Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:712/09.3BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/24/2024
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:REGIME DE ISENÇÃO DE IRC
OBRAS REALIZADAS NA BASE DAS LAJES E INFRAESTRUTURAS NATO
MÉTODO DE IMPUTAÇÃO DE CUSTOS
CONTABILIDADE ANALÍTICA
IMPUTAÇÃO POR UTILIZAÇÃO EFETIVA
PRINCÍPIO DA CONSISTÊNCIA
Sumário:I - Da interpretação conjugada dos normativos XI, nº 1, do Anexo I do Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os Estados Unidos e 14.º, nº2, do CIRC resulta consignado um regime de isenção de IRC, relativamente aos sujeitos passivos que desenvolvam obras e trabalhos executados nas instalações concedidas na Base das Lajes e nas infraestruturas NATO e quanto aos lucros derivados dessas obras e trabalhos.
II - Em regra, todos os custos contraídos por um sujeito passivo serão relevados negativamente na determinação do seu lucro tributável, conforme dimana, expressamente, do artigo 17.º, nº1, do CIRC. De resto, por imperativo constitucional, estatuído no artigo 104.º, n.º 2 da CRP, a tributação das empresas deve incidir sobre o rendimento real.
III - O artigo 17.º do CIRC apenas impõe que a contabilidade das sociedades esteja organizada de forma a refletir e a distinguir todas as operações por si efetuadas, o que significa que, em matéria de apuramento de resultados de operações sujeitas e não isentas de imposto, o que importa é que seja possível percecionar, de forma absolutamente fidedigna, a expressão concreta a alocar e a imputar a esses custos.
IV - Se a Impugnante possui contabilidade analítica, devidamente organizada, a qual permite individualizar, em centro de custo específico cada uma das obras que realiza, os departamentos gerais da sociedade, proporcionando, por conseguinte, a total perceção, validação e adjunção sistemática de todos os proveitos e custos de cada obra, no final do exercício, e apurar o resultado de cada uma das obras que executa;
V - E se, adicionalmente ao evidenciado em IV), inexiste qualquer exigência legal que vincule a Impugnante a proceder à imputação dos custos nos moldes preconizados pela AT, nada sendo sindicado quanto à qualidade da informação contabilística, e quanto aos elementos transmitidos pela mesma, não se questionando, tão-pouco, os valores concretamente apurados pela Impugnante, na medida em que não se corporiza qualquer elenco que os permita segmentar ou deslocalizar do respetivo centro de custos, então, nenhuma ilegalidade pode ser apontada à atuação da Impugnante.
VI - O princípio da consistência, tem apenas como desiderato garantir a comparação da informação financeira entre diferentes períodos, daí que se estabeleça, como regra, que não se devem alterar as políticas contabilísticas empresarias de forma discricionária, fazendo-o apenas quando existam circunstâncias que o justificam, devendo explicitar-se as razões resultantes desta alteração e sempre que possível quantificá-las.
VII - Inexiste qualquer violação do princípio da consistência, porquanto, por um lado, as realidades em contenda são materializadas extra-contabilisticamente, e por outro lado, porque o mesmo não pode ser interpretado de forma estanque e sem que seja admitida qualquer alteração nos meandros e diretrizes de atuação da empresa.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO

O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por “S…TRABALHOS HIDRÁULICOS, SA”, tendo por objeto o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) do exercício de 2004, e respetivos juros compensatórios, com os nºs 2008 2010391108, 2008 8310037270, 2008 1963077 e 2008 1963076, todos objeto da Demonstração de Acerto de Contas nº 2008 7105401, no valor total a pagar de 238.797,58€.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

“A) In casu, salvaguardado o elevado respeito, deveria ter sido dada uma maior acuidade ao vertido no art. 14.º, n.º 2, 23.º e 50º, todos do CIRC, assim como ao escopo do consignado no documento de fls. 284 a 305 do PAT junto aos autos (Relatório Final), tudo devidamente condimentado e com arrimo no respeito pelo princípio da legalidade e da justiça,

B) Decidindo como decidiu, o Tribunal a quo lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, não considerou e/ou avaliou correctamente a prova documental produzida nos autos,

C) tendo preconizado uma incorrecta interpretação do sentido factual a retirar daquele acervo probatório documental, consequentemente, lavrou em errada aplicação das normas legais supra vazadas.

D) Aliás, tudo assim, conforme melhor é explanado e vertido nos itens 14.º ao 25.º das Alegações que supra se aduziram, e das quais, as presentes Conclusões são parte integrante.

E) Por conseguinte, salvo o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo lavrou em erro de julgamento.

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido total provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a sentença proferida com as devidas consequências legais.

CONCOMITANTEMENTE,

Apela-se desde já à vossa sensibilidade e profundo saber, pois, se aplicar o Direito é um rotineiro acto da administração pública, fazer justiça é um acto místico de transcendente significado, o qual, poderá desde já, de uma forma digna ser preconizado por V. as Ex.as, assim se fazendo a mais sã, serena, objectiva e acostumada JUSTIÇA! E.R.D.”


***

A Recorrida devidamente notificada apresentou contra-alegações, tendo peticionado o seguinte:

“a) Nos termos do nº 1 do artº 640º do C.P.Civil, aplicável ex vi artº 281º do C.P.P.T., rejeitar as alegações da Recorrente, no que ao recurso da matéria de facto respeita;
b) Nos termos do nº 3, in fine, do artº 639º do C.P.Civil, aplicável ex vi artº 281º do C.P.P.T., abster-se de conhecer o recurso da Recorrente, por este não identificar, nem nas Conclusões, nem na própria Alegação, o sentido com que ... as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas.
Caso assim não se entenda (o que não se admite),
c) Negar provimento ao recurso apresentado pela Recorrente, por infundado e não provado e, em consequência, manter a douta sentença recorrida.
Sem conceder,
Merecendo provimento o recurso interposto pela Recorrente na parte em que impugna o julgamento do Tribunal a quo, com fundamento (não concretizado) em pretenso erro na apreciação e decisão da matéria de facto e, ainda, na interpretação e aplicação das normas legais,
Seja admitida a requerida ampliação do âmbito do Recurso, procedentes as razões que sustentam o recurso e, em consequência, proferida, Tribunal de Recurso, decisão que:
a) seleccione e integre, entre os factos assentes e relevantes à boa decisão do litígio, os identificados sob os parágrafos 9,13,17, 20, 23, 28 e 33 das Conclusões;
b) corrija, como proposto sob os parágrafos 24 e 29 das Conclusões, os factos assentes contidos nas alíneas L), M) e N) da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo;
E, a final,
c) julgue procedente a Impugnação e anule a liquidação de IRC do exercício de 2004, dentro dos limites quantitativos determinados pelo Tribunal a quo na Sentença Recorrida.”


***

O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

***

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal a quo fixou a seguinte factualidade:

“Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os factos infra indicados:

A) A Impugnante tem por objeto a execução de trabalhos de construção civil e obras públicas (acordo).

B) A Impugnante executa trabalhos, na Base Aérea das Lajes, na Ilha Terceira, nos Açores, para o estado norte-americano há algumas décadas, bem como trabalhos de construção civil em infra-estruturas comuns da Nato localizadas em território português (prova testemunhal de S…, M…).

C) A Impugnante dispunha, designadamente em 2004, de escritório e estaleiro junto da Base das Lajes, na ilha Terceira, nos Açores, espaço concedido pelo governo norte-americano, com uma equipa composta por seis ou sete a trabalhar em exclusivo e de modo permanente para as obras aí desenvolvidas, utilizando-se materiais específicos que se encontravam guardados no armazém local, eram utilizados equipamentos próprios e afetos exclusivamente àquelas obras, a par de outros da estrutura central da Impugnante (prova testemunhal de S…, P…).

D) A Direção de Produção da Impugnante estima anualmente o valor dos custos a suportar com os seus equipamentos – centros de custos 7100 a 7400), tendo em conta a sua manutenção, seguros e desgaste ou amortização, fracionando-o depois por 365 dias, apurando um valor diário que corresponderá à imputação direta a cada obra em função do número de dias que cada uma delas utilize o equipamento na sequência da solicitação da Direção de Obra ao Estaleiro Central (prova testemunhal de S… e M…).

E) No que concerne aos trabalhos executados pelo estaleiro central, oficina mecânica e carpintaria, são os trabalhos solicitados pela Direção de cada obra imputados a cada uma delas, em função do custo dos materiais utilizados acrescido de uma percentagem de 15%, correspondente aos custos de armazenagem, e em função do custo da mão-de-obra utilizada aferido com base nas horas despendidas registadas em folhas de horas (prova testemunhal de S… e M…).

F) A sala de desenho da estrutura central da Impugnante nunca trabalhou para as obras da Base das Lajes ou foi por estas aproveitada (prova testemunhal de P…).

G) A estrutura da Base das Lajes da Impugnante não utilizava os serviços do departamento central de estudos, orçamentos e concursos, sendo que era o chefe dessa estrutura, P…, quem decidia concorrer aos concursos e elaborava os orçamentos (prova testemunhal de P…).

H) Também os serviços de aprovisionamento e transporte da estrutura central da Impugnante não colaboravam com as obras da Base das Lajes, já que os materiais eram adquiridos pela estrutura da Base das Lajes de forma direta e principalmente nos Estados Unidos ou localmente, atenta a especificidade dos materiais e equipamentos necessários e o facto destes serem transportados por navios militares americanos ou por embarcações contratadas pelo governo americano (prova testemunhal de P…).

I) Devido às especificidades e exigências constantes dos contratos celebrados com o Governo Norte-Americano, a Estrutura da Baje das Lajes da Impugnante nunca recorreu ao departamento geral de Gestão da Qualidade, nem ao departamento jurídico central da Impugnante (prova testemunhal de P…).

J) No exercício da atividade descrita em A), a Impugnante executou em 2004 os seguintes trabalhos de construção nas instalações militares concedidas pelo Estado Português na Base das Lajes, nos Açores e para instalações da Nato:

Obra nº 2910 - WTP Operation, na Base das Lajes;

Obra nº 0111- Replace Military Family Housing - Phase I, na Base das Lajes;

Obra nº 0210- Replace Military Family Housing - Phase II, na Base das Lajes;

Obra nº 0221- Tank Repairs - Tanks 1642 and 1643, na Base das Lajes;

Obra nº 230 - Jet Fuel Pipeline at Porto Santo Airfield, nas infra-estruturas NATO;

Obra nº 0322 - Dental Clinic Replacement, na Base das Lajes;

Obra nº 405 - Reparação de Emergência do Passadiço no Depósito POL, nas infraestruturas NATO;

Obra nº 417 - Emergency Repairs to Breakwater, na Base das Lajes;

Obra nº 419 - Additions and Alterations to Fitness Center T-333, na Base das Lajes;

Obra nº 433 - Additions and Alterations to Fitness Center T-333 - Phase II, na Base

das Lajes (artigo 24º da p.i. e fls. 13/117 do Relatório de Inspeção).

K) A Impugnante dispõe de contabilidade analítica na qual divide as obras desenvolvidas por centros de custo nos quais procede à imputação de todos os custos que diretamente digam respeito a cada uma das obras (acordo, fls. 10/117 do Relatório Inspetivo e prova testemunhal de S… e J…).

L) A contabilidade da Impugnante também procede à destrinça dos custos gerais por centros de custos – centros de custos nº 6300 a 9700 – tendo até ao exercício de 2003 procedido à imputação desses custos gerais por cada obra de forma proporcional, aplicando o coeficiente resultante da divisão entre o total dos custos gerais e o total dos proveitos gerados por cada obra (acordo, fls. 11/117 do Relatório de Inspeção e prova testemunhal de S… e J…).

M) A partir do exercício de 2004 a Impugnante passou a proceder à imputação proporcional dos custos gerais por cada obra apenas com referência aos centros de custos 8070 (Higiene e Segurança), 8500 (Setor Administrativo) e 9200 (Administração) (acordo, fls. 11/117 do Relatório de Inspeção e prova testemunhal de S… e J…).

N) No que respeita ao exercício de 2004 e posteriores, a Impugnante concluiu ser possível, quanto aos restantes centros de custos gerais não mencionados na alínea antecedente, proceder à imputação a cada obra em particular, dos custos com relação direta e inequívoca a cada obra, com base no critério de utilização efetiva (cfr. fls. 212, e 354 a 416 dos autos, prova testemunhal de S… e J…).

O) Em cumprimento da Ordem de Serviço nº OI 2008000976, de 06.03.2008, foi desenvolvida ação inspetiva à Impugnante, tendo em 15.10.2008 sido elaborado o Relatório Final constante de fls. 284 a 305 do PAT, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, aí constando designadamente o seguinte:

“RELATÓRIO

I. DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO

Como resultado da acção inspectiva externa efectuada ao exercício de 2004 detectamos algumas irregularidades, as quais se encontram discriminadas e fundamentadas no capítulo III, como correcções meramente aritméticas em sede de IRC. Posteriormente ao direito de audição as correcções dividem-se do seguinte modo:

2004

- IRC - ao resultado tributável no montante de € 807.146,27 e correcções regularizadas voluntariamente no de € 389.289,07;

IVA - deduzido indevidamente no montante de € 2.335,27

II. OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA

II.1. Motivos da Fiscalização

Em cumprimento da Ordem de Serviço n° 01 2008000976 de 2008/03/06, com despacho de 2008/04/14, foi efectuada uma análise externa ao Sujeito Passivo S… TRABALHOS HIDRAULICOS, SA, contribuinte n.º 5…, com sede na R…, n° …, … andar, 2…-… Portela, Loures.

Os actos inspectivos decorreram no período compreendido entre 2008/04/21 a 2008/09/09.

A Ordem de Serviço foi aberta com o PNAIT 221,39, para uma análise externa de IRC e IVA ao exercício de 2004 na sequência da análise interna efectuada ao Modelo 22 e à Declaração Anual.

II.2. Identificação do Sujeito Passivo

(…)

II.3. Enquadramento do Sujeito Passivo

II.3.1. Em Sede de IVA

A empresa está enquadrada no regime normal de periodicidade mensal, realiza operações tributáveis à taxa normal, que confere direito à dedução total do imposto suportado nas aquisições, com as limitações previstas no CIVA, (Anexo 1 com 8 fls). O contribuinte pratica operações não sujeitas a IVA de acordo com o artigo IX do Acordo de Cooperação e Defesa Realizado Entre Portugal e os Estados Unidos da América - Acordo da Base das Lajes _ Resolução da Assembleia da República nº 38/95 (Anexo 2 com 4 fls), conjugado com o exercício do direito à dedução do imposto suportado nos termos dos art. 19° a 25° e 71° do CIVA.

II.3.2. Em sede de IRC

O sujeito passivo está colectado em IRC, no 3° Serviço de Finanças de Loures, e beneficia da isenção total de IRC sobre os lucros obtidos nas obras realizadas na Base das Lajes nos termos do n° 1 do art. XI do Anexo I do Regime Aduaneiro e Fiscal (Anexo 2 com 4 fls).

(…)

III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES

MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

(…)

III.1.3. Imputação dos Gastos Gerais à Actividade Isenta a) Descrição de situação

Em 1995 foi celebrado um Acordo de Cooperação e Defesa entre a Republica Portuguesa e os Estados Unidos da América, aprovado na Resolução da Assembleia da República nº 38/95 de 11/10/1995, (Anexo 2 com 4 fls).

- Este acordo, veio estabelecer no seu nº 1 e 2 do art. XI, um regime especial de isenção de IRC nos lucros derivados das obras e trabalhos respeitantes às instalações concedidas;

- No n° 1 e 2° do art. IX estabelece ainda "são igualmente isentos do imposto sobre o valor acrescentado ou do imposto que o substitua as prestações de serviços, localizadas em Território Português, de que sejam destinatárias as Forças e o elemento civil". Pelo que os serviços efectuados pela S… dentro da Base das Lajes cujo adquirente é a U.S.N..., beneficiam directamente da isenção prevista nas alíneas l), m) e n) do art. 14° do CIVA, não havendo por isso lugar a liquidação do imposto quando da respectiva facturação.

Assim, no âmbito do desenvolvimento da actividade económica, a empresa celebrou com Governo dos Estados Unidos da América, diversos contratos de empreitada que tiveram como objecto a execução de obras e trabalhos de construção civil nas " Instalações Militares Concedidas" ao Governo dos EUA, na Base das Lajes na Ilha Terceira, Açores.

Face ao mencionado, os lucros obtidos nas obras realizadas pela empresa na Base das Lajes estão isentos de IRC. Porém, e dado que a empresa realiza outras obras que estão sujeitas ao regime geral de tributação, a contabilidade deverá permitir individualizar as obras de modo a que:

- sejam contabilizados os custos e proveitos que directamente dizem respeito a essas obras (centros de custos);

- relativamente aos custos comuns para os quais não é possível efectuar uma imputação especifica, o contribuinte deverá definir os critérios de repartição.

Porém, da análise efectuada à empresa verifica-se que, até 2003 foi seguido um critério de imputação dos gastos comuns, o qual foi alterado em 2004, pelo facto da empresa entender este como mais correcto face à especificidade das Lajes. Porém, não se verifica no anexo ao balanço e demonstração de resultados qualquer justificação para esta alteração.

Sendo que a Certificação Legal das Contas não refere de igual modo essa situação.

Porém, para obter uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira e dos resultados das operações da empresa, esta deve seguir determinados princípios contabilísticos, nomeadamente o da consistência, que refere que a empresa não altera as suas políticas contabilísticas de um exercício para o outro. Se o fizer e a alteração tiver efeitos materialmente relevantes, esta deve ser referida no anexo ao balanço e demonstração de resultados.

Refere ainda o POC que a informação proporcionada pelas demonstrações financeiras deverá ser comparável, ou seja, a divulgação e quantificação dos efeitos financeiros de operações e de outros acontecimentos devem ser registadas de forma consistente pela empresa e durante a sua vida, para identificarem tendências na sua posição financeira e nos resultados das suas operações.

b) Critério de determinação dos custos seguido pela empresa:

A empresa dispõe de contabilidade analítica e divide as obras por centros de custos onde são imputados todos os custos que directamente digam respeito a essa obra (cc 1 a 4315).

Relativamente aos custos comuns são imputados nos cc 6300 a 9700, cuja descriminação consta em (Anexo 16 com 1 fl).

Na contabilidade é apurado o resultado contabilístico e fiscal comum a toda a actividade da empresa e posteriormente à elaboração do balanço e da demonstração de resultados bem como do Quadro 07, a empresa recorre ao seguinte rácio para imputação dos gastos gerais às obras isentas:

Até 2003

Centros de custos 6300 a 9700

Total dos proveitos das obras

No numerador estavam todos os cc comuns cuja descrição está no (Anexo 17 com 1 fl)

Em 2004

Centros de custos 8070+ 8500+ 9200

Total dos proveitos das obras

8070 - higiene e segurança

8500 - sector administrativo

9200 - Administração

Verifica-se assim que em 2004 a empresa apenas imputou estes 3 centros (Anexo 16 e 18).

Com base neste coeficiente, determinado em cada um dos anos, a empresa calcula os gastos gerais a imputar às obras isentas, conforme consta em (Anexo 18 com 13 fls). Assim, determina o lucro/prejuízo de cada obra isenta, o qual é inscrito no campo 323/324 do quadro 09 da declaração Modelo 22 - no regime isento. O restante é incluído no campo do regime geral 301/302. A soma dos dois é igual ao lucro tributável do campo 240 do Quadro 07 (Anexo 13 come 3 fls).

De acordo com o definido nos critérios contabilísticos e no CIRC, a que nos referimos na alínea a) deste ponto, além dos gastos específicos ou directos, devemos ainda imputar-lhes uma parte dos gastos gerais que são comuns a toda a actividade. Porém, dos centros de custos comuns, em 2004, a empresa apenas utilizou 3 deles para calcular o coeficiente de imputação dos gastos gerais.

Logo o coeficiente é menor, o que implica menos custos comuns imputados às obras das Lajes.

De acordo com o mesmo critério utilizado até 2003 o contribuinte teria uma matéria colectável sujeita ao regime geral superior em € 810.974,70, conforme os cálculos a seguir apresentados:












f) Situações apresentadas a título exemplificativo

Porém, de todos os centros de custos gerais, a empresa apenas utilizou três para cálculo do rácio acima referido. De acordo com o definido contabilisticamente e legalmente, são custos gerais os que não são especificadamente imputados a uma obra, logo seriam esses a repartir por todos.

Conforme se pode verificar na descrição dos restantes cc (Anexo 20 com 2 tis), estes também deveriam ser de igual modo imputados, se não vejamos algumas situações apresentadas a título exemplificativo:

- No centro custo 8510 - departamento jurídico - foi registado na conta 62236349 - trabalhos especializados uma factura de serviços prestados por Advogados e não refere a que diz respeito. Foi correctamente imputado a um centro de custo geral mas depois não foi utilizado na repartição. (Anexo 21 com 2 fls);

- No mesmo centro de custo foi registado na conta 62231318 - contencioso e notariado -despesas de depósitos das contas da S…, facturadas pelo Advogado porém não foi repartido pelo sector isento (Anexo 21 com 2 fls );

- No 8550 - departamento de informática foi registado na conta 622322349 - conservação e reparação um contrato de manutenção da T… que não especifica para onde, logo é um custo geral (Anexo 22 com 2 tis). E na repartição efectuada este centro de custo não foi incluído;

- No centro de custo 8520 - relações públicas foi registado na conta 65 - Quotizações – as quotas da A… e A…, que tem a ver com o alvará e a actividade de construção a nível geral da empresa, logo é gasto geral. Mesmo que não seja pedido pelo governo Americano para as obras das Lajes, é o que permite à empresa exercer a sua actividade. Por outro lado, os custos suportados com o departamento de relações públicas será para a globalidade da empresa (Anexo 23 com 4 fls.);

- No centro de custo 9700 - resultados diversos foram registados os custos decorrentes do cálculo da equivalência patrimonial, as provisões, os sinistros, bem como prestações de serviços de gestão facturados por uma empresa relacionada. Apesar de gerais não foram imputados às obras isentas;

- Apesar do fornecedor D… estar relacionado com as obras das Lajes, foi registado no centro de custo 9700, conta 6988 uma correcção relacionada com esse fornecedor. Porém este centro não foi utilizado no coeficiente (Anexo 24 com 1 fl);

- No sector 8020 - Sala de desenho e topografia foi facturada pela O… a assistência técnica de equipamento que não especifica qual e por isso foi custo geral mas depois não foi incluído na repartição (Anexo 25 com 1 fl);

- Apesar da contabilidade analítica relevar as imputações internas efectuadas às obras com os custos do imobilizado, o centro de custo 9600 - Amortizações - não contribuiu para o cálculo do referido coeficiente;

Por exemplo para a obra 111 Military Housing Lajes, existe uma descrição do imobilizado que é utilizado nessa obra, mas não lhe foram imputadas amortizações, porque o centro de custo 9600 não contribui para o rácio, (de referir que na contabilidade analítica também não foram efectuadas imputações internas dos custos de imobilizado a essa obra) (Anexo 26 com 11 fls).

A própria empresa subdivide os custos comuns dos custos directamente imputados às obras, porém na imputação ao sector isento apenas considera uma parte, contrariamente ao que fez até 2003.

g) Conclusão

Face ao anteriormente mencionado e nos termos do art. 23° do CIRC bem como com o estabelecido no POC o regime geral sujeito a tributação deverá ser acrescido de € 810.974,70.



(…)

IX – DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO

O direito de audição entrou nestes Serviços em 13/10/2008, o qual fica a fazer parte integrante dos papéis de trabalho, tendo sido alegadas as seguintes situações:

1. No projecto de relatório tinha sido proposto uma correcção de IVA no montante de €2.766,59, no entanto a correcção a efectuar será de € 2.335,27, por ser este o registado contabilisticamente (Anexo 28 com 3 fls).

Assim, no relatório final é corrigido o valor de € 2.335,27.

2. As correcções efectuadas às ajudas de custo e aos documentos não aceites fiscalmente no montante total de € 389.289,07, descritas nos pontos 111.1.1. e 111.1.2. do projecto de relatório, foram devidamente regularizadas pelo contribuinte mediante a apresentação da declaração de rendimentos Modelo 22 de substituição (Anexo 29 com 3 fls);

3. Relativamente ao ponto III.1.3. Imputação dos gastos gerais à actividade isenta a requerente referiu o seguinte:

3.1. "... requer a V.Exas. se digne abster-se de converter em definitivo o projecto de correcção inerente à imputação de custos à actividade isenta de imposto, por aplicação de um critério diferente do adoptado pela Requerente";

3.2. Até 2003 "A requerente presumia que todos os custos e proveitos apresentados nos centros de custos gerais aproveitavam quer à actividade sujeita a imposto, quer à actividade isenta, e na sequência, alocava-os proporcionalmente às obras isentas de imposto, na mesma medida em que os respectivos proveitos contribuíram, para os proveitos globais da sociedade".

Porém, "A medida que o critério foi sendo utilizado, apercebeu-se a requerente que o mesmo deveria ser aprimorado ..." tendo constatado que "... devido às especiais características dos trabalhos para o governo norte-americano e para a NATO - havia criado, dentro da sua organização societária, uma estrutura autonomizável de facto para execução destas obras";

3.3. Foram registadas quotizações das associações A… e A… e imputadas ao centro de custo 8520 - relações públicas (o qual não foi imputado às obras isentas). No direito de audição vem agora a requerente referir que "... os encargos com o pagamento destas quotizações deveriam ser repartido pelas obras isentas de imposto ..." e por lapso não terá sido lançado no centro de custo 9200 - Administração, e este havia sido imputado às obras isentas.

Foi ainda lançado no centro de custo 9700 - resultados diversos - uma correcção relacionada com um fornecedor que presta serviços no âmbito das obras das Lajes e este centro de custo não afectou o quociente. Em direito de audição a requerente referir "A correcção em causa deveria ter sido lançada no centro de custo da obra respectiva.

3.4. "Atento o erro verificado, entende a requerente que se impõe a integração dos saldos dos centros de custo 8410 e 9540 nos custos gerais pelas obras isentas". Assim, aos três centros de custos já imputados, entende agora a requerente acrescer mais dos 8410 - Medicina no Trabalho e o 9540 Juros e Descontos.

3.5."Para apurar o quociente a aplicar aos proveitos das obras isentas, a Administração Fiscal não incluiu na base de cálculo dos custos gerais os centros de custo 7180,7210, 7320 e 7330" sendo que o valor total dos custos não é assim, de € 3.116.062,47, mas antes de € 3.105.398,64.

Assim, o quociente não seria de 0,073230, mas antes de 0,072979171, pelo que solicita o recálculo do quociente proposto

Face ao alegado pela requerente temos a referir o seguinte:

- A imputação de um custo, aos centros de custos gerais, ocorre da impossibilidade de o imputar ao respectivo centro de custo. Sempre que esta situação ocorre o critério adoptado pela Administração Fiscal tem sido a imputação dos custos gerais proporcionalmente a todos os centros de custos directos. A própria requerente vem agora propor a inclusão no quociente de imputação de mais dois centros de custos pelo facto de terem sido " ... imputados nestes centros de custo encargos com reflexo nas obras da Base das Lajes";

- procedendo à imputação de todos os gastos gerais às obras das Lajes, conforme vinha sendo o critério utilizado até 2003 e agora por nós proposto, seriam imputados cerca de 35,9% dos gastos gerais às obras das Lajes, ou seja na mesma proporção dos proveitos. Com os cálculos efectuados pela empresa em 2004, apenas são imputados cerca de 9,9% dos gastos gerais;

- Relativamente ao solicitado pela requerente no ponto 3.5. acima descrito, foram devidamente alterados os custos, tendo originado uma correcção de € 807.146,27 e não de €810.974,70, conforme tinha sido proposto no projecto de relatório. Esta correcção foi devidamente incluída no relatório final e na liquidação.

P) Fruto de um lapso praticado pela Impugnante no cálculo da percentagem de imputação dos custos gerais de estrutura às obras isentas, ao invés do quociente de imputação apurado de 0,020144, deveria ter sido utilizado o quociente de 0,02296932, devido à correção dos custos gerais referentes aos centros de custos 8410 – medicina no trabalho –, 9540 – juros e descontos e 9200 – Administração no valor de 14.165€ respeitante ao valor das quotas pagas à A… e A… (cfr. fls. 233 dos autos, e fls. 119, 120 e 122 dos autos, que constitui os artigos 224º a 233º e 241º do direito de audição prévia pela Impugnante).

Q) Em 27.10.2008 foi emitida em nome da Impugnante, a liquidação adicional de IRC do exercício de 2004 com o nº 2008 8310037270, como decorrência do Relatório Inspetivo referido em O), a qual gerou uma demonstração de acerto de contas no montante a pagar de 238.797,58€, incluindo juros compensatórios (cfr. fls. 258 a 261 dos autos).

R) A Impugnante prestou a garantia bancária nº GAR/09300696 emitida pelo BPI, no montante de 314.676,67€ em 06.02.2009, junto do Serviço de Finanças de Loures 3, por forma a obstar ao prosseguimento de execução fiscal para cobrança coerciva do montante referido na alínea antecedente (cfr. fls. 274 a 277 dos autos).


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A decisão recorrida consignou ainda que:

“Não se provaram outros factos nem existem factos não provados com interesse para a decisão da causa.”


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Mais ficou consignado em termos de motivação da matéria de facto que:

“A decisão da matéria de facto fundou-se na prova documental junta aos autos e ao PAT, bem como na posição expressa pelas partes nos seus articulados, e sobretudo na prova testemunhal produzida, tudo conforme referido expressamente a propósito de cada alínea do probatório.

No tocante aos factos dados como assentes em B) a E), K), L), M) e N), a convicção do Tribunal fundou-se no depoimento coerente, claro, espontâneo e convincente, revelando conhecimento direto dos factos, da testemunha S…, diretora financeira na Impugnante, que iniciou funções junto na mesma em 2000, como controller financeira, intervindo na Ação de Inspeção em causa nos presentes autos, e que confirmou que a Impugnante desenvolve trabalho na Base das Lajes há décadas, tendo know how e uma posição de mercado mais favorável que os concorrentes (v.g. como têm estrutura, têm custos menores). Com efeito, a referida testemunha revelou um conhecimento aprofundado da organização da contabilidade da Impugnante e da sua estrutura organizacional, respondendo de forma clara à forma como aquela contabilidade destrinçava os custos por obra, dizendo de forma determinada que o facto da Impugnante ter deixado de imputar proporcionalmente a cada obra todos os custos considerados nos Centros de Custos Gerais se deveu exclusivamente ao facto da empresa ter concluído que a imputação desses custos a cada obra em concreto era possível e desejável, descrevendo a forma como essa imputação era realizada.

No que concerne à testemunha M…, técnico de construção civil da impugnante, desde dezembro de 1981, tendo como função a revisão de contratos ou projetos e controlo financeiro dos contratos com os diretores financeiros, sendo o elo de ligação entre a parte técnica e a financeira, contribuiu também de forma decisiva para os factos dados como provados em B), C), D) e E), através da prestação de um depoimento esclarecido, espontâneo, que levou o Tribunal a considerá-lo sincero e verdadeiro.

Para a prova dos factos dados como assentes em K), L), M) e N), foi ainda considerado o depoimento da testemunha J…, revisor oficial de contas (ROC), que desde 1997 audita a Impugnante, sendo seu ROC em 2004, e que explicou de forma clara a convincente as exigências em termos de contabilidade analítica, designadamente para fazer face às imposições de relato à casa-mãe da impugnante, na Dinamarca, algo que também a testemunha S…, com a razão de ciência já referida, também referiu no seu depoimento.

Finalmente, para os factos dados como assentes em B), C), F), G), H) e I), contribuiu decisivamente o teor do depoimento de P…, que criou em 1992 o departamento de obras da Base das Lajes e que, desde então o chefia, caracterizando-o como uma estrutura local para execução dessas obras, dotada de recursos humanos próprios que o próprio recrutou e formou, instalações completas construídas em área cedida pelo Governo Norte-Americano, com equipamentos administrativos e mobiliário adquiridos pela própria estrutura local, demonstrando um profundo conhecimento sobre a realidade daquela estrutura da Impugnante na Base das lajes e a sua interacção com os departamentos centrais da empresa.

Quanto à alínea P) do probatório resulta do facto da Impugnante assumir na sua audição prévia ao projeto de relatório que o valor das quotas para a A… e A…, no valor de 14.165€ deveria ter sido considerado nos custos gerais de Administração – CC 9200 – e, assim, ter influenciado o quociente de imputação dos custos gerais nas obras isentas, o que não ocorreu por lapso, mas depois no novo cálculo desse quociente manteve o valor desse centro de custos (9200) igual ao inicialmente apurado, ou seja, 375.437,11€, sem acrescer o valor que a própria Impugnante considera ter sido incorretamente qualificado.”


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C) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC, do exercício de 2004, e respetivos JC, no valor total a pagar de 238.797,58€.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, face ao exposto cumpre aferir:

Ø Se o recurso da Recorrente deve ser rejeitado, porquanto as conclusões não cumprem os requisitos legais, mormente, quanto à concreta identificação das normas jurídicas violadas;

Ø Se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento:

o De facto, por errada valoração da prova, importando, assim, aferir dos requisitos do artigo 640.º do CPC;

o Por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, na medida em que sentenciou que nenhuma ilegalidade derivava do critério de imputação dos custos às obras isentas.

Ø Procedendo o erro de julgamento, conhecer da ampliação do objeto do recurso.

Apreciando.

Comecemos, então, pela rejeição do recurso atentas as deficiências das conclusões.

Defende a Recorrida, nas suas contra-alegações, que as conclusões formuladas pela Recorrente nas suas alegações de recurso não obedecem ao disposto no n.º 1, do artigo 639.º do CPC, na medida em que incumpre, desde logo, com o ónus de identificar as normas jurídicas violadas pela sentença recorrida.

Compete, assim, aferir se estão reunidos os pressupostos legais e condições para se conhecer do objeto do recurso.

Vejamos, então.

De harmonia com o disposto no artigo 282.º do CPPT, à data em vigor, sob a epígrafe de “Forma de interposição do recurso. Regras gerais. Deserção”:

“1 - A interposição do recurso faz-se por meio de requerimento em que se declare a intenção de recorrer.
2 - O despacho que admitir o recurso será notificado ao recorrente, ao recorrido, não sendo revel, e ao Ministério Público.
3 - O prazo para alegações a efetuar no tribunal recorrido é de 15 dias contados, para o recorrente, a partir da notificação referida no número anterior e, para o recorrido, a partir do termo do prazo para as alegações do recorrente.
4 - Na falta de alegações, nos termos do n.º 3, o recurso será julgado logo deserto no tribunal recorrido.
5 - Se as alegações não tiverem conclusões, convidar-se-á o recorrente a apresentá-las.”

Preceitua, por seu turno, o artigo 639.º, aplicável ex vi artigo 2.º alínea e), do CPPT, sob a epígrafe de “ónus de alegar e formular conclusões” que:

“1 - O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 - Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
3 - Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada.
4 - O recorrido pode responder ao aditamento ou esclarecimento no prazo de cinco dias.”

Consignando, outrossim, o artigo 652.º, nº2, alínea a), do CPC, aplicável ex vi artigo 282.º do CPPT, que compete ao Juiz Relator “[c]onvidar as partes a aperfeiçoar as conclusões das respetivas alegações, nos termos do nº3 do artigo 639.º”

Resultando, igualmente e à data, que no domínio dos recursos jurisdicionais das decisões proferidas pelos Tribunais Tributários de 1ª instância, de carácter não urgente, os Recorrentes após a admissão do competente recurso devem apresentar as suas alegações de recurso as quais têm, obrigatoriamente, de revestir conclusões.

Na falta de apresentação de conclusões ou contendo as mesmas deficiências, a lei dispõe que devem os Recorrentes ser previamente convidados a apresentá-las ou a suprir as suas deficiências, sendo que só após o incumprimento dessa formalidade está o Tribunal legitimado a não conhecer do objeto do recurso.

Com efeito, as conclusões das alegações de recurso visam identificar e extrair corretamente as questões controvertidas suscitadas pelo Recorrente, tendo a importante função de delimitar o objeto do recurso e circunscrever o campo de intervenção do Tribunal ad quem.

Neste particular, importa atentar no sumário do Aresto do STA, proferido no processo nº 0958/17, de 23 de novembro de 2017, o qual claramente doutrina:

“I - A finalidade ou função das conclusões é definir o objecto do recurso, através da identificação, abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas já desenvolvidas nas alegações;

II - Sendo as conclusões a delimitar o objecto do recurso, a sua precisão tem essencialmente por finalidade tornar mais fácil, mais pronta e segura a tarefa da administração da justiça, numa perspectiva dinâmica de estreita cooperação entre os vários agentes judiciários, e permitir eficaz contraditório ao recorrido, que terá ganho total ou parcialmente a causa, e que, por via disso, terá todo o interesse em manter o decidido, reagindo, para isso, a questões que deverá perceber;

III - A lógica, e a boa arte de alegar, mandam que as conclusões sejam proposições sintéticas que emanam do que se desenvolveu nas alegações. Devem, portanto, ser em número consideravelmente inferior aos artigos das alegações, mas não só, devem traduzir, ainda, o esforço de condensar, de forma clara, a exposição realizada naquelas;

IV - É nessa perspectiva dinâmica de cooperação, servindo o objecto do recurso e a efectividade do contraditório, e bem assim a promoção das decisões de mérito, que deve ser enquadrado o despacho convite formulado pelo relator nos termos do artigo 639º, nº3, do CPC;

V - O que significa que nunca se deverá atribuir ao «convite» uma impositividade que ele não tem, nem extrair do seu eventual incumprimento, total ou parcial, consequências que ele não comporta. É que, enquanto convite, a sua aceitação não poderá deixar de ficar na disponibilidade do destinatário, e, enquanto convite incumprido, sempre fica a dever a cominação de «não conhecimento do recurso, na parte afectada» à permanência e efectividade dos vícios detectados nas conclusões.”

Visto o quadro normativo, e tecidos os considerandos de direito reputados de relevantes, regressemos ao caso dos autos.

In casu, a Recorrida entende que as conclusões não cumprem o seu desiderato, e que tal situação determina a sua rejeição, no entanto, e ainda que as alegações de recurso em contenda não representem a melhor técnica jurídica, porquanto genéricas ou pouco objetivadas quanto à concreta valoração da prova e refutação do entendimento ajuizado na decisão recorrida, a verdade é que atentando no seu teor é possível percecionar e alcançar a concreta delimitação das questões, sendo, outrossim, evidenciados os respetivos fundamentos de facto e de direito, com a inerente convocação das normas jurídicas.

De relevar, a final, que o não conhecimento do recurso, deve ser usado com parcimónia e moderação, apenas devendo ser utilizado como solução de última linha, ou seja, quando não for de todo possível, ou for muito difícil, determinar as questões submetidas à apreciação do tribunal superior ou ainda quando a síntese ordenada se não faça de todo, sendo certo que o Tribunal ad quem deve privilegiar os valores da justiça, da celeridade e da eficácia em detrimento de aspetos de índole formal.

Face a todo o exposto inexiste fundamento para a sua rejeição.

Prosseguindo, ora, com o erro de julgamento de facto.

Neste âmbito sufraga a Recorrente que, não foi dada a devida relevância ao acervo documental mormente do respetivo Relatório Final.

Ora, se o que está em causa é o Tribunal a quo ter errado o seu julgamento de facto, cumpre ter em conta a tramitação processual atinente à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.

Para o efeito, importa começar por aferir se a Recorrente cumpriu os requisitos consignados no artigo 640.º do CPC.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (1-António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.).

Ora, convocado o quadro normativo e tecidos os competentes considerandos de direito, dimana perentório que, in casu, a Recorrente não impugna a matéria de facto, não requerendo qualquer aditamento por complementação ou substituição, apenas convoca um erro de julgamento no sentido de que deveria ter sido valorado de forma distinta a prova documental constante dos autos.

É certo que advoga que, o Tribunal a quo deveria ter melhor valorado e considerado o acervo probatório documental constante dos autos maxime, o Relatório de Inspeção Tributária e seus anexos, mas a verdade é que, por um lado, não retira qualquer ilação para efeitos de probatório, não convocando qualquer asserção fática que devesse ser consignada como provada, como, por outro lado, não pode limitar-se a remeter, em bloco, para o teor integral do Relatório de Inspeção Tributária e seus anexos, e concluir, sem mais, que foram extraídas erradas ilações jurídico-factuais.

Mais cumpre salientar que em nada importa, neste e para este efeito, a convocação do parecer do DMMP, por um lado, porque o mesmo não releva para efeitos de integração do respetivo probatório, em nada contemplando quaisquer asserções de facto que, naturalmente, careçam de o incorporar, e por outro lado, porquanto o seu teor não é vinculativo, competindo ao julgador estabelecer a devida interpretação e valoração de acordo com o seu arbítrio.

Face a todo o exposto, não se vislumbra qualquer erro de julgamento da matéria de facto encontrando-se, por conseguinte, estabilizado o respetivo probatório.


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Vejamos, ora, o erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

Advoga a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na medida em que a liquidação impugnada é legal, porquanto adequada e acertada a desconsideração do método de imputação dos custos gerais às obras isentas de IRC, no exercício de 2004.

Densifica, para o efeito, que foram indevidamente interpretados os normativos 14.º, nº2, 17.º e 23.º do CIRC, visto que a metodologia de repartição dos custos comuns para efeitos de afetação dos mesmos às atividades isentas e não isentas em sede de IRC foi decidida unilateralmente pela Recorrida, carecendo em absoluto de correto enquadramento legal, e inobservância do princípio da permanência do modelo de afetação de custos estabelecido no código do IRC para situações análogas, especificamente, artigo 50.º, nº2, do CIRC.

Conclui, assim, que inversamente ao aduzido na decisão recorrida, a Impugnante, ora Recorrida, procedeu à substituição de um modelo de repartição de custos comuns vigente até 2003, por outro com resultados a nível de tributação fiscal completamente distintos, não tendo sido observados os correspondentes pressupostos legais para a alteração daquele modelo.

Dissente a Recorrida propugnando pela manutenção da decisão recorrida, porquanto estabelecido um correto enquadramento jurídico com a devida transposição para a realidade de facto em apreço.

Sustenta, para o efeito, que possui contabilidade analítica mediante a qual individualiza, em centro de custo específico, cada uma das obras que realiza, os departamentos gerais da sociedade, sendo que é justamente essa organização que proporciona e legitima o apuramento segmentado de cada obra.

Mais advoga que, conforme bem evidenciado na decisão recorrida, em momento algum a AT questiona que a forma de determinação do lucro de cada obra utilizado pela Impugnante em 2004 seja o mais adequado em função da organização contabilística da empresa, da especificidade das obras desenvolvidas na Base das Lajes e para a NATO, e que é, em rigor, o que faz aproximar mais os resultados obtidos com a realidade dos factos.

Sufraga, in fine, que esta alteração no procedimento e critério de repartição dos custos gerais pelo resultado das obras isentas de imposto jamais não poderá consubstanciar uma violação do princípio da consistência ou permanência, na medida em que tal não determina qualquer modificação dos procedimentos contabilísticos ou da política contabilística.

O Tribunal a quo, por seu turno, esteou a procedência apartando a falta de verificação dos pressupostos legais para a adoção da metodologia seguida pela Impugnante, ora Recorrida, e qualquer violação do princípio da consistência.

Neste concreto particular convoque-se, designadamente, a seguinte fundamentação jurídica que sustentou a anulação parcial do ato impugnado:

“No desenvolvimento do sistema da contabilidade de gestão deve haver a preocupação em definir as bases de imputação mais adequadas para relacionar os gastos indiretos com os centros de custo de obras em prol do aumento da fiabilidade da informação. Esta preocupação conduz à utilização de critérios de afetação, baseados numa base de imputação única (apenas uma base de imputação para repartir todos os gastos indiretos) ou múltipla (bases de imputação distintas que traduzem uma relação de causa efeito com os fatores que provocaram o custo). (…)
Como resulta dos autos, e não se mostra controvertido, a Impugnante possui contabilidade analítica que se encontra organizada por centros de custo específicos, onde individualiza cada uma das obras por si desenvolvidas ou realizadas, e ainda os departamentos gerais da sociedade, as suas oficinas, estaleiro, equipamentos, administração, entre outros.
E a divergência entre a A.T. e a Impugnante prende-se tão-só quanto ao facto da Impugnante ter utilizado até ao ano de 2003, um método de imputação de todos os custos gerais a cada uma das obras, suportado exclusivamente na determinação de um quociente apurado pela proporção resultante entre o total dos proveitos e os proveitos de cada obra, ao passo que a partir do exercício de 2004 passou a considerar para aquele método apenas alguns dos centros de custos gerais, tendo procedido à imputação direta dos restantes custos em função de critérios pré-determinados que a Impugnante considera aproximarem os resultados obtidos de uma imagem mais real e fidedigna da situação de cada obra.
E, na realidade, a Inspeção Tributária apenas faz assentar a sua não aceitação quanto ao critério utilizado pela Impugnante em dois fatores essenciais:
1º - caso a Impugnante tivesse continuado a aplicar o método de imputação utilizado até ao exercício de 2003, teria um lucro tributável enquadrado no regime geral de IRC, ou seja, não isento, superior em 807.146,27€;
2º - não se verificar no anexo ao balanço e demonstração de resultados qualquer justificação para a alteração do método, o que era exigível de acordo com os princípios da consistência e da comparabilidade previstos no POC.
Ou seja, na realidade, nunca, em momento algum, a A.T. questiona que a forma de determinação do lucro de cada obra utilizado pela Impugnante em 2004 seja o mais adequado em função da organização contabilística da empresa, da especificidade das obras desenvolvidas na Base das Lajes e para a NATO, e que é o que mais faz aproximar os resultados obtidos com a realidade. (…)
fica claro não fazer qualquer sentido fazer imputar os custos considerados nestes centros de custos gerais, respeitantes a estes departamentos centrais, no apuramento do lucro das obras desenvolvidas na Base das Lajes, porquanto tal atuação desvirtua de forma manifesta e ostensiva a realidade contabilística e fiscal, ocorrendo uma evidente transferência de resultados entre obras isentas e não isentas, precisamente o que a lei pretende evitar. (…)
No que concerne à invocação pela A.T. do princípio da consistência há que referir (…) estando-se perante operações unicamente com reflexo a nível fiscal, em nada alterando a política contabilística da Impugnante, na medida em que não resulta ter sido alterado o critério de lançamento de custos na contabilidade analítica, não se provocando a alteração do seu resultado líquido, não se pode concluir pela violação daquele princípio contabilístico vertido no POC. (…)
Por tudo o que antes se referiu, tendo em conta as razões invocada pela A.T. para a alteração do lucro tributável das obras não isentas de IRC, é de concluir assistir razão à Impugnante na ilegitimidade da A.T. para proceder à alteração do modo de imputação dos custos às obras isentas, o que conduz à ilegalidade dessas correções por erro sobre os pressupostos de facto e de direito.”

Importa, desde já, relevar que não se vislumbra que o entendimento do Tribunal a quo mereça qualquer censura, visto que interpretou corretamente o quadro normativo vigente e aplicou-o com adequação ao recorte fático dos autos.

Senão vejamos.

Comecemos por atentar no regime jurídico aplicável ao caso vertente.

Importa, desde logo, convocar o consignado no artigo XI, nº 1, do Anexo I do Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os Estados Unidos, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 38/95 e ratificado pelo Decreto do Presidente da República nº 72/95, de 11 de outubro, publicado no Diário da República I Série-A, nº 235 de 11 de outubro de 1995, o qual estatuía que:

“Ficam isentos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) e da derrama os contratantes e subcontratantes nacionais ou estrangeiros relativamente aos lucros derivados das obras e trabalhos respeitantes às instalações concedidas”.

De chamar à colação, outrossim, o consignado no artigo 14º, nº 2, do CIRC, segundo o qual “estão ainda isentos de IRC os empreiteiros ou arrematantes, nacionais ou estrangeiros, relativamente aos lucros derivados de obras e trabalhos das infraestruturas comuns NATO a realizar em território português, de harmonia com o Decreto-Lei n.º 41 561, de 17 de março de 1958”.

Ora, do cotejo dos normativos transcritos resulta, desde logo, que se encontra consignado um regime de isenção de IRC, relativamente aos sujeitos passivos que desenvolvam obras e trabalhos executados nas instalações concedidas na Base das Lajes e nas infraestruturas NATO e quanto aos lucros derivados dessas obras e trabalhos.

Neste concreto particular, há que ter presente, outrossim, o consignado no artigo 17.º do CIRC, do qual dimana que:

“1 - O lucro tributável das pessoas coletivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do nº 1 do artigo 3º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, os excedentes líquidos das cooperativas consideram-se como resultado líquido do exercício.
3 - De modo a permitir o apuramento referido no nº 1, a contabilidade deve:
a) Estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo sector de atividade, sem prejuízo da observância das disposições previstas neste Código;
b) Refletir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo e ser organizada de modo que os resultados das operações e variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC possam claramente distinguir-se dos das restantes.”

O que significa, portanto, que em regra, todos os custos contraídos por um sujeito passivo serão relevados negativamente na determinação do seu lucro tributável, conforme dimana, expressamente, do artigo 17.º, nº1, do CIRC. De resto, por imperativo constitucional, estatuído no artigo 104.º, n.º 2 da CRP, a tributação das empresas deve incidir sobre o rendimento real.

Contudo, conforme resulta da letra do artigo 23.º do CIRC, o legislador não estabeleceu uma correspondência absoluta entre os custos contabilísticos e os custos fiscais, porquanto só devem relevar negativamente no apuramento do lucro tributável os custos ou perdas que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, estando, por seu turno, vedadas à AT atuações que coloquem em causa o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo (2-Neste sentido, vide, designadamente, os Acórdão do STA, proferidos nos processos 0627/16, 1236/05, datados de 28.06.2017 e de 29.03.2006, respetivamente.).

Visto o direito que releva para o caso vertente, regressemos, então, ao caso dos autos.

Para o efeito importa, desde já, convocar quais as razões atinentes à desconsideração do método de imputação de custos, atentando, naturalmente, na fundamentação constante do respetivo Relatório de Inspeção Tributária.

Ora, perscrutando a fundamentação contemporânea do ato, verifica-se que a AT mediante constatação da outorga por parte da Recorrida com o Governo dos EUA, de diversos contratos de empreitada, tendo por objeto a execução de obras e trabalhos de construção civil na Base das Lajes na Ilha Terceira, Açores, enquadrou a questão no artigo 14.º, nº2, do CIRC e concluiu que os lucros obtidos nessas obras se encontrariam isentos de IRC.

Dissentiu, no entanto, quanto ao critério de imputação de custos adotado pela Recorrida relativamente ao exercício de 2004, porquanto, por um lado, inexiste qualquer justificação no anexo ao balanço e demonstração de resultados para a alteração do método adotado até esse exercício, sendo que a manutenção do método lograria matéria coletável superior e por outro lado, porque desrespeita o princípio contabilístico da consistência.

Conclui, mediante comparação com o exercício de 2003, que a manutenção do procedimento acarretaria uma matéria coletável sujeita ao regime geral superior em €810.974,70, inferência essa que fundou a correspondente correção técnica ao abrigo do artigo 23.º do CIRC.

Ora, tendo presente a fundamentação expendida anteriormente, o respetivo quadro normativo e estabelecendo-se a devida transposição para o acervo fáctico dos autos, há que secundar o entendimento propugnado pelo Tribunal a quo.

Senão vejamos.

Do probatório resulta que a Recorrida, tem por objeto a execução de trabalhos de construção civil e obras públicas e que nesse âmbito executa trabalhos, na Base Aérea das Lajes, na Ilha Terceira, nos Açores, para o estado norte-americano, bem como trabalhos de construção civil em infraestruturas comuns da Nato localizadas em território português.

E que, em concreto, no exercício de 2004, executou os seguintes trabalhos de construção nas instalações militares concedidas pelo Estado Português na Base das Lajes, nos Açores e para instalações da Nato:

Obra nº 2910 - WTP Operation, na Base das Lajes;

Obra nº 0111- Replace Military Family Housing - Phase I, na Base das Lajes;

Obra nº 0210- Replace Military Family Housing - Phase II, na Base das Lajes;

Obra nº 0221- Tank Repairs - Tanks 1642 and 1643, na Base das Lajes;

Obra nº 230 - Jet Fuel Pipeline at Porto Santo Airfield, nas infra-estruturas NATO;

Obra nº 0322 - Dental Clinic Replacement, na Base das Lajes;

Obra nº 405 - Reparação de Emergência do Passadiço no Depósito POL, nas infraestruturas NATO;

Obra nº 417 - Emergency Repairs to Breakwater, na Base das Lajes;

Obra nº 419 - Additions and Alterations to Fitness Center T-333, na Base das Lajes;

Obra nº 433 - Additions and Alterations to Fitness Center T-333 - Phase II, na Base

das Lajes.

Para o efeito, e justamente nesse exercício, dispunha de escritório e estaleiro junto da Base das Lajes, na ilha Terceira, nos Açores, espaço concedido pelo governo norte-americano, com uma equipa composta por seis ou sete colaboradores a trabalhar em exclusivo e de modo permanente para as obras aí desenvolvidas, nas quais utilizavam materiais específicos que se encontravam guardados no armazém local, e equipamentos próprios e afetos exclusivamente àquelas obras, a par de outros da sua estrutura central.

Sendo que, em termos de meandros operacionais e diretrizes de atuação e controlo, resultou provado que a Direção de Produção da Impugnante estimava, anualmente, o valor dos custos a suportar com os seus equipamentos (centros de custos 7100 a 7400), tendo em conta a sua manutenção, seguros e desgaste ou amortização, fracionando-o depois por 365 dias, apurando um valor diário que corresponderá à imputação direta a cada obra em função do número de dias que cada uma delas utilize o equipamento na sequência da solicitação da Direção de Obra ao Estaleiro Central.

E no que concerne aos trabalhos executados pelo estaleiro central, oficina mecânica e carpintaria, os mesmos seriam imputados a cada uma obras, em função do custo dos materiais utilizados acrescido de uma percentagem de 15%, correspondente aos custos de armazenagem, e em função do custo da mão-de-obra utilizada aferido com base nas horas despendidas registadas em folhas de horas.

Promanou, no entanto, enquanto realidade assente que a sala de desenho da estrutura central nunca executou trabalhou para as obras da Base das Lajes ou foi por estas aproveitada, e bem assim que a estrutura da Base das Lajes não utilizava os serviços do departamento central de estudos, orçamentos e concursos.

O mesmo sucedia com os serviços de aprovisionamento e transporte da estrutura central da Impugnante, porquanto os materiais eram adquiridos pela estrutura da Base das Lajes de forma direta e principalmente nos Estados Unidos ou localmente, atenta a especificidade dos materiais e equipamentos necessários e o facto de estes serem transportados por navios militares americanos ou por embarcações contratadas pelo governo americano.

Dimanando, igualmente, assente que a Estrutura da Baje das Lajes da Impugnante nunca recorreu ao departamento geral de Gestão da Qualidade, nem ao departamento jurídico central, realidade concatenada e justificada com as especificidades e exigências constantes dos contratos celebrados com o Governo Norte-Americano.

No concreto particular dos procedimentos atinentes à organização contabilística e com relevância para a questão decidenda, resultou provado que a Impugnante dispõe de contabilidade analítica na qual divide as obras desenvolvidas por centros de custo nos quais procede à imputação de todos os custos que diretamente digam respeito a cada uma das obras.

Procedendo, igualmente, à destrinça dos custos gerais por centros de custos – centros de custos nº 6300 a 9700, sendo que até ao exercício de 2003 procedeu à imputação desses custos gerais por cada obra de forma proporcional, aplicando o coeficiente resultante da divisão entre o total dos custos gerais e o total dos proveitos gerados por cada obra.

Enquanto que a partir do exercício de 2004, alterou o aludido procedimento passando a imputar, proporcionalmente, os custos gerais por cada obra apenas com referência aos centros de custos 8070 (Higiene e Segurança), 8500 (Setor Administrativo) e 9200 (Administração), em ordem às diretrizes organizacionais e de controlo que desenvolveu, porquanto aquiesceu ser possível, quanto aos restantes centros de custos gerais, proceder à imputação a cada obra em particular dos custos com relação direta e inequívoca a cada obra, com base no critério de utilização efetiva.

Ora, face ao recorte probatório sintetizado supra, e tendo presente, outrossim, que nada foi sindicado quanto à qualidade da informação contabilística, e quanto aos elementos transmitidos pela mesma, nenhuma ilegalidade pode ser apontada à disciplina adotada pela Recorrida.

Expliquemos, então, porque assim o entendemos.

Ab initio, há desde logo, que ter presente que a AT não sindica os valores concretamente apurados pela Impugnante, ora Recorrida, na medida em que não corporiza qualquer elenco que os permita segmentar ou deslocalizar do respetivo centro de custos. Com efeito, e como decorre inequivocamente da fundamentação jurídica que apoia as correções em contenda, a AT limita-se a advogar que a Recorrida procedeu à alteração da metodologia adotada no exercício de 2003, a qual granjeia a obtenção de uma matéria coletável superior, e que tal alteração colide com o princípio da consistência.

Sendo que, como veremos, o supra expendido não legitima a correção realizada, quer em termos de pressupostos de facto, quer em termos de pressupostos de direito.

E isto porque, conforme demos nota anteriormente, a letra da lei, mormente, o convocado artigo 17.º do CIRC apenas impõe que a contabilidade das sociedades esteja organizada de forma a refletir e a distinguir todas as operações por si efetuadas.

O que significa que, em matéria de apuramento de resultados de operações sujeitas e não isentas de imposto, o que importa é que seja possível percecionar, de forma absolutamente fidedigna, a expressão concreta a alocar e a imputar a esses custos.

Não podendo, assim, lograr mérito o expendido pela Recorrente no sentido de que, em regra, em situações como a do contorno dos autos, o critério adotado pela AT tem sido a imputação dos custos gerais proporcionalmente a todos os centros de custos diretos, e isto porque nada a vincula normativamente a isso. Aliás, tanto assim é, que o normativo que foi convocado para fundamentar a correção foi o artigo 23.º do CIRC, e o mesmo nada permite extrair nesse âmbito.

Note-se que, no caso vertente, e conforme supra expendido, a par da contabilidade financeira, a Recorrida possui contabilidade analítica, devidamente organizada, a qual permite individualizar, em centro de custo específico, cada uma das obras que realiza, os departamentos gerais da sociedade proporcionando, por conseguinte, a total perceção, validação e adjunção sistemática de todos os proveitos e custos de cada obra, no final do exercício, e apurar o resultado de cada uma das obras que executa.

Conforme é consabido, a contabilidade analítica permite identificar, de uma forma clara e minuciosa, a origem dos proveitos e o destino dos encargos suportados pela empresa. Daí que, a mesma seja entendida como um processo de tratamento de dados cujos objetivos são, fundamentalmente, apreender os custos das diferentes funções desempenhadas pela empresa, delimitar as bases de avaliação de determinados elementos do balanço da empresa e explanar os resultados, mensurando os custos dos produtos e dos serviços, para os comparar com os preços de venda respetivos e, bem assim estabelecer previsões para os custos e para os proveitos correntes, aferir a sua realização e justificar quaisquer desvios daí advenientes.

Como doutrina Nuno Renato Meireles Matos de Sousa (3-A Contabilidade Analítica como Instrumento de Gestão ao Nível das Autarquias Locais; Universidade Portucalense, páginas 36, disponível em https://rdpc.uevora.pt/handle/10174/15655) “a Contabilidade Analítica, ao contrário da Contabilidade Geral, está direccionada para o interior da empresa e a sua função consiste em realizar o tratamento dos processos de transformação internos, descrevendo, em termos monetários, os fluxos internos que dizem respeito às diferentes etapas e aos diferentes processos através dos quais a empresa propõe bens ou serviços aos seus clientes.”

Mais esclarecendo que a “[c]ontabilidade Analítica, por oposição à Contabilidade Geral, é uma contabilidade do pormenor uma vez que procura dividir a empresa num determinado número de unidades de gestão integrados no sistema mais amplo que é a empresa. Assim, a Contabilidade Analítica permite responder a um conjunto de questões, para as quais a Contabilidade Geral não tem capacidade de resposta, reclassificando por destino os proveitos e os custos classificados por natureza pela Contabilidade Geral. A Contabilidade Analítica permite um conhecimento pormenorizado ao realizar análises por produtos, por serviços, por funções, por centros de actividade ou de responsabilidade, por operações, ou por qualquer outro objecto. Neste sentido, a Contabilidade Analítica responde a questões do tipo: Quem consome o quê e quanto? Quem produz o quê e quanto? Que produtos ou famílias de produtos são rentáveis? Que centros de actividade ou de responsabilidade são eficientes? Que clientes são mais vantajosos para a empresa? Quem são os vendedores com melhor desempenho? Quais são as zonas geográficas mais favoráveis para a empresa? Etc. (4-In ob. Cit, página 37.)

Por outro lado, há que referenciar que o método adotado pela Recorrida se encontra inclusive em conformidade com o estabelecido na Norma Internacional de Contabilidade (NIC) nº 11, publicada no J.O.C.E. de 13 de outubro de 2003, cujo objetivo era o de prescrever o tratamento contabilístico de réditos e custos associados a contratos de construção, conforme resulta, expressamente, do seu preâmbulo.

Com efeito, preceituava a aludida NIC, relativamente aos custos do contrato que os mesmos devem compreender “(a) os custos que se relacionem diretamente com o contrato específico; (b) os custos que sejam atribuíveis à atividade do contrato em geral e possam ser imputados ao contrato; e (c) outros custos que sejam especificamente debitáveis ao cliente nos termos do contrato.”

Densificando depois no ponto 17 que, os custos que diretamente se relacionem com um contrato específico “incluem: (a) custos de mão-de-obra local, incluindo supervisão local; (b) os custos de materiais usados na construção; (c) a depreciação de activos fixos tangíveis utilizados no contrato; (d) os custos de movimentar os activos fixos tangíveis e os materiais para e do local do contrato; (e) os custos de alugar instalações e equipamentos; (f) os custos de concepção e de assistência técnica que estejam directamente relacionados com o contrato; (g) os custos estimados de rectificar e garantir os trabalhos, incluindo os custos esperados de garantia; e (h) reivindicações de terceiras partes.”

E no ponto 18, que “compreendem-se nos custos que podem ser atribuíveis à actividade do contrato em geral e que podem ser imputados a contratos específicos: (a) seguros; (b) os custos de concepção e assistência técnica que não estejam directamente relacionados com um contrato específico; e (c) gastos gerais de construção. Tais custos são imputados usando métodos que sejam sistemáticos e racionais e sejam aplicados consistentemente a todos os custos que tenham características semelhantes. A imputação é baseada no nível normal de actividade de construção.”

Sendo, ainda, de relevar que, entretanto, foram consagrados na Norma Contabilística e de Relato Financeiro 19, constando inclusive do seu prólogo que “[e]sta Norma Contabilística e de Relato Financeiro tem por base a Norma Internacional de Contabilidade IAS 11 — Contratos de Construção, adoptada pelo texto original do Regulamento (CE) n.º 1126/2008 da Comissão, de 3 de Novembro.”

E por assim ser, inexistindo, como visto, qualquer exigência legal que vincule a Recorrida a proceder a imputação nos moldes preconizados pela AT, quando reitere-se e sublinhe-se a mesma nunca sindica os elementos apurados, a realidade fática que está na génese, e os resultados concretamente alocados, e a sua fiabilidade, limitando-se a sindicar uma alteração da metodologia adotada face ao exercício de 2003, a qual, como visto, se encontra inteiramente justificada e fundada em razões objetivas, e inclusive ancorada em NIC, ter-se-á de validar e secundar o entendimento propugnado na decisão recorrida.

Note-se, ademais, que a concreta subsunção normativa no artigo 23.º do CIRC à luz da fundamentação constante no Relatório de Inspeção Tributária não a permite, de todo, fundar. Aliás, sempre se dirá que, com as premissas de facto nele constantes, o juízo atinente à alteração do método de imputação propugnado pela AT, no sentido de implementar a distribuição equitativa de todos os custos gerais pelas obras isentas de imposto, poderia isso sim, e sem mais, acarretar uma violação do próprio regime consignado no artigo 23.º do CIRC, na medida em que impunha, para efeitos de apuramento do lucro isento de imposto, que fossem ponderados e levados em consideração custos sem relação causal com a concreta atividade desenvolvida nas obras que beneficiam de isenção, subvertendo, inclusive, a liberdade e autonomia de gestão da Recorrida.

Ademais, é a própria AT no seu Relatório Inspetivo a considerar que o procedimento de registo, contabilização e imputação de custos terá de observar o seguinte:

“- sejam contabilizados os custos e proveitos que directamente dizem respeito a essas obras (centros de custos);

- relativamente aos custos comuns para os quais não é possível efectuar uma imputação específica, o contribuinte deverá definir os critérios de repartição.

Refere ainda o POC que a informação proporcionada pelas demonstrações financeiras deverá ser comparável, ou seja, a divulgação e quantificação dos efeitos financeiros de operações e de outros acontecimentos devem ser registadas de forma consistente pela empresa e durante a sua vida, para identificarem tendências na sua posição financeira e nos resultados das suas operações.”

Ora, todo esse procedimento de registo contabilístico, estabelecimento de imputação específica e definição dos competentes critérios de repartição, foi inteiramente adotado no caso vertente proporcionando, por seu turno, as demonstrações financeiras informação fidedigna e comparável.

Dimana, assim, do recorte probatório dos autos -não impugnado- que a atuação da Recorrida se mostra em conformidade com a lei, tendo uma lógica racional e operacional, devidamente justificada, documentada de forma idónea, não podendo, por conseguinte, a correção fundar-se numa alegada violação do artigo 23.º do CIRC.

Uma nota final neste conspecto para evidenciar que, a alegada convocação da situação análoga constante do artigo 50.º do CIRC, não produz, de todo, os efeitos almejados pela Recorrente, não só porque não integra a fundamentação constante no Relatório de Inspeção Tributária, mas, igualmente, porque em nada traduz a configuração de direito e a interpretação jurídica que resulta da letra do aludido normativo, bem pelo contrário validando a metodologia e procedimento de imputação perfilhado pela Recorrida.

Mais importa relevar que não logra, outrossim, provimento a alegada preterição do princípio da consistência, por um lado, porque inexistiu qualquer violação no domínio contabilístico, porquanto as realidades em contenda são materializadas extra-contabilisticamente, e por outro lado, porque o mesmo não pode ser interpretado de forma estanque e sem que seja admitida qualquer alteração nos meandros e diretrizes de atuação da empresa.

Senão vejamos.

Com efeito, aos centros de custo de cada obra ocorreu a imputação de todos os custos diretamente respeitantes a cada uma das obras, entre estes, o débito do valor monetário por cada dia de utilização efetiva dos equipamentos, conducente à concreta alocação a cada obra dos respetivos custos de manutenção e amortização na medida da sua particular utilização e por obra, e o débito dos custos de materiais e mão-de-obra afetos às suas oficinas e estaleiro, mas utilizados no desenvolvimento de trabalhos específicos para a obra. Por seu turno, e em operação extra-contabilística, foram imputados os centros de custo de cada obra isenta de imposto, por repartição proporcional, os custos gerais com relação direta e inequívoca a cada obra, e com base num critério de utilização efetiva.

O que significa, portanto, que a organização da contabilidade da Recorrida não sofreu, nos exercícios de 2003 e 2004 qualquer alteração.

Destarte, o supra expendido em nada pode determinar qualquer modificação dos procedimentos contabilísticos ou da política contabilística, e naturalmente traduzir qualquer violação do princípio da consistência.

Note-se, ademais, que o aludido princípio contabilístico tem apenas como desiderato garantir a comparação da informação financeira entre diferentes períodos, daí que se estabeleça, como regra, que não se devem alterar as políticas contabilísticas empresarias de forma discricionária, fazendo-o apenas quando existam circunstâncias que o justificam, devendo explicitar-se as alterações resultantes desta alteração e sempre que possível quantificá-las (5-Vide, designadamente, Guilhermina Freitas, SNC Estrutura Conceptual, FOTOC, página 54.).

Ou seja, não é estipulado uma imutabilidade da informação financeira entre diferentes exercícios, podendo, naturalmente, existir alterações desde que não sejam arbitrárias e discricionárias, ou seja, que estejam, devidamente, patenteadas, justificadas de forma racional, e objetiva e assentes na operacionalidade e gestão da empresa, como in casu.

Aliás, admitir-se que não pudesse existir uma alteração com essa amplitude, tal levaria a que a AT se intrometesse nas medidas de gestão e operacionalidade da empresa, o que, como é consabido se encontra, efetivamente, apartado do nosso modelo de determinação do lucro tributável e concreta assunção da dedutibilidade dos custos fiscais.

Por último, importa ter presente que o nosso CIRC acolheu o modelo de dependência parcial -que não total-entre a fiscalidade e a contabilidade para efeitos de apuramento do lucro tributável [vide, designadamente, Acórdãos do STA, proferidos nos processos nºs 01278/12, de 09.10.2019, e 963/13, de 04.11.2015].

Face a todo o supra expendido, ter-se-á de concluir que sendo realidade fáctica assente que os procedimentos contabilísticos e elementos de suporte se subsumem no citado artigo 17.º, do CIRC, mormente, o seu nº2, alínea b), e que, nessa conformidade, a Recorrida apurou os resultados das obras isentas de imposto com base nesses mesmos elementos e suportes, cumprindo o regime constante no artigo 23.º do CIRC, a correção realizada padece de vício de violação de lei por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, devendo, por isso, ser cominada com a anulabilidade.

Destarte, a sentença que assim o decidiu não merece qualquer censura, resultando prejudicada a apreciação da ampliação do objeto do recurso.

***
IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em: NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
Registe. Notifique.

Lisboa, 24 de abril de 2024

(Patrícia Manuel Pires)

(Vital Lopes)

(Ângela Cristina da Silva Cerdeira)