Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:929/13.6BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:03/17/2022
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:ATRASO DA JUSTIÇA
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DANOS MORAIS DE SOCIEDADES
Sumário:I – Não se provando que o atraso na comercialização e venda de frações de empreendimento urbanístico teve um real impacto negativo nas vendas, designadamente quanto à margem de lucro obtida a final, não se pode considerar demonstrado que esse atraso consubstanciou a existência de um dano patrimonial para o Empreiteiro.
II - Constatada uma violação do art. 6.º, § 1.º, da CEDH, relativamente ao direito à emissão de uma decisão judicial em prazo razoável, opera em favor da vítima daquela violação da Convenção, uma presunção natural da verificação de um relevante dano psicológico e moral comum, de natureza não patrimonial, sofrido por todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo em tempo razoável.
III - Tal presunção é, todavia, ilidível pelo demandado, impendendo sobre este o ónus de alegação e de prova em concreto da inexistência daquele dano e do afastamento do automatismo entre a violação constatada da Convenção e aquele dano.
IV - A indemnização por danos não patrimoniais visa compensar de forma justa, satisfatória e equilibrada aqueles que foram forçados a suportar prejuízos decorrentes de factos ilícitos de outrem.
V - De acordo com a jurisprudência do TEDH, os danos não patrimoniais de uma sociedade comercial podem incluir a respetiva reputação, a incerteza no planeamento da decisão, a rutura na gestão da empresa e, por último, ainda que em menor grau, a ansiedade e incómodos causados aos membros da equipa de gestão.
VI - A apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I Relatório
As A....., Lda., M....., Lda. e J....., S.A., devidamente identificadas nos autos, no âmbito da ação administrativa Comum, que intentaram contra o Estado Português, com os demais sinais nos autos, peticionaram originariamente a condenação deste pagar-lhes as seguintes quantias, acrescidas de outras que se vierem a liquidar e de juros vincendos, a contar da citação até integral pagamento:
i) à 1.ª autora, a quantia de €4.630.000;
ii) à 2.ª autora, a quantia de €1.339.900;
iii) à 3.ª autora, a quantia de €2.051.220.
Para fundamentarem a sua pretensão alegaram as Autoras que em 11/10/2004, o Procurador da República junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra instaurou uma ação administrativa especial contra o Município de Oeiras e contra a 3.ª autora peticionando a declaração de “nulidade, ou no mínimo a anulação do ato de licenciamento da operação de loteamento urbano” titulada pelo alvará de loteamento n.º2/2004, bem como a declaração de “nulidade, ou a anulação de todos os atos consequentes ao ato antes referido, designadamente as licenças de construção”, sendo que, em resultado de tal ação, ficaram suspensos os efeitos do alvará de loteamento n.º2/2004, ficando o Município impedido de emitir alvarás de construção para os lotes 1, 2, 3, 6 e 7 relativamente aos quais ainda não haviam sido emitidos alvarás e, em consequência, a 1.ª e a 3.ª autoras ficaram privadas de requerer a emissão dos alvarás de construção e de realizar obras nos lotes n.º1, 6 e 7 e 2 e 3, respetivamente.
Acresce que em 10/03/2005, o Ministério Público propôs contra o Município de Oeiras e contra a 1.ª e a 2.ª autoras uma outra ação administrativa especial, onde peticionou a declaração de “nulidade dos dois atos administrativos datados de 07/09/2004, ambos da autoria do Vice Presidente da Câmara Municipal de Oeiras, devidamente identificados no articulado da ação, e mediante os quais foram emitidos os alvarás de autorização n.º120/2004 RJUE e 121/2004 RJUE”, sendo que, com a citação para tal ação, a 1.ª e a 2.ª autoras ficaram impedidas de prosseguir com as obras que tinham em curso nos lotes 4 e 5, em cumprimento da notificação do Tribunal.
Alegam as autoras que a ação que correu termos no âmbito do Processo n.º1343/04.0BESNT esteve pendente de uma decisão de mérito desde 11/11/2004 até 12/04/2012 e que a ação que correu termos no Processo n.º305/05.4BESNT esteve pendente de uma decisão de mérito desde 10/03/2005 até 08/03/2013, sendo que, durante a pendência dos processos, viveram uma situação de incerteza quanto à legalidade dos seus lotes e quanto às autorizações administrativas que lhes haviam sido concedidas pelo Município de Oeiras, a 1.ª e a 2.ª autoras estiveram impossibilitadas de saber se e quando poderiam vir a prosseguir com as obras autorizadas nos lotes n.ºs 4 e 5 da sua propriedade e, durante a pendência do Processo n.º1343/04.0BESNT, a 1.ª e a 3.ª autoras ficaram impossibilitadas de promover a emissão dos alvarás de autorização para a execução de obras nos seus lotes n.ºs 1, 2, 3, 6 e 7.
Alegam, também, que, desde Setembro de 2007 até à presente data, mercê da impossibilidade de concretização dos seus projetos de investimento, suportaram um prejuízo correspondente à indisponibilidade dos montantes que razoavelmente seria de esperar que obteriam com a venda dos fogos a construir, sendo que tal prejuízo pode ser liquidado tomando por referência a taxa de rendibilidade aplicável às empresas imobiliárias (10%), correspondendo, desse modo, a um prejuízo de €15.400.000 para a 1.ª autora, €4.433.000 para a 2.ª autora e €6.197.400 para a 3.ª autora e, no limite, mesmo que não reinvestissem os montantes recebidos das vendas na sua atividade social e se limitassem a aplicar essas verbas em depósitos bancários, ter-se-ia que considerar que a 1.ª autora suportou um prejuízo nunca inferior a €4.620.000, a 2.ª autora suportou um prejuízo nunca inferior a €1.329.900 e a 3.ª autora suportou um prejuízo nunca inferior a €1.859.220, valores que provisoriamente se liquidam e se peticionam.
Acrescentam que, desde 2005 até à presente data, a 3.ª autora suportou também um prejuízo correspondente à indisponibilidade do recebimento do preço de venda dos lotes n.ºs 6 e 7, sendo que tal prejuízo pode e deve ser liquidado tomando por referência a taxa de rendibilidade aplicável às empresas imobiliárias (10%), correspondendo deste modo a um prejuízo de €640.000 e, no limite, mesmo que não reinvestisse os montantes recebidos das vendas na sua atividade social e se limitasse a aplicar essas verbas em depósitos bancários, ter-se-ia de considerar que a 3.ª autora suportou, com a perda do recebimento do preço dos lotes 6 e 7, um prejuízo nunca inferior a €192.000, valor que provisoriamente se liquida e se peticiona.
Referem que, mercê das ações judiciais e da permanência dos seus efeitos suspensivos, com a consequente manutenção da garantia bancária prestada em favor do Município, a 3.ª autora suportou encargos bancários e juros com essa garantia em montante a liquidar e que as autoras recorreram a financiamentos bancários para a aquisição dos lotes n.ºs 2, 3, 4 e 5 e apoio às construções a implantar nos mesmos, os quais importaram juros e despesas bancárias, em montantes a liquidar, que foram suportados durante o período de vigência dos embargos, sendo certo que não teriam sido suportados durante esse longo período de tempo.
Referem, também, que toda a situação descrita causou danos no seu bom nome e imagem, prejuízos que conservadoramente calculam em €5.000 para cada uma das autoras, e que com a contestação dos processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, que vieram a ser declarados improcedentes, suportaram os inerentes custos com a contratação de advogados, implicando o pagamento de honorários, taxas, certidões, deslocações e outras despesas, tudo em montantes a apurar e liquidar, sendo que, por outro lado, ficaram sujeitas à inerente tributação de IMI durante todo o longo período de tempo em que durou o impedimento de construir, o que implicou custos fiscais acrescidos que não teriam que suportar se lhes tivesse sido possível construir e comercializar os fogos de acordo com a normalidade das coisas e com a calendarização do investimento programada, gerando um prejuízo indemnizável em montantes a apurar e a liquidar em execução de sentença.
Alegam as autoras que sofreram prejuízos com a supressão dos efeitos do alvará de loteamento n.º2/2004 e com a paralisação das obras de construção a que se referem os alvarás de autorização de construção n.ºs 120/2004 e 121/2004, bem como com o prolongamento, muito para além do razoável, da indefinição da situação jurídica quanto à apreciação da legalidade de tais atos de gestão urbanística e quanto ao reinício das obras, sendo que tais prejuízos são a consequência natural de atos e omissões praticados por Magistrados do Ministério Público (conexos à propositura das ações administrativas especiais e à sua condução e desenvolvimento) e/ou, bem assim, por outros intervenientes na administração da justiça que prolongaram uma decisão jurisdicional muito para além do razoável – atos e omissões de natureza jurídico-administrativa no âmbito da função jurisdicional (v. art. 12.º do RRCCE).
Acrescentam que a situação relatada, ante os prejuízos por si sofridos, não pode concorrencialmente deixar de conduzir à responsabilização do Estado por deficiente atuação do Tribunal, por mau funcionamento do sistema judiciário e denegação de justiça em prazo razoável, considerando o longo período temporal de pendência das ações administrativas impugnatórias com efeitos suspensivos.
Por fim, alegam que mesmo que se entendesse que a atuação do Ministério Público e do Tribunal seria plenamente conforme com os padrões de comportamento normalmente diligentes, o certo é que, nas circunstâncias concretas patenteadas na presente ação, assiste ao Estado o dever de indemnizar as autoras pelos prejuízos por si sofridos, em razão da anormalidade e especialidade desses prejuízos e de harmonia com o princípio da igualdade, sendo que eram titulares de atos administrativos que lhes outorgaram a possibilidade objetiva de aproveitamento urbanístico dos seus prédios, designadamente a possibilidade de neles construir, e a longa privação que lhes foi imposta, retirando-lhes, por alegadas razões de interesse público, as vantagens e os direitos que esses atos lhes outorgaram, corresponde a uma afetação de direitos e interesses de tal forma intensa, injusta e desigual que deve dar lugar a uma indemnização pelo sacrifício, nos termos previstos no artigo 16.º do RRCEE e na decorrência do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos.

Por Sentença proferida no TAF de Sintra em 20 e maio de 2019 foi decidido julgar a presente ação administrativa comum improcedente, tendo, em consequência, sido absolvido o réu do pedido.

Não se conformando com tal decisão vieram as Autoras A....., Lda., M....., Lda. e J....., S.A, em 27 de junho de 2019 interpor recurso para este TCAS, em cujas alegações, concluíram:
“1.ª O facto elencado sob a alínea a) dos «factos não provados» deverá ser julgado como provado, por presunção judicial ante as regras da experiência, extraindo-se a impossibilidade de acesso aos prédios da prova da selagem dos estaleiros por autoridade pública e da aposição de cadeados por parte do Ministério Público, pois ninguém pode aceder a um prédio que está selado por uma autoridade pública e para mais selado com um cadeado.
2.ª Ao contrário do entendimento expresso na decisão recorrida, os factos provados permitem inferir a existência de um investimento de «capitais» levado a efeito pelas Autoras, assim como a assunção de «custos» (independentemente do seu montante), bem como um programa de investimento por si levado a cabo, pois não seria normal que alguém se encontrasse a promover uma urbanização com as características demonstradas sem a utilização de capitais (próprios ou alheios), sem suportar custos e sem ter um plano orientador do seu investimento, tendo por finalidade obter retorno financeiro.
3.ª Os factos elencados sob as alíneas b), ff) e gg) dos «factos não provados» deverão ser julgados como provados ante as respostas periciais positivas aos quesitos 12, 66 e 67 e por presunção judicial, extraindo-se da factualidade provada (v. als. a), d), e), zz), aaa), bbb), f), h), i), j), k), l), m), n), o), kkkk) dos factos provados) em conjugação com os factos provados sob as als. u), v), aa), bb), cc), dd), ff), jjjj), oooo), nnnn) e pppp) - máxime da inviabilidade de execução de obras e de comercialização dos lotes -, que a pendência das ações perturbou o programa de investimento das Autoras, atrasou o retorno de capitais, fez acrescer custos, gerou dificuldades na sua organização e planeamento e perturbou decisões de investimento.
4.ª Os factos enunciados sob as alíneas p), q), d) e) nos «factos não provados» deveriam ter merecido resposta positiva no sentido de ficar provado que (à semelhança do que o Tribunal julgou provado como previsível para a construção e comercialização nos lotes 4 e 5), se as 1.ª e 3.ª Autoras não tivessem sido impedidas de promover a emissão dos alvarás de construção para os lotes n.ºs 1, 2 e 3, teriam podido promover as respetivas construções dentro de um prazo normal que se estima em 24 meses, teriam previsivelmente concluído as respetivas obras em Setembro de 2006 e em condições de normalidade, seria previsível que no decurso de 36 meses contados da data do início das obras concluíssem os seus projetos de comercialização dos edifícios dos lotes n.ºs 1, 2 e 3, o que se extrai da prova pericial (v. resposta pericial aos quesitos 19, 22, 46 e 47), dos depoimentos das testemunhas, em especial da testemunha Luís Miguel Gamboa dos Santos (v. depoimento no SITAF entre os minutos 2.18 e 4.50 - Gravações audiências de 09-01-2018 11-13-26) e igualmente por presunção a extrair dos factos constantes das alíneas e), xxxx), yyyy), zzzz) e aaaaa) dos factos provados.
5.ª Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, as alíneas f), s) e j) dos pontos de facto dados por não provados deveriam ter merecido resposta favorável, pelo menos em formulação restritiva, dando como provado que as Autoras ficaram privadas de obter as quantias correspondentes à previsível comercialização dos lotes nas datas estimadas, o que se extrai das respostas dadas pelos peritos (v. quesitos 24, 33 e 49 do laudo pericial maioritário) e também por presunção resultante do conjunto dos factos provados e das regras da experiência comum.
6.ª O facto descrito sob a alínea dd) dos factos não provados deverá ter-se como provado em face dos documentos particulares não impugnados correspondentes aos documentos n.ºs 32 e 33 juntos aos autos pelas Autoras com a p.i., traduzindo missivas da Caixa G.....relativas aos apoios financeiros concedidos para o “lote 5. Renovação de apoio financeiro” e para os “lotes 2, 3 e 4. Renovação do Apoio Financeiro”, como ali se pode ler e cujo conteúdo confirma ipsis verbis o ali alegado (v. penúltimo parágrafo das cartas).
7.ª O facto descrito sob a alínea x) dos factos não provados deverá ter-se como provado, pelo menos em parte, em face dos documentos particulares não impugnados correspondentes aos documentos n.ºs 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32 e 33 juntos aos autos pelas Autoras com a p.i., considerando-se documentalmente provado, pelo menos, que as Autoras contrataram financiamentos em condições e montantes não concretamente apurados;
8.ª Deverá ter-se como provado, por presunção judicial, a alínea y) dos factos não provados quanto a tais contratos bancários importarem o pagamento de juros, pois é condição normal de qualquer contrato de financiamento bancário o pagamento de juros e despesas.
9.ª Dos documentos n.ºs 1 e 30 juntos aos autos e por presunção extraída do facto provado sob a alínea g), deveria o Tribunal a quo ter dado como provada a existência de custos inerentes à garantia bancária prestada, ainda que em montantes não rigorosamente apurados, juros esses que a Autora não teria suportado em igual montante caso o empreendimento não tivesse ficado 8 anos suspenso por força da pendência da ação, devendo ser dados como provados os factos vertidos sob as alíneas v) e w) dos factos erradamente julgados como não provados.
10.ª Nas condições retratadas nos autos, vendo as suas obras embargadas, abandonadas na paisagem de Oeiras e apelidadas publicamente de forma negativa, conclui-se facilmente que, contrariamente ao entendeu o Tribunal a quo na sentença recorrida, as sociedades Autoras ficaram associadas à imagem degradada das obras paradas, vendo afetada a imagem da sua capacidade técnica e económica junto do público com danos no bom seu nome e imagem, devendo ter-se como provados, por presunção judicial e com base em regras de experiência, os factos constantes das alíneas aa), bb), cc) e ee).
11.ª Os factos constantes das alíneas e), f), g), h), r), s), t), u), i), j), k) e l) dos factos não provados, pertinentes à quantificação dos valores de comercialização que as Autoras deixaram de poder receber e consequentemente às quantias que deixaram de ver retribuídas, seja fazendo uso da taxa de rentabilidade média das empresas do sector, seja aplicando a taxa média de depósitos a prazo, deverão ser dados por provados em face dos factos provados nas alíneas u), v), aa), bb), cc), dd) e nnnn), ff), jjjj) e oooo), pppp), d), e), zz), aaa), bbb), vvvv, tttt) e uuuu) e à luz das regras da experiência e critérios de normalidade.
12.ª Contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, os factos constantes da alíneas jjjj), nnnn), oooo), pppp), xxxx), zzzz), yyyy), aaaaa), zz), aaa), bbb), vvvv), tttt) e uuuu) dos factos provados, traduzem a demonstração da existência de danos patrimoniais, ainda que não quantificados, na esfera jurídica das Autoras, empresas comerciais de construção que ficaram privadas de comercializar os seus imóveis em resultado dos anos de pendência das ações judiciais propostas pelo Ministério Público, o que poderiam ter feito com vantagem patrimonial que acresceria à simples disponibilidade dos imóveis que lhes foi igualmente suprimida.
13.ª Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, os factos provados nos autos relativamente às ações judiciais e aos seus efeitos, e em particular os factos averbados sob as alíneas hh), bbbbb), llll), mmmm) e pppp) dos factos provados, traduzem a demonstração da existência de danos não patrimoniais na esfera jurídica das Autoras em resultado dos anos de pendência ilícita e culposa das ações judiciais propostas pelo Ministério Público.
14.ª A sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao absolver o Réu com fundamento na falta de demonstração da existência de danos depois de concluir (e bem) pela ocorrência de um atraso injustificado, ilícito e culposo, na decisão dos processos judiciais em causa nos autos, pois ao contrário do entendimento expresso pelo Tribunal a quo, ainda que as Autoras não tivessem logrado demonstrar outros especiais danos, sempre teria de se aceitar a existência de um dano moral comum, presumido e implícito ao atraso na decisão dos processos (v. acs. do TEDH de 6.4.2000, no Proc. 35 382/97, caso C..... S.A. v. Portugal, e de 18 de Maio de 2000, caso F..... S.A. c. Portugal; acórdão do TEDH de 7.6.2012, no Proc. n.º 38 433/09, caso Centro Europa 7 SRL e Di Stefano contra Itália, e acórdão de 23.1.2014, no Proc. n.º 19 336/04, caso East/Wet Alliance Limited contra Ucrânia e v. Ac. STA, de 10/09/2008, no Proc. n.º 0319/08 ou, recentemente, o Ac. TCAS, de 03/21/2019, no Proc. n.º 365/17.5BELSB, in www.dgsi.pt).
15.ª Ao contrário do entendimento expresso na sentença recorrida, a simples privação do uso normal de bens patrimoniais, em si mesma, constitui um dano indemnizável, independentemente da demonstração direta ou indireta de outros concretos prejuízos que a indisponibilidade relativa do bem possa envolver (v. MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, Vol. I, 11.ª ed., p. 301 e, na jurisprudência, entre outros, acs. do Supremo Tribunal de Justiça de 05-07-2007, no Proc. 07B1849 ou o ac. da Rel. Lisboa, de 12/06/2012, no proc. n.º 813/09.8TVLSB.L1-6 e o na jurisdição administrativa, o ac. do Supremo Tribunal Administrativo, de 11/28/2007, no Proc. n.º 0691/07, in www.dgsi.pt).
16.ª Os factos dados como provados pelo Tribunal a quo na sentença recorrida confirmam que as Autoras, sociedades de construção civil ficaram privadas dos lotes de terreno para o seu uso normal, ou seja, para os efeitos da sua comercialização ou transformação em fogos, estando em causa imóveis com concretas capacidades construtivas, em localização urbana consolidada e num período temporal de grande procura, tendo-se provado inclusivamente que as Autoras poderiam efetivamente ter construído e comercializado os fogos e em que prazos e a que preços o poderiam ter feito.
17.ª Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo na sentença recorrida, justifica-se a condenação do Réu ao pagamento de uma indemnização às Autoras que inclua danos emergentes e lucros cessantes, incluindo a privação das Autoras da fruição dos imóveis durante o período de tempo em que as ações judiciais se encontraram pendentes de forma ilícita e culposa, em montantes a apurar, se necessário com o recurso a juízos de equidade (v. art. 566.º/3 do Código Civil), só desse modo sendo as Autoras colocadas na posição em que estariam se porventura não fosse o evento lesivo.
18.ª O dever de indemnização a cargo do Réu radica, a par do facto ilícito inerente à morosidade excessiva da pendência das ações, da própria propositura dessas ações com efeitos suspensivos, enquanto atos lícitos levados a efeito por autoridade pública, retirando às Recorrentes a possibilidade de comercializar os lotes ou de neles construir e todas as vantagens e os direitos em que estas estavam investidas, com fundamento em razões de interesse público e para satisfação de necessidades da comunidade em geral, induzindo desse modo às Recorrentes prejuízos especiais e anormais que deverão ser compensados (v. artigos 13.º e 22.º da Constituição da República Portuguesa).
NESTES TERMOS, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, com as legais consequências. Assim se decidindo se fazendo JUSTIÇA!
MAIS SE REQUER, desde já por cautela de patrocínio que, atento o valor da ação e o objeto do presente recurso, seja dispensada a liquidação do remanescente da taxa de justiça nesta instância de recurso, ex vi do artigo 7.º, n.º 6 do Regulamento das Custas Processuais, sob pena de o valor a liquidar se revelar incomportável e desproporcionado por relação à atividade processual verificada, afetando ainda o direito de acesso aos tribunais.”

Em 30 de setembro de 2019 veio o Estado Português, representado pelo Ministério Público, apresentar as suas contra-alegações de Recurso, nas quais concluiu:
“1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos presentes autos que considerou a presente ação administrativa totalmente improcedente e, em consequência, absolveu o R. Estado Português do pedido.
2. Tal como as AA. configuraram a presente ação, as causas de pedir da presente ação consistem nos alegados danos decorrentes:
a. Da interposição das ações públicas n.º 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT pelo Ministério Público:
i. Por alegado uso indevido e ilícito de tal meio processual;
ii. Ou, subsidiariamente, pelos danos especiais e anormais impostos por razões de interesse público;
b. De alegada violação do direito a uma decisão em prazo razoável nesses processos.
3. Atento as alegações de recurso apresentadas, o objeto do recurso pode resumir-se nas seguintes questões a decidir:
a. Erro de julgamento na decisão da matéria de facto;
b. Erro de julgamento na decisão de direito quanto à verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, quer por facto ilícito, quer por facto lícito.
4. Invocam desde logo as AA. que, face à prova produzida e às regras de experiência comum, deveriam ainda ter sido dados como provados outros factos por si alegados na petição inicial.
5. Todavia, o certo é que compulsada a decisão da matéria de facto constata-se que a sentença não omitiu nessa parte quaisquer factos determinantes para o conhecimento de mérito, dando acertadamente como provados aqueles que deveria dar e como não provados os relativamente aos quais não foi produzida prova suficiente, tendo em conta as regras de distribuição do ónus da prova.
6. As AA. estão nesta parte a queixar-se da forma como elas próprias configuraram a ação e dos factos que elas próprias (não) alegaram!
7. Quanto ao acesso aos prédios após o embargo, é muito diferente ficar impedido de aceder ou não ao prédio ou à obra, por um lado, e ficar obrigado a suspender os trabalhos de execução da obra, por outro lado, sendo certo que o efeito legal da citação da ação interposta pelo Ministério Público não é a proibição de acesso às respetivas operações urbanísticas, mas sim a obrigação de suspensão imediata, no todo ou em parte, dos trabalhos de execução da obra.
8. Acresce, ainda que muitos dos factos alegados são absolutamente conclusivos.
9. Mesmo que assim não se entendesse, o que não se admite, muitos desses factos conclusivos alegados nunca seriam suscetíveis de ser demonstrados através de prova testemunhal, nem pericial que não incidisse sobre o caso em concreto e a análise em concreto do planeamento e atividade de determinada sociedade, pois competia às AA. terem apresentado prova documental cabal do planeamento da atividade das sociedades em causa e quais as concretas decisões de investimento que foram impedidas e perturbadas, o que não fizeram.
10. Por outro lado, muitos dos factos alegados pelas AA. são meramente hipotéticos, que assentam em previsões e estimativas, e que, assim, são insuscetíveis de serem considerados provados por a prova produzida ser insuficiente para o Tribunal formar a convicção sobre a real verificação dos mesmos.
11. Mesmo que se desse como provado que a Caixa G….. “equacionou” a denúncia do apoio concedido, tal é absolutamente inócuo e irrelevante para a decisão de mérito, pois equacionar a denúncia é muito diferente de efetuar realmente a denúncia.
12. Relativamente aos financiamentos bancários cumpre referir que se os mesmos tinham o fim alegado, então, não tendo tais lotes sido construídos na ocasião e não tendo sido denunciados tais contratos, seguramente que, de acordo com as regras de experiência comum, ao capital resultante desse financiamento foi dado pelas AA. outro destino que não a construção destes lotes em concreto.
13. Acresce, ainda, que tais alegados custos decorrentes dos financiamentos sempre teriam de ser suportados pelas AA. até integral pagamento do montante financiado, sendo certo que as AA. nunca alegaram em parte alguma que poderiam ou pretenderiam amortizar tal financiamento bancário quando comercializassem as frações do empreendimento em causa.
14. Ficou provado as AA. edificaram, entretanto, o empreendimento em causa e já venderam diversas frações.
15. Para além da contabilização dos danos efetuada pelas AA. ser absolutamente conclusiva em sede factual, cumpre referir que as AA. lavram num erro matemático, que mantém nas alegações de recurso, no sentido dessa alegada taxa de rentabilidade ser apurada ao ano.
16. Com efeito, essa taxa de rentabilidade a existir, o que não se admite, é só calculada uma vez, apurados os encargos e deduzidos estes ao produto de venda, e não ao ano (o que os senhores peritos, e bem, corrigem)!
17. Por outro lado, não basta alegar uma rentabilidade média em abstrato, pois tal depende de muitos fatores, uns exógenos e outros endógenos às próprias empresas, como a exposição excessiva ao crédito bancário, pressão de fornecedores, falta de liquidez, etc., que pode fazer com que, para se poder realizar dinheiro mais rapidamente para fazer face a necessidades de tesouraria, essa margem de lucro possa ser muito menor.
18. Finalmente, igualmente sem conceder, os danos alegados nunca seriam do valor alegado e peticionado, pois tal valor assenta numa flagrante contradição dos próprios termos e factos alegados e configurados pelas AA., que apenas se justifica com base num ostensivo erro de cálculo matemático, facilmente percetível.
19. Com efeito, se atentarmos no alegado pelas AA. na petição inicial quanto a tal matéria (e aqui chama-se à colação os artigos 82º, 83º, 86º, 92º, 93º, 96º, 99º, 100º e 103º da petição inicial) constatamos que as AA. invocam, pegando no exemplo da 1ª Autora, que seria de 28.000.000 o valor de venda desses imóveis e que do mesmo obteria um rendimento (um lucro...) de 10%, ou seja, 2.800.000.
20. Mas depois, se atentarmos no art.º 83º da petição inicial, calculam os 3% de juros de depósitos bancários que alegam que obteriam não sobre 2.800.000 (que seria o valor do capital que ficaria disponível para as AA., correspondente ao lucro que alegam que obteriam, deduzidas despesas e encargos), mas sim sobre os 28.000.0000 (valor total da venda), como se fosse esse o final de rentabilidade, como se não tivessem qualquer despesa ou encargo, como se todo o produto da venda fosse lucro e ficassem com todo esse dinheiro disponível!
21. Ora mediante esse errado cálculo das AA., tal dá o resultado, relativamente à 1ª Autora, de 4.620.000€, quando, tal como as próprias AA. configuraram a ação, teria que dar um resultado de alegados danos de apenas 462.000€!!!
22. E o mesmo relativamente aos pedidos das outras AA, pois relativamente à 2ª Autora em vez de 1.329.900, teria que ter sido peticionado, de acordo com a sua própria argumentação, apenas 132.990€, e o mesmo se diga relativamente à 3ª Autora.
23. Face ao exposto, e da análise da douta sentença recorrida, a decisão da matéria de facto foi, claramente, corretamente efetuada de acordo com a prova documental existente nos autos, a prova produzida e as regras de repartição do ónus da prova, inexistindo qualquer erro de julgamento.
24. No que respeita ao alegado erro de julgamento de direito, as ora recorrentes não colocam em causa a parte de douta sentença recorrida em que julgou pela inexistência do pressuposto ilicitude da causa de pedir referente ao facto do Ministério Público ter intentado duas ações administrativas especiais, que correram termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob os n.º 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, que, por força do disposto nos artigos 69º, n.º 2, e 103.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, impediram durante a pendência das mesmas a construção nos lotes de que eram proprietárias, pelo que essa parte da sentença transitou em julgado.
25. Resta, assim, e apenas, quanto à responsabilidade civil por facto ilícito, a causa de pedir referente à omissão de decisão em prazo razoável.
26. Com efeito, a posição defendida pelo Ministério nessas ações era absolutamente razoável e uma das soluções plausíveis da questão de direito, pelo que não existiu existir qualquer violação técnica grosseira, tendo sido a atuação do Ministério Público conforme ao direito, às competências constitucional e legalmente consagradas e ao Estatuto do Ministério Público.
27. As AA. não concretizaram minimamente na petição inicial os danos decorrentes da omissão de decisão em prazo razoável, com indicação de factos concretizadores de eventuais prejuízos, pelo que logo por aí seria tal pedido de improceder.
28. Acresce, ainda, tendo em conta a forma como as AA. configuraram a ação, que dos artigos 126º, 127º e 128º da petição inicial resulta que o pedido pelo atraso na justiça é de apenas 5000€ para cada uma das AA., sendo todo o restante pedido indemnizatório com base na causa de pedir de alegado uso indevido da ação pública pelo Ministério Público.
29. Como tal, caso fosse de considerar procedente o pedido em causa, o que não se admite, nunca a indemnização a atribuir poderia ser superior ao montante em causa, atento o princípio do pedido, corolário do princípio do dispositivo e da estabilidade da instância, que são enformadores do nosso processo civil (artigos 3º/1, 260º e 609º/1 do Código de Processo Civil).
30. Por outro lado, sempre cumpriria ter em conta as especificidades inerentes às indemnizações por dano moral das pessoas coletivas, nos termos que têm vindo a ser afirmados, doutrinária e jurisprudencialmente, bem como o valor de indemnização que jurisprudencialmente tem vindo a ser fixado (incluindo pelo TEDH) por cada ano de atraso do processo.
31. Todavia, o que resulta é que claramente não se verifica a existência do pressuposto dano, conforme muito bem se decidiu na douta sentença recorrida.
32. A pretensão das AA. relativas aos alegados danos patrimoniais assenta, tal como as mesmas configuraram a ação, num duplo raciocínio:
a. Primeiro tentam definir qual seria o lucro pela venda das frações desse empreendimento;
b. Depois de efetuada essa operação, aplicam um valor de taxa de juros de depósitos bancários a esse lucro, na perspetiva de que depositariam o valor desse lucro.
33. Ora, conforme supra referido, as AA. lavram em erros matemáticos, que mantém nas alegações de recurso, no sentido dessa alegada taxa de rentabilidade ser apurada uma única vez, e não ao ano, por um lado, e de calcularem a taxa de juro de depósitos bancários não sobre o produto da rentabilidade (ou seja, sobre o capital que efetivamente ficaria disponível para as AA.), mas sim sobre o valor total da venda das frações, como se não tivessem qualquer despesa ou encargo, como se todo o produto da venda fosse lucro e ficassem com todo esse dinheiro disponível!
34. Ora mediante esses errados cálculos das AA., ao resultado da operação das AA. sempre se teria que retirar um zero para o pedido, com erro na classe de números utilizada, pois em vez da classe milhão, deveria ter ficado pela classe milhar.
35. Acresce, ainda, que os factos alegados no articulado superveniente pelo R. Estado Português e que foram julgados provados, desfazem qualquer dúvida quanto à não verificação do pressuposto dano.
36. É que o empreendimento foi, entretanto, construído e muitas das frações foram já vendidas (facto que as AA. omitiram ao tribunal até à apresentação de articulado superveniente pelo R. Estado Português).
37. Ora, pelo facto de estarem a vender as frações em 2017 e 2018, as AA. conseguem lucros muito superiores do que conseguiriam em 2007, o que cobre os eventuais prejuízos alegados, incluindo nestes quaisquer encargos eventualmente adicionais decorrente do financiamento bancário.
38. Com efeito, o valor corrente de mercado é muito superior ao de 2007 e os custos de construção praticamente não aumentaram desde essa data, ou seguramente não aumentaram na mesma proporção do aumento do imobiliário.
39. Ou seja, se pelo facto de não poderem ter construído e vendido o empreendimento em 2007 se considerasse ter tal gerado prejuízo para as AA., o que não se admite pelos argumentos já expostos, então esse prejuízo teria desaparecido entretanto fruto da especulação imobiliária e dos valores a que estão a vender entretanto as frações, que nunca seria atingido se tivessem sido vendidas em 2007, e que cobre os valores dos prejuízos alegados.
40. O que as AA. não podem querer, sob pena de manifesto e evidente enriquecimento ilícito, é receber indemnização do Estado Português correspondente ao juro bancário que alegadamente deixaram de receber por não terem podido aplicar em depósitos bancários o lucro da venda das frações, e, agora, em 2016/2018, irem vender essas mesmas frações e obter quantia muito superior a essa!
41. Muito relevante quanto a esta matéria o decidido no douto aresto do Supremo Tribunal Administrativo de 20-06-2017, processo n.º 0247/15, disponível em www.dgsi.pt, que em situação semelhante decidiu, e muito bem, que “Não se provando que o atraso na comercialização e venda das frações do empreendimento teve um impacto negativo nas vendas, designadamente quanto à margem de lucro obtida, não se pode considerar demonstrado que esse atraso consubstanciou a existência de um dano para a A.”.
42. Quanto aos alegados custos decorrentes dos financiamentos bancários, estes sempre teriam de ser suportados pelas AA. até integral pagamento do montante financiado, sendo certo que as AA. nunca alegaram em parte alguma que poderiam ou pretenderiam amortizar tal financiamento bancário quando comercializassem as frações do empreendimento em causa.
43. Veja-se, a título de exemplo o acórdão já referenciado, que decidiu que:“V – O embargo não é condição do dano respeitante aos encargos com o passivo bancário referente ao período em que aquele vigorou, dado que o pagamento desses juros é consequência do recurso ao financiamento bancário para a construção do empreendimento que sempre teria de ser suportado pela A.”
44. Por outro lado, vêm agora as recorrentes invocar um alegado dano decorrente “da privação do uso das utilidades dos lotes”.
45. O dano que as autoras imputam à demora na prolação das decisões proferidas nos Processos n.º 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT é o prejuízo correspondente à indisponibilidade dos montantes que razoavelmente seria de esperar que obteriam com a venda dos lotes a construir.
46. Atenta a causa de pedir da presente ação, qual seja a propositura e pendência das ações que correram termos neste Tribunal sob os n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, cumpre concluir se que estes alegados prejuízos decorrentes “da privação do uso das utilidades dos lotes” não cabem na referida causa de pedir, nem constitui o pedido agora formulado um desenvolvimento do pedido primitivo.
47. Como muito bem referiu o tribunal a quo em decisão igualmente a propósito do referido anterior requerimento de ampliação do pedido “quando a presente ação foi proposta, as referidas ações já se encontravam decididas por sentença transitada em julgado, ou seja, já não se encontravam pendentes, pelo que os prejuízos agora alegados não encontram o seu fundamento na pendência daquelas ações”.
48. Tal como se decidiu no douto aresto do Tribunal da Relação de Lisboa de 14.04.2005, Proc. 2991/2005-6, estando perante uma situação de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, apenas se poderia considerar que a ampliação do pedido seria o desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo se a alegada ilicitude ainda continuasse a perdurar no tempo, o que manifestamente não sucede in casu, pois, conforme já referido, as ações em causa findaram, respetivamente, 12.04.2012 e 08.03.2013, ainda antes de ter sido interposta a presente ação.
49. Finalmente, vêm ainda as recorrentes invocar um erro de julgamento de direito na decisão de considerar não verificados os pressupostos da responsabilidade civil por facto lícito.
50. À data em que as ações em causa nos autos foram propostas pelo Ministério Público não se encontrava em vigor o Regime da Responsabilidade Civil do Estado e demais entidades públicas, aprovado pela Lei n. º67/2007, de 31 de dezembro, pelo que o disposto no artigo 16.º deste regime não é aplicável à situação em causa nos autos.
51. Acresce que o artigo 9.º do Decreto-lei n.º48051, de 21 de novembro de 1967, apenas prevê a obrigação do Estado indemnizar os particulares a quem, no interesse geral, mediante atos administrativos legais ou atos materiais lícitos, tenha imposto encargos ou causado prejuízos especiais e anormais.
52. A propositura de ações pelo Ministério Público no quadro do exercício da ação pública não consubstancia a prática de um ato administrativo.
53. Como tal, a norma do artigo 9.º do Decreto-lei n.º 48051, de 21 de novembro, não é aplicável à situação em causa nos autos, isto é, à atuação do Ministério Público no quadro do exercício da ação pública.
54. De qualquer forma, nunca se encontrariam preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil por ato lícito da especialidade e a anormalidade do dano, sendo que o dano é especial quando incide sobre uma pessoa ou grupo, sem afetar a generalidade das pessoas, e é anormal quando ultrapassa o custo próprio da vida em sociedade.
55. A impossibilidade de construir durante um determinado lapso temporal, ainda que longo, não constitui, em si mesma, um dano, sendo certo que a propositura e pendência dessas ações não inviabilizaram que tal construção viesse a ter lugar posteriormente.
56. Tal como supra referido quanto à não verificação do pressuposto dano na responsabilidade civil por facto ilícito, e tal como se decidiu na douta sentença recorrida, não se verificando sequer a existência dos danos alegados, muito menos será de considerar verificada a existência de danos especiais e anormais exigidos pelo normativo em apreço, desde logo porque, como está demonstrado, o empreendimento em causa acabou por ser edificado e comercializado.
57. Face ao exposto, improcedem totalmente as alegações das recorrentes, não sendo a douta decisão recorrida merecedora de qualquer censura, devendo a mesma, como tal, ser integralmente confirmada.
Nestes termos, e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser considerado improcedente e manter-se, nos seus precisos termos, a douta decisão recorrida.
Assim decidindo farão V. Ex.as JUSTIÇA!”

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144.º, n.º 2, e 146.º, n.º 1, do CPTA e dos artigos 608.º, nº 2, 635.º, nºs. 4 e 5, e 639.º, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do disposto no artigo 140.º, n.º 3, do CPTA.
Importa apreciar as pretensões dos Recorrentes, de acordo com as quais a Sentença Recorrida deverá ser revogada, imputando-lhe:
a. Erro de julgamento na decisão da matéria de facto;
b. Erro de julgamento na decisão de direito quanto à verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, quer por facto ilícito, quer por facto lícito.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada e não provada, a qual aqui se reproduz:
“Factos Provados
a) As autoras são sociedades comerciais que têm por objecto social, além do mais, a construção civil e a compra e venda de imóveis [acordo].
b) Em 15/04/2004, a Senhora Presidente da Câmara Municipal de Oeiras emitiu em favor da 3.ª autora, J....., S.A., o alvará de loteamento n.°2/2004, titulando uma operação de loteamento com obras de urbanização sob o nome comercial “Edifícios do Parque” [documento n.º1 junto com a petição inicial].
c) De acordo com o alvará de loteamento, o prédio loteado denomina-se «Parcela C», situada entre as Ruas Joaquim Moreira Rato e Carlos Vieira Ramos, freguesia de Paço de Arcos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Oeiras, sob a ficha n° 2279/19…. e inscrito na matriz predial sob o art.º 5…., secção 46 (parte) e 53 (parte), com a área de 15.300,00m2 [documento n.º1 junto com a petição inicial].
d) A citada operação de loteamento traduziu-se na “constituição de 7 lotes de terreno, numerados de 1 a 7, destinados a habitação, comércio e serviços, com um total de 125 fogos, com as áreas e localização previstas na planta anexa (...) prevendo-se a construção de uma área de 22.926,00 m2 para habitação, de 1.304,00 m2 para comércio, de 1.100,00 m2 para serviços e de 14.517,34 m2 para estacionamentos” [documento n.º1 junto com a petição inicial].
e) De acordo com o alvará de loteamento, os lotes 1 a 7 apresentam as seguintes características e áreas de construção:
(Dá-se por reproduzido o documenta Fac-similado contante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
[documento n.º1 junto com a petição inicial].
f) O terreno loteado situa-se no Aglomerado Urbano de Paço de Arcos, numa zona urbana consolidada, na freguesia de Paço de Arcos, confrontando a Sul com jardim público - Parque dos Poetas [acordo].
g) Para garantia da execução das obras de urbanização, a 3.ª Autora prestou a favor do Município uma garantia bancária, constituída junto da Caixa G…. em 30/03/2004, no montante de €282.517,23 [documento n.º2 junto com a petição inicial].
h) Por escritura pública celebrada em 22/07/2004, a 1.ª autora, A....., comprou à 3.ª autora os seguintes lotes de terreno para construção, do referido alvará de loteamento:
“a) pelo preço de dois milhões quatrocentos e trinta mil euros, o prédio urbano que constitui um lote de terreno para construção designado por lote 2, descrito sob o número três mil quinhentos e cinquenta e sete, inscrito na matriz sob o artigo provisório 5…., ainda sem avaliação.
b) pelo preço de dois milhões quatrocentos e trinta mil euros, o prédio urbano que constitui um lote de terreno para construção designado por lote 3, descrito sob o número três mil quinhentos e cinquenta e oito, inscrito na matriz sob o artigo provisório 5…., ainda sem avaliação.
c) pelo preço de dois milhões cento e quarenta mil euros, o prédio urbano que constitui um lote de terreno para construção designado por lote 4, descrito sob o número três mil quinhentos e cinquenta e nove, inscrito na matriz sob o artigo provisório 5…, ainda sem avaliação.” [documento n.º4 junto com a petição inicial].
i) Por escritura pública celebrada em 22/07/2004, a 2.ª autora, MOMATE, comprou à 3.ª autora, pelo preço de € 2.015.000.00 o lote de terreno para construção designado por Lote 5, sito entre as Ruas Joaquim Moreira Rato e Carlos Vieira da Silva, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Oeiras sob a ficha n.°3…., freguesia de Paço de Arcos e inscrito na matriz sob o art.º provisório 5…., ainda sem avaliação [documento n.º4 junto com a petição inicial].
j) Por escritura pública celebrada em 23/07/2004, a 3.ª autora vendeu à sociedade “M....., Lda.”, pelo preço de oitocentos e trinta e três mil euros, os lotes de terreno para construção designados por Lotes … e…., tendo nessa data recebido a quantia de trinta e três mil euros, tendo as partes ajustado o seguinte quanto ao pagamento do remanescente do preço:
a) Quatrocentos mil euros até seis meses depois do levantamento da licença de construção; e,
b) Quatrocentos mil euros no prazo de cento e oitenta dias depois do pagamento referido na alínea a);
c) Que a presente venda fica sujeita à cláusula da reserva de propriedade até ao integral pagamento [documento n.º5 junto com a petição inicial].
k) Em meados de 2004, a 3.ª autora requereu junto do Município autorização para edificação nos lotes 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 do alvará de loteamento n.º2/2004, nas condições fixadas no alvará de loteamento [documentos juntos aos autos]
l) Em 14/09/2004, foi emitido em nome da 1.ª autora, A....., o alvará de obras de construção n.°120/2004 RJUE, titulando a autorização de construção de um edifício destinado a habitação colectiva para o lote 4 [documento n.º6 junto com a petição inicial].
m) Na mesma data, foi emitido em nome da 2.ª autora, M....., o alvará de obras de construção n.°121/2004 RJUE, titulando a autorização de construção de um edifício destinado a habitação colectiva para o lote 5 [documento n.º7 junto com a petição inicial].
n) De acordo com a autorização de construção relativa ao lote 4, as obras autorizadas apresentavam as seguintes características:
(Dá-se por reproduzido o documenta Fac-similado contante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
[documento n.º6 junto com a petição inicial].
o) De acordo com a autorização de construção relativa ao lote 5, as obras autorizadas apresentavam as seguintes características:
(Dá-se por reproduzido o documenta Fac-similado contante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
[documento n.º7 junto com a petição inicial].
p) Em 11/10/2004 o Ministério Público instaurou uma acção administrativa especial contra o Município de Oeiras, sendo contra-interessada a 3.ª autora, J....., peticionando a:
•(...) declaração de nulidade, ou no mínimo a anulação, do acto de licenciamento da operação de loteamento urbano sobre o prédio urbano pertença da firma J....., SA, descrito na Conservatória do Registo Predial de Oeiras sob a ficha n° 2279/1990….., e melhor identificado no articulado da presente acção, acto esse da autoria da Câmara Municipal de Oeiras e datado de 8.10.2003, que foi titulado pelo alvará de loteamento
● declaração de nulidade, ou a anulação, de todos os actos consequentes ao acto antes referido, designadamente, as licenças de construção e de utilização que venham a ser emitidas;
● ser determinada a reposição da parcela de terreno no estado em que se encontrava [artigo 18.º da petição inicial e artigo 4.º da contestação - Processo n° 1343/04.0BESNT].
q) Nessa acção, o Ministério Público imputou ao ato de licenciamento da operação de loteamento titulada pelo alvará n.°2/2004, os seguintes vícios:
a) vício de violação de lei, por violação do Regulamento do PDM de Oeiras;
b) vício de violação de lei, por violação dos princípios e objectivos gerais do RPDM [documento n.º8 junto com a petição inicial].
r) O Ministério Público defendeu nessa acção que a operação de loteamento excederia “a área de construção máxima”, o “número de habitantes” e o “número de fogos” permitidos no Regulamento do PDM de Oeiras [documento n.º8 junto com a petição inicial].
s) De acordo com a tese do Ministério Público, o terreno loteado só consentiria os seguintes parâmetros:
“- 15.300 m2 x 0,48= 7.344 m2 de área de construção máxima, a que acresce a área das garagens a calcular para a referida área de construção.
- 7.344 m2: 37,5 m2 = 195,84 habitantes.
- 195,84 hab: 3,2 hab = 61,2 fogos.” [documento n.º8 junto com a petição inicial].
t) Segundo vieram as Autoras a apurar, tal acção foi apresentada na sequência da apresentação de um articulado intitulado “queixa” junto do Procurador da República no Tribunal Administrativo de Sintra, datado de 18/07/2004 [documento n.º9 junto com a petição inicial].
u) Na referida acção, a pedido do Ministério Público, os demandados foram “citados para os efeitos de embargo da presente acção, nos termos do disposto no artigo 103.°, aplicável ex vi do disposto no artigo 69.°, n.°2, ambos do RJUE.” [Processo n.º1343/04.0BESNT].
v) Em resultado de tal acção, ficaram suspensos os efeitos do alvará de loteamento n.º2/2004, ficando o Município impedido de emitir alvarás de construção para os lotes 1, 2, 3, 6 e 7, relativamente aos quais ainda não haviam sido emitidos alvarás [acordo].
w) O Município de Oeiras contestou a acção, apontando o erro do Ministério Público na forma de cálculo da área de construção, número de habitantes e número de fogos [Processo n.º1343/04.0BESNT].
x) Em 10/03/2005, o Ministério Público propôs contra o Município de Oeiras, sendo contra-interessadas a 1.ª e a 2.ª autoras, uma outra acção administrativa especial, que deu origem ao processo n° 305/05.4BESNT do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra [documento n.º10 junto com a petição inicial e Processo n.º305/05.4BESNT].
y) Na referida acção administrativa especial, o Ministério Público peticionou a declaração de “nulidade dos dois atos administrativos datados de 07.09.2004, ambos da autoria do Vice Presidente da Câmara Municipal de Oeiras, devidamente identificados no articulado da acção, e mediante os quais foram emitidos os alvarás de autorização n° 120/2004 RJUE e 121/2004 RJUE” [documento n.º10 junto com a petição inicial e Processo n.º305/05.4BESNT].
z) Tal acção judicial reproduz a mesma argumentação apresentada no Processo n.º 1343/04.0BESNT sustentando a violação do PDM quanto à “área de construção máxima”, o “número de habitantes” e o “número de fogos” [Processo n.º1343/04.9BESNT].
aa) Na mesma acção, o Ministério Público requereu a citação do Município e das aqui 1.ª e 2.ª autoras “para os efeitos suspensivos e de embargo da presente acção, nos termos do disposto nos arts. 69.°, n.°2, e 103.°, ambos do RJUE” [documento n.º10 junto com a petição inicial e Processo n.º305/05.4BESNT].
bb) Na mesma acção, o Ministério Público promoveu a selagem dos estaleiros de obras respeitantes aos lotes 4 e 5, propriedade da 1.ª e da 2.ª autoras [Processo n.º305/05.4BESNT].
cc) Em 04/04/2005, a 2.ª autora foi citada para os termos daquela acção e “ainda (citado(a) para os efeitos de embargo da presente acção, nos termos do disposto no artigo 103.°, aplicável ex vi do disposto no artigo 69.°, n.°2, ambos do RJUE” [Processo n.º305/05.4BESNT].
dd) Em 07/04/2005, a 1.ª autora foi citada nos mesmos termos para a mesma acção [Processo n.º305/05.4BESNT].
ee) No âmbito do referido processo judicial, foram notificadas a E....., S.A e os SMAS de Oeiras-Amadora para efeitos de suspensão de fornecimento de electricidade e de água aos lotes 4 e 5, o que veio a suceder [documentos n.ºs 12 e 13 juntos com a petição inicial].
ff) Com a citação para tais acções, a 1.ª e a 2.ª autoras ficaram impedidas de prosseguir com as obras que, respectivamente, tinham em curso nos lotes 4 e 5, em cumprimento da notificação do Tribunal [Processo n.º305/05.4BESNT].
gg) Os estaleiros das autoras ficaram selados [acordo].
hh) Da propositura das citadas acções administrativas pelo Ministério Publico foi então dada cobertura nos meios de comunicação social locais, nacionais, incluindo televisões [documentos n.ºs 14 a 18 juntos com a petição inicial].
ii) Em 13/05/2005, a 1.ª e a 2.ª autoras requereram no processo autorização para o prosseguimento dos trabalhos, tendo o Ministério Público pugnado pelo indeferimento desse pedido [Processo n° 305/05.4BESNT].
jj) Por despacho de 25/10/2005, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra indeferiu tal pedido de autorização [Processo n° 305/05.4BESNT].
kk) Por requerimento de 27/09/2005 o Ministério Público, autor na referida acção, veio aos autos requerer “a suspensão da instância até que seja proferida decisão no Proc. n.°1343/04.0BESNT, invocando para tanto que os actos impugnados nestes autos são actos consequentes daqueles que são objecto da acção” [Processo n° 305/05.4BESNT].
ll) Por despacho de 29/11/2005, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra determinou a suspensão da instância do processo n.º305/05.4BESNT até decisão do processo n.°1343/04.0BESNT [Processo n° 305/05.4BESNT].
mm) Na mesma data, o Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra lavrou o seguinte despacho: “solicite ao Exmo Juiz titular do proc. n° 1343/04.0BESNT - UO4 que logo que ocorra o trânsito em julgado da decisão a proferir naqueles autos, dê conhecimento do mesmo” [Processo n° 305/05.4BESNT].
nn) Em 17/01/2006, a 1.ª e a 2.ª autoras recorreram do despacho do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que determinou a suspensão da instância, dando origem ao Recurso com o n.°01546/06, do 2° Juízo, 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul, julgado improcedente por acórdão de 31/05/2012 [Processo n.º305/05.4BESNT].
oo) No Processo n.°1343/04.0BESNT, o Ministério Público autor requereu uma perícia para demonstrar o invocado excesso de construção e a violação dos demais índices urbanísticos [Processo n.º1343/04.0BESNT].
pp) Em 09/05/2007, o colégio de Peritos nomeados pelo Tribunal respondeu nos termos que constam do documento n.°19 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
qq) Por sentença de 31/10/2008 veio a ser julgada improcedente a acção proposta pelo Ministério Público, nos termos que constam do documento n.°20 junto com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
rr) A 04/12/2008, o Ministério Público interpôs recurso da sentença [ver requerimento de interposição de recurso e alegações do processo n° 1343/04, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido - art 49° da petição inicial e art. 4° da contestação].
ss) Por Acórdão datado de 12/04/2012, já transitado em julgado, veio a ser julgado improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público e confirmada a sentença de 31/10/2008 que havia julgado não provada e improcedente a acção pública [documento n.º21 junto com a petição inicial].
tt) Até então permaneceu suspensa a eficácia da autorização de loteamento e actos consequentes, mantendo-se os efeitos de embargo conferidos àquela acção [acordo].
uu) Entretanto, manteve-se suspensa a instância no Processo n.°305/05.4BESNT, mantendo-se os efeitos de embargo conferidos a essa acção e suspensa a eficácia das autorizações administrativas de construção dos lotes n.ºs 4 e 5 [Processo n° 305/05.4BESNT].
vv) Por decisão de 08/03/2013, já transitada em julgado, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra veio a julgar improcedente a acção que correu termos no Processo n.°305/05.4BESNT [documento n.º22 junto com a petição inicial].
ww) Em 15/04/2013, o Tribunal verificou que a sentença não tinha sido notificada à E..... e aos SMAS, na sequência do que veio a notificar aquelas entidades no sentido da reposição dos fornecimentos [documentos n.ºs 23 a 25 juntos com a petição inicial].
xx) A acção que correu termos sob o n.°1343/04.0BESNT teve início em 10/10/2004 e a 12/04/2012 o Tribunal Central Administrativo Sul proferiu acórdão, rejeitando o recurso [Processo n.º1343/04.0BESNT].
yy) A acção que correu termos sob o n.°305/05.4BESNT teve início a 10/03/2005, a instância esteve suspensa até 09/10/2012 e foi decidida em 08/03/2013 [Processo n.º305/05.4BESNT].
zz) Os lotes n° 2, 3 e 4 comportam uma área bruta de construção de habitação, respectivamente, de 4.860 m2, 4.860 m2 e 4.280 m2, repartidos por 27 fogos, 26 fogos e 23 fogos, respectivamente [acordo].
aaa) O lote n° 5 comporta uma área bruta de construção de habitação de 4.030 m2, repartidos por 20 fogos [acordo].
bbb) O lote 1 comporta uma área bruta de construção de 5.634 m2 [acordo].
ccc) As acções administrativas foram instauradas pelo Ministério Público na sequência de Queixa formalizada junto da Procuradoria de República neste TAF de Sintra por centenas de munícipes do Concelho de Oeiras, denunciando actos que reputavam ilegais [acordo].
ddd) A A....., Lda. no Relatório de Gestão referente ao ano 2003, ano em que declarou resultados líquidos apurados de €438.815,34, com um passivo de €2.140.263,49, referiu que “(...) durante o ano de 2003, a economia portuguesa contraiu-se, resultado da fase de ajustamento já iniciada em 2000, com decréscimos sucessivos da procura interna, e do fraco e insuficiente crescimento da procura externa (…)”. [documento n.º2 junto com a contestação].
eee) No exercício de 2004, a autora A....., Lda. referiu, no Relatório de Gestão, não ter efectuado qualquer negócio, apresentando um resultado líquido negativo de (€227.392,51) [documento n.º2 junto com a contestação].
fff) No exercício de 2005, a mesma autora A....., Lda. referiu no Relatório de Gestão as “(...) más condições que o mercado atravessa (...)”, tendo declarado um resultado líquido de €134.206,51 [documento n.º2 junto com a contestação].
ggg) No exercício de 2006, a autora A....., Lda. declarou um resultado líquido de €37.764,29, com dívidas a instituições de crédito de €10.978.182,14 [documento n.º3 junto com a contestação].
hhh) No exercício de 2007, a autora A....., Lda. declarou um resultado líquido negativo de (€671.184,87), com dívidas a instituições de crédito de €11.430.000,01 [documento n.º3 junto com a contestação].
iii) No exercício de 2008, a autora A....., Lda. declarou um resultado líquido negativo de (€297.279,00), com dívidas a instituições de crédito de €12.029.000,01 [documento n.º3 junto com a contestação].
jjj) No exercício de 2009, a autora A..... Lda. declarou um resultado líquido negativo de (€613.068,50), com dívidas a instituições de crédito de €22.029.000,01 [documento n.º3 junto com a contestação].
kkk) No exercício de 2010, a autora A..... Lda. declarou um resultado líquido negativo de (€613.068,50), com empréstimos de instituições de crédito de €2.380,01 + €18.660.000,00 [documento n.º3 junto com a contestação].
lll) No exercício de 2011, a autora A..... Lda. declarou um resultado líquido negativo de (€401.225,24) e financiamentos obtidos de €12.955.000,00 [documento n.º3 junto com a contestação].
mmm) No exercício de 2012, a autora A..... Lda. declarou um resultado líquido negativo de (€498.342,49) [documento n.º3 junto com a contestação].
nnn) A autora J....., S.A. no exercício de 2003, declarou o lucro líquido de €268.306,06, com dívidas a instituições de crédito de €10.981.269,45 [documento n.º4 junto com a contestação].
ooo) No exercício de 2004, o lucro líquido de €1.262.650,90, com dívidas a instituições de crédito de €6.353.095,08 [documento n.º4 junto com a contestação].
ppp) No exercício de 2005, o prejuízo de €79.018,86, com dívidas a instituições de crédito de €9.695.872,12, referindo-se no Relatório de Gestão que “(...) o baixo valor obtido nos resultados operacionais, que, embora positivos, foram significativamente afectados pelas péssimas condições de mercado verificadas nos últimos dois anos, em consequência do excesso de oferta relativamente à procura, que condicionou as margens obtidas. O valor obtido não suportou o valor dos custos financeiros em que incorremos durante o exercício, e daí o resultado negativo obtido.” [documento n.º4 junto com a contestação].
qqq) No exercício de 2006, a autora J....., S.A. declarou um resultado líquido de € 120.157,80, com dívidas a instituições de crédito de €9.497.165,39 [documento n.º5 junto com a contestação].
rrr) No exercício de 2007, a autora J....., S.A. declarou um resultado líquido de €300.206,44 com dívidas a instituições de crédito de €8.685.000,00 [documento n.º5 junto com a contestação].
sss) No exercício de 2008, a autora J....., S.A. declarou um resultado líquido negativo de (€ 1.010.747,16) com dívidas a instituições de crédito de €11.205.000,00 [documento n.º5 junto com a contestação].
ttt) No exercício de 2009, a autora J....., S.A. declarou um resultado líquido negativo de (€623.486,15) com dívidas a instituições de crédito de €28.573.000,00 [documento n.º5 junto com a contestação].
uuu) No exercício de 2010, a autora J....., S.A. declarou um resultado líquido negativo de (€565.221,10) com financiamentos obtidos de €18.564.326,27 [documento n.º5 junto com a contestação].
vvv) No exercício de 2011, a autora J....., S.A. declarou um resultado líquido €1.951.582,34 [documento n.º5 junto com a contestação].
www) No exercício de 2012, a autora J....., S.A. declarou um resultado líquido €339.971,09 [documento n.º5 junto com a contestação].
xxx) No exercício de 2003, a autora M....., Lda. declarou resultados líquidos de €76.597,58, com dívidas a instituições de crédito de € 1.010.777,74 [documento n.º6 junto com a contestação].
yyy) No exercício de 2004, a autora M....., Lda. declarou resultados líquidos de €105.349,68, com dívidas a instituições de crédito de €1.451.080,73, referindo no Relatório de Gestão que, naquele ano económico, “(…) a exemplo do ano anterior a economia nacional continua a atravessar uma profunda crise (...)” [documento n.º6 junto com a contestação].
zzz) No exercício de 2005, a autora M....., Lda. declarou resultados líquidos de €5.732,84, e dívidas a terceiros, de curto prazo, de €3.012.189,00, referindo no Relatório de Gestão que “(...) o ano de 2005, foi tremendamente difícil, pois o número de processos não aprovados por instituições bancárias, continuou a aumentar, a par da crescente dificuldade em se venderem imóveis usados, facto que origina que potenciais clientes não passem disso mesmo” [documento n.º6 junto com a petição inicial].
aaaa) No exercício de 2006, a autora M....., Lda. declarou lucro tributável de €18.444,61 com dívidas a instituições de crédito de €2.397.771,39 [documento n.º7 junto com a petição inicial].
bbbb) No exercício de 2007, a autora M....., Lda. declarou prejuízo para efeitos fiscais de (€151.784,72) com dívidas a instituições de crédito de €3.556.469,39 [documento n.º7 junto com a contestação].
cccc) No exercício de 2008, a autora M....., Lda. declarou prejuízo para efeitos fiscais de (€62.962,53) com dívidas a instituições de crédito de €6.527.762,57 [documento n.º7 junto com a contestação].
dddd) No exercício de 2009, a autora M....., Lda. declarou prejuízo para efeitos fiscais de (€43.870,49) com dívidas a instituições de crédito de €5.070.578,17 [documento n.º7 junto com a contestação].
eeee) No exercício de 2010, a autora M....., Lda. declarou lucro tributável de €19.005,43 [documento n.º7 junto com a contestação].
ffff) No exercício de 2011, a autora M....., Lda. declarou prejuízo para efeitos fiscais de (€207.346,56) [documento n.º7 junto com a contestação].
gggg) No exercício de 2012, a autora M....., Lda. declarou prejuízo para efeitos fiscais de (€268.846,46) [documento n.º7 junto com a contestação].
hhhh) A proprietária do lote 1 do Alvará de Loteamento n.º2/2004 é a autora J....., Lda. [documentos juntos com o requerimento apresentado pelas autoras em 18/11/2015].
iiii) A 1.ª e a 2.ª autoras iniciaram as obras de construção dos edifícios, nos lotes n.ºs 4 e 5, no ano de 2004 [depoimento testemunhal].
jjjj) A 1.ª e a 3.ª autoras não puderam realizar obras, respectivamente, nos lotes 1, 6 e 7 e 2 e 3.
kkkk) Em 10/03/2005, quando foi proposta a acção n.º305/05.4BESNT, encontrava-se construída parte da estrutura dos edifícios [depoimento testemunhal.
llll) Durante a pendência dos citados processos, as autoras viveram uma situação de incerteza quanto à legalidade dos seus lotes e quanto às autorizações administrativas que lhes haviam sido concedidas pelo Município de Oeiras [Relatório Pericial].
mmmm) Durante a pendência dos citados processos, a 1.ª e a 2.ª autoras estiveram impossibilitadas de saber se e quando poderiam vir a prosseguir com as obras autorizadas nos lotes n.ºs 4 e 5 da sua propriedade [Relatório Pericial].
nnnn) Durante a pendência do Processo n.º1343/04.0BESNT, a 1.ª e a 3.ª autoras ficaram impossibilitadas de promover a emissão dos alvarás de autorização para a execução de obras nos seus lotes n.ºs 1, 2, 3, 6 e 7 [Relatório Pericial].
oooo) Em resultado das acções, as autoras ficaram impedidas de promover qualquer construção nos lotes de terreno de que eram e são proprietárias [Relatório Pericial].
pppp) A pendência das acções inviabilizou a comercialização dos lotes [Relatório Pericial].
qqqq) As obras de construção nos lotes n.ºs 4 e 5 mantiveram-se suspensas pelo período de 8 anos [Relatório Pericial].
rrrr) A crise económica afectou o país e, em particular, o mercado imobiliário especialmente a partir de 2008 [Relatório Pericial].
ssss) As autoras são empresas comerciais que visam o lucro através da aplicação de capitais na compra de terrenos e edifícios destinados à sua promoção imobiliária ou à sua colocação no mercado para arrendamento e obtenção de rendimento [Relatório Pericial].
tttt) Nos anos de 2005 a 2007, a taxa de rentabilidade média das empresas imobiliárias foi de, pelo menos, 10% [Relatório Pericial e depoimento testemunhal].
uuuu) Entre os anos de 2005 a 2013, a taxa de juro média nas operações passivas bancárias a um ano ascendeu a 3% [Relatório Pericial].
vvvv) O valor médio do metro quadrado de área bruta de construção para habitação na área de Paço de Arcos-Oeiras, nos anos de 2005-2007, poderia ascender a cerca de €2.000.00/m2 [Relatório Pericial e depoimento testemunhal].
wwww) No concelho de Oeiras, os anos de 2005 a 2007 foram anos de grande dinamismo e expansão da procura de terrenos e de fogos destinados à habitação [Relatório Pericial].
xxxx) A 1.ª autora poderia ter concluído as obras de construção do edifício do lote n.º4 dentro de um prazo que pode ser estimado em 24 meses, ou seja, poderia ter concluído as obras em Setembro de 2006 [Relatório Pericial e depoimento testemunhal].
yyyy) Em condições de normalidade, era possível que, no decurso do prazo máximo de 36 meses contados da data do início das obras – desde Setembro de 2004 até Setembro de 2007 –, a 1.ª autora concluísse o seu projecto de comercialização dos fogos dos edifícios do lote n.º 4 [Relatório Pericial e depoimento testemunhal].
zzzz) A 2.ª autora poderia ter concluído as obras de construção do edifício no lote n.º5 dentro de um prazo que pode ser estimado em 24 meses, ou seja, poderia ter concluído as obras em Setembro de 2006 [Relatório Pericial e depoimento testemunhal].
aaaaa) Em condições de normalidade, era possível que, no decurso do prazo máximo de 36 meses contados da data do início das obras, isto é, até Setembro de 2007, a 2.ª autora concluísse o seu projecto de comercialização dos fogos do edifício do lote n.º5 [Relatório Pericial].
bbbbb) As obras dos lotes n.ºs 4 e 5 permaneceram desde 2005 até data não concretamente apurada, mas, pelo menos, até Março de 2013, em estado de abandono na paisagem de Oeiras, sendo as obras localmente conhecidas pelo nome de “mamarracho dos poetas” [depoimento testemunhal].
ccccc) Tendo ficado impedidas de construir nos seus lotes de terreno, as autoras ficaram, todavia, sujeitas à inerente tributação de imposto municipal sobre imóveis (IMI) durante o período em que durou tal impedimento.
ddddd) Pelo menos desde 2006, a economia mundial está em crise, com graves reflexos em Portugal [facto notório].
eeeee) Esta crise alastrou a Portugal, tendo afectado especialmente o sector imobiliário a partir de 2008 [facto notório e Relatório Pericial].
fffff) Até, pelo menos, o ano de 2005, as autoras tinham em construção e/ou venda outros imóveis além do empreendimento em causa nos autos [documentos n.ºs 2, 4 e 6 juntos com a contestação].
ggggg) O empreendimento em causa nos autos tem actualmente a designação comercial de “U.....” [acordo].
hhhhh) Estão já edificados, pelo menos, os lotes n.ºs 2, 3 e 4 do empreendimento [acordo].
iiiii) Já foram vendidas, pelo menos, 17 fracções do lote n.º4 [documentos juntos pelas autoras com o requerimento apresentado em 23/01/2018].
jjjjj) Já foram vendidas, pelo menos, 18 fracções do lote n.º5 [documentos juntos pelas autoras com o requerimento apresentado em 23/01/2018].
Factos não provados:
a) Em resultado da selagem dos estaleiros e da colocação de um cadeado, as autoras ficaram privadas de acederem aos seus prédios.
b) A pendência das acções perturbou e perturba o programa de investimento das autoras, fazendo acrescer custos e atrasando o retorno dos capitais investidos.
c) A possibilidade legal de retomar as obras cuja construção foi programada para 2004-2005, ocorrendo só em 2012-2013, em ambiente de profunda crise económica, não significa para as autoras uma verdadeira possibilidade económica, considerando a absoluta inexistência de mercado no sector imobiliário.
d) Se a 1.ª autora não tivesse sido impedida de obter os alvarás de autorização para construção nos lotes n.ºs 2 e 3, de sua propriedade, teria promovido as respectivas construções dentro de um prazo que pode ser estimado em 24 meses, ou seja, poderia ter concluído as obras em Setembro de 2006.
e) Entre 2005 e 2007, seria previsível que a 1.ª Autora comercializasse os fogos dos lotes n.ºs 2, 3 e 4 a valores médios de € 2.000/m2, recebendo um valor estimado nunca inferior a:
Lote n°.2: € 9.720.000 (nove milhões, setecentos e vinte mil Euros) - 2000€/m2 x 4.860 m2 = € 9.720.000;
Lote n°.3: € 9.720.000 nove milhões, setecentos e vinte mil Euros) - 2000€/m2 x 4.860 m2 = € 9.720.000;
Lote n°.4: € 8.560.000 (oito milhões, quinhentos e sessenta mil Euros) - 2000€/m2 x 4.280 m2 = € 8.560.000.
f) Deste modo, a 1.ª Autora ficou desapossada das quantias correspondentes ao valor da comercialização dos fogos dos edifícios a construir nos lotes n.ºs 2, 3 e 4 - num total de 28.000.000 Euros (vinte e oito milhões de Euros) - desde o momento em que era expectável a venda dos fogos até à presente data.
g) Considerando a taxa de rentabilidade das empresas imobiliárias, pelo menos de 10%/ano sobre os capitais investidos, com o valor de mercado da venda dos fogos dos lotes n.ºs 2, 3 e 4, a 1.ª autora poderia obter um rendimento de 10%/ano, ou seja, um total de € 2.800.000/ano (dois milhões e oitocentos mil euros).
h) Considerando a taxa de juro média nas operações passivas bancárias vigente entre os anos de 2004 a 2013, com o valor de venda dos fogos (28.000.000 Euros), a 1.ª Autora poderia obter em juros de depósitos a prazo um rendimento nunca inferior a 3%/ano, ou seja, um total de €840.000/ano (oitocentos e quarenta mil Euros).
i) Entre 2006 e 2007, seria previsível que a 2.ª autora comercializasse os fogos do lote n.º5 a valores médios de €2000.00/m2, recebendo um valor estimado nunca inferior a €8.060.000 (oito milhões e sessenta mil euros) – 2000€/m2 x 4.030m2 = €8.060.000.
j) Deste modo, a autora ficou desapossada das quantias correspondentes ao valor da comercialização dos fogos do edifício a construir no lote n.º5, num total de 8.060.000 Euros (oito milhões e sessenta mil euros), desde o momento em que era expectável a venda dos fogos até à presente data.
k) Considerando a taxa de rentabilidade das empresas imobiliárias, pelo menos de 10%/ano sobre os capitais investidos, com o valor de mercado da venda dos fogos do lote n.º5, a 2.ª autora poderia obter um rendimento de 10%/ano, ou seja, um total de €806.000/ano.
l) Considerando a taxa de juro média nas operações bancárias vigente entre os anos de 2005 a 2013, com o valor de venda dos lotes, a 2.ª autora poderia obter em juros de depósitos a prazo um rendimento nunca inferior a 3%/ano, ou seja, um total de €241.800.00.
m) A 3.ª autora ficou desapossada da quantia de €800.000.00, desde o momento em que era expectável a emissão dos alvarás de construção para os lotes n.ºs 6 e 7, que se situa em 2005, até à presente data.
n) Considerando a taxa de rentabilidade das empresas imobiliárias, pelo menos de 10%/ano sobre os capitais investidos, com o citado valor, a 3.ª autora poderia obter um rendimento de 10%/ano, ou seja, um total de €80.000/ano.
o) Considerando a taxa de juro média nas operações passivas bancárias vigente entre os anos de 2004 a 2013, com o recebimento do citado valor, a 3.ª autora poderia obter, em juros de depósitos a prazo, um rendimento nunca inferior a 3%/ano, ou seja, um total de €24.000.
p) Se a 3.ª autora não tivesse sido impedida de promover a emissão do alvará de construção para o lote n.º1, teria podido promover as respectivas construções dentro de um prazo normal que se estima em 24 meses, ou seja, teria previsivelmente concluído as respectivas obras em Setembro de 2006.
q) Em qualquer caso, em condições de normalidade, seria previsível que no decurso de 36 meses contados da data do início das obras, isto é, até Setembro de 2007, a 3.ª autora concluísse o seu projecto de comercialização do edifício do lote n.º1.
r) Entre 2006 e 2007, seria previsível que a 3.ª autora comercializasse o lote n.º1 a valores médios de €2.000/m2, recebendo um valor estimado nunca inferior a €11.268.00 – 2000€/m2 x 5.634 m2 = 11.268.000.
s) Deste modo, a 3.ª autora ficou desapossada das quantias correspondentes ao valor da comercialização do edifício a construir no lote n.º1, num total de €11.268.000.00, desde o momento em que era expectável a venda dos fogos até à presente data.
t) Considerando a taxa de rentabilidade das empresas imobiliárias, pelo menos de 10%/ano sobre os capitais investidos, com o valor de mercado da venda dos fogos do lote n.º1, a 3.ª autora poderia obter um rendimento de 10%/ano, ou seja, um total de €1.126.800.00/ano.
u) Considerando a taxa de juro média nas operações passivas bancárias vigente entre os anos de 2004 a 2013, com o valor da venda dos lotes (€11.268.000.00), a 3.ª autora poderia obter em juros de depósitos a prazo um rendimento nunca inferior a 3%/ano, ou seja, um total de €338.040.00.
v) Mercê das acções judiciais e da permanência dos seus efeitos suspensivos, com a consequente manutenção da garantia bancária prestada em favor do Município, a 3.ª autora suportou encargos bancários e juros com essa garantia.
w) A 3.ª autora não teria suportado tais despesas se tivesse podido concluir as obras de urbanização conforme projectado e licenciado.
x) As autoras recorreram a financiamentos bancários para a aquisição dos lotes n.ºs 2, 3, 4 e 5 e apoio às construções a implantar nos mesmos:
a) A 1.ª autora contratou com a Caixa G.....um financiamento bancário no valor de €8.512.500.00 e com o Banco S......no valor de €2.430.000.00;
b) A 2.ª autora contratou com a Caixa G.....um financiamento bancário no valor de €932.550.00 e com o Banco Santander no valor de €1.465.000.00.
c) A 3.ª autora contratou com a Caixa G.....um financiamento bancário no valor de €6.462.968.00 e com o Banco S......no valor de €249.399.00.
y) Tais contratos bancários importaram juros e despesas bancárias.
z) Tais juros e despesas bancárias foram suportados pelas autoras durante o período de tempo de vigência dos embargos.
aa) No mercado imobiliário, as autoras foram e estão hoje associadas à imagem degradada das obras paradas.
bb) Em razão da paragem prolongada das obras, as sociedades autoras, enquanto construtoras, e a 3.ª autora também como urbanizadora, foram e são hoje vistas como entidades sem capacidade técnica e económica para concluir os seus projectos imobiliários.
cc) Tal ideia é partilhada pela generalidade dos operadores do mercado imobiliário e pelo público em geral.
dd) Em face da suspensão das obras, a 1.ª e a 2.ª autoras foram confrontadas pela Caixa G.....pela necessidade de apresentar um ponto de situação relativamente a essa suspensão, sob pena de denúncia dos contratos de financiamento e sua liquidação imediata e cobrança coerciva.
ee) A situação descrita causou danos no bom nome e imagem das autoras.
ff) A simples pendência dos processos impugnatórios durante mais de 8 anos gerou dificuldades na organização e no planeamento das decisões societárias das autoras.
gg) A incerteza associada ao desfecho das acções impediu e perturbou outras decisões de investimento por parte das autoras.
hh) Com a contestação dos Processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, que vieram a ser julgados improcedentes, as autoras suportaram os inerentes custos, com a contratação de advogados, implicando o pagamento de honorários, taxas, certidões e outras despesas.
ii) De acordo com o Censos de 2001, estavam vagos, em Portugal, 10,8% dos alojamentos existentes, ou seja, cerca de 522 milhares de fogos, o que significa que, já em 2001, existia excesso de oferta imobiliária.
jj) As autoras tinham e têm níveis de endividamento bancário muito elevado, face ao seu capital social, activos e volume de negócios.
kk) Evidenciando uma estrutura económico-financeira pouco sólida, susceptível de ser gravemente afectada por qualquer variação negativa do mercado imobiliário e pelo aumento das taxas de juro das operações bancárias.
ll) O valor médio de cada uma das fracções do empreendimento em causa nos autos é, actualmente, face ao valor a que estão a ser comercializadas, de cerca de €790.000.00.
mm) O valor médio de venda do metro quadrado de área de construção do empreendimento em causa nos autos é, actualmente, face ao valor a que está a ser comercializado, de cerca de €4.265.00.

IV – Do Direito
No que ao discurso fundamentador concerne, expendeu-se no Tribunal a quo, e no que aqui releva, designadamente o seguinte:
“Na presente ação, as autoras fundamentam a sua pretensão, em suma, no facto de o Ministério Público ter intentado duas ações administrativas especiais, que correram termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sob os n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, que, por força do disposto nos artigos 69.º, n.º2, e 103.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, impediram a construção nos lotes de que eram proprietárias, causando-lhes prejuízos.
(…)
Está, assim, em causa na presente ação, por um lado, a responsabilidade civil do Estado por factos ilícitos, consubstanciados na errada propositura das supra identificadas ações pelo Ministério Público e na demora na prolação de uma decisão jurisdicional nas mesmas ações, e, por outro lado, a responsabilidade civil do Estado por factos lícitos, que as autoras enquadram juridicamente no instituto da indemnização pelo sacrifício consagrado no artigo 16.º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais entidades públicas, aprovado pela Lei n.º67/2007, de 31 de Dezembro.
(…)
À data em que foram propostas as ações que correram termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra com os n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, respectivamente, em 11/10/2004 e 10/03/2005, ainda não se encontrava em vigor o Regime da Responsabilidade Civil do Estado e demais entidades públicas, aprovado pela Lei n.º67/2007, de 31 de dezembro, que entrou em vigor em 30/01/2008, pelo que este regime não é aplicável à pretensão indemnizatória das autoras.
(…)
No Processo n.º1343/04.0BESNT, o Ministério Público pediu que fosse declarada a nulidade ou, no mínimo, anulado o ato de licenciamento titulado pelo alvará de loteamento n.º2/04, bem como todos os atos consequentes daquele ato, designadamente, as licenças de construção e de utilização que viessem a ser emitidas, e que fosse determinada a reposição da parcela de terreno no estado em que se encontrava [alínea p) dos factos provados].
O Ministério Público imputou ao ato de licenciamento vício de violação de lei, por violação do Regulamento do PDM de Oeiras e por violação dos princípios e objetivos gerais deste Regulamento, tendo defendido, nesta ação, que a operação de loteamento excedia “a área de construção máxima”, o “número de habitantes” e o “número de fogos” permitido pelo referido Regulamento [alíneas q) e r) dos factos provados].
Segundo as autoras vieram a apurar, a ação foi apresentada na sequência da apresentação de um articulado intitulado “queixa” junto do Procurador da República no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datado de 18/07/2004 [alínea t) dos factos provados].
No Processo n.º305/05.4BESNT, o Ministério Público pediu que fosse declarada a “nulidade dos dois atos administrativos datados de 07.09.2004, ambos da autoria do Vice-presidente da Câmara Municipal de Oeiras, devidamente identificados no articulado da ação, e mediante os quais foram emitidos os alvarás de autorização n.º120/2004 RJUE e 121/2004 RJUE” [alínea y) dos factos provados].
A referida ação reproduz a mesma argumentação apresentada no Processo n.º1343/04.0BESNT, sustentando a violação do PDM quanto à “área de construção máxima”, o “número de habitantes” e o “número de fogos” [alínea z) dos factos provados].
(…)
É certo que as referidas ações vieram a ser julgadas improcedentes [alíneas qq) e vv) dos factos provados]. Contudo, tal é manifestamente insuficiente para concluirmos pela ilicitude da conduta do Ministério Público ao propor as mesmas ações.
(…)
Acresce, noutra perspetiva, que a conduta processual do Ministério Público no âmbito das referidas ações não se mostra manifestamente errada ou contrária ao Direito, sendo certo que a interposição do recurso da sentença proferida no Processo n.º1343/04.0BESNT constitui o exercício de um direito processual.
Nesta medida, impõe-se concluir que a propositura das referidas ações pelo Ministério Público não consubstancia um facto ilícito, uma vez que se encontravam preenchidos os pressupostos do exercício da ação pública, sendo que, por outro lado, a sua conduta processual no âmbito das mesmas ações não se mostra manifestamente errada ou contrária ao Direito.
A questão que se coloca, assim, é a de saber se a alegada demora na prolação das decisões nos Processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT é suscetível de responsabilizar civilmente o Estado pelos danos causados às autoras.
(…)
A violação do direito a uma decisão em prazo razoável constitui um facto ilícito, sendo o primeiro pressuposto da responsabilidade civil extracontratual do Estado, pelo que cumpre verificar, em primeiro lugar, se tal pressuposto se encontra preenchido na situação dos autos, o que coloca a questão de saber qual a medida do atraso na decisão judicial que consubstancia a referida violação.
(…)
São de excluir desde logo da possibilidade de servir de esteio à apreciação os atrasos que tenham sido provocados pela própria parte que se queixa da demora.
Deve em seguida passar a analisar-se na globalidade o tempo de duração da ação e o seu estado e, se a conclusão que se recolher deste conspecto for clara e seguramente no sentido de que foi ultrapassado o prazo razoável não deveremos perder-nos na floresta dos meandros processuais à procura de saber se foi ou não cumprido religiosamente cada um dos prazos dos atos daquele percurso.
(…)
É de sublinhar neste ponto que em alguns casos de claro excesso do prazo razoável poderia porventura o método analítico de cada ato processual e respetivo prazo conduzir à conclusão de que não houve atrasos, mas nem assim se pode infirmar a conclusão do excesso injustificado porque a ser assim teria o Estado que prover a criação de outros ou diferentes meios, mecanismos, prazos, organização, para o objetivo de administrar a justiça em prazo razoável.
(…)
Da jurisprudência citada resulta que o prazo razoável deve ser aferido tendo em consideração o processo concreto, bem como a duração global do mesmo, sem prejuízo de se poder ter igualmente em conta os prazos processuais fixados na lei, ainda que o incumprimento ou o cumprimento destes não se possa ter por determinante para se concluir pela violação, ou não, do prazo razoável de decisão.
No juízo sobre a razoabilidade da duração do processo concreto e fazendo apelo à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, importa atender aos seguintes critérios: complexidade da ação, comportamento dos demandantes, atuação das autoridades judiciais e importância do litígio para as partes envolvidas.
(…)
Relativamente à atuação das autoridades judiciais, cumpre averiguar da diligência com que foi dado andamento ao processo, ou seja, verificar se ocorreram atrasos significativos na tramitação da ação imputáveis ao Tribunal.
(…)
Da factualidade provada resulta que a ação que correu termos sob o n.º1343/04.0BESNT foi proposta em 11/10/2004 e que, tendo o Ministério Público requerido a realização de uma perícia, em 09/05/2007, foi apresentado o Relatório Pericial [alíneas p), oo) e pp) dos factos provados].
Em 31/10/2008, foi proferida sentença, de que foi interposto recurso pelo Ministério Público, em 04/12/2008, sendo que por Acórdão datado de 12/04/2012, já transitado em julgado, o recurso foi julgado improcedente [alíneas pp) a ss) dos factos provados].
Desde a data em que foi proposta a ação até à data em que transitou em julgado a sentença nela proferida decorreram cerca de 7 anos e 6 meses.
A ação que correu termos sob o n.º305/05.4BESNT foi proposta em 10/03/2005 e, por despacho de 29/11/2005, foi determinada a suspensão da instância até à decisão do Processo n.º1343/04.0BESNT, sendo que, por decisão de 08/03/2013, já transitada em julgado, a ação foi julgada improcedente [alíneas x), ll) e vv) dos factos provados], o que significa que desde que a ação foi proposta até à data em que foi proferida sentença decorreram cerca de 7 anos e 4 meses.
Assim sendo, conclui-se que a duração das referidas ações foi superior àquela que a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem considerado razoável, qual seja cerca de 3 anos em 1.ª instância e entre 4 a 6 anos a duração de todo o processo [cfr. Isabel Celeste Fonseca, in CJA, nº. 72, pags. 45 e 46].
(…)
Atenta a factualidade provada, não podemos concluir que a tramitação das referidas ações assumiu uma complexidade superior à comum, ou seja, uma complexidade superior à inerente à tramitação de uma ação administrativa especial tal como a mesma se encontra legalmente prevista no CPTA.
(…)
Em suma, o facto de ter sido realizada uma perícia no âmbito do Processo n.º1343/04.0BESNT deve ser tomado em consideração para aferir da razoabilidade da duração do processo – não é indiferente, para a celeridade processual, ser ou não produzida prova pericial, como não é ser ou não produzida prova testemunhal –, mas não surge como determinante para concluirmos pela complexidade das ações em causa nos autos.
(…)
Quanto à atuação do Tribunal, surge como relevante, no Processo n.º1343/04.0BESNT, o período de tempo que mediou entre a apresentação do Relatório Pericial e a prolação da sentença em 1.ª instância – cerca de um ano e 5 meses – e entre a interposição do recurso da sentença e a prolação do Acórdão pelo Tribunal Central Administrativo Sul que julgou improcedente o recurso – cerca de 3 anos e 4 meses.
(…)
Quanto à ação que correu termos sob o n.º305/05.4BESNT, importa ter presente que a instância esteve suspensa desde 29/11/2005 até ao trânsito em julgado da sentença proferida no Processo n.º1343/04.0BESNT, sendo que, durante o período em que a instância esteve suspensa, não podiam ser praticados quaisquer atos no processo.
Atenta a factualidade provada nos autos, não podemos concluir que tenha sido o comportamento das partes a obstar ao regular andamento do processo.
Tendo presente o alegado pelo réu, cumpre referir que o facto de as autoras não terem requerido que fosse atribuído efeito meramente devolutivo ao recurso interposto da sentença proferida no Processo n.º1343/04.0BESNT não assume, nesta sede, qualquer relevância, uma vez que não impendia sobre as mesmas o dever de efetuar tal requerimento.
(…)
De facto, no juízo sobre a razoabilidade da duração das ações em causa nos autos e, em concreto, no que respeita à importância do litígio para as partes, não podemos olvidar que a impugnação de atos de licenciamento com fundamento em qualquer das ilegalidades previstas no artigo 68.º do RJUE implica a suspensão imediata dos trabalhos de execução da obra, bem como a suspensão da eficácia da licença, o que significa que, quando seja impugnada uma licença de loteamento, não é possível obter as correspondentes licenças de construção nos lotes [cfr. artigo 103.º do RJUE].
Pelo exposto, considerando, por um lado, que a complexidade das ações resultava da complexidade das matérias discutidas nos autos e que a conduta processual das partes não contendeu com a celeridade processual e, por outro lado, que o Processo n.º1343/04.0BESNT esteve a aguardar a decisão em 2.ª instância durante mais de três anos, o que determinou que apenas viesse a ser proferida sentença no Processo n.º305/05.4BESNT mais de 7 anos depois de ter sido proposta a ação, e, ainda, atenta a importância do litígio para as partes, concluímos que a duração global das referidas ações – superior a 6 anos – excedeu o prazo razoável, não cumprindo, assim, analisar os atomísticos atos de cada um dos processos.
(…)
Assim, concluindo que foi violado o direito das autoras a uma decisão em prazo razoável, encontra-se preenchido o primeiro pressuposto da responsabilidade civil do Estado.
Cumpre, assim, apreciar e decidir se se verifica o segundo pressuposto da responsabilidade civil, ou seja, a culpa.
(…)
Ora, cabe ao Estado assegurar que as decisões judiciais são proferidas em prazo razoável, o que implica que o mesmo dote os Tribunais dos meios humanos e materiais necessários para o efeito, sendo certo que a falta de meios nos Tribunais não constitui causa de exclusão da culpa do Estado, na medida em que tal falta de meios lhe é imputável.
(…)
Nesta medida, concluímos que se encontra preenchido o segundo pressuposto da responsabilidade civil.
Vejamos, então, se se encontram preenchidos os pressupostos do dano e do nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Da factualidade provada resulta que, em resultado das ações propostas pelo Ministério Público, as autoras ficaram impedidas de promover qualquer construção nos lotes de terreno de que eram e são proprietárias e que a pendência das ações inviabilizou a comercialização dos lotes, bem como que as obras de construção se mantiveram suspensas pelo período de 8 anos [alíneas oooo) a qqqq) dos factos provados].
(…)
O dano que as autoras imputam à demora na prolação das decisões proferidas nos Processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT é o prejuízo correspondente à indisponibilidade dos montantes que razoavelmente seria de esperar que obteriam com a venda dos lotes a construir.
(…)
Contudo, o atraso nos processos já referidos não obstou a que as autoras, findos os mesmos, procedessem à construção e comercialização dos lotes, ou seja, não inviabilizou a concretização do seu projeto em momento posterior, apenas retardou a mesma, sendo certo que resultou provado nos autos que estão já edificados, pelo menos, os lotes 2, 3 e 4 do empreendimento, tendo sido vendidas, pelo menos, 17 frações do lote n.º4 e, pelo menos, 18 frações do lote n.º5 [alíneas ggggg) a jjjjj) dos factos provados].
Acresce, noutra perspetiva, que, atenta a factualidade provada, não podemos concluir que o retardamento da concretização do projeto das autoras decorrente do atraso nos Processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT lhes causou prejuízos, uma vez que, desde logo, não resultou provado nos autos que a possibilidade de retomar as obras cuja construção foi programada para 2004-2005, ocorrendo só em 2012-2013, em ambiente de profunda crise económica, não significa para as autoras uma verdadeira possibilidade económica [alínea c) dos factos não provados].
(…)
De facto, as autoras não pedem, a título de indemnização pelos danos, o valor que teriam obtido com a venda do empreendimento, mas, de outro modo, os juros que teriam obtido caso tivessem efetuado a venda e colocado o produto da mesma num depósito a prazo.
No entanto, atenta a factualidade provada, não podemos concluir que se não fosse o atraso que se verificou nos Processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT as autoras teriam logrado vender, todos ou alguns dos lotes de que são proprietárias em momento anterior àquele em que terminaram as referidas ações, auferindo o correspondente lucro, vendo-se, assim, privadas do mesmo por força do referido atraso, causando-lhes, assim, um prejuízo que, como aquelas pretendem, pode ser calculado com base no valor que teriam auferido se tivessem colocado o produto das vendas num depósito a prazo.
(…)
Atento o exposto, concluímos que as autoras não lograram provar, e era seu o ónus, que o atraso verificado nos Processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT lhes causou o alegado “prejuízo correspondente à indisponibilidade dos montantes que razoavelmente seria de esperar que obteriam com a venda dos lotes a construir”.
Vejamos, agora, se as autoras lograram provar, uma vez que era seu o ónus, os demais danos por si alegados.
(…)
Assim sendo, atenta a factualidade provada, não podemos concluir que o atraso verificado nas ações n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT causou danos à 3.ª autora relativos aos encargos com a garantia bancária prestada a favor do Município de Oeiras.
(…)
Não resultou provado nos autos que as autoras recorreram a financiamentos bancários para a aquisição dos lotes n.ºs 2, 3, 4 e 5 e apoio às construções a implantar nos mesmos e que tais contratos bancários importaram juros e despesas bancárias que foram suportados pelas autoras durante o período de tempo de vigência dos embargos [alíneas x) a z) dos factos não provados].
(…9
Os juros e despesas suportados pelas autoras com o referido financiamento bancário apenas poderiam constituir um dano imputável ao atraso na administração da justiça na exata medida em que este atraso tivesse determinado um acréscimo no pagamento de tais juros e despesas, o que não resultou provado nos autos.
Quanto ao pagamento do Imposto Municipal sobre Imóveis [IMI], apenas resultou provado que, tendo ficado impedidas de construir nos seus lotes de terreno, as autoras ficaram sujeitas à inerente tributação daquele imposto durante o período em que durou tal impedimento [alínea ccccc) dos factos provados].
Também aqui a factualidade provada não permite concluir que, devido ao atraso nas ações supra identificadas, as autoras suportaram o IMI em montante superior àquele que suportariam se não fosse tal atraso.
Não resultou provado nos autos que, com a contestação dos Processos n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, as autoras suportaram os inerentes custos, com a contratação de advogados, implicando o pagamento de honorários, taxas, certidões e outras despesas [alínea hh) dos factos não provados].
(…)
Em suma, não resultaram provados nos autos os factos relativos aos alegados danos no bom nome e imagem da autora.
Pelo exposto, concluímos que as autoras não lograram provar, e era seu o ónus, que o atraso verificado nos processos em causa nos autos lhes causou danos, pelo que não se encontram preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso na administração da justiça.
A questão que se coloca, assim, é a de saber se a pretensão indemnizatória das autoras pode encontrar o seu fundamento no instituto da indemnização pelo sacrifício, em virtude de as ações propostas pelo Ministério Público lhes terem causado danos por terem determinado, por força do disposto no artigo 69.º, n.º2, do RJUE, a paralisação das obras e impedido as mesmas de, na sua pendência, construírem nos seus lotes em conformidade com os atos de licenciamento praticados pelo Município de Oeiras.
(…)
Acresce que ainda que se admitisse a possibilidade de o Estado ser responsabilizado pela atuação lícita do Ministério Público, designadamente com fundamento no princípio da responsabilidade civil do Estado consagrado no artigo 22.º da Constituição, sempre teríamos que concluir que não se encontram preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil por ato lícito.
(…)
Ora, como resulta do que já referimos, as autoras apenas lograram provar na presente ação, em suma, que a propositura das ações supra identificadas pelo Ministério Público implicou a paralisação das obras, tendo ficado impedidas de construir nos lotes de que eram proprietárias durante a pendência daquelas e que era possível que a 1.ª e a 3.ª autoras tivessem concluído a comercialização dos lotes n.ºs 4 e 5 até setembro de 2007.
É certo que, devido à pendência das referidas ações, as autoras se viram privadas de proceder à construção nos lotes de que eram proprietárias em conformidade com os atos de licenciamento praticados pelo Município de Oeiras. Contudo, a impossibilidade de construir durante um determinado lapso temporal, ainda que longo, não constitui, em si mesma, um dano, podendo, de outro modo, constituir fonte de danos para as autoras, os quais, no entanto, as mesmas não lograram provar.
(…)
Diferente seria se, por força das ações propostas pelo Ministério Público, tivesse ficado irremediavelmente prejudicada a possibilidade de as autoras procederem à construção nos lotes de que são proprietárias em conformidade com os atos de licenciamento praticados pelo Município de Oeiras.
(…)
Claro está que o referido retardamento na construção pode ter causado danos às autoras, mas tais danos, a terem existido, não resultaram provados nos autos, o que, desde logo, e sem que se possa proceder a qualquer juízo sobre a especialidade e anormalidade de danos que não foram provados, obsta a que a pretensão indemnizatória das autoras possa encontrar o seu fundamento no regime da responsabilidade civil por ato lícito.
Pelo exposto, concluindo que as autoras não lograram provar, e era seu o ónus, que se encontram preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil do Estado, quer por facto ilícito, quer por facto lícito, a presente ação tem de improceder.

Correspondentemente decidiu-se em 1ª Instância
“Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se a presente ação administrativa comum improcedente e, em consequência, absolve-se o réu do pedido.”

Vejamos:
Importa agora analisar o Recurso interposto.
Diga-se, desde já, que o Discurso fundamentador da decisão recorrida assentou praticamente em exclusivo na verificação se os reclamados danos patrimoniais se mostravam indemnizáveis, nomeadamente à luz do Atraso da Justiça, sendo que as Autoras, aqui Recorrentes, logo na PI afirmaram que “os factos descritos foram causa adequada de avultados prejuízos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelas Autoras.”

Já em sede recursiva, afirmaram as Autoras relativamente aos danos não patrimoniais:
“Com efeito, em ações de responsabilidade civil fundadas em atrasos na administração da justiça e violação dos artigos 20º n.º 1 da CRP e 6º §1.º da CEDH – como é também o caso patenteado nos presentes autos –, presume-se a existência de um dano moral relevante, embora se admita prova do contrário e independentemente de o lesado poder vir a demonstrar que, para além desse dano presumido, outros danos patrimoniais e não patrimoniais ocorreram. Desde há muito que a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem entende a este respeito que o “dano não patrimonial é a consequência normal, ainda que não automática, da violação do direito a uma decisão em prazo razoável e presume-se como existente, sem necessidade de dele fazer prova, sempre que a violação tenha sido objetivamente constatada” – cfr. acórdão nº 62361, de 29 de março de 2006 (caso Riccardi Pizzati c. Itália), citado no ac. do Ac. STA, de 10/09/2008, no Proc. n.º 0319/08, in www.dgsi.pt. Igualmente os Tribunais Administrativos entendem que o dano não patrimonial dos sujeitos lesados pela falta de decisão em prazo razoável, é um facto da vida do conhecimento geral e que “merece a tutela o direito mesmo que não se efetue uma específica prova de ter causado grande sofrimento ou sensível alteração da vida ou de comportamentos, depressão ou outra situação clinicamente caracterizável como sofrimento psicológico e moral” – cfr. ac. TCAN, de 12.10.2012, Proc. 00064/10.9BELSB, in www.dgsi.pt.
Entende-se, assim, pacificamente, que “a duração excessiva de um processo judicial cria na ordem jurídica uma presunção de dano não patrimonial a favor do lesado, não lhe cabendo o ónus da prova sempre que se constate objetivamente a violação do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável.” – cfr. o recente Ac. TCAS, de 03/21/2019, no Proc. n.º 365/17.5BELSB, in www.dgsi.pt.
Assim é que, “se a parte que invoca a lesão alegar e procurar provar mais danos do que os comuns, mas não conseguir provar que os sofreu, nem por isso fica prejudicada no direito à indemnização que resulta da presunção natural de um dano moral relevante, salvo quando se provar que em concreto, mesmo este, não ocorreu” – cfr. Ac. STA, de 10/09/2008, no Proc. n.º 0319/08, in www.dgsi.pt.
Estando em causa nos presentes autos, sociedades comerciais lesadas com a violação do direito a uma decisão célere, nem por isso estas deixam de sofrer danos de natureza não patrimonial, pois “as pessoas coletivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza” (v. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2005, pág. 113).
Assim, de acordo com a jurisprudência do TEDH, os danos não patrimoniais de uma sociedade comercial podem incluir “a reputação da empresa, a incerteza no planeamento da decisão, a perturbação na gestão da empresa (para a qual não existe um método preciso de cálculo das consequências) e, por último, embora em menor grau, o inconveniente causado aos membros da equipa de gestão”. – cfr. acórdãos do TEDH de 6.4.2000, no Proc. 35 382/97, (…)
Pelo que, ainda que as Autoras não lograssem ter feito prova dos danos patrimoniais e não patrimoniais por si alegados, sempre estaria presente o dano moral comum, presumido e implícito ao atraso na decisão dos processos.”

Vejamos em concreto, os vícios suscitados recursivamente:
DO ERRO DE JULGAMENTO NA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Invocam os AA. que, face à prova produzida deveriam ter sido dados acrescidamente como provados outros factos.

Atenda-se, desde logo, ao sumariado no Acórdão do TCAN nº 02078/20.1BEPRT-A, de 02-07-2021, onde se refere que “Em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida.
A alteração da matéria de facto por instância superior, sempre deverá ser considerada uma intervenção excecional.”

Diga-se ainda, tal como sumariado, entre muitos outros no Acórdão do TCAN nº 1828/06.3BEPRT de 27-11-2020, que “Em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida.”
Como se sumariou igualmente no acórdão do TCAN nº 01466/10.6BEPRT, de 04.11.2016, “À instância recursiva apenas caberá sindicar e modificar o decidido quanto à factualidade dada como provada e não provada, caso verifique a ocorrência de erro de apreciação, suscetível de determinar a viciação da decisão final, mormente enquanto erro de julgamento, patente, ostensivo palmar ou manifesto.”

Em qualquer caso, sem prejuízo do referido, os recorrentes não demonstram que os factos que pretende alterar e/ou incluir na matéria dada como provada, influenciariam a decisão final a proferir, em face do que, só por si, sempre improcederia o pretendido.

No entanto, e para que não possam subsistir quaisquer dividas, veja-se, desde logo, a fundamentação aduzida pela sentença recorrida relativamente aos factos questionados:
Alínea a) dos factos não provados:
“Considerou-se provado que a 1.a e a 3.a autoras não puderam realizar obras nos lotes n.º1, 6 e 7 e 2 e 3 [alínea jjjj) dos factos provados], uma vez que, como resulta da demais factualidade provada, apenas foram emitidas as licenças de construção relativas aos lotes n.º 4 e 5 e, em resultado da ação n.º 1343/04.0BESNT, ficaram suspensos os efeitos do alvará de loteamento n.º 2/2004, ficando o Município impedido de emitir alvarás de construção para os lotes n.º 1, 2, 3, 6 e 7 [alínea v) dos factos provados], sendo que, sem a licença de construção, as autoras não poderiam realizar quaisquer obras nos lotes referidos.
Não se considerou, no entanto, provado que, em resultado da selagem dos estaleiros e da colocação de um cadeado, as autoras ficaram privadas de acederem aos seus prédios [alínea a) dos factos não provados], uma vez que não foi produzida prova quanto a esta matéria”.

O tribunal, como é suposto, deu como provada ou não provada a matéria de facto de acordo com os factos que foram alegados pelas partes, sendo que face à factualidade em questão, as Recorrentes se limitaram a invocar que, na sequência da selagem dos estaleiros, ficaram privadas de aceder aos seus prédios, sendo que o que estava em causa e havia sido requerido, era a mera suspensão da execução das obras e não o acesso às mesmas.
Alíneas b), ff) e gg) dos factos não provados:
“Não se considerou, no entanto, provado que a pendência das ações perturbou e perturba o programa de investimento das autoras, fazendo acrescer custos e atrasando o retorno dos capitais investidos [alínea b) dos factos não provados], uma vez que se trata de um facto conclusivo, nada tendo sido alegado em concreto sobre o programa de investimento das autoras e qual o “papel” do empreendimento em causa nos autos no mesmo e de que forma a pendência das ações se refletiu em tal programa.
(...)
Relativamente à matéria das alíneas ff) e gg) dos factos não provados, que corresponde aos temas da prova n.º 66 e 67, cumpre referir que as autoras não concretizaram, através da alegacã̧ o de factos concretos, em que consistiram as dificuldades na organização e no planeamento das decisões societárias e quais as concretas decisões de investimento que foram impedidas e perturbadas, e de que forma, pela incerteza associada ao desfecho das ações.
Além da natureza conclusiva da matéria em causa, também não foi produzida qualquer prova quanto à mesma”.

Os factos alegados são conclusivos, ao que acresce que não seriam suscetíveis de ser demonstrados por via de prova testemunhal, nem pericial que não incidisse sobre o caso em concreto, pois que sempre careceriam de prova documental que o suportasse, mormente no que respeita às decisões de investimento que teriam ficado comprometidas.

Alíneas d), e), p) e q) e alíneas f), s) e j) dos factos não provados:
“Na alínea yyyy) dos factos provados, apenas se considerou provada a comercialização do edifício do lote n.º 4, e não dos lotes 2 e 3, em virtude de ser o único que dispunha de licença de construção e relativamente ao qual esta tinha sido iniciada, não sendo possível prever quando seria concluída a comercialização de edifícios cuja construção não se encontrava licenciada e ainda não tinha tido início.
Pela mesma ordem de razões, não se consideraram provados os factos das alíneas d) e p) dos factos não provados e, consequentemente, das alíneas q) a u).
Com efeito, não sendo a 1.ª e a 3.ª autoras, respetivamente, titulares de licenças de construção para o lote n.º 1 e para os lotes n.º 2 e 3, não é possível determinar quando teriam início as obras de construção nos mesmos lotes e, consequentemente, quando seria concluída a sua comercialização, sendo certo que em Setembro de 2004 – data em que as autoras situam o início da construção para alegarem que as obras estariam concluídas em Setembro de 2006 e a comercialização em Setembro de 2007 – tais obras nunca poderiam ter tido início, como não tiveram, dado a inexistência de licença de construção e sem que a falta de licença, naquela data, possua qualquer relação com as ações propostas pelo Ministério Público, uma vez que a ação n.º 1343/04.0BESNT foi proposta em 11/10/2004.
Não é possível considerar provado que as obras estariam concluídas em setembro de 2006 quando as mesmas não se iniciaram em setembro de 2004 e, consequentemente, não se pode considerar provado que a comercialização dos edifícios estaria terminada em 2007.
Relativamente à matéria das alíneas e) a l) dos factos não provados, cumpre referir que os factos alegados pelas autoras relativamente, grosso modo, às quantias que poderiam ter auferido caso tivessem logrado construir os edifícios dos lotes n.º 4 e 5 assentam em meras previsões.
Com efeito, se, com base na prova produzida, podemos considerar provado que as autoras poderiam ter construído e era previsível que comercializassem os referidos edifícios num determinado período temporal [alíneas xxxx) a aaaa) dos factos provados], já não se mostra possível concluir, a partir de factos cuja ocorrência não é certa, mas meramente possível, quais os valores que teriam auferido com as vendas e, consequentemente, qual o seu lucro, que é pressuposto dos factos constantes das alíneas h) e l) dos factos não provados.
É certo que se considerou provado que o valor médio do metro quadrado de área bruta de construção para habitação na área de Paço de Arcos/Oeiras, nos anos de 2005-2007, poderia ascender a cerca de €2.000.00/m2 [alínea vvvv) dos factos provados]. No entanto, também este valor constitui uma mera possibilidade, não se podendo a partir do mesmo concluir que as autoras iriam vender todos os apartamentos dos edifícios em causa com base neste valor.
Acresce que a posição expressa pelos peritos P...... e T...... sobre os factos em causa no Relatório Pericial parte de pressupostos cuja verificação não é certa, designadamente, no que respeita ao momento da conclusão e comercialização dos edifícios e ao valor da venda por m2.
De facto, os mesmos peritos consideram “aceitável” o valor médio de venda de €2000/m2 e, na resposta ao tema da prova n.º 19, consideram realista o prazo de 24 meses para a conclusão do volume de obra.
Estamos, em suma, perante factos meramente hipotéticos, que assentam em previsões e estimativas, e que, assim, não se consideram provados por a prova produzida ser insuficiente para o Tribunal formar a convicção de que os mesmos, com elevado grau de probabilidade, teriam ocorrido caso as autoras não tivessem ficado impedidas de prosseguir as obras por força das ações judiciais propostas pelo Ministério Público”.

Os factos alegados pelos Autores são, pois, meras conjeturas, não demonstradas, que não permitem ser dados, sem mais, como provados, tendo as próprias Recorrentes afirmado sintomaticamente que “é claro que se trata aqui de lidar com prognósticos e, por isso, de operar com a projeção de factos cuja ocorrência não pode nunca ter-se como absolutamente certa”.

Alínea dd) dos factos não provados:
“Não foi produzida prova quanto à matéria da alínea dd) dos factos não provados, sendo que o que consta do Relatório Pericial – “a suspensão de qualquer obra, permite a solicitação de esclarecimentos por parte de qualquer entidade credora” – é insuficiente para se considerar provado que, em face da suspensão das obras, a 1.a e a 2.a autoras foram confrontadas pela Caixa G.....pela necessidade de apresentar um ponto da situação relativamente a essa suspensão, sob pena de denúncia dos contratos de financiamento e sua liquidação imediata e cobrança coerciva”.

Mesmo que fosse admitido que a Caixa G.....“equacionou” a denúncia do apoio concedido, tal, ainda assim, mostrar-se-ia insuficiente para os objetivos recursivos, uma vez que, incontornavelmente, equacionar a denúncia é diferente de efetuar a denúncia.

Alíneas x) e y) dos factos não provados:
“Não se considerou provado o facto da alínea x) dos factos não provados na medida em que os documentos n.º 26 a 31 juntos com a petição inicial apenas permitem concluir que as autoras tinham encargos empréstimos bancários, e já não que recorreram a financiamentos bancários para a aquisição dos lotes n.º 2, 3, 4 e 5 e apoio às construções a implantar nos mesmos.
De facto, os referidos documentos indicam, de forma genérica, o valor dos empréstimos bancários, o que não permite determinar qual a finalidade dos mesmos, ou seja, que se destinaram a financiar a aquisição e construção dos lotes, sendo certo que, tendo presente o teor do Relatório Pericial quanto a esta matéria, é ao Tribunal que cabe decidir se a prova produzida é suficiente para se considerar provado determinado facto.
Em consequência, não se consideraram provados os factos das alíneas y) e z) dos factos não provados”.

Mais uma vez, a prova do suscitado, sempre careceria de prova documental adequada e suficiente que o suportasse, sendo que a prova produzida não permitiu fazer infletir a convicção a que chegou o tribunal a quo, sendo que algum destino terá sido dado ao financiamento efetuado, o que certamente poderá ter permitida a sua rentabilização e pontenciação.

Alíneas v) e w) dos factos não provados:
“Não se consideraram provados os factos das alíneas v) e w) dos factos não provados, uma vez que não foi produzida qualquer prova quanto aos encargos bancários e juros suportados pela 3.ª autora em consequência da manutenção da garantia bancária prestada ao Município de Oeiras, sendo certo que o que consta do Relatório Pericial quanto a esta matéria é insuficiente para se considerar provado que a autora suportou os referidos encargos bancários e juros, uma vez que não se baseou em quaisquer documentos constantes dos autos.
Com efeito, o juízo dos peritos quanto ao facto de a autora ter suportado encargos bancários e juros com a manutenção da garantia bancária não resulta de quaisquer especiais conhecimentos técnicos que o julgador não possui, antes resultando, afigura-se, da sua experiência, sendo que a circunstância de, em geral, a manutenção de garantias bancárias implicar o pagamento de encargos e juros não permite concluir que, em concreto, a 3.a autora suportou tal pagamento”.

Mais uma vez é incontornável circunstância de não ter sido feita prova documental que permitisse contrariar a convicção a que chegou o tribunal de 1ª instância.

Aliás, e como afirmado no relatório da Peritagem, “A 3ª A. teria sempre que suportar custos com a garantia bancária.
Não existem elementos no processo que permitam calcular a diferença entre os referidos custos que sempre existiriam mesmo que a obra tivesse sido executada e a situação que foi criada com a sua suspensão”.

Alíneas aa) a gg) dos factos não provados:
“Não se consideraram provados os factos das alíneas aa) a cc) e ee) dos factos não provados, uma vez que o depoimento da testemunha João Manuel Maia dos Santos se mostrou insuficiente para o efeito, atendendo a que se limitou a referir, de forma genérica e pouco concretizada, que a situação foi muito falada no meio imobiliário e também por outras pessoas e, perguntado sobre os danos na imagem das autoras, respondeu, em suma, que “ninguém gostava de estar numa situação daquelas, quer pela questão financeira, quer pela imagem”, sendo certo que não foi produzida outra prova quanto a esta matéria.
Não foi produzida prova quanto à matéria da alínea dd) dos factos não provados, sendo que o que consta do Relatório Pericial – “a suspensão de qualquer obra, permite a solicitação de esclarecimentos por parte de qualquer entidade credora” – é insuficiente para se considerar provado que, em face da suspensão das obras, a 1.ª e a 2.ª autoras foram confrontadas pela Caixa G.....pela necessidade de apresentar um ponto da situação relativamente a essa suspensão, sob pena de denúncia dos contratos de financiamento e sua liquidação imediata e cobrança coerciva.
Relativamente à matéria das alíneas ff) e gg) dos factos não provados, que corresponde aos temas da prova n.ºs 66 e 67, cumpre referir que as autoras não concretizaram, através da alegação de factos concretos, em que consistiram as dificuldades na organização e no planeamento das decisões societárias e quais as concretas decisões de investimento que foram impedidas e perturbadas, e de que forma, pela incerteza associada ao desfecho das ações.
Além da natureza conclusiva da matéria em causa, também não foi produzida qualquer prova quanto à mesma”.

A fundamentação aduzida na Sentença, “fala por si”, pois, mais uma vez, é incontornável que a alegação das Recorrentes era meramente conclusiva, sem que tivesse sido suportada em factos concretos que permitissem lograr contrariar a convicção a que chegou o tribunal a quo.
Alíneas e), f), g), h), r), s), t), u), i), j), k) e l) dos factos não provados:
“Na alínea yyyy) dos factos provados, apenas se considerou provada a comercialização do edifício do lote n.º4, e não dos lotes 2 e 3, em virtude de ser o único que dispunha de licença de construção e relativamente ao qual esta tinha sido iniciada, não sendo possível prever quando seria concluída a comercialização de edifícios cuja construção não se encontrava licenciada e ainda não tinha tido início.
Pela mesma ordem de razões, não se consideraram provados os factos das alíneas d) e p) dos factos não provados e, consequentemente, das alíneas q) a u).
Com efeito, não sendo a 1.ª e a 3.ª autoras, respetivamente, titulares de licenças de construção para o lote n.º 1 e para os lotes n.ºs 2 e 3, não é possível determinar quando teriam início as obras de construção nos mesmos lotes e, consequentemente, quando seria concluída a sua comercialização, sendo certo que em Setembro de 2004 – data em que as autoras situam o início da construção para alegarem que as obras estariam concluídas em Setembro de 2006 e a comercialização em Setembro de 2007 – tais obras nunca poderiam ter tido início, como não tiveram, dado a inexistência de licença de construção e sem que a falta de licença, naquela data, possua qualquer relação com as ações propostas pelo Ministério Público, uma vez que a ação n.º1343/04.0BESNT foi proposta em 11/10/2004.
Não é possível considerar provado que as obras estariam concluídas em setembro de 2006 quando as mesmas não se iniciaram em setembro de 2004 e, consequentemente, não se pode considerar provado que a comercialização dos edifícios estaria terminada em 2007.
Relativamente à matéria das alíneas e) a l) dos factos não provados, cumpre referir que os factos alegados pelas autoras relativamente, grosso modo, às quantias que poderiam ter auferido caso tivessem logrado construir os edifícios dos lotes n.ºs 4 e 5 assentam em meras previsões.
Com efeito, se, com base na prova produzida, podemos considerar provado que as autoras poderiam ter construído e era previsível que comercializassem os referidos edifícios num determinado período temporal [alíneas xxxx) a aaaa) dos factos provados], já não se mostra possível concluir, a partir de factos cuja ocorrência não é certa, mas meramente possível, quais os valores que teriam auferido com as vendas e, consequentemente, qual o seu lucro, que é pressuposto dos factos constantes das alíneas h) e l) dos factos não provados.
É certo que se considerou provado que o valor médio do metro quadrado de área bruta de construção para habitação na área de Paço de Arcos/Oeiras, nos anos de 2005-2007, poderia ascender a cerca de €2.000.00/m2 [alínea vvvv) dos factos provados]. No entanto, também este valor constitui uma mera possibilidade, não se podendo a partir do mesmo concluir que as autoras iriam vender todos os apartamentos dos edifícios em causa com base neste valor.
Acresce que a posição expressa pelos peritos P...... e T...... sobre os factos em causa no Relatório Pericial parte de pressupostos cuja verificação não é certa, designadamente, no que respeita ao momento da conclusão e comercialização dos edifícios e ao valor da venda por m2.
De facto, os mesmos peritos consideram “aceitável” o valor médio de venda de €2000.00/m2 e, na resposta ao tema da prova n.º19, consideram realista o prazo de 24 meses para a conclusão do volume de obra.
Estamos, em suma, perante factos meramente hipotéticos, que assentam em previsões e estimativas, e que, assim, não se consideram provados por a prova produzida ser insuficiente para o Tribunal formar a convicção de que os mesmos, com elevado grau de probabilidade, teriam ocorrido caso as autoras não tivessem ficado impedidas de prosseguir as obras por força das ações judiciais propostas pelo Ministério Público.
Refira-se, não obstante, que, quanto aos factos das alíneas g) e k) dos factos não provados, os peritos P...... e T...... referem que o valor não é calculado ao ano.
(…)
Resta referir que os temas da prova n.ºs 27.º, 28.º, 29.º, 37.º, 38.º, 43.º, 44.º, 45.º, 52.º, 53.º, 54.º e 71.º não se reportam à alegação de factos concretos, mas a conclusões, sendo que o tema da prova n.º68 se reporta à avaliação que as autoras fazem dos prejuízos por si sofridos e o tema da prova n.º72 é matéria de direito”.

Mais uma vez as Recorrentes assentaram a sua posição em alegações meramente conclusivas, sendo que mais uma vez, ficou por demonstrar a taxa de rentabilidade das sociedades imobiliárias, não bastando alegar uma rentabilidade média em abstrato, a qual sempre dependerá de múltiplos fatores.

Assim, e em conclusão, no que respeita ao invocado erro de julgamento na apreciação da prova, quanto à enunciação dos factos apurados, o tribunal deverá adotar uma postura e uma metodologia que lhe permita aferir e mensurar o alegado em função da prova produzida, não se vislumbrando que o tribunal de 1ª instância se tenha afastado dessa conduta, em face do que se não reconhece a verificação do invocado erro de julgamento.

DO ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE DIREITO - DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL - Facto Ilícito
Na petição inicial, foram enunciados como causas de pedir, os danos decorrentes:
a) Da interposição das ações n.º 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT pelo Ministério Público:
i) Por alegado uso indevido e ilícito de tal meio processual;
ii) Ou, subsidiariamente, pelos danos especiais e anormais impostos por razões de interesse público;
b) De violação do direito a uma decisão em prazo razoável nesses processos.

Diga-se, desde logo que, independentemente do resultado das Ações intentadas, o Ministério Público exerceu um direito e uma obrigação que é sua, no que respeita ao cumprimento da legalidade, nomeadamente no que ao direito urbanístico diz respeito.

Efetivamente, resultado do art.º 219º nº 1 da CRP que “ao Ministério Público compete representar o Estado e defender os interesses que a lei determinar, bem como, com observância do disposto no número seguinte e nos termos da lei, participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, exercer a ação penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática”.

Em concreto, estava em causa a aplicação dos parâmetros legais do RPDM de Oeiras à operação urbanística em questão, nomeadamente no que respeita ao modo de contabilização do índice de ocupação do solo, o que, por natureza, não é uma questão linear de resposta automática e imediata, não podendo, nem devendo o Ministério Público ser limitado ou condicionado na sua atividade de zelar pela Legalidade, designadamente urbanística.
Em qualquer caso, refira-se que se ratifica o entendimento adotado em 1ª instância no que respeita à inexistência de prova relativamente aos reclamados danos Patrimoniais resultantes da omissão de decisão em prazo razoável.

Sublinha-se que as Autoras, aqui Recorrentes, peticionaram na PI (Artºs 126º, 127º e 128º da PI), pelo atraso na justiça 5.000€ para cada uma, sendo o restante peticionado, relacionado com o alegado uso indevido da ação pública pelo Ministério Público.

Em qualquer caso, é incontornável ter sido dado como não provada a existência dos danos patrimoniais, como resulta da matéria dada como provada e não provada, o que aqui se ratifica, circunstâncias que não importa aqui retomar argumentativamente.

Diga-se, ainda assim, e como aludido na Sentença Recorrida, que “o atraso nos processos já referidos não obstou a que as autoras, findos os mesmos, procedessem à construção e comercialização dos lotes, ou seja, não inviabilizou a concretização do seu projeto em momento posterior, apenas retardou a mesma, sendo certo que resultou provado nos autos que estão já edificados, pelo menos, os lotes 2, 3 e 4 do empreendimento, tendo sido vendidas, pelo menos, 17 frações do lote n.º4 e, pelo menos, 18 frações do lote n.º5 [alíneas ggggg) a jjjjj) dos factos provados].

Acresce que tendo as frações passado a ser vendidas a partir de 2017, determinou que as Autoras tivessem tido lucros superiores aos que teriam obtido em 2007 pelas mesmas vendas.

Como se afirmou no Acórdão do STA de 20-06-2017, proferido no Procº n.º 0247/15, “Não se provando que o atraso na comercialização e venda das frações do empreendimento teve um impacto negativo nas vendas, designadamente quanto à margem de lucro obtida, não se pode considerar demonstrado que esse atraso consubstanciou a existência de um dano para a A.”.

No que concerne aos invocados custos decorrentes dos financiamentos bancários, uma vez requeridos, sempre os mesmos teriam de ser suportados pelas AA. até integral pagamento do montante financiado, sendo que, como afirmado já, nada se diz quanto ao destino dado aos montantes do financiamento atribuído.

Como mais uma vez afirmou o STA no acórdão referido, aqui aplicado mutatis mutandis, “(…) O embargo não é condição do dano respeitante aos encargos com o passivo bancário referente ao período em que aquele vigorou, dado que o pagamento desses juros é consequência do recurso ao financiamento bancário para a construção do empreendimento que sempre teria de ser suportado pela A.”
“Para que esta conclusão se pudesse extrair seria necessário que a A. demonstrasse que, se não fosse a paralisação das obras, não teria de suportar o aludido pagamento, prova que não foi feita”.

Como se afirma ainda no discurso fundamentador do mesmo Acórdão do STA, “Porém, todas essas despesas são inerentes à construção e comercialização do empreendimento, não sendo o ato ilícito que as desencadeou. Efetivamente, independentemente de esse ato ter sido ou não proferido, elas sempre teriam de ser suportadas pela A. durante o período em que se manteve o embargo. Assim, em face da matéria de facto dada por provada, não se pode concluir que tais despesas são uma consequência adequada da prática do ato ilícito”.

Pedem ainda os Recorrentes o ressarcimento do alegado dano decorrente “da privação do uso das utilidades dos lotes”.

Como bem se refere na decisão recorrida, “o dano que as autoras imputam à demora na prolação das decisões proferidas nos Processos n.º 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT é o prejuízo correspondente à indisponibilidade dos montantes que razoavelmente seria de esperar que obteriam com a venda dos lotes a construir. (...) De facto, as autoras não pedem, a título de indemnização pelos danos, o valor que teriam obtido com a venda do empreendimento, mas, de outro modo, os juros que teriam obtido caso tivessem efetuado a venda e colocado o produto da mesma num depósito a prazo”.

Aqui chegados, atenta a causa de pedir da presente ação, qual seja a propositura e pendência das ações que correram termos neste Tribunal sob os n.ºs 1343/04.0BESNT e 305/05.4BESNT, importa evidenciar que os agora alegados prejuízos decorrentes “da privação do uso das utilidades dos lotes” não cabem na causa de pedir formulada originariamente, nem constituem um desenvolvimento do pedido primitivo.

Importa não perder de vista que a invocada impossibilidade de edificação e comercialização do empreendimento em causa ocorreu apenas durante a pendência das indicadas Ações, o que cessou com o termo das mesmas, ocorrido em 12.04.2012 e 08.03.2013, respetivamente.

Como afirmou o tribunal a quo, “quando a presente ação foi proposta, as referidas ações já se encontravam decididas por sentença transitada em julgado, ou seja, já não se encontravam pendentes, pelo que os prejuízos agora alegados não encontram o seu fundamento na pendência daquelas ações”.

DO ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE DIREITO: DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL POR FACTO LÍCITO
Invocam ainda os Recorrentes a verificação de erro de julgamento de direito ao não terem sido considerados na decisão os pressupostos da responsabilidade civil por facto lícito.

De relevante, afirmou-se na decisão Recorrida:
“A questão que se coloca, assim, é a de saber se a pretensão indemnizatória das autoras pode encontrar o seu fundamento no instituto da indemnização pelo sacrifício, em virtude de as ações propostas pelo Ministério Público lhes terem causado danos por terem determinado, por força do disposto no artigo 69.º, n.º2, do RJUE, a paralisação das obras e impedido as mesmas de, na sua pendência, construírem nos seus lotes em conformidade com os atos de licenciamento praticados pelo Município de Oeiras.
Como já referimos, à data em que as ações em causa nos autos foram propostas pelo Ministério Público não se encontrava em vigor o Regime da Responsabilidade Civil do Estado e demais entidades públicas, aprovado pela Lei n.º67/2007, de 31 de dezembro, pelo que o disposto no artigo 16.º deste regime não é aplicável à situação em causa nos autos.
Acresce que o artigo 9.º do Decreto-lei n.º48.051, de 21 de Novembro de 1967, apenas prevê a obrigação do Estado indemnizar os particulares a quem, no interesse geral, mediante atos administrativos legais ou atos materiais lícitos, tenha imposto encargos ou causado prejuízos especiais e anormais, sendo que a propositura de ações pelo Ministério Público no quadro do exercício da ação pública não consubstancia a prática de um ato administrativo, ou seja, e recorrendo à definição constante do CPA em vigor à data dos factos em causa nos autos, uma decisão de um órgão da Administração que, ao abrigo de normas de direito público, visa produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
Nesta medida, entendemos que a norma do artigo 9.º do Decreto-lei n.º48.051, de 21 de novembro, não é aplicável à situação em causa nos autos, isto é, à atuação do Ministério Público no quadro do exercício da ação pública.
Acresce que ainda que se admitisse a possibilidade de o Estado ser responsabilizado pela atuação lícita do Ministério Público, designadamente com fundamento no princípio da responsabilidade civil do Estado consagrado no artigo 22.º da Constituição, sempre teríamos que concluir que não se encontram preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil por ato lícito.
Com efeito, é pressuposto da responsabilidade civil por ato lícito a especialidade e a anormalidade do dano, sendo que o dano é especial quando incide sobre uma pessoa ou grupo, sem afetar a generalidade das pessoas, e é anormal quando ultrapassa o custo próprio da vida em sociedade.
Ora, como resulta do que já referimos, as autoras apenas lograram provar na presente ação, em suma, que a propositura das ações supra identificadas pelo Ministério Público implicou a paralisação das obras, tendo ficado impedidas de construir nos lotes de que eram proprietárias durante a pendência daquelas e que era possível que a 1.ª e a 3.ª autoras tivessem concluído a comercialização dos lotes n.ºs 4 e 5 até setembro de 2007.
É certo que, devido à pendência das referidas ações, as autoras se viram privadas de proceder à construção nos lotes de que eram proprietárias em conformidade com os atos de licenciamento praticados pelo Município de Oeiras.
Contudo, a impossibilidade de construir durante um determinado lapso temporal, ainda que longo, não constitui, em si mesma, um dano, podendo, de outro modo, constituir fonte de danos para as autoras, os quais, no entanto, as mesmas não lograram provar.
Também nesta sede importa ter presente que a propositura e a pendência das referidas ações determinou o retardamento da construção nos lotes de que as autoras são proprietárias pelo tempo em que as mesmas ações estiveram pendentes, não tendo, no entanto, obstado a que tal construção viesse a ter lugar posteriormente.
Diferente seria se, por força das ações propostas pelo Ministério Público, tivesse ficado irremediavelmente prejudicada a possibilidade de as autoras procederem à construção nos lotes de que são proprietárias em conformidade com os atos de licenciamento praticados pelo Município de Oeiras.
Neste caso, a privação do “jus aedificandi” de que as autoras eram titulares devido aos atos de licenciamento praticados pelo Município de Oeiras poderia constituir, em si mesma, um dano, por obstar a que as autoras retirassem do bem de que são proprietárias uma sua utilidade específica para a qual tinham obtido a necessária licença administrativa.
Claro está que o referido retardamento na construção pode ter causado danos às autoras, mas tais danos, a terem existido, não resultaram provados nos autos, o que, desde logo, e sem que se possa proceder a qualquer juízo sobre a especialidade e anormalidade de danos que não foram provados, obsta a que a pretensão indemnizatória das autoras possa encontrar o seu fundamento no regime da responsabilidade civil por ato lícito”.

Assim, no que respeita à verificação de Responsabilidade Civil Extracontratual por atos lícitos, à luz do Decreto-lei n.º48.051, não se vislumbram razões para divergir do discurso fundamentador vindo de transcrever.

Efetivamente, não é de dar como verificada a existência dos danos alegados, a titulo de responsabilidade civil extracontratual por factos lícitos, mormente enquanto danos especiais e anormais exigidos pelo normativo referido, tanto mais que o empreendimento acabou por ser edificado e comercializado.

DOS DANOS NÃO PATRIMONIAIS PELO ATRASO NA JUSTIÇA
Em concreto, resulta da factualidade provada que a ação n.º1343/04.0BESNT foi proposta em 11/10/2004, tendo o correspondente Acórdão final sido proferido em 12/04/2012, o que significa que a Ação se prolongou por cerca de 7 anos e 6 meses.

Já a Ação n.º305/05.4BESNT foi proposta em 10/03/2005, tendo terminado por Acórdão de 08/03/2013, o que significa que a Ação se prolongou por cerca de 7 anos e 4 meses.

Como se sumariou no Acórdão do STA de 05/07/2018:
I - Constatada uma violação do art. 6.º, § 1.º, da CEDH, relativamente ao direito à emissão de uma decisão judicial em prazo razoável, existe e opera, em favor da vítima daquela violação da Convenção, uma forte presunção natural da verificação de um relevante dano psicológico e moral comum, de natureza não patrimonial, sofrido por todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo em tempo razoável.
II - Àquela vítima impenderá um ónus de alegação e de prova dos danos não patrimoniais que excedam aquele dano comum e se mostrem relativos à sua específica situação concreta.
III - Tal presunção é, todavia, ilidível pelo demandado, impendendo sobre este o ónus de alegação e de prova em concreto da inexistência daquele dano e do afastamento do automatismo entre a violação constatada da Convenção e aquele dano.
IV - O demandante, para poder beneficiar da operatividade e aplicação daquela presunção, carecerá apenas de alegar e demonstrar a existência de uma violação objetivamente constatada da Convenção, nisso radicando o seu ónus de alegação e prova, que, uma vez satisfeito, conduz a que se presuma como existente o dano psicológico e moral comum, sem necessidade de que dele por si seja feita a sua prova.”

No que respeita aos danos morais relativos a pessoas coletivas, sumariou-se já no Acórdão deste TCAS nº 2441/15.0BELRS, de 19-12-2017 que “I - Na aplicação da Convenção Europeu dos Direitos do Homem e na densificação dos respetivos conceitos, como é o caso do conceito de danos morais indemnizáveis, tem, necessariamente, de atender-se à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), a qual tem entendido que uma pessoa coletiva pode receber uma indemnização por tal tipo de danos.
II – De acordo com a jurisprudência do TEDH, os danos não patrimoniais de uma sociedade comercial podem incluir a respetiva reputação, a incerteza no planeamento da decisão, a rutura na gestão da empresa e, por último, ainda que em menor grau, a ansiedade e incómodos causados aos membros da equipa de gestão.
III - Nos termos dessa mesma jurisprudência, os danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre ocorrem em praticamente todos os casos de atraso excessivo na atuação da justiça merecem, em princípio, a tutela do direito, não sendo de minimizar na respetiva relevância, sem prejuízo de os mesmos poderem ser ilididos, ou seja, deve presumir-se que a duração excessiva de um processo causa nas partes um dano não patrimonial que estas não estão obrigadas a provar, abrangendo tal presunção danos distintos conforme se esteja perante pessoa singular (angústia, ansiedade, frustração, etc.) ou coletiva (incerteza no planeamento da decisão, rutura na gestão da empresa, etc., conforme explicitado em II).
IV – A referida presunção de dano consubstancia-se numa presunção judicial e não num facto notório, razão pela qual o concreto dano em causa carece de ser alegado.

É assim pacífico, por força do disposto no artigo 22.º da Constituição, que o Estado é civilmente responsável pelos danos decorrentes da violação do direito à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável, consagrado no artigo 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH, ratificada por Portugal em 1978) e no artigo 20.º/4 da CRP (desde a revisão constitucional de 1997).

Como se sintetiza no Acórdão do STA, de 27.11.2013, P. 0144/13, convocando jurisprudência reiterada do mesmo Supremo Tribunal, o Estado será responsabilizado por atraso na justiça quando “da factualidade apurada resultar que o processo que fundamenta aquele pedido foi julgado para além do «prazo razoável», que esse atraso se ficou a dever a culpa dos serviços do Estado, que daí decorreram danos para a Autora e que existe uma relação direta entre essa demora e os prejuízos cujo ressarcimento se peticiona.”

Além disso, como salientado pelo STA (cfr., entre outros, o Acórdão do STA, de 28.11.2007, P. 308/07), a apreciação destes pressupostos implica a densificação de conceitos como o de “prazo razoável”, de “indemnização razoável” e de “danos morais indemnizáveis”, a qual não pode deixar de implicar uma interpretação do direito interno em conformidade com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), sob pena de “divergência entre a aplicação tida por apropriada na ordem nacional e a interpretação dada pelo Tribunal de Estrasburgo” (cfr. Acórdão citado).

No que concerne ao montante do valor indemnizatório, estando em causa danos não patrimoniais, importa concluir que será atribuído um valor calculado de acordo com as regras da equidade, tendo sempre em atenção a situação concreta dos autos.

O montante dos danos não patrimoniais deve assim ser calculado, não arbitrariamente, mas atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização (artigo 496º n.º 3), aos padrões de indemnização geralmente adotados na jurisprudência, às flutuações da moeda (João de Matos Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol I, 10º edição pág 607).

No que se refere à jurisprudência, muito vasta nesta matéria, cita-se o Acórdão do STA proc. n.º 0197/15, de 22-04-2015, no qual se sumariou que:
I - A indemnização por danos não patrimoniais visa compensar de forma justa, satisfatória e equilibrada aqueles que foram forçados a suportar desgostos e sofrimentos causados por factos ilícitos de outrem por forma, a que se sintam compensados por terem sido sujeitos a tais sofrimentos.
II - Todavia, só podem ser indemnizados os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito e, atenta a impossibilidade da sua quantificação, o seu montante tem de ser fixado equitativamente pelo Tribunal tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (art.ºs 496.º e 494.º do CC).
III - Sendo certo que a gravidade desses danos deve ser medida por um padrão tanto quanto possível objetivo e não à luz de fatores subjetivos.

Objetivando, e como tem sido reiteradamente salientado, “a determinação da razoabilidade da duração do processo é feita casuisticamente e mediante uma análise global ou de conjunto do mesmo” (Acórdão do STA, de 10.09.2014, P. 090/12 que segue de perto anterior Acórdão do STA, de 09.10.2008, P. 0319/08).

Como se sintetiza no Acórdão deste TCAN, de 05.07.2012, P. 02767/06.3BEPRT: “A existência ou não de um prazo excessivo na decisão de um processo judicial deve ser aferida caso a caso tendo em conta os critérios definidos pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem:
1º - a complexidade do processo;
2º - o comportamento das partes;
3º - a atuação das autoridades competentes no processo; e
4º - a importância do objeto do litígio para o interessado”.

Sumariou-se no Acórdão do TCAN proferido no Processo nº 1684/13.5BEPRT, de 7 de julho de 2017, que:
“I- A apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso.
II- Tem-se como razoável o prazo de 3 anos como duração média de um processo na primeira instância, para a generalidade das matérias, e de 4 a 6 anos para a duração global da lide, ou seja, quando haja recurso para os Tribunas Superiores.”

Em face do que precede, mostra-se que nas situações em apreciação, a duração do processo se revela globalmente excedido, pois que o prazo razoável ou duração média do processo está excedido, no essencial, nos termos e quantitativos estabelecidos em 1ª Instância.

Assim, mostra-se verificada a ilicitude, traduzida num atraso na decisão do processo judicial que viola o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, garantido pelos artigos 20.º/4 da CRP e 6.º/1 da CEDH.

Importa ainda apreciar o pressuposto da culpa, ou seja, o juízo de censura que, sendo imputável ao serviço de justiça em si mesmo considerado, equivale ao conceito de “culpa do serviço”. Em concreto, trata-se de saber se a demora excessiva do processo é devida a um funcionamento deficiente dos serviços de justiça do Estado português ou se o atraso do processo terá sido causado pela mera atuação conflituosa das partes ou de outros intervenientes processuais.

Independentemente da questão de saber a quem incumbe o ónus de provar se o Estado adotou, ou não, as medidas adequadas para garantir uma justiça em prazo razoável (cfr. Acórdão do STA, de 01.03.2011, P. 0336/10), conclui-se que quando se mostre excedido o prazo razoável de decisão do processo é ao Estado, que devia garantir tal prazo, “que incumbe alegar e provar qualquer causa justificativa do excesso verificado, já que tal constitui matéria de exceção, cujo ónus de alegação e prova cabe ao Réu, nos termos gerais (cf. art. 342.º, n.º 2 do CC)”.
O certo é que no caso vertente ficou provada uma atuação da administração da justiça do Estado ilícita e culposa, porque a morosidade processual verificada foi, em boa medida, decorrente da sua atuação, pelo menos, a título de culpa leve.

Mesmo considerando os reconhecidos, cerca de 7 anos e meio de duração de cada um dos Processos identificados, tal determina, tendo por base a duração entendida como razoável de 6 anos de duração dos Processos com intervenção dos Tribunais Superiores, que o atraso aqui em questão, a atender para efeitos da indemnização de danos Não Patrimoniais, rondará o ano e meio.

Com efeito, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, tendo em linha de conta a culpa do Estado na propiciação da situação que determinou os controvertidos atrasos e as condições que o determinaram, e as suas emergentes consequências, e a intensidade e a natureza dos danos sofridos no período da intervenção no processo, impondo-se que o quantum indemnizatório fixado para os danos não patrimoniais atente nessas circunstâncias, de modo equitativo.

Em concordância com o entendimento que dimana da jurisprudência do TEDH, a jurisprudência administrativa portuguesa tem admitido generalizadamente a relevância do dano moral decorrente do atraso na justiça, mesmo quando se trata do dano comum notoriamente conhecido, sem mais caraterização ou prova (neste sentido v., entre outros, o citado Acórdão do STA, de 09.10.2008, P. 0319/08).

Tal dano não patrimonial “merece a tutela do direito mesmo que não se efetue uma específica prova de ter causado grande sofrimento ou sensível alteração da vida ou de comportamentos, depressão ou outra situação clinicamente caraterizável como de sofrimento psicológico e moral” (idem).

Este dano não patrimonial é um dano presumido, um dano moral in re ipsa “necessariamente ínsito no dano decorrente da violação do direito à prolação de sentença em prazo razoável” (Isabel Celeste Fonseca, ob. cit., 46).

O dano moral constitui o “dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo” (cfr. Ac. do STA de 09.10.2008, P. 0319/08). A este dano (que todos sabemos que existe e que corresponde a um facto notório que não carece de alegação nem se prova – artigo 412.º do CPC) acrescem os danos que os autores consigam provar relativos à situação concreta (Acórdão do STA citado).

Importa agora simplesmente fixar o quantum da indemnização por danos morais, por violação dos artigos 22.º da CRP, e o artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ratificada pela Lei nº 65/78, de 13.10, e aplicável, nos termos do art 8º da Constituição da República Portuguesa.
As Autoras avaliaram tais prejuízos em €5.000 para cada uma das Autoras, o que se entende excessivo, atento o período de atraso de cerca de um ano e meio.

Como salientado pelo Supremo Tribunal Administrativo (cfr., entre outros, o Acórdão do STA, de 28.11.2007, P. 308/07), a apreciação destes pressupostos implica a densificação de conceitos como o de “prazo razoável”, de “indemnização razoável” e de “danos morais indemnizáveis”, a qual não pode deixar de implicar uma interpretação do direito interno em conformidade com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), sob pena de “divergência entre a aplicação tida por apropriada na ordem nacional e a interpretação dada pelo Tribunal de Estrasburgo” (cfr. Acórdão citado).
Não resultou dos autos que as partes tivessem feito um uso reprovável do processo, mediante a utilização de expedientes dilatórios que atrasassem de modo injustificado o prosseguimento dos autos.

Como se viu já, não se considera justificada a demora de cerca de um ano e meio em cada um dos Processos intentados pelo Ministério Público, pelo que se entende que o processo registou atrasos indesculpáveis e concretamente imputáveis à máquina da justiça e por conseguinte ao Estado Português.

Em jurisprudência do TCAN, sumariou-se no Processo nº 1684/13.5BEPRT, de 7 de julho de 2017, no qual o aqui relator foi adjunto, o seguinte:
“I- A apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso.
II- Tem-se como razoável o prazo de 3 anos como duração média de um processo na primeira instância, para a generalidade das matérias, e de 4 a 6 anos para a duração global da lide, ou seja, quando haja recurso para os Tribunas Superiores.”

Ora, atendendo a que, conforme acima se referiu, a duração média, que corresponde a duração razoável, de um processo em primeira instância é de cerca de três anos e a duração média de todo o processo deve corresponder, em princípio, a um período que vai de quatro a seis anos, os identificados Processos ultrapassaram o prazo razoável pelo que se conclui então terem sido violados no caso concreto os artigos 20.°, n.° 1 e 4 da CRP e 6.°, n.° 1 da CEDH.

No que concerne aos danos morais aqui em causa, não resultando dos autos que esse dano tivesse outra causa que não o atraso verificado no âmbito dos identificados processos, e não tendo o Estado logrado ilidir em absoluto a presunção da existência de tais danos, impõe-se concluir pela existência de nexo de causalidade entre o facto e os invocados danos morais.

Para determinar a indemnização devida pelos danos morais decorrentes dessa demora, há que convocar os padrões fixados na jurisprudência nacional e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), por forma a encontrar um valor indemnizatório equilibrado e equitativo.

Como se resume no Acórdão do TCAN de 02.07.2015, P. 02089/09.8BEPRT, a quantificação do dano não patrimonial, a efetuar de acordo com a equidade, tem que atender, nomeadamente, à morosidade do processo e aos danos verificados, considerando apenas o dano comum quando o A. não consegue fazer prova de prejuízo não patrimonial superior.

Seguindo de perto o entendimento discorrido no Acórdão do TCAN nº 2114/17.9BEPRT, de 27-09-2019, refira-se que tem vindo a ser entendido, na decorrência da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que se deve presumir a existência de danos não patrimoniais como consequência da demora excessiva de um processo judicial, não sendo necessário ao autor alegar e provar esses mesmos danos.

Vale aqui o raciocínio de que esse será um dano comum, que se apura de acordo com as regras da vida, inerente a todas as pessoas singulares que são vítimas de um atraso na justiça. Daí que a alegação e prova só serão exigíveis nos casos em que os danos excedam os normalmente produzidos nestas situações (vide, entre outros, os Acórdãos do TEDH n.ºs 62361, de 29-03-2006, Riccardi Pizzati c. Itália e 50262/99, de 22-06-2004, C. Bartl c. República Checa).

A este respeito, vide, entre outros:
- O acórdão do STA de 05/07/2018, Proc. nº 0259/18, assim sumariado:
«I - Constatada uma violação do art. 6.º, § 1.º, da CEDH, relativamente ao direito à emissão de uma decisão judicial em prazo razoável, existe e opera, em favor da vítima daquela violação da Convenção, uma forte presunção natural da verificação de um relevante dano psicológico e moral comum, de natureza não patrimonial, sofrido por todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo em tempo razoável. (…)”;
- O acórdão do TCA Sul de 19/04/2018, Proc. nº 12258/15, em que se sumariou entre o demais que: «Deve presumir-se a existência de danos não patrimoniais como consequência da demora excessiva de um processo judicial».

Quanto ao montante do dano não patrimonial regem os artigos 496º, nº 3 e 494º do CC, de acordo com os quais o montante da indemnização deve ser fixado equitativamente, tendo em atenção a situação económica do lesante e do lesado e as demais circunstâncias do caso, como o grau de culpabilidade do agente, a que se refere também o artigo 41º da CEDH.

A jurisprudência do TEDH tem considerado que a indemnização a atribuir pelo juiz nacional deve ser razoável e em montante idêntico aos atribuídos por aquele TEDH para casos semelhantes, apontando, para a tarefa de identificar os casos semelhantes, a comparação do número de anos, do número de jurisdições em que os casos correram, da importância dos interesses em jogo, do comportamento das partes e das situações para um mesmo país (vide os Acs. do TEDH n.º 36813/97, de 29-03-2006, Scordino c. Itália, 64699/01, de 29-03-2006, Musci c. Itália ou 64890/01, de 10-11-2004, Apicella c. Itália).

Deste modo, o quantum da indemnização por danos não patrimoniais, a arbitrar a título de indemnização decorrente de atraso na decisão de processo judicial, deve atender aos padrões usados, quer na jurisprudência nacional, quer na do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

No que respeita aos concretos montantes que têm sido fixados pelo TEDH no quadro de petições dirigidas contra o ESTADO PORTUGUÊS, tenha-se presente as seguintes condenações (referidas no acórdão do STA de 11/05/2017, Proc. nº 01004/16):
- de 4.000€ relativo ao atraso verificado em ação (declarativa e executiva) instaurada no Tribunal de Trabalho ainda pendente e que se estendia já por 4 anos e 9 meses para uma só instância - Acórdão do TEDH de 27/10/2009, no c. «Ferreira Araújo do Vale», §§ 22, 24 e 27 -;
- de 3.500€ por atraso verificado, nomeadamente, em ação de regulação de poder paternal/direito visitas que durou 07 anos e 11 meses, para dois graus de jurisdição – Acórdão do TEDH de 13/04/2010, no c. «Ferreira Alves n.º 6», §§ 23 e 51;
- de 28.000€ (para um autor) e de 11.000€ (para outros dois autores) por atrasos verificados em ação cível (acidente de viação) e em ação indemnizatória fundada no atraso na administração da justiça, que, respetivamente, duraram 14 anos e 20 dias para três instâncias percorridas, e 12 anos, 6 meses e 19 dias, numa só instância – Acórdão do TEDH de 12/04/2011, no c. «Domingues Loureiro e outros», §§ 55, 60 e 68;
- de 1.200€, por atraso em ação cível para cobrança de dívida que durou 8 anos, 8 meses e 12 dias para três instâncias percorridas – acórdão do TEDH de 20/09/2011, no c. «Ferreira Alves n.º 7», §§ 38 e 53;
- de 7.600€ por atraso verificado em três ações cíveis que duraram, respetivamente, 10 anos, 6 meses e 28 dias para duas instâncias, 12 anos, 5 meses e 1 dia para duas instâncias, e 9 anos e 14 dias para quatro instâncias – Acórdão do TEDH de 04/10/2011, no c. «Ferreira Alves n.º 8», §§ 69/71 e 95;
- de 16.400€ por atraso verificado em duas ações cíveis (falência/verificação créditos e ação para efetivação de responsabilidade contratual por construção defeituosa de um imóvel) que, respetivamente, duraram 15 anos, 5 meses e 3 dias, para três instâncias, e 4 anos, 3 meses e 28 dias para duas instâncias –Acórdão do TEDH de 31/05/2012, no c. «Sociedade C. Martins &Vieira n.º 4», §§ 48/49 e 68/70;
- de 5.000€ (para uns autores) e de 4.800€ (para outros) por atraso verificado em ações cíveis (de recuperação empresas, de falência, de reclamação e verificação créditos e ação para execução especifica de contrato-promessa) que, respetivamente, duraram 16 anos, 1 mês e 1 dia, para três instâncias, 18 anos, 4 meses e 13 dias para três instâncias, 14 anos, 3 meses e 20 dias em duas instâncias, e 14 anos, 5 meses e 12 dias numa só instância - Acórdão do TEDH de 16/04/2013, no c. «Associação de Investidores do Hotel Apartamento Neptuno e outros», §§ 48/50 e 77;
- de 15.600€ (para 3 requerentes) por atraso verificado em processo penal que durou 14 anos e 9 meses numa só instância –Acórdão do TEDH de 30/10/2014, no c. «Sociedade C. Martins &Vieira e outros», §§ 50 e 73;
- de 3.750€ por atraso verificado em ação laboral que durou 9 anos e 07 meses, para três instâncias –Acórdão do TEDH de 04/06/2015, no c. «Liga Portuguesa de Futebol Profissional», §§ 88 e 100;
- de 11.830€ por atraso verificado em ação de reconhecimento de direito quanto à existência de contrato trabalho com autarquia que durou 9 anos, 11 meses e 20 dias, num único grau de jurisdição – Acórdão do TEDH de 29/10/2015, no c. «Valada Matos das Neves», §§ 111 e 117.

E quanto aos que têm sido fixados nos tribunais nacionais, atenha-se, nos montantes fixados pelo STA (igualmente referidos no supra citado acórdão do STA de 11/05/2017, Proc. nº 01004/16):
- de 5.000€ (2.500€ para cada um dos autores) por atraso verificado em ação cível (despejo), que intentada em 18/01/1995 ainda estava pendente em 2003, percorrendo duas instâncias – Acórdão do STA de 28/11/2007, Proc. n.º 0308/07;
- de 5.000€ (2.500€ para cada um dos autores), por atraso verificado em execução sentença cível, intentada em 30/01/1997 e que perdurou até 22/02/2002, data em que foi declarada suspensa a instância nos termos do art. 882.º do CPC (na redação à data vigente), percorrendo duas instâncias – Acórdão do STA de 09/10/2008, Proc. n.º 0319/08;
- de 10.000€ por atraso verificado em ação cível (acidente de viação) intentada em 15/07/1983 e que perdurou até 30/10/2003 (data em que se iniciaria a audiência de discussão e julgamento e em que o processo terminou por transação), correspondendo a uma duração superior a 20 anos numa só instância – Acórdão do STA de 09/07/2009, Proc. n.º 0365/09;
- de 10.000€ (para um Autor) e 5.000€ (para cada um dos dois outros autores) por atraso verificado em ação cível (inventário facultativo instaurado em 13/12/1981), pendente à data da instauração indemnizatória, ia para 26 anos, e sem que tivesse terminado, tendo percorrido duas instâncias – Acórdão do STA de 01/03/2011, Proc. n.º 0336/10);
- de 3.550€ (para um Autor) e 1.500€ (para outro) por atrasos verificados em processos tributários (impugnações judiciais - uma relativa a «IVA» e outra a «IRC»), processos que, tendo sido apresentados em juízo em 19.02.2003 só foram julgados em 18.10.2006, isto é, cerca de 3 anos e 8 meses depois da sua apresentação, sem que tivessem ocorrido incidentes anormais e em que os atrasos, fundamentalmente, resultaram de duas «paragens» do processo, a primeira, entre a contestação e a inquirição de testemunhas - mais de um ano - e, a segunda, entre a notificação para a apresentação das alegações finais e o julgamento - quase dois anos -, tendo percorrido apenas uma instância - Acórdão do STA de 15/05/2013, Proc. n.º 01229/12);
- de 4.000€ por atraso verificado em processo de menores (regulação do poder paternal), instaurado em 07/07/1999 e concluído em 18/01/2011, sempre na mesma instância, sendo que no valor arbitrado foi considerado apenas o período de duração (de 4 anos) e até ao seu termino correspondente ao período que a A. interveio, após ter atingido a maioridade – Acórdão do STA de 14/04/2016, Proc. n.º 01635/15;
- de 4.800€ (para cada um dos autores) por atraso verificado em processo penal, no qual foi deduzida acusação em 30/04/2003 e que após cerca de 12 anos (à data da emissão da sentença na ação indemnizatória - 23.07.2015) ainda estava pendente mercê de suspensão aguardando a decisão dos processos tributários de impugnação judicial instaurados relativamente às liquidações de «IRC» e de «IVA» - Acórdão do STA de 30/03/2017, Proc. n.º 0488/16;

Resulta do descrito serem adotados, a título meramente indicativo, os valores que oscilam entre 1.000€ e 1500€ por cada ano de demora do processo (vide neste sentido os Acórdãos do TEDH n.ºs 65102/01, de 29-03-2006, Mostacciuolo v. Italy (n.º 2), 65075/01, de 29-03-2006, Giuseppina and Orestina Procaccini c. Italy, 64886/01, de 29-03-2006, Cocchiarella c. Italy, 64699/01, de 29-03-2006, Musci c. Itália ou 64890/01, de 10-11-2004, Apicella c. Itália. e Acórdãos do STA de 12/05/2011, Proc. n.º 07472/11 e de 11/05/2017, Proc. nº 01004/16).

Como se afirmou já, de acordo com a jurisprudência do TEDH, os danos não patrimoniais de uma sociedade comercial podem incluir a respetiva reputação, a incerteza no planeamento da decisão, a rutura na gestão da empresa e a ansiedade e incómodos causados aos membros da equipa de gestão.

São pois estes os pressupostos em termos de danos atendíveis para a fixação do valor da indemnização por danos morais, sendo que na situação presente está em causa um atraso de cerca de ano e meio em cada um dos processos apresentados pelo Ministério Público, mostrando-se adequado e equitativo, fixar a indemnização por danos morais, em 2.000€ para cada uma das Autoras, por se entender ser o valor razoavelmente adequado, dentro do valor padrão estabelecido pelo TEDH, que se extrai do caso Musci c. Itália (P. 64699/01) variável entre €1.000 e €1.500 por cada ano de demora do processo.

Em face do que precede, procederá parcialmente o Recurso das Autoras.
* * *
As Autoras mais requereram “por cautela de patrocínio que, atento o valor da ação e o objeto do presente recurso, seja dispensada a liquidação do remanescente da taxa de justiça nesta instância de recurso, ex vi do artigo 7.º, n.º 6 do Regulamento das Custas Processuais, sob pena de o valor a liquidar se revelar incomportável e desproporcionado por relação à atividade processual verificada, afetando ainda o direito de acesso aos tribunais.”

Dispõe o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais que «[n]as causas de valor superior a 275.000€, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.».

Como pondera Salvador da Costa, «A referência à complexidade da causa e à conduta processual das partes significa, por um lado, a sua menor complexidade ou maior simplicidade, e, por outro, a atitude das partes na prática dos atos processuais necessários à adequada decisão da causa, isto é, margem de afirmações ou alegações de índole dilatória.
A este propósito, é necessário ter em conta que a taxa de justiça é um dos elementos essenciais do financiamento dos tribunais e do acesso ao direito e aos tribunais.
A atitude das partes com vista à dispensa ou não do remanescente da taxa de justiça deve ser apreciada à luz dos princípios da cooperação e da boa fé processual, a que se reportam os artigos 7.º, n.º 1, e 8.º da CPC.» (in As Custas Processuais, análise e comentário, 7.ª Edição, Almedina, nota 6.8. ao artigo 6.º, pág. 141).

Trata-se, portanto, de uma dispensa excecional que, à semelhança do que ocorre com o agravamento previsto no nº 7 do art. 7º do mesmo Regulamento, depende de concreta e casuística avaliação pelo juiz e deve ter lugar aquando da fixação das custas ou, no caso de aí ser omitida, mediante requerimento de reforma da decisão — cfr., neste sentido, o acórdão do Pleno do STA, de 15/10/2014, no proc. nº 01435/12.

Resulta do Ac. nº 562/13.2TVLSB.L3-8 do TRL que “(…) o teor literal do nº 7 do art. 6° do RCP aponta claramente para a bondade da interpretação que se orienta no sentido de que o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem que ser formulado pela parte (caso o não tenha feito anteriormente o juiz) em momento anterior à elaboração da conta de custas. E como nos ensina Oliveira Ascensão (O Direito. Introdução e Teoria Geral, p. 350), aliás em concordância com o que dispõe o n° 2 do art. 9° do CCivil, "A letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação ".

E, de outro lado, diferente interpretação deste normativo levaria a sufragar a prática de atos (a feitura de uma conta final, a sua notificação e, eventualmente, até mesmo algum pagamento entretanto feito) que teriam depois que ser destruídos, logo estaríamos perante a prática de atos inúteis, quando o que é certo é que a lei os proíbe (v. art. 130° do CPCivil). Mais: outra interpretação levaria ao absurdo da dispensa do pagamento poder ser equacionada sem qualquer limitação temporal (não se argumente com o prazo para reclamar da conta, pois que não é disso que se trata, além de que o exercício da oficiosidade que existe nesta matéria sempre independeria de qualquer prazo), inclusivamente quando estivesse já a correr execução para pagamento da taxa de justiça a dispensar.

No caso em apreço, tendo em conta o valor fixado ao processo, em face da norma do n.º 7 do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, há, em regra, lugar ao pagamento, a final, do remanescente da taxa de justiça, para além dos €275.000, calculada nos termos constantes da Tabela I, anexa ao dito Regulamento.

Porém, com a norma em apreço, recupera-se a possibilidade do juiz ou o relator nos tribunais superiores, dispensar o remanescente da taxa de justiça devida acima daquele valor, em função da complexidade da causa e a conduta processual das partes, pelo que será sob o prisma destes referenciais que o juiz deve fundamentar a dispensa do pagamento da referida taxa.

Ora, desde já se adianta que tais valores de taxa de justiça se têm por manifestamente desproporcionados.

Assim, considerando a concreta e casuística avaliação, assente nos supra apontados pressupostos que, no caso, se têm por verificados, a que acrescem ainda razões constitucionais de justiça e proporcionalidade, entende-se estar justificada a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida no recurso, conforme o pedido formulado ao abrigo do disposto no nº 7 do artigo 6º do citado Regulamento.
* * *

Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, conceder parcial provimento ao recurso, fixando-se a indemnização por danos não Patrimoniais por atraso na Justiça em 2.000€, para cada uma das Autoras.

Mais se isentam as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Custas na proporção do decaimento.

Lisboa 17 de março de 2022
Frederico de Frias Macedo Branco

Ana Lameira (Em substituição)

Lina Costa