Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:786/10.4BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/30/2025
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
GERÊNCIA DE FACTO
PROVA
Sumário:I - A responsabilidade subsidiária dos gerentes, por dívidas da executada originária, tem por pressuposto o exercício efetivo do cargo de gerente.
II - O n.º 1 do artigo 24.º da LGT exige para responsabilização subsidiária a gerência efetiva ou de facto, ou seja, o efetivo exercício de funções de gerência, não se satisfazendo com a mera gerência nominal ou de direito.
III - O ónus da prova da gerência de facto recai sobre a Administração Tributária.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO

Vem P…, interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a oposição por si apresentada à execução fiscal n.º 3344200701019775, instaurada originariamente à sociedade “V... – Empresa de Trabalho Temporário, Unipessoal, Lda”, por dívidas de IVA, do período 2006/12T e imposto de selo do ano de 2005, no montante de € 268.353,69.

O Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“1ª – Na pronúncia em sede de audiência prévia ao despacho de reversão o Opoente alegou a) - que a estratégia de constituição da VTT, que sempre desconheceu, foi decidida pelos órgãos sociais da VCC, que acedeu a ser gerente da VTT por ser trabalhador da VCC e a pedido do Sr J..., que era o verdadeiro gestor e o “homem forte” desta e do grupo V..., o qual lhe garantiu que isso não lhe trazia qualquer responsabilidade acrescida (Artigos 2º a 6º); b) que nunca praticou actos de gerência da executada (Artigo 8º, 9º e 11º); c) - que foram sempre as pessoas que compunham os órgãos sociais da VCC (Sr J... e sua filha Dra T...) quem decidiu os actos a praticar pela VTT (Artigos 5º e 7º); d) - que em Dezembro de 2006 o Sr J... lhe tinha garantido que as dívidas iriam ser pagas pela venda do edifício de Portimão, adiante referido, uma vez que a VCC iria pagar a sua dívida à VTT (Artigo 13º); e) - que se encontrava em curso o processo de insolvência da VCC, sócia única da VTT e que para com esta tinha um débito que em 31.Março.20017 ascendia a € 785.907,16 do qual em Requerimento a esse Processo deu conhecimento ao Administrador de Insolvência e por isso devia ser aí reconhecido e graduado (Artigos 15º a 18º); f) - que esse crédito da VTT poderia nele ser paga pela venda de um terreno/edifício em Portimão (Artigos 15º a 18º); g) - que a fls 8 a 26 dos autos a Técnica Oficial de Contas (TOC) da VTT deu conhecimento das dúvidas sobre esse terreno/edifício de Portimão, requereu que por aí as Finanças podiam recuperar o seu crédito (Artigos 19º a 21º); h) - que, por já constarem do PEF elementos que tornam possível a chamada à responsabilidade dos verdadeiros responsáveis, é extemporâneo o accionamento da responsabilidade do Oponente (Artigos 22º a 24º); i) - que a responsabilidade solidária da sócia única é causa de ilegalidade da reversão, antes devendo o crédito ser reclamado no processo de insolvência (Artigo 25º); j) – requereu que no Processo de Insolvência, atenta a responsabilidade da sócia única VCC, fossem desencadeados os actos tendentes à reclamação do crédito exequendo; l) - e termina defendendo que, por não estarem reunidas as condições factuais e os requisitos legais da reversão contra o Oponente, não deve ser proferido o despacho de reversão.

2ª – Para prova dessa matéria que alegou arrolou duas Testemunhas – Dra S… (a TOC da empresa) e Dr N… (o outro gerente nomeado, constante da certidão permanente, também trabalhador do grupo V..., nomeado nos mesmos termos dele, Oponente).

3ª – Porém, que essas duas Testemunhas não prestaram depoimento no âmbito da defesa e sobre a matéria alegada pelo Oponente.

4ª – Em situação onde a Administração Tributária também não ouviu em depoimento as testemunhas arroladas na audição prévia, decidiu o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 22.Abril.2015, proferido no Proc. 0511/14, “Sendo controvertido o exercício de facto da gerência pelo potencial responsável subsidiário, a inquirição das testemunhas por ele requerida no exercício do seu direito de audiência prévia constitui “diligência complementar conveniente” (artigo 104º do CPA, subsidiariamente aplicável ao procedimento tributário), que, não tendo sido realizada sem que para tal a Administração Tributária apresente justificação, gera a anulabilidade do despacho de reversão que foi proferido”.

5ª – Mais diz na parte expositiva o mesmo aresto, “Foi, assim, preterida, sem justificação plausível, diligência complementar de instrução requerida pelo interessado, conveniente para o esclarecimento do exercício de facto da gerência na observância do princípio do contraditório (artigo 45º do CPPT), o que consubstancia violação do direito de audição prévia à reversão ou, pelo menos, impondo a lei (artigo 60º, nº 7 da LGT) que os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes sejam tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão – dever que não foi observado, desde logo porque as testemunhas não foram inquiridas – inquina o despacho de reversão de vício de forma, por deficiente fundamentação, determinante da sua anulação”.

6ª – Em consonância consigna o Acórdão também do STA de 19.Abril.2017, in Proc. 01114/16, proferido igualmente em situação onde a Administração Tributária não ouviu em depoimento as testemunhas arroladas na audição prévia, na sua parte expositiva “A prova foi ignorada pela Administração Tributária, sem qualquer justificação e os argumentos apresentados não foram rebatidos de forma nenhuma por quaisquer outros dados que a Administração Tributária dispusesse que demonstrassem a sua falta de fundamento.
O direito de audição não é uma mera perda de tempo no procedimento tributário. É uma preciosa oportunidade para a Administração Tributária, que prossegue apenas interesses de legalidade estrita, avaliar as situações concretas, tão cedo quanto possível de molde a garantir que cobra eficazmente tudo o que é devido e apenas o que é devido, seguindo um processo justo, equitativo e eficiente. Não serve apenas para que o revertido lance no papel algumas desculpas mas que se demonstre que responderá por dívidas que ele podia e devia ter conseguido pagar por recurso aos bens da originária devedora se eficazmente administrados, como é dever de qualquer gerente. Não há qualquer justificação neste processo para tomar uma decisão final sem ouvir a prova oferecida, nem foi dada qualquer explicação para esse procedimento, que é, pois, manifestamente ilegal porque desrespeitador da lei e dos direitos de defesa do revertido” - sublinhado nosso (vide também Pontos IV e V do Sumário).

7ª – A páginas 27/28 aduz a douta sentença recorrida, apreciando a não audição das testemunhas arroladas pelo Oponente, que o órgão de execução fiscal decidiu ouvir em termo de declarações N… antes de decidir pela reversão e invocou mesmo tais declarações em favor dessa decisão.

8ª – A propósito de situação similar, postula na parte expositiva o já referido Acórdão do STA de 22.Abril.2015: “Daí que, como bem aponta o Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto no seu parecer junto aos autos, o requerimento do ora recorrente de inquirição de testemunhas constituía “diligência complementar conveniente” para apurar da veracidade do alegado, não sendo substituível, sem prejuízo, pelos esclarecimentos prestados pelos outros gerentes no exercício do respectivo direito de audiência prévia, em que estão na posição de defesa dos seus próprios interesses...” – isto corroborando o defendido no Parecer do Exmo Procurador-Geral Adjunto – que acentua: “...sendo de concluir, em face do nº 3 do art. 101º do CPA subsidiariamente aplicável, ser tal pedido legítimo e não tendo sido as mesmas ouvidas pelo órgão de execução fiscal, o qual proferiu despacho de reversão, fundado em informações prestadas, em que constavam, nomeadamente, as posições em contrário dos outro gerentes...” (sublinhados nossos).

9ª – Como é bom de ver, uma coisa é inquirir as testemunhas ao que constitui a matéria de defesa apresentada pelo Oponente na sua pronúncia em audiência prévia, em relação portanto a essa matéria, outra coisa bem diferente é ouvi-las em declarações genéricas sobre o que lhes for perguntado (como sucedeu no “Termo de Declarações” de fls 87/88 do PEF, em que foi inquirido “sobre factos relacionados com a referida entidade”).

10ª – Só aquele primeiro caso, ou seja, quando a inquirição se faz em referência à matéria concreta da alegação do Oponente, é que corresponde ao verdadeiro exercício do contraditório – que, como sabemos, constitui princípio estruturante basilar de todo o procedimento, maxime do tributário (vide, por todos, art. 45º do CPPT).

11ª – Em ambos os Acórdãos atrás referidos se decidiu pela anulação do despacho de reversão. O que, entendemos, também aqui deve suceder – e se requer – já que é essa a consequência jurídica dos vícios apontados.

12ª – Como se disse, o Serviço de Finanças não ouviu as duas Testemunhas em depoimento no âmbito da defesa e sobre a matéria alegada pelo Oponente.

13ª – Vem, contudo, depois dizer no despacho de reversão (parágrafos quarto e sexto), chamando à colação, não se percebe bem como e com que intenção, o art. 74º da LGT, que “não foi apresentada qualquer prova”, apenas alegado...”, e concluir que “Não existem por isso elementos probatórios que permitam afastar a sua responsabilidade”.

14ª – Ou seja, o Opoente alega e invoca matéria factual para cuja prova indica testemunhas, o Órgão de Execução Fiscal (OEF) decide não ouvir as testemunhas indicadas – assim impedindo a prova requerida –...e depois diz que o Opoente não fez prova.

15ª – Há aqui uma contradição insanável de raciocínio, cuja consequência jurídica é também a anulação do despacho de reversão.

16ª – Como postula o Acórdão de 15.Fevereiro.2012, in Proc. 0872/11, “Por imposição do artigo 268º da CRP, dos artigos 124º e 125º do CPA e artigos 77º, 22º, nº 4 e 23º nº 4, da LGT, a reversão da execução é um acto impositivo de deveres e encargos sujeito ao dever de fundamentação. A Administração tributária está pois obrigada a indicar as razões de facto e de direito que a determinaram a reverter a execução contra o responsável subsidiário”.

17ª – Por outro lado, e como dispõe o nº 7 do art. 60º da LGT, “Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão”.

18ª – O despacho de reversão é, como se constata pela sua mera leitura, omisso quanto a quase toda a matéria factual invocada pelo Opoente na sua defesa – que preferiu, em vez de a analisar como a lei lhe impõe, decidir com base em outros elementos que aleatoriamente resolveu “eleger” de entre o que constava do processo que instruiu.

19ª – Assim, quer pela assinalada contradição de base e insanável quanto à indicação e obstaculização da prova, quer pela total ausência de análise da matéria factual alegada pelo Opoente, o despacho de reversão deve, por ser essa a consequência jurídica, ser anulado.

20ª – O art. 20º da Constituição da República Portuguesa (CRP) garante a todos o “acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva”, dispondo o nº 4 que esse direito fundamental é garantido “mediante processo equitativo”.

21ª – Constitui princípio básico e estruturante do processo o direito ao contraditório.

22ª – O órgão executivo tributário, ao decidir não ouvir as testemunhas arroladas pelo Oponente, fez uma errada interpretação e aplicação do regime legal aplicável e com isso violou o princípio do contraditório.

23ª – Por outro lado, dispõe o Artigo 268º também da Constituição, sob a epígrafe “Direitos e garantias dos administrados”, que os actos administrativos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos – como é manifestamente o caso do despacho de reversão – estão sujeitos ao dever de fundamentação expressa.

24ª – Quer pela assinalada contradição de base e insanável quanto à indicação e obstaculização da prova, quer pela total ausência de análise da matéria factual alegada pelo Opoente, o despacho de reversão violou esse comando constitucional.

25ª – Resulta do atrás exposto que o despacho de reversão não está devidamente fundamentado. Como consta do referido Acórdão do STA de 15.Fevereiro.2012, “...Repetidamente se diz que a suficiência de fundamentação é um conceito relativo, variável conforme a matéria, o tipo de acto e sobretudo as particularidades concretas de cada decisão. Todavia, para que possa cumprir as funções principais que a lei lhe comete, não pode deixar de ter capacidade para esclarecer concretamente as razões determinantes do acto, o que só acontece se for clara, congruente e suficiente”.

26ª – O despacho de reversão padece de fundamentação claramente insuficiente – que, nos termos do nº 2 do art. 125º do CPA vigente à data, equivale a falta de fundamentação.

27ª – O que, por si, é causa da sua anulação.

28ª – São, por violação dos artigos 20º, 266º e 268º da CRP, na interpretação que lhes dá a douta sentença recorrida, inconstitucionais os artigos 124º e 125º do CPA, artigos 60º, nº 7, 74º, 77º, 22º, nº 4 e 23º nº 4, da LGT.

29ª – Face aos depoimentos das Testemunhas Dra S… e M…, pela autenticidade e pela intervenção directa das mesmas nos factos em causa, proferidos nestes autos na audiência de inquirição de testemunhas e gravados no respectivo sistema áudio – nos exactos lugares e termos atrás indicados e transcritos nestas Alegações, que aqui se dão por reproduzidos – conjugados com a demais prova constante dos autos, deve ser retirada a alínea C) da matéria provada.

30ª – Ou então, se assim não se entender, que se dê mais provado o seguinte – passando a alínea C) a ser a C.1):
C.2). As funções referidas na alínea anterior já eram exercidas pelo Oponente na V... Construção Civil antes da criação da V... Trabalho Temporário, enquanto responsável dos Recursos Humanos dessa empresa, passando depois dessa criação a ser exercidas nas duas empresas nos mesmos termos e da mesma forma.
C.3). O Oponente exercia essas funções no âmbito da gestão operacional das duas empresas, quem é que ia para determinadas obras, quem é que saía quem é que entrava, sendo que depois quem decidia em última instância, quem dava a última palavra, era o Sr J....
C.4). Mesmo nessa gestão operacional em muitas situações nos Recursos Humanos achavam que trabalhadores poderiam ir para determinadas obras mas se o Sr J... não concordasse essa pessoa não ia.

31ª – Igualmente essas Testemunhas prestaram depoimentos de relevância – aliás de algum modo em complemento do que referiram quanto ao ponto anterior (uma vez que se trata da abordagem da mesma questão com enfoque em pessoas diferentes – em que as funções de um estão interligadas com as “não-funções” dos outros) sobre quem exercia efectivamente a gerência da V... Trabalho Temporário.

32ª – Conforme decorre directa e necessariamente do depoimento dessas duas Testemunhas, era o Sr J... – bem como, embora em menor grau, também a sua filha, Dra T... – quem exercia as funções de gerência da V... Trabalho Temporário, bem como aliás de todas as empresas do grupo V....

33ª – Face a esses depoimentos, também aqui pela autenticidade e pelo conhecimento e intervenção directa das Testemunhas nos factos em causa, impõe-se que a alínea E) passe a consignar aquilo que, a nosso ver, se provou no Processo, sugerindo-se a seguinte redacção em substituição da anterior:
E) Durante o período de gerência do Oponente foram o Sr J....., e a sua filha Dra T..., quem tomou as decisões de fundo, de gestão, quem exerceu a gerência da V... Trabalho Temporário, bem como de todas as empresas do grupo V....

34ª – A matéria dada por provada sob a alínea D), na parte em que refere “...angariou clientes...”, deve ser objecto de alteração pela eliminação dessa parte – aqui não só por força dos depoimentos gravados, mas pela boa análise dos demais elementos documentais constantes dos autos e do processo de execução apenso.

35ª – Com efeito, e sem prejuízo do que adiante mais se dirá sobre esta parte, o que aqui importa salientar é que a única alusão nos depoimentos em audiência foi feita pela testemunha M… (45,10 a 46,27 da gravação do seu depoimento) quando referiu “...na maior parte do tempo o Paulo tratava das questões operacionais da empresa...o arranjar os clientes...arranjar as obras...tratar da integração dos trabalhadores e de toda a parte logística que isso envolvia, quem é que vai para a obra, como, tratar do suporte todo...”.

36ª – É muito forçado o sentido dado pela douta sentença recorrida ao termo arranjar usado pela testemunha – é muito subjectivo, quiçá até tendencioso, dar-lhe o significado de angariar; mais avisado, afigura-se-nos, é tentar apreendê-lo do contexto em que é usado pela testemunha, e daí certamente se infere que arranjar significa distribuir os trabalhadores pelos clientes e pelas obras e organizar toda a parte logística, como e quem vai, como vai, etc., etc..

37ª – Havendo dúvidas, poderemos e deveremos compaginar essa parte do depoimento com o referido em declarações pela Dra S… e pelo Dr N…, nas partes transcritas nas alíneas U) e P), respectivamente – a primeira disse que “O Sr J... efectuava todos os contactos com os clientes...” e o segundo apenas aludiu, de forma abstracta e genérica (como adiante voltará a referir-se) a “...contactos estabelecidos pelo Sr P..”.

38ª – Não há assim, salvo melhor opinião, qualquer suporte fáctico, interpretativo ou lógico, que legitime fazer corresponder “arranjar” a “angariar”.

39ª – Deverá, assim, desta alínea D) ser retirada a expressão “...angariou clientes...”

40ª – Para bem se compreender a actividade funcional e administrativa das empresas de trabalho temporário – era esta a natureza da V... Trabalho Temporário – há que atentar no regime jurídico aprovado pelo Dec-Lei nº 260/2009, de 25 de Setembro.

41ª – Como dele se verifica, resulta do seu objecto social (vide arts 3º e 4º, e ainda Artigo 2º do doc. junto de fls 12 a 16) que na actividade dos Recursos Humanos duma empresa desta natureza são muitos os contratos celebrados, desde contratos de trabalho temporário (CTT) a contratos de utilização de trabalho temporário (CUTT), contratos para cedência temporária (CCT), são imensos os actos e as acções ligadas a esses contratos, aos pagamentos a eles inerentes, etc. etc..

42ª – Era essa área administrativa, de actividade documental e acompanhamento intenso, que o Oponente dirigia na V... Trabalho Temporário (a par, como se provou, também da V... Construção Civil).

43ª – Era no desenvolvimento dessa actividade, enquanto responsável pelos Recursos Humanos, que o Oponente praticava os actos de “contratação, gestão e despedimento de trabalhadores” referidos na alínea C) da matéria dada por provada – que são actos correntes, digamos mesmo os mais frequentes, da empresa que desenvolve tal actividade.

44ª – Sendo assim, como é, tem essa actividade que ser entendida no seu devido contexto, que é o atrás descrito – e não, como de forma a nosso ver incorrectamente abstracta e sem ter em conta o circunstancialismo relevante, a douta sentença recorrida faz.

45ª – E, vista nesse contexto real e efectivo, no caso dos autos há que concluir que essa actividade tem carácter marcadamente administrativo, instrumental, funcional, e nada tem a ver com a prática de actos de gerência da empresa.

46ª – Quanto a trabalhadores do quadro da V... Trabalho Temporário, a única coisa atestada nos autos é que quem convidou e admitiu a Dra S… como Contabilista foram o Sr J... e a Dra T... (vide declarações por ela prestadas no Serviço de Finanças, de fls...).

47ª – Diz a douta sentença recorrida “Factos que foram confirmados pelas declarações prestadas junto do órgão de execução fiscal por N… e S…, e pelo depoimento desta e de M…, como testemunhas nos presentes autos”.

48ª – Quanto aos depoimentos da Dra S… e M.. enquanto Testemunhas neste Processo já atrás nos debruçámos – pelo que, sendo-nos permitido, remetemos para essa alegação.

49ª – Reportemo-nos então, e não se leve a mal que o façamos com alguma minúcia, às conclusões tiradas pela sentença e às declarações prestadas junto do órgão de execução fiscal pelo Dr N… e pela Dra S….

50ª – Procurando sustentar a conclusão que assume de não se confirmar que o Oponente não tenha assumido compromissos nem participado na tomada de decisões necessárias para a condução da vida e administração da sociedade, consigna a sentença recorrida que resulta das declarações de Nuno Miguel de Sousa Alexandre junto do órgão de execução fiscal a que o Oponente “procedeu à negociação com clientes” (vide páginas 24 e 26 da sentença).

51ª – Porém, analisadas essas declarações (fls 69/70 dos autos), delas apenas consta que “quem efectuava as compras e quem decidia as vendas ou serviços prestados, dada a integração da executada no grupo, decorria da própria actividade da V..., SA, sem prejuízo da análise e decisões noutras situações ou por solicitações externas ou decorrentes da actividade comercial da V... SA ou de contactos estabelecidos pelo Sr P… (bold nosso)”.

52ª – Ou seja, o declarante em causa apenas alude, de forma genérica e abstracta, e sem qualquer objectivação, a contactos estabelecidos pelo Sr P… mas sem os concretizar ou dizer de que natureza e com quem eram esses contactos.

53ª – Assim, é manifestamente exagerada e sem apoio fáctico a conclusão da douta sentença recorrida de que o Oponente procedeu à negociação com clientes – bem como está viciado o raciocínio daí inferido de que essas declarações confirmam a prática de actos de gestão pelo mesmo.

54ª – Deve, assim, essa parte ser tida por não escrita.

55ª – Em contraponto – e que aliás está em total consonância com a demais prova constante dos autos, mormente a produzida testemunhalmente em julgamento – o que deve ser relevado (e a sentença não o fez...) é o seguinte, que consta expressamente desse mesmo depoimento: “Questionado se houve outras pessoas, inclusive não sócios, que praticaram actos de gerência sem que tivessem sido nomeados gerentes em acta ou contrato de sociedade referiu que a sua actuação esteve sempre condicionada às instruções recebidas pelos administradores da V... Estrutura para Betão e Construção Civil SA, os quais definiam o âmbito de actuação da executada” (bold e sublinhado nossos).

56ª – Isso sim, deveria ser relevado pela douta sentença recorrida – porque de interesse decisivo para a questão.

57ª – Aludindo à matéria que considera provada nas alíneas C) e D) diz a douta sentença recorrida (vide páginas 24/25) que “...de resto, o Oponente não coloca em causa estes factos, antes pelo contrário, referindo mesmo no artigo 10º da sua petição inicial que assinou documentos relativos à sociedade devedora originária”.

58ª – Com o devido respeito, isso não corresponde à verdade

59ª – O Opoente disse e alegou muito claramente que nunca praticou actos de gerência da executada (vide Artigo 8º), nunca foi gerente de facto da Executada (vide Artigo 11º), foram sempre as pessoas que compunham os órgãos sociais da V... Construção Civil quem decidiu os actos a praticar pela Executada (vide Artigo 7º).

60ª – É certo que o Opoente também alegou (vide Artigo 10º) que se limitou a assinar os documentos que, pelas pessoas responsáveis da V..., lhe eram para isso apresentados.

61ª – Mas nessa parte o que o Oponente alegou é precisamente aquilo que a sentença recorrida acolhe em particular na sua página 25 – ou seja, parafraseando a sentença, “O mero gerente de direito pode praticar actos formais de gerência; fazendo-o, porém, na dependência do gerente efectivo que lhe determina a oportunidade, o que, o como e o quando fazer. A sua função esgota-se nas assinaturas e não pode (porque não tem o poder) ir para além disso. Assim, admite-se que se o gerente se limite a assinar documentos que o verdadeiro gerente de facto lhe diz para assinar, e não tem qualquer controlo sobre os destinos da sociedade, ou seja, não compra, não vende, não contrata, nada sabe sobre o assunto, sendo tudo decidido por quem efectivamente administra a sociedade, não se pode considerar aquele gerente um gerente de facto para efeitos do disposto no artigo 24º da LGT”.

62ª – Portanto, a assinatura de documentos que o Opoente refere insere-se precisamente nesse contexto e, nos próprios termos em que é acolhido na douta sentença recorrida, nada tem a ver com o exercício de poderes de gerência.

63ª – Em sustentação ainda desse mesmo raciocínio refere a douta sentença recorrida as declarações da Dra S… junto do órgão de execução fiscal, a fls 79/81 dos autos, e delas retira a referência a dois episódios (um referente a uma factura com incorrecções e outro a um pagamento de IVA) que, na sua tese, demonstrariam que afinal o Oponente não se limitava a assinar documentos e nada mandava.

64ª – Lendo essas declarações da Dra S… verifica-se que o sentido com que se referiu a esses dois casos, aliás episódicos, o primeiro sem concretização em particular temporal e o segundo temporalizado no primeiro trimestre de 2007 (o que desde logo torna muito duvidosa qualquer conclusão alcançada, uma vez que ocorreu na altura da “confusão” em que os responsáveis já tinham fugido e não apareciam a ninguém, como sem papas na língua disseram todas as testemunhas e declarantes) é precisamente o contrário do que foi acolhido na douta sentença – ou seja, e basta ler as suas declarações na íntegra para o compreender, o que ela acentua é que no final quem decidia era a Dra T... e não o Oponente.

65ª – Entendemos, assim, que a conclusão de que o Oponente exerceu actos de gerência deriva de uma errada análise da prova constante dos autos, quer documental quer das declarações constantes do processo de execução no órgão de administração tributária e das produzidas em julgamento.

66ª – O Opoente foi considerado responsável e contra ele se reverteu a dívida, quando N… não o foi e contra ele o OEF não reverteu a dívida – tendo assim, em violação do princípio da igualdade, decidido duas questões rigorosamente iguais de modo diferente.

67ª – A douta sentença recorrida decide essa questão pela improcedência com o fundamento, em síntese, de se tratar de situações diferentes e por isso merecedoras de enquadramento legal diferenciado.

68ª – Discordamos. Resulta claramente provado que o aqui Opoente e N… foram ambos convidados pelo Sr J... para serem os gerentes da devedora originária, a VTT, ambos aceitaram e ambos agiram da mesma forma, o primeiro nos recursos humanos e o segundo na área financeira, ambos abandonaram a empresa por iniciativa própria – N… em 5.Janeiro.2007 e Paulo Amaro em 28.Março.2007.

69ª – É essa a única diferença entre ambos – o Oponente ainda era gerente à data do fim do prazo legal de pagamento do IVA e N… já não era.

70ª – Nos termos do nº 1 do art. 24º da LGT ambos são responsáveis desde que a falta de pagamento seja por culpa sua – resultando das alíneas a) e b) uma diferença ao nível do ónus da prova (enquanto no primeiro caso cabe à Administração provar a culpa do Contribuinte, no seguindo é este que tem que provar não ter culpa).

71ª – Trata-se de uma diferença meramente adjectiva e não substancial – ou seja, na sua essência, substancialmente, a situação é igual, porém ao nível da sua aferição, da sua prova, as regras processuais são diferentes.

72ª – Perante situações substancialmente iguais o Estado não pode bastar-se com a mera maior dificuldade de prova de um dos contribuintes para daí retirar a consequência de lhe exigir o que não exige ao outro porque, confessadamente, diz não ter elementos para provar quanto a ele.

73ª – Porque as situações são iguais, as decisões também têm que o ser. Porque assim não foi, foram violados os princípios da igualdade, da imparcialidade e da justiça, princípios basilares do estado de direito de dignidade constitucional – art. 266º da CRP.

74ª – Ao decidir como decidiu violou a douta sentença recorrida as normas legais atrás invocadas em relação a cada situação, em particular os artigos 45º, 46º, 50º do CPPT, números 3, 4 e 5 do art. 607º do CPC, 22º, 23º, 24º, 60º nº 7, 77º, da LGT, 101º-3, 104º, 124º 125º do CPA vigente à data, bem como as regras de apreciação da prova. Fez também errada interpretação e aplicação dos artigos124º e 125º do CPA, artigos 60º, nº 7, 74º, 77º, 22º, nº 4 e 23º nº 4, da LGT. 23º, nº 4, da Lei Geral Tributária, em desrespeito dos artigos 20º, 266º e 268º da CRP.

Termos em que, e com o mais de douto suprimento, deve ser concedido provimento ao presente recurso com todas as consequências daí advindas, em particular ser anulado o despacho de reversão e declarado nulo tudo o processado a partir daí. Deve, por outro lado e porque o Opoente não exerceu, de facto, actos de gerência da sociedade devedora originária, ser o mesmo declarado parte ilegítima na execução.”
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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A Exmª. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do recurso apresentado.
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Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações do Recorrente, importa decidir se a sentença enferma de:
i) erro de julgamento de facto por a sentença não ter considerado todos os factos relevantes para a decisão;
ii) erro de julgamento de direito ao ter decidido que o despacho de reversão não padece de falta de fundamentação e que o Recorrente é parte legítima na execução fiscal por considerar que ficou provada a gerência de facto.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Com interesse para a decisão a proferir, o Tribunal considera provados os seguintes factos:

A) Pelo averbamento da inscrição ap. 37, de 24.11.2004, foi registada na Conservatória de Registo Comercial de Lisboa a constituição da sociedade por quotas denominada V... – Empresa de Trabalho Temporário, Unipessoal, Lda, sendo sócio único a sociedade V... – Estruturas para Betão e Construção Civil, S.A., bem como a designação do ora Oponente e de N… como gerentes da referida sociedade (cfr. certidão junta a fls. 46 a 48 dos autos e 37 a 41 do processo de execução apenso aos autos);

B) A sociedade identificada em A) obrigava-se pela assinatura de dois gerentes, (cfr. certidão junta a fls. 46 a 48 dos autos e 37 a 41 do processo de execução apenso aos autos);

C) Durante o seu período de gerência, o Oponente era o responsável pela contratação, afectação e despedimento de trabalhadores da sociedade identificada em A) supra (cfr. declarações de N… junto do órgão de execução fiscal, a fls. 69-70 dos autos e fls. 87-88 verso do processo de execução fiscal apenso, e depoimento nos autos da testemunha M…);

D) O ora Oponente, durante o seu período de gerência, assinou cheques, efectuou pagamentos, designadamente de IVA, angariou clientes e assinou documentos relativos à sociedade identificada em A) supra (cfr. declarações de S… junto do órgão de execução fiscal, a fls. 79 a 81 dos autos e fls. 160 e 162 do processo de execução apenso, e depoimento da mesma e de M… nos autos, bem como o alegado pelo Oponente no artigo 10º da P.I.);

E) Durante o seu período de gerência da sociedade identificada em A), o Oponente recebia directrizes e orientações do Sr. J... (cfr. declarações de S… junto do órgão de execução fiscal, a fls. 79 a 81 dos autos e fls. 160 e 162 do processo de execução apenso, e depoimento da mesma e de M… nos presentes autos);

F) O ora Oponente remeteu à sociedade identificada em A) supra carta datada de 28.03.2007, recepcionada por aquela sociedade em 02.04.2007, na qual, sob o assunto “Renuncia à gerência”, se comunica o seguinte:
“(…)
Venho, por este meio, apresentar a minha renúncia de gerente da sociedade VTT, nos termos do n.º l do art.° 258° do Código das Sociedades Comerciais.
A presente renúncia deve ser considerada efectiva, oito dias depois da recepção da presente carta.
A causa da minha renúncia prende-se com o atraso no pagamento das facturas da V..., Lda,, quotista da VTT, que gerou um problema de tesouraria, impossibilitando o cumprimento das suas obrigações.
(…)” (cfr. documento de fls. 21 dos autos e fls. 79 do processo de execução apenso);

G) O ora Oponente remeteu à sociedade identificada em A) supra carta datada de 02.04.2007, na mesma data recepcionada por aquela sociedade, na qual, sob o assunto “Rescisão de Contrato”, declarava rescindir o contrato de trabalho celebrado com a sociedade, sendo o último dia de prestação de trabalho o dia 02.06.2007 (cfr. documento de fls. 22 dos autos e fls. 85 do processo de execução apenso);

H) Consta do balancete da sociedade mencionada na alínea A), a 31.03.2007, um crédito desta sociedade relativamente à sociedade V... – Estruturas para Betão e Construção Civil, S.A., no valor de 785.907,16 EUR (cfr. documento de fls. 25 a 29 dos autos e fls. 80 a 84 do processo de execução apenso);

I) Foram instaurados contra a sociedade identificada em A), pelo Serviço de Finanças de Lisboa 11, os seguintes processos de execução fiscal, entretanto apensos:
1. Processo n.º 3344200701019775, instaurado em 15.04.2007, por dívida de IVA do período 2006/12T, no valor de 268.328,69 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 15.02.2007;
2. Processo n.º 3344200801152025, instaurado em 07.12.2008, por dívida de imposto de selo do ano de 2005, no valor de 25,00 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.01.2006;
(cfr. documentos de fls. 5 dos autos e fls. 1 e 2 do processo de execução apenso);

J) Em 14.01.2008, foi elaborado auto de diligências por funcionário do Serviço de Finanças de Lisboa 11, do qual consta que, tendo-se deslocado à sede da sociedade identificada em A) supra, não foi possível cumprir mandato de penhora “por não encontrarmos bens alguns nem nos constar que os possua em qualquer outra parte” (cfr. documentos de fls. 33 do processo de execução apenso);

K) Por sentença proferida em 12.05.2008, foi declarada a insolvência da sociedade V... – Estruturas para Betão e Construção Civil, S.A., mencionada em A) supra (cfr. certidão junta a fls. 90 a 92 verso do processo de execução apenso);

L) Tendo o Serviço de Finanças de Lisboa 11 efectuado, em 25.02.2009, consulta ao Cadastro Electrónico de Activos Penhoráveis, da base de dados da Administração Tributária e Aduaneira, desta consulta resultou a ausência de prédios, viaturas e “outros valores ou rendimentos” em nome da sociedade identificada em A) supra e o reconhecimento de dois créditos daquela sociedade, no valor total de 12.037,22 EUR (cfr. documentos de fls. 43 a 47 do processo de execução fiscal apenso);

M) Em 25.02.2009, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 11, denominado de “despacho para audição (reversão)”, no qual determinou a notificação do ora Oponente para efeitos de exercício do direito de audição prévia à reversão da execução identificada em I) supra (cfr. documento de fls. 50 do processo de execução fiscal apenso);

N) Notificado para o efeito, o Oponente apresentou, em 17.03.2009, no Serviço de Finanças de Lisboa 11, requerimento onde exerceu o direito de audição prévia à reversão, alegando não estarem reunidas as condições factuais e os requisitos legais para determinar a reversão contra si da dívida exequenda, e que devem ser desencadeados no processo de insolvência da sociedade V... − Estruturas para Betão e Construção Civil, S.A. (processo n.º 772/07.1TYLSB) os actos tendentes à reclamação do crédito exequendo com vista ao seu pagamento, face às responsabilidades da insolvente perante a executada, bem como à sua responsabilidade solidária enquanto sócia única (cfr. documento de fls. 66 a 68 verso do processo de execução fiscal apenso);

O) No requerimento mencionado na alínea anterior o Oponente arrolou como testemunhas S…, ex-técnica oficial de contas/contabilista certificada da sociedade identificada em A), e N…, anterior gerente daquela sociedade (cfr. documento de fls. 66 a 68 verso do processo de execução fiscal apenso);

P) Em 17.04.2009, no âmbito dos processos de execução identificados em I) supra, prestou declarações N…, nos termos constantes de termo de declarações que a seguir parcialmente se reproduz:
“(…)
Questionado se houve outras pessoas, inclusive não sócios, que praticaram actos de gerência sem que tivessem sido nomeados gerentes em acta ou contrato de sociedade referiu que a sua actuação esteve sempre condicionada às instruções recebidas pelos administradores da V... ESTRUTURA PARA BETÃO E CONSTRUÇÃO CIVIL SA, os quais definiam o âmbito de actuação da executada.
Identificou como as pessoas que lhe dava ordens e instruções o Senhor J... e T....
(…)
Questionado sobre:
Quem procedia à admissão de pessoal e ao seu despedimento disse ser o Sr Paulo José Grilo Amaro.
Quem efectuava as compras e quem decidia as vendas ou serviços prestados, dada a integração da executada no grupo, decorria da própria actividade da V... SA, sem prejuízo da análise e decisão noutras situações ou por solicitações externas ou decorrentes da actividade comercial da V… SA ou de contactos estabelecidos pelo Sr P… .
(…)
No que concerne ao controlo dos pagamentos do IVA e demais impostos declarou que no período que geriu tinha um acompanhamento juntamente com a área administrativa da V... SA do controlo das importâncias que eram devidas e o respectivo pagamento. (…)”.
(cfr. documento de fls. 69-70 dos autos e fls. 87-88 verso do processo de execução fiscal apenso);

Q) Em 29.04.2009, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 11 despacho de reversão contra o ora Oponente da execução fiscal identificada em I) supra, com o seguinte teor:
“(…)


(…)” (cfr. documento de fls. 71-72 dos autos e fls. 98-99 do processo de execução fiscal apenso);

R) No seguimento do despacho mencionado em Q) que antecede, foi remetido ao Oponente, por carta registada com aviso de recepção, o designado ofício de “CITAÇÃO (Reversão)”, recepcionado em 07.05.2009 (cfr. ofício de citação e aviso de recepção juntos a fls. 73-74 dos autos e fls. 105 e 105 verso do processo de execução apenso);

S) Ainda em 29.04.2009, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 11 despacho de reversão do processo identificado no ponto 2 da alínea I) supra contra N…, com o seguinte teor:
“(…)
De acordo com os elementos junto aos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, tendo em conta a informação supra verifica-se que o contribuinte supra identificado foi notificado para exercer o direito de audição prévia nos termos do artigo 60° da LGT do projecto de decisão de responsável subsidiário da devedora originara V... EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO UNIPESSOAL LDA - contribuinte 5…, por dividas que ascendem a € 378 050.13.
De acordo com os elementos ora juntos, o contribuinte renunciou a gerência em 2007.01.05.
Existem dois momentos relevantes para a constituição da responsabilidade subsidiaria a saber, o momento de formação do facto tributário, que está na origem da dívida e o momento da obrigação de pagamento, pelo que, considerando o(s) período(s) aqui em causa temos como enquadramento(s) legal(is).
1. Relativamente ao facto tributário:
Verifica-se que o facto tributário - IVA do período 200512T 200703T e infracções praticadas - ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributaria (LGT) assim, nos termos da alínea a) do nº 1 do seu artº 24º os gerentes e administradores serão subsidiariamente responsáveis pelas dívidas da sociedade, mediante prova de culpa a efectivar pela Administração Tributaria. Como não dispõe este Serviço de Finanças de elementos que permitam concretizar a referida prova não é possível efectivar s responsabilidade latente. Tanto mais que face aos elementos carreados, a mesma não teria qualquer sustentação.
2. Relativamente à obrigação de pagamento:
Verifica-se que a obrigação de pagamento ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributaria (LGT) assim, nos termos da alínea b) do nº 1 do seu artº 24.°, os gerentes e administradores que exerçam, ainda que somente de facto, funções de gestão em pessoas colectivas ou equiparadas serão subsidiariamente responsáveis pelas dividas tributárias cujo prazo legal de pagamento tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Estando provado que o mesmo exerceu a gerência até 2007.01.05, em 2006.01. 21, data limite de pagamento da Retenção na Fonte de Imposto de Selo relativa ao período 2005/12, o mesmo não poderá deixar de ser responsabilizado.
Da análise à prova produzida tendo em consideração os requisitos legais e em face das diligências que antecedem nomeadamente da consulta à base de dados do Cadastro Electrónico de Activos Penhoráveis (CEAP) e Sistema Informático de Penhoras Automáticas (SIPA) não existem quaisquer bens susceptíveis de penhora.
Não havendo bens da devedora originária que respondam pelo pagamento da divida estão pois verificadas as condições previstas nos termos do nc 2 do art.º 153° do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) para: chamamento à execução, dos responsáveis subsidiários, de acordo com a legislação em vigor no momento do exercício do seu cargo e no momento de constituição de responsabilidade revertendo assim contra estes a execução.
Em consequência, conjugando todo o exposto e demais probatório existente, verifica-se
- Fundamento da reversão - Inexistência de bens penhoráveis da devedora originária (nº 2 do art 153° do CPPT
- Gerência - Desde a data da constituição até 2007 01 05 conforme certidão de registo da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, no Sistema de Gestão de Contribuintes (SGRC) e Termo de Declarações
- Certidões de dívida (menção dos períodos em concreto) - Todas as certidões de divida contêm os períodos e as datas limite de pagamento a que as mesmas se referem
- Caducidade das liquidações, eventuais prescrições e da execução do património da originária devedora – As liquidações transitaram em julgado antes da caducidade e a devedora originária já não possui património.
Atenta a fundamentação supra, nos termos dos artigos 23° e 24º da LGT, REVERTO as dívidas exigíveis no presente processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário N… contribuinte 2…, no montante de € 25.00
(…)” (cfr. documento de fls. 97 do processo de execução fiscal apenso);

T) Em 08.06.2009, o Oponente apresentou a presente oposição;

U) Em 29.10.2009, no âmbito dos processos de execução identificados em I) supra, prestou declarações S…, na qualidade de técnica oficial de contas/contabilista certificada da sociedade identificada em A) supra, nos termos constantes de termo de declarações que a seguir parcialmente se reproduz:
“(…)
Questionada sobre qual a relação profissional que tinha com a executada, respondeu que exercia as funções de TOC, desde a sua constituição até à sua renúncia em 2007/04/27 (…).
Questionada sobre quem exercia as funções de gerente/administrador, declarou que eram o Sr. J... e a Srª T…. Declarou que o mentor das empresas V... era o Sr. J... e quando este teve problemas relacionados com o levantamento de processo de uma outra empresa no Porto, a Dobraço II, Lda, da qual era director comercial, a Srª T..., filha daquele, começou a ser mais activa e interveniente na tomada de decisões. (…). Tem conhecimento que os Senhores P…. e o N… foram convidados pelo Sr. J... para serem gerentes da executada V..., Lda e que estes aceitaram em virtude de temerem pelo seu posto de trabalho, pois eram trabalhadores dependentes da única sócia, V..., SA.
(…)
Questionada sobre quem era responsável pelo controlo dos pagamentos de IVA e demais impostos, referiu que a Srª T... definia o que é que se pagava e a quem, sendo que as assinaturas utilizadas, para cheques e passwords para transferências bancárias (que eram mais frequentes) eram sempre dos Srs Paulo Amaro e Nuno Alexandre.
Questionada onde exercia as suas funções de TOC, respondeu que era na sede das empresas V..., que era a mesma.
(…)
Questionada se houve outras pessoas, inclusive não sócios, que praticaram actos de gerência sem que tivessem sido nomeados gerentes em acta ou contrato de sociedade referiu que o Sr. J... e a sua filha T... definiam praticamente na íntegra a actuação da empresa. Apesar de seguir as instruções do pai, a Srª T... exercia autonomamente a gerência da empresa, havendo até algumas incompatibilidades com o pai. O Sr. J... efectuava todos os contactos com os clientes e com os fornecedores; com estes últimos, quando não havia mais dinheiro, deixava para os gerentes designados os referidos contactos, pois quando não havia dinheiro para todos os pagamentos, o Sr. J… afastava-se das empresas. Sabia que os fornecedores da zona de residência da família M… eram pagos mais frequentemente que os outros, havia esse cuidado.
Referiu também um episódio que se recorda: no exercício das suas funções, deu conta de uma factura que tinha incorrecções e que contabilisticamente não podia ser aceite para deduzir o IVA; falou nisso ao Sr. P… que lhe disse que contabilizasse a factura (pois era de montante relevante) porque era ele que mandava. Como não gostou da resposta, entregou uma carta ao Sr. P… a desvincular-se da empresa como TOC e no dia seguinte a Srª T... ligou-lhe a dizer que continuasse na empresa e a dizer que o Sr. P… não mandava nada, para falar com ela sempre que precisasse.
Referiu também outro episódio: a determinada altura havia dinheiro guardado para pagamento aos trabalhadores, mas o Sr. P…, inquietante com as dívidas de montante elevado, a nível de IVA, efectuou um pagamento de €60.000,00 na declaração periódica do IVA do 1° trimestre de 2007, à revelia da Sr. T..., a qual demonstrou a sua total discordância e oposição quando tomou conhecimento desse pagamento.
Questionada sobre se conhecia da existência de bens/activos na altura em que exerceu funções, respondeu que desconhece a existência de bens da executada.
Questionada sobre como se encontrava a situação financeira da executada, tem conhecimento que a mesma tinha créditos de elevado montante perante a V..., SA, única sócia. (…)”
(cfr. documento de fls. 79 a 81 dos autos e fls. 160 e 162 do processo de execução apenso)”
*
Factos não provados:
“Não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão.”
*
Motivação da decisão de facto:
“Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e do processo de execução apenso, não impugnados, bem como nos depoimentos das testemunhas S… e M…, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
O facto dado como provado na alínea C) do probatório, foi confirmado pelas declarações prestadas por N…, gerente da devedora originária conjuntamente com o Oponente, junto do órgão de execução fiscal, reproduzidas em P) da factualidade assente supra, que afirmou que era o Oponente quem procedia à admissão de pessoal e ao seu despedimento. Neste mesmo sentido, confluiu o depoimento da testemunha M…, funcionária da sociedade devedora originária nos anos a que se reportam as dívidas, a qual declarou que o Oponente era o responsável pelas questões operacionais, relativas à gestão de recursos humanos e gestão do trabalho.
Quanto ao facto dado como provado em D) da factualidade assente, na verdade, o próprio Oponente admite ter assinado documentos relativos à sociedade (cfr. artigo 10º da petição inicial), obviamente, em sua representação (ainda que ressalvando que não era o mesmo que tomava as decisões relevantes da sociedade, mas antes o Sr. J... Machaqueiro de Sousa).
Sendo que é claramente afirmado pela contabilista certificada da devedora originária nos anos a que se reportam as dívidas em cobrança, S…, quer nas suas declarações efectuadas no âmbito do processo de execução fiscal em referência, parcialmente reproduzidas na alínea U) da factualidade assente supra, quer no depoimento que efectuou nos presentes autos, declarando que o Oponente efectuou pagamentos, nomeadamente a funcionários, bem como de IVA devido ao Estado, tendo assinado cheques.
Tendo a testemunha M… declarado expressamente que o Oponente era quem tratava das questões operacionais, angariando clientes e obras onde colocar o pessoal da sociedade devedora originária.
Das declarações de N… junto do órgão de execução fiscal também se retira a prática pelo Oponente de contactos com clientes ou potenciais clientes da sociedade devedora originária.
No que concerne ao facto dado como provado na alínea E) da factualidade assente, o mesmo é confirmado pelas declarações produzidas por S…, seja no âmbito do processo de execução fiscal em referência, seja no depoimento que efectuou nos presentes autos, bem como no depoimento de M…. Tendo aquela afirmado expressamente no seu depoimento que o Sr. J... dava directrizes ao Oponente relativas ao exercício pelo mesmo da gerência da sociedade. Tendo também a testemunha M… feito referência ao recebimento pelo Oponente de orientações/instruções daquela identificada pessoa e à sua influência nas decisões do Oponente.
Salienta-se que, tanto quanto a este facto, como aos factos dados como provados em C) e D) do probatório, foi relevada a credibilidade dos depoimentos/declarações aqui mencionados, bem como o facto de as referidas testemunhas, face às suas funções na referida sociedade devedora originária, terem um conhecimento privilegiado e directo dos referidos factos.”

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

O Tribunal Tributário de Lisboa julgou improcedente a oposição à execução fiscal deduzida pelo Recorrente no âmbito do processo de execução fiscal nº 3344200701019775 e apensos, tendo para o efeito considerado que o despacho de reversão não padecia de falta de fundamentação, e que o oponente era parte legítima no referido processo de execução fiscal por estar provada a gerência de facto da sociedade devedora originária.

Discordando do assim decidido vem o Oponente/Recorrente invocar erro de julgamento de facto e de direito, pedindo em conclusão seja concedido provimento ao recurso, alterada a matéria de facto nos termos peticionados e seja considerado parte ilegítima na execução fiscal por não ter sido provada a gerência de facto da sociedade devedor originária.

Alega o Recorrente erro de julgamento de facto, tendo cumprido os requisitos previstos no art. 640º do CPC quanto à impugnação da matéria de facto, pelo que, ouvidos os depoimentos das testemunhas, importa decidir sobre a alteração do probatório nos termos peticionados:
i) Eliminação da alínea C) da matéria de facto e que tem o seguinte teor:
C) Durante o seu período de gerência, o Oponente era o responsável pela contratação, afectação e despedimento de trabalhadores da sociedade identificada em A) supra (cfr. declarações de N… junto do órgão de execução fiscal, a fls. 69-70 dos autos e fls. 87-88 verso do processo de execução fiscal apenso, e depoimento nos autos da testemunha Margarida Alexandre Fernandes Xavier).”.

O Recorrente pretende a eliminação desta alínea do probatório, face aos depoimentos das testemunhas, conjugados com os demais elementos de prova.
Ouvidos os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas, não vimos razão para a eliminação desta alínea porquanto a factualidade nela descrita foi mencionada de forma objetiva e assertiva pelas testemunhas, não nos suscitando quaisquer dúvidas de que, o que consta da alínea C) corresponde ao que foi dito em sede de audiência perante o tribunal a quo. Importa salientar que a prova dos factos nela constantes fundou-se, não só nos depoimentos prestados perante o tribunal, como também nos depoimentos prestados perante a AT, como se refere na motivação da matéria de facto constante da sentença recorrida ao mencionar: O facto dado como provado na alínea C) do probatório, foi confirmado pelas declarações prestadas por N…, gerente da devedora originária conjuntamente com o Oponente, junto do órgão de execução fiscal, reproduzidas em P) da factualidade assente supra, que afirmou que era o Oponente o responsável pela admissão de pessoal e ao seu despedimento. Neste mesmo sentido, confluiu o depoimento da testemunha M…, funcionária da sociedade devedora originária nos anos a que se reportam as dívidas, a qual declarou que o Oponente era o responsável pelas questões operacionais, relativas à gestão de recursos humanos e gestão do trabalho.
Face ao exposto improcede a pretendida eliminação da alínea C) do probatório.

ii) Do aditamento das alíneas C2), C3) e C4)
O Recorrente, na eventualidade de não ser aceite o pedido de eliminação da alínea C) do probatório, requer que esta passe a figurar como C1) e que sejam aditados mais 3 factos, que passariam a constar das novas alíneas C2), C3) e C4).

O Recorrente pretende o aditamento de factos com o seguinte teor:
“C.2). As funções referidas na alínea anterior já eram exercidas pelo Oponente na V... Construção Civil antes da criação da V... Trabalho Temporário, enquanto responsável dos Recursos Humanos dessa empresa, passando depois dessa criação a ser exercidas nas duas empresas nos mesmos termos e da mesma forma.
C.3). O Oponente exercia essas funções no âmbito da gestão operacional das duas empresas, quem é que ia para determinadas obras, quem é que saía quem é que entrava, sendo que depois quem decidia em última instância, quem dava a última palavra, era o Sr J....
C.4). Mesmo nessa gestão operacional em muitas situações nos Recursos Humanos achavam que trabalhadores poderiam ir para determinadas obras mas se o Sr J... não mandasse essa pessoa não ia.”

Quanto ao facto C2) que o Recorrente pretende aditar, não vimos qualquer relevância no seu aditamento porquanto o que releva são as funções exercidas na devedora originária e não em qualquer outra empresa, razão pela qual se indefere o requerido aditamento.

Relativamente aos factos pretendidos aditar denominados C3) e C4) considera este Tribunal que do depoimento das testemunhas inquiridas não se retira, exatamente, o que neles vem mencionado. Na verdade, da menção feita pelas testemunhas que a última palavra era do Sr. J…, não se retira que fosse sempre assim, ou seja, que em todas as decisões tomadas pelo Recorrente, a decisão final era do Sr. J…. Assim, indefere-se o requerido aditamento ao probatório.

iii) Quanto à alínea E)
A sentença recorrida deu como provado o seguinte facto, constante da alínea E) do probatório:
“E) Durante o seu período de gerência da sociedade identificada em A), o Oponente recebia directrizes e orientações do Sr. J... (cfr. declarações de S… junto do órgão de execução fiscal, a fls. 79 a 81 dos autos e fls. 160 e 162 do processo de execução apenso, e depoimento da mesma e de M… nos presentes autos)”.

Pretende o Recorrente que seja alterado o conteúdo da alínea E) por forma a dela passar a constar o seguinte:
E) Durante o período de gerência do Oponente foram o Sr J..., e a sua filha Dra T..., quem tomou as decisões de fundo, de gestão, que, exerceu a gerência da V... Trabalho Temporário, bem como de todas as empresas do grupo V....”

Não podemos concordar com a pretensão do Recorrente, uma vez que do depoimento das testemunhas inquiridas não resulta o que pretende que passe a constar da alínea E). O que se sabe é que o Sr. J… tomou decisões relativamente à sociedade devedora originária, mas não que tomou todas as decisões. Foi isso que a sentença deu como provado, pelo que se indefere a alteração da alínea E) do probatório.

Pretende ainda o Recorrente, quanto à alínea D) do probatório, a eliminação da expressão “angariou clientes”, com base nos depoimentos e demais prova.

A sentença recorrida deu como provado o seguinte facto, constante da alínea D) do probatório:
D) O ora Oponente, durante o seu período de gerência, assinou cheques, efectuou pagamentos, designadamente de IVA, angariou clientes e assinou documentos relativos à sociedade identificada em A) supra (cfr. declarações de Sónia Marisa Costa Fragueira junto do órgão de execução fiscal, a fls. 79 a 81 dos autos e fls. 160 e 162 do processo de execução apenso, e depoimento da mesma e de M… nos autos, bem como o alegado pelo Oponente no artigo 10º da P.I.)”
Ouvidos os depoimentos das testemunhas, por elas foi dito que o oponente “arranjava clientes”, no sentido de que procurava clientes, pelo que não vislumbramos razão para ser eliminada da alínea D) a expressão “angariava clientes”.

Em face do exposto improcede o alegado erro de julgamento de facto.

Estabilizada a matéria de facto, prossigamos.

Vem o Recorrente alegar fundamentação insuficiente do despacho de reversão, por, em seu entender, existir “quer pela contradição de base e insanável quanto à indicação e obstaculização da prova, quer pela total ausência de análise da matéria factual alegada pelo oponente” (cfr. conclusão 24ª das alegações) .

Decidindo.

O dever de fundamentação do despacho de reversão decorre do princípio constitucionalmente consagrado, no art.º 268.º, n.º 3, da CRP, nos termos do qual “Os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos.”.

A fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, para que o respetivo destinatário consiga perceber o iter cognoscitivo e para que, por outro lado, seja possível o controlo, quer administrativo, quer jurisdicional, do ato em causa.

Deve ser clara, expressa, congruente e suficiente, de maneira a esclarecer inteiramente o seu destinatário, cumprindo, dessa forma, o desiderato constitucionalmente consagrado.

Sobre a fundamentação do despacho de reversão importa referir a jurisprudência do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, que no seu Acórdão de 16/10/2013, recurso 0458/13, refere o seguinte:
“De acordo com o disposto no nº 1 do art. 23º da LGT, a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal, sendo o despacho que a ordena (despacho de reversão) o acto que dá início ao procedimento para efectivação da responsabilidade subsidiária.
E sendo um acto administrativo tributário, aquele despacho está sujeito a fundamentação, dado até o princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos (nº 3 do art. 268º da CRP) densificado, no caso, no nº 4 do art. 23º e nº 1 do art. 77º da LGT. Daí que, enquanto acto administrativo tributário, o despacho de reversão deva incluir, além da indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (citado nº 1 do art. 77º da LGT), também a «declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação» - cfr. nº 4 do art. 23º da LGT. (De acordo com o disposto neste nº 4 do art. 23º da LGT «A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».)
Ora, são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT).
Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT).
Não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.
É que, como se exara no acórdão de 31/10/2012, da Secção do Contencioso Tributário deste STA, processo nº 0580/12, «não … parece, porém, … que seja necessário que do despacho de reversão constem os factos concretamente identificados nos quais a Administração tributária fundamenta a sua convicção relativa ao efectivo exercício de funções, pois que em causa não está uma acusação em matéria sancionatória e persistindo dúvida acerca do efectivo exercício de funções o “non liquet” não poderá deixar de ser valorado contra a Administração fiscal, que invoca o direito a responsabilizar o gerente, pois que inexiste presunção legal no sentido de que o gerente de direito exerça de facto as suas funções, daí que não possa seriamente defender-se que a não invocação no despacho de reversão de tais factos possa comprometer a defesa do responsável subsidiário»

De referir também o Acórdão do STA, de 29/10/2014, proferido no âmbito do processo n.º 0925/13 no qual se afirma o seguinte:
“(…) não sofre dúvida que a responsabilidade subsidiária se efectiva por reversão do processo de execução fiscal (n.º 1 do art. 23.º da LGT) e que este despacho de reversão, sendo um acto administrativo tributário, está sujeito a fundamentação (art. 268.º n.º 3 da CRP; arts. 23.º n.º 4 e 77.º nº 1, da LGT).
E sendo pressupostos da responsabilidade subsidiária (arts. 23.º n.º 4 e 24.º n.º 1, da LGT) a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (art. 23.º n.º 2 da LGT; art. 153.º n.º 2 do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou da respectiva entrega (art. 24.º n.º 1 da LGT), então o despacho de reversão, enquanto acto administrativo tributário, deve, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (nº 1 do art. 77.º da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração daqueles pressupostos e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária (art. 23º nº 4 LGT). Daí que, em consonância com este normativo, se tenha afirmado, no acórdão do Pleno desta Secção do STA, proferido em 16/10/13, 0458/13, que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada, «não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.» (cfr., igualmente, os acórdãos desta Secção do STA, de 31/10/2012, proc. n.º 580/12 e de 23/1/2013, proc. n.º 953/12).”. (sublinhado nosso)

Perante este entendimento podemos afirmar que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a extensão temporal da responsabilidade que está a ser efetivada.

No caso em apreço resultou provado que, do teor do despacho de reversão transcrito na alínea Q) do probatório, constam os pressupostos da responsabilidade subsidiária, sendo que a extensão temporal e montante da dívida exequenda consta de documento anexo a esse despacho.

Tal como referido anteriormente, sendo o despacho de reversão um ato administrativo tributário sujeito ao dever de fundamentação, poderá essa fundamentação ser efetuada por remissão. Ora no presente caso a menção da extensão temporal da responsabilidade encontra-se fundamentada por remissão para a relação de dívidas em anexo ao despacho.

Destarte se conclui que o despacho de reversão não padece de qualquer vício que condicione ou limite o direito de defesa do revertido encontrando-se devidamente fundamentado de forma clara e congruente, mencionando os factos e o direito aplicável permitindo dessa forma ao revertido conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo que conduziu à reversão, resultando evidente esse conhecimento por parte do ora Recorrente, atento o teor da oposição à execução fiscal que apresentou, razão pela qual julgamos improcedente a alegada falta de fundamentação do despacho de reversão.

Vejamos de seguida a questão da prova da gerência de facto e a consequente decisão pelo tribunal a quo de considerar o oponente parte legítima da execução.


A responsabilidade subsidiária dos gerentes e administradores pelas dívidas das sociedades encontra-se prevista no nº 1 do artº 24º da LGT ao consagrar que:
Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”.

Do regime acima transcrito resulta que o chamamento dos “administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados”, os quais são subsidiariamente responsáveis em relação à dívida e solidariamente responsáveis entre si, depende da verificação do exercício efetivo de gerência, ou seja a existência de uma situação de gerência de facto (Acórdão do STA de 09/04/2014, proc. n.º 0954/13), não bastando a mera titularidade do cargo de gerente, isto é, a gerência nominal ou de direito.

A responsabilidade subsidiária dos gerentes e administradores, por dívidas da executada originária, tem por pressuposto o exercício efetivo do cargo de gerente ou administrador.

Como se salienta no Acórdão do STA, de 02/03/2011 no recurso nº 0944/10, “Como se conclui da inclusão nesta disposição das expressões «exerçam, ainda que somente de facto, funções» e «período de exercício do seu cargo», não basta para a responsabilização das pessoas aí indicadas a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respetivas funções, ponto este que é pacífico, a nível da jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo.
Assim, desde logo se vê que a responsabilidade subsidiária depende, antes de mais, do efetivo exercício da gerência ou administração, ainda que somente de facto, à semelhança do que o artigo 13.º do CPT também já consagrava”.

É também pacífico na jurisprudência o entendimento de que é à Fazenda Pública como titular do direito de reversão que compete fazer a prova da gerência. Na verdade, ao abrigo do regime previsto no art.º 24.º, n.º 1, da LGT, já não existe qualquer presunção legal que imponha que, provada a gerência de direito, se dê por provado o efetivo exercício da função de gerente, pelo que compete à Fazenda Pública o ónus da prova desse pressuposto da responsabilidade subsidiária, aí se incluindo o exercício de facto da gerência.

Salienta-se que, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e acima mencionada, mesmo nas situações de comprovada gerência de direito, a administração tributária não pode alhear-se da prova quanto à efetividade da gerência, sem prejuízo de o julgador poder inferir o exercício dessa gerência da globalidade da prova produzida.

E, destaca-se ainda que a prova da gerência de facto tem de ser evidenciada por referência a atos praticados pelos potenciais revertidos, suscetíveis de demonstrar esse efetivo exercício de funções, entendendo-se como tal a prática de atos com caráter de continuidade, efetividade, durabilidade, regularidade, com poder de decisão e com independência.

Importa salientar que a gerência de facto de uma sociedade consiste “no efectivo exercício das funções que lhe são inerentes e que passam, nomeadamente, pelas relações com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade.” – cfr. acórdão do TCA Norte, de 30/04/14, no processo nº 1210/07.5 BEPRT.

O tribunal a quo considerou provado que o Oponente, no período a que respeita a dívida exequenda ou em que esta se venceu, era gerente de facto da sociedade devedora originária, pelo que considerou improcedente a alegada ilegitimidade do responsável subsidiário.

O Recorrente defende que não exerceu de facto a gerência da executada originária, porquanto eram outras pessoas que tomavam as decisões sobre a gestão da sociedade.

A sentença recorrida entendeu o seguinte:
(…) in casu, os actos praticados pelo Oponente não se limitaram à assinatura de documentos, ainda que, na prática, grande parte dos actos de gerência pressuponham precisamente a assinatura de documentos pelos responsáveis das sociedades. Como supra foi dito, foi demonstrado nos autos que o Oponente efectuou pagamentos, assinou cheques, procedeu à negociação com clientes, tendo sido o mesmo o responsável pela contratação, afectação e despedimento de trabalhadores da sociedade. Ou seja, não se confirma que o Oponente não tenha assumido compromissos nem participado na tomada de decisões necessárias para a condução da vida e administração da sociedade, nem na sua representação perante terceiros. Antes pelo contrário.
Por outro lado, ainda que se tenha dado como provado nos autos, conforme assente em E) do probatório, que o Oponente, durante o seu período de gerência, recebia directrizes e orientações do Sr. J..., a verdade é que tal não nos permite concluir que o Oponente não tinha qualquer capacidade decisória, no âmbito do exercício dos seus poderes a sua administração.
Não foi, nomeadamente, demonstrado que todos os actos praticados (assinatura de cheques e outros documentos) eram feitos a pedido do Sr. J…, que este tratava de todas as decisões e assuntos relacionados com a sociedade.
Antes resulta dos autos que o Oponente tomava decisões, designadamente no âmbito da admissão, despedimento e gestão de pessoal.
O facto de o Oponente ter recebido directrizes e orientações do Sr. J... M…, não significa que não tenha mantido autonomia decisória em grande parte do exercício das suas funções.
Constituem exemplo do supra concluído os episódios relatados pela contabilista certificada da devedora originária, S…, em declarações prestadas perante o órgão de execução fiscal, reproduzidas na alínea U) da factualidade assente, concretamente quando refere que, tendo dado conta, no exercício das suas funções, “de uma factura que tinha incorrecções e que contabilisticamente não podia ser aceite para deduzir o IVA; falou nisso ao Sr. P… que lhe disse que contabilizasse a factura (pois era de montante relevante) porque era ele que mandava”. Ora, tal assunção de poderes não é compatível com a sua alegação de que se limitava a assinar documentos, nada mandando.
Outro episódio traduz-se na revelação de que “a determinada altura havia dinheiro guardado para pagamento aos trabalhadores, mas o Sr. P… (…) efectuou um pagamento de €60.000,00 na declaração periódica do IVA do 1° trimestre de 2007, à revelia da Sr. T..., a qual demonstrou a sua total discordância e oposição quando tomou conhecimento desse pagamento”.
Perante esta factualidade, não se pode ver o Oponente como um mero “testa de ferro”. O mesmo, efectivamente, tomou decisões relevantes para a vida da sociedade, designadamente em termos de pagamento dos tributos devidos, mesmo contra aquelas que eram as opções daqueles que afirma serem os únicos gerentes da sociedade devedora originária.
Assim, tendo sido demonstrado que o Oponente, no período a que respeita a dívida exequenda ou em que esta se venceu, era gerente de facto da sociedade devedora originária, impõe-se decidir pela improcedência da alegação de ilegitimidade em apreciação”. (fim de citação)

Em situação idêntica aos presentes autos e onde, aliás, figuravam as mesmas partes, foi proferido Acórdão por este Tribunal em 20/03/2025 no processo n.º 1422/11.7BELRS, cuja fundamentação sufragamos, razão pela qual seguiremos o que aí ficou dito, com as necessárias adaptações, tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (cfr.artigo 8.º, n.º 3, do C.Civil).

Não sendo controvertido que, nos períodos em causa, o Recorrente figurava, no Registo Comercial, como gerente de direito da devedora originária, importa apreciar e decidir se da matéria de facto dada como assente na sentença recorrida, é possível extrair a conclusão de que o Recorrente, para além de figurar como gerente de direito, exerceu, efetivamente, tais funções.

O tribunal a quo entendeu que, pela circunstância de o Recorrente ser responsável pela contratação, gestão diária e despedimento de trabalhadores, e pelo facto de ter assinado diversos cheques e documentos, exerceu a gerência efetiva da devedora originária.

É certo que a assinatura de documentos, em nome da sociedade, pode ser um elemento para a prova da gerência efetiva, mas importa analisar o caso concreto, no sentido de verificar se as datas dos documentos correspondem ao período de pagamento das dívidas exequendas. O mesmo se dirá quanto à assinatura de cheques da devedora originária.

Do probatório resultou provada a assinatura de documentos pelo Recorrente, mas em concreto desconhece-se que documentos e cheques terá assinado, e em que datas, pelo que, o seu valor probatório é diminuto para o caso.

No que diz respeito à contratação e despedimento de trabalhadores, entende este Tribunal que, por si só, não relevam para a prova do exercício efetivo da gerência. Recorde-se que a devedora originária era uma empresa de trabalho temporário, pelo que aquela factualidade, por si só, nada revela quanto ao exercício efetivo da gerência.

Por outro lado, como decorre dos depoimentos das testemunhas inquiridas nos serviços da AT, ambos referiram que a gerência efetiva era exercida pelo Sr. J… e pela sua filha T....

Mais ficou provado (cfr. alínea E) do probatório) que J…, durante o período da gerência do Recorrente, tomou decisões relativas à sociedade devedora originária.

Assim, analisada a prova produzida, e contrariamente ao decidido em 1ª instância,
entendemos que ficou por demonstrar factualidade bastante para a prova do exercício da gerência por parte do Recorrente, sendo que era à Fazenda Pública que competia a prova da gerência de facto.

Na verdade não existe nos autos elementos que revelem qualquer intervenção pelo Recorrente reveladora, ao nível da gestão efetiva da sociedade, nomeadamente, a assinatura de contratos ou quaisquer outros documentos, a alienação ou aquisição de património, a negociação com fornecedores ou clientes, entre outros atos típicos do exercício da gerência.

Sendo que a prática de atos isolados, por si só, não é apta a extrair a conclusão de que o Recorrente terá exercido, de facto, a gerência da dita sociedade nos anos em causa.

Recorde-se que o exercício efetivo da gerência constitui facto constitutivo de um pressuposto da responsabilidade subsidiária que se pretende efetivar através da reversão e a lei não estabelece, nesse domínio, qualquer presunção que inverta o ónus da prova.

No caso concreto, perante a falta de elementos de facto convincentes sobre o exercício da gerência, sempre seríamos levados a considerar a existência de uma dúvida substancial e fundada sobre o exercício de facto da gerência por parte do ora Recorrente.

Por tudo o que vem exposto, conclui-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira não reuniu elementos bastantes e suficientes para se dar como provado o exercício efetivo ou a gerência de facto da sociedade devedora originária por parte do Oponente e ora Recorrido, isto é, de que este praticou atos de representação da empresa perante terceiros, nos anos em causa.

Destarte se conclui ser de conceder provimento ao recurso quanto à ilegitimidade do oponente por não se mostrar provado o exercício da gerência de facto, e, em consequência revoga-se a sentença recorrida, julgando-se procedente a oposição à execução fiscal.

Face ao provimento do presente recurso, fica prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos invocados pelo Recorrente.
* *
V- DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a oposição à execução.

Custas a cargo da Recorrida, sem prejuízo da dispensa da taxa de justiça dado não ter contra-alegado.
Lisboa, 30 de abril de 2025
Luisa Soares
Susana Barreto
Filipe Carvalho das Neves