Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 713/07.6BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 02/20/2025 |
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Relator: | MARIA DA LUZ CARDOSO |
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Descritores: | IRC RENDIMENTOS DOS VALORES MOBILIÁRIOS BASE TRIBUTÁVEL |
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Sumário: | I - Comercializando a Impugnante seguros unit linked, os rendimentos dos valores mobiliários, que constituem a carteira a que está associada a rentabilidade do seguro, são da Impugnante, não obstante o risco ser por conta do tomador. II - Rendimentos esses resultantes de ativos por si detidos um nome próprio e na sua esfera considerados como proveitos, o que, consequentemente, acarreta o seu direito à dedução das retenções na fonte a que as entidades pagadoras dos rendimentos tenham procedido no momento desse mesmo pagamento, sendo essas retenções na fonte consideradas como pagamento por conta do imposto devido a final, tudo nos termos do artigo 88º, nºs 1 e 3 do CIRC. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | I - RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente), veio recorrer da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa no dia 30.05.2017, na impugnação judicial deduzida pelo B........, S.A (doravante Recorrida), na sequência do deferimento parcial da reclamação graciosa nº ..........15, contra a liquidação de IRC do exercício de 2002 com o nº ..........20, de 16.03.2005, que gerou uma nota de compensação no montante a pagar de €360.871,42, que julgou procedente a impugnação e em consequência determinou a anulação da liquidação impugnada na parte referente à desconsideração do montante de €356.128,57 referente a retenções na fonte efetuadas por terceiros sobre rendimentos de capitais, com o pagamento correspondente de juros indemnizatórios à taxa legal, desde 27.12.2006 até à data de emissão da nota de crédito. Com o requerimento de interposição do recurso, a Recorrente apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: “III - CONCLUSÕES I - Pelo elenco de razões supra arroladas, ressalve-se melhor entendimento, infere-se que a sentença proferida pelo tribunal "a quo” enferma de erro de julgamento, porquanto não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante e, bem assim, total e acertada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso “sub judice”; II - A fundamentação da Sentença recorrida assenta, em síntese, no seguinte entendimento ”(...) os rendimentos auferidos pela Impugnante resultantes de ativos por si detidos e aos quais se encontram indexados os valores das unidades de conta subjacentes aos contratos de seguro unit linked, são claramente rendimentos próprios da Impugnante, resultantes de ativos por si detidos em nome próprio e na sua esfera considerados como proveitos, o que, consequentemente, acarreta, o seu direito à dedução das retenções na fonte a que as entidades pagadoras dos rendimentos tenham procedido no momento desse mesmo pagamento, sendo essas retenções na fonte consideradas como pagamento por conta do imposto devido a final, tudo nos termos do artigo 88.°, n.° 1 e 3 do CIRC; III - O "thema decidendum”, no presente recurso prende-se com a divergência de entendimento perfilhado entre a Fazenda Pública e o Tribunal “a quo”, no que se refere à natureza, modo de funcionamento contabilístico dos produtos financeiros denominados unit linked, em suma se a desconsideração do montante de € 356.128,57, referente a retenções na fonte efectuadas por terceiros sobre rendimentos de capitais e, que deu origem à liquidação de IRC do exercício de 2002 padece do vício de ilegalidade, ou ao invés, deverá permanecer na ordem jurídica do ora Recorrido; IV - Relativamente ao produto financeiro denominado unit Iinked (produtos de investimento, inerentes a seguros) a seguradora assume-se como entidade gestora de uma carteira de investimento do tomador de seguro, pagando, este, à seguradora uma comissão pela gestão desse montante e, aquela gere a sua carteira, investindo onde melhor entender, não sendo, contudo, responsável, quer pelo lucro quer pelos prejuízos derivados das referidas aplicações; V - A gestão é orientada por critérios e padrões, cuja definição é estabelecida pela entidade gestora - a seguradora (Recorrido), limitando-se o tomador de seguro no fim do prazo contratado, obter um retorno positivo ou negativo do seu investimento, sendo o risco suportado, única e exclusivamente, pelo tomador de seguro; VI - Em suma o Recorrido, limitou-se a pagar aos seus clientes o valor que estava indexado ao valor dos activos subjacentes, pelo que as variações nos mercados não afectaram, quer a capacidade de pagamento quer os seus resultados, uma vez que, os montantes investidos são do tomador do seguro e, não do Recorrido; VII - Em suma a capacidade de pagamento da seguradora, nunca é afectada, uma vez que se limita a pagar ao tomador de seguro o resultado da venda dos activos financeiros, deduzido da sua comissão, pelo que qualquer risco da operação não se reflecte na esfera da seguradora, mas única e exclusivamente na do tomador do seguro, que, inclusivamente, suportará os eventuais prejuízos a que o investimento der lugar, não havendo, sequer, a protecção da integridade do capital investido, como se constata do senso comum; VIII - Já ao nível da contabilidade do ora Recorrido os produtos financeiros - unit linked - reflectiram-se contabilisticamente na conta de proveitos - 74.1 - rendimentos de investimentos - risco suportado pelo tomador, sendo aqueles compensados na sua totalidade pela variação das provisões técnicas, as quais foram relevadas contabilisticamente na conta de custos 61.01 - variação outras provisões técnicas, resultando nula a base tributável, por não ser afetada com os referidos movimentos, motivo pelo qual os unit linked, são caracterizados pela sua neutralidade contabilística e fiscal; IX - Desta singela, mas preclara, observação, permite-se concluir que estamos numa situação relativa a retenções na fonte sobre fundos de investimento nacionais, relacionadas com unidades de participação subscritas pelo ora Recorrido, cuja dedução à colecta de IRC nunca poderia ser aceite (artigo 88.º do CIRC), considerando - se, por esse facto, indevido o pedido de reembolso no montante de € 356.128,57. X - Por último e, face ao valor fixado pelo M. Juiz do tribunal "a quo", mormente o montante de € 356.128,57 (valor da causa), solicita-se, desde já, ao abrigo do disposto no artigo 6.°, n.° 7 do Regulamento das Custas Processuais (RCP) que V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul, concedam oficiosamente a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida a final tendo subjacente a salvaguarda, entre outros valores, o princípio da proporcionalidade e da justiça distributiva na responsabilização do pagamento das custas processuais. Nestes termos e, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência a douta sentença ora recorrida, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA.” * A Recorrida, devidamente notificada da admissão do recurso, apresentou contra-alegações, tendo as suas conclusões o seguinte teor: “IV. CONCLUSÕES A.O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou totalmente procedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrida, a qual tinha por objeto a apreciação jurisdicional da liquidação referente a IRC do exercício fiscal de 2002, e em concreto a dedutibilidade de retenções na fonte ao abrigo do artigo 22.º do EBF relativamente a rendimentos de títulos afetos a carteiras de seguros unit linked. B. Na ótica do Tribunal a quo, e em sintonia com a posição defendida nos autos pela ora Recorrida, a qual se encontra sustentada por parecer e artigo de JOSÉ LUÍS SALDANHA SANCHES e JOÃO GAMA, as correções à matéria coletável objeto dos presentes autos devem ser anuladas, pois estão verificados os requisitos do artigo 22.º do EBF para aceitação da dedutibilidade das retenções na fonte suportadas pela Recorrida sobre os rendimentos decorrentes das carteiras unit linked, o que invalida a legalidade do ato tributário sindicado e das correções subjacentes. C. Na ótica da Fazenda Pública, ora Recorrente, na sentença recorrida, o Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, o que fundamentou a apresentação do presente recurso. D. Conforme resulta do teor da sentença recorrida e das alegações da ora Recorrente, a questão material controvertida objeto do presente recurso prende-se em determinar se a Recorrida poderia beneficiar da dedução à coleta das retenções na fonte suportadas nos termos do artigo 22.º do EBF sobre os rendimentos afetos à carteira de seguros unit linked E. Na ótica da AT e como defendido pela Fazenda Pública nas suas alegações, não seria possível a dedução das retenções na fonte na esfera da Seguradora, "uma vez que os montantes investidos são do tomador do seguro e, não do Recorrido." F. Parece claro que a questão do risco correr por conta da Recorrida ou do tomador do seguro se mostra totalmente inócua para efeitos do tratamento dos rendimentos obtidos através dos fundos de investimento detidos pela Recorrida, desde logo porquanto a Administração Tributária parte de um erro de base ao considerar que tais unidades de participação (e consequentemente os rendimentos por esta gerados) não são ativos da Recorrida, conforme exposto no relatório de inspeção. G. É, assim, absolutamente pacífico que os subscritores das apólices unit linked não são titulares de quaisquer unidades de participações em fundos de investimento, mas sim de unidades de conta indexadas a ativos detidos pela Recorrida, cuja valorização ou desvalorização determinará o montante final do seguro a pagar pela seguradora. H. Ou seja, os investimentos em ações, cujo montante provem da subscrição de seguros de vida em que o risco é suportado pelo tomador de seguros, são diretamente realizados pela Recorrida, a qual é a efetiva titular da carteira de títulos e respetivos rendimentos. I.Parece, assim, claro que se mostra decisivo separar e distinguir para efeitos de aplicação da disposição legal aqui em análise (i) os rendimentos associados a cada apólice (que refletem o valor dos ativos subjacentes) a tributar aquando do resgate na esfera do subscritor do seguro; (ii) e a tributação associada aos rendimentos gerados na esfera do fundo de investimento, os quais constituem proveitos da ora Recorrida. J. Deste modo, conforme refere o Professor SALDANHA SANCHES no parecer junto aos presentes autos, "o investimento financeiro é um negócio no qual o segurado não participa. É a seguradora que vai aos mercados, é a seguradora que compra, que vende, que participa nas perdas e que recebe, ou não, os dividendos. O Cliente da seguradora não dispõe de unidades de participação, nem de acções, nem de qualquer outro título.” K. Aliás, é o próprio plano de contas do setor segurador que obriga (e sempre obrigou) ao registo dos rendimentos advenientes destes investimentos como proveitos da própria Seguradora. L. Concretizando: os ativos subjacentes aos seguros unit linked pertencem à seguradora e não ao tomador do seguro, o que encontra expressa consagração legal no n.º 51 da Norma n.º 16/95-R, de 12 de Setembro do ISP, pelo que, ao contrário do que pretende fazer crer a Recorrente nos presentes autos, a Recorrida é a única titular dos investimentos por si realizados, quer sejam eles ações, obrigações ou outros, independentemente de o risco dos produtos por si comercializados ser assumido pelo tomador do seguro ou pela própria seguradora. M. Com efeito, a questão do risco associado ao produto unit linked não é suscetível de afastar o regime previsto no artigo 22º do EBF por falta de estatuição expressa ou implícita nessa matéria, o que não deixará de ser apreciado por este Venerando tribunal. N. Se o único rendimento da Recorrida fosse uma "comissão" pela gestão da carteira associada aos seguros "unit linked", como pretende fazer crer a AT, então o PCES teria estabelecido que fosse apenas a "comissão" o proveito a registar e não a totalidade dos rendimentos derivados das participações sociais associadas aos fundos de investimento, sob pena de empolamento artificial da matéria coletável da Recorrida. O. Os seguros Unit-Linked implicaram desde sempre e ao abrigo do Plano de Contas para as Empresas de Seguros (aprovado pela Norma Regulamentar n.º 7/94, de 27 de Abril - "PCES 94") a constituição de provisões técnicas, por forma a acautelar os pagamentos futuros a efetuar aos respetivos subscritores, sendo que a obrigatoriedade de constituição e manutenção de provisões técnicas resulta clara do diploma que regula as condições de acesso e de exercício da atividade seguradora (Decreto-Lei n.º 8-A/2002, de 11 de janeiro). P. A circunstância das provisões técnicas serem um custo fiscal em sede de IRC não afasta o regime previsto no artigo 22.º, n.º 3 do EBF, inexistindo qualquer norma legal que suporte o entendimento da Recorrente. Q. Resulta evidente do quadro legal aplicável que os sujeitos passivos de IRC, que aufiram rendimentos decorrentes da detenção de UPs em fundos de investimento, os quais tenham sido objeto de retenção na fonte na esfera desses fundos, beneficiam da dedução do montante que haja sido retido, uma vez que o mesmo reveste a natureza de imposto por conta, tal como se verifica na situação da ora Recorrida. R. Quando a Recorrida investe os montantes recebidos dos segurados em unidades de participação em fundos de investimento, esta age como qualquer investidor coletivo, inexistindo qualquer base legal que sustente o afastamento do regime tributário previsto no artigo 22º do EBF, padecendo a liquidação adicional ora sindicada de um erro sobre a matéria de facto e direito e um vício de ilegalidade por violação dos artigos 83.º do CIRC e 22º do EBF, o que se invoca para os devidos efeitos legais. S. A solução propugnada pela Recorrida é a única capaz de assegurar a neutralidade fiscal que norteia a tributação destes produtos de natureza financeira, assegurando a sua equiparação a outros produtos em tudo idênticos, mas em que o segurado detém uma participação nos resultados do investimento ou lhe é assegurado um capital mínimo no caso de morte. T. Assume extrema relevância referir, para efeitos de apreciação da questão material ora controvertida, que, conforme prova documental produzida em l.ª instância, a Administração Tributária tem aceite expressamente, desde o exercício de 2007, a possibilidade de a Recorrida deduzir, ao abrigo do artigo 22º do EBF, o imposto retido na fonte, tendo sido as correções efetuadas, a partir da referida data, com base, não na inaplicabilidade do referido preceito legal aos seguros unit linked, mas sim na circunstância de uma parte do imposto deduzido pela Recorrida respeitar a imposto presumivelmente retido e declarado como tal pela Recorrida. U. A posição sustentada nos presentes autos tem merecido acolhimento expresso em diversos arestos proferidos por este mui douto Tribunal, bem como em sede arbitral. V. Requer-se assim a este Venerando Tribunal que se digne julgar improcedente o presente recurso, confirmando-se a sentença proferida em l.ª instância pelo Tribunal a quo no sentido da anulação das correções ora sindicadas, o que motivará a anulação da liquidação de IRC do exercício de 2002, bem como o reconhecimento do direito da Recorrida ao reembolso do imposto indevidamente pago no valor de EUR 356.128,57, acrescido dos juros indemnizatórios devidos nos termos legais, tal como expressamente determinado pelo Tribunal a quo. W. Em harmonia com a mais recente jurisprudência dos nossos tribunais superiores e dada a simplicidade da questão material controvertida, em função da posição já sustentada pela nossa Doutrina e pela jurisprudência dos tribunais, incluindo os arbitrais, a ora Recorrida vem requerer a este Venerando Tribunal a fixação do valor do presente recurso no montante máximo de EUR 275.000, determinando-se igualmente nos presentes autos a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos e para os efeitos do n.º 7 do artigo 6.° do RCP. Nestes termos, e nos melhores de Direito que os mui Ilustres Juízes DESEMBARGADORES deste Venerando Tribunal assim o julgarem no seu MUI douto juízo, deve o recurso interposto pela Recorrente ser julgado improcedente no que respeita à questão material controvertida, requerendo-se a confirmação da decisão proferida pelo Tribunal a quo no sentido da anulação do ato tributário ora sindicado, com base nos fundamentos acima melhor expostos, tudo com as devidas consequências legais, mormente o reconhecimento do direito da Recorrida ao reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios, tal como determinado na decisão ora recorrida. Mais se requer a fixação do valor do presente recurso no montante máximo de EUR 275.000, determinando-se igualmente nos presentes autos a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos e para os efeitos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP. Assim fazendo, VOSSAS EXCELÊNCIAS, a costumada Justiça!” * A Digna MAGISTRADA DO MINISTÉRIO PÚBLICO neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. * Colhidos os vistos legais (artigo 657º, n. º2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), cumpre apreciar e decidir. * Delimitação do objeto do recurso Em ordem ao consignado no artigo 639º do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282º do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir: * II. FUNDAMENTAÇÃO II.1- De facto A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “III. FUNDAMENTAÇÃO 1. Dos Factos Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os factos infra indicados: A) A Impugnante tem como objeto social a promoção e comercialização de produtos seguros do ramo vida (acordo). B) No âmbito da sua atividade a Impugnante comercializa os denominados produtos “unit linked” que se tratam de aplicações financeiras baseadas numa apólice de seguro de vida, expressa em unidades de conta cujo valor corresponde, em cada momento, ao produto do número de unidades de participação de cada Fundo, pelo valor da respetiva unidade de participação à data, sendo que, em caso de morte, o(s) Beneficiário(s) recebem 100% do valor da unidade de conta à data da ocorrência (cfr. fls. 93 a 96 dos autos). C) Os produtos referidos na alínea antecedente encontram-se afetos a carteiras de títulos constituídas por ações, obrigações e unidades de participação em fundos de investimento mobiliário e imobiliário que são adquiridos pela Impugnante, títulos que geram rendimentos que são auferidos pela Impugnante (acordo). D) A Impugnante procedeu no exercício de 2002 à contabilização dos rendimentos referidos na alínea antecedente numa conta de Proveitos – conta 74.1- Rendimentos de Investimentos – Risco de Investimento suportado pelo tomador do seguro (acordo). E) A Impugnante constituiu, no exercício de 2002 provisões técnicas contabilizadas na conta de Custos 61.01-Variação das Provisões Técnicas, considerando o valor dos rendimentos mencionados em C) e o funcionamento dos produtos mencionados em B) (acordo). F) Em cumprimento da ordem de serviço nº 04/1/219 de 05.07.2004, os Serviços da Direcção de Serviços de Inspeção Tributária iniciaram em 19.07.2004, à Impugnante, ação de inspeção de âmbito geral ao exercício de 2002 (cfr. fls. 121 e 124 do PAT). G) Em 19.01.2005 foi sancionado pelo Diretor de Serviços da DSPIT o relatório final da ação de inspeção do qual consta, designadamente, o seguinte: “(…) II - 3- Outras situações II - 3.1- Caracterização da empresa A Companhia de Seguros T..........S. A, contribuinte n.º …….56, com sede social na Av. da Liberdade n.º …. em Lisboa, foi constituída em 28 de Junho de 1993. Desde Junho de 1996 tem uma sucursal em Espanha com sede em Madrid. Em 31 de Dezembro de 2002, a totalidade do capital está representada por 50.000.000 acções nominativas de valor nominal de 5 euros. II - 3.2- Actividade desenvolvida A empresa tem como objecto a produção de seguros do ramo vida desde o inicio da sua actividade. No exercício em análise houve um acréscimo do volume de prémios emitidos do Ramo Vida de 12,1% face ao ano anterior. No entanto, os produtos tradicionais, associados a seguros de vida, registaram um acréscimo de 13,1% e os PPR’s apresentaram uma variação positiva de 16,7% em relação a 2001. Os produtos são comercializados, fundamentalmente através de canais de distribuição bancários. No exercício em análise o resultado líquido do exercício é de (62.467.948,00 €) e o resultado fiscal (96.912.454,00€). (…) (…) III – 2 – Imposto em falta (…) III – 2.1 – Retenções de terceiros sobre rendimentos da capitais O Sujeito Passivo incluiu no imposto retido por terceiros a parte correspondente a rendimentos de Unidades de Participação. Trata-se de rendimentos afectos a investimentos que se encontram a representar as provisões técnicas em que o risco é suportado pelo tomador do seguro (Unit Linked), registados na conta de proveitos 74.1 - Rendimentos de Investimentos - "Risco Investimento suportado pelo tomador do seguro", por montante igual ao imposto, tendo como contrapartida o movimento a débito na conta de custos 6101 - "Variação das outras provisões técnicas", tornando o efeito em resultados nulo, não afectando, desta forma a base tributável. Não sendo rendimentos da empresa que deram origem à retenção efectuada esta não se enquadra no artigo 88° do CIRC, pelo que o reembolso, no montante de € 356.128,57 foi indevido. Assim não se aceita a dedução do imposto, pelo que este se considera em falta. - Anexo 3 (1fl) (…) IX - Direito de Audição - Fundamentação Em 17 de Novembro de 2004 foi notificada a referida sociedade para o exercício de audição prévia, previsto na alínea e) do nº 1 do artigo 60° da Lei Geral Tributária e do nº 1 do artigo 60° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, aprovados pelo Decreto-Lei nº 398/98 de 17 de Dezembro e Decreto-Lei nº 413/98 de 31 de Dezembro, respectivamente. Assim, no âmbito do exercício do direito de audição, deu entrada na DSPIT um documento escrito em 29 de Novembro, pronunciando-se do seguinte modo: (…) Ponto III- 2.1 do projecto de conclusões do relatório de inspecção - Retenções de terceiros sobre rendimentos de capitais - correcção no montante de 356.128,57 € O sujeito passivo questiona e não concorda com a correcção proposta referente ao imposto que incidiu sobre rendimentos de unidades de participação (UP'S) em fundos de investimento nacionais. O argumento que invoca é que tem direito à dedução de imposto suportado pelo fundo nos termos do artigo 22°, nº 3 do EBF, dado que as UP'S são subscritas pela Tranquilidade Vida, sendo esta a titular da carteira de títulos pelo que os rendimentos gerados pelo fundo constituem rendimentos da Companhia e são contabilizados pelo valor i1fquido. Como foi explanado no ponto III-2.1.do projecto de conclusões do relatório de inspecção e dado tratar-se de imposto retido respeitante a rendimentos associados a investimentos em que o risco é suportado pelo tomador do seguro e sendo estes rendimentos contabilizados em contas de rendimentos da empresa são simultaneamente contabilizados numa conta de custos anulando o impacto no resultado. Resulta assim, que a empresa não é titular dos rendimentos pelo que não se altera a correcção proposta não dando razão aos fundamentos apresentados pelo contribuinte ao exercer o direito de audição.” (cfr. fls. 123 a 133 do PAT, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). H) Em concretização das correções realizadas pelos Serviços Inspetivos e vertidas no Relatório parcialmente transcrito na alínea antecedente, foi emitida em 16.03.2005, em nome da Impugnante, a liquidação adicional de IRC do exercício de 2002, com o nº ..........20, que deu origem a uma nota de cobrança no montante a pagar de 360.871,42€ (cfr. fls. 46 a 48 dos autos). I) O montante referido na alínea antecedente foi pago em 27.12.2006 (cfr. fls. 111 do PAT). J) Em 24.08.2005 a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação identificada na alínea antecedente, instaurada no Serviço de Finanças de Lisboa 2 sob o nº ..........15 (cfr. processo de reclamação graciosa em apenso ao PAT). K) A reclamação graciosa referida na alínea antecedente foi deferida parcialmente por despacho proferido em 27.09.2007, tendo sido mantida a correção referente à não aceitação das retenções na fonte efetuadas por terceiros sobre rendimentos de capitais, relacionados com os seguros de vida unit linked (cfr. fls. 93 a 109 do processo de reclamação graciosa apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais). L) Notificada em 10.10.2007 da decisão referida na alínea antecedente, a Impugnante apresentou a presente impugnação em 25.10.2007 (acordo e cfr. fls. 157 dos autos). * “Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa” * Motivação “A decisão da matéria de facto fundou-se na prova documental junta aos autos e no processo administrativo, tal como na posição factual expressa pelas partes nos respetivos articulados, porquanto a prova testemunhal limitou-se, no essencial, a considerações referentes à reprodução de factos que já constam provados documentalmente dos autos relacionados, designadamente, com o teor do relatório da acção de inspecção.” * II.2 - De direito In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrida, a qual tinha por objeto a apreciação jurisdicional da liquidação referente a IRC do exercício de 2002 e em concreto a dedutibilidade de retenções na fonte ao abrigo do artigo 22º do EBF relativamente a rendimentos de títulos afetos a carteiras de seguros unit linked. Estão em causa correções à matéria coletável do exercício de 2002/IRC. As correções em apreço assentam na fundamentação seguinte. A ora Recorrida incluiu no imposto retido por terceiros a parte correspondente a rendimentos de Unidades de Participação. Trata-se de rendimentos afetos a investimentos que se encontram a representar as provisões técnicas em que o risco é suportado pelo tomador do seguro (Unit Linked), registados na conta de proveitos 74.1 - Rendimentos de Investimentos - "Risco Investimento suportado pelo tomador do seguro", por montante igual ao imposto, tendo como contrapartida o movimento a débito na conta de custos 61.01 - "Variação das outras provisões técnicas", tornando o efeito em resultados nulo, não afetando, desta forma a base tributável. Não sendo rendimentos da empresa que deram origem à retenção efetuada esta não se enquadra no artigo 88° do CIRC, pelo que o reembolso, no montante de € 356.128,57 foi indevido. Em suma estão em causa correções técnicas impostas ao lucro tributável de IRC de 2002, relativas a rendimentos percebidos em virtude de detenção de participações associadas a contratos de seguro vida, denominados unite-linked. Discorda a Recorrente do teor da sentença recorrida, que no seu entender padece de erro de julgamento, traduzido em errónea aplicação do direito aos factos dados como provados. A Impugnante (ora Recorrida) entendeu na sua petição de impugnação que a circunstância de o risco ser suportado pelo tomador do seguro e o facto de obrigatoriamente ter de proceder à constituição das provisões técnicas pelo valor correspondente aos rendimentos por si percebidos, resultantes da detenção dos ativos financeiros aos quais se encontram indexados os produtos unit linked, não descaracteriza o facto de esses rendimentos (provenientes de obrigações, ações ou UP de fundos de investimento), serem efetivamente seus, sendo a Impugnante que adquire tais ativos, o que lhe permite deduzir as retenções na fonte que lhe tenham sido efetuadas na sequência do pagamento dos rendimentos supra mencionados. Por seu turno, a Fazenda Pública (ora Recorrente) pugna pelo entendimento de que a assunção do risco pelo tomador do seguro implica que não se possam considerar os rendimentos em causa como rendimentos da Impugnante, o que, aliado ao facto de que, apesar de os rendimentos constarem da contabilidade da Impugnante como proveitos, estes serem contrabalançados pelas provisões técnicas constituídas nos mesmos montantes, impede que a seguradora usufrua de dedução ao imposto de retenções na fonte, na medida em que tais rendimentos não são sua pertença, mas de terceiros. O Tribunal a quo deu razão à ora Recorrida. A Recorrente coloca sob censura o entendimento que fez vencimento na instância. A Recorrente Fazenda Pública não se conforma com o decidido invocando erro de julgamento de facto e de direito, pois na sua perspetiva a sentença efetuou um errado enquadramento da questão, na medida em que se fundou numa análise formal da situação. Entende a Recorrente que relativamente ao produto financeiro denominado unit Iinked (produtos de investimento, inerentes a seguros) a seguradora assume-se como entidade gestora de uma carteira de investimento do tomador de seguro, pagando, este, à seguradora uma comissão pela gestão desse montante e, aquela gere a sua carteira, investindo onde melhor entender, não sendo, contudo, responsável, quer pelo lucro quer pelos prejuízos derivados das referidas aplicações Na perspetiva da Recorrente, a capacidade de pagamento da seguradora, nunca é afetada, uma vez que se limita a pagar ao tomador de seguro o resultado da venda dos ativos financeiros, deduzido da sua comissão, pelo que qualquer risco da operação não se reflete na esfera da seguradora, mas única e exclusivamente na do tomador do seguro, que, inclusivamente, suportará os eventuais prejuízos a que o investimento der lugar. Mais alega a Recorrente nas suas alegações e conclusões de recurso, que, ao nível da contabilidade da ora Recorrido os produtos financeiros - unit linked - refletiram-se contabilisticamente na conta de proveitos - 74.1 - rendimentos de investimentos - risco suportado pelo tomador, sendo aqueles compensados na sua totalidade pela variação das provisões técnicas, as quais foram relevadas contabilisticamente na conta de custos 61.01 - variação outras provisões técnicas, resultando nula a base tributável, por não ser afetada com os referidos movimentos, motivo pelo qual os unit linked, são caracterizados pela sua neutralidade contabilística e fiscal. Conclui a Recorrente que estamos numa situação relativa a retenções na fonte sobre fundos de investimento nacionais, relacionadas com unidades de participação subscritas pela ora Recorrida, cuja dedução à coleta de IRC nunca poderia ser aceite (artigo 88° do CIRC), considerando - se, por esse facto, indevido o pedido de reembolso no montante de € 356.128,57. * Vejamos então.De relevar, ab initio, que a Recorrente não procedeu à impugnação da matéria de facto em ordem ao consignado no artigo 640º do CPC, nada requerendo em termos de aditamento ou supressão do competente acervo probatório, razão pela qual a mesma se encontra devidamente estabilizada. Atenhamo-nos aos factos que relevam, ou seja, aqueles que antecedem a liquidação impugnada na parte em causa no presente recurso, a saber: - A Impugnante tem como objeto social a promoção e comercialização de produtos seguros do ramo vida. - No âmbito da sua atividade a Impugnante comercializa os denominados produtos “unit linked” que se tratam de aplicações financeiras baseadas numa apólice de seguro de vida, expressa em unidades de conta cujo valor corresponde, em cada momento, ao produto do número de unidades de participação de cada Fundo, pelo valor da respetiva unidade de participação à data, sendo que, em caso de morte, o(s) Beneficiário(s) recebem 100% do valor da unidade de conta à data da ocorrência. - Os produtos referidos na alínea antecedente encontram-se afetos a carteiras de títulos constituídas por ações, obrigações e unidades de participação em fundos de investimento mobiliário e imobiliário que são adquiridos pela Impugnante, títulos que geram rendimentos que são auferidos pela Impugnante. - A Impugnante procedeu no exercício de 2002 à contabilização dos rendimentos referidos na alínea antecedente numa conta de Proveitos – conta 74.1- Rendimentos de Investimentos – Risco de Investimento suportado pelo tomador do seguro. - A Impugnante constituiu, no exercício de 2002 provisões técnicas contabilizadas na conta de Custos 61.01-Variação das Provisões Técnicas, considerando o valor dos rendimentos mencionados em C) e o funcionamento dos produtos mencionados em B) (do probatório). - Em cumprimento da ordem de serviço nº 04/1/219 de 05.07.2004, os Serviços da Direcção de Serviços de Inspeção Tributária iniciaram em 19.07.2004, à Impugnante, ação de inspeção de âmbito geral ao exercício de 2002. - Em concretização das correções realizadas pelos Serviços Inspetivos e vertidas no Relatório parcialmente transcrito na alínea antecedente, foi emitida em 16.03.2005, em nome da Impugnante, a liquidação adicional de IRC do exercício de 2002, com o nº ..........20, que deu origem a uma nota de cobrança no montante a pagar de 360.871,42€. * Está em causa a correção relativa a retenções na fonte efetuadas por terceiros, identificadas na alínea G) 5 do probatório.Para julgar procedente a presente impugnação, no que respeita à correção em apreço, a sentença estruturou, em síntese, a argumentação seguinte: «Na verdade, reconduzir a posição da Impugnante, enquanto entidade seguradora no âmbito dos contratos unit linked, à mera posição de intermediária resulta totalmente redutor e sem aderência à realidade, porquanto, como já antes se viu, é a própria Impugnante quem escolhe os concretos ativos que serão alvo de aquisição, esses ativos nunca saem da esfera de titularidade da Impugnante, ela é quem recebe efetivamente os rendimentos auferidos pela detenção dessa titularidade, e é a Impugnante quem faz a gestão desses ativos financeiros. Por outro lado, não se vislumbra de que modo é que o facto dos produtos unit linked implicarem que a sua rentabilidade se encontra indexada aos ativos financeiros adquiridos pela Impugnante, retira a titularidade direta e imediata desses mesmos ativos da esfera da Impugnante, uma vez que o que o tomador do seguro adquire mais não é senão um determinado número de unidades de conta do produto unit linked e nunca a titularidade dos ativos financeiros aos quais o seguro adquirido se conexiona para efeitos de determinação da sua valorização. Quanto ao facto da Impugnante proceder à constituição das provisões técnicas, tal obrigação é decorrente diretamente dos normativos legais que lhe são aplicáveis enquanto entidade seguradora. Assim, dispõe o artigo 69º, nº 1, do Decreto-Lei nº 94-B/98, de 17.04 (Regime de Acesso e Exercício da Atividade Seguradora e Resseguradora – RAEASR), que “[o] montante das provisões técnicas deve, em qualquer momento, ser suficiente para permitir à empresa de seguros cumprir, na medida do razoavelmente previsível, os compromissos decorrentes dos contratos de seguro”, nelas se incluindo as provisões de seguros e operações do ramo «Vida» (artigo 70º, nº 1, alínea e), do RAEASR). (…) A base de atuação da A.T. que fundamenta a correção exercício de 2002, no montante de 356.128,57€ referente a retenções na fonte efetuadas à Impugnante por terceiros, tal como a Fazenda Pública bem sintetiza na sua contestação, resulta da consideração de que não se trata de rendimentos da Impugnante mas dos tomadores do seguro unit linked. Ora, quanto a esta questão, pelas razões já supra escalpelizadas, há que concluir que a A.T. labora em erro, uma vez que os rendimentos auferidos pela Impugnante resultantes dos ativos por si detidos e aos quais se encontram indexados os valores das unidades de conta subjacentes aos contratos de seguro unit linked, são claramente rendimentos próprios da Impugnante, resultantes de ativos por si detidos um nome próprio e na sua esfera considerados como proveitos, o que, consequentemente, acarreta o seu direito à dedução das retenções na fonte a que as entidades pagadoras dos rendimentos tenham procedido no momento desse mesmo pagamento, sendo essas retenções na fonte consideradas como pagamento por conta do imposto devido a final, tudo nos termos do artigo 88º, nºs 1 e 3 do CIRC. Por essa razão, procede a impugnação nesta parte, sendo de anular a correção às retenções na fonte no montante de 356.128,57€.». A este propósito e uma vez que a Recorrente não introduz argumentos ou elementos novos, estando em causa situação semelhante à que foi apreciada no Acórdão, proferido por este TCAS, em 15.12.2016, Processo n.º 09756/16 (IRC de 2001), com o qual concordamos, acolhemos aqui a referenciada tese, também em tributo do artigo 8º, nº 3 do Código Civil (que impõe ao julgador a interpretação e aplicação uniformes do direito em casos análogos). Impõe-se reiterar nesta sede a fundamentação que se recolhe do mesmo para julgar a impugnação procedente. Aí se consignou o seguinte: «(…) Vejamos. Os seguros Unit-linked ou instrumentos de captação de aforro estruturados – ICAE - «combinam as características de um produto clássico — segurador, bancário ou do mercado de valores mobiliários — com as de outro ou outros instrumentos financeiros, formando assim um produto materialmente novo»1 . Tais contratos estão integrados no ramo «Vida» nos termos do n.º 3 do artigo 124.º do Decreto-Lei n.º 94-B/98, de 17 de Abril (diploma que aprova o Regime de Acesso e Exercício da Actividade Seguradora e Resseguradora – RAS)2. O seguro de vida é o contrato pelo qual o segurador recebe do tomador do seguro (segurado), por uma ou mais vezes, certa quantia (prémio) e promete pagar àquele ou a outrem (beneficiário) uma soma de dinheiro determinada (benefício), em caso de vida ou de morte de uma pessoa (pessoa segura ou beneficiária). «O capital seguro (…) pode-se destinar à própria pessoa cuja vida se segura (seguro em caso de vida) ou a outrem designado na apólice (beneficiário), que adquire um mero direito potencial, uma expectativa, que apenas se transforma em definitivo no momento do vencimento do seguro e desde que se encontre vivo e que o benefício se mantenha a seu favor»3. No que respeita aos seguros de vida, com capitalização, mas sem garantia (os Unitlinked), cabe referir que lhes «está associado um nível de risco que, dependente de variáveis de evolução incerta, poderá implicar a inexistência de remuneração ou até a perda do capital investido. Os unit linked não garantem taxas de rentabilidade, podendo mesmo, nos casos em que os fundos têm uma componente accionista mais elevada, o seu resultado ser negativo»4 . «Quando o tomador subscreve este tipo de produto, continua a ter que pagar um prémio. No entanto, as prestações que a seguradora se obriga para com o segurado são variáveis (podendo existir uma parte fixa/garantida). «(…) [T]odos os contratos de seguro são contratos aleatórios por natureza, pela imprevisibilidade em relação ao facto (seja ao se, ou apenas ao quando). (…) Aos valores pagos a título de prémio por parte do tomador do seguro, a seguradora faz corresponder um certo número de unidades de conta. Estas unidades de conta (que não são títulos e não têm mercado) têm o seu valor ligado, em cada momento, ao valor de um conjunto de activos (por exemplo, unidades de participação em fundos de investimento, participações sociais, depósitos bancários, créditos sobre o Estado). O seu valor encontra-se normalmente uma vez por dia, pela divisão do valor do conjunto de activos num determinado momento pelo número total das unidades de conta contratualmente atribuídas, descontando-se os encargos contratualmente previstos a favor da seguradora. O conjunto de activos que serve de referência para se encontrar o valor da unidade de conta é conhecido como “o Fundo”. Para cada segurado, a seguradora cria uma conta (em sentido escritural), na qual são creditadas as unidades de conta atribuídas em função do prémio pago, e é o valor total das unidades de contas inscritas a favor de cada segurado o valor a que este tem direito por parte da seguradora no evento. Assim, o valor da responsabilidade da seguradora para com o segurado varia ao longo do período contratual, consoante a variação do valor dos activos a que estão indexadas as unidades de conta»5 . (…) 2.2.5. A recorrente afirma também que os dividendos em causa mostraram-se cobertos pela constituição de provisões técnicas, ou seja, que «os dividendos estão na Seguradora afectos a investimentos que se encontram a representar as provisões técnicas em que o risco é suportado pelo tomador do seguro (Unit Linked)», e que «a seguradora apenas faz a gestão da sua carteira, pelo que perante os rendimentos auferidos, não nos encontramos perante um verdeiro proveito da empresa, mas sim do tomador do seguro, donde os rendimentos auferidos do investimento são compensados na sua totalidade pela variação das provisões técnicas de igual valor, relevadas contabilisticamente na conta de custos, pelo que o resultado contabilístico nunca é afectado»8 . ---------------------------------------------------------------- 1 José de Campos Amorim, Benefícios Fiscais em matéria de protecção social, Comunicação apresentada no "I Congresso Internacional de Ciências Jurídico-Empresariais, 2009", Universidade do Porto. 2 Entretanto revogado pela Lei nº 147/2015, de 9 de Setembro, com produção de efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2016, 3 Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 16.06.2011, P. 3434/08.9TBGMR.G1. 4 José de Campos Amorim, Benefícios Fiscais em matéria de protecção social, Comunicação apresentada no "I Congresso Internacional de Ciências Jurídico-Empresariais, 2009", Universidade do Porto. 5 J. Luis Saldanha Sanches e João Taborda da Gama, Provisões no âmbito de seguros unit-linked e dupla tributação económica, in Fiscalidade, Revista de Direito e Gestão Fiscal, 33, Janeiro-Março de 2008, pp. 25/69, máxime, p. 31. 8 Ponto 13, da informação de suporte à contestação da Fazenda Pública. Nos termos do 2.9. do POC, «[a]s provisões têm por objecto reconhecer as responsabilidades cuja natureza esteja claramente definida e que à data do balanço sejam de ocorrência provável ou certa, mas incertas quanto ao seu valor ou data de ocorrência. O montante das provisões não pode ultrapassar as necessidades. As provisões não podem ter por objecto corrigir os valores dos elementos do activo»9 . São provisões fiscalmente dedutíveis as provisões técnicas e as provisões para prémios por cobrar constituídas obrigatoriamente, por força de normas emanadas do Instituto de Seguros de Portugal, de carácter genérico e abstracto, pelas empresas de seguros submetidas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal e empresas seguradoras com sede em outro Estado membro da União Europeia»10. As empresas de seguros são obrigadas a constituir provisões técnicas (artigo 68.º do RAS). «O montante das provisões técnicas deve, em qualquer momento, ser suficiente para permitir à empresa de seguros cumprir, na medida do razoavelmente previsível, os compromissos decorrentes dos contratos de seguro» (artigo 69.º/1, do RAS). «A provisão de seguros e operações do ramo «Vida» deve representar o valor das responsabilidades da empresa de seguros líquido das responsabilidades do tomador do seguro, em relação a todos os seguros e operações do ramo «Vida», compreendendo: // a) A provisão matemática; // b) A provisão de seguros e operações do ramo «Vida» em que o risco de investimento é suportado pelo tomador do seguro; // c) A provisão para compromissos de taxa; // d) A provisão de estabilização de carteira» (artigo 75.º/1, do RAS). «Quando se faz um contrato de seguro, assume-se a perspectiva de ter um pagamento futuro. No caso dos seguros Unit-Linked haverá sempre um pagamento futuro com formas especiais de quantificação – um pagamento futuro que tem de ser provisionado. Este cálculo do que é necessário ter hoje para enfrentar obrigações futuras pode ter maior ou menor complexidade. Em seguros de vida, tem de se considerar a esperança de vida, o sexo, eventualmente aspectos ligados à saúde do grupo de indivíduos a que pertence o segurado, etc.. Daí que grande parte das provisões a realizar pelas companhias de seguros sejam determinadas por uma técnica especialmente elaborada – o cálculo actuarial – com fórmulas de grande complexidade para permitir o cálculo das obrigações futuras»11. A este propósito, cumpre ter presente as regras actualizadas pela Norma Regulamentar N.º 09/2008-R, de 25 de Setembro – “Cálculo e reporte das provisões técnicas com base em princípios económicos”, aprovada pelo Instituto de Seguros de Portugal. Das regras em referência extrai-se que as «Responsabilidades hedgeable» correspondem «às responsabilidades em que os respectivos cash flows podem ser aproximadamente reproduzidos por uma carteira de activos financeiros de liquidez adequada face à duração das responsabilidades, com valor de mercado conhecido e directamente observável e transaccionados num mercado financeiro regulamentado suficientemente líquido, profundo e transparente11 e que a «Provisão técnica de seguros e operações do ramo “Vida”» corresponde ao «valor actuarial estimado dos compromissos da empresa de seguros, após dedução do valor actuarial estimado dos prémios futuros, incluindo as participações nos resultados futuras e, no caso dos seguros e operações do ramo ¯Vida‖ ligados a fundos de investimento (unit-linked), o valor dos índices ou activos que tenham sido fixados como referência para determinar o valor das importâncias seguras (…)»12. ------------------------------------------------------------------- 9 Versão conferida pelo Decreto-Lei nº 35/2005, 10 Artigo 34.º/1/d), do CIRC 11 J. Luis Saldanha Sanches e João Taborda da Gama, Provisões no âmbito de seguros unitlinked e dupla tributação económica, in Fiscalidade, Revista de Direito e Gestão Fiscal, 33, JaneiroMarço de 2008, pp. 25/69, máxime, p. 49. 12 Artigo 3.º/1/a), da Norma Regulamentar, citada Por outras palavras, da existência da obrigação legal de constituir e manter provisões técnicas, cujo valor deve permitir às empresas seguradoras fazer face no futuro aos compromissos assumidos, e que se repercutem, como custos, nos resultados do exercício, valor indexado à variação do valor da carteira de títulos, escolhida como referência do seguro, não se extrai que os montantes percebidos, a título de dividendos, em razão da carteira de participações sociais detidas por aquelas, não se venha a inscrever no balanço como rendimento e como tal tributável. De modo semelhante, as normas sobre a eliminação da dupla tributação13 ou as normas sobre a redução da tributação dos dividendos gerados por certa categoria de acções14 não deixam de se aplicar, porquanto está-se na presença de rendimento da contribuinte, ora recorrida, cuja tributação ocorre (deve ocorrer) nos termos gerais, como em relação a qualquer outro contribuinte». --------------------------------------------------- 13 Artigo 3.º/2/a), da Norma Regulamentar, citada. 14 Artigo 46.º do CIRC.” Deste modo, comercializando a Impugnante seguros unit linked, os rendimentos dos valores mobiliários, que constituem a carteira a que está associada a rentabilidade do seguro, são da Impugnante, não obstante o risco ser por conta do tomador. Rendimentos esses, resultantes de ativos por si detidos um nome próprio e na sua esfera considerados como proveitos, o que, consequentemente, acarreta o seu direito à dedução das retenções na fonte a que as entidades pagadoras dos rendimentos tenham procedido no momento desse mesmo pagamento, sendo essas retenções na fonte consideradas como pagamento por conta do imposto devido a final, tudo nos termos do artigo 88º, nºs 1 e 3 do CIRC. Refira-se que, o entendimento constante na decisão recorrida, e ora, secundado, tem sido o adotado, de forma unânime e uniforme por este TCAS, designadamente, nos Acórdãos proferidos nos processos nºs 1305/07.5BELSB, de 19-09-2017, 0733/09.6BELRS, de 22-02-2018, 2173/04.4BELSB, de 25-02-2021, 20019/16.9BCLSB, de 19-06-2024, os quais se convocam, e mais uma vez, se adere à fundamentação jurídica neles constante. Pelo exposto, é de confirmar a sentença recorrida que neste sentido decidiu, improcedendo todas as conclusões de recurso da Recorrente. * No que respeita à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, n.º 7, do RCP, formulado pela recorrida. Vencida a Recorrente é a mesma responsável pelas custas (artigo 527º do CPC). Cumpre, no entanto, atento o valor dos autos, considerar o disposto no artigo 6º, n.º 7, do RCP. Assim, nos termos desta disposição legal, “[n]as causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”. No caso, tendo em conta a circunscrição das questões a apreciar e a conduta processual das partes, determina-se que haja lugar à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no artigo 6º, n.º 7, do RCP. * Pelo que, a sentença que assim decidiu não padece de qualquer erro de julgamento, devendo, por isso, ser confirmada. * III. DECISÃO Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em: - Negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida. - Condenar a Recorrente no pagamento de custas, em ambas as instâncias. - Determina a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, n. º7, do RCP, em relação a ambas as partes. Registe e notifique. Lisboa, 20 de fevereiro de 2025. ---------------------------------- [Maria da Luz Cardoso] ---------------------------------- [Rui A. S. Ferreira] ------------------------------ [Patrícia Manuel Pires] |