Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 316/12.3BELLE |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 06/05/2025 |
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Relator: | ISABEL VAZ FERNANDES |
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Descritores: | OPOSIÇÃO REVERSÃO GERÊNCIA EFECTIVA PROVA. |
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Sumário: | I – A responsabilidade subsidiária dos gerentes, por dívidas da executada originária, tem por pressuposto o exercício efectivo do cargo de gerente. II – A alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT exige para responsabilização subsidiária a gerência efectiva ou de facto, ou seja, o efectivo exercício de funções de gerência, não se satisfazendo com a mera gerência nominal ou de direito. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO A Fazenda Pública, veio, recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, em 21 de Outubro de 2014, que julgou procedente a oposição deduzida por H......... , oponente e aqui Recorrido, no âmbito do processo de Execução Fiscal nº 1112-2009/01004999, instaurado para cobrança de dívidas relativas a IVA de Novembro de 2004, no valor de € 2.809,00, contra este revertido, originariamente instaurado contra “......... , Lda.” «1. A douta sentença recorrida decidiu pela procedência do pedido fundamentando com o facto de não ter sido provada o exercício da gerência de facto por parte do Oponente; 2. A decisão, no tocante à matéria de facto, considerou o depoimento da testemunha G.... como merecedor de credibilidade e o seu testemunho esclarecedor e pormenorizado quanto à questão do exercício da gerência da sociedade devedora originária; 3. Considerou o Mmº Juiz “a quo” que a sociedade devedora originária foi dissolvida em 2004 antes do termo do prazo para pagamento do imposto e que AT não fez qualquer esforço instrutório tendente a demonstrar que o Oponente exerceu a gerência de facto; 4. Porém, essa prova foi efectuada no decorrer da audiência de julgamento, na qual a testemunha G.... , cujo depoimento foi considerado credível e esclarecedor quanto a esse ponto; 5. Com efeito, da transcrição do depoimento efectuada nas alíneas a) a i) do artigo 11º das presentes alegações de recurso, resulta que a testemunha afirmou que a gerência de facto da devedora originária era partilhada pelos seus quatro sócios, cada um tendo um papel específico na boa gestão da mesma; 6. Cabendo ao Oponente a escolha dos bens comprados e posteriormente vendidos bem como a viabilização dos meios financeiros para tal objecto uma vez que a grande maioria das aquisições se destinavam a ser vendidas ao grupo Barraqueiro do qual o Oponente era director; 7. A escolha de fornecedores, bens a comprar pela sociedade e suas condições de venda e negociação com entidades bancárias de condições de pagamento constituem actos de gerência; 8. Não o tendo feito, incorreu o julgador da 1ª instância em erro de julgamento e violou o disposto no n.º 1 do art.º 24º da Lei Geral Tributária por não considerar provado o exercício da gerência de facto do Oponente; Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida e substituída por outra que considere o pedido improcedente como é de inteira JUSTIÇA» * Não foram apresentadas contra-alegações. * A DMMP junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. * Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão. * - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «Com interesse para a decisão da causa, de acordo com as diversas soluções plausíveis de direito, julgam-se provados os seguintes factos, com atinência aos meios de prova respectivos: 1. Em 23 de Fevereiro de 2012, o Processo de Execução Fiscal n.º 1112-2009/01004999, instaurado no Serviço de Finanças de Portimão contra .... , Lda., reverteu contra H......... – cfr. fls. 15 dos autos. 2. Em causa está a cobrança de € 2.809,00, relativos a IVA de Novembro de 2004, cuja data limite de pagamento ocorreu em 31 de Dezembro de 2008 – cfr. fls. 15v dos autos. 3. Em 12 de Maio de 2005, foi publicado no Diário da República, III Série, a certificação da dissolução e encerramento da liquidação da sociedade ......... , Lda – cfr. fls. 17 dos autos. 4. A criação da sociedade devedora originária foi ideia de G.... que, para o efeito, angariou três sócios capitalistas, entre os quais H......... – cfr. o depoimento de G.... 5. A originária vendedora dedicava-se à compra e venda de autocarros de passageiros – cfr. os depoimentos de G.... , M.... e S.... . 6. G.... contactava os clientes e os fornecedores - cfr. o depoimento de G.... e de M... 7. G.... deslocava-se ao estrangeiro para efectuar a compra dos autocarros que depois eram vendidos em Portugal pela devedora originária – cfr. o depoimento de G.... . 8. H......... angariava contactos de possíveis clientes da devedora originária em Portugal – cfr. o depoimento de G.... . 9. H......... era também dono do “Grupo Barraqueiro”. » * Factos não provados «Não se provou que: A. H......... nunca tenha exercido, de facto, funções de gerência na ......... , Lda.B. Foi sempre G.... quem tomou todas as decisões sobre os negócios da empresa.Inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa.» * Motivação da decisão de facto «Os documentos referidos não foram impugnados pelas partes e não há indícios que ponham em causa a sua genuinidade. Quanto às testemunhas: G.... depôs de forma pouco ordenada, por vezes sem concretizar na primeira resposta os factos sobre os quais foi questionado, sendo notórias as suas limitações físicas (teve um AVC em 2005 e foi-lhe diagnosticado Parkinson em 2006) e tendo o próprio reconhecido não estar na posse de todas as faculdades intelectuais, uma vez que por vezes se esquece de algumas coisas. O seu depoimento foi longo, tendo sido questionado por mim, depois pela Senhora Mandatária e, finalmente, pela Senhora Representante, sendo evidente o seu esforço de colaboração e as perguntas que lhe causavam maior ansiedade pois estas eram sinalizadas pela maior cadência dos tremores de que padece. A versão dos factos que apresentou mereceu credibilidade não só porque, à luz das regras de experiência comum, foram plausíveis, mas também porque não alterou significativamente o teor das suas declarações ao longo de toda a inquirição. Acresce que a testemunha reagia fisicamente às perguntas que lhe eram efectuadas, transparecendo tranquilidade quando falava do quotidiano da devedora originária, ficando um pouco agitado quando extrapolava para a sua estória de vida (como emigrante e, depois do regresso a Portugal, como empresário em várias sociedades de diferentes ramos) e alterado - com o olhar fixo e maior exaltação – quando abordava os negócios fracassados que por várias vezes referiu terem-lhe sido roubados por pensarem que ia morrer. Pareceu-me que, quanto a esta última matéria, aliás irrelevante para os autos, a testemunha não conseguiu depor de forma convincente, dada a sua evidente fixação com o facto de considerar ter sido vítima de um roubo. No entanto, quanto à questão do exercício da gerência da sociedade devedora originária, o seu testemunho foi esclarecedor e pormenorizado, com identificação das pessoas e empresas com quem contactava e trabalhou, bem como quanto ao modo como era desenvolvido o negócio da devedora originária. Marcos Oliveira respondeu com a propósito às questões que lhe foram colocadas, tendo demonstrado estar bem ciente de que só deveria responder de acordo com o viu, ouviu ou fez, pois respondeu a várias perguntas com a expressão inicial “Do que era do meu conhecimento…”, sendo que o seu conhecimento era atinente, em exclusivo, ao que se passava nas instalações da devedora originária, que apenas eram frequentadas pelo sócio G.... , embora soubesse, porque este lhe dizia, que havia reuniões entre G.... e o Oponente fora das instalações, desconhecendo, todavia, o seu conteúdo, pelo que nada de relevo adiantou quanto ao exercício, ou não, de facto da gerência por parte do Oponente. Finalmente, Vera Correia nada disse com interesse para a decisão da causa, uma vez que não era funcionária da devedora originária, mas de outra sociedade que com aquela partilhava as instalações.» Do pretendido aditamento ao probatório * Ao abrigo do preceituado no artigo 662º do CPC, densificando o conteúdo do facto constante do ponto 1) do probatório, adita-se, oficiosamente, o seguinte facto: 10) Em 23/02/2012 foi proferido despacho de reversão, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Portimão, nos termos do qual se determinou a reversão do PEF nº 1112200901004999 contra H......... , onde constam os seguintes fundamentos: “Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art.24º/nº1/b) LGT].” – Cfr. documento constante a fls. 59, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido. Estabilizada a matéria de facto, prossigamos. - De Direito Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. Ora, lidas as conclusões das alegações de recurso, resulta que está em causa saber se o Tribunal a quo errou no seu julgamento ao julgar procedente a oposição em virtude de a AT não ter efectuado qualquer esforço instrutório tendente a demonstrar que o Oponente, ora Recorrido, exercia, de facto, funções equiparadas à de gerente “quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou”, como se fundamenta no despacho de reversão. Afirma a Recorrente que resulta do depoimento da testemunha G.... que a gerência de facto da sociedade devedora originária era partilhada pelos quatro sócios, onde se incluía o ora Recorrido. Entende que a sentença padece de erro de julgamento na medida em que não considerou provado o exercício da gerência de facto pelo Oponente. Que dizer? Atentemos no que se escreveu na sentença recorrida a este propósito, depois de efectuar o enquadramento legal da questão em apreciação: “(…) No caso dos autos, a sociedade devedora originária foi dissolvida e a sua liquidação encerrada em 2004, cerca de quatro anos antes do termo do prazo de pagamento – cfr. ponto 3 do probatório. Por outro lado, a Administração não fez qualquer esforço instrutório tendente a demonstrar que o Oponente exercia, de facto, funções equiparadas à de gerente “quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou”, como se fundamenta no despacho de reversão. Não há, pois, qualquer facto que permita concluir, ou presumir, que o Oponente exercia tais funções em 31 de Dezembro de 2008. E, assim sendo, impõe-se concluir que não se mostra observado o ónus de prova que recaía sobre a Administração Tributária.(…)” Recorde-se que a reversão operada ao abrigo da alínea b) do nº1 do artigo 24º da LGT (como a situação dos autos) pressupõe que o gerente tenha exercido, efectivamente, o cargo ao tempo em que se verifica o termo do prazo legal de pagamento das dívidas tributárias, sendo que nessa hipótese, caberá ao revertido demonstrar e provar que não lhe é imputável a falta de pagamento. E que não há dúvidas, como tem sido jurisprudência reiterada dos Tribunais Superiores, que é à Fazenda Pública, enquanto titular do direito de reversão, que cabe fazer a prova do exercício efectivo da gerência. Recuperamos, aqui, o que se expendeu a este propósito no Acórdão do STA de 2 de Março de 2011, proferido no âmbito do processo nº 0944/10: “I - Nos termos do artigo 24.º, n.º 1, da LGT, não basta para a responsabilização das pessoas aí indicadas a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respectivas funções. II - Não existe presunção legal que imponha que, provada a gerência de direito, por provado se dê o efectivo exercício da função, na ausência de contraprova ou de prova em contrário. III - A presunção judicial, diferentemente da legal, não implica a inversão do ónus da prova. IV - Competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência.” Inexiste, pois, presunção legal que imponha que, provada a gerência de direito, se dê por provado o efectivo exercício do cargo, na ausência de contraprova ou de prova em contrário, resultando apenas uma presunção legal, mas circunscrita à culpa do administrador pela insuficiência do património da sociedade originária devedora. Ora, in casu, a sentença entendeu, face ao probatório, que não havia qualquer facto que permitisse concluir, ou presumir, que o Recorrido exercia tais funções em 31 de Dezembro de 2008, data em que terminou o pagamento voluntário da dívida. E, quanto a este aspecto, a Recorrente nada disse. O que nos leva a concluir pela falência da sua argumentação recursiva, por falta de ataque ao decidido. Assim sendo, será de negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida. * III- Decisão Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 5 de Junho de 2025 (Isabel Vaz Fernandes) (Luísa Soares) |