Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:400/23.8BELSB.CS1
Secção:CA
Data do Acordão:11/20/2025
Relator:MARA DE MAGALHÃES SILVEIRA
Descritores:ATRASO NA ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
PRAZO RAZOÁVEL
Sumário:I - Apenas na sequência da prolação da decisão final na ação em questão e do respetivo trânsito em julgado se pode ter por firmado o conhecimento do direito indemnizatório, derivado da extensão do atraso no funcionamento do aparelho de justiça, tendo aí início o prazo de prescrição de três anos, previsto no artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil;
II - Verificando-se que entre a instauração da ação (em 17.1.2001) e o termo, com a prolação do Acórdão de retificação (em 11.3.2021), o processo, nas suas fases declarativa e executiva, teve a duração global de 20 anos, 1 mês e 23 dias, revelando-se atrasos significativos na sua tramitação, mostra-se ostensivo que a duração do processo ultrapassou o prazo razoável;
III - “A violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável (o não cumprimento dos standards de duração razoável de um processo) consubstancia um facto ilícito e culposo (i. e., o funcionamento anormal do serviço, conforme os artigos 7.º, n.ºs 3 e 4, e 9.º, n.º 2, ambos do RCEEP), que opera a favor do A. a presunção natural (nexo de causalidade) da verificação de um relevante dano psicológico e moral comum, de natureza não patrimonial (dano), (ou seja, um dano sofrido por todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um acto final do processo em tempo razoável)” (Ac. do STA de 18.12.2024, proferido no processo 0188/19.7BEPRT).
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa, Subsecção Comum, do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. Relatório

A..., S.A. (doravante Recorrente ou A.) instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a presente ação administrativa contra o Estado Português (doravante R. ou Recorrido), na qual peticionou a condenação do R. no pagamento da quantia de € 40.000,00, acrescida de juros, a título de indemnização pelos danos decorrentes da violação do direito à Justiça em prazo razoável.

Por sentença proferida em 24.3.2025, o referido Tribunal julgou procedente a exceção perentória de prescrição do direito indemnizatório e absolveu o R. dos pedidos formulados.

Inconformada, a A./ Recorrente interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo Sul, cujas alegações contêm as seguintes conclusões:

“I. O direito da A. a propor a presente acção, não se encontrava prescrito em 9/2/2023, data da propositura da mesma.
II. O Mmo Tribunal a quo, entendeu mal que o direito da A. a propor a presente acção se encontrava prescrito, entendimento que não pode proceder.
III. No que concerne à prescrição, prevê o artigo 5.° da Lei 67/2007, de 31 de Dezembro, que o direito à indemnização por responsabilidade civil extracontratual do Estado, das demais pessoas coletivas de direito público e dos titulares dos respetivos órgãos, funcionários e agentes bem como o direito de regresso prescrevem nos termos do artigo 498.° do Código Civil, sendo-lhes aplicável o disposto no mesmo Código em matéria de suspensão e interrupção da prescrição.
IV. Dispondo este artigo 498.°, n.° 1, do Código Civil, que "[o] direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso."
V. Nos presentes autos está em causa o direito a obter uma indemnização por danos derivados de atraso no funcionamento do aparelho de justiça.
VI. Caso em que entendemos, que apenas na sequência da prolação da decisão final na ação em questão e do respetivo trânsito em julgado se pode ter por firmado o conhecimento do direito indemnizatório, derivado da extensão do atraso no funcionamento do aparelho de justiça. Aí se estabelecendo o dies a quo, o início do prazo de prescrição.
VII. Vem entendendo o Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 19/11/2020, proferido no proc. n.° 0506/16.0BELSB-A, como no acórdão de 06/02/2020, proferido no proc. n.° 03/16.3BEALM, e no acórdão de 07/11/2019, proferido no proc. n.° 01909/16.5BELSB, entre outros, que no âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso na justiça, o prazo de prescrição previsto no n.° 1 do artigo 498.° do Código Civil apenas começa após a conclusão do processo.
VIII. Esse entendimento é o entendimento largamente acolhido quer a nível nacional quer no TEDH.
IX. Vide, neste sentido, o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 19-112020, Processo n° 0506/16.0BELSB-A, que decidiu que "[n]o âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso na justiça, o prazo de prescrição previsto no n.° 1 do artigo 498.° do Código Civil apenas começa após a conclusão do processo".
X. Por seu turno, entendeu este mesmo TCA Sul, no seu Ac. datado de 20-09-2024: "(...) Apenas na sequência da prolação da decisão final na ação em questão e do respetivo trânsito em julgado se pode ter por firmado o conhecimento do direito indemnizatório, derivado da extensão do atraso no funcionamento do aparelho de justiça. Aí se estabelecendo o dies a quo, o início do prazo de prescrição."
XI. O entendimento vertido na sentença recorrida contraria o entendimento supra, como viola o disposto no art. 6°, n°1, do CEDH, bem como a jurisprudência assente do TEDH, sobre esta questão.
XII. Como resulta do Acórdão do TEDH de 23-03-1994 «Silva Pontes c. Portugal»: ”30. Se a legislação nacional de um Estado prevê um processo composto por duas fases - uma quando o Tribunal decide sobre a existência de uma obrigação de pagar e outra quando fixa o montante devido - é razoável considerar que, para os fins do Artigo 6° n°. 1 (art. 6-1), um direito civil não é ''determinado” até que o montante seja decidido. (...)"
XIII. O que, caso viesse a proceder o entendimento vertido na sentença recorrida, sempre a mesma estaria a violar jurisprudência consolidada do TEDH e da CEDH.
XIV. No caso vertente, o prazo de prescrição teve início necessariamente após 11/03/2021, data da prolação da decisão final, pelo que à data da instauração da ação e da citação que se lhe seguiu, 09/02/2023 e 27/02/2023, ainda não tinham decorrido os três anos previstos no artigo 498.°, n.° 1, do Código Civil.
Termos em que e nos demais de direito, e sempre com o douto suprimento de V°. Exc.ias, deve ser revogada a sentença sub judice, e substituída por outra que condene o R. conforme o pedido da A., fazendo os venerandos desembargadores, dessa forma, Justiça.”


O Estado Português, representado pelo Ministério Público, apresentou contra-alegações, concluindo nos seguintes termos,

“1) O recurso a que ora se responde vem interposto da sentença que julgou improcedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais formulado pela Autora, ora recorrente, com fundamento na verificação de exceção perentória de prescrição do direito indemnizatório.
2) A Autora não exerceu a faculdade de impugnar a matéria de facto, pelo que se deve considerar definitivamente assente toda a factualidade dada como provada na sentença, para todos os efeitos - cf. artigo 640.°, n.° 1 e 2, do CPC, ex vi artigo 140.°, n.° 3, do CPTA.
3) A questão central do recurso prende-se com um alegado erro de julgamento quanto ao termo inicial da contagem do prazo previsto no artigo 498.°, n.° 1, do Código Civil.
4) O instituto da prescrição visa garantir a segurança jurídica e estabilidade das relações jurídicas, obstando à perpetuação indefinida de litígios e protegendo da incerteza as entidades demandadas ou demandáveis.
5) O requisito "conhecimento do direito", para efeitos de prescrição, exige somente a consciência da existência de um dano e da sua causa; isto é, não exige a sua perfeição ou quantificação final dos danos.
6) No caso vertente, o próprio administrador da sociedade Autora reconheceu em audiência de julgamento ter tido consciência da duração excessiva do processo e dos danos, designadamente relacionados com garantias bancárias, num data que situou no ano 2003.
7) Este facto, incontornavelmente distintivo no presente processo, fixa o início do prazo de prescrição no ano de 2003, pelo que, nessa decorrência, o direito da Autora está prescrito desde o ano 2006 - muito antes da propositura da presente ação (09-02-2023).
8) A interpretação da recorrente, que defende o início do prazo de prescrição apenas com a conclusão definitiva do processo (11-03-2021), desvirtua o escopo e teleologia do instituto da prescrição e não se coaduna com a casuística em apreço.
9) A jurisprudência do TEDH, embora preveja a proteção do direito a uma decisão em prazo razoável, não impõe a configuração de um regime de prescrição que tenha por efeito esconjurar a sua finalidade atinente ao valor da segurança jurídica e à ideia de Direito, sendo legítima a posição do Tribunal a quo face à data do conhecimento efetivo da lesão, expressamente reconhecido pelo representante legal da Autora.
Subsidiariamente, e sem conceder, quanto aos pressupostos cumulativos da responsabilidade civil,
10) Mesmo que o direito de indemnização não estivesse prescrito, a pretensão da Autora sempre soçobraria por manifesta ausência, no elenco dos factos provados, de qualquer factualidade integradora de danos não patrimoniais e do eventual nexo de causalidade adequada com pretenso facto ilícito.
11) Acresce que, da tramitação processual, identifica-se que o comportamento processual da Autora contribuiu significativamente para a duração da causa originária - designadamente, além do mais, devido a períodos de ausência de mandatário judicial (impedindo a tramitação, como no incidente das cassetes) e por atos que complexificaram a lide -, o que exclui a ilicitude e culpa genericamente imputáveis ao sistema de Justiça.
12) Os danos não patrimoniais não são danos automáticos decorrentes da mera violação de um direito, sendo exigida a prova de nexo causal e de que resultaram em violação de direitos de personalidade, o que não foi demonstrado nos autos e é incontornável face à sua ausência dos factos dados como provados.
13) A presente tipologia de processos não pode constituir um formulário de pedido de indemnizações ao Estado Português, na sequência do simples decurso dos prazos dos processos judiciais, ao arrepio da verificação dos requisitos cumulativos da responsabilidade civil extracontratual, os quais não estão reunidos no caso em apreço.
14) A decisão recorrida interpretou e aplicou corretamente os regimes que resultam do disposto nos artigos 498.°, n.° 1, 303.°, 304.°, 318.° a 327.°, bem como 483.°, 487.°, 496.°, 562.° e 563.°, todos do Código Civil, artigo 5.° da Lei n.° 67/2007, e artigos 576.°, n.° 1 e 3, 579.° e 608.°, n.° 2, do CPC, pelo que deve ser mantida nos seus termos.
Termos em que se conclui que deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos, pelo que, assim decidindo, V. Exas. farão a habitual Justiça.”


O Tribunal a quo admitiu o recurso, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

2. Delimitação do objeto do recurso

Considerando que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos apelantes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso [cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º 2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPTA], a este Tribunal cumpre apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito ao dar como verificada a exceção perentória de prescrição do direito indemnizatório.

3. Fundamentação de facto

3.1. Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos,

“Em face dos elementos juntos aos autos e das regras de experiência comum, resultam provados os seguintes factos, considerados bastantes e com interesse para a decisão da alegada exceção e do mérito da causa.
A. Em 17.1.2001 a A., deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa da petição inicial do processo que viria a ser autuado com o n° 00/00, cfr fls 1 a 230 do Volume I do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
B. O R. na ação, o Hospital de Santa Marta, apresentou contestação em 23.2.2001, cfr fls 232 a 472 do Volume II e 473 a 648 do Volume III do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
C. Em 17.4.2001 a A. apresentou Réplica, cfr fls 650 a 712 do Volume III do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
D. Em 4.5.2001 o R. apresentou resposta à exceção de ilegitimidade passiva, cfr fls 713 a 716 do Volume III do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
E. Em 27.2.2002 realizou-se a audiência preliminar, cfr fls 753 a 773 do Volume IV do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
F. A partir de 2003, o Administrador da A., B..., concluiu que o processo estava a ter uma duração excessiva e que estava a causar danos à A. devido às garantias bancárias que haviam sido prestadas, cfr declarações de parte de B...;
G. Em 6.6.2005 realizou-se a 1ª sessão da audiência de julgamento cfr fls 871 a 882 do Volume IV do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
H. Na referida audiência de julgamento a A. interpôs recurso da decisão do tribunal que indeferiu o pedido de declaração de incompetência quanto à matéria da reconvenção, cfr fls 871 a 882 do Volume IV do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
I. Por despacho de 14.6.2005 foi admitido o referido recurso, cfr fls 888 do Volume IV do processo n° 00/00, e fls 2 do volume dos Autos de Agravo em Separado, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
J. Em 27.6.2005 realizou-se a 2.ª sessão da audiência de julgamento, cfr fls 894 a 897 do Volume IV do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
K. Em 6.7.2005 a A. apresentou as alegações do recurso supra referido, cfr fls 899 a 905 do Volume IV do processo n° 00/00, e fls 3 a 9 do volume dos Autos de Agravo em Separado, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
L. Em 13.7.2005 realizou-se a 3ª sessão da audiência de julgamento, cfr fls 1007 a 1013 do Volume V do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
M. Em 12.10.2005 realizou-se a 4ª sessão da audiência de julgamento, cfr fls 1137 a 1145 do Volume V do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
N. Em 28.11.2005 realizou-se a 5ª sessão da audiência de julgamento, cfr fls 1165 a 1145 do Volume V do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
O. Em 12.12.2005 realizou-se a audiência de resposta aos quesitos, cfr fls 1177 a 1178 do Volume V do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
P. Em 4.1.2006 a A. apresentou alegações de direito, cfr fls 1179 a 1218 do Volume V do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
Q. Em 30.11.2006 o I. Mandatário da A. R… renunciou ao mandato, cfr fls 1221 do Volume V do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
R. Em 28.9.2007 a A. juntou procuração forense aos autos, cfr fls 1241 do Volume V do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
S. Em 17.6.2008 foi proferida sentença no processo n° 00/00, cfr fls 1247 a 1295 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
T. Em 1.7.2008 a A. interpôs recurso da sentença supra referida, cfr fls 1301 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
U. Em 2.7.2008 a A. requereu que lhe fossem confiadas as cassetes referentes à prova produzida em audiência de julgamento, cfr fls 1303 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
V. Em 7.7.2008 a R. interpôs recurso da decisão supra referida, cfr fls 1307 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
W. Em 18.7.2008 a R. veio desistir do recurso que interpôs a 7.7.2008, cfr fls 1314 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
X. Mediante despacho de 2.4.2009 foi admitido o recurso referido em S) supra, cfr fls 1317 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
Y. Em 17.4.2009 foram requisitadas à secção central as cópias das cassetes requeridas, cfr fls 1319 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
Z. Em 17.4.2009 foram entregues ao I. Mandatário da A. as referidas cópias das cassetes relativas às audiências de 6.6.2005, 13.7.2005, 12.10.2005, cfr fls 1320 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
AA. Mediante requerimentos datados de 4.5.2009 e 6.5.2009, veio a A. requerer a anulação do julgamento com a consequente repetição do mesmo atenta a informação da secretaria de que as cassetes com a agravação da diligência de 27.6.2005 haviam desaparecido, cfr fls 1322 e 1326 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
BB. Em 11.9.2009 a I. Mandatário da A. A…, renunciou ao mandato, cfr fls 1333 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
CC. Mediante despacho de 9.12.2012 foi declarada interrompida a instância, cfr fls 1342 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
DD. Em 16.9.2013 foi proferido despacho em que se determinou a realização de diligências para encontrar a cassetes erradamente registadas noutros autos, cfr fls 1346 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
EE. Em 14.10.2013 foram localizadas as cassetes desaparecidas, cfr fls 1347 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
FF. Mediante requerimento de 7.11.2013 veio a A. requerer a confiança das cassetes que haviam desaparecido, cfr fls 1352 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
GG. Mediante requerimento de 8.11.2013 veio a A. requerer a suspensão da instância e o reinício do prazo de interposição de recurso, cfr fls 1355 e 1363 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
HH. Mediante despacho de 12.11.2013 foram as partes convocadas para audiência a ter lugar em 20.11.2013, cfr fls 1366 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
II. A referida audiência teve lugar em 26.11.2013, na qual se decidiu pela suspensão da instância por 20 dias, findo o qual se iniciaria o prazo para alegações de recurso, assim como a entrega das cassetes e a confiança do processo, cfr fls 1376 a 1379 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
JJ. Em 4.12.2013, foram entregues as cassetes e confiado o processo, cfr fls 1382 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
KK. Em 28.1.2014 a A. deu entrada em tribunal das alegações de recurso da sentença proferida em 17.6.2008, cfr fls 1388 a 1568 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
LL. Por despacho de 9.7.2014 foi ordenada a subida dos autos, cfr fls 1574 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
MM. O recurso correu termos no Supremo Tribunal Administrativo sob o n° 1195/15, não contestado cfr artigo 34° da contestação;
NN. Em 25.5.2015 foi ordenada a subida do recurso da decisão do tribunal que indeferiu o pedido de declaração de incompetência quanto à matéria da reconvenção, referido em H) e I) supra, cfr fls 115 do volume dos Autos de Agravo em Separado, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
OO. Em 28.5.2015 foi remetido ao Supremo Tribunal Administrativo os Autos de Agravo em Separado que correu termos naquele tribunal com o n° 695/15, cfr fls 115 do volume dos Autos de Agravo em Separado, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
PP. Em 29.10.2015 foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo, negando provimento ao recurso, no processo n° 695/15, cfr fls 121 a 128 do volume dos Autos de Agravo em Separado, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais e https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3d47b42ecbf a58e580257ef3003838de?OpenDocument&ExpandSection=1# Section1
QQ. Em 12.5.2016 foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo sobre o recurso da sentença proferida em 17.6.2008,facto JJ), https: / / www.dgsi.pt/jsta.nsf/ 35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931 / 260dd89831 93271e80257fb60038ceba?OpenDocument&ExpandSection=1&Highlight=0,695 %2F15# Sectin1.
RR. Em 20.5.2016 a A. teve conhecimento do acórdão supra mencionado, não contestado cfr artigo 34° da contestação;
SS. Em 29.9.2016 a A. intentou ação de execução que correu termos sob o n° .../...BELSB,
cfr fls 1 do processo .../...BELSB, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
TT. Em 12.11.2018 foi proferida sentença no processo n° .../...BELSB, cfr fls não paginadas do processo .../...BELSB, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
UU. Em 1.2.2019 a A. apresentou recurso da decisão referida em SS), cfr fls não paginadas do processo .../...BELSB, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
VV. Em 24.6.2019 foi proferido despacho de admissão do recurso e determinada a sua subida ao TCAS, cfr fls não paginadas do processo .../...BELSB, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
WW. Em 14.11.2019 foi proferida decisão sumária no TCAS na qual se decidiu negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida, cfr fls 266 e seguintes do II volume do processo .../...BELSB, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
XX. Em 14.9.2020 a A. requereu a retificação do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 12.5.2016, facto PP), não contestado cfr artigo 34° da contestação e consulta ao processo eletrónico;
YY. Em 11.3.2021 foi proferido acórdão no qual se retificou o teor do acórdão de 12.5.2016, não contestado cfr artigo 34° da contestação e consulta ao processo eletrónico e
https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4efa8471da5 3d07e8025869c00461118?OpenDocument&ExpandSection=1# Section1.
ZZ. A presente ação deu entrada neste Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa em 9.2.2023, cfr fls 1 do SITAF;”

3.2. Nada consta na sentença como factos não provados.

3.3. A respeito da motivação da matéria de facto consignou-se na sentença recorrida,

“Analisando criticamente a prova produzida cfr artigo 607.° n° 4 CPC, a convicção do Tribunal assentou na prova documental junta aos autos pelas partes, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório e nas declarações de parte proferidas pelo administrador da A..
Prova documental que não foi impugnada pelas partes e sobre os quais não existem indícios que ponham em causa a sua genuinidade.
Sobre as declarações de parte de B..., administrador da A.., visivelmente nervoso e ainda perturbado com o assunto, as suas declarações, não obstante a alegada falta de memória relativamente a determinadas questões, foi credível, resultando das mesmas que, a partir de 2003, concluiu que o processo estava a ter uma duração excessiva e que tal facto estava a causar danos devido às garantias bancárias que haviam sido prestadas pelos bancos.”

3.4. Com vista ao conhecimento do mérito do recurso reformulam-se os factos A., B., S., QQ., SS., TT., YY. e adita-se à factualidade provada o facto AAA., nos seguintes termos,

A. Em 17.1.2001 a A., deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa da petição inicial do processo que viria a ser autuado com o n° 00/00, na qual peticionou a condenação do Hospital de Santa Marta na libertação das garantias bancárias retidas e no pagamento da quantia total de 295.958.729$00, a titulo de trabalhos contratuais não liquidados, trabalhos extra-contratuais, danos emergentes por imobilização de estaleiro, equipamento e pessoal, danos emergemente por dívidas a fornecedores (5.177.493$00), lucros cessantes, danos emergentes por despesas com manutenção de garantias bancárias, contratos de aluguer de equipamentos e danos não patrimoniais, alegando, em suma, que celebrou com o R. um contrato de empreitada que rescindiu por motivos imputáveis ao dono de obra, designadamente a supressão de trabalhos, suspensões de trabalhos, perturbações da empreitada, devendo ser ressarcida dos sobrecustos e prejuízos em que incorreu e que prestou garantias bancárias que o R. reteve. - cfr fls 1 a 230 do Volume I do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
B. O R. na ação, o Hospital de Santa Marta, apresentou contestação em 23.2.2001, aí deduzindo pedido reconvencional. - cfr fls 232 a 472 do Volume II e 473 a 648 do Volume III do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
S. Em 17.6.2008 foi proferida sentença no processo n° 00/00, constando do seu segmento decisório,
“Assim, julgando a acção parcialmente procedente.
a) Condena-se o R. a pagar à A. os montantes de:
I «esc. 351.000$00 (IVA incluído) a título de trabalhos extra contratuais;
II. esc. 16.640.000$00 a título de danos emergentes por retenção de garantias;
III. esc. 2.495.100$00 (IVA incluído) a título de danos emergentes por despesas com manutenção de garantias bancárias;
IV. esc. 4.384.680$00 (mais IVA) a título de aluguer e montagem de uma grua.
b) E no que se vier a apurar em execução de sentença,
I. Resultante da diferença do que lhe foi pago e do que deve receber em função dos trabalhos contratuais efectivamente realizados;
II. Da utilização de andaimes durante um mês.
E, julgando a reconvenção parcialmente procedente:
c) Condena-se a A. a pagar ao R.:
I. esc. 1.950.029$00 a título de remunerações pagas a B... até 31/01/01;
II. esc. 7.655.628$00 a título de custo da segunda cobertura provisória;
III. esc. 10.036.400$00 a título de acréscimo das despesas de fiscalização;
IV. esc. 16.366.693$00 a título de acréscimo do custo dos trabalhos suprimidos à A.
d) E no que se vier a apurar em execução de sentença a título de danos patrimoniais:
I. Resultante do encerramento da UCI do Serviço de Medicina entre 13 e 17/09/99;
II. Relativos aos custos da reparação do ar condicionado da UCI;
III. Resultantes do encerramento do serviço de Medicina (incluindo a UCI) entre 18/09/99 a 30/11/99;
IV. Relativos ao custo de limpeza das instalações em consequência das inundações;
V. Relativos às despesas efectuadas e a efectuar, relacionadas com o tratamento e a recuperação da funcionária C..., e por qualquer indemnização que venha a ser atribuída e fixada à mesma a qualquer título incluindo por incapacidade temporária ou definitiva, total ou parcial.
e) E absolve-se A. e R do mais que reciprocamente peticionaram um do outro»
- cfr fls 1247 a 1295 do Volume VI do processo n° 00/00, junto aos autos, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais;
QQ. Em 12.5.2016 foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo sobre o recurso da sentença proferida em 17.6.2008, facto JJ), do qual consta,
“2.2. O Direito
(…)
Mas, ainda a título de danos emergentes, peticiona a autora o pagamento da quantia de esc. 5.177.493$00 (IVA incluído) por dívidas a fornecedores, designadamente no que respeita aos perfis de alumínio que teve de encomendar para aplicação na obra e que não podem ser aplicados noutra obra, pois foram feitos com medidas precisas e únicas – cfr. pontos 18 e 19 dos factos provados.
E quanto a este pedido, atendendo a que, em virtude da rescisão que não lhe é imputável, a autora teve de suportar este custo, é manifesto que terá de ser o dono da obra a suportá-lo, indemnizando a autora no montante a este título dispendido.
Procede, pois, o pedido no que respeita aos esc. 5. 177.493$00.
(…)
Assim, face ao que antecede, impõe-se conceder parcial provimento ao recurso interposto pela recorrente, e consequentemente revogar a decisão recorrida no que concerne à condenação da autora/recorrente no pagamento das importâncias referentes a dívidas a fornecedores [esc. 5.177.493$00], à indemnização devida à funcionária B..., do custo da segunda cobertura [esc. 7.655.628$00], do acréscimo de despesa com a fiscalização [esc. 10.036.400$00] e do acréscimo de custo dos trabalhos suprimidos à recorrente [esc. 16.366.693$00], mantendo o mais decidido na decisão recorrida, com as legais consequências.

3. DECISÃO
Atento o exposto, concede-se parcial provimento ao recurso interposto pela recorrente, e consequentemente revoga-se a decisão recorrida no que concerne à condenação da autora/recorrente no pagamento das importâncias supra referidas, mantendo o mais decidido na decisão recorrida.”
- cf. https: / / www.dgsi.pt/jsta.nsf/ 35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931 / 260dd89831 93271e80257fb60038ceba?OpenDocument&ExpandSection=1&Highlight=0,695 %2F15# Sectin1.
SS. Em 29.9.2016 a A. intentou ação de execução que correu termos sob o n° .../...BELSB, na qual peticionou,

cfr fls 1 do processo .../...BELSB, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
TT. Em 12.11.2018 foi proferida sentença no processo n° .../...BELSB, aí se decidindo,
“Por todo o exposto, o Tribunal decide:
a) Admitir o requerimento da exequente, de 23.11.2016, a requerer que o executado seja condenado ainda no pagamento do valor de €: 25.825,21, a título de danos emergentes por dívidas a fornecedores, acrescido de juros vencidos, no valor de €: 38.133,84, e vincendos;
b) Declarar extinta a instância quanto ao valor de €: 119.066,95, pago pelo executado à exequente a 25.10.2016, por perda, superveniente, de objeto da lide, nesta parte;
c) Condenar o executado a pagar à exequente os juros de mora sobre a quantia exequenda de €: 119.066,95, a partir da data de citação do executado (12.10.2016) na presente instância executiva até ao respetivo pagamento (que ocorreu a 25.10.2016), contabilizados à taxa comercial;
d) Absolver o executado de tudo o mais peticionado na presente lide.”
- cfr fls não paginadas do processo .../...BELSB, junto aos autos, que se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais;
YY. Em 11.3.2021 foi proferido acórdão no qual se retificou o teor do acórdão de 12.5.2016, não contestado, constando de tal decisão
“Cumpre decidir:
Compulsado o acórdão cuja rectificação é peticionada constata-se que, efectivamente, a Autora/recorrente formulou um pedido de condenação da Ré/recorrida no montante de esc. 5.177.493$00 (IVA incluído) acrescido de juros, a título de danos emergentes por dívidas a fornecedores;
*
Esse pedido foi julgado procedente.
E, nessa procedência, foi decidido conceder parcial provimento ao recurso interposto pela autora/recorrente e, consequentemente, revogar a decisão recorrida no que concerne entre o mais, à condenação da autora/recorrente no pagamento da importância referente a dívidas a fornecedores.
Isto significa que a autora/recorrente havia sido condenada a pagar à Ré este valor e o acórdão deste STA entendeu que neste segmento, assistindo razão à recorrente a mesma não teria de pagar esta quantia à Ré/recorrida, antes o devia receber da mesma Ré.
Faltou porém, proceder à condenação da Ré ao pagamento desta quantia à Autora/recorrente tal como peticionado.
Deste modo, o que se deveria também ter consignado no segmento decisório, seria a condenação da Ré/recorrida no pagamento à Autora/recorrente da quantia de esc. 5.177.493$00, o que agora, em sede de rectificação do erro material se impõe seja corrigido [nº 3 do art° 614° do CPC].
Concluindo, rectifica-se o acórdão proferido nos autos em 12.05.2016, dele ficando a constar em sede de segmento decisório o seguinte:
«Atento o exposto, concede-se parcial provimento ao recurso interposto pela recorrente e consequentemente revoga-se a decisão recorrida no que concerne à condenação da Autora/recorrente no pagamento das importâncias supra referidas, condenando-se a Ré no pagamento à Autora da quantia esc. 5.177.493$00, mantendo o mais decidido na decisão recorrida».”
- cfr artigo 34° da contestação e consulta ao processo eletrónico e
https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4efa8471da5 3d07e8025869c00461118?OpenDocument&ExpandSection=1# Section1.
AAA. O R. foi citado para a presente ação em 27.2.2023. – cf. doc. de fls. 38 do SITAF.


4. Fundamentação de direito


4.1. Do erro de julgamento de direito quanto à prescrição do direito indemnizatório

A sentença recorrida julgou prescrito o direito indemnizatório reclamado pela A./Recorrente, decorrente dos danos por esta alegadamente suportados em resultado da demora excessiva da ação por si instaurada, que correu termos no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, sob o número 00/00, e da ação de execução da sentença proferida naqueles autos e que correu termos no mesmo Tribunal sob o número .../...BELSB, por considerar em suma,
“[…] numa ação de responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso na prolação de decisão jurisdicional em prazo razoável, é aplicável, por força do disposto no artigo 5.° do RRCECEPC o previsto no artigo 498° n.° 1, do Código Civil, começando tal prazo a correr quando o lesado tem consciência que o processo tem uma duração excessiva e que tal facto lhe está a causar danos. Sendo que, só quando não seja possível determinar ao certo o momento de tal consciência se presume que a mesma ocorreu com o conhecimento do trânsito em julgado da decisão proferida, efetuando-se a contagem do prazo trienal de prescrição no máximo a partir dessa data.
Atento todo o supra exposto, e a factualidade assente resulta que in casu,
I. os processos n° 00/00 e .../...BELSB são considerados como uma única ação, cfr factos A) a YY);
II. em 2003 os Administradores da A. tiveram consciência de que o processo em questão estava a ter uma duração excessiva e de que tal facto lhes estava a causar os danos pelos quais pedem a atribuição de uma indemnização, cfr facto F).
Ora, atenta a jurisprudência supra referida, com a qual concordamos e aqui aplicamos, para obstar à prescrição do direito à indemnização a A. tinha de o ter exercido nos três anos seguintes ao conhecimento da totalidade dos pressupostos dessa mesma responsabilidade. Isto é, até 2006, 3 anos a contar de 2003, cfr facto F).
In casu, resulta da factualidade assente que a A. deu entrada da petição inicial da presente ação em 9.2.2023, cfr facto ZZ), ou seja após o decurso do prazo de três anos de que a A. dispunha para intentar a ação com vista à indemnização dos danos cuja indemnização peticiona nos presentes autos, cfr factos F) e ZZ).
E atenta a supra data de 2006, não é de considerar o regime de suspensão dos prazos por força da pandemia trazida pela COVID19, nos termo do disposto no n.° 3 do artigo 7.° da Lei n.° 1-A/2020, o qual não era aplicável à data.” 
A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, entendendo que o Tribunal a quo errou ao não considerar que no âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso na justiça, o prazo de prescrição previsto no artigo 498.º, n.º 1 do Código Civil apenas se inicia após a conclusão do processo e que o entendimento seguido pela sentença não tem amparo na jurisprudência nacional e confronta com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Daí advoga que, na medida em que a causa – entendendo-se que os processos n° 00/00 e .../...BELSB, são uma única causa, para efeitos do direito exercido pela autora com os presentes autos - só ficou definitivamente concluída em 11.03.2021, quando foi proferido o acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo, que retificou o acórdão de 12.5.2016 (facto YY), quando a presente ação deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 9.2.2023 (ponto ZZ), não se encontrava esgotado o prazo de prescrição.
E assiste-lhe razão, não se podendo manter a sentença recorrida.
A respeito da prescrição do direito de indemnização no âmbito da responsabilidade civil do Estado e demais pessoas coletivas públicas rege o artigo 5.º da Lei n.º 67/2007, de 31.12 (Regime de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, doravante RRCEEEP) que “o direito à indemnização por responsabilidade civil extracontratual do Estado, das demais pessoas colectivas de direito público e dos titulares dos respectivos órgãos, funcionários e agentes bem como o direito de regresso prescrevem nos termos do artigo 498.º do Código Civil, sendo-lhes aplicável o disposto no mesmo Código em matéria de suspensão e interrupção da prescrição”.
Por sua vez, o n.º 1 do artigo 498.º do CC dispõe que “[…] direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso”.
Por seu turno, o artigo 306.º do Código Civil estabelece que “o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido”.
À luz do artigo 498.º do CPC, o prazo de prescrição de três anos do direito de ação de indemnização tem início com o conhecimento pelo lesado da possibilidade legal do ressarcimento dos danos que ocorrem por virtude de certo facto danoso ou atuação danosa.
Contudo, é entendimento jurisprudencial dominante que, quando está em causa o direito de indemnização no âmbito da responsabilidade civil do Estado e demais pessoas coletivas públicas por atraso na justiça, por estarmos “no âmbito do exercício de um direito que tem uma fonte simultaneamente interna (art. 20.º CRP) e internacional (art. 6.º CEDH), sendo que a adequação do ordenamento interno às exigências que derivam da adesão à CEDH pode implicar algumas soluções mais específicas ou individualizadas do legislador ou mesmo do julgador, no sentido de não vulnerar de forma desproporcional o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas” , “um eventual atraso terá de ser apreciado de forma unitária, desde a proposição da acção até à prolação da decisão de mérito final. Até porque pode haver atrasos em certas fases do processo e não em todas, sendo isso, no entanto, suficiente para condenar o Estado por atraso na justiça. Só uma visão global do processo permite, pois, ao julgador, avaliar se a decisão judicial foi dada sem dilações indevidas” (Ac. do STA de 6.2.2020, proferido no processo 03/16.3BEALM, consultável em https://www.dgsi.pt/JSTA.NSF/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/9ead8b87be1159048025850d0055116c?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1).
E daí que, tal como se consignou no Ac. deste TCA Sul de 3.7.2025, proferido no processo 22/20.5BESNT (disponível em https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/a0a488245610db7180258cc300310548?OpenDocument) que a ora relatora subscreveu na qualidade de adjunta, se entenda que “os lesados apenas no final do processo têm plena consciência da dimensão exata do atraso verificado, pelo que, nos processos em que se coloca em crise a violação do direito a uma decisão em prazo razoável, apenas após o trânsito em julgado da decisão final na ação a que respeite corresponde ao momento em que o lesado tem conhecimento do seu direito, tendo início nessa data o prazo de prescrição vertido no artigo 498.º, n.º 1 do Código Civil (cfr. neste sentido, entre outros, o acórdão deste Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 10 de dezembro de 2020, proferido no processo n.º 995/19.0BESNT-S1 e os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, datados de 6 de fevereiro de 2020, proferido no processo n.º 03/16.3BEALM e de 19 de novembro de 2020, proferido no processo n.º 0506/16.0BELSB-A)”.
Recordando-se o sumário do Acórdão deste TCA Sul de 20.9.2024, proferido no processo 147/23.5BELRA, disponível para consulta em https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/c1a18ef3cb67938f80258ba5003e25e8?OpenDocument,
“I. Apenas na sequência da prolação da decisão final na ação em questão e do respetivo trânsito em julgado se pode ter por firmado o conhecimento do direito indemnizatório, derivado da extensão do atraso no funcionamento do aparelho de justiça.
II. Pelo que aí tem início o prazo de prescrição de três anos, previsto no artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil.”
Acompanhamos integralmente este entendimento de que “só com a prolação da decisão no processo no qual se verifica o suposto atraso, e respetivo trânsito em julgado, se pode fazer uma ponderação ajuizada e global sobre a delonga na tramitação do processo e sua licitude/ilicitude”, pelo que “não faz sentido que para evitar o decurso do prazo de prescrição, o lesado deva intentar a ação indemnizatória ainda na pendência do processo atrasado, uma vez que, embora o conhecimento dos elementos constitutivos ou dos pressupostos do eventual direito à indemnização vá ocorrendo no decurso do processo, apenas com o termo do processo se logra apurá-los integralmente.” (Ac. deste TCA Sul de 3.7.2025, proferido no processo 22/20.5BESNT, disponível em https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/a0a488245610db7180258cc300310548?OpenDocument).
Atento o exposto, no caso dos autos, tal como se entendeu na sentença recorrida, para efeitos de apreciação da exceção da prescrição consideram-se os processos n.ºs 00/00 e .../...BELSB, correspondentes à fase declarativa e executiva da mesma pretensão, como uma única ação, o que se encontra em linha com a jurisprudência citada e constante dos Acórdãos do STA proferidos nos processos n.° 0350/17, de 08.3.2018 e n.º 01909/16.5BELSB, de 07.11.2019, lendo-se no sumário deste último que,
"I - O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já por várias vezes decidiu que o processo cível, contem uma fase declarativa e uma fase executiva que são indissociáveis para os efeitos dos art.°s 35° e 6°, n° 1, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
II - Pelo que, só quando termina o processo executivo é que ocorre a determinação dos direitos e obrigações de carácter civil, devendo contar-se, em ação por morosidade da justiça, todos os períodos desde a entrada da ação declarativa em juízo.”
Daí que, mostrando-se provado que, tendo a A. requerido em 14.9.2020 a retificação do Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 12.5.2016 no âmbito do recurso da sentença proferida no processo n.° 00/00, tendo sido proferido em 11.3.2021 o Acórdão que retificou a decisão anteriormente proferida (facto YY), é nessa data que se considera ter havido lugar à prolação da decisão de mérito irrecorrível.
Consequentemente, quando a presente ação dá entrada em 9.2.2023 e o R. para ela é citado em 27.2.2023, ainda não se encontrava esgotado o prazo de 3 anos de que a A./Recorrida dispunha para exercer judicialmente o seu direito indemnizatório nos termos do artigo 498.º, n.º 1 do CC ex vi artigo 5.º do RRCEEEP.
Incorrendo, pois, a sentença em erro de julgamento, não se podendo a mesma manter.

*
Cumpre, pois, ao abrigo do disposto no artigo 149.º, n.º 1 do CPTA, conhecer em substituição se se encontram preenchidos os requisitos do direito indemnizatório reclamado pela A..

4.2. Do conhecimento em substituição

A A. funda a sua pretensão indemnizatória no atraso, que reputa ilícito, na administração da justiça no âmbito do processo que instaurou, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, e que ali correu termos na sua fase declarativa sob o número 00/00 e na correspondente fase executiva sob o número .../...BELSB.
Alega, em suma, que em 17.1.2001 instaurou naquele Tribunal uma ação administrativa comum contra o Hospital Santa Marta em que peticionou a condenação do ali R. ao pagamento de € 1.476.235,92 pelos prejuízos causados com a rescisão do contrato de empreitada, na qual foi proferida sentença em 17.6.2008 e, fruto do desaparecimento das cassetes onde se gravara a audiência de julgamento, apenas logrou apresentar recurso em 28.1.2014, vindo a ser notificada do Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, que concedeu parcial provimento, em 20.5.2016.
Em 29.9.2016 deduziu o correspondente processo de execução da decisão proferida pelo STA, que tramitou sob o número .../...BELSB, vindo a ser proferida sentença em 12.11.2018. Dessa sentença interpôs recurso em 1.2.2019 e por Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 18.11.2019, resultou existir um erro no Acórdão do STA em execução porquanto na fundamentação do acórdão diz-se que a quantia de 25.825,21€ é devido pelo dono de obra à A., mas no dispositivo condena a A. a pagar o valor ao R.. Consequentemente, em 14.9.2020 a A. viu-se obrigada a requerer a retificação do Acórdão, pretensão a que foi dado provimento por Acórdão de 11.3.2021.
Refere mostrar-se desrazoável, ao abrigo do artigo 20.º, n.º 1 e 4, da CRP e artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que uma ação judicial proposta em janeiro de 2001 apenas chegue ao seu fim em março de 2021, decorridos 20 anos e 2 meses, e que se manteve numa situação de incerteza, incómodo, ansiedade e angústia, com preocupação para com os seus trabalhadores, criando um ambiente negativo na empresa. Advoga que os seus administradores e trabalhadores sentiram e sentem-se frustrados pela ineficácia do sistema na defesa dos seus interesses. Entendendo que se os prazos legais fossem cumpridos o seu pesadelo, o bom nome junto da banca, funcionários, TOC, ROC, não teriam acontecido, nem a gestão da empresa entrava em rutura.
Considera preenchidos os pressupostos para fazer recair sobre o R. o dever de indemnização dos danos por si sofridos, correspondentes a € 2.000,00 por cada ano de duração do processo até prolação de decisão, num total não inferior a € 40.000,00.
O R., na sua contestação, aduz que do processo resulta que os autos não estiveram parados ou sem impulso processual e que a demora apontada não resultou de conduta negligente dos operadores judiciários, nos diversos graus de jurisdição, mas, antes, de um conjunto de circunstâncias estranhas à sua vontade, nem a A. invoca em que termos e condições a conduta culposa dos Tribunais envolvidos e dos seus agentes lhe causou efetivos prejuízos.
Aduz que não basta a mera alegação de deficiente e moroso funcionamento da administração da Justiça para que haja obrigação de indemnizar. E que a atuação do R. se regeu pelas normas processuais aplicáveis, de forma a cumprir os deveres a que está adstrito, na defesa dos direitos legalmente consagrados do aqui A., não se detetando a violação objeciva de «disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares» ou a infração de «regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado» de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos, razão pela qual não se verifica o pressuposto de ilicitude.
Considera que sempre que os tribunais nas diversas instâncias foram chamados a intervir, fizeram-no de forma mais expedita possível e que o processo em causa teve a tramitação própria prevista na lei, que respeitou as diversas incidências ocorridas. E que, sendo certo que desde o início da ação declarativa até à decisão final na ação executiva terão decorrido cerca de 20 anos e 2 meses, não basta a simples ou mera violação dum prazo previsto na lei para a prática de certo ato judicial, para concluir logo no sentido de que foi violado o direito à justiça em prazo razoável.
A respeito da culpa advoga que os factos não a revelam, pois, o período que decorreu entre o início da ação declarativa e a decisão final está justificado e o atraso não decorreu de qualquer atuação censurável dos magistrados judiciais, nem dos funcionários, que acompanharam o standard de produtividade e de diligências médios e pautaram a sua atividade funcional pela diligência exigível. Considerando que os elementos do processo apreciado não revelam que foi por organização deficiente dos serviços que houve o alegado atraso, afastando-se, assim, a “culpa funcional e colectiva dos serviços”.
Nega os danos, considerando que os mesmos não se encontram documentados e provados e que, a existirem, derivam apenas da incapacidade da A. saber gerir a sua situação financeira, não sendo atendíveis os danos sofridos pelos administradores e trabalhadores, que não são parte nos autos. Aduz que a A. não alegou factos concretos para alicerçar a peticionada indemnização por danos não patrimoniais e o conceito de gravidade exigido pelo artigo 496.º do CC não se preenche com uma mera alegação conclusiva e abstrata, não havendo lugar a indemnização sem prova dos danos. E que mesmo que se admitisse que a A. sofreu os alegados danos, o montante indicado é exagerado.
Adianta que não se encontra provado o nexo de causalidade porquanto foi a incapacidade da A. saber gerir os seus interesses fazendo opções inadequadas a causa determinante dos danos invocados.
Vejamos.
É pacífico que, por força do artigo 22.º da C.R.P, o Estado é civilmente responsável pelos danos resultantes do mau funcionamento da administração da justiça, incluindo os decorrentes da violação do direito à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável, consagrado no artigo 6.º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 20.º, n.º 4 da CRP.
O regime dessa responsabilidade civil é o previsto no Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Publicas, anexo à Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro (doravante RRCEEEP), que no seu artigo 12.º estabelece que “Salvo o disposto nos artigos seguintes, é aplicável aos danos ilicitamente causados pela administração da justiça, designadamente por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, o regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa”.
Nos termos do RRCEEEP, são pressupostos - cumulativos - para a efetivação da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas na administração da justiça, a existência de um facto ilícito e culposo, que tenha provocado danos e a verificação de um nexo de causalidade entre aquele facto e os danos verificados.
O facto é entendido como um ato conteúdo positivo ou negativo, como uma conduta de um órgão ou do seu agente, no exercício das suas funções e por causa delas.
No caso, os factos corresponderão à violação do dever de proferir decisão em prazo razoável no âmbito do processo instaurado pela A., que correu termos no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, na sua fase declarativa sob o número 00/00 e na fase executiva sob o número .../...BELSB. Ou seja, o facto corresponde à atividade e sua omissão, do Réu, Estado português, na organização e funcionamento do sistema de justiça, enquanto poder judicial.
Exige-se, depois, a ocorrência de uma ilicitude, comportando uma lesão antijurídica que se traduz na violação objetiva de uma norma, princípio jurídico, regras de ordem técnica ou deveres de cuidado, da qual resulte a ofensa de direitos e interesses legalmente protegidos. Ou seja, depende de um comportamento ativo ou omissivo voluntário do órgão ou agente, no exercício das suas funções e por causa delas.
Deste modo, a ilicitude reconduz-se à reprovação da conduta do agente por confronto com o plano geral e abstrato previsto na lei (por contraponto à culpa, que pressupõe uma avaliação da conduta do agente em concreto).
No que respeita concretamente à ilicitude, o artigo 9º do RRCEEEP estabelece o seguinte:
“(…)
1 – Consideram-se ilícitas as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.
2 – Também existe ilicitude quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos resulte do funcionamento anormal do serviço, segundo o disposto no nº 3 do artigo 7º”.
Este normativo faz apelo a duas componentes de ilicitude: i) a violação objetiva de normas, princípios jurídicos ou regras; ii) ofensa a direitos e interesses legalmente protegidos.
E entende-se que o atraso na decisão de processos judiciais é ilícito quando viola o direito a uma decisão em prazo razoável garantido pelos artigos 20.º, n.º 4, da CRP, 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e 2.º, n.º 1 do CPTA, podendo, por isso, ser gerador da responsabilidade civil do Estado.
No que respeita à determinação da razoabilidade da duração do processo, a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e do STA têm entendido «que um processo decorreu para além do “prazo razoável” quando o mesmo foi decidido para além do momento em que, em circunstâncias normais, deveria ter sido decidido e que esse atraso se ficou a dever ao deficiente e culposo funcionamento da “máquina judicial” (em sentido lato)» (Ac. deste TCA Sul de 19.5.2022, proferido no processo 781/20.5BELRA, disponível em https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/d06a8c0c48cff6958025884b0047d954?OpenDocument).
A ponderação sobre a razoabilidade da duração dum processo não deve ser feita em abstrato, mas sim, em conformidade com a jurisprudência emanada do TEDH a respeito do n.º 1 do artigo 6.º da CEDH, “a razoabilidade do prazo deverá ser aferida mediante critérios, como a complexidade do processo, o comportamento do recorrente e das diversas autoridades envolvidas no processo, o modo de tratamento do caso pelas autoridades judiciais e administrativas e as consequências da delonga para as partes, entre outros” (Ac. deste TCA Sul de 28.5.2020, proferido no processo 1225/17.5BESNT, disponível https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/65780bce77cfa2588025857a002c1771?OpenDocument).
Tal como se adiantou, entre outros, no Acórdão do STA de 10.9.2014, proferido no processo 090/12 (disponível em https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/0/fa9539d374a3b21780257d580052c55f?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1), na “apreciação haverá que considerar todas as coordenadas do caso, como a duração média daquela espécie, a complexidade e ocorrências especiais, os incidentes suscitados, entre outros factores, e que excluir o tempo de atraso injustificado que tenha ficado a dever-se à actuação da parte que pede a indemnização”, entendendo-se que, “[q]uando, considerando o processo na sua globalidade, é manifesto que a sua duração ultrapassou o prazo razoável, não há que apreciar se foram cumpridos os prazos processuais relativos a cada acto, pois, ainda que assim se considerasse, não se poderia infirmar aquela conclusão, porque o Estado sempre teria que prover à criação de outros ou diferentes meios, mecanismos, prazos, organização para atingir o objectivo de administrar a justiça em prazo razoável”. Isto é, como se defende no Ac. do STA de 9.10.2018, n.º 0319/08, se analisada na globalidade o tempo de duração da ação e o seu estado, “a conclusão que se recolher deste conspecto for clara e seguramente no sentido de que foi ultrapassado o prazo razoável não deveremos perder-nos na floresta dos meandros processuais à procura de saber se foi ou não cumprido religiosamente cada um dos prazos dos actos daquele percurso. Uma situação deste tipo pressupõe evidentemente uma opinião praticamente unânime de um universo de apreciadores que o julgador pode prefigurar e portanto ocorre apenas quando a demora processual seja chocante, inaceitável, para os critérios do homem comum e das suas expectativas ponderadas sobre o andamento da máquina da administração da justiça.”
Refira-se, ainda, que de acordo com a jurisprudência do TEDH, a duração média – que corresponde à duração razoável – de um processo em 1ª. instância é de cerca de 3 anos e a duração média de todo o processo deve corresponder, em princípio, a um período que vai de 4 a 6 anos, salvo casos especiais (cf. Isabel Celeste Fonseca, in CJA, nº. 72, pags, 45 e 46).
E que “para o cômputo desse prazo global releva não apenas a fase declarativa, desde o seu início, mas também a fase de execução judicial, importando apurar, no todo, o tempo em que decorreu até que uma dada pretensão formulada em juízo fosse efectivamente conhecida ou satisfeita” (Ac. deste TCA Sul de 9.5.2019, proferido no processo 2093/16.0BELSB, consultável em https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/69c694d6281ef26b802583f6003a4584?OpenDocument).
Feito este enquadramento importa considerar que a ação, tramitada na sua fase declarativa sob o número 00/00, foi instaurada em 17.1.2001, estando ali em causa uma ação sobre contratos e sobre responsabilidade das partes pelo seu incumprimento, tramitada, então, à luz dos artigos 71.º e 72.º da LPTA, que remetiam para o processo civil de declaração na sua forma ordinária (artigo 71.º, n.º 1 da LPTA), em que a A., aqui Recorrente, na qualidade de empreiteira demandava o réu, dono da obra (Hospital de Santa Marta), invocando como causa de pedir o contrato de empreitada de obra pública que celebrou com o réu e que rescindiu alegadamente por culpa exclusiva do dono da obra - «supressão de trabalhos» ditada pelo dono da obra, «suspensões parciais da obra» motivada por alterações ao projeto introduzidas pelo dono da obra, «falta de satisfação das indemnizações reclamadas» por si junto do dono da obra em consequência daquelas suspensões, e «demora na entrega de elementos técnicos» imputável ao dono da obra -, pedindo a condenação do R. a pagar-lhe várias quantias líquidas, e os respetivos juros, relativas a trabalhos contratuais e extra-contratuais não liquidados, a danos emergentes por imobilização do seu estaleiro, equipamento e pessoal, por dívidas a fornecedores e por despesas com a manutenção de «garantias bancárias», a lucros cessantes, a contratos de aluguer de equipamento e a danos não patrimoniais e, bem assim, a libertação das garantias bancárias retidas (factos A. , PP. e QQ.).
Verifica-se que o ali réu apresentou contestação em 23.2.2001, na qual deduziu reconvenção peticionando a condenação da empreiteira, reconvinda, no pagamento de várias quantias líquidas, relativas a adiantamentos que lhe foram feitos e não reembolsados, à diferença correspondente à supressão de trabalhos, ao acréscimo de despesas com fiscalização, e à indemnização de prejuízos patrimoniais e não patrimoniais (factos B. e QQ.), de que resultou a apresentação de réplica pela autora em 17.4.2001 e de tréplica pelo réu em 4.5.2001 [factos C) e D)].
A realização da audiência preliminar ocorreu cerca de 9 meses após os articulados, em 27.2.2002, iniciando-se o julgamento, mais de 3 anos depois, em 6.6.2005, com a duração de 5 sessões de julgamento até 28.11.2005 (factos E., G., J., L., M. e N.), com a resposta aos quesitos a dar-se em 12.12.2005 e apresentadas alegações de direito em 4.1.2006 (factos O. e P.).
A sentença, todavia, só foi proferida, mais de dois anos após as alegações, em 17.6.2008 (facto S.), notando-se que a 30.11.2006 houve lugar à renúncia do mandato do advogado da A., que apenas constitui novo mandatário em 28.9.2007 (factos Q. e R.). Nessa sentença, além do mais, condenou-se o R.
Nos autos houve, ainda, em 6.6.2005, lugar a recurso da decisão que julgou materialmente competente o Tribunal para a apreciação do pedido reconvencional, o qual foi admitido em 14.6.2005, alegando a autora em 6.7.2005, e veio a subir ao Supremo Tribunal Administrativo em 28.5.2015 e, por aquele Tribunal foi decidido, negando provimento, em 29.10.2015 (factos H., I., K., NN., OO. e PP.).
Apresentando a A. em 2.7.2008 requerimento de recurso da sentença e solicitando os suportes de gravação da mesma (factos T. e U), estas apenas lhe foram entregues em parte em 17.4.2009 e, perante a informação da secretaria do desaparecimento da correspondente à sessão de julgamento de 27.6.2006 (factos Y, Z e AA), a autora requereu, em 4.5.2009 e 6.5.2009, a anulação do julgamento com a consequente repetição do mesmo.
Após renúncia da mandatária do R. em 11.9.2009, mais de 3 anos depois com o processo sem qualquer tramitação, em 9.12.2012 foi proferido despacho, o qual declarou a instância interrompida (factos BB. e CC.). Tão só em 16.9.2013 o Tribunal ordenou a realização de diligências para localizar as cassetes desaparecidas, as quais se localizaram em 14.10.2013, vindo a A. a requerer a sua confiança em 7.11.2013 e a solicitar o reinício do prazo de recurso em 8.11.2013 (factos DD a GG).
Realizada diligência de partes em 26.11.2013, na sequência de despacho de 12.11.2013, foi concedido um prazo de suspensão da instância e determinado o reinício do prazo de recurso. Sendo que, entregues as cassetes em 4.12.2013, as alegações de recurso foram apresentadas em 28.1.2014 (factos JJ e KK). Mas, apenas em 9.7.2014, o Tribunal ordenou a subida do recurso da sentença ao STA, o qual veio a proferir decisão, aproximadamente 1 ano e 10 meses depois, em 12.5.2016 (facto QQ).
Refira-se que desse Acórdão do STA, de 12.5.2016, consta da sua fundamentação que, no que respeita ao segmento da decisão recorrida que condenou a autora/recorrente a pagar à Ré o valor das 5.177.493$00 (IVA incluído) acrescido de juros, a título de danos emergentes por dívidas a fornecedores, foi decidido que assistia razão à recorrente, pelo que a mesma não teria de pagar esta quantia à Ré/recorrida, antes o devia receber da mesma Ré, concedendo-se parcial provimento ao recurso interposto pela autora/recorrente e, consequentemente, revogada nessa parte a decisão recorrida. Contudo, no segmento decisório apenas se consignou que “concede-se parcial provimento ao recurso interposto pela recorrente, e consequentemente revoga-se a decisão recorrida no que concerne à condenação da autora/recorrente no pagamento das importâncias supra referidas, mantendo o mais decidido na decisão recorrida”, ou seja, não se procedeu à condenação da Ré ao pagamento daquela quantia à Autora/recorrente tal como peticionado (factos PP e YY).
A A., em 29.9.2016, instaurou contra o Hospital de Santa Marta o processo de execução visando o pagamento da dívida de € 119.066,95, juros vencidos no valor de € 172.817,78 e juros vincendos, resultantes da condenação decorrente do Acórdão do STA de 12.5.2016 (facto SS).
A sentença da fase de execução foi proferida em 12.11.2018, dela interpondo recurso a A. em 1.2.2019. O despacho de admissão foi proferido em 24.6.2019 e proferida decisão sumária no recurso em 14.11.2019 (factos TT a UU).
Em 14.9.2020 a A. requereu a retificação do Acórdão do STA de 12.5.2016 por erro material no segmento decisório, vindo a ser proferido Acórdão em 11.3.2021.
Como resulta do exposto, entre a instauração da ação (em 17.1.2001) e o termo, com a prolação do Acórdão de retificação (em 11.3.2021), o processo, nas suas fases declarativa e executiva, teve a duração global de 20 anos, 1 mês e 23 dias, revelando-se atrasos significativos na sua tramitação. Duração essa que, num juízo de evidência e sem margem para dúvidas, se apresenta como patentemente desrazoável e inaceitável, à luz dos critérios do homem comum e das suas expectativas ponderadas sobre o andamento da máquina da administração da justiça.
Isto é, não estamos perante uma situação em que não é ostensivo que a duração do processo tenha ou não ultrapassado o prazo razoável e em que, portanto, desempenha um papel relevante o critério analítico do cumprimento ou não dos prazos processuais, nem tão pouco em que seja indubitável que a duração do processo se considera razoável, hipótese em que não interessa averiguar se num caso ou noutro houve atraso.
A situação dos autos revela com clareza e segurança que a duração do processo ultrapassou o que se se deve considerar um “prazo razoável”, nos termos em que o art.º 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o art.º 20º, n.º 1 da CRP consagram.
Na determinação desse prazo razoável são de atender, como demos nota, aos standards assinalados como um tempo razoável e que para a tramitação de uma ação declarativa em 1.ª instância correspondem ao período de 3 anos, sendo que a duração média de todo o processo deve corresponder a um período que vai de 4 a 6 anos.
No caso dos autos assinala-se, é certo, a complexidade que revestiam as matérias tratadas, não por clamarem pela aplicação de um quadro legal difícil ou complexo, mas porque, na dimensão do apuramento de responsabilidade contratual na execução de uma empreitada de obra pública e do seu equilíbrio económico financeiro, numa ação de duas frentes, face ao pedido reconvencional, a produção e avaliação da prova assumem dificuldade, de resto revelada pelo número de sessões de julgamento que se realizaram.
Não se encontra, contudo, demonstrado que o litígio tenha revestido particular importância à atividade (empreiteira) desenvolvida pela A., designadamente como fora alegado detendo aptidão a determinar a rutura na gestão da empresa ou de gerar acrescida preocupação aos responsáveis e trabalhadores da A.. Daí que tal importância não passará daquela que, em situações semelhantes, representam para as empresas do setor das empreitadas de obra públicas os litígios com o dono de obra respeitantes à execução contratual.
Ora, não obstante a sua delonga, não se verifica que, no essencial, o comportamento processual das partes tenha contribuído para aquela. Houve lugar a recursos, da decisão que julgou materialmente competente o Tribunal e, bem assim, das sentenças proferidas nas fases declarativa e executiva, mas “segundo a jurisprudência deste STA e do TEDH [5 Cf. citados acórdãos do STA de 01.03.2011, rec. 336/10 e de 09.10.2008,: rec. 319/08 e jurisprudência do TEDH neles citada (Acórdãos Bucholz, A 42, p.21, §63, Zimmermann e Steines, A 66, p. 29§29 e caso Pulido Garcia, Queixa n° 11499/ 85, Déc. Rap, 68, p.5.), o facto de as partes utilizarem os meios processuais que a lei interna lhes permite, não pode relevar como comportamento censurável a atender para efeitos de excluir a responsabilidade do Estado pela duração de um processo para além do prazo razoável, a não ser que deles façam um uso abusivo ou pré-determinado a atrasar o processo” (Ac. do TCA Sul de 14.6.2018, proferido no processo 684/04.0BELRA, https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/b1dea22c4aed05f1802582bb0051ae5a?OpenDocument).
O que se constata é que o fator determinante do atraso não foram vicissitudes complicadas ou pesadas, mas sim, longos períodos de paragem do processo decorridos na sua tramitação, designadamente entre o fim dos articulados e a realização da audiência prévia (9 meses), o início do julgamento (3 anos), a prolação da sentença (2 anos após as alegações), do requerimento de recurso e pedido dos suportes da gravação até ao momento em que o Tribunal ordena a sua localização (5 anos), possibilitando a apresentação das alegações, da apresentação do recurso à sua subida ao tribunal superior (6 meses), o período para a decisão do recurso (1 ano e 10 meses), à duração de 3 anos do processo executivo. Sendo que no recurso em separado decorreu um período de cerca de 10 anos entre as alegações e a sua subida ao STA, e consequente decisão.
A tal respeito, note-se que o TEDH tem considerado que a existência de longos períodos durante os quais o processo não seja tramitado, sem qualquer justificação para o efeito, não é aceitável, para efeitos da razoabilidade da duração do processo (§ 33 do acórdão proferido em 24/11/1994, Proc. n.º 15287/89, BEAUMARTIN v. FRANCE, in http://hudoc.echr.coe.int/eng).
Neste contexto, reputando-se, face aos elementos supra referidos, como prazo razoável os 6 anos para a duração global do processo, ocorre o requisito ilicitude, no caso, por o tempo de tramitação do processo, nas suas fases declarativa e executiva, ter demorado 20 anos, 10 meses e 23 dias, quando deveria ter demorado um máximo de 6 anos.
E o mesmo é dizer que a A. demonstrou, claramente, a violação do seu direito a obter uma decisão judicial definitiva em prazo razoável, conforme este se mostra consagrado no art.º 20º, n.ºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa e art.º 6º, § 1º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a revelar a ilicitude da conduta do R.
No que respeita à culpa, como se escreveu no Ac. do TCA Sul de 30.1.2020, proferido no processo 52717.4BELRA, disponível em https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/7e634d04dd26ee268025850700326211?OpenDocument)
“Quanto à culpa, é entendida enquanto um juízo subjectivo ou de censurabilidade, que liga o facto ao agente, por ter praticado a própria conduta ilícita ou por ter violado regras jurídicas ou de prudência que tinha obrigação de conhecer e adoptar.
Por aplicação dos art.ºs. 10.º, n.º 1, e 12.º da Lei n.º 67/2007, de 31-12, a culpa é apreciada pela diligência que é exigível, em abstracto, a um titular de órgão, funcionário ou agente zeloso e cumpridor em face do circunstancialismo próprio do caso concreto.
Estando em causa uma responsabilidade pelo ilícito, não se exige uma culpa subjectivada, a culpa personalizável no próprio autor do acto, aceitando-se como bastante uma culpa do serviço, globalmente considerado. Considera-se, pois, que da circunstância dos serviços de justiça não funcionarem de acordo com os standards de qualidade e eficiência que são expectáveis num Estado de Direito, decorre a indicada culpa, que aqui é apreciada enquanto uma culpa anónima ou de serviço (cf. art.º 7.º da Lei n.º 67/2007, de 31-12).
Por aplicação do art.º 10.º, n.º 2, da Lei n.º 67/2007, de 31-12, há aqui uma inversão da regra geral do ónus da prova prevista no art.º 344.º, n.º 1, do CC, presumindo-se a culpa, salvo prova em contrário (cf. art.º 350.º, n.º 2, do CC).”
Isto posto, aplicando-se aqui a presunção de culpa do art. 10.º, n.º 2 do RRCEEEP, cabe ao autor da lesão a prova principal de que não teve qualquer culpa na ocorrência geradora dos danos, bem como a de que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias, adequadas a evitar o facto, ou de que este se deveu a caso fortuito ou de força maior só por si determinante do evento danoso.
Considerando o que supra se indicou a respeito do prazo in casu razoável, temos que o atraso corresponde ao período posterior aos 6 anos em que a duração do processo é considerada razoável e até à data do Acórdão de retificação, entre 18.1.2007 e 11.3.2021 (14 anos, 3 meses e 22 dias).
E quanto a este, o Estado Português nada demonstrou relativamente às razões a ele subjacentes, limitando-se a alegar que os seus agentes atuaram em concordância com as normas processuais aplicáveis, não tendo o atraso decorrido de qualquer atuação censurável dos magistrados judiciais, nem dos funcionários, que acompanharam o standard de produtividade e de diligências médios e pautaram a sua atividade funcional pela diligência exigível. E que os elementos do processo apreciado não revelariam a organização deficiente dos serviços.
Mas a tal respeito nada provou. Isto é, nesse conspecto, não ilidiu a presunção de culpa que sobre si recaía.
Daí que se mostre inegável a existência de uma culpa de serviço, que revela que a administração da justiça não funcionou de acordo com os standards de qualidade e eficiência que são expectáveis num Estado de Direito, desde logo porque não conseguiu efetivar num tempo mais curto e portanto mais razoável a justiça devida e, consequentemente, porque não se prolatou a decisão com maior prontidão (cf. art.º 7.º da Lei n.º 67/2007, de 31-12).
Analisaremos, seguidamente, e pela sua ligação intrínseca o preenchimento dos pressupostos do dano e do nexo causalidade entre o facto e o dano.
Como se sabe, «[p]ara haver obrigação de indemnizar, é condição essencial que haja dano, que o facto ilícito culposo tenha causado um prejuízo a alguém» (cf. Antunes Varela, Das Obrigações em geral, Vol. I, Coimbra, 1986, p. 557). Os danos tanto podem ser patrimoniais como morais.
«Alude-se ao dano patrimonial ou material para abranger os prejuízos que, sendo susceptíveis de avaliação pecuniária, podem ser reparados ou indemnizados, senão directamente (mediante restauração natural ou reconstituição específica da situação anterior à lesão) pelo menos indirectamente (por meio de equivalente ou indemnização pecuniária). Ao lado destes danos pecuniariamente avaliáveis, há outros prejuízos (como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética), que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização» (cf. Antunes Varela, Das Obrigações em geral, Vol. I, Coimbra, 1986, p. 561).
O critério da indemnização é o da restauração natural, sendo a indemnização em dinheiro apenas atribuível quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa (art.º 3.º, n.º 2, RRCEEEP).
Nos casos em que não possa ser averiguado o valor exato dos danos (em função do critério da teoria da diferença), o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados – cfr. nº 3 do art. 566.º do mesmo Código -, funcionando, por conseguinte, em sede de danos patrimoniais, a equidade como critério residual, apenas para o caso de não ter sido possível averiguar o valor exato dos danos – cfr. Ac. STJ de 19/02/2004, Proc. n.º 03B4271, in base de dados do ITIJ.
Importa, ainda, considerar que no âmbito destas ações de efetivação de responsabilidade civil por atraso na justiça, se considera que “[o] atraso da justiça consubstancia, portanto, um dano não patrimonial pelo atraso, pelo mau funcionamento do serviço que não proferiu a decisão judicial em prazo adequado. O dano resulta do atraso em si mesmo e não de um prejuízo patrimonial, efectivo ou potencial, que possa ser imputado a esse atraso; neste segundo caso estamos antes perante um dano autónomo, que carece de prova, não só da prova dos prejuízos sofridos, mas também do nexo de causalidade entre o atraso e a produção desses prejuízos. Já o dano moral pelo atraso, que resulta (objectivamente) do funcionamento anormal do serviço de justiça [acórdão do STA de 22.06.2023 (proc. 02168/16.5BELSB)] é presumido, assim como o respectivo nexo de causalidade”. (Ac. do STA de 18.12.2024, proferido no processo 01888/19.7BEPRT, disponível em https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/59e1a7ba3b62213480258c070042eeed?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1). Sem prejuízo, “a presunção de danos morais é ilidível, podendo o julgador concluir que a sua verificação não resultou provada” Ac. do STA de 4.6.2020, proferido no processo 01510/13.5BEPRT 01389/17), disponível em (https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/88fb648d329ee0fc8025857e00468f6f?OpenDocument).
A este respeito escreveu-se no Ac. TCA Sul de 14.6.2018, proferido no proc. 931/16.6BELSB (disponível em https://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/e5d2dd5721e74a8c802582be00481515?OpenDocument),
“No que concerne ao pressuposto dano, corresponderá à lesão ou ao prejuízo de ordem patrimonial ou não patrimonial produzido na esfera jurídica de terceiros, decorrente da demora na tramitação do processo, ou na decisão, ou na adopção tempestiva procedimentos cautelares e de medidas provisórias que tenha sido oportunamente requeridas para se acautelar direito.
[…]
Por via da jurisprudência do TEDH tem sido igualmente entendido que se deve presumir a existência de danos não patrimoniais como consequência da demora excessiva de um processo judicial, não sendo necessário ao A. alegar e provar esses mesmos danos. Será um dano comum, que se apura de acordo com as regras da vida, inerente a todas as pessoas (singulares) que são vítimas de um atraso na justiça. Logo, a alegação e prova só nestas acções só serão exigíveis nos casos em que os danos excedam os normalmente produzidos nestas situações (cf. neste sentido, entre outros, os Acs. do TEDH n.ºs 62361, de 29-03-2006, Riccardi Pizzati c. Itália ou 50262/99, de 22-06-2004, C. Bartl c. República Checa).
[…]
Tal presunção da existência de danos não patrimoniais é, no entanto, ilidível, aceitando-se que haja casos em que a duração excessiva do processo provoca apenas um dano moral mínimo ou, até nenhum dano moral (cf. art.ºs 346.º e 351.º do CC).
Quanto ao montante do dano não patrimonial, regem os art.ºs. 496.º, nº 3 e 494.º do CC, quando indicam que o montante da indemnização deve ser fixado equitativamente, tendo em atenção a situação económica do lesante e do lesado e as demais circunstâncias do caso, como o grau de culpabilidade do agente (cf. também art.º 41.º da CEDH).
Ainda aqui, há igualmente que atender à jurisprudência do TEDH, que tem exigido que a indemnização a atribuir pelo juiz nacional seja razoável e em montante idêntico aos atribuídos por aquele TEDH para casos semelhantes. Para aferir os casos semelhantes o TEDH compara os números de anos, o número de jurisdições em que os casos correram, a importância dos interesses em jogo, o comportamento das partes e considera as situações para um mesmo país (c. neste sentido, entre outros, os Acs. do TEDH n.º 36813/97, de 29-03-2006, Scordino c. Itália, 64699/01, de 29-03-2006, Musci c. Itália ou 64890/01, de 10-11-2004, Apicella c. Itália).
Ou seja, para aferir do quantum da indemnização a arbitrar nos processos de indemnização decorrentes de atraso na decisão de processo judicial deve considerar-se os padrões fixados, quer na jurisprudência nacional, quer do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Sobre o assunto, indicando os vários montantes para os casos “semelhantes”, pronunciou-se detalhadamente o STA no Ac. n.º 01004/16, de 11-05-2017, ali se referindo o seguinte: ”quanto aos montantes que concretamente têm sido fixados pelo «TEDH» no quadro de petições dirigidas contra o Estado Português, aqui também R., invocando a violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, ressaltam, nomeadamente, as condenações de:
- 4.000,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 27.10.2009, no c. «Ferreira Araújo do Vale», §§ 22, 24 e 27 - relativo ao atraso verificado em ação (declarativa e executiva) instaurada no Tribunal de Trabalho ainda pendente e que se estendia já por 04 anos e 09 meses para uma só instância];
- de 3.500,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 13.04.2010, no c. «Ferreira Alves n.º 6», §§ 23 e 51 - relativo ao atraso verificado, nomeadamente, em ação de regulação de poder paternal/direito visitas que durou 07 anos e 11 meses, para dois graus de jurisdição];
- de 28.000,00 € [para um A.] [valor final esse correspondente à redução ao montante de 43.000,00 € do que foi o montante arbitrado ao mesmo na ação indemnizatória interna] e de 11.000,00 € [para outros dois AA.] [valor final esse correspondente à redução ao montante de 21.000,00 € do que foi o montante arbitrado aos mesmos na ação indemnizatória interna] [no Ac. daquele Tribunal de 12.04.2011, no c. «Domingues Loureiro e outros», §§ 55, 60 e 68 - relativo aos atrasos verificados em ação cível (acidente de viação) e na ação indemnizatória fundada no atraso na administração da justiça, que, respetivamente, duraram 14 anos, e 20 dias para três instâncias percorridas, e 12 anos, 06 meses e 19 dias, numa só instância];
- de 1.200,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 20.09.2011, no c. «Ferreira Alves n.º 7», §§ 38 e 53 - relativo ao atraso verificado em ação cível para cobrança de dívida que durou 08 anos, 08 meses e 12 dias para três instâncias percorridas];
- de 7.600,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 04.10.2011, no c. «Ferreira Alves n.º 8», §§ 69/71 e 95 - relativo ao atraso verificado em três ações cíveis que duraram, respetivamente, 10 anos, 06 meses e 28 dias para duas instâncias, 12 anos, 05 meses e 01 dia para duas instâncias, e 09 anos e 14 dias para quatro instâncias];
- de 16.400,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 31.05.2012, no c. «Sociedade C. Martins &Vieira n.º 4», §§ 48/49 e 68/70 - relativo ao atraso verificado em duas ações cíveis (falência/verificação créditos e ação para efetivação de responsabilidade contratual por construção defeituosa de um imóvel) que, respetivamente, duraram 15 anos, 05 meses e 03 dias, para três instâncias, e 04 anos, 03 meses e 28 dias para duas instâncias] [aquele montante corresponde ao valor global arbitrado, resultante da soma duma primeira verba indemnizatória de 14.400,00 € (respeitante aos danos não patrimoniais decorrentes do atraso na ação falimentar) e duma segunda de 2.000,00€ (relativa aos danos pelo atraso na outra ação)];
- de 5.000,00 € [para uns requerentes] e de 4.800,00 € [para outros requerentes] [no Ac. daquele Tribunal de 16.04.2013, no c. «Associação de Investidores do Hotel Apartamento Neptuno e outros», §§ 48/50 e 77 - relativo ao atraso verificado em ações cíveis (de recuperação empresas, de falência, de reclamação e verificação créditos e ação para execução especifica de contrato-promessa) que, respetivamente, duraram 16 anos, 01 mês e 01 dia, para três instâncias, 18 anos, 04 meses e 13 dias para três instâncias, 14 anos, 03 meses e 20 dias em duas instâncias, e 14 anos, 05 meses e 12 dias numa só instância];
- de 15.600,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 30.10.2014, no c. «Sociedade C. Martins &Vieira e outros», §§ 50 e 73 - relativo ao atraso verificado em processo penal que durou 14 anos e 09 meses numa só instância] [quantia essa a ser repartida pelos três requerentes - 5.200,00 €];
- de 3.750,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 04.06.2015, no c. «Liga Portuguesa de Futebol Profissional», §§ 88 e 100 - relativo ao atraso verificado em ação laboral que durou 09 anos e 07 meses, para três instâncias];
- de 11.830,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 29.10.2015, no c. «Valada Matos das Neves», §§ 111 e 117 - relativo ao atraso verificado em ação de reconhecimento de direito quanto à existência de contrato trabalho com autarquia que durou 09 anos, 11 meses e 20 dias, num único grau de jurisdição].
LIII. Já no plano interno e quanto aos litígios que concretamente têm sido julgados por este Supremo e os montantes fixados nas condenações do Estado Português por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável resulta, nomeadamente, o seguinte:
- 5.000,00 € [2.500,00 € para cada um dos AA.] [no Ac. do STA de 28.11.2007 (Proc. n.º 0308/07) - relativo ao atraso verificado em ação cível (despejo), que intentada em 18.01.1995 ainda estava pendente em 2003, percorrendo duas instâncias];
- 5.000,00 € [2.500,00 € para cada um dos AA.] [no Ac. do STA de 09.10.2008 (Proc. n.º 0319/08) - relativo ao atraso verificado em execução sentença cível, intentada em 30.01.1997 e que perdurou até 22.02.2002, data em que foi declarada suspensa a instância nos termos do art. 882.º do CPC (na redação à data vigente), percorrendo duas instâncias];
- 10.000,00 € [no Ac. do STA de 09.07.2009 (Proc. n.º 0365/09) - relativo ao atraso verificado em ação cível (acidente de viação) intentada em 15.07.1983 e que perdurou até 30.10.2003 (data em que se iniciaria a audiência de discussão e julgamento e em que o processo terminou por transação), correspondendo a uma duração superior a 20 anos numa só instância];
- 10.000,00 € [para um A.] e 5.000,00 € [para cada um dos dois outros AA.] [no Ac. do STA de 01.03.2011 (Proc. n.º 0336/10) - relativo ao atraso verificado em ação cível (inventário facultativo instaurado em 13.12.1981), pendente à data da instauração indemnizatória, ia para 26 anos, e sem que tivesse terminado, tendo percorrido duas instâncias];
- 3.550,00 € [para um A.] e 1.500,00 € [para o outro A.] [no Ac. do STA de 15.05.2013 (Proc. n.º 01229/12) - relativo aos atrasos verificados em processos tributários (impugnações judiciais - uma relativa a «IVA» e outra a «IRC»), processos que, tendo sido apresentados em juízo em 19.02.2003 só foram julgados em 18.10.2006, isto é, cerca de 03 anos e 08 meses depois da sua apresentação, sem que tivessem ocorrido incidentes anormais e em que os atrasos, fundamentalmente, resultaram de duas «paragens» do processo, a primeira, entre a contestação e a inquirição de testemunhas - mais de um ano - e, a segunda, entre a notificação para a apresentação das alegações finais e o julgamento - quase dois anos -, tendo percorrido apenas uma instância];
- 4.000,00 € [no Ac. do STA de 14.04.2016 (Proc. n.º 01635/15) - relativo ao atraso verificado em processo de menores (regulação do poder paternal), instaurado em 07.07.1999 e concluído em 18.01.2011, sempre na mesma instância, sendo que no valor arbitrado foi considerado apenas o período de duração (de 04 anos) e até ao seu termino correspondente ao período que a A. interveio, após ter atingido a maioridade];
- 4.800,00 € [para cada um dos AA.] [no Ac. do STA de 30.03.2017 (Proc. n.º 0488/16) - relativo ao atraso verificado em processo penal, no qual foi deduzida acusação em 30.04.2003 e que após cerca de 12 anos (à data da emissão da sentença na ação indemnizatória - 23.07.2015) ainda estava pendente mercê de suspensão aguardando a decisão dos processos tributários de impugnação judicial instaurados relativamente às liquidações de «IRC» e de «IVA»].
Mais se refira, que atendendo à jurisprudência do TEDH, vão sendo apontados a título meramente indicativo os valores que oscilam entre 1.000,00€ e 1.500,00€ por cada ano de demora do processo – cf. neste sentido os Acs do TEDH n.ºs 65102/01, de 29-03-2006, Mostacciuolo v. Italy (n.º 2), 65075/01, de 29-03-2006, Giuseppina and Orestina Procaccini c. Italy, 64886/01, de 29-03-2006, Cocchiarella c. Italy, 64699/01, de 29-03-2006, Musci c. Itália ou 64890/01, de 10-11-2004, Apicella c. Itália. Assim apontando Fonseca, Isabel Celeste - “Violação do prazo razoável e reparação do dano: quantas novidades, mamma mia! Anotação ao Ac. do STA de 09-10-2008, Proc. 319/08”, in CJA, Braga, Cejur, n.º 72, (Nov-Dez) 2008, pp. 45-46; Ac. do STA n.º 07472/11, de 12-05-2011.”
E quanto ao pressuposto do nexo de causalidade entre o facto e o dano, aplica-se aqui, tal como para os demais casos da responsabilidade do Estado pelo ilícito, a teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, tal como vem formulada no art.º 563.º do CC, preceito segundo o qual a “obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. Ou seja, só ocorre este nexo quando os danos, em abstrato, são consequência apropriada do facto. Igualmente, se para a produção do dano a condição é de todo indiferente ou só se tornou condição em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, essa condição não será causa adequada do dano que se alega.
Evidenciando-se que “cumpre ao autor, para o efeito de preenchimento do necessário nexo causal, alegar e provar que a duração excessiva do processo foi causa adequada da verificação de danos patrimoniais” (Ac. do STA de 4.6.2020, proferido no processo 01510/13.5BEPRT, disponível em (https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/88fb648d329ee0fc8025857e00468f6f?OpenDocument).
Isto posto, do probatório nada resulta provado quanto aos danos alegados pela A., pelo que apenas há que considerar que, “de acordo com a jurisprudência reiterada deste STA, a violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável (o não cumprimento dos standards de duração razoável de um processo) consubstancia um facto ilícito e culposo (i. e., o funcionamento anormal do serviço, conforme os artigos 7.º, n.ºs 3 e 4, e 9.º, n.º 2, ambos do RCEEP), que opera a favor do A. A presunção natural (nexo de causalidade) da verificação de um relevante dano psicológico e moral comum, de natureza não patrimonial (dano), (ou seja, um dano sofrido por todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não vêem as suas pretensões resolvidas por um acto final do processo em tempo razoável)” (Ac. do STA de 18.12.2024, proferido no processo 18.12.2024, disponível em https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/59e1a7ba3b62213480258c070042eeed?OpenDocument&ExpandSection=1).
Assim, dado que o período temporal a considerar será o correspondente ao atraso, ou seja, os referenciados 14 anos, 1 mês e 22 dias, atendendo a que não se mostra provado que o litígio tenha revestido particular e especial relevância à esfera jurídica e patrimonial da A., mas não podendo deixar de se relevar a amplitude temporal do atraso, considera-se equitativo fixar em € 1.200,00 por ano, num total de € 16.800,00, a indemnização devida à A. a título de danos não patrimoniais.
A tal quantia acrescem juros de mora, à taxa legal dos juros civis, desde a citação até efetivo e integral pagamento no regime dos artigos 805.º n.º 2 b) e 806.º do Código Civil.


4.3. Da condenação em custas

Vencido, é o R./Recorrido condenado nas custas do recurso.
A A./Recorrente e o R./Recorrido são condenados nas custas da ação na proporção do respetivo decaimento que se computa, respetivamente, em 58% e 42%.
(art.ºs 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).

5. Decisão

Nestes termos, acordam os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção Administrativa Comum, do Tribunal Central Administrativo Sul, em,
a. Conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a decisão recorrida;
b. Em substituição, julgar a ação parcialmente procedente, condenando-se o R./Recorrido, Estado Português, a pagar à A./Recorrente a quantia de € 16.800,00, acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento;
c. Condenar o Recorrido nas custas do recurso;
d. Condenar a A./Recorrente e o R./Recorrido nas custas da ação na proporção do respetivo decaimento que se computa, respetivamente, em 58% e 42%.

Mara de Magalhães Silveira
Marta Cavaleira
Alda Nunes