente emitida a liquidação, designadamente indicou que estava em causa uma operação de fusão por incorporação, decorrendo a liquidação adicional de actuação menos diligente da AT, tanto no apuramento da matéria tributável (negligenciando o valor do imóvel no balanço), como quanto ao prazo em que procedeu à liquidação em causa, ou seja, decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação.

Que o Serviço de Finanças de Loulé determinou incorrectamente a matéria colectável da liquidação inicial, desprezando os demais elementos que tinha na sua posse, sem diligenciar no sentido do cumprimento rigoroso do disposto na alínea g) do nº 5 do artigo 2º e na regra 13ª do nº 4 do artigo 12º, ambas as disposições do CIMT.

Alega que as referidas liquidações são de qualificar como adicionais, pelo que, apenas poderiam ser emitidas até decorridos 4 anos sobre a data das liquidações que visam corrigir, conforme sucedeu no caso vertente, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento, por violação do disposto nos nºs 1 e 3, do artigo 31.º do CIMT ao assim não entender, julgando verificada a caducidade do direito à liquidação.

Não constitui facto controverso que estamos em presença de uma liquidação adicional.

O Tribunal julgou aplicável ao caso dos autos o prazo de caducidade do direito à liquidação de 8 anos, por estar em causa uma omissão na indicação do valor do acto ou contrato, tendo julgado aplicável o disposto nos artigos 31.º, n.º 3 e 35.º do CIMT.

Para assim decidir sustentou-se o Tribunal recorrido no seguinte discurso fundamentador: «(…) o facto tributário que deu origem à liquidação de IMT, foi a transmissão do terreno rústico, inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Almancil, sob o artigo 2..., para a Impugnante, através da incorporação na Impugnante da sociedade J..., S.A., através de fusão (cfr. alínea g), do n.º 5, do art.º 2.º do CIMT).

Sendo a Impugnante, de acordo com o artigo 4.º do CIMT, o sujeito passivo do imposto.

No que respeita ao valor tributável, previa a regra 13.ª, do n.º 4, do artigo 12.º do CIMT, em vigor à data dos factos, que “Na fusão ou na cisão das sociedades referidas na alínea g) do n.º 5 do artigo 2.º, o imposto incide sobre o valor patrimonial tributário de todos os imóveis das sociedades fusionadas ou cindidas que se transfiram para o activo das sociedades que resultarem da fusão ou cisão, ou sobre o valor por que esses bens entrarem para o activo das sociedades, se for superior.”.

No que se refere à iniciativa da liquidação do IMT, de acordo com o disposto no n.º 1, do artigo 19.º, do CIMT, a mesma é da iniciativa dos interessados, para cujo efeito devem apresentar, em qualquer serviço de finanças ou por meios electrónicos, uma declaração de modelo oficial devidamente preenchida.

Relativamente ao conteúdo da declaração, prevê-se nas alíneas a), b) e d), do n.º 1, do artigo 20.º do CIMT que, para efeitos de liquidação, deve o interessado fornecer a identificação dos imóveis ou a indicação de estarem omissos nas matrizes, bem como o valor constante do acto ou contrato e, os demais esclarecimentos indispensáveis à exacta liquidação do imposto.

No que respeita à competência para a liquidação, prevê-se no artigo 21.º do CIMT, que o IMT é liquidado pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base na declaração do sujeito passivo ou oficiosamente (sublinhado nosso). (…)

no preenchimento dessa declaração, deveria a Impugnante fornecer a identificação dos imóveis, bem como o valor do acto ou contrato e, os demais esclarecimentos indispensáveis à exacta liquidação do imposto, uma vez que a liquidação do IMT era efectuada pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos (actual Autoridade Tributária e Aduaneira), com base na declaração do sujeito passivo, a qual nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 75.º da Lei Geral Tributária (LGT), se presume verdadeira e de boa-fé.

Ora, consta da declaração Modelo 1 para liquidação do IMT, apresentada pela ora Impugnante, que na mesma foi identificado como facto tributário “Fusão por incorporação”, foi identificado o bem imóvel transmitido e, no que se refere ao valor global do acto ou contrato, foi indicado o valor de €652,32, valor este que não corresponde àquele por que o prédio transmitido se encontrava inscrito no Balanço da sociedade incorporada, o qual era no montante de €500.000,00 (cfr. alíneas C) e D) do probatório).

Por outro lado, analisada a referida declaração, não resulta que à mesma tenham sido anexados quaisquer documentos, ou prestados quaisquer esclarecimentos indispensáveis à exacta liquidação do imposto (cfr. alínea D) do probatório).

Deste modo, os únicos elementos que eram conhecidos pela Administração Tributária, na data da liquidação, eram o facto tributário, a identificação do bem, e o valor do acto ou contrato indicado pela Impugnante, o qual era inferior ao Valor Patrimonial Tributário do prédio transmitido, motivo pelo qual, a Administração Tributária procedeu à liquidação do IMT com base no valor do VPT (cfr. alíneas D) e E) do probatório).

Efectivamente, apenas na sequência da acção de inspecção tributária, levada a efeito à Impugnante pela DF de Lisboa, foi detectado que a Impugnante pagou IMT sobre o VPT do imóvel, quando deveria ter pago sobre o valor inscrito no Balanço da sociedade incorporada, em virtude de esse ser superior àquele (cfr. alínea G) do probatório).

Assim sendo, e ao contrário do defendido pela Impugnante, o Serviço de Finanças de Loulé 1 não praticou qualquer erro de direito ao proceder à primitiva liquidação de IMT com base no valor do VPT do imóvel, uma vez que essa liquidação foi efectuada de acordo com o disposto na regra 13.ª, do n.º 4, do artigo 12.º do CIMT, uma vez que esse valor era superior ao valor global do acto ou contrato indicado pela Impugnante. (…)

Deste modo, ao não ter indicado como valor do acto ou contrato, o valor do bem imóvel constante do Balanço, da sociedade incorporada, a Impugnante omitiu valores sujeitos a tributação (…)»

E assim é. A sentença recorrida efectuou uma correcta apreciação da factualidade subjacente aos autos, subsumindo os factos ao direito interpretando as normas aplicáveis correctamente.

Com efeito, cabendo a iniciativa do procedimento de liquidação ao contribuinte interessado, conforme resulta do n.º 1 do artigo 19.º do CIMT sobre quem incumbe a obrigação de declarar os elementos essenciais à emissão da liquidação, com a apresentação do modelo 1 cabe-lhe, também, a responsabilidade de prestar todas as informações necessárias ao indicado efeito.

Decorre com clareza do disposto no n.º 1 do artigo 20.º do mesmo código o elenco da informação que lhe incumbe prestar para a correcta determinação do valor a liquidar.

As transmissões de bens imóveis por fusão estão sujeitas a IMT nos termos do disposto na alínea g) do n.º 5 do artigo 2.º do Código do IMT (CIMT) incidindo sobre o valor patrimonial tributário (VPT) do imóvel que se transfere para o activo da sociedade incorporante ou sobre o valor contabilístico por que esses imóveis se entravam registados no activo, se for superior.

Conforme se dispõe na regra 13.ª, do n.º 4, do artigo 12.º do CIMT, em vigor à data dos factos, «[n]a fusão ou na cisão das sociedades referidas na alínea g) do n.º 5 do artigo 2.º, o imposto incide sobre o valor patrimonial tributário de todos os imóveis das sociedades fusionadas ou cindidas que se transfiram para o activo das sociedades que resultarem da fusão ou cisão, ou sobre o valor por que esses bens entrarem para o activo das sociedades, se for superior» pelo que, cabia à recorrente declarar no modelo 1 o valor do imóvel decorrente do acto ou contrato, que corresponde ao valor dos activos constantes do balanço, o que não sucedeu.

Cabia à recorrente indicar o valor do acto ou contrato, o que fez indicando o valor patrimonial tributário do imóvel. Donde não pode afirmar-se como afirma a recorrente que a AT dispunha de todos os elementos necessários à liquidação do imposto, quando omitiu o valor em causa. Não é por acaso que a declaração modelo 1 não dispõe de um campo para a identificação do valor patrimonial tributário do imóvel pois este valor é do conhecimento da AT, prevendo um campo destinado à indicação do valor do acto ou contrato.

Deste modo, não cumprindo a recorrente a obrigação declarativa que sobre si incumbia de declarar o valor e que não podia ignorar, determinou a legitimação da correcção efectuada pela AT no exercício dos seus poderes/deveres de fiscalização do cumprimento das obrigações e da situação tributárias conforme resulta do disposto no artigo 61.º da LGT, momento em que detectou a omissão.

Estando em causa um erro na declaração por omissão parcial do valor do activo o prazo aplicável para que a AT pudesse emitir a liquidação adicional é o previsto no artigo 31.º, n.º 3 do CIMT como decidiu o Tribunal recorrido.

Sobre a liquidação adicional dispõe o artigo 31.º do CMT o seguinte:

«1 - Em caso de omissão de bens ou valores sujeitos a tributação ou havendo indícios fundados de que foram praticados ou celebrados actos ou contratos com o objectivo de diminuir a dívida de imposto ou de obter outras vantagens indevidas, são aplicáveis os poderes de correcção atribuídos à administração fiscal pelo presente Código ou pelas demais leis tributárias.

2 - Quando se verificar que nas liquidações se cometeu erro de facto ou de direito, de que resultou prejuízo para o Estado, bem como nos casos em que haja lugar a avaliação, o chefe do serviço de finanças onde tenha sido efectuada a liquidação ou entregue a declaração para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 19.º, promove a competente liquidação adicional.

3 - A liquidação só pode fazer-se até decorridos quatro anos contados da liquidação a corrigir, excepto se for por omissão de bens ou valores, caso em que poderá ainda fazer-se posteriormente, ficando ressalvado, em todos os casos, o disposto no artigo 35.º(...

Vejamos os que dispõe o artigo 35.º do CIMT:

«1 - Só pode ser liquidado imposto nos oito anos seguintes à transmissão ou à data em que a isenção ficou sem efeito, sem prejuízo do disposto no número seguinte e, quanto ao restante, nos artigos 45.º e 46.º da lei geral tributária. (…)

3 - Nos actos ou contratos por documento particular autenticado, ou qualquer outro título, quando essa forma seja admitida em alternativa à escritura pública, o prazo de caducidade do imposto devido conta-se a partir da data da promoção do registo predial.»

Tendo sido cometido erro de facto ou de direito, de que resultou prejuízo para o Estado, no caso dos autos uma omissão na indicação do valor do acto ou contrato, de acordo com o estatuído no n.º 3 do artigo 31.º do CIMT à liquidação adicional de IMT é aplicável o regime previsto no artigo 35.º sobre a caducidade do direito à liquidação.

Assim sendo, no caso dos autos, a liquidação inicial podia ser corrigida através da emissão de uma liquidação adicional, desde que não tivessem decorrido oito anos desde a data da transmissão.

Recorde-se que a fusão que deu origem à liquidação impugnada foi outorgada por escritura pública em 11/02/2009 e a liquidação adicional impugnada foi emitida em 19/11/2013, antes de decorridos 8 anos sobre a data da transmissão, neste caso da fusão por incorporação, pelo que não ocorreu a caducidade do direito à liquidação, tal como decidiu o Tribunal recorrido.

A sentença que assim decidiu não incorreu em erro de julgamento de facto nem de direito, pelo que se impõe julgar o recurso improcedente e confirmar a sentença.

IV – CONCLUSÕES

A liquidação de IMT em que foi parcialmente omitido o valor constante do balanço de prédio rústico que integrou o activo transmitido no âmbito de uma operação de concentração, mais concretamente de uma fusão por incorporação pode ser corrigida através da emissão de uma liquidação adicional desde que não tenham decorrido 8 anos contados da data da transmissão.

V – DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes que integram a Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 11 de Julho de 2024.


Ana Cristina Carvalho - Relatora

Teresa Costa Alemão – 1ª Adjunta com voto de vencida

Isabel Silva – 2ª Adjunta

Voto de vencida



Não acompanho a decisão e, como tal, contrariamente ao sufragado no presente acórdão, teria concedido provimento ao recurso jurisdicional, revogado a decisão recorrida e julgado procedente a impugnação.

Em síntese, considero que, na verdade, a situação do processo não difere de nenhuma das outras, perfeitamente comuns, em que a AT faz uma inspecção ao sujeito passivo e verifica que os valores declarados estão errados e faz a devida liquidação adicional.

A situação da norma do art. 31.º n.º 3 do CIMT, que se refere a "omissão de bens ou valores" tem origem numa adaptação do disposto no paragrafo 3º do artigo 111º do CIMSISD, que se referia às omissões à relação de bens, e que não levou em conta a separação das legislações aplicáveis aos casos de transmissão onerosa de imóveis, sujeita a IMT, dos casos de transmissões gratuitas de bens, sujeitas a imposto de selo e tem que ver com a omissão de factos tributários e não com a errada indicação da matéria tributável, a qual, de resto, é perfeitamente cognoscível pela AT, como no caso concreto, através de uma inspecção.

De notar que, como resulta do probatório, foi declarada a fusão por incorporação, sendo a sociedade proprietária de imóveis, ou seja, foi correctamente declarado o facto tributário, tendo havido uma declaração errada do valor patrimonial - intencional ou não - a qual foi corrigida pela AT através de liquidação adicional.

Ou seja, o caso concreto é um caso típico de liquidação correctiva aos valores declarados, errados (e não omitidos), a que se aplica o prazo de caducidade de 4 anos.

Lisboa, 11-07-2024



Teresa Costa Alemão