Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:63/14.1BEFUN
Secção:CA
Data do Acordão:11/20/2025
Relator:HELENA TELO AFONSO
Descritores:DISPENSA OU REDUÇÃO DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
DIREITO DE ACESSO AO DIREITO E A TUTELA JURISDICIONAL EFETIVA
Sumário:I – O pedido de dispensa total ou parcial do pagamento do remanescente da taxa de justiça requerida após a notificação da elaboração da conta final de custas é extemporâneo.
II – A interpretação do artigo 6.º n.º 7 do RCP no sentido de que o momento da reclamação da conta de custas, não é já o momento processual, nem o meio adequado para a dedução de pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, não coloca em causa o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Contratos Públicos
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na Subseção de Contratos Públicos, da 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – Relatório:
MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ, réu nos autos à margem mencionados, notificado do despacho proferido a 7 de maio de 2025 que indeferiu o pedido do recorrente de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, e não se conformando com o teor do mesmo, veio apresentar o presente recurso.

Por despacho proferido a 7 de maio de 2025 foi proferido despacho que indeferiu o pedido do recorrente de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, com fundamento na extemporaneidade do pedido.

O réu interpôs recurso do referido despacho, apresentando alegação, na qual formulou as seguintes conclusões:
“1. O presente recurso vem interposto do despacho que indeferiu o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos do art.º 6.º n.º 7 do RCP, com fundamento na extemporaneidade do pedido.
2. A decisão recorrida é, salvo o devido respeito, que aliás é muito, injusta e muito precipitada, tendo partido de pressupostos errados.
3. Entende o Recorrente que as suas legítimas pretensões saem manifestamente prejudicadas pela manutenção da decisão recorrida.
4. Com efeito, só após a elaboração da conta, o Recorrente teve conhecimento do valor do remanescente da taxa de justiça que foi liquidado, e que passou o Recorrente a ter a correta noção do montante que lhe era imputado a título de custas e de remanescente de taxa de justiça.
5. É também só a partir desse momento que o Tribunal pode aferir da proporcionalidade entre o valor do remanescente da taxa de justiça e o serviço efetivamente prestado e apreciar a verificação dos critérios para dispensa do pagamento desse remanescente, previstos no artigo 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais.
6. Não existe nenhuma regra legal que indique o momento em que o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça deve ser deduzido.
7. O artigo 31.º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais nada dispõe e nem enumera os vícios da conta de custas final que podem ser fundamento de uma reclamação e os elementos da conta que podem ser objeto dessa reclamação.
8. Consequentemente, a reclamação da conta de custas, prevista no artigo 31.º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais, permite a impugnação não só de vícios materiais, mas também de vícios de outra natureza de que padeça.
9. A este respeito, reitera o Recorrente que a reclamação da conta do Tribunal é o meio adequado ou, pelo menos, é um dos meios disponibilizados nos termos do artigo 6. °, n.º 7 e 31.º do Regulamento das Custas Processuais, para uma qualquer parte processual solicitar a dispensa do remanescente da taxa de justiça.
10. Em face de tudo o que se expôs, a dispensa total ou parcial do pagamento do remanescente da taxa de justiça pode ser requerida após a notificação da elaboração da conta final de custas.
11. E, como tal, o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça feito pelo Recorrente é tempestivo.
12. Mesmo que assim não se entendesse - o que não se concede e apenas se refere a benefício da discussão - terá de se considerar que quando a desproporção do valor das custas é grosseiramente atentatória do princípio da proporcionalidade, deve a pretensão de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça admitir-se em sede de reclamação da conta de custas, por interpretação conforme à Constituição.
13. Neste sentido, decidiram o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 29.04.2014, no processo n.º 2045/09.6T2AVR-B.C2 e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 28.04.2016, no processo n.° 473/12.9TVLSB-C.L1- 2.
14. E assim é porque a norma do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais impõe ao juiz um poder dever, que tem de ser interpretado e aplicado à luz dos princípios constitucionais da proporcionalidade e acesso à justiça.
15. Nos presentes autos, não foram suscitadas questões jurídicas de complexidade acima do normal, não podendo os recursos interpostos configurar-se como tal, nem foram suscitados incidentes ou questões dilatórias tendentes a dificultar a normal prossecução dos autos com vista à decisão final.
16. Resulta, pois, à saciedade que o montante da taxa de justiça final fixado é manifestamente desproporcional em função do serviço prestado, pelo que, ao contrário da decisão recorrida, se impõe a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.°7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais.
17. Finalmente, e como resulta do próprio texto da decisão, esta funda-se claramente no decidido no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2022, de 3 de Janeiro de 2022.
18. Porém, e à semelhança do que consta de dois dos votos de vencido de tal acórdão - Votos dos Excelentíssimos Senhores Conselheiros Ana Paula Boularot e Paulo Rijo Ferreira - considera-se que o legislador não estabeleceu no n.° 7 do artigo 6.° do Regulamento das Custas Processuais, qualquer prazo para que as partes possam requerer ao Tribunal a prevista dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, bem como dela não decorre qualquer momento para que o Juiz use de tal poder/dever.
19. Não pode, pois, o Recorrente deixar de secundar os referidos votos de vencido, com os quais se concorda na íntegra e se dão, nesta sede, por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos.
20. Por isso, o Tribunal a quo decidiu incorretamente quando considerou extemporâneo o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça, denegando grave e manifestamente os princípios da proporcionalidade e do acesso ao direito, tribunais e tutela jurisdicional efetiva, devendo essa mesma decisão ser revogada e ser deferido o pedido de dispensa do Recorrente (ou, caso assim não se entenda, deverá ponderar-se a redução da taxa a arbitrar segundo juízos de equidade), tendo em consideração que em parte alguma o despacho recorrido nega a verificação dos requisitos previstos no art. 6.°, n.° 7, do Regulamento das Custas Processuais.
21. Não pode, pois, colher a argumentação sustentada pelo Tribunal a quo na decisão proferida.
Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá em que deverá o presente recurso proceder, por provado, e, em consequência, ser declarada revogada a decisão recorrida e substituída por outra que defira o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da totalidade ou parte remanescente da taxa justiça.”.



O Ministério Público junto do TAF do Funchal, em resposta ao recurso interposto pelo recorrente Município de Santa Cruz apresentou contra-alegação de recurso, que concluiu nos seguintes termos:
“1 - Analisado o recurso interposto pela recorrente, tanto na sua motivação como nas conclusões apresentadas, constata-se desde logo que não ocorreu qualquer violação de preceito ou princípio legal no despacho judicial que indeferiu o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça proferido pelo Tribunal a quo;
2 - O mecanismo da dispensa do remanescente das custas encontra-se previsto no art. 6°, n° 7 do RCP que dispõe: Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes dispensar o pagamento.
3 - O Supremo Tribunal de Justiça, por AUJ n.º 1/2022 (publicado no DR 1ª Série de 3/1/2022), fixou a seguinte jurisprudência:
A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem lugar, de acordo com o n.º 7 do art. 6.º do RCP, com o trânsito em julgado da decisão final do processo.
4 - Não tendo sido oportunamente requerida a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, não assiste razão à recorrente quando pretende ver o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça deferido, por via do recurso.
5 - Não se mostra violado qualquer preceito legal ou o princípio da Proporcionalidade e de Acesso à Tutela Jurisdicional Efetiva.
6 - Na fixação das custas judiciais, há-de o legislador ter sempre na devida conta o nível geral dos rendimentos dos cidadãos de modo a não tornar incomportável para o comum das pessoas o custeio de uma demanda judicial, pois, se tal suceder, se o acesso aos tribunais se tornar insuportável ou especialmente gravoso, violar-se-á o direito em causa.
7 - É, pois, perfeitamente legítimo que os custos da justiça sejam suportados, pelo menos em parte, por aqueles que deles usufruem (o princípio do utilizador pagador), assim desonerando o Orçamento do Estado, cujos recursos são naturalmente limitados.
8 - Deste modo, não ocorreu qualquer violação do princípio da proporcionalidade ou de acesso à tutela jurisdicional efetiva, como pretende fazer crer o recorrente.
9 - Nestes termos, deve ser julgado improcedente o recurso interposto pelo Recorrente e mantido o despacho posto em crise, pois fez correta interpretação e aplicação do direito, não merecendo, por isso qualquer reparo.”.

O Digno Magistrado do Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), relativamente ao recurso interposto pelo recorrente aderiu aos fundamentos de facto e de direito expressos na resposta ao recurso interposto elaborada pelo Ministério Público na primeira instância.

Sem vistos, com prévio envio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o presente processo à conferência para decisão.
*
II. Questões a apreciar e decidir:
As questões suscitadas pelo recorrente são as de decidir se o despacho recorrido que indeferiu o pedido do recorrente de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, com fundamento na extemporaneidade do pedido, incorreu em violação do previsto no artigo 6. °, n.º 7 e 31.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP), dos princípios constitucionais da proporcionalidade e acesso ao direito, tribunais e tutela jurisdicional efetiva.


III – Fundamentação:
3.1. De facto:
No despacho recorrido foi julgada a matéria de facto com interesse para a decisão, nos seguintes termos:
“Com interesse para a decisão do presente incidente, julgam-se provados os seguintes factos:
1- Em 14.09.2023, foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo que condenou em custas o Réu Município de Santa Cruz (cf. fls. 1611 do SITAF);
2 - Em 28.09.2023, transitou em julgado a referida decisão (cf. consulta do SITAF);
3) - Posteriormente, em 19.12.2023, nos presentes autos, foi elaborada conta n.º 985400001512023, nos seguintes termos:
(…)
Imagem
(cf. fls. 1649 do SITAF);
4) Em 03.01.2024, o Réu Município de Santa Cruz apresentou requerimento nos autos a peticionar a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça (cf. fls. 1659 do SITAF).
*
Inexistem factos não provados relevantes para a decisão em causa.”.
*
Importa, então, apreciar e decidir o recurso interposto pelo Réu e Recorrente, sendo as questões a decidir, tal como vêm delimitadas pela alegação de recurso as supra enunciadas em II.
*
3.2. De Direito.
Nos presentes autos de ação administrativa comum, sob a forma de processo ordinário, veio o ora recorrente Município de Santa Cruz interpor recurso do despacho proferido a 7 de maio de 2025 que indeferiu o pedido do recorrente de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, com fundamento na extemporaneidade do pedido. Alegou que só após a elaboração da conta teve conhecimento do valor do remanescente da taxa de justiça que foi liquidado, e passou a ter a correta noção do montante que lhe era imputado a título de custas e de remanescente de taxa de justiça. E que é também só a partir desse momento que o Tribunal pode aferir da proporcionalidade entre o valor do remanescente da taxa de justiça e o serviço efetivamente prestado e apreciar a verificação dos critérios para dispensa do pagamento desse remanescente, previstos no artigo 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais. Não existe nenhuma regra legal que indique o momento em que o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça deve ser deduzido e a reclamação da conta de custas, prevista no artigo 31.º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais, permite a impugnação não só de vícios materiais, mas também de vícios de outra natureza de que padeça, pelo que é o meio adequado nos termos do artigo 6.°, n.º 7 e 31.º do Regulamento das Custas Processuais, para uma qualquer parte processual solicitar a dispensa do remanescente da taxa de justiça, podendo a dispensa total ou parcial do pagamento do remanescente da taxa de justiça ser requerida após a notificação da elaboração da conta final de custas e como tal, o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça feito pelo Recorrente é tempestivo.
Vejamos.
O despacho recorrido julgou improcedente o pedido de dispensa e redução de pagamento do remanescente da taxa de justiça, mantendo-se nos autos a conta n.º 985400001512023, com a seguinte fundamentação jurídica:
“Na situação em apreço, o Réu Município de Santa Cruz contestou a presente acção administrativa contra ele intentada pela A. (a fls. 1640 do SITAF), que veio a ser julgada totalmente procedente, pelo que aquele ficou vinculado ao pagamento da taxa de justiça pela prática dos actos processuais, com base no valor atribuído à causa nos termos do artigo 11.° do RCP.
Ou seja, o valor da taxa de justiça devido pelo Réu é o que resulta da aplicação das regras gerais estabelecidas no artigo 529.°, n.° 2, do CPC e artigo 6.°, n.° 1, do RCP, em conjugação com a Tabela I-A anexa a este último.
Nessa medida, uma vez fixado à acção um valor superior a €275.000,00, o que decorre do regime acima descrito é que o valor devido do remanescente da taxa de justiça deverá ser incluído na conta final, posto que não tinha havido dispensa de pagamento do mesmo, nos termos previstos no artigo 6.°, n.° 7, n.° 1 do RCP.
Tal pagamento do remanescente da taxa de justiça poderia ser dispensado, nos termos da 2.ª parte do n.º 7 do artigo 6.° do RCP, isto é, caso o juiz oficiosamente, e de forma fundamentada, entendesse que a especificidade da situação o justificava, em face da complexidade da causa e conduta processual das partes. O que não aconteceu, de facto, no caso em apreço.
No entanto, tendo sido notificado dos sucessivos Acórdãos prolatados pelos Tribunais superiores, verificando-se, por isso, o trânsito em julgado da decisão final, o Réu não havia formulado, até agora, qualquer pedido de dispensa, nem tendo o juiz oficiosamente dispensado o pagamento em causa, foi o referido montante considerado na conta final, elaborada nos termos dos artigos 29.°, n.° 1, e 30.° do RCP (cf. artigo 6.°, n.° 7, l.ª parte, do RCP).
Como resulta do Acórdão do STJ de Uniformização de Jurisprudência n.º 1/2022, de 10/11/2021, publicado no DR I.ª Série de 3/1/2022, com o qual concordamos, "A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo".
Assim, é de concluir que da interpretação conjugada dos artigos 6.°, n.° 7, 14.°, n.° 9, 29.°, n.° 1 e 30.°, n.° 3, alínea a), todos do RCP, resulta que a dispensa ou redução do pagamento do remanescente da taxa de justiça - oficiosamente ou a requerimento das partes - tem de ser decidida antes do trânsito em julgado da decisão final da causa (cf. Salvador da Costa, "Termo do prazo de formulação do pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça", in https://bloQippc.bloQSPOt.com/2019/10/termo-do-prazo-de-formulacao-do-pedido.html').
Ante o exposto, improcede o pedido de dispensa e redução de pagamento do remanescente da taxa de justiça, mantendo-se nos autos a conta n.° 985400001512023.”.
E o assim decidido não merece qualquer censura, devendo ser confirmado, porquanto fez uma correta interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis, mostrando-se o despacho fundamentado, com citação pertinente quer de doutrina, quer de jurisprudência, concretamente o despacho seguiu a jurisprudência fixada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Uniformização de Jurisprudência n.º 1/2022, de 10/11/2021, publicado no DR 1.ª Série de 3/1/2022, que estabelece a seguinte uniformização:
A preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, tem lugar com o trânsito em julgado da decisão final do processo”.
Não existem razões para divergir deste segmento uniformizador de jurisprudência.
Ora, atento o previsto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP e seguindo a jurisprudência uniformizada considerando que:
- o acórdão proferido em 14.09.2023, pelo Supremo Tribunal Administrativo que condenou em custas o Réu Município de Santa Cruz transitou em julgado em 28 de setembro de 2023;
- a conta de custas conta n.º 985400001512023, foi elaborada em 19 de dezembro de 2023, ascendendo a quantia total a pagar pelo réu ora recorrente a € 74.256,00 (setenta e quatro mil duzentos e cinquenta e seis euros);
- a apresentação em 3 de janeiro de 2024, pelo Réu Município de Santa Cruz do requerimento a peticionar a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça é extemporâneo – cfr., designadamente, artigos 6.º, n.ºs 1 e 7, 29.º, 30.º e 31.º do RCP.
Com efeito, o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça deve ser formulado pela parte, caso não seja conhecida oficiosamente pelo Tribunal, nomeadamente aquando da prolação da sentença ou do acórdão, em momento anterior à elaboração da conta de custas, em conformidade com o previsto nas disposições conjugadas dos artigos 6.º nºs 1 e 7, 3.º, n.º 1, 14.º nºs 1, 2 e 9, 29.º, 30.º e 31.º todos do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-A anexa ao mesmo regulamento.
Assim, após a elaboração da conta o ato processual admitido relativamente à mesma será a reclamação com fundamento na sua elaboração em desconformidade com “o julgado em última instância” (cfr. artigo 30.º, n.º 1, do RCP) destinando-se a corrigir erros materiais ou de elaboração da conta em desconformidade com o previsto nos artigos 30.º, n.º 3 e 31.º, n.º 3 do RCP ou a reforma se a conta “não estiver de harmonia com as disposições legais”, como se prevê no artigo 31.º, n.º 2 do RCP.
Termos em que se conclui que o pedido de dispensa total ou parcial do pagamento do remanescente da taxa de justiça requerida após a notificação da elaboração da conta final de custas é extemporâneo.
Termos em que improcede este fundamento do recurso.
*
Defendeu, ainda, o recorrente que quando a desproporção do valor das custas é grosseiramente atentatória do princípio da proporcionalidade, deve a pretensão de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça admitir-se em sede de reclamação da conta de custas, porque a norma do n.º 7 do artigo 6.° do Regulamento das Custas Processuais impõe ao juiz um poder dever, que tem de ser interpretado e aplicado à luz dos princípios constitucionais da proporcionalidade e acesso à justiça.
Em abono da sua tese refere o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 29.04.2014, no processo n.º 2045/09.6T2AVR-B.C2 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 28.04.2016, no processo n.º 473/12.9TVLSB-C.L1- 2.
Aduz que não foram suscitadas questões jurídicas de complexidade acima do normal, não podendo os recursos interpostos configurar-se como tal, nem foram suscitados incidentes ou questões dilatórias tendentes a dificultar a normal prossecução dos autos com vista à decisão final, sendo o montante da taxa de justiça final fixado manifestamente desproporcional em função do serviço prestado, pelo que, ao contrário da decisão recorrida, se impõe a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais
Conclui dizendo que Tribunal a quo decidiu incorretamente quando considerou extemporâneo o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça, denegando grave e manifestamente os princípios da proporcionalidade e do acesso ao direito, tribunais e tutela jurisdicional efetiva, devendo essa decisão ser revogada e ser deferido o pedido de dispensa do Recorrente (ou, caso assim não se entenda, deverá ponderar-se a redução da taxa a arbitrar segundo juízos de equidade), tendo em consideração que em parte alguma o despacho recorrido nega a verificação dos requisitos previstos no artigo 6.°, n.° 7, do Regulamento das Custas Processuais
Como já acima se decidiu o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça deve ser formulado pela parte - caso não seja conhecida oficiosamente pelo Tribunal, nomeadamente aquando da prolação da sentença ou do acórdão-, em momento anterior à elaboração da conta de custas, pois após a elaboração da conta os atos processuais admitidos relativamente à mesma são a reclamação com o fundamento na sua elaboração em desconformidade com “o julgado em última instância” (cfr. artigo 30.º, n.º 1, do RCP) destinando-se a corrigir erros materiais ou de elaboração da conta em desconformidade com o previsto no artigo 30.º, n.º 3 do RCP ou a reforma se a conta “não estiver de harmonia com as disposições legais”, como se prevê no artigo 31.º, n.º 2 do RCP.
Neste sentido decidiu-se, entre outros, no acórdão do STJ, de 22/05/2018 “I - Proferida uma decisão que se refira, sem qualquer ressalva, à responsabilidade das partes pelas custas da acção, deve reconhecer-se o direito de ser suscitada perante o juiz a justificabilidade da dispensa/redução do remanescente da taxa de justiça (art. 6.º, n.º 7, do RCP), nomeadamente mediante pedido de reforma de tal segmento de decisão, desde que não seja exercitado extemporaneamente (decorrido o prazo de 10 dias subsequente à notificação da decisão), sob pena de colisão com a tipicidade processual imposta pelo princípio da legalidade, que obsta a que aquela invocação aguarde pela elaboração da conta.
II - Atendendo ao princípio da proporcionalidade a que toda a actividade pública está sujeita, a taxa de justiça deverá ter tendencial equivalência ao serviço público prestado, concretamente, ao serviço de justiça a cargo dos tribunais, no exercício da função jurisdicional, devendo a mesma corresponder à contrapartida pecuniária de tal exercício e obedecer, além do mais, aos critérios previstos nos arts. 530.º, n.º 7, do CPC, e 6.º, n.º 7, do RCP, pelo que, perante o valor da acção, o grau de complexidade dos autos e o comportamento processual das partes, poderá dispensar-se, total ou parcialmente, o pagamento do remanescente da taxa de justiça a considerar na conta a final. (1-Consultável em ECLI:PT:STJ:2018:5844.13.0TBBRG.P1.S1.F3)”.
No artigo 6.º, o legislador consagrou regras gerais relativas ao pagamento da taxa de justiça, prevendo no n.º 1 que “[a] taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela i-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.”.
Prevendo-se no n.º 7 do referido artigo 6.º “Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”.
A interpretação do artigo 6.º n.º 7 do RCP no sentido de que o momento da reclamação da conta de custas, não é já o momento processual, nem o meio adequado para a dedução de pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, não coloca em causa o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
Pois, prevendo-se a possibilidade de se efetuar a ponderação dos custos de acesso à justiça, ou seja, da prestação do serviço público de justiça, atendendo aos diversos fatores enunciados, designadamente, ao valor da ação e à complexidade da causa, em observância dos princípios da tipicidade processual e da preclusão, conclui-se que a decisão recorrida não incorreu em violação dos princípios da proporcionalidade e do acesso ao direito, tribunais e tutela jurisdicional efetiva, merecendo ser confirmada.
Nesta conformidade, não pode senão manter-se a decisão recorrida nos seus exatos termos.
*
Em face do exposto, deve ser negado provimento ao recurso e confirmado o despacho recorrido.
*
As custas serão suportadas pelo recorrente – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, todos do Regulamento das Custas Processuais.
*
IV. Decisão:
Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Subsecção de Contratos Públicos, da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar o despacho recorrido.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 20 de novembro de 2025.

(Helena Telo Afonso – relatora)

(Jorge Martins Pelicano)

(Ana Carla Teles Duarte Palma)