Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 984/08.0BELRA-A |
![]() | ![]() |
Secção: | CA |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 01/21/2021 |
![]() | ![]() |
Relator: | DORA LUCAS NETO |
![]() | ![]() |
Descritores: | DECRETO-LEI N.º 118/79, DE 04.05 - CRIA O PARQUE NATURAL DAS SERRAS DE AIRE E CANDEEIROS; ART. 5.º DO DECRETO-LEI N.º 340/2007, DE 12.10; PEDREIRA. |
![]() | ![]() |
Sumário: | A decisão a tomar quanto à sustentabilidade da atividade de extração de inertes ornamentais no Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros, terá de ter em conta, antes de mais, a localização e a extensão da exploração em apreço e será sempre prévia a qualquer licenciamento, que exigirá, por sua vez, o respeito de outra ordem de normas, designadamente, técnicas. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Votação: | UNANIMIDADE |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I. Relatório S... – E..., Lda, intentou uma ação administrativa especial, contra o ICNB, IP-Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade, IP. Após sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 29.09.2014, que julgou procedente a ação, veio o INSTITUTO DA CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E DAS FLORESTAS, I.P. apresentar reclamação para a conferência, a qual foi jugada improcedente pelo coletivo. Assim, veio o INSTITUTO DA CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E DAS FLORESTAS, I.P., ora RECORRENTE, interpor recurso jurisdicional do acórdão final, de 15.07.2015, tendo, nas alegações de recurso que apresentou, culminado com as seguintes conclusões - cfr. fls. 253 e ss., ref. SITAF: «(…) 1 º Deveriam ter sido considerados provados os seguintes Factos: a) Em 26 de Outubro de 1999, a S..., E..., Lda. solicitou um parecer de localização ao PNSAC, para a instalação de uma exploração de massas minerais para uma área de 40.000 m2. b) Em 14 de Fevereiro de 2000, através do Oficio n.º 229, o PNSAC emite parecer desfavorável, em virtude de a área se situar em zona de "Agricultura", a qual de acordo com o Plano de Ordenamento do PNSAC em vigor "são proibidas todas as ações que possam reduzir ou prejudicar direta ou indiretamente o aproveitamento da capacidade produtiva do solo, nomeadamente (…) extração de inertes" (n.º 2 do artigo 4° da Portaria n.º 21/88, de 12 de Janeiro). c) Em 8 de Fevereiro de 2000, é apresentado um novo pedido de parecer ao PNSAC, agora para uma área de 20.000 m2, mas feita em nome de L.... d) Em 13 de Março de 2000, através do Oficio n.º 425 (em anexo), o PNSAC emite novo parecer desfavorável, com os mesmos fundamentos do parecer anterior, uma vez que a "área agora em análise refere-se à mesma localização, propondo no entanto uma redução da área de pedreira ". e) A área localiza-se no Sítio de Interesse Comunitário (SIC) "Serras de Aire e Candeeiros", aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros n.0 76/2000, de 5 de Julho e reconhecido como SIC, pela Portaria n.º 829/2007, de 1 de Agosto, na qual estão identificados os tipos de habitats naturais e das espécies de fauna e de flora que ai ocorrem, previstos no Decreto-Lei n.0 140/99, de 24 de Abril, entretanto alterado pelo Decreto-Lei n.º 4912005, de 24 de Fevereiro. f) Parte da pedreira insere-se numa zona onde está identificado a presença do habitat natural de interesse comunitário 5330. g) O pedido de adaptação ao artigo 5°, é feito para uma área muito superior, quer à que se encontrava intervencionada à data (verificando-se a existência de zonas ainda não intervencionadas pela exploração), bem como superior aos pedidos de parecer efetuados ao PNSAC em 2000. h) Esta mesma situação é verificada na primeira reunião do Grupo de Trabalho, que se realizou no dia 30 de Setembro de 2008, e sobre a qual se lavrou a respetiva acta onde é mencionado que " a área requerida se encontra parcialmente intervencionada, existindo 3 núcleos de exploração e uma área de escombreira, não tendo sido salvaguardada a zona de defesa a Sul" (cfr. processo instrutor e que deveria ter sido dado como provado). 2º O Decreto-Lei n.º 270/2001, de 06 de Outubro tem como âmbito de aplicação a revelação e aproveitamento das "pedreiras" e não a sua localização (ou seja, o local/zona onde poder ser feita a exploração). 3º A legislação a aplicar dentro das áreas protegidas, e "in casu" dentro do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, era, na altura, precisamente o Decreto-Lei nº 118/79, de 04 de Maio e a Portaria nº 21/88, de 12 de Janeiro. 4º Legislação essa que estipula as regras sobre a localização das pedreiras dentro daquela área protegida. 5º O Decreto-Lei nº 118/79, de 04 de Maio e a Portaria nº 21/88, de 12 de Janeiro, respectivamente, que aprovam a criação do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros e o seu regulamento, são, face ao Decreto-Lei nº 270/2001, de 06 de Outubro - denominada a "lei das pedreiras ", de carácter especial, sendo este último (" lei das pedreiras ") lei geral. 6º Sendo a sua violação, contrariamente ao que acontece com uma eventual violação da "lei das pedreiras " cominada com a nulidade, desvaler mais gravoso a nível do ordenamento jurídico - cfr. artigos 102° e 103° do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro, para além de consubstanciar uma contra-ordenação - artigo 104º do Decreto-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro. 7º A qual prevalece sempre sobre a aplicação deste último. 8º Pois que, caso não seja possível localizar determinada pedreira em determinada zona dentro da área protegida Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, nem valerá a pena à entidade exploradora recorrer às medidas de adequação à lei promovidas pelo Decreto-Lei nº 270/2001. 9º Que é o caso. 10º Aliás, como se refere na sentença dos autos de processo cautelar que correram termos nesse tribunal sob o nº 983/08.2BELRA: " .... a norma que regulamenta a exploração de pedreiras não encerra a potencialidade de revogação das normas do Dec.-Lei n.º 118/79, de 4 de Maio, que aprova a criação do Parque Natural das Serras de Aires e Candeeiros ......" . 11º Aplicando-se aqui o princípio de que a lei geral não revoga a lei especial (Cfr. artigo 7° nº 3 do Código Civil), prevalecendo esta última, naturalmente, sobre a primeira. 12º Contrariamente ao referido na Sentença reclamada e mantido pelo Acórdão recorrido, o recorrente não ignorou o pedido de adaptação apresentado pela empresa, o que se pretendeu foi que os trabalhos da pedreira cessassem de imediato, devido à ação continuada da empresa de infrações sistemáticas ao longo dos anos, e como forma de acautelar a salvaguarda dos valores naturais existentes no local e que ainda não tinham sido destruídos pela actividade da pedreira. 13º Ora, posto isto, sucede que, nos termos do artigo 6° do Decreto-Lei nº 118/79,de 04 de Maio e do artigo 11º nº 1 da Portaria nº 21/88, de 12 de Janeiro, as autorizações e pareceres emitidos pelo Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros são sempre vinculativos, sendo que, a exploração das "pedreiras" depende sempre de autorização prévia do Parque Natural. 14° Independentemente de a exploração em causa poder recorrer ou não ao regime de adequação à lei promovido pelo Decreto-Lei nº 270/2001, de 06 de Outubro quanto ao licenciamento, naturalmente. 15º Na douta Sentença reclamada e mantido pelo Acórdão recorrido, considera se ser de aplicar à recorrida o disposto no artigo 5° do Decreto-Lei nº 340/2007, de 12 de Outubro, mas sem razão, com o devido respeito. 16° Com efeito, sob a epígrafe "Explorações não tituladas por licença" aquele artigo 5° permite a adaptação das referidas explorações às exigências do Decreto-Lei nº 340/2007, de 12 de Outubro, sendo que tal adaptação já prevê, naturalmente, (e outra coisa não poderia ser) que a "pedreira" em causa não esteja a funcionar com violação do Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros. 17° E, neste caso, não é possível a legalização, pelo simples facto de a pedreira em causa violar o Decreto-Lei nº 1 18/79, de 04 de Maio e a Portaria nº 21/88, de 12 de Janeiro. 18º Condição prévia à ao pedido de licença, nos termos dos artigos 9º e 20° do Decreto-Lei nº 270/2001, de 06 de Outubro. 19° Pelo que, a adaptação das explorações sem licença ao disposto no Decreto Lei nº 340/2007 nada tem a ver com a localização das mesmas em violação da legislação do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros. 20° Até porque tal nem faria qualquer sentido. 21° Pois que, a extracção de inertes é uma actividade com características de irreversibilidade para o ambiente e para a conservação da natureza, valores esses que se protegem com a legislação especial aplicável ao Parque Natural, até porque tal actividade implica, naturalmente, a alteração à configuração do relevo natural e à morfologia do solo. 22º O que nada tem a ver com as novas regras de licenciamento instituídas pelo Decreto-Lei n" 340/2007, de 12 de Outubro. 23º A isto acresce, e de maior importância, que o auto de embargo não se fundamenta na falta de licença da "pedreira" em causa nestes autos, mas sim, na violação pela mesma dos diversos diplomas aplicáveis ao Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros. 24º Mais acresce repisar que a violação perpetrada pela A. dos diplomas especiais aplicáveis ao Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros jamais poderá ser sanada pelo processo de legalização que a mesma requereu com base no disposto no artigo 5º do Decreto-Lei nº 340/2007, de 12 de Outubro. 25º Porque, mais uma vez se diz, que são situações distintas, sendo que a adequação da "pedreira" em causa aos diplomas do Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros será sempre prévia a qualquer licenciamento. 26º Face ao exposto, o Auto de Embargo levantado à empresa S..., E..., Lda., é válido. 27º Destarte, tendo em conta tudo o supra exposto, se toma necessário concluir que o acto aqui em causa nos autos não é inválido, não existindo qualquer vício de violação de lei, bem pelo contrário, sendo evidente a improcedência da pretensão formulada pela recorrida. Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provada e, em consequência, ser o Acórdão recorrido substituído por outra, que decida pela improcedência da acção e pela manutenção do acto de embargo.(…).»
I. 1. Questões a apreciar e decidir As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respetivas conclusões, traduzem-se em apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito, ao ter considerado que o ato impugnado padecia de vício de violação de lei, por alegadamente ter desconsiderado disposto no art. 5° do Decreto-Lei nº 340/2007, de 12.10.
II. Fundamentação II.1. De facto A matéria de facto constante da sentença recorrida é aqui transcrita ipsis verbis: «Imagem no original» (Facto Provado por documento, a fls 1 e segs, constante como doc 3 à PI, dos autos – paginação electrónica) 2. Em 30 de Abril de 2008, o Presidente do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, IP subscreve o “Despacho n.º 13569/2008 de 30 de Abril”, delegando competências na vice-presidente Dr.ª A..., ali constando que “… Nos termos do n.º 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 136/2007, de 27 de Abril, conjugado com o disposto nos artigos 35.º a 40.º do Código do Procedimento Administrativo, e no artigo 9.º, n.º 2, da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, com a redacção dada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto, e no uso das minhas competências próprias, delego na vice-presidente Dra. A... as competências: 1 - Em todos os assuntos no âmbito dos Departamentos de Gestão das Áreas Classificadas do Centro e Alto Alentejo e das Zonas Húmidas, Departamento de Conservação e Gestão da Biodiversidade, todas as matérias relacionadas com o litoral e ainda todos os assuntos no âmbito das relações internacionais; 2 - As matérias referidas no n.º 1 deste despacho podem ser subdelegadas nos directores dos departamentos, devendo dar-me conhecimento prévio das subdelegações. Mais determino que a Vice-Presidente, Dra A..., me substitui nas minhas faltas e impedimentos, exercendo todas as minhas competências próprias e as que me foram delegadas em conformidade com o disposto no Código do Procedimento Administrativo. O presente despacho produz efeitos desde a data da sua assinatura pelo que se consideram ratificados todos os actos que, no âmbito dos poderes delegados, tenham sido praticados desde o dia 25 de Março de 2008, inclusive. (Facto Notório) 2. A 17 de Junho de 2008 é subscrito documento timbrado de Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, IP” subscrito pela Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas do Litoral de Lisboa e Oeste”, denominado de “Auto de Embargo”, onde consta, em especial que: «Imagem no original» (Facto Provado por documento, a fls 1 e segs, constante como doc 1 à PI, dos autos – paginação electrónica) 4. Em documento timbrado de “Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, IP” subscrito pela Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas do Litoral de Lisboa e Oeste” e dirigida a “S...-E..., Lda”, onde consta designadamente que “… Ficam notificados por este meio do Auto de Embargo dos trabalhos de alteração à configuração do relevo natural, realizados por S...-E..., Lda, no local de P.. – freguesia de São Bento, concelho de Porto de Mós, levantado a 17 de Junho de 2008, pelas 16: 20 que decorriam sem parecer prévio do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros …”; (Facto Provado por documento, a fls 1 e segs, constante como doc 1 à PI, dos autos – paginação electrónica) 5. Em 26 de Junho de 2008 é subscrito documento timbrado de “Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional”, dirigido a “S...-E..., Lda”, onde consta: «Imagem no original» (…) (Facto Provado por documento, a fls 1 e segs, constante como doc 2 à PI, dos autos – paginação electrónica) 6. Consta na cartografia do Parque Natural das Serras de Aires e Candeeiros que a pedreira da autora, S... Lda, em P…, Moleana, freguesia de S. Bento, Porto de Mós, se localiza em zona de agricultura e silvopastorícia; (Facto Provado por documento – levantamento GPS do dia 16/06/2008 – junto aos autos) 7. Em 27 de Agosto de 2008 é subscrito documento timbrado do “Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, IP”, denominada de “Proposta n.º 100/08” onde consta “… 9 – Ainda no dia 17 de Junho de 2008, simultaneamente com o Auto de Embargo, a funcionária do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, F..., no cumprimento das ordens e instruções da Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas do Litoral de Lisboa e Oeste, Eng.ª S... levantou um Auto de Notícia/Contra-Ordenação, que deu origem ao processo de contra-ordenação 05/08-MD, em que foi constituída arguida a sociedade S..., E... Lda pela prática dos factos acima referidos … (…) 10 – Sucede que por despacho n.º 13565/2008, de 15 de Maio, o Presidente do Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade, IP no uso das suas competências próprias delegou na Directora do Departamento de Gestão de Áreas classificadas – Litoral de Lisboa e Oeste, Eng.ª T…, os poderes necessários para a prática de vários actos no âmbito da gestão das áreas protegidas abrangidas pelo DGAC-Litoral de Lisboa e Oeste, aprovadas pela Portaria n.º 530/2007, de 30 de Abril, não se incluindo entre os poderes delegados a pratica de actos de embargo de trabalhos e obras de construção civil em violação de Planos de Ordenamento das respectivas áreas classificadas. 11 – Importa esclarecer que até o dia 15 de Maio de 2008 era da competência da Directora do Departamento de de Gestão de Áreas classificadas do Litotal de Lisboa e Oeste a prática de actos de embargo de trabalhos e obras de construção civil em violação de Planos de Ordenamento das respectivas áreas classificadas. 12 – (…) verificamos que o acto de embargo levantado pelos serviços do PNSAC no dia 17 de Junho de 2008, sendo ordenado pela Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas – Litoral de Lisboa e Oeste – se encontra ferido de invalidade (…)25- A ratificação é o acto administrativo pelo qual o órgão competente decide sanar um acto inválido, anteriormente praticado, suprindo a ilegalidade que o vicia. (…) 28 – com o objectivo de sanar a invalidade do acto de embargo propomos que o mesmo seja ratificado pelo Presidente do Instituto de Conservação da Natureza e Viodiversidade, IP…”; (Facto Provado por documento constante a fls 1 a 10 do PA) 8. Em 28 de Agosto de 2008 a Vice-Presidente do “Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, IP” ratifica os actos praticados pela Directora do Departamento de Gestão de Áreas Classificadas do Litoral de Lisboa e Oeste, em substituição do Presidente, “… em substituição do Presidente, nos termos do despacho n.º 13569/2008, publicado no DR n.º 94 …”; (Facto Provado por documento constante a fls 1 a 10 do PA) 9. Em 28 de Julho de 2010, o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, IP dirige a S..., E..., Lda documento onde se informa o levantamento de processo de contra-ordenação por aquele se encontrar a realizar obras e utilização do solo em violação do plano de ordenamento do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, alterando a configuração do relevo natural sem parecer prévio favorável da Direcção daquela área protegida; (Facto Provado por documento constante a fls 28 do PA) 10. A autora exerce a sua defesa no âmbito do processo de contra-ordenação referido no facto 9., explicitando ter requerida a legalização da exploração da pedreira no âmbito do artigo 5.º do diploma que aprova o Regime Jurídico de Pesquisa e Exploração de Massas Minerais (Pedreiras). (Facto Provado por documento constante a fls 19 a 27 do PA) 2.2. MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA Não existem factos relevantes para a boa decisão da causa de que devam ser dados como não provados. MOTIVAÇÃO A convicção do tribunal baseou-se na análise dos documentos constantes do processo administrativo apenso, bem como dos documentos juntos pelas partes, cuja força probatória é de apreciação livre pelo Tribunal.» Notificadas ambas as partes para virem aos autos informar se, dado o tempo entretanto decorrido, se tinham verificado quaisquer alterações, de facto ou e direito, na situação em apreço, nada foi trazido aos autos – cfr. fls. 341 e ss. e 345 e ss., ref. SITAF. II.2. De direito As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respetivas conclusões, traduzem-se em apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito, ao ter considerado que o ato impugnado padecia de vício de violação de lei em virtude de ter, alegadamente, desconsiderado disposto no art. 5° do Decreto-Lei nº 340/2007, de 12.10. Vejamos. i) Do erro de julgamento da matéria de facto/impugnação da matéria de facto O Recorrente ICNB,IP limita-se a enunciar que «1 º Deveriam ter sido considerados provados os seguintes Factos: a) Em 26 de Outubro de 1999, a S..., E..., Lda. solicitou um parecer de localização ao PNSAC, para a instalação de uma exploração de massas minerais para uma área de 40.000 m2. b) Em 14 de Fevereiro de 2000, através do Oficio n.º 229, o PNSAC emite parecer desfavorável, em virtude de a área se situar em zona de "Agricultura", a qual de acordo com o Plano de Ordenamento do PNSAC em vigor "são proibidas todas as ações que possam reduzir ou prejudicar direta ou indiretamente o aproveitamento da capacidade produtiva do solo, nomeadamente (…) extração de inertes" (n.º 2 do artigo 4° da Portaria n.º 21/88, de 12 de Janeiro). c) Em 8 de Fevereiro de 2000, é apresentado um novo pedido de parecer ao PNSAC, agora para uma área de 20.000 m2, mas feita em nome de L.... d) Em 13 de Março de 2000, através do Oficio n.º 425 (em anexo), o PNSAC emite novo parecer desfavorável, com os mesmos fundamentos do parecer anterior, uma vez que a "área agora em análise refere-se à mesma localização, propondo no entanto uma redução da área de pedreira ". e) A área localiza-se no Sítio de Interesse Comunitário (SIC) "Serras de Aire e Candeeiros", aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros n.0 76/2000, de 5 de Julho e reconhecido como SIC, pela Portaria n.º 829/2007, de 1 de Agosto, na qual estão identificados os tipos de habitats naturais e das espécies de fauna e de flora que ai ocorrem, previstos no Decreto-Lei n.0 140/99, de 24 de Abril, entretanto alterado pelo Decreto-Lei n.º 4912005, de 24 de Fevereiro. f) Parte da pedreira insere-se numa zona onde está identificado a presença do habitat natural de interesse comunitário 5330. g) O pedido de adaptação ao artigo 5°, é feito para uma área muito superior, quer à que se encontrava intervencionada à data (verificando-se a existência de zonas ainda não intervencionadas pela exploração), bem como superior aos pedidos de parecer efetuados ao PNSAC em 2000. h) Esta mesma situação é verificada na primeira reunião do Grupo de Trabalho, que se realizou no dia 30 de Setembro de 2008, e sobre a qual se lavrou a respetiva acta onde é mencionado que " a área requerida se encontra parcialmente intervencionada, existindo 3 núcleos de exploração e uma área de escombreira, não tendo sido salvaguardada a zona de defesa a Sul" (cfr. processo instrutor e que deveria ter sido dado como provado).» Não identificando quais as folhas do processo administrativo instrutor onde estão tais documentos ou sequer tendo juntado cópia dos mesmos, por referência ao mesmo processo administrativo instrutor. Ora, decorre do disposto no art. 640.º do CPC (art.º 685.º-B CPC 1961), sob a epígrafe «Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto», que «1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Não tendo o Recorrente cumprido o ónus que sobre si impendia, não indicando os concretos meios probatórios constantes do processo administrativo instrutor que pudessem habilitar este tribunal de recurso a aditar os suscitados factos à matéria de facto decidida pelo tribunal a quo, não pode conhecer-se do erro de julgamento/impugnação da matéria de facto em que poderá ter incorrido a decisão recorrida.
ii) Do erro de direito imputado à decisão recorrida, por ter considerado que o ato impugnado padecia de vício de violação de lei ao não ter tido em conta o disposto no art. 5° do Decreto-Lei nº 340/2007, de 12.10.
No caso dos autos está provado que a 17.06.2008 foi levantado um auto de embargo de obra por alteração da configuração do relevo natural, mediante a extração de pedras ornamentais no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros (PNSAC), no local de P… - Moleana – cfr. factos n.º 3 e 4 da matéria de facto supra. Assim como resultou provado que a A. ora Recorrida, havia requerido a legalização da exploração da pedreira no âmbito do art. 5.º do diploma que aprova o Regime Jurídico de Pesquisa e Exploração de Massas Minerais, Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12.10. – cfr. facto n.º 10 da matéria de facto supra. Insurge-se o Recorrente ICNB,IP, contra a decisão recorrida que, em suma, que «no âmbito do regime especial e transitório de regularização da pedreira as regras especiais de proteção de áreas classificadas são sempre tidas em conta, sendo obrigatório integrar no grupo de trabalho que apreciará o licenciamento requerido um elemento do réu, ICNB, IP, por um lado, e, por outro, se houver necessidade de compatibilização da exploração com os planos de ordenamento do território vigentes, a decisão do grupo de trabalho impõe os votos favoráveis dos representantes das câmaras municipais, das CCDR´s ou do ICNB, IP, só podendo a licença de exploração ser emitida após a referida compatibilização ter lugar, se for possível. Ora, o vício de violação de lei procedeu porque nenhuma destas regras foi respeitada pelo réu, o que não significa que depois de as respeitar o resultado não venha a ser aquele a que o réu chegou e que foi impugnado pelo autor, mas isso é questão diferente.», alegando, por sua vez, que o auto de embargo levantado no dia 17.06.2008, pelo o vigilante da natureza, a prestar serviço no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, no local da P…, em S. Bento, Porto de Mós, se deveu a ter constatado a realização de trabalhos de extração de pedra ornamental sem qualquer parecer prévio do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, em violação da alínea c) do n.° 1 do art. 6.° do Decreto-Lei n.° 118/79, de 04.05, em desrespeito pelas regras do plano de ordenamento do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros. Mais defendeu que a propriedade em causa se situa nos limites do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, abrangendo uma zona de agricultura e uma zona de silvo- pastorícia, sendo proibidas, por esse motivo também, todas as ações que reduzam ou prejudiquem a capacidade produtiva do solo, por força do n.° 1 do art. 11.° da Portaria n.° 21/ 88, de 12.01., mais se exigindo parecer prévio vinculativo do PNSAC, por força da já citada alínea c) do n.° 1 do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 118/79, de 04.05., não sendo aplicável ao caso dos autos o Decreto-Lei 340/2007, de 12.10, na medida em que este diploma trata do licenciamento do aproveitamento de pedreiras e que, ao invés, os diplomas legais acima citados visam regular a localização possível de pedreiras de modo a não serem postas em causa as espécies naturais existentes e o aproveitamento agrícola e de silvo-pastorícia nas Serras de Aire e dos Candeeiros. Desde já se adianta que o Recorrente tem razão. Vejamos porquê. A pedreira em causa situa-se, em grande parte, em área de agricultura e silvo-pastoril do Parque Nacional da Serra de Aire e Candeeiros, conforme cartografia aos autos e facto n.º 6 da matéria de facto supra. Quer a decisão recorrida, quer a Recorrida, invocam a “desconsideração” ou “não acatamento” por parte do Recorrente, do regime de regularização previsto no art. 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12.10., invocado pela Recorrida no procedimento – cfr. facto m.º 10 da matéria de facto supra – ali se prevendo a constituição de uma comissão que deverá integrar um representante do INCB, I.P., se a exploração se situar em áreas classificadas e que deverá emitir uma decisão sobre o pedido de regularização da exploração, a qual deve ser adotada por maioria podendo assumir uma das seguintes formas: i) Decisão favorável; ii) Decisão favorável condicionada; iii) Decisão desfavorável Mais dispondo que, quando a decisão tomada for desfavorável condicionada prevista, resultante da necessidade de compatibilização da exploração com os planos de ordenamento do território vigentes, com restrições de utilidade pública com áreas abrangidas pela Rede Natura 2000, a decisão do grupo de trabalho exige os votos favoráveis dos representantes da câmara municipal e da CCDR ou do ICNB, I.P., só podendo a licença de exploração ser emitida após a referida compatibilização do lugar em apreço. No mesmo art. 5.º. atentemos também ao disposto nos respetivos n°s 10 e 11, ao dispor que: 10. Até que seja emitida a licença prevista no n° 8, é permitida e permitida a exploração da pedreira a título provisório, pelo prazo de um ano a contar da notificação da decisão favorável condicionada, findo o qual, não se verificando a compatibilização referida no número anterior a entidade licenciadora notifica o proprietário da exploração para o encerramento do sítio nos termos dos números seguintes. 11. Se o grupo de trabalho emitir uma decisão desfavorável ao pedido de regularização da pedreira, a entidade licenciadora, mediante decisão fundamentada que atenda à dimensão da exploração e ao tipo de intervenções a efectuar para o encerramento do sítio, a fixar entre um mínimo de 6 e um máximo de 18 meses, e estabelece as condições técnicas de exploração e recuperação que o proprietário da exploração tem de cumprir até ao termo fixado, devendo nesse período sei efectuado acompanhamento que verifique o cumprimento do estabelecido. Procedimento que a decisão recorrida entendeu ter sido omitido e, por esse motivo, considerou verificar-se o invocado vício de violação de lei do ato impugnado, que anulou. Contudo, no caso em apreço, e contrariamente ao referido na decisão recorrida, o Recorrente não ignorou o pedido de adaptação apresentado pela Recorrida, ao qual foi, aliás, dado seguimento. Porém, a tal não obsta, antes exige, que os trabalhos da pedreira cessassem de imediato, devido à ação continuada da empresa, para salvaguarda dos valores naturais existentes no local e que ainda não tivessem sido destruídos pela atividade da pedreira. Na verdade, nos termos do art. 6° do Decreto-Lei nº 118/1979, de 04.05. e do art. 11.º. nº 1. da Portaria nº 21/1988, de 12.01., as autorizações e pareceres emitidos pelo Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros são sempre vinculativos, sendo que, a exploração das "pedreiras" depende sempre de autorização prévia do Parque Natural, mesmo estando pendente o pedido de adequação promovido pela Recorrida ao abrigo do citado Decreto-Lei nº 340/2007, que alterou o Decreto-Lei n.º 270/2001, de 06.10. Pedido esse que, ao invés do que resulta da decisão recorrida, tendo sido formulado ao abrigo do citado art. 5.º, que, sob a epígrafe «Explorações não tituladas por licença», estabelece um regime transitório que permite apenas a sua adaptação às exigências que este mesmo diploma introduz. Porém, uma eventual viabilidade de adaptação dependerá, naturalmente, que a pedreira em causa não esteja a funcionar em violação das regras de uso e ocupação do solo estabelecidas para o Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros, o que não sucedia no caso em apreço – cfr. os já citados Decreto-Lei nº 118/1979, de 04.05 e a Portaria nº 21/1988, de 12.01. Ora, por esse motivo, o auto de embargo não se fundamenta na falta de licença da pedreira – cujo pedido, por via do regime transitório previsto no citado Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12.10. supra transcrito, em parte, e que a decisão recorrida entende ser determinante estaria pendente – cfr. facto n.º 10 da matéria de facto e fundamentação da decisão recorrida - mas sim, na violação pela mesma dos diversos diplomas aplicáveis ao Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros. Pelo que, segundo a ordem natural destes procedimentos, primeiro teria de se averiguar em que medida a violação perpetrada pela Recorrida aos diplomas aplicáveis ao Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros poderá ser corrigida ou mitigada, fazendo parar in illo tempore a atividade lesiva – fundamento do auto de embargo e posterior decisão, sob escrutínio no caso em apreço, praticados que foram ao abrigo do art. 12.º, do Decreto-Lei n.º 794/76, 05.11 – Lei dos solos -, ex vi art. 8.º, do Decreto-Lei n.º 118/79, de 04.05 - Cria o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros -, e art. 6.º, n.º1, alínea c), deste último diploma legal – cfr. facto n.º 3 da matéria de facto supra – e só depois, se conheceria/apreciaria o pedido de adaptação da atividade levada a cabo na citada pedreira, ao abrigo do citado art. 5.º do Decreto-Lei n.º 340/2007, de 12.10. E isto porque, como se disse supra, a decisão que se tomar quanto à sustentabilidade da atividade de extração de inertes ornamentais no Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros, terá de ter em conta, antes de mais, a localização e a extensão da exploração em apreço e será sempre prévia a qualquer licenciamento, que exigirá, por sua vez, o respeito de outra ordem de normas, designadamente, técnicas. Razões pelas quais não se pode acompanhar o sentido da decisão recorrida.
III. Decisão Pelo exposto, acordam os juízes da secção do contencioso administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e, conhecendo em substituição, julgar a ação improcedente.
Custas pela Recorrida.
Lisboa, 21.01.2021. Dora Lucas Neto * A relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.°- A do Decreto-Lei n.° 10- A/2020, de 13.03., aditado pelo art. 3.° do Decreto-Lei n.° 20/2020, de 01.05., têm voto de conformidade com o presente Acórdão os senhores magistrados integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores Pedro Nuno Figueiredo e Ana Cristina Lameira. |