Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1582/15.8BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:09/30/2025
Relator:MARIA DA LUZ CARDOSO
Descritores:IVA
FATURAS FALSAS
VALORAÇÃO DA PROVA
Sumário:I - Na impugnação da decisão da matéria de facto apurada de 1ª. Instância a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, devendo, nas alegações de recurso, especificar, obrigatoriamente não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida.
II - De acordo com o artigo 607º, nº 5, do CPC, o julgador aprecia a prova de acordo com a sua livre convicção acerca de cada facto, embora esta não abranja os factos:
- para cuja prova a lei exija formalidade especial;
- que só possam ser provados por documentos;
- que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo das partes quer por confissão das partes.
III - A AT está onerada com a demonstração da factualidade que a levou a desconsiderar as faturas, em termos de abalar a presunção de veracidade das operações económicas inscritas nas faturas e registadas na contabilidade da Recorrida e nos respetivos documentos de suporte de que aquela goza em homenagem do princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito [artigo 75º da LGT].
IV - Quando estão em causa indícios de faturas falsas a AT tem o encargo de demonstrar os indícios de falsidade e que estes são consistentes, sérios e reveladores de uma séria probabilidade de que as faturas são «falsas» para cumprir o ónus da prova.
V - É preciso que a AT aporte para o relatório de inspeção factos objetivos, de sentido unívoco, que segundo as regras da experiência permitam concluir com considerável probabilidade que as operações descritas nas faturas não se realizaram.
VI - Na ausência de tal resultado a atuação da AT ao desconsiderar faturas inscritas na contabilidade do S.P. é ilegal, importando anulação das liquidações.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I – RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente), veio recorrer da sentença proferida a 28.04.2021, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, na qual se julgou procedente a impugnação judicial deduzida por F......., Lda. (doravante Recorrida), contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa que este apresentara contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e respetivos juros compensatórios, referentes aos períodos de 10/12, 11/01, 11/02, no valor global de €14.029,15.

Nas suas alegações de recurso apresentadas, formulou, a final, as seguintes conclusões:

V. - Conclusões

A. A discordância que aqui se exterioriza com o aresto recorrido funda-se pois na errada apreciação e compreensão intentada pelo Tribunal a quo quanto aos factos que reputou essenciais para a boa decisão da causa e ainda errada subsunção jurídica dos factos à aplicação de Direito.

B. Do ponto de vista da AT, foram recolhidos indícios sólidos de que as quatro faturas emitidas em nome de “V.......”, não correspondem a operações reais, não tendo sido legalmente aceite a dedução do IVA incluído em tais faturas, ao abrigo da norma legal constante do n°3 do artigo 19.° do CIVA.

C. Passando então à análise dos fundamentos invocados na sentença e que estão, no seu essencial, vertidos nas páginas 24 a 26 da sentença.

D. No último parágrafo da página 24 da douta sentença é referido que: “No que concerne ao teor do relatório de inspeção efetuado ao fornecedor, embora tenham sido recolhidos indícios da prática de operações fictícias, era necessário confrontar essas conclusões com a situação específica do destinatário das faturas, ou seja, com a Impugnante, o que não foi feito."

E. Essa conclusão vai contra os factos que foram dados como provados, mais concretamente no ponto 7., onde se transcreve o relatório de inspeção tributária e onde podemos ler, no primeiro parágrafo da página 8 da sentença:

Notificação efetuada ao Sujeito Passivo

“Notificado o sujeito passivo, através do N/ ofício n.° 6727 datado de 19-11-2013, para apresentar documentação relacionada com as operações em causa, nomeadamente, cópia de extratos de conta corrente do fornecedor, cópias de faturas, cópias de meios de pagamento e cópias de guias de transporte das mercadorias, o mesmo veio apresentar os elementos solicitados com exceção das guias de transporte. "

F. Pelo que aqui temos erro de julgamento traduzido na errada apreciação dos factos.

G. Efetivamente, os elementos juntos pela impugnante foram devidamente apreciados e confrontados e podemos ler no relatório de inspeção, que consta do ponto 7 dos factos provados, na transcrição que é feita no segundo parágrafo da página 8 da sentença: “Não obstante o sujeito passivo ter vindo apresentar cópias dos meios de pagamento (cópias de cheques, frente e verso), salienta-se que, no âmbito da ação inspetiva a V......., levada a cabo pela direção de finanças de Setúbal, se apurou que as contas bancárias movimentadas pela mesma evidenciavam a saída, no próprio dia ou nos dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais eram normalmente efetuados em numerário.”

H. Estando nós perante operações indiciariamente fictícias, bem se compreende a não junção das guias de transporte, nem de outros elementos como contratos, cartas comerciais, orçamentos ou notas de encomenda, uma vez que sendo de operador fora do circuito económico, não seria possível a sua apresentação.

I. O sujeito passivo juntou cópias dos meios de pagamento, que comprovam o circuito financeiro da mercadoria, mas não comprovam o seu circuito económico. É necessário fazer a comprovação do circuito económico dado que, nesta sede, rege o princípio da substância sobre a forma do negócio em causa.

J. E mesmo no respeitante ao circuito financeiro, é importante ter presente que o facto das contas bancárias movimentadas evidenciarem a saída, no próprio dia ou nos dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais se referem na sua quase totalidade a levantamentos em numerário, é ele próprio indiciador de operações simuladas.

K. Portanto, a AT apurou indícios internos (indícios apurados junto da impugnante que refletem a sua atuação nas operações em causa) e indícios externos (junto do emitente das faturas que refletem a atuação deste nas operações em causa).

L. Os indícios da prática de operações fictícias foram confrontados com a situação específica do destinatário das faturas.

M. As testemunhas, trabalhadoras da impugnante, apenas vieram demonstrar o circuito documental da operação (faturas, cheques, talões de pesagem, etc), sendo que esse circuito não é posto em causa pela inspeção tributária.

N. O que deveria pesar na apreciação da prova testemunhal produzida, teria de ser o facto de nenhuma das testemunhas conhecerem “V.......” e de a única diligência que efetuavam era ir ao portal das finanças (cfr. artigos 38 a 42 deste recurso).

O. Acresce que o testemunho de M......., apresentado como técnico de contas da impugnante, revelou-se extremamente parcial e opinativo com afirmações inverosímeis conforme demonstrado no presente recurso (cfr. artigos 44.° a 51.° do recurso, que contêm transcrições do testemunho), existindo erro na apreciação da prova, acentuado por se tratar de prestador de serviços, na área da contabilidade, esta testemunha tinha a obrigação acrescida de ter um comportamento isento e equidistante, conforme consta do artigo 3.°, n.° 1 alínea c) do Código Deontológico dos Contabilistas Certificados.

P. Na opinião desta testemunha, era a Autoridade que tinha de dizer à impugnante quem estava a passar faturas falsas, com quebra de sigilo fiscal, não lhe sendo exigível mais diligências.

Q. As diligências efetuadas pela impugnante não poderão cingir-se a verificações formais no site da Autoridade Tributária, sobretudo quando estão em causa valores elevados e tendo sido passadas faturas em nome desta pessoa - de nome V....... - ao longo de vários exercícios (pelo menos de 2011 a 2014, tendo em conta que o aproveitamento da prova testemunhal foi feito do Processo 77/18.2BELRA, que abrange esses exercícios).

R. In casu, não estamos perante uma situação em que a Impugnante não sabia, nem poderia saber, que as faturas não titulam operações verdadeiras por os indícios resultarem única e exclusivamente da atuação do emitente da fatura.

S. Na sentença é referido, no penúltimo parágrafo da página 25, que não basta invocar, “por exemplo, uma alegada incipiente estrutura organizacional.”

T. Mas, o que resulta do relatório de inspeção, é que foram invocados vários factos, para além da falta de estrutura organizacional (cfr. página 5 da sentença), existindo aqui novamente erro na apreciação que é feita dos factos que foram dados como provados.

U. Mais se refere na sentença, no último parágrafo da página 25: “Aliás, tendo em conta a natureza do negócio em causa, onde à semelhança de muitos outros ligados à atividade com produtos agrícolas, os respetivos produtores fornecem muitas vezes os seus produtos a intermediários, muitas das vezes, pequenos comerciantes ou negociantes, sem que estes careçam de qualquer estrutura empresarial, maquinaria, armazéns, empregados, estabelecimento ou outros e depois revendem-nas. Sendo este o caso, aliás, da fornecedora V......., dado que era intermediária de um único fornecedor."

V. Porém, esse “único fornecedor", não reúne sequer requisitos para ser considerado fornecedor de facto, dado que o que consta no relatório de inspeção tributária, citado aqui no artigo 59 do recurso, é que, esse único “fornecedor", “não apresenta na sua contabilidade quaisquer documentos de aquisição que justifiquem os montantes faturados a V........", facto que consta do facto provado 7 e que também foi ignorado pela sentença.

W. No segundo parágrafo da página 26 da sentença é referido também que a Autoridade Tributária não coloca em causa a aquisição das pinhas pela Impugnante, o que é verdade, mas isso não obsta ao facto de os serviços de inspeção terem recolhido indícios sérios, consistentes e objetivos de se estar perante faturação fictícia suscetíveis de pôr em causa a presunção legal de veracidade das declarações da impugnante e dos dados constantes da sua contabilidade.

X. Nessa sua tarefa, os serviços de inspeção tributária lançaram mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, efetivadas junto de outro contribuinte, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das faturas não têm necessariamente que advir de, nem sequer em exclusivo, de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.

Y. Cumprido este ónus probatório, recai sobre o contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a deduzir o imposto nos termos do disposto no artigo 19.°, n.° 3 do CIVA, ou seja, o ónus de demonstrar que as transações tituladas pelas faturas apresentadas são verdadeiras e reais e, por conseguinte, tem direito a proceder à dedução do respetivo imposto.

Z. Não basta, por isso, criar a dúvida sobre a sua existência, ainda que fundada, exigindo-se a prova da materialidade das transações ou da efetividade dos sujeitos que nela intervieram, ou o seu desconhecimento sem obrigação de saber, uma vez que, em caso de dúvida, esta será resolvida contra si, pois neste caso, o ónus da prova impende sobre a impugnante.

AA. A impugnante não apresentou, em sede de audiência de julgamento, testemunhos que fizessem prova de que alguém na empresa da impugnante conhecia V........

BB. Pelo que não foi feita qualquer prova, documental ou testemunhal, de que existia uma relação comercial entre os intervenientes e que estes se conheciam de facto.

CC. Ora, neste conspecto, e como vem sendo firmado na jurisprudência, não é à AT que incumbe provar a situação de fraude, esta apenas tem a obrigação de demonstrar a existências de indícios suficientemente fundados e sérios para fazer cessar a presunção de veracidade a favor do Sujeito Passivo, prevista no art. 75.° da LGT.

DD. Não sendo exibida prova demonstrativa da veracidade da titularidade das transações que constam das aludidas faturas, tem de haver-se como devidos os atos tributários reclamados.

EE. Nesta lacuna patente do iter decisório, também descortinamos ter incorrido o Tribunal a quo em erro de julgamento na interpretação e subsunção dos factos ao direito e consequente aplicação da norma.

FF. Circunstância que se reputa bastante para estribar o presente recurso e motivar junto da Instância Superior uma mais justa e congruente decisão jurisdicional.

GG. Só pode por isso concluir-se que a AT praticou legal e fundamentadamente as liquidações impugnadas.

Nestes termos e nos melhores de Direito que o insigne Coletivo entender suprir, propugna a Representação da Fazenda Pública que seja reconhecida a procedência deste recurso jurisdicional, sendo revogada a sentença do Tribunal a quo, com o que se fará a costumada e desejada Justiça!

*

A Recorrida, notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.

*

O MINISTÉRIO PÚBLICO neste Tribunal Central Administrativo Sul, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*

Colhidos os vistos legais (artigo 657º, n. º2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), cumpre apreciar e decidir.
*

Delimitação do objeto do recurso

Em ordem ao consignado no artigo 639º do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282º do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se:

- a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto decorrente do erro da apreciação da prova.

- a sentença recorrida padece do apontado erro de julgamento de direito ao ter considerado que a Administração Tributária não recolheu “indícios fundados” que legitimam a sua atuação no sentido de não aceitar a dedução do IVA, mencionado nas faturas emitidas pela fornecedora em causa nos autos, ou seja, não cumpriu com o ónus que sobre si impendia na fundamentação material das liquidações impugnadas, as quais estão, assim, inquinadas de ilegalidade.


*

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1- De facto

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

“1. A Impugnante é uma sociedade comercial por quotas, exercendo nos exercícios de 2010 e 2011 a atividade de “Descasque e transformação de frutos de casca rija comestíveis” a que corresponde o CAE 016293 - cf. Relatório de Inspeção Tributária (RIT) a fls. 28v. do processo administrativo (PA).

2. A impugnante iniciou a sua atividade em 07/01/1980, estando enquadrada, para efeitos de IVA, no regime normal de periodicidade mensal - cf. RIT a fls. 28v. do PA

3. Com datas de 22.12.2010, 28.12.2010, 17.01.2011 e 07.02.2011, em nome de “V.......”, foram emitidas à Impugnante as faturas n.°s 128, 135, 142 e 303, relativa a “pinha mansa”, nas quantidades delas constantes, nos valores de €20.076,80, €17.984,47, €11.106,90 e €20.472,12, acrescido de IVA no valor de €3.484,40, €3.121,27, €2.076,90 e €3.828,12, respetivamente, no montante global de €69.629,80, cujos pagamentos foram efetuados por cheque - cf. faturas constantes do RIT a fls. 29v. e 30 do PA.

4. Foram realizadas várias reuniões entre representantes da Impugnante com o Diretor de Finanças do Distrito de Santarém onde foi exposta a questão dos procedimentos de verificação dos fornecedores das pinhas - cf. depoimento da testemunha M........

5. A Impugnante verificava sempre no portal das finanças se os fornecedores de pinhas tinham atividade aberta e se eram sujeitos passivos de IVA - cf. depoimento da testemunha A........

6. Ao abrigo das Ordens de Serviço n.°s 01....... e 01……, os serviços de inspeção tributária, da Direção de Finanças de Santarém, realizaram uma ação inspetiva de âmbito parcial aos exercícios de 2010 (IRC e IVA) e 2011 (IVA), a qual teve “origem no facto de ter sido detetada a utilização de faturas relativamente às quais se verifica a existência de fortes indícios de que as operações por elas tituladas respeitam a negócios jurídicos simulados (também conhecida por faturação “falsa ”), isto é, não correspondem a transações reais, emitidas por V......., NIF 21.......e morada fiscal R. …….. Montijo” - cf. RIT a fls. 28v. do processo administrativo (PA)

7. Em 20.10.2014, foi elaborado “Relatório de Inspeção Tributária” no âmbito do procedimento inspetivo referido em 3., no qual pode ler-se o seguinte:

“(…)

III - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável

Na sequência da acção inspectiva levada a cabo pela Direcção de Finanças de Setúbal relativamente ao sujeito passivo V......., Nif: 21……., apurou-se que as facturas por esta emitidas no decurso da sua alegada atividade de compra e venda de cortiça, pinha e lenha, não correspondem a operações efectivamente realizadas entre a própria e os seus clientes (operações simuladas), conforme fundamentos expressos no relatório de inspecção elaborado pela Direcção de Finanças de Setúbal (012……), do qual se extraíram as conclusões que a seguir se transcrevem:

“C) Conclusões

Em face dos elementos descritos, verifica-se estarmos perante factos que comprovam que as facturas emitidas por S....... a V....... e que as respectivas facturas emitidas por esta aos seus clientes não correspondem a transacções efectivamente realizadas entre as partes. Consequentemente, também não representam encargos reais suportados pelos destinatários das mesmas, sendo de realçar os seguintes aspectos:

- O facto do sujeito passivo não evidenciar estrutura para o exercício do negócio de compra e venda de Cortiça, Pinhas e Lenha. situação corroborada pela ausência de quaisquer instalações, equipamentos ou funcionários registados na sua contabilidade nos exercícios de 2010 e 2011:

- O facto do sujeito passivo não possuir valores de compras de Cortiça e Lenha que justifiquem os montantes facturados:

- O facto de, sendo os valores de compras de Pinhas significativos, os mesmos provirem essencialmente de um único fornecedor. S……., o qual, por sua vez, não apresenta na sua contabilidade quaisquer documentos de aquisição que justifiquem os montantes facturados a V.......:

- O facto do sujeito passivo ter começado a transmitir bens mesmo antes de os ter adquirido, remontando as primeiras-transmissões a sete meses antes das respectivas aquisições:

- O facto das contas bancárias movimentadas pelo sujeito passivo evidenciarem a entrada dum valor inferior a 50% ao total dos recebimentos dos respectivos clientes:

- O facto das contas bancárias movimentadas pelo sujeito passivo evidenciarem a saída, no próprio dia ou nos dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais se referem na sua quase totalidade a levantamentos em numerário:

- O facto de se terem apurado inúmeras irregularidade ao nível da facturacão emitida, como u existência de emissão não sequencial e a desconformidade entre originais na posse de clientes e cópias na posse do suieito passivo. ”

O montante das facturas emitidas por V....... ao cliente F......., LDA, NIPC: 500 ……. (sujeito passivo), durante os exercícios de 2010 e 2011, ascendeu a um total de €69.640,29 com 1VA incluído à taxa normal de 21 % (2010) e de 23%, (2011), conforme extracto de conta de cliente e facturas. que a seguir se indicam:


“(texto integral no original; imagem)”


Notificação efetuada ao Sujeito Passivo

Notificado o sujeito passivo, através do N/ oficio n o 6727 datado de 19-11-2013, para apresentar documentação relacionada com as operações em causa, nomeadamente, cópia de extratos de conta corrente do fornecedor, cópias de faturas, cópias de meios de pagamento e cópias de guias de transporte das mercadorias, o mesmo veio apresentar os elementos solicitados com exceção das guias de transporte. Da análise da documentação apresentado confirmou-se que as faturas emitidas por V....... se encontravam refletidas na contabilidade do sujeito passivo, tendo contribuído para o apuramento dos gastos dos períodos, bem como, o IVA mencionado nas mesmas foi deduzido pelo contribuinte.

Não obstante o sujeito passivo ter vindo apresentar cópias dos meios de pagamento (cópias de cheques, frente e verso), salienta-se que, no âmbito da ação inspetiva a V......., levada a cabo pela direção de finanças de Setúbal, se apurou que as contas bancárias movimentadas pela mesma evidenciavam a saída, no próprio dia ou nos dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais eram normalmente efetuados em numerário.

Complementarmente aos fundamentos invocados transcrevemos jurisprudência:

(...).

Conclusão:

Em face do exposto concluí-se pela existência de fortes indícios, objectivos e credíveis que as vendas indicadas nas facturas emitidas por V....... não consubstanciam operações reais, o que indicia que se está na presença da designada prática de emissão /utilização de facturas "falsas"

Correcções Propostas

III.I - Em sede de IRC - Exercício de 2010

(...)

III.II. Em sede de IVA

Pelos mesmos factos, descritos, o IV4 deduzido pelo sujeito passivo constante nas faturas emitidas por V......., não é dedutível, devido ao disposto no n.° 3 do artigo 19.0 do Código do IV4 o qual refere que "Não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente. "

III.II.I- Exercício de 2010 - Operações Simuladas

O montante de IVA indevidamente deduzido ascende a:


“(texto integral no original; imagem)”


III.II.II - Exercício de 2011 - Operações simuladas

De igual modo, o IVA deduzido nas faturas emitidas por V....... nos períodos de 2011/01 e 2011/02 não é dedutível, devido ao disposto no n. o 3 do artigo 19. o do Código do IVA.


“(texto integral no original; imagem)”


O sujeito passivo praticou infracções ao disposto no n.0 3 do artigo 19.0 do Código do 11 A, pela dedução indevida de imposto consubstanciada em faturas relativamente às quais se verificam fortes indí9ios de as operações por ela~ tituladas respeitarem a operações simuladas, punida pelo n.° 1 do art.° 118.° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT).

(...)

IX - Direito de audição - fundamentação

O sujeito passivo foi notificado para exercer o direito de audição nos termos do art. °60.0 da LGT e art.0 60.° do RCPIT, através do Oficio n.° 5849 de 29/09/2014 (objecto n.° RF012811139PT), endereçado para a sede da sociedade constante do sistema informático da AT, tendo sido entregue em 2014-10-01 (conforme consta do portal dos CTT - entrega conseguida às 10:30 horas).

Em 15.10.2014 deu entrada nestes Serviços, o documento que consubstancia o exercício do direito de audição.

No documento apresentado são identificados, o Sujeito Passivo “F......., Lda. ”, a sede “Zona Industrial Monte da Bar ca, em Coruche ", o número e data do oficio pelo qual foi notificado ao Sujeito Passivo - “Oficio n.° 5….. de 2014-09-29” - o Projecto de Relatório de Inspecção, assim como são aduzidos argumentos que revelam o conhecimento do teor do dito Projecto de Relatório de Inspecção.

Assim sendo, tendo em consideração o respeito pelos princípios do contraditório - artigo 8.0 do Regime Complementar de Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT), da participação - artigos 60° da Lei Geral Tributária (LGT) e 60.0 do RCPIT, e da decisão - artigo 56° da LGT, procede-se de seguida à apreciação dos argumentos invoçados no exercício do direito de audição, cujo conteúdo passamos a transcrever na integra:

(...)

Análise pelos Serviços

Articulados n. °s 1 a 6 Argumentos apresentados:

Vem o sujeito passivo alegar não concordar com as correções propostas no projeto de relatório, em virtude de considerar que a existência de fortes indícios não é a mesma coisa que existência de prova irrefutável, não sen,po os mesmos suficientes para dar lugar a correcções fiscais, liquidação de imposto e aplicação de coimas.

Considera ainda, que não pode ser penalizado por condutas de terceiros, nomeadamente ilegalidades praticadas pelos seus fornecedores, uma vez que as informações que pode obter, referentes aos mesmos, são verificadas (se o mesmo se encontra coletado e se o número de contribuinte é válido).

Apreciação:

Conforme já se encontra descrito no capitulo III do projeto de relatório, salienta-se que é posição dominante da jurisprudência portuguesa que à Administração Fiscal basta a recolha de indícios, embora fundados, objetivos e seguros, de que as operações constant,s dos documentos não correspondem a operações efetivamente realizadas, fazendo cessar a pjesunção de veracidade dos elementos contabilísticos. Não é imposto à Administração Tributária a prova irrefutável.

Ora, conforme se encontra descrito no capitulo III, a Administração fiscal apresentou factos fundados, objetivos e seguros de que as operações constantes das faturas emitidas por V....... não podem corresponder a operações reais. Desta forma, cabe ao sujeito passivo fazer a prova irrefutável de que as pinhas formalmente faturadas por V......., correspondem a operações reais.

O que está aqui em causa é o conhecimento que o adquirente tem do emitente das faturas em causa, pois este sabia, ou não devia ignorar,- tanto mais que o Montijo dista de Coruche, apenas cerca de 58 hn -terra do "fornecedor" formal, que V......., não lhe havia fornecido quaisquer bens, razão pela qual a dedução do IVA e a contabilização de gastos, foi considerada indevida.

De salientar, que a Administração Fiscal não põe em causa que o sujeito passivo tenha efetuado aquisições de pinhas, o que a Administração Fiscal questiona, perante os indicios recolhidos e demonstrados, é que as aquisições de pinhas constantes das faturas emitidas pela alegada fornecedora, não podem corresponder a operações reais, uma vez que V....... não tinha capacidade para lhe poder ter efetuado aquelas vendas.

Foi demonstrada a clara existência de fortes e fundados indícios de que as faturas em causa não correspondem a operações reais, cabendo ao sujeito passivo, cumprir o ónus da prova sobre a realidade das mesmas.

Articulados n.° 7 a 13 Argumentos apresentados:

O sujeito passivo veio argumentar que os elementos referentes às operações em causa foram totalmente r confirmados na ação inspetiva, tendo sido apresentados todos os documentos solicitados, inclusivamente cópias de cheques, frente e verso, de todos os cheques emitidos à alegada fornecedora.

Considera assim, que apresentou à Administração Fiscal toda a documentação para fazer prova da veracidade das operações.

Apreciação:

Refira-se a propósito dos argumentos apresentados neste articulado, que o sujeito passivo foi notificado através do n.° oficio n.° 6727 de 2013-11-19, a fim de apresentar documentação que lhe permitisse provar a veracidade das transacções. De entre essa documentação, solicitava-se o envio de cópias das guias de transporte das mercadorias transaccionadas, não tendo o sujeito passivo vindo apresentar qualquer guia de transporte das mercadorias em causa.

De facto, o sujeito passivo apresentou cópias frente e verso dos cheques emitidos em nome da alegada fornecedora, no entanto, conforme consta do extrato do relatório de inspeção elaborado pela Direção de Finanças de Setúbal, transcrito no capítulo III, as contas bancárias movimentadas pelo sujeito passivo evidenciavam a saída no próprio dia ou em dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, referindo-se os mesmos na quase totalidade a levantamentos em numerário.

Ora, os levantamentos no próprio dia de valores iguais ou aproximados aos das entradas, em numerário, bem como o levantamento de cheques ao balcão, em vez do seu depósito, é prática bastante comum no esquema das “faturas falsas" ou das “faturas de favor” (ou “faturas de substituição"), devido ao facto de os pagamentos “em dinheiro” de valores avultado apresentarem, desde logo, indícios de “faturação falsa

Deste modo, esta prática de depósito do cheque seguido de levantamento do seu valor, cumpre duas funções, constitui um suposto meio de prova do pagamento e permite efetuar repartição do seu valor entre os interessados, ou seja, emitente da fatura, fornecedor real e eventualmente o utilizador, na proporção previamente negociada.

A AT não põe em causa que a sociedade ora inspecionada tenha adquirido pinhas e, consequentemente tenha procedido ao seu pagamento. O que aqui está em causa é que essas pinhas não foram vendidas por V......., conforme titulam as faturas contabilizadas. A alegada fornecedora, conforme é referido na informação recebida da Direção de Finanças de Setúbal, não se dedica ao comércio de pinhas nem demonstra qualquer estrutura empresarial suscetível desse comércio. A acrescer a tudo isto, e da análise efetuada pela Direção de Finanças de Setúbal às contas bancárias tituladas por V....... é revelado que no próprio dia ou em dias subsequentes, é efetuado o levantamento de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, referindo-se os mesmos na quase totalidade a levantamentos em numerário.

Articulados n. °s 14 a 18 Argumentos apresentados:

Nos articulados 14 a 18 vem o sujeito passivo argumentar que as operações em causa correspondem a operações reais, porquanto o mesmo comprou, recebeu os bens e pagou-os, factos que entende ter comprovado.

Alega ainda que, se a vendedora tem historial de operações simuladas não pode o mesmo responder por isso, não se tratando das operações firmadas com o mesmo.

Conclui o sujeito passivo, que não devem ser efetuadas as correcções propostas no projeto de relatório em sede de IVA e IRC, uma vez que as operações em causa correspondem a operações reais, entendendo ter sido apresentadas a prova necessária.

Apreciação:

Conforme já foi descrito ao longo do presente relatório de inspeção, estão em causa operações relativamente às quais existem fortes indícios de que se tratam de operações simuladas, os quais se encontram devidamente explicitados.

Apesar de o sujeito passivo ter apresentado elementos que pretendem justificar as operações constantes das faturas emitias por V......., os mesmos não são suficientes para refutar os indícios apurados, de que se tratam de operações que não correspondem à realidade.

Alais uma vez se reitera que, à Administração Fiscal apenas incumbem a obrigação de demonstrar a existência de indícios de que as operações não correspondem à realidade, cabendo ao sujeito passivo o ónus de provar que as operações são reais, não tendo o sujeito passivo logrado provar, inequivocamente, a veracidade das operações.

Assim sendo, encontrando-se os documentos em causa refletidos na contabilidade do sujeito passivo, tendo contribuído para diminuir o valor do IVA e IRC a entregar nos cofres do Estado, deverão os mesmos ser desconsiderados.

Conclusão:

Em resultado da análise efetuada ao teor do exercício do direito de audição, conclui-se qe não foram apresentados elementos susceptíveis de alterar as conclusões do projeto de relatório, pelo que se mantém as correções propostas.

(...). " - cf. fls. 26 a 36 do PA.

8. Foram emitidas, em nome da Impugnante, as liquidações adicionais de IVA n.°s 10……., no valor de €6.605,67, 10……. no valor de €2.076,90, 10……, no valor de €3.828,12, e respetivos juros compensatórios, liquidações n.°s 10…….., no valor de €977,28 e 10……., no valor de 541,18, no montante global de €14.029,15, relativas aos períodos 10/12, 11/01 e 11/02 - cf. fls. 1 e 23 do PA.

9. Em 06.05.2015, a Impugnante apresentou reclamação graciosa das liquidações identificadas em 8. - cf. fls. 3 a 18, do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

10. Em 01.06.2015, pela Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Leiria foi elaborada informação, na qual foi proposto o indeferimento do pedido da reclamação graciosa apresentada pela Impugnante por se considerar estar devidamente justificada, em sede inspetiva, os requisitos legais atinentes à não consideração do IVA - cf. fls. 37 a 48 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

11. Em 05.06.2015, foi emitido despacho pela Chefe de Divisão, por delegação de competências, no sentido de notificar a Impugnante para exercer o direito de audição sobre a proposta referida em 10. - cf. fls. 49 do PA.

12. A coberto do ofício n.° 1529, foi enviado ao mandatário do Impugnante, por correio postal registado, a informação e o despacho referidos no número anterior, concedendo o prazo de 15 dias para se pronunciarem sobre os mesmos, não tendo a Impugnante usufruído de tal direito - cf. fls. 50, 51 e 52. do PA.

13. Em 02.07.2015, pelo Diretor de Finanças de Santarém foi emitido despacho de indeferimento da reclamação apresentada pela Impugnante - cf. fls. 53 do PA.

14. A presente ação deu entrada neste Tribunal em 05.01.2015 - cf. fls. 1 dos autos em suporte físico.”

*

Factos não provados

“Para além dos supra elencados, não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.”

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Motivação

Motivação da matéria de facto

A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto dada como provada resultou da posição assumida pelas partes (factos não controvertidos) e da análise crítica dos documentos juntos aos autos e constantes do processo administrativo, tendo, ainda, relevado a factualidade constante do relatório de inspeção, não impugnados, tudo tal como indicado acima por referência a cada concreto ponto da matéria de facto.

A acrescer, a prova testemunhal prestada em sede de diligência de inquirição de testemunhas, efetuada no processo n.° 77/18.2 BELRA (a cujo aproveitamento se procedeu) e documentada em Ata constante dos autos foi relevante para a prova dos factos constantes em 4. e 5.

Concretizando, a testemunha D......... diretor de produção, referiu que exerceu funções para a Impugnante entre 2009/2010 a 2015, onde procedia à receção da matéria-prima, controlo de qualidade e era responsável pela fábrica, dado que era funcionário do grupo de empresas do qual faz parte a Impugnante, tendo deixado de desempenhar funções para o grupo em 2018.

Referiu que fazia a pesagem, preenchia o talão de receção, onde constava também o número de entrada, a tara do veículo de transporte e as suas características, a avaliação do produto e verificava se havia correspondência do mesmo com o fornecedor, afirmando, ainda, que só tinha autorização para receber cargas devidamente autorizadas

Mais declarou que a pesagem propriamente dita era efetuada por outra funcionária, porém também era por si examinada para verificar se havia correspondência entre o peso e a pessoa que recebia, bem como o controlo da qualidade do produto. Posteriormente, por correio interno, remetia os documentos para o escritório, não sabendo dizer qual o procedimento seguinte.

Disse, ainda, que no âmbito da ação inspetiva, não foi chamado para prestar esclarecimentos.

Confrontado com o nome de vários fornecedores, respondeu que o nome C......... é-lhe familiar dos registos de entrada, não sabendo quem é a pessoa; não conhece J…..; conhece V....... de nome; conhece pessoalmente R.S........, apesar de não saber de onde trazia as pinhas, onde era a empresa, se tinha estaleiro, conseguindo visualizar o veículo, mas não sabe se era de aluguer ou emprestado e que não sabia se ia em nome próprio ou em nome de outrem.

A testemunha A........., técnica superior de apoio técnico à contratação pública no Município de Coruche, trabalhadora, declarou que entre 2005 e 2017, foi funcionária de uma das empresas do grupo de que faz parte a Impugnante, tendo, entre 2011 e 2014, prestado serviços para a Impugnante na área do aprovisionamento, compras, relatórios de vendas, análise de vendas, acompanhava controlo e campanha das pinhas.

Mais referiu que quando recebia as faturas dos fornecedores, confirmava junto da autoridade tributária, o cadastro dos fornecedores, verificava o talão da báscula, o preço acordado e depois, emitia a fatura para pagamento. Disse que normalmente, nas faturas, assinava o seu nome, apunha a menção de conferido e a data.

Em relação aos fornecedores de pinhas, respondeu que verificava se tinham atividade aberta e se eram sujeitos passivos de IVA, junto do portal das finanças, para completar a fatura, através do número de contribuinte do fornecedor, que o documento que constava no portal das finanças era impresso e agrafado à fatura, fazendo esta verificação para todas as faturas. Disse, ainda, que todas as faturas eram verificadas e arquivadas com todos os documentos, como o documento retirado do portal das finanças, o talão ou a guia de remessa e depois de tudo conferido, passava para a colega dos pagamentos.

Mais referiu ter tido conhecimento da ação inspetiva, não tendo havido muita interação com os inspetores, tendo estes ido às instalações, solicitado as pastas dos anos que queriam verificar e selecionado as faturas que queriam recolher numa sala.

Referiu também que as pastas estavam organizadas por exercícios, que os inspetores levaram o que quiseram, foi-lhes dada a pasta completa com tudo, tendo eles apreendido os originais de algumas faturas, mas julga não terem levado os anexos, não tendo sido explicado o porquê e que na Impugnante ficaram com cópias autenticadas dos originais. Reiterou que os inspetores tiveram acesso a toda informação porque está tudo junto à fatura.

Confrontada com vários nomes de fornecedores, entre os quais o de V........., respondeu serem nomes que não lhe dizem nada.

Perguntada sobre a consulta no portal das finanças, referiu que só aparece se o fornecedor tem atividade ativa e se é sujeito passivo de IVA, não sabendo mais nada, nem se cumprem ou não as suas obrigações fiscais ou se entregavam o IVA aos cofres do Estado, dizendo, ainda, que nem as finanças dava essa informação.

A testemunha M......., contabilista certificado, exerce as funções de técnico de contas da Impugnante desde meados dos anos 70, referiu que esteve presente em várias reuniões, com o Diretor R........., F…… e H........, sendo que as preocupações em controlar os produtores de pinhas já se colocavam há cerca de 30 anos, tendo sido prometida ajuda.

Mais referiu que na altura a Impugnante já tinha sido fiscalizada, momento em que deu toda a informação à autoridade tributária e nos momentos seguintes a Impugnante tinha dificuldade em adquirir pinhas, pois os fornecedores não lhe queriam vender porque esta só comprava com fatura, o que foi comunicado, na altura, ao Diretor R........, mas ficou tudo na mesma.

Referiu que mais tarde tiveram outra fiscalização realizada pelo inspetor O........, tendo este colocado muitos problemas. Mais disse que juntamente com H........, falaram com o Diretor L........, pensando que algo se ia resolver, porquanto, a conselho daquele, escreveram uma carta anónima, mas nada aconteceu.

Referiu, ainda, que a Impugnante voltou a ser fiscalizada, tendo nessa altura pedido uma reunião com o atual Diretor de Finanças, antes da campanha de 2014 e na altura fizeram uma consulta vinculativa, que os devolveu à estaca zero.

Afirmou que, a cada fiscalização, colocava-se sempre a questão como é que a Impugnante podia saber quem era cumpridor e quem não era, referindo que em relação a empresas com nome estranho, o depoente aconselhou a Impugnante a ir ao portal das finanças verificar se as empresas estavam coletadas, situação que foi sempre verificada pelas trabalhadoras da Impugnante.

Disse, ainda, que durante as várias ações de fiscalização o que sempre perguntava era como é que podiam saber quem eram os cumpridores e os não cumpridores.

Confirmou também que um representante da Impugnante, através da Associação do Pinhão à qual estava ligado, chegou a ter reuniões com o Secretário de Estado das Finanças por causa deste problema das pinhas e não teve nenhum resultado, nem sequer na inversão da situação de cobrança e entrega do IVA ao Estado.

Referiu que durante a inspeção que deu origem aos presentes autos, foram fornecidos todos os elementos aos inspetores, faturas, guias de transporte, talões, não sabendo o motivo pelo qual só apreenderam os originais das faturas.

Mais referiu que foi apresentada uma lista de indivíduos “não cumpridores”, em total colaboração com a autoridade tributária, o que foi prejudicial para a Impugnante porque depois os operadores deixaram de lhe vender pinhas.

Aludiu que quer a Impugnante quer as restantes empresas do grupo, sempre cumpriram com as suas obrigações, tendo ganho alguns prémios atribuídos por algumas entidades, inovando e fazendo investimento no sector do pinhão português.

Esclareceu também que o problema não reside nos donos dos pinhais, mas sim no facto de existir uma grande quantidade de pessoas a roubar toneladas de pinhas, que as enterravam e depois iam buscá-las quando estas pudessem circular.

Explicou que as pinhas iam para eiras e depois eram levadas, por exemplo, para Espanha, sem fatura, tendo existido situações em que até foram roubar pinhas à eira da impugnante. Rematou dizendo que o problema resolver-se-ia se o IVA fosse liquidado pelo adquirente.

Perguntado sobre os adiantamentos de dinheiro, referiu que foram feitos alguns adiantamentos que se destinavam a comprar pinhas, os quais foram efetuados a fornecedores que a impugnante conhecia, ou seja, eram efetuados a indivíduos que se encontravam dentro do negócio para irem à procura de fornecedores de pinhas, dado que, devido às denúncias, as pessoas não iam ter com a Impugnante.

Reconhece que há faturas falsas. Por exemplo V....... era coletada e vendia pinhas, apesar de ser cabeleireira. Disse ainda que, não obstante isto, nem todos os fornecedores que emitiram as faturas eram desonestos, apareceram alguns que possivelmente seriam desonestos, mas a impugnante não tinha forma de saber quais eram. Referiu que os pagamentos eram feitos em cheque e por transferência bancária. Se os cheques eram logo levantados, era normal, pois tinham que pagar aos trabalhadores e aos indivíduos a quem compravam as pinhas.

Assentiu também que ir aos pinhais ver onde é feita a extração das pinhas não é viável, pois muitos dos fornecedores são intermediários, compram as pinhas a outros fornecedores e, para além disso, não existe nenhuma obrigação legal de verificar de onde vêm as pinhas.”

*

II.2 - De direito

Com base na matéria de facto supra transcrita o Tribunal a quo, analisando o vício invocado pela Impugnante (ora Recorrida) («F......., LDA.»), a saber: ilegalidade das liquidações por vício de violação de lei, por violação do disposto no artigo 19º, nº 1, alínea a) e 20º, nº 1, alínea a), do Código do IVA (CIVA), julgou procedente a Impugnação judicial de IVA dos exercícios de 2010 e 2011, entendendo, “… que a Administração Tributária não recolheu “indícios fundados” que legitimam a sua atuação no sentido de não aceitar a dedução do IVA, mencionados nas faturas emitidas pela fornecedora acima referida e em causa nos autos, ou seja, não cumpriu com o ónus que sobre si impendia na fundamentação material das liquidações impugnadas, as quais estão, assim, inquinadas de ilegalidade, impondo-se, consequentemente, determinar a anulação das liquidações de IVA, na parte impugnada.

A Recorrente não se conforma com o assim decidido, invocando que a decisão objeto de recurso padece de errada apreciação e compreensão quanto aos factos que reputou essenciais para a boa decisão da causa e ainda errada subsunção jurídica dos factos à aplicação de Direito.

Para tanto, alega nas suas conclusões de recurso, que, no seu entender, foram recolhidos pela AT indícios sólidos de que as quatro faturas emitidas em nome de “V.......”, não correspondem a operações reais.

Está em causa nos autos correções em sede de IVA, em que a AT entendeu que as operações subjacentes às faturas ora em causa, dos exercícios de 2010 e 2011, e referentes a um emitente [«V.......»] não titulam operações reais, considerando-as fictícias ou falsas, e nessa medida, não aceitou a dedução do IVA nos termos do disposto no artigo 19º, n.º 3 e do 20º n.º 1 aliena a), ambos do CIVA.

O recurso da Fazenda centra-se no erro de julgamento, apoiando-se no relatório da inspeção onde foram elencados vários factos que, no seu entender, indiciam com elevada probabilidade que as faturas não corporizam o que lá se declara.
Por conseguinte, a Recorrente, imputa à sentença erro de análise da matéria de facto por valoração errada da prova produzida, ao concluir que as faturas correspondem a efetivas operações económicas nelas descritas, pois que a prova produzida não permite extrair tal conclusão, nem abalar os indícios aportados para o relatório da inspeção.

Mas será assim?

Vejamos agora se a sentença incorreu em erro de julgamento na apreciação e valoração da prova e na aplicação e interpretação das normas jurídicas e na subsunção dos factos ao direito.

Antes de mais, salienta-se que o probatório se tem por estabilizado uma vez que a Recorrente não questiona a seleção dos factos, não os impugna, nem pretende o aditamento de outros por referência à prova produzida, apenas se insurge contra a apreciação e valoração dos factos levados ao probatório.

Dito de outro modo, a Recorrente não imputa à sentença erro na apreciação da prova, que sempre implicaria a rejeição do recurso nessa parte por manifesta inobservância do ónus imposto ao recorrente no artigo 640º do CPC, mas unicamente e só, erro na apreciação e valoração dos factos constantes do probatório.

Como bem sabemos, a fundamentação do ato de liquidação encontra-se plasmada no respetivo relatório inspetivo, motivo pelo qual será a partir do que dele consta que se poderá concluir que o mesmo contém a indicação e explanação dos indícios da existência e contabilização de faturas que não correspondem a operações reais.

Dos fundamentos vertidos no relatório de inspeção no ponto III, sob a epígrafe “Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritmética à matéria tributável”, o relatório indica que: [cfr. item 7. da matéria de facto assente]

“Na sequência da acção inspectiva levada a cabo pela Direcção de Finanças de Setúbal relativamente ao sujeito passivo V......., Nif: 21….., apurou-se que as facturas por esta emitidas no decurso da sua alegada atividade de compra e venda de cortiça, pinha e lenha, não correspondem a operações efectivamente realizadas entre a própria e os seus clientes (operações simuladas), conforme fundamentos expressos no relatório de inspecção elaborado pela Direcção de Finanças de Setúbal (01201101028), do qual se extraíram as conclusões que a seguir se transcrevem:

Em face dos elementos descritos, verifica-se estarmos perante factos que comprovam que as facturas emitidas por S.......a V....... e que as respectivas facturas emitidas por esta aos seus clientes não correspondem a transacções efectivamente realizadas entre as partes. Consequentemente, também não representam encargos reais suportados pelos destinatários das mesmas. sendo de realçar os seguintes aspectos:

- O facto do sujeito passivo não evidenciar estrutura para o exercício do negócio de compra e venda de Cortiça, Pinhas e Lenha. situação corroborada pela ausência de quaisquer instalações. equipamentos ou funcionários registados na sua contabilidade nos exercícios de 2010 e 2011;
- O facto do sujeito passivo não possuir valores de compras de Cortiça e Lenha que justifiquem os montantes facturados;
- O facto de, sendo os valores de compras de Pinhas significativos, os mesmos provirem essencialmente de um único fornecedor, S……., o qual, por sua vez, não apresenta na sua contabilidade quaisquer documentos de aquisição que justifiquem os montantes facturados a V.......;
- O facto do sujeito passivo ter começado a transmitir bens mesmo antes de os ter adquirido. remontando as primeiras-transmissões a sete meses antes das respectivas aquisições;
- O facto das contas bancárias movimentadas pelo sujeito passivo evidenciarem a entrada dum valor inferior a 50% ao total dos recebimentos dos respectivos clientes;
- O facto das contas bancárias movimentadas pelo sujeito passivo evidenciarem a saída, no próprio dia ou nos dias subsequentes. de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais se referem na sua quase totalidade a levantamentos em numerário;
- O facto de se terem apurado inúmeras irregularidade ao nível da facturação emitida, como a existência de emissão não sequencial e a desconformidade entre originais na posse de clientes e cópias na posse do sujeito passivo.”

Vejamos, então, se os elementos coligidos pela inspeção tributária constituem indícios objetivos, sólidos e consistentes que demonstrem com elevada probabilidade que as operações subjacentes às respetivas faturas não correspondem à realidade, são fictícias, ou seja, se ao assim não ter entendido o Tribunal a quo, errou no seu julgamento de facto e de direito.

Comecemos por estabelecer o quadro normativo e jurisprudencial em que se move a impossibilidade de dedução do IVA, nestas circunstâncias, bem como toda aquela que se relaciona com o ónus da prova da falsidade das faturas.

O direito aÌ dedução faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado, exercendo-se imediatamente em relação aÌ totalidade do IVA que incidiu sobre as operações a montante [Vide, entre outros, Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 22 de dezembro de 2010, Dankowski, C-438/09, n.ºs 22 e 23].

Nesta aceção do princípio da neutralidade, o regime instituído pela Diretiva Imposto sobre o Valor Acrescentado (DIVA) permite aos sujeitos passivos deduzir o IVA que tenha onerado as aquisições de bens e serviços destinados aÌ atividade tributada.

Em suma, o mecanismo do direito à dedução permite ao sujeito passivo expurgar do seu encargo o IVA suportado a montante retirando o efeito cumulativo e a tributação em cascata que caracterizavam sistemas anteriores de tributação do consumo.

Assim, o direito à dedução assenta no designado método da dedução do imposto, método do crédito de imposto, método subtrativo indireto ou ainda método das faturas.
O Código do IVA, na esteira do previsto na DIVA, determina, como regra geral, a dedutibilidade do imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos.

No que ora nos importa, cumpre uma chamada de atenção para a jurisprudência emanada pelo TJUE, nomeadamente, entre outros, nos acórdãos de 21 de fevereiro de 2006, Halifax C-255/02, n.ºs 68 e 71; de 27 de outubro de 2011, Tanoarch, C-504/10, n.ºs 50; de 21 de junho de 2012, Mahageìben e Daìvid, C-80/11 e C-142/11, n.º 41, e de 6 de dezembro de 2012, Bonik, C-285/11, n.ºs 35 e 36, nos quais se vem reiterando que a luta contra a fraude, a evasão fiscal e os eventuais abusos constitui um objetivo reconhecido e incentivado pela DIVA, não podendo os sujeitos passivos, fraudulenta ou abusivamente, aproveitar-se das normas do direito da União.

Incumbe, pois, às autoridades nacionais e aos tribunais dos Estados membros recusar o direito aÌ dedução, se se demonstrar, face a elementos objectivos, que esse direito eì invocado fraudulenta ou abusivamente [Cfr. acórdãos de 6 de junho de 2006 Kittel e Recolta Recycling, C-439/04 e 440/04 n.º 55, e acórdãos já referenciados Mahageìben e Daìvid, n.º 42; Bonik, n.º 37].

Em jeito de conclusão, temos que, pode recusar-se o direito aÌ dedução que tenha sido exercido de forma fraudulenta ou quando o sujeito passivo sabia ou devia saber que participava numa fraude ao IVA (ainda que a operação em causa preencha os critérios objetivos em que se baseiam os conceitos de transmissões de bens efetuadas por um sujeito passivo agindo enquanto tal).

Neste particular, cumpre ter em atenção, a jurisprudência do TJUE presente nos acórdãos de 12 de janeiro de 2006, Optigen C-354/03, C-355/03 e C-484/03, n.ºs 52 e 55, e dos , já mencionados, Kittel e Recolta Recycling, n.ºs 45, 46 e 60, Mahageìben e David, n.º 47, e Bonik, n.º 41, em que se afirma não ser compatível com o regime do direito à dedução, a recusa desse direito a um sujeito passivo que não sabia nem podia saber que a operação em causa fazia parte de uma fraude cometida pelo fornecedor ou que outra operação incluída na cadeia de fornecimento, anterior ou posterior aÌ realizada pelo referido sujeito passivo, estava viciada por fraude ao IVA.

Em sede do direito interno, as disposições previstas no artigo 19.º n.ºs 3 e 4, do Código do IVA visam precisamente consagrar o impedimento do direito aÌ dedução que resulte de operações fraudulentas. Imbuído do princípio de que só confere direito aÌ dedução o IVA que tenha onerado aquisições de bens e serviços destinados ao exercício da atividade tributada realizada pelo sujeito passivo, por um lado, e consequentemente, por outro lado, de que não confere necessariamente direito aÌ dedução, imposto que não se reporte a efectivas transmissões de bens ou prestações de serviços, determinando o n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA que “não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente”. Este preceito legal, em face da sua formulação, aplica-se quer em situações de simulação absoluta em que constituem paradigma, no âmbito do IVA, as designadas “facturas falsas”, quer em situações de simulação relativa (quando existe a vontade de dissimular um outro negócio).
A premissa de que o direito à dedução pressupõe que o IVA tenha onerado efetivas prestações de serviços ou transmissões de bens é amplamente reconhecida pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores ao afirmar-se que “O direito de dedução do IVA pago a montante apenas poderá existir, segundo a própria natureza das coisas, relativamente a imposto efectivamente suportado em operações económicas efectivamente acontecidas. De contrário, estaríamos perante um simples arquétipo intelectual ou virtual e não perante um tributo que visa atingir de forma geral o consumo real de bens e serviços nos diversos estádios do circuito económico. A inadmissibilidade da dedução do imposto relativo a operação simulada ou em que seja simulado o preço, afirmada positivamente no n.º 3 do art.º 19º do CIVA, corresponde, deste modo, a uma conclusão forçosa ou decorrente da própria natureza do imposto, cuja explicitação formal apenas se justifica por questões de clareza” [acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), proc. n.º 026635, de 17.04.2002 (citado), bem como os recentes acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, entre outros, de 16.03.2016, processo n.º 587/15; de 16.11.2016, processo n.º 600/15; de 17.02.2016, processo n.º 591/15 e de 30.09.2020, processo n.º518/17.6BALSB].

Tecidos estes breves considerandos, atenhamos então às regras do ónus da prova vigente no nosso direito interno, fundamentais nas situações em que as faturas (ou documentos equivalentes) são emitidas na forma legal, mas que (no entender da AT) não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto refletirem não tiveram lugar, é sobre a AT que recai o ónus da prova da verificação dos respetivos indícios ou pressupostos da tributação, ou seja, dos pressupostos legais da sua atuação, considerando o princípio da legalidade administrativa. Em contraposição, num segundo momento, é ao contribuinte que cabe provar a existência dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito, ou seja, a efetiva existência das alegadas transações (cf. neste sentido entre outros acórdãos do STA de 30.04.2003, proc. n.º 0241/03 e de 24.04.02, proc. n.º 102/02).

Neste domínio, quando a AT desconsidera as faturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT), competindo à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transação.

É consabido, que o artigo 75º, n.º 1 da LGT estabelece uma presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes, bem como dos dados que constam da sua contabilidade e escrita: “[p]resumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”.

A AT não precisa de demonstrar a falsidade das faturas, bastando-lhe evidenciar a consistência daquele juízo (acórdão do STA de 27.10.2004, processo n.º 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas faturas serem simuladas, suscetível de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade, não se impondo a “prova provada” de que por detrás dos documentos, das faturas não está a realidade que normalmente refletem e comprovam.

O que significa, que, a AT não necessita de demonstrar a falsidade das faturas, basta-lhe evidenciar a consistência daquele juízo, invocando factos que traduzam uma probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade (artigo 75º da LGT).

O mesmo é dizer, que, sobre a AT não recai o ónus de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratório, no intuito de enganar terceiros – cf. art. 240.º do CC) para lograr o ónus de prova que sobre si impende (cf. nesse sentido, entre outros, acórdãos do Pleno da secção do CT do STA de 16.11.2016 e proc. n.º 0600/15, de 19.10.2016, proc. n.º 511/15).

Assim, para abalar a presunção legal a favor do contribuinte, e “Para que a AT, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 19.º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em faturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efetivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do CCivil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende.” [cf. Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 16.03.2016, proferido no processo n.º 0587/15, disponível em www.dgsi.pt].

Nesta senda, não é imperioso que a AT efetue uma prova direta da simulação.

Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indireta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém diretamente, mas indiretamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” [cf. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 154], o que significa que a Autoridade Tributária não tem que demonstrar a falsidade das faturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo, invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas faturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade - artigo 75º da LGT [cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 20/04/2017, processo n.º 00455/07.2BEPRT, disponível em www.dgsi.pt].

Os indícios podem ser definidos como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” [cf. Castro Mendes, in “O conceito de Prova em Processo Civil (1961) 176-186” Apud José Luís Saldanha Sanches, in “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2.ª edição, Lex, Lisboa 2000, p. 311].
No tocante aos indícios, podem estes ser recolhidos tanto na esfera material e económica do utilizador das faturas, como também na esfera de quem as emite, pelo que tais indicadores de falsidade das faturas não têm necessariamente que advir exclusivamente de elementos do próprio contribuinte fiscalizado [neste sentido, vide o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 05/02/2015, processo n.º 08097/14, disponível em www.dgsi.pt].

Assim, ponto assente, como se aludiu, é que os indícios apurados pela AT sejam objetivos, seguros e credíveis que permitam concluir que os mesmos são suficientes para criar a convicção de que existe uma probabilidade séria das operações comerciais tituladas nas faturas postas em causa e contabilizadas pela Impugnante não são reais, e como tal, quer o IVA deduzido quer os gastos e perdas contabilizados, devem ser desconsiderados, e só depois, recai sobre o sujeito passivo de imposto o ónus da prova da veracidade das referidas faturas.

Cumpre assim averiguar se o Tribunal a quo errou no seu juízo ao concluir que a AT não fez prova, como lhe competia, da verificação de indícios que permitem concluir que às apontadas faturas emitidas por “V.......” contabilizadas pela Impugnante, ora Recorrente, não subjazem as operações que, alegadamente, teriam implicado a respetiva emissão, por outras palavras, saber se a AT estava legitimada, com os factos relatados, a proceder às correções que operou, desconsiderando faturas por não consubstanciarem operações reais.

Munidos do enquadramento jurídico supra gizado, nomeadamente quanto ao ónus da prova aplicável às correções em causa, e considerando os factos apurados em sede inspetiva, vejamos se resulta dos factos descritos que a AT fez prova da verificação de indícios que lhe permitiam concluir que as questionadas faturas do emitente “V.......” constantes do RIT não tiveram subjacentes quaisquer operações económicas realizadas entre ele e a Recorrida/impugnante.

Considera a Recorrente, que, houve erro na apreciação da prova, pois, contrariamente ao que se afirma na decisão recorrida, “Efetivamente, os elementos juntos pela impugnante foram devidamente apreciados e podemos ler no relatório de inspeção, que consta do ponto 7 dos factos provados, na transcrição que é feita no segundo parágrafo da página 8 da sentença: “Não obstante o sujeito passivo ter vindo apresentar cópias dos meios de pagamento (cópias de cheques, frente e verso), salienta-se que, no âmbito da ação inspetiva a V......., levada a cabo pela direção de finanças de Setúbal, se apurou que as contas bancárias movimentadas pela mesma evidenciavam a saída, no próprio dia ou nos dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais eram normalmente efetuados em numerário.”

Mais alega a Recorrente que “Os indícios da prática de operações fictícias foram confrontados com a situação específica do destinatário das faturas.”

Defende ainda a Recorrente no seu recurso, que se impunha, “… que em tribunal a prova testemunhal apresentada pela Impugnante fosse então mais objetiva e detalhada, por forma a justificar que o fornecedor em causa teria capacidade objetiva, por si próprio ou através de terceiros, devidamente identificada e localizada no tempo, para transacionar as quantidades de pinha constantes das faturas.” E ainda que, “… as testemunhas, trabalhadoras da impugnante, apenas vieram demonstrar o circuito documental da operação (faturas, cheques, talões de pesagem, etc), o que não é posto em causa pela inspeção tributária.”

Está em causa a valoração da prova produzida.

No que diz respeito às regras da impugnação da matéria de facto e à apreciação da prova, vigora no processo tributário português, o regime jurídico estabelecido para o processo civil, por força do disposto no artigo 2º, alínea e) do CPPT.

Fazendo um breve enquadramento legal das regras a que a Recorrente está sujeita para impugnar a matéria de facto e dos poderes do TCA para a sua apreciação há que trazer à colação o n.º 1 do artigo 662º e o artigo 640º, ambos do CPC.

Resulta da conjunção daqueles normativos que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se a prova produzida impuser decisão diversa, conquanto o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e indique os concretos meios probatórios que os demonstram.

Assim, para que o TCA possa proceder à alteração da matéria de facto, esses meios de prova devem conduzir e impor uma decisão diversa da proferida, de molde a concluir-se que a 1ª instância incorreu em erro de apreciação das provas.

Ora, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas previsto no artigo 607º, n. º5 do CPC.

Como se afirmou no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Sul de 30 de abril de 2025, Processo n.º 2242/10.1BELRS:

Por força do referido princípio, as provas são apreciadas livremente, de acordo com a convicção que geram no julgador acerca da existência de cada facto, ficando afastadas as situações de prova legal que se verifiquem, por força do disposto nos artigos 350º, nº 1, 358º, 371º e 376º, todos do CC, nomeadamente, da prova por confissão, por documentos autênticos, por certos documentos particulares quanto à materialidade das suas declarações e por presunções legais.

Na verdade, constitui dado adquirido o de que existem inúmeros aspetos comportamentais dos depoentes que não são passíveis de ser registados numa gravação simples áudio. Tal como já era apontado por Eurico Lopes Cardoso os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspeto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe e como tal apreendidos ou percecionados por outro Tribunal que pretenda fazer a reapreciação da prova testemunhal, sindicando os termos em que a mesma contribuiu para a formação da convicção do julgador, perante o qual foi produzida (cfr. BMJ n.º 80, págs. 220 e 221). Como tal, sempre o juiz perante o qual foram prestados os depoimentos estará em posição privilegiada em termos de recolha dos elementos e sua posterior ponderação, nomeadamente com a devida articulação de toda a prova oferecida, de que decorre a convicção plasmada na decisão proferida sobre a matéria de facto.

Em conformidade, a convicção resultante de tal articulação global, evidencia-se como sendo de difícil destruição, principalmente quando se pretende pô-la em causa através de indicações parcelares, ou referências meramente genéricas que o impugnante possa fazer, como contrárias ao entendimento expresso.

Com efeito e como tem vindo a ser entendimento jurisprudencial consensual o depoimento oral de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, as suas reações imediatas, o sentido dado à palavra e à frase, o contexto em que é prestado o depoimento, o ambiente gerado em torno da testemunha, o modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo contribuindo para a formação da convicção do julgador. Segundo a lição que se extrai dos ensinamentos de Enrico Altavilla "… o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras …" (in: "Psicologia Judiciária", vol. II, Coimbra, 3.ª edição, pág. 12).

Daí que a convicção do tribunal se forma de um modo dialético, pois, para além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas produzidas nos autos, importa atender também à análise conjugada das declarações produzidas e dos depoimentos das testemunhas, em função das razões de ciência, da imparcialidade ou falta dela, das certezas e ainda das lacunas, das contradições, das hesitações, das inflexões de voz, da serenidade, dos “olhares de súplica” para alguns dos presentes, da “linguagem silenciosa e do comportamento”, da própria coerência de raciocínio e de atitude demonstrados, da seriedade e do sentido de responsabilidade evidenciados, das coincidências e inverosimilhanças que transpareçam no decurso da audiência de julgamento entre depoimentos e demais elementos probatórios.

Ao invés do que acontece nos sistemas da prova legal em que a conclusão probatória está prefixada legalmente, nos sistemas da livre apreciação da prova, como o nosso, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objeto da discussão em sede de julgamento, com base apenas no juízo que se fundamenta no mérito objetivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.

Note-se, contudo, que este sistema não significa puro arbítrio por parte do julgador.

É que este pese embora livre no seu exercício de formação da sua convicção não está isento ou eximido de indicar os fundamentos onde aquela assentou por forma a que, com recurso às regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquele processo de formação da convicção sobre a prova ou não prova daquele facto, permitindo, desta feita, sindicar-se o processo racional da própria decisão.

A nossa lei processual determina e faz impender sobre o julgador um ónus de objetivação da sua convicção, através da exigência da fundamentação da matéria de facto (da factualidade provada e da não provada), devendo aquele analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.

Deste modo, a alteração da matéria de facto pelo Tribunal ad quem tem lugar nos casos de manifesta desconformidade entre as provas produzidas e a decisão proferida, traduzida num erro na apreciação das provas, que implica uma decisão diversa.”

Ora, a sentença recorrida fundamentou a sua decisão quanto à matéria de facto no exame dos elementos documentais e informações oficiais constantes dos autos bem como na prova testemunhal que teve lugar em sede da respetiva audiência de inquirição de testemunhas.

Nesse sentido, escreve-se na decisão objeto de recurso, que:

Motivação da matéria de facto

A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto dada como provada resultou da posição assumida pelas partes (factos não controvertidos) e da análise crítica dos documentos juntos aos autos e constantes do processo administrativo, tendo, ainda, relevado a factualidade constante do relatório de inspeção, não impugnados, tudo tal como indicado acima por referência a cada concreto ponto da matéria de facto.

A acrescer, a prova testemunhal prestada em sede de diligência de inquirição de testemunhas, efetuada no processo n.º 77/18.2 BELRA (a cujo aproveitamento se procedeu) e documentada em Ata constante dos autos foi relevante para a prova dos factos constantes em 4. e 5.

Concretizando, a testemunha D......... diretor de produção, referiu que exerceu funções para a Impugnante entre 2009/2010 a 2015, onde procedia à receção da matéria-prima, controlo de qualidade e era responsável pela fábrica, dado que era funcionário do grupo de empresas do qual faz parte a Impugnante, tendo deixado de desempenhar funções para o grupo em 2018.

Referiu que fazia a pesagem, preenchia o talão de receção, onde constava também o número de entrada, a tara do veículo de transporte e as suas características, a avaliação do produto e verificava se havia correspondência do mesmo com o fornecedor, afirmando, ainda, que só tinha autorização para receber cargas devidamente autorizadas.

Mais declarou que a pesagem propriamente dita era efetuada por outra funcionária, porém também era por si examinada para verificar se havia correspondência entre o peso e a pessoa que recebia, bem como o controlo da qualidade do produto. Posteriormente, por correio interno, remetia os documentos para o escritório, não sabendo dizer qual o procedimento seguinte.

Disse, ainda, que no âmbito da ação inspetiva, não foi chamado para prestar esclarecimentos.

Confrontado com o nome de vários fornecedores, respondeu que o nome C......... é-lhe familiar dos registos de entrada, não sabendo quem é a pessoa; não conhece J…..; conhece V....... de nome; conhece pessoalmente R.S........, apesar de não saber de onde trazia as pinhas, onde era a empresa, se tinha estaleiro, conseguindo visualizar o veículo, mas não sabe se era de aluguer ou emprestado e que não sabia se ia em nome próprio ou em nome de outrem.

A testemunha A........., técnica superior de apoio técnico à contratação pública no Município de Coruche, trabalhadora, declarou que entre 2005 e 2017, foi funcionária de uma das empresas do grupo de que faz parte a Impugnante, tendo, entre 2011 e 2014, prestado serviços para a Impugnante na área do aprovisionamento, compras, relatórios de vendas, análise de vendas, acompanhava controlo e campanha das pinhas.

Mais referiu que quando recebia as faturas dos fornecedores, confirmava junto da autoridade tributária, o cadastro dos fornecedores, verificava o talão da báscula, o preço acordado e depois, emitia a fatura para pagamento. Disse que normalmente, nas faturas, assinava o seu nome, apunha a menção de conferido e a data.

Em relação aos fornecedores de pinhas, respondeu que verificava se tinham atividade aberta e se eram sujeitos passivos de IVA, junto do portal das finanças, para completar a fatura, através do número de contribuinte do fornecedor, que o documento que constava no portal das finanças era impresso e agrafado à fatura, fazendo esta verificação para todas as faturas. Disse, ainda, que todas as faturas eram verificadas e arquivadas com todos os documentos, como o documento retirado do portal das finanças, o talão ou a guia de remessa e depois de tudo conferido, passava para a colega dos pagamentos.

Mais referiu ter tido conhecimento da ação inspetiva, não tendo havido muita interação com os inspetores, tendo estes ido às instalações, solicitado as pastas dos anos que queriam verificar e selecionado as faturas que queriam recolher numa sala.

Referiu também que as pastas estavam organizadas por exercícios, que os inspetores levaram o que quiseram, foi-lhes dada a pasta completa com tudo, tendo eles apreendido os originais de algumas faturas, mas julga não terem levado os anexos, não tendo sido explicado o porquê e que na Impugnante ficaram com cópias autenticadas dos originais. Reiterou que os inspetores tiveram acesso a toda informação porque está tudo junto à fatura.

Confrontada com vários nomes de fornecedores, entre os quais o de V........., respondeu serem nomes que não lhe dizem nada.
Perguntada sobre a consulta no portal das finanças, referiu que só aparece se o fornecedor tem atividade ativa e se é sujeito passivo de IVA, não sabendo mais nada, nem se cumprem ou não as suas obrigações fiscais ou se entregavam o IVA aos cofres do Estado, dizendo, ainda, que nem as finanças dava essa informação. A testemunha M......., contabilista certificado, exerce as funções de técnico de contas da Impugnante desde meados dos anos 70, referiu que esteve presente em várias reuniões, com o Diretor R........., F……. e H........, sendo que as preocupações em controlar os produtores de pinhas já se colocavam há cerca de 30 anos, tendo sido prometida ajuda.

Mais referiu que na altura a Impugnante já tinha sido fiscalizada, momento em que deu toda a informação à autoridade tributária e nos momentos seguintes a Impugnante tinha dificuldade em adquirir pinhas, pois os fornecedores não lhe queriam vender porque esta só comprava com fatura, o que foi comunicado, na altura, ao Diretor R........, mas ficou tudo na mesma.

Referiu que mais tarde tiveram outra fiscalização realizada pelo inspetor O........, tendo este colocado muitos problemas. Mais disse que juntamente com H........, falaram com o Diretor L........, pensando que algo se ia resolver, porquanto, a conselho daquele, escreveram uma carta anónima, mas nada aconteceu.

Referiu, ainda, que a Impugnante voltou a ser fiscalizada, tendo nessa altura pedido uma reunião com o atual Diretor de Finanças, antes da campanha de 2014 e na altura fizeram uma consulta vinculativa, que os devolveu à estaca zero.

Afirmou que, a cada fiscalização, colocava-se sempre a questão como é que a Impugnante podia saber quem era cumpridor e quem não era, referindo que em relação a empresas com nome estranho, o depoente aconselhou a Impugnante a ir ao portal das finanças verificar se as empresas estavam coletadas, situação que foi sempre verificada pelas trabalhadoras da Impugnante.

Disse, ainda, que durante as várias ações de fiscalização o que sempre perguntava era como é que podiam saber quem eram os cumpridores e os não cumpridores.

Confirmou também que um representante da Impugnante, através da Associação do Pinhão à qual estava ligado, chegou a ter reuniões com o Secretário de Estado das Finanças por causa deste problema das pinhas e não teve nenhum resultado, nem sequer na inversão da situação de cobrança e entrega do IVA ao Estado.

Referiu que durante a inspeção que deu origem aos presentes autos, foram fornecidos todos os elementos aos inspetores, faturas, guias de transporte, talões, não sabendo o motivo pelo qual só apreenderam os originais das faturas.

Mais referiu que foi apresentada uma lista de indivíduos “não cumpridores”, em total colaboração com a autoridade tributária, o que foi prejudicial para a Impugnante porque depois os operadores deixaram de lhe vender pinhas.

Aludiu que quer a Impugnante quer as restantes empresas do grupo, sempre cumpriram com as suas obrigações, tendo ganho alguns prémios atribuídos por algumas entidades, inovando e fazendo investimento no sector do pinhão português.

Esclareceu também que o problema não reside nos donos dos pinhais, mas sim no facto de existir uma grande quantidade de pessoas a roubar toneladas de pinhas, que as enterravam e depois iam buscá-las quando estas pudessem circular.

Explicou que as pinhas iam para eiras e depois eram levadas, por exemplo, para Espanha, sem fatura, tendo existido situações em que até foram roubar pinhas à eira da impugnante. Rematou dizendo que o problema resolver-se-ia se o IVA fosse liquidado pelo adquirente.

Perguntado sobre os adiantamentos de dinheiro, referiu que foram feitos alguns adiantamentos que se destinavam a comprar pinhas, os quais foram efetuados a fornecedores que a impugnante conhecia, ou seja, eram efetuados a indivíduos que se encontravam dentro do negócio para irem à procura de fornecedores de pinhas, dado que, devido às denúncias, as pessoas não iam ter com a Impugnante.

Reconhece que há faturas falsas. Por exemplo V....... era coletada e vendia pinhas, apesar de ser cabeleireira. Disse ainda que, não obstante isto, nem todos os fornecedores que emitiram as faturas eram desonestos, apareceram alguns que possivelmente seriam desonestos, mas a impugnante não tinha forma de saber quais eram. Referiu que os pagamentos eram feitos em cheque e por transferência bancária. Se os cheques eram logo levantados, era normal, pois tinham que pagar aos trabalhadores e aos indivíduos a quem compravam as pinhas.

Assentiu também que ir aos pinhais ver onde é feita a extração das pinhas não é viável, pois muitos dos fornecedores são intermediários, compram as pinhas a outros fornecedores e, para além disso, não existe nenhuma obrigação legal de verificar de onde vêm as pinhas.”

Tendo em conta os ensinamentos de M. Teixeira de Sousa “… o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente …” (in: “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, pág. 348) Neste sentido cfr. Acd do TCA proferido em 15/11/2018, no âmbito do processo nº 02790/11.6BEPRT, disponível in: www.dgsi.pt..

À luz desta perspetiva temos que se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
Presentes os considerandos que antecedem e na sequência dos mesmos, temos que para que possa ser atendida nesta sede a divergência quanto ao decidido em 1.ª instância no julgamento de facto deverá ficar demonstrado, pelos meios de prova indicados pela Recorrente, a ocorrência de um erro na apreciação do seu valor probatório, exigindo-se, contudo e para tanto, que tais elementos de prova sejam inequívocos quanto ao sentido pretendido por quem recorre, ou seja, neste domínio, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, o que significa que o Recorrente tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida.

No caso em análise, não se patenteia que a Meritíssimo Juíza a quo haja valorado erradamente a prova existente nos autos.

Como refere Jorge Lopes de Sousa, “Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado”, Vislis, 4.ª ed. (2003), a pág.561, o exame crítico das provas a que se refere o n.º3 do art.º659.º do CPC (corresponde ao actual 607.º, n.º4), «…consubstancia-se no esclarecimento dos elementos probatórios que levaram o tribunal a decidir a matéria de facto como decidiu e não de outra forma e, no caso de elementos que apontem em sentidos divergentes, as razões por que foi dada prevalência a uns sobre os outros».

Ora, resulta do relatório de inspeção tributária, que, relativamente às faturas emitidas pelo referido fornecedor da ora Recorrida, V......., socorre-se a inspeção tributária do relatório de inspeção efetuado pela Direção de Finanças de Setúbal a esse fornecedor.

Defende a Recorrente no seu recurso [alínea G. das conclusões], que, “Efetivamente, os elementos juntos pela impugnante foram devidamente apreciados e confrontados e podemos ler no relatório de inspeção, que consta do ponto 7 dos factos provados, na transcrição que é feita no segundo parágrafo da página 8 da sentença: “Não obstante o sujeito passivo ter vindo apresentar cópias dos meios de pagamento (cópias de cheques, frente e verso), salienta-se que, no âmbito da ação inspetiva a V......., levada a cabo pela direção de finanças de Setúbal, se apurou que as contas bancárias movimentadas pela mesma evidenciavam a saída, no próprio dia ou nos dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, os quais eram normalmente efetuados em numerário.”

Mas, tal como concluiu o Tribunal a quo, no que concerne ao teor do relatório de inspeção efetuado ao fornecedor, embora tenham sido recolhidos indícios da prática de operações fictícias, era necessário confrontar essas conclusões com a situação específica do destinatário das faturas, ou seja, com a Impugnante (ora Recorrente), o que não foi feito.

A propósito de tais indícios, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
“ … ainda que resultasse provado que um determinado fornecedor emite faturas falsas, tal não significa necessariamente que o tenha feito de todas as vezes que emitiu uma fatura, com todos os seus clientes, já que os indícios recolhidos relativamente a um fornecedor, não podem ser usados de forma generalizada e indiscriminada sem a devida confirmação junto de quem recebe a fatura [neste sentido, vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 18.06.2015, proferido no processo n.º 07169/13, disponível em www.dgsi.pt].

Dito de outro modo, a mera invocação dos elementos colhidos noutras inspeções efetuadas a fornecedores, e ao respetivo fornecedor, do contribuinte, que apontam no sentido de que emite faturas falsas ou fictícias (indícios externos), não basta para afirmar a existência de faturação falsa do contribuinte inspecionado, se não forem acompanhados de elementos obtidos junto deste (indícios internos) que justifiquem esse juízo de descredibilização [cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 11.07.2019, proferido no processo n.º 647/09.0BELRA, disponível em www.dgsi.pt].

In casu, a inspeção apoia-se no relatório da Direção de Finanças de Setúbal, sem acrescentar factos em que a Impugnante seja interveniente claramente demonstradores da existência de operações simuladas, não bastando invocar, por exemplo, uma alegada incipiente estrutura organizacional deste fornecedor para justificar essa conclusão, visto que, por exemplo a falta de estrutura organizacional (pessoal, instalações, etc.) não é suficiente para se considerar que as operações são fraudulentas, uma vez que é comum no universo negocial a existência de empresas ou indivíduos que funcionam quase exclusivamente na base da intermediação [cf. o Acórdão do TCA Sul, de 11.07.2019, acima citado].

Destaque para o que sobre isto se disse na sentença atacada: “Aliás, tendo em conta a natureza do negócio em causa, onde à semelhança de muitos outros ligados à atividade com produtos agrícolas, os respetivos produtores fornecem muitas vezes os seus produtos a intermediários, muitas das vezes, pequenos comerciantes ou negociantes, sem que estes careçam de qualquer estrutura empresarial, maquinaria, armazéns, empregados, estabelecimento ou outros e depois revendem-nas. Sendo este o caso, aliás, da fornecedora V......., dado que era intermediária de um único fornecedor.

Eventuais irregularidades ou omissões existentes na contabilidade desse mesmo fornecedor situam-se ao nível da relação comercial existente com V......., cuja responsabilidade não pode ser assacada à Impugnante. Tanto mais que a própria Autoridade Tributária não coloca em causa a aquisição das pinhas pela Impugnante [cf. pág. 19 do RIT].

No que tange ao alegado em sede de recurso pela Recorrente, quanto à não junção das guias de transporte, nem de outros elementos como contratos, cartas comerciais, orçamentos ou notas de encomenda por parte da Recorrida, justificando a Recorrente, tal circunstância, com o facto de a Impugnante no que respeita às faturas em causa, ter operado fora do circuito económico, pelo que, não seria possível a sua apresentação [alínea H, I. e J. das conclusões], diga-se desde logo, que resulta do RIT [item 7. dos factos provados], que “Notificado o sujeito passivo, através do N/ ofício nº 6727 datado de 19-11-2013, para apresentar documentação relacionada com as operações em causa, nomeadamente, cópia de extratos de conta corrente do fornecedor, cópias de faturas, cópias de meios de pagamento e cópias de guias de transporte das mercadorias, o mesmo veio apresentar os elementos solicitados com exceção das guias de transporte. Da análise da documentação apresentada, confirmou-se que as faturas emitidas por V....... se encontravam refletidas na contabilidade do sujeito passivo, tendo contribuído para o apuramento dos gastos dos períodos, bem como, o IVA mencionado nas mesmas foi deduzido pelo contribuinte.”

Acresce, que, falece o argumento da Recorrente, de que a não junção de contratos, cartas comerciais, orçamentos ou notas de encomenda, a acontecer, sejam indicadores da falsidade das operações tituladas pelas faturas. Pois, não podemos perder de vista a atividade em causa e, como nos ditam as regras da experiência comum, neste género de negócios vigora uma grande informalidade, o que significa que a falta de contratos, cartas comerciais, orçamentos e notas de encomenda, são próprios de negócios no âmbito rural, como é aquele em que se desenvolvem este tipo de negócios (venda de pinhas). A inexistência de guias de transporte, só por si, não pode conduzir à conclusão pretendida pela Recorrente.

Em suma, após análise dos indícios relevados pela AT no seu RIT, conclui-se que esta apoia as correções efetuadas à Recorrida na ação de inspeção efetuada ao fornecedor de serviços, pretendendo extrapolar as conclusões a que chegou nessa ação de inspeção às faturas adquiridas pela Recorrida, sem que tenha recolhido um único indício concreto e credível relacionado com esta, limitando-se a tecer ilações da extrapolação de juízos retirados de uma análise critica efetuada à contabilidade.

É a própria AT que no âmbito da ação inspetiva, no RIT (resposta ao direito de audição da Impugnante), diz: “De facto, o sujeito passivo apresentou cópias frente e verso dos cheques emitidos em nome da alegada fornecedora, no entanto, conforme consta do extrato do relatório de inspeção elaborado pela Direção de Finanças de Setúbal, transcrito no capítulo III, as contas bancárias movimentadas pelo sujeito passivo evidenciavam a saída no próprio dia ou em dias subsequentes, de valores iguais ou aproximados aos das correspondentes entradas, referindo-se os mesmos na quase totalidade a levantamentos em numerário.
Ora, os levantamentos no próprio dia de valores iguais ou aproximados aos das entradas, em numerário, bem como o levantamento de cheques ao balcão, em vez do seu depósito, é prática bastante comum no esquema das “faturas falsas” ou das “faturas de favor” (ou “faturas de substituição”), devido ao facto de os pagamentos “em dinheiro” de valores avultado apresentarem, desde logo, indícios de “faturação falsa”.

Os indícios recolhidos relativamente a um fornecedor não podem ser usados de forma generalizada e indiscriminada sem a devida confirmação junto de quem recebe a fatura.

O relatório de inspeção não sendo completamente omisso na análise da atividade da Recorrida, dessa análise nada se retira de credível.

Alega a Recorrente, que, O sujeito passivo juntou cópias dos meios de pagamento, que comprovam o circuito financeiro da mercadoria, mas não comprovam o seu circuito económico. É necessário fazer a comprovação do circuito económico dado que, nesta sede, rege o princípio da substância sobre a forma do negócio em causa [alínea I. das conclusões].

E ainda, que, o sujeito passivo juntou cópias dos meios de pagamento, que comprovam o circuito financeiro da mercadoria, mas não comprovam o seu circuito económico. É necessário fazer a comprovação do circuito económico dado que, nesta sede, rege o princípio da substância sobre a forma do negócio em causa [alínea J. das conclusões].

No entanto, tendo ficado provado que os pagamentos foram efetuados em cheque fica absolutamente comprovado o circuito financeiro e económico da operação, que aliás não é verdadeiramente colocado em causa pela Recorrente.

Podem existir muitas razões para a saída do dinheiro no próprio dia ou em dias subsequentes, designadamente para efetuar pagamentos, que só por si não demonstra a falsidade das faturas.

Com efeito, nenhum indicador relevante de falsidade é relatado quanto ao utilizador ou à concreta operação faturada ao utilizador e falamos de indicadores como o descritivo vago das faturas emitidas, preço ostensivamente inflacionado para o produto ou serviço fornecido, falta de documentos comprovativos do circuito comercial, pagamento em numerário dos valores fraturados, fornecedores não coletados para a atividade declarada, pagamentos contabilizados ou fluxos financeiros que não apresentam coerência com as datas e valores das operações faturadas, entre outros.

Densificando, no atinente ao circuito de pagamento que, a AT não põe em causa o circuito de endosso dos cheques.

Assim, como indicador relevante de falsidade das operações sobra apenas a constatada falta de adequada estrutura empresarial e organizacional dos emitentes para o exercício da atividade declarada, o que é manifestamente insuficiente para sustentar correções à dedutibilidade do IVA mencionado nas questionadas faturas com base no apelado art.º 19.º, n.º 3, do CIVA, segundo o qual, “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada”.

O juízo subjacente à desconsideração das operações por falsas reside única e exclusivamente em inspeções efetuada ao fornecedor, o restante apresenta-se com carácter genérico e considerações conclusivas que tentam abalar a dispensabilidade dos serviços prestados.

Os indícios em apreço incidem sobre os emitentes das faturas, mas não sobre as faturas inscritas na contabilidade da Impugnante (ora Recorrida), a qual, mostrando-se regular, do ponto de vista formal, está revestida de presunção de veracidade e de boa fé (artigo 75º, n. º1, da LGT).

Ao cumprimento do ónus probatório da recorrente importava a alegação e demonstração de factos concretos que permitissem afiançar da falta de aderência à realidade de cada uma das operações tituladas pelas faturas em apreço. O que no caso não foi feito.

Sendo as faturas em causa as que constam discriminadas no RIT, importaria ao cumprimento do ónus em presença o cotejo entre os elementos fornecidos pela contribuinte e cada uma das faturas em referência. O que também não foi realizado. [Acórdão TCA Sul de 09.07.2020, proferido no âmbito do processo n.º893/10.3BELRS].

Assim sendo, há que concluir que, in casu, não tendo sido colocado em causa que as faturas foram emitidas na forma legal, a AT não logrou cumprir o ónus da prova da verificação dos respetivos indícios ou pressupostos da tributação que sobre si recai, nos termos do n.º 1 do artigo 74º da LGT, ou seja, dos pressupostos legais da sua atuação, face à presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes (art. 75.º da LGT).

A AT não demonstrou, relativamente a Recorrida e na sua esfera, a existência de “indícios fundados” (objetivos, sólidos e consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais).”, pois que é disso que se trata.

Apesar de a prova que a AT tem que realizar não ter de ser direta e dogmática, no sentido de evidente e intocável, antes pode resultar de circunstâncias colaterais e indiretas que, atentas a idoneidade dos respetivos meios de suporte e as regras da experiência comum, indiciem, segundo padrões de avaliação e aferição pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado como o mais legitimamente atendível; a verdade é que a AT não reuniu factos ponderosos e objetivos fortemente indiciadores de que as faturas em causa são falsas, não sendo suficiente, como vimos, apelando a um critério de bom senso e razoabilidade, suspeitar que estas operações comerciais não poderiam ter ocorrido entre os intervenientes em causa, e que se destinavam a diminuir a matéria coletável.

Por outro lado, não se pode concluir, de igual modo, que a Recorrida tinha conhecimento das irregularidades declarativas e/ou participava nos diversos esquemas dos emitentes das faturas e que foram apurados pelas ações de inspeção desenvolvidas pela Direção de Finanças ..., na medida em que tal não ficou evidenciado no relatório de inspeção.

Pelo que, lançando mão da jurisprudência supra citada do TJUE (Bonik, de 6 de Dezembro de 2012, C-285/11, reiterado pelo acórdão Maks Pen EOOD, de 13 de Fevereiro 2014, C-18/13) não pode a Recorrente ver recusada a dedução do IVA porquanto incumbe às autoridades fiscais competentes fazer prova bastante de que os elementos objetivos estão reunidos, ou seja, demonstrar que à Recorrida, à qual foram fornecidos os serviços que estão na base do direito a dedução, sabia ou deveria saber que, ao adquirir estes bens ou estes serviços, participava numa operação que fazia parte de uma fraude ao IVA cometida pelo fornecedor ou por outro operador a montante ou a jusante na cadeia destes fornecimentos ou destas prestações, o que não foi feito nos presentes autos.

Conclui-se, portanto, que a realidade fática convocada pela AT não é suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, logo os indícios recolhidos pela AT não permitem suportar, objetivamente e à luz das regras da experiência comum, a conclusão a que chegou e que determinou as correções respeitantes a IRC quanto às visadas sociedades, sendo certo que, como visto, foi feita prova da materialidade das operações.

Improcedem, por isso, as conclusões de recurso.

Pelo que, a sentença que assim decidiu não padece de qualquer erro de julgamento, devendo, por isso, ser confirmada.


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III. DECISÃO


Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 30 de setembro de 2025.
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[Maria da Luz Cardoso]

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[Cristina Coelho da Silva]
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[Margarida Reis]