Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1977/23.3BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:05/09/2024
Relator:JOANA MATOS LOPES COSTA E NORA
Descritores:CONTRADITÓRIO
DESENTRANHAMENTO
INFORMAÇÃO SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
AGENDAMENTO NO PORTAL ARI
Sumário:I - Violam o princípio do contraditório os despachos que determinam o desentranhamento e a consideração como não escrito de requerimentos de pronúncia sobre os factos alegados na resposta da entidade demandada, tendo tais requerimentos sido apresentados na sequência de despacho a determinar a notificação dos requerentes para que, “no exercício do contraditório”, se pronunciassem sobre o alegado na resposta da entidade demandada.
II - Nem a pronúncia da entidade demandada no sentido em que os recorrentes devem «aguardar a notificação / abertura de vagas no Portal ARI» e continuar a encetar esforços no sentido de efectuar o agendamento, nem a informação de que só após a entrega do pedido de ARI e da documentação legalmente exigida no local de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é que se procede à recolha de dados biométricos que servirão para a (eventual) emissão do título ARI, e de que os agendamentos são feitos através do Portal ARI, segundo a disponibilidade de vagas que vão sendo publicitadas (mas que se encontram, actualmente, esgotadas, desconhecendo-se quando haverá mais vagas), dão resposta ao pedido de informação sobre o andamento de um concreto procedimento administrativo para concessão de autorização de residência.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção COMUM
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

Acordam, em conferência, os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul:


I – RELATÓRIO

P…, titular do passaporte n.º U…, emitido pela República da Turquia, em 10.07.2020 e válido até 10.07.2030, e NIF n.º 3…, L…, titular do Passaporte n.º U…, emitido pelas autoridades competentes da República da Turquia, em 10.07.2020, válido até 10.07.2030, e A…, titular do passaporte n.º U…, emitido pelas autoridades competentes da República da Turquia em 26.11.2021, válido até 26.11.2026, todos residentes em Dominica, intentaram intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, contra o Ministério da Administração Interna. Pedem a condenação da entidade demandada a “(…) relativamente à candidatura dos Requerentes ao Programa ARI e respetivo pedido de reagrupamento familiar que corre termos com o n.º 02636/ARI/094/20, prestar, num prazo não superior a 10 (dez) dias, as seguintes informações/esclarecimentos: a) Ponto de situação sobre o andamento do seu processo; b) Estimativa de quando estimam proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos; c) Eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir; d) Outras informações relevantes para que os Requerentes possam ter a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo.” Alegam, para tanto e em síntese, que: (i) O requerente P… é um cidadão de nacionalidade turca a residir em Dominica há, pelo menos, 4 anos e, por reunir os necessários requisitos previstos na legislação aplicável, iniciou, em 29.09.2020, na plataforma dos serviços do SEF (http://ari.sef.pt) um pedido de autorização para actividade de investimento, tendo instruído a sua candidatura com todos os documentos exigidos e pago a taxa de análise, pelo que o processo passou a correr termos sob o n.º 02636/ARI/094/20; (ii) Volvidos que estão mais de 13 meses sobre a data em que, por facto que não lhes é imputável, não puderam comparecer no SEF em Lisboa para a realização e recolha dos seus dados biométricos, os requerentes endereçaram à entidade demandada um pedido de informação, ao abrigo do artigo 82.º do Código do Procedimento Administrativo, para prestar informações sobre o andamento do seu processo, nomeadamente, “para quando estimam proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos, quaisquer eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir, e outras informações relevantes para que a interessado possa ter a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo”; (iii) Em 28.03.2023, a entidade demandada respondeu-lhe, dizendo tão somente “Deverá aguardar a notificação / abertura de vagas no Portal ARI.”; (iv) Os requerentes, inconformados com tal resposta, em 27.04.2023, enviaram à entidade demandada email a dar conta de que não haviam sido facultadas as informações concretamente solicitadas, mas não obtiveram qualquer reposta e, em 30.05.2023, reiteraram o pedido de informação, enviando novo email, mais uma vez não tendo obtido qualquer resposta; (v) A omissão de resposta da entidade demandada consubstancia denegação do direito à informação do requerente.
A entidade demandada apresentou resposta, alegando, em síntese, que o requerente efetuou pré-registo online obrigatório no Portal ARI, relativo a pedido de concessão de autorização de residência para actividade de investimento, não tendo comparecido no SEF nas datas agendadas, pelo que deve continuar a encetar esforços no sentido de efectuar o agendamento através do Portal ARI, mediante a disponibilidade de vagas que vão sendo publicitadas, não conseguindo a entidade demandada, dado o volume de pedidos de emissão de títulos de residência, garantir uma resposta mais célere.
Pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa foi proferida sentença a determinar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, tendo a mesma sido antecedida da prolação de dois despachos: um a determinar o desentranhamento do requerimento apresentado pelos requerentes em 10.07.2023 e outro a determinar que se considerem não escritos os artigos 7º a 33º do requerimento apresentado pelos requerentes em 14.07.2023, por, em ambos os requerimentos, os requerentes se terem pronunciado sobre os factos alegados na resposta.
Os autores interpuseram o presente recurso de apelação, cujas alegações contêm as seguintes conclusões:
“1) A douta sentença recorrida deve ter-se por nula porquanto violou o princípio do contraditório e da igualdade das partes ao ordenar o desentranhamento da réplica/ resposta apresentada pelos Recorrentes a fls 98-111 dos autos em paginação eletrónica, bem como, a dar por não escritos os artigos 7.º a 33.º do requerimento dos Recorrentes a fls 117-124 dos autos em paginação eletrónica.
Senão veja-se,
2) Dispõe o artigo 107.º nºs 1 e 2 do CPTA, quanto à tramitação do processo judicial intimação para prestação de informações que “1. Apresentando o requerimento, o juiz ordena a citação da autoridade requerida para responder no prazo de dez dias. 2. Apresentada a resposta ou decorrido o respectivo prazo e concluídas as diligências que se mostrem necessárias, o juiz profere decisão”.
3) O citado preceito legal não refere expressamente que a resposta da Recorrida seja notificada aos Recorrentes, mas tal notificação não será despicienda se atendermos ao princípio do contraditório assegurado pelo artigo 3º, nº 3 do CPC, aplicável ex vi pelo artigo 1.º do CPTA, bem como, o princípio da igualdade das partes previsto no artigo 3º-A do CPC.
4) Com efeito, dispõe o artigo 3º, n.º 3 do CPC que “3. O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”, atento o conteúdo da resposta da autoridade requerida apresentada nos autos, impunha-se que fosse observado o disposto em tal preceito legal, assegurando-se o principio do contraditório e da igualdade das partes, bem como o da proibição de decisão surpresa.
5) O SEF ao responder que o processo só se inicia com a entrega presencial no SEF para entrega dos documentos e realização da recolha dos dados biométricos invoca factos suscetíveis de extinguir a pretensão dos Recorrentes, factos esses que impunham a competente resposta, mas que o tribunal a quo decidiu não considerar por entender que os mesmos extravasavam o âmbito da réplica e o âmbito da pronúncia sobre a inutilidade superveniente da lide.
6) No entanto, o momento em que se inicia o procedimento vem expressamente mencionado na decisão que ora se recorre, influindo-a, e, por conseguinte, ao decidir como decidiu o tribunal a quo não assegurou a efetivação dos princípios consagrados nos artigos 3º., nº 3 e 3ºA do CPC.
7) Aos Recorrentes deveria, assim, ter sido dada a oportunidade de exporem as suas razões em desabono da matéria alegada na resposta sobre o início do procedimento de ARI, matéria que, conforme supra se expôs, se apresenta com manifesta natureza de defesa por exceção, contribuindo assim para um debate mais aprofundado, antes de o tribunal tomar decisão.
8) E a tal não obsta a natureza urgente do processo de intimação judicial, a qual se encontra estabelecida, em grande parte, em favor daquele que lança mão do processo judicial, pois a efetiva realização do direito e a eficácia do meio judicial respetivo não sairiam prejudicadas com a observância da formalidade preterida, pois se “a prontidão na administração da justiça reclama celeridade, a preocupação primordial no processo deve ser fazer justiça.” (neste sentido Ac. STA, de 03.12.03, in Rec. 1744/03, disponível em www.dgsi.pt).
9) Face a todo o exposto, com o desentranhamento do requerimento a fls 98-111 dos autos em paginação eletrónica e a factualidade dada por não escrita no requerimento a fls. 117- 124 dos autos em paginação eletrónica, o Tribunal a quo violou o princípio do contraditório e o princípio da igualdade das partes, plasmados nos artigos 3.º, nº 3 e 3.º-A do CPC, incluindo-se tal violação na cláusula geral sobre nulidades processuais constante do artigo 201.º, nº 1 do CPC, e, podendo tal violação influir no exame e decisão da causa, a sua verificação determina a procedência da nulidade que ora se argui.
Caso assim não se entenda o que não se concede, sempre se dirá que,
10) A decisão recorrida é manifestamente contrária à lei, tendo o Tribunal recorrido feito uma errada interpretação sobre matéria de direito, colocando em causa diversas normas jurídicas que, dessa forma violou, concretamente, o que se julga disposto no artigo 277.º do CPC, no artigo 268.º, n.ºs 1 e 2 da Lei Fundamental e no artigo 82.º do CPA.
Senão veja-se,
11) Refere a douta decisão de que ora se recorre que tendo em conta o regime previsto no Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 05/11, que veio regulamentar a Lei 23/2007, de 04/07, bem como o teor do respetivo Manual de Procedimentos, previsto no artigo 65.º-J do aludido decreto regulamentar, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras dispõe de um sistema específico de receção dos requerimentos iniciais relativos aos procedimentos previstos na Lei n.º 23/2007, de 04/07 e no decreto que a regulamentou, aplicável, no que ora interessa, aos pedidos de ARI, que pressupõe, antes do interessado poder dar início ao seu procedimento e apresentar a sua pretensão junto da Administração, um prévio agendamento junto dos serviços para essa finalidade, a ser efetuado através de uma plataforma on-line, a qual vai indicando aos interessados quais os postos de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e as respetivas disponibilidades (dia/hora).
12) No entanto, ao contrário do que resulta da decisão ora em crise, o pedido de agendamento para realização da recolha dos dados biométricos é sempre feito a convite da Entidade Demandada e após formalização do seu pedido na plataforma ARI.
13) De acordo com o artigo 81.º da Lei 23/2007, de 4 de julho, “o pedido de autorização de residência pode ser formulado pelo interessado ou pelo representante legal e deve ser apresentado junto do SEF”.
14) Por sua vez, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 51.º do Decreto-Lei 84/2007, de 5 de novembro, “o pedido de concessão e de renovação de autorização de residência ou de cartão azul UE é formulado em impresso próprio e assinado pelo requerente e pelo seu representante legal e pode ser apresentado em qualquer direção ou delegação regional do SEF, que o pode remeter, após instrução e decisão, para a direção ou delegação regional da área da residência do requerente”.
15) Diz-nos também o n.º 9 do citado artigo 51.º do Decreto-Lei 84/2007 que os pedidos de renovação de autorização de residência e de concessão de autorização de residência podem ser apresentados através da plataforma eletrónica sendo dispensada a entrega de documentos e recolha de dados biométricos já integrados no fluxo de trabalho eletrónico do SEF, sem prejuízo de poder ser solicitada a sua exibição no momento da deslocação ao SEF”. (negrito e sublinhado nosso)
16) Note-se que o requerimento para obtenção de autorização de residência para atividade de investimento inicia-se e conclui-se quase integralmente online, uma vez que os Recorrentes estão obrigados a juntar toda a documentação necessária para apreciação do seu pedido. (vide Doc. 2 junto com a Petição Inicial)
17) E atento o teor do Manual de Procedimentos relativo à Autorização de Residência para Atividade de Investimento, o qual foi objeto de aprovação pelo membro do Governo responsável pela pasta da Administração Interna, resulta expressamente do ponto 1.1.2. que “os comprovativos da realização de investimento devem ser apresentados no momento da apresentação do pedido de ARI. (negrito e sublinhado nosso)
18) É assim evidente que o pedido de autorização de residência para atividade de investimento é apresentado via eletrónica, constituindo a exibição e entrega dos documentos já submetidos na plataforma online e a recolha dos dados biométricos um mero procedimento de finalização do pedido, o qual ocorre em momento posterior à efetiva submissão do pedido.
19) Salienta-se ainda que dispõe o n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil (CC) sob a epígrafe “Interpretação da lei” que “a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborado e as condições específicas do tempo em que é aplicada. (sublinhado nosso)
20) Nesta medida, atento o facto de inexistir, na legislação que regula a autorização de residência para atividade de investimento em Portugal, qualquer definição expressa relativamente ao momento em que se deve considerar formalizado ou efetivamente submetido o “pedido” de autorização de residência, a concretização desse elemento essencial à correta interpretação da lei deverá seguir o preceituado no artigo 9.º do CC.
21) Neste sentido, refere o douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29.11.2011, proferido no processo n.º 0701/10 (disponível em www.dgsi.pt), que: “Interpretar a lei é atribuir-lhe um significado, determinar o seu sentido a fim de se entender a sua correcta aplicação a um caso concreto. A interpretação jurídica realiza-se através de elementos, meios, factores ou critérios que devem utilizar-se harmónica e não isoladamente. O primeiro são as palavras em que a lei se expressa (elemento literal); os outros a que seguidamente se recorre, constituem os elementos, geralmente, denominados lógicos (histórico, racional e teleológico). (…). Estes elementos lógicos agrupam-se em três categorias: a) elemento histórico que atende à história da lei (trabalhos preparatórios, elementos do preâmbulo ou relatório da lei e occasio legis [circunstâncias sociais ou políticas e económicas em que a lei foi elaborada]; b) o elemento sistemático que indica que as leis se interpretam umas pelas outras porque a ordem jurídica forma um sistema e a norma deve ser tomada como parte de um todo, parte do sistema; c) elemento racional ou teleológico que leva a atender-se ao fim ou objectivo que a norma visa realizar, qual foi a sua razão de ser (ratio legis).” (negrito e sublinhado nosso)
22) O Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de novembro, na sua versão introduzida pelo Decreto Regulamentar 4/2022, de 30 de setembro, refere que este regulamento do regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território nacional “assenta numa opção realista e equilibrada: favorecer a imigração legal, desincentivar e contrariar a imigração ilegal, combater a burocracia, tirar partido das novas tecnologias para simplificar e acelerar os procedimentos, inovar soluções”. (negrito e sublinhado nosso)
23) Mais refere o preâmbulo do citado diploma que “reduziram-se ao mínimo indispensável os requisitos de prova documental e outros que devem ser apresentados e criaram-se canais céleres que facilitam os fluxos de informação interserviços”. (negrito e sublinhado nosso)
24) As citadas menções mais não visam do que a simplificação e agilização tecnológica de todos os procedimentos relativos a pedidos de visto ou de residência a cidadãos estrangeiros, uma vez que o próprio Governo deixou claro que “o novo regime de concessão de autorização de residência a estrangeiros que queiram investir ou desenvolver uma atividade empresarial no país, contribuindo assim, para a atração de investimento criador de emprego e de riqueza” é fundamental para a economia nacional. (negrito nosso)
25) O que antecede serve para dizer que a única interpretação que vai de encontro aos fins preconizados pelo governo é aquela que permite que o pedido se considere submetido e formalizado pelo Recorrente, ou pelo seu representante legal, aquando da sua submissão online acompanhado de todos os documentos exigidos e após o pagamento da competente taxa de análise.
26) Importa assim concluir que o entendimento sufragado na douta sentença que ora se recorre mais não é do que a negação dos elementos históricos e teleológicos necessários à interpretação das normas nesta matéria, consubstanciando uma clara violação dos princípios da legalidade, da prossecução do interesse público, da boa administração da justiça, da proporcionalidade, da razoabilidade e da boa-fé, nos quais o Tribunal a quo deveria ter fundado a sua decisão.
27) A interpretação defendida na douta sentença do Tribunal a quo não tem qualquer suporte legal ou interpretativo, não podendo, naturalmente, manter-se por falta de sustentação válida.
28) Certo é que, o pedido de autorização de residência para atividade de investimento iniciou-se com a submissão dos documentos necessários à instrução do processo e, por conseguinte, importa concluir que a pretensão dos Recorrentes não ficou satisfeita com a resposta de que deverão aguardar a notificação/abertura de vagas no Portal ARI.
29) Prevê o n.º 1 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa que “os cidadãos têm o direito de ser informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam diretamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas”.
30) Neste contexto, prevê o artigo 82.º do CPA, sob a epígrafe “direito dos interessados à informação, que: “1. Os interessados têm o direito de ser informados pelo responsável pela direção do procedimento sempre que o requeiram, sobre o andamento dos procedimentos que lhes digam diretamente respeito, bem como do direito de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas. 2. As informações a prestar abrangem a indicação do serviço onde o procedimento se encontra, os atos e diligências praticados, as deficiências a suprir pelos interessados, as decisões adotadas e quaisquer outros elementos solicitados. 3. As informações solicitadas ao abrigo do presente artigo são fornecidas no prazo máximo de 10 dias. (…)”
31) O citado artigo 82.º do CPA refere assim que o direito à informação procedimental abrange a possibilidade de obtenção de informação direta sobre o procedimento, sendo certo que constitui requisito do direito à informação procedimental na qualidade de interessado direto no procedimento.
32) No caso vertente, pretendiam os Recorrente exercer o direito à informação procedimental, pois está em causa processo administrativo no âmbito do qual requereram acesso a determinada informação, mais concretamente, informação sobre o andamento do seu processo, nomeadamente, a estimativa de quando irão proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos, eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir e outras informações relevantes que permitissem aos Recorrentes terem a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo.
33) Por essa razão, a resposta deverá aguardar a notificação/abertura de vagas no portal ARI não satisfaz integralmente a pretensão dos Recorrentes por se tratar de uma resposta claramente insuficiente para cumprir a pretensão informativa em causa, na medida em que não responde às questões concreta e objetivamente colocadas pelos Recorrentes.
34) Nesta cadência, a extinção da instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide, determinada pela sentença do Tribunal a quo, baseada na resposta da Entidade Requerida, ora Recorrida, remetida a 28.03.2023, a qual dá nota ao Recorrente de que “[d]everá aguardar a notificação/abertura de vagas no Portal ARI”, é claramente violadora do direito dos Recorrentes à informação procedimental.
35) A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lida ocorre quando por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não pode subsistir, seja porque desapareceu o objeto do processo, seja porque foi, entretanto, satisfeita fora do esquema da providência pretendida.
36) No entanto, nenhum dos necessários pressupostos se verificou no caso vertente porquanto a citada resposta da Recorrida ao pedido de informações não é uma circunstância superveniente, nem tão pouco impede a manutenção da pretensão formulada pelos ora Recorrentes.
37) A informação de que “[d]everá aguardar a notificação/abertura de vagas no Portal ARI” não constitui uma novidade para os Recorrentes pois o facto nela invocado já era conhecido porquanto aguardam vaga para recolha dos biométricos há mais de 3 anos.
38) Para além disso, também não se revela idónea a esclarecer as suas dúvidas e incertezas sobre o pedido de ARI em causa.
39) Note-se que, o Apelante requereu informações concretas sobre: 1) o andamento do seu processo, nomeadamente, para quando estimam proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos; 2) quaisquer eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir; e 3) outras informações relevantes para que o interessado possa ter a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo.
40) No entanto, a resposta genérica da Recorrida mais não é do que uma resposta vaga sobre a tramitação do pedido de autorização de residência para investimento, não sendo suscetível de esclarecer os Recorrentes de modo claro e completo sobre o estado do seu processo, particularmente, a data para a recolha dos seus dados biométricos, se existem deficiências no procedimento e qual o tempo previsto para a sua conclusão.
41) Nestes termos, a resposta da Recorrida não pode ser considerada como uma causa de inutilidade superveniente da lide, pois não constitui um facto posterior ao início da presente a instância, mas apenas uma repetição de uma informação que o Requerente obtém desde há 3 anos da Recorrida.
42) Assim sendo, mantém-se a utilidade na lide por manutenção da pretensão formulada.
43) Em conclusão, não se verificou qualquer inutilidade superveniente da lide e ao ter decidido como decidiu o Tribunal recorrido interpretou e aplicou mal o que se encontra disposto no artigo 277.º do CPC que, dessa forma, violou.
44) O Tribunal a quo coartou ainda definitivamente ao Recorrente o direito à informação procedimental de que é titular, em clara violação do disposto no artigo 268.º, n.ºs 1 e 2 da Lei Fundamental e do artigo 82.º do CPA, disposições que igualmente violou.
45) Pelo que deve a decisão ora em crise ser revogada e substituída por outra que ordene o prosseguimento da lide intimando a entidade requerida a prestar ao Requerente as informações solicitadas nos termos do artigo 104º e ss. do CPTA.”
A entidade recorrida não respondeu à alegação dos recorrentes.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, não emitiu pronúncia.
Sem vistos dos juízes-adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. n.º 2 do artigo 36.º do CPTA), importa apreciar e decidir.


II – QUESTÕES A DECIDIR

Os recorrentes invocam a nulidade da sentença por ter violado os princípios do contraditório e da igualdade das partes, ao determinar o desentranhamento do requerimento apresentado pelos requerentes em 10.07.2023 e que se considerem não escritos os artigos 7º a 33º do requerimento apresentado pelos requerentes em 14.07.2023, considerando que tal violação influi no exame e na decisão da causa, para o efeito convocando a norma do CPC respeitante às nulidades processuais. No entanto, tal invocação é alheia ao facto de as referidas determinações resultarem de despachos autónomos, que antecedem a sentença - e não da própria sentença -, e denota confusão entre o erro de julgamento e a ocorrência de nulidade processual, sendo o cerne da alegação a violação dos referidos princípios – e não a prática de um acto que a lei não admita -, o que nos remete para o erro de julgamento de tais despachos, consubstanciado na violação dos referidos princípios.
Assim, as questões que ao Tribunal cumpre solucionar são as de saber:
a) Se os despachos que antecedem a sentença, e que determinam o desentranhamento do requerimento apresentado pelos requerentes em 10.07.2023 e que se considerem não escritos os artigos 7º a 33º do requerimento apresentado pelos requerentes em 14.07.2023, padecem de erro de julgamento por violarem os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
b) Se a sentença padece de erro de julgamento por a pronúncia da entidade demandada sobre o pedido de informação dos recorrentes não satisfazer a sua pretensão material.


III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida fixou os seguintes factos, que considerou provados:

“1. A datada de 24.03.2023, com «V/ Ref. Proc. n.º 02636/ARI/094/20», com o «Assunto: Autorização de Residência para Atividade de Investimento – Pedido de Informações», é do teor que se passa a reproduzir:
Requerentes:
P…, cidadão de nacionalidade turca, nascido em 27.05.1976
L…, cidadã de nacionalidade turca, nascida em 13.09.1988
A…, cidadã de nacionalidade turca, nascida em 21.04.2021
Exmos. Senhores,
Na qualidade de mandatários do Exmo. Senhor P…, cidadão de nacionalidade turca, requerente de uma autorização de residência para atividade de investimento no âmbito do processo em referência, vimos solicitar a V. Exas. a prestação de informações sobre o estado do identificado processo.
Em 29.09.2020 o Requerente iniciou um pedido de autorização de residência para atividade de investimento, também conhecido como “ARI”, na plataforma disponibilizada pelo SEF (http://ari.sef.pt).
Nessa data o Requerente pagou a correspondente taxa de análise, no valor de € 533,00 (quinhentos e trinta e três euros), e o processo passou a correr termos sob o n.º 02636/ARI/094/20.
A candidatura foi instruída com todos os documentos exigidos a 10.02.2021, tendo posteriormente sido aceite por V. Exas.
Em consequência, em 25.02.2020 as candidaturas ao reagrupamento familiar da sua mulher L…, cidadã de nacionalidade turca, nascida em 13.09.1988 e da sua filha A…, cidadã de nacionalidade turca, nascida em 21.04.2021, foram submetidas na plataforma.
(…)
O Requerentes foram, entretanto, notificados para agendar um atendimento no SEF entre os dias 3 de Março de 2022 e 17 de Março de 2022, mas a agenda que lhe foi disponibilizada pela SEF para proceder ao agendamento não lhe permitiu a obtenção atempada de vistos para si e para o seu agregado familiar.
Por essa razão, os Requerentes viram-se forçados a cancelar tais agendamentos na expetativa que V. Exas lhes dirigissem, no mais curto espaço de tempo, um novo convite ao agendamento.
(…)
Desde que se viu forçado a cancelar o seu agendamento, o Requerente não recebeu qualquer atualização sobre andamento do seu processo, conforme se impunha.
Pelo que solicita a V. Exas., ao abrigo do disposto no artigo 82.º do Código do Procedimento Administrativo, se dignem prestar as devidas informações sobre o andamento do seu processo, nomeadamente, para quando estimam proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos, quaisquer eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir, e outras informações relevantes para que a interessado possa ter a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo.
(…)
Cf. documento junto com o requerimento inicial, que consta do documento a fls. 35-37 autos em paginação eletrónica.
2. O correio eletrónico datado de 28.03.2023, 12:15, remetido por «SEF-Centro de Contacto», para «G...@v….com», é do teor que se passa a reproduzir: Ref.: M.../ 35136.781/GRICRP.CC/23
Exma Senhora Dra. V…,
Em resposta à comunicação enviada, cumpre-nos informar que:
Deverá aguardar a notificação / abertura de vagas no Portal ARI.
Com os melhores cumprimentos
Serviço de Estrangeiros e Fronteiras Telefone: Rede fixa +351 217 115 000; Rede Móvel + 351 965 903 700
Cf. documento junto com o requerimento inicial, que consta do documento a fls. 38-38 autos em paginação eletrónica.
3. O presente processo entrou em juízo em 14.06.2023.
Cf. documento a fls. 1-4 dos autos em paginação eletrónica.”
*
Com relevância para a decisão do recurso, consideram-se provados também os seguintes factos:

4. Em 10.07.2023, foi proferido, nos presentes autos, despacho com o seguinte teor – cfr. fls. 95 do SITAF:
“Notifique os requerentes da resposta apresentada pela entidade requerida, e da incorporação nos autos do processo administrativo.
Atendendo ao teor da resposta apresentada, notifique, ainda, a requerente, para que se pronuncie, de forma expressa, sobre o aí alegado (no exercício do contraditório, Cf. artigo 3.º n.º 3 do CPC, aplicável ao contencioso administrativo por remissão da parte final do artigo 1.º do CPTA), com a advertência de que, se nada disser, no prazo de (5) cinco dias, entender-se-á que nada tem a opor à extinção da instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide (Cf. artigo 277.º alínea e) do CPC).
Caso não considere satisfeita integralmente a sua pretensão, deverão os requerentes indicar, de forma especificada, qual a informação que ainda considera em falta.”

5. Em 10.07.2023, os requerentes apresentaram, nos presentes autos, requerimento com o seguinte teor – cfr. fls. 98 do SITAF:
(…)
I. Introdução
1. A Entidade Demandada apresentou a sua resposta à intimação para prestação de informações promovida pelos Requerentes dizendo, em suma, o seguinte: “O ora requerente efetuou Pré-registo online obrigatório no Portal ARI, disponível em http://ari.sef.pt, relativo a pedido de concessão de autorização de residência para actividade de investimento (ARI), de acordo com o previsto no artigo 90º-A da lei nº 23/2007 de 4/7, na redação à data”.
2. Acrescenta ainda que, “Não obstante não ter comparecido no SEF, nas datas agendadas: 1. P… Estava agendado para o dia: Direcção Regional do Centro – Rua Venâncio Rodrigues, 25-31 Coimbra 1 de fevereiro de 2022 – 10:30:00 Posteriormente o cidadão/representante legal efectuou a desmarcação do agendamento no dia 19-01-2022 23:57:43
2. L… Estava agendada para o dia: Direcção Regional do Centro – Rua de Venâncio Rodrigues, 25-31 Coimbra 1 de fevereiro de 2022 – 10:30:00 Posteriormente o cidadão/representante legal efectuou a desmarcação do agendamento no dia 19-01-2022 23:57:51 3. A… O pedido no âmbito da ARI encontra-se em análise: 5 … A… 21-04-2021 Filho(a) Em análise”.
3. Mais alega que, “vem o ora requerente alegar que apresentou a candidatura no portal ARI para efetuar pedido de autorização de residência e não conseguir agendamento para recolha dos seus dados biométricos, não tendo a Entidade Demandada procedido à emissão do título de residência.”
4. Ora, conforme consta dos artigos 15º a 22º da Petição Inicial, o curto período disponibilizado pela Entidade Demandada para os Requerentes se apresentarem nos serviços do SEF para recolha dos seus dados biométricos inviabilizou a necessária obtenção de vistos para o efeito, já que não existe representação diplomática portuguesa permanente na Domínica.
5. E como tal, o não comparecimento dos Requerentes na data e hora agendada para recolha dos seus dados biométricos junto dos serviços da Entidade Demandada não lhes foi imputável.
6. Adicionalmente, afirma ainda a Entidade Demandada que, “Só após a entrega do pedido de ARI, com a entrega da documentação legalmente exigida no local de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) procede-se à recolha de dados biométricos que servirão para a (eventual) emissão do título ARI”.
7. Acrescentando que, “só após a tramitação prévia, é aberto o processo ARI, sendo que, para ser proferida decisão final positiva no procedimento que o ora requerente, é indispensável nos termos legalmente previstos a realização da atividade instrutória, para aferir do preenchimento dos requisitos legalmente previstos, sob pena de violação do princípio do inquisitório (cf. artº 58º do CPA) e sobretudo do princípio da legalidade (cf. artº 266º nº 2 da CRP e artº 3º nº1 do CPA)”.
8. Tal entendimento resultaria, portanto, em considerar que o Requerente só formaliza verdadeiramente o seu pedido com a entrega física dos documentos legalmente exigidos junto dos serviços da Entidade Demandada, coincidindo a referida entrega de documentos com a recolha dos seus dados biométricos.
9. Ora, a interpretação acabada de referir não resulta de qualquer normativo, não sendo, sequer, a prática comum dos serviços.
10. O que apenas serviu para justificar o injustificável, como seja a delonga incompreensível na tramitação do procedimento, a qual consubstancia uma manifesta violação do princípio da legalidade.
11. Pelo que não assiste razão à Demandada conforme se demonstrará. II. Do pedido de autorização de residência
12. Dispõe o artigo 81º da Lei nº 23/2007, de 04 de julho, sob a epígrafe “Pedido de autorização de residência” que, “O pedido de autorização de residência pode ser formulado pelo interessado ou pelo representante legal e deve ser apresentado junto do SEF”.
13. Por sua vez, dispõe o nº 1 do artigo 51º do Decreto-Lei nº 84/2007, de 05 de Novembro , na sua versão atualizada pelo Decreto regulamentar nº 4/2022, de 30 de setembro (Regulamenta o Regime jurídico de entrada/permanência/saída/afastamento dos estrangeiros) que “O pedido de concessão e de renovação de autorização de residência ou de cartão azul UE é formulado em impresso próprio e assinado pelo requerente ou pelo seu representante legal e pode ser apresentado em qualquer direção ou delegação regional do SEF, que o pode remeter, após instrução e decisão, para a direção ou delegação regional da área de residência do requerente”.
14. Adicionalmente, prevê o nº 9 do mesmo preceito legal que “Os pedidos de renovação de autorização de residência e de concessão de autorização de residência podem ser apresentados através da plataforma eletrónica, sendo dispensada a entrega de documentos e recolha de dados biométricos já integrados no fluxo de trabalho eletrónico do SEF, sem prejuízo de poder ser solicitada a sua exibição no momento da deslocação do SEF”.
15. O teor da norma acabada de citar evidencia que o pedido de autorização de residência ARI pode ser apresentado por via eletrónica, constituindo a exibição e entrega dos documentos já transmitidos no sítio da plataforma online e a recolha dos dados biométricos um mero procedimento de finalização do pedido, o qual ocorre em momento posterior à sua efetiva submissão.
16. Aliás, o requerimento para a obtenção de autorização de residência para atividade de investimento inicia-se e conclui-se quase integralmente online, uma vez que o Requerente está obrigado a juntar toda a documentação essencial para a apreciação do seu pedido, nomeadamente: A página biográfica do seu passaporte; Certificado de registo criminal válido, certificado por representação diplomática ou consular portuguesa; Título aquisitivo da compra e venda do bem imóvel; Certidão da conservatória do registo predial, com registos, averbamentos e inscrições, demonstrando ter a propriedade de bens imóveis, livres de ónus ou encargos; Declaração de instituição financeira, atestando a transferência internacional e efetiva de capitais para a aquisição e realização de obras de reabilitação; Comprovativo de apresentação de pedido de informação prévia, ou comunicação prévia ou pedido de licenciamento de obras de reabilitação, e quando aplicável declaração que ateste que o imóvel se encontra em área de reabilitação urbana; Contrato de empreitada para a realização de obras de reabilitação do imóvel. (cfr. Doc.1 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
17. Tanto assim é que, no momento da submissão do seu pedido de autorização de residência para atividade de investimento, através da plataforma online, deve o Requerente, obrigatoriamente, juntar o comprovativo do investimento já realizado em território nacional nos termos do nº 12 do artigo 65ºA do Decreto Regulamentar nº 84/2007, de 5 de novembro.
18. Do acabado de expor resulta claro que a interpretação segundo a qual só se verificaria a efetivação do pedido de residência após a entrega de documentos complementares no dia designado para a recolha dos dados biométricos do Requerente junto do SEF, o que muitas das vezes ocorre decorridos mais de dois/três/quatro anos sobre a realização do investimento, seria gravemente (ainda mais) atentatório dos direitos dos Requerentes se tivessem que aguardar por este intervalo de tempo para dar formalmente início ao procedimento, após terem afetado uma parte significativa das suas economias no investimento realizado em Portugal.
19. A prática corrente no SEF evidencia, aliás, que esse não é o procedimento adotado, uma vez que logo que os Requerentes submetem o pedido online e procedem à junção dos documentos de suporte, após alguns dias e, nomeadamente, após validação prévia da documentação, o SEF insere no sistema a designação “candidatura aceite”.
20. Entendimento diferente sempre colidiria com o disposto no artigo 86º, nº 1, do CPA, que expressamente impõe aos órgãos administrativos que se pronunciem, na falta de disposição especial, no prazo máximo de 10 dias.
21. Mais, atento o teor do Manual de Procedimentos Relativo à Autorização de Residência para Investimento, o qual foi objeto de aprovação pelo membro do Governo responsável pela área de Administração interna, resulta expressamente do ponto 1.1.2 que “Os comprovativos da realização do investimento devem ser apresentados no momento da apresentação do pedido ARI”. (Negrito e sublinhado nosso).
22. Conforme mencionado supra, os documentos comprovativos da realização do investimento constam da lista de documentos que devem ser obrigatoriamente juntos com o pedido submetido na plataforma online da Entidade Demandada, ou seja, no momento da apresentação do pedido ARI. Ainda que assim não se entenda, o que apenas por mera hipótese se concebe, sempre se dirá que, III. Da interpretação da lei
23. De acordo com o estabelecido no nº 1 do artigo 9º do Código Civil (CC), sob a epígrafe “Interpretação da lei”, “A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”. (Sublinhado nosso).
24. Consequentemente, e atento o facto de inexistir, na legislação que regula a autorização de residência para atividade de investimento em Portugal, qualquer definição expressa relativamente ao momento em que se deve considerar formalizado ou efetivamente submetido o “pedido” de autorização de residência, a concretização desse elemento essencial à correta interpretação da lei deverá seguir o preceituado no artigo 9º do CC.
25. Neste sentido também se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo, num Acórdão de 29.11.2011 (Processo nº 0701/10, disponível em www.dgsi.pt), no qual se pode ler o seguinte: “Interpretar a lei é atribuir-lhe um significado, determinar o seu sentido a fim de se entender a sua correcta aplicação a um caso concreto. A interpretação jurídica realiza-se através de elementos, meios, factores ou critérios que devem utilizar-se harmónica e não isoladamente. O primeiro são as palavras em que a lei se expressa (elemento literal); os outros a que seguidamente se recorre, constituem os elementos, geralmente, denominados lógicos (histórico, racional e teleológico). (…). Estes elementos lógicos agrupam-se em três categorias: a) elemento histórico que atende à história da lei (trabalhos preparatórios, elementos do preâmbulo ou relatório da lei e occasio legis [circunstâncias sociais ou políticas e económicas em que a lei foi elaborada]; b) o elemento sistemático que indica que as leis se interpretam umas pelas outras porque a ordem jurídica forma um sistema e a norma deve ser tomada como parte de um todo, parte do sistema; c) elemento racional ou teleológico que leva a atender-se ao fim ou objectivo que a norma visa realizar, qual foi a sua razão de ser (ratio legis). (Negrito e sublinhado nosso).
26. Resulta do preâmbulo do Decreto Regulamentar nº 84/2007, de 5 de novembro, na sua última versão introduzida pelo Decreto Regulamentar nº 4/2022, de 30 de setembro, que o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território nacional, “assenta numa opção realista e equilibrada: favorecer a imigração legal, desincentivar e contrariar a imigração ilegal, combater a burocracia, tirar partido das novas tecnologias para simplificar e acelerar os procedimentos, inovar nas soluções”. (Negrito e sublinhado nosso).
27. Consta igualmente do preâmbulo relativo ao regime jurídico acabado de citar que “reduziram-se ao mínimo indispensável os requisitos da prova documental e outros que devam ser apresentados e criaram-se canais céleres que facilitam os fluxos de informação interserviços”. (Negrito e sublinhado nosso).
28. A adoção do Decreto Regulamentar nº 84/2007, de 5 de novembro, na sua atual versão de 30 de setembro de 2022, mais não visa se não a simplificação e agilização tecnológica de todos os procedimentos relativos a pedidos de visto ou de residência a cidadãos estrangeiros, uma vez que o próprio Governo deixou claro que “o novo regime de concessão de autorização de residência a estrangeiros que queiram investir ou desenvolver uma actividade empresarial no país, contribuindo, assim, para a atração de investimento criador de emprego e de riqueza” é fundamental para a economia nacional. (Negrito nosso).
29. Assim, a única interpretação que vai de encontro aos fins preconizados pelo Governo (expressos no Decreto Regulamentar nº 84/2007, de 5 de novembro) é aquela que permite que o pedido se considere submetido e formalizado pelo Requerente, ou pelo seu Representante legal, aquando da sua submissão online acompanhado de todos os documentos exigidos, e após o pagamento da competente taxa de análise.
30. O entendimento sufragado pela Entidade Demandada consubstancia, por isso, uma negação dos elementos históricos e teleológicos necessários à correta interpretação das normas nesta matéria, resultando ainda numa clara violação dos princípios da legalidade, da prossecução do interesse público, da boa administração, da proporcionalidade, da justiça, razoabilidade e boa-fé, com os quais a Entidade Demandada deve conformar a sua atuação nos termos dos artigos 3º a 8º e 10º do CPA.
31. Conforme já mencionado supra, a correta interpretação das leis apela também à consideração do seu elemento sistemático, a saber, a sua integração no regime jurídico que o enquadra e nomeadamente a sua adequação com as restantes normas que o compõem.
32. Por todos estes motivos, verifica-se que a interpretação defendida pela Entidade Demandada não tem qualquer suporte legal ou interpretativo.
33. Acresce referir que, de acordo com a Entidade Demandada, no artigo 10º da sua resposta, “atualmente encontram-se esgotadas” as vagas para agendamento, devendo a Requerente “continuar a encetar esforços no sentido de efetuar o agendamento através do Portal ARI -https://ari.sef.pt”.
34. Ou seja, sendo o agendamento para a recolha dos dados biométricos do Requerente apenas possível com a disponibilização de vagas por parte da Entidade Demandada, o que geralmente acontece decorridos 2, 3 ou 4 anos após a submissão do pedido, a tomar como boa a interpretação que o SEF pretende dar à norma, o Requerente estaria privado de uma verba significativa que canalizou para o investimento necessário ao início do procedimento, sem qualquer contrapartida durante um período significativo de tempo, o que resultaria na imposição de um ónus sobre o Requerente absolutamente desproporcional e ilegal.
35. Entendimento que, naturalmente, não pode proceder, não encontrando na letra da lei a menor sustentação válida. IV. Da alegada violação do Princípio da igualdade
36. Alega ainda a Entidade Demandada que a sua condenação “à marcação de data para agendamento da situação particular da ora requerente redundaria sempre na quebra do princípio da igualdade e da não discriminação uma vez que contenderia com os direitos e legítimos interesses de cidadãos, que estando nas mesmas condições continuam a aguardar a sua vez para satisfação do seu pedido”.
37. O que não faz qualquer sentido, designadamente, se atendermos às situações correntes da vida em sociedade, em que numa miríada de situações existem cidadãos que se conformam com as atitudes da Administração Pública, tomadas à margem da Lei, e outros, pelo contrário, recorrem aos Tribunais para fazerem valer os seus direitos, nomeadamente, levando a Administração a responder ou a agir quando a tanto está legalmente obrigada, e tal direito constitucional está na disponibilidade de cada um.
38. Preceitua o nº 1 do artigo 20º da CRP que “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.”
39. Preceituando ainda o nº 5 da mesma disposição que “Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.”
40. Conforme mencionado acima, a Entidade Demandada, enquanto entidade pública está sujeita a todas as normas e princípios do CPA, e não somente ao princípio da igualdade, como parece sugerir com a afirmação acima citada.
41. Acontece que a atribuição de um agendamento para a Requerente e para os membros da sua família nunca resultaria numa violação do princípio da igualdade a que está adstrita a Entidade Demandada. Senão vejamos,
42. Dispõe o artigo 13º, nº 1, da CRP que “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”, acrescentando o nº 2 do mesmo preceito normativo que, “Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual”. (Negrito e sublinhado nosso).
43. Por sua vez, dispõe o artigo 6º do CPA que “Nas suas relações com os particulares, a Administração Pública deve reger-se pelo princípio da igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever ninguém em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.”
44. No presente caso, a Requerente jamais se poderia considerar beneficiada pela Entidade Demandada, após lhe ser concedida uma vaga para recolha dos seus dados biométricos, uma vez que o prazo legalmente estabelecido para o efeito já foi largamente ultrapassado.
45. Pelo que é abusivo e infundado concluir, como concluiu a Demandada, que dar cumprimento à Lei, que expressamente obriga a agir num determinado prazo, configura um “benefício” ou um “favor” atribuído ao Requerente!?!?
46. Não podendo servir de fundamento a justificação segundo a qual outros cidadãos “que estando nas mesmas condições continuam a aguardar a sua vez para satisfação do seu pedido”.
47. Pois que tal entendimento redundaria num subterfúgio para, em nome do princípio da igualdade, denegar a aplicação da Lei que expressamente obriga o SEF a agir, designadamente, procedendo ao agendamento do ato para a recolha dos dados biométricos.
48. Para além do mais, e ainda que se admita que a ora Requerente e membros da sua família se encontrem numa situação idêntica à de tantos outros cidadãos que tenham apresentado um pedido de autorização de residência em Portugal, a verdade é que a Requerente, para levar o SEF a fazer o que lhe compete, teve de despender recursos adicionais com a propositura da presente ação.
49. Conforme se disse, tal facto, longe de corresponder à realidade de todos os outros cidadãos que se encontram “nas mesmas condições”, introduz um critério que diferencia a Requerente dos restantes.
50. Assim, a comparação da situação da Requerente com a de qualquer outro cidadão que adote uma postura de passividade perante a inércia da Entidade Demandada, é que consubstancia uma violação do princípio da igualdade.
51. Neste sentido, se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo, em 23.05.2002 (Processo nº 0716/02, disponível em www.dgsi.pt) e no qual se pode ler o seguinte: “O princípio constitucional da igualdade do cidadão perante a lei é um princípio estruturante do Estado de Direito Democrático e do sistema constitucional global. Trata-se, aqui, de um princípio de conteúdo pluridimensional, que postula várias exigências, designadamente a de obrigar a um tratamento igual de situações de facto iguais e a um tratamento desigual de situações de facto desiguais, não autorizando o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual de situações desiguais”.
52. Em consequência, e conforme já se deixou exposto, a situação concreta do Requerente não se compadece com a situação de qualquer outro cidadão que tenha apresentado um pedido de autorização de residência em território nacional, somente porque estão a aguardar vagas há vários anos, configurando, pelo contrário, uma situação distinta das demais uma vez que o Requerente usou dos meios ao seu alcance para fazer valer os seus direitos que, nessa medida, espera ver reconhecidos. V. Da posição da jurisprudência
53. O Tribunal Central Administrativo, num Acórdão de 17.11.2022 (Processo nº 872/22.8BELSB, disponível em www.dgsi.pt) estabeleceu que o prazo dentro do qual a Entidade Demandada deve possibilitar o agendamento para recolha dos dados biométricos do Requerente é de 10 dias a contar do registo do pedido na plataforma online do SEF, nos termos do artigo 86º, nº 1 do CPA.
54. Prazo esse há muito ultrapassado.
55. Cabe igualmente recordar que o Acórdão acabado de citar incidiu sobre uma decisão emitida pelo Tribunal de Círculo de Lisboa de 14.07.2022 que “julgou parcialmente procedente o pedido do Requerente e intimou o Ministério da Administração Interna a dar andamento à pretensão despoletada pelo 1º requerente, no prazo de dez dias, ou seja a adotar todos os actos materiais necessários à emissão da autorização de residência formulada pelo 1º requerente dentro do aludido prazo”.
56. Continuando a citar a referida decisão, “Os actos a praticar pela entidade requerida consistem, por ora, no seguinte: • Confirmação e aprovação do registo do 1º requerente, se a tal nada obstar; • Possibilidade de agendamento para entrega do pedido ARI no local de atendimento do SEF e para tramitação subsequente (v.g, entrega da documentação exigida, recolha de dados, pagamento de taxas requeridas).”
57. Ou seja, e conforme já demonstrado, a entrega do pedido ARI no local de atendimento do SEF mais não é se não a entrega física da documentação já transmitida por via eletrónica na plataforma do SEF, correspondendo esta fase à mera formalização final de um pedido já realizado que, nos termos da lei, deve merecer despacho no prazo de dez dias após o registo.
58. Por todos estes motivos, deverá a Entidade Demandada facultar as informações solicitadas, devendo disponibilizar ao Requerente e membros do seu agregado familiar uma data concreta para a recolha dos dados biométricos, com uma antecedência mínima de três meses de forma a permitir a esta família obter os necessários vistos de entrada em território português.
Nestes termos, deverá o pedido dos Requerentes ser julgado procedente por provado e, em consequência, deve a Entidade Demandada ser intimada para, relativamente à candidatura dos Requerentes ao Programa ARI, e respetivo pedido de reagrupamento familiar, que corre termos com o n.º 02636/ARI/094/20, prestar as informações solicitadas. Devendo ainda o SEF tomar em consideração a necessidade de os Requerentes serem notificados da data do agendamento com uma antecedência mínima de três meses de forma a lhes permitir a obtenção do necessário visto de entrada em território português.
(…)

6. Em 14.07.2023, os requerentes apresentaram, nos presentes autos, requerimento com o seguinte teor – cfr. fls. 117 do SITAF:
(…)
I. Introdução
1. Em 14.06.2023, os Demandantes apresentaram um pedido intimação para prestação de informações, consulta de processo e/ou passagem de certidões contra a Demandada, peticionado, em sínteses, o seguinte: “Deve a Entidade Demandada ser intimada judicialmente, num prazo não superior a 10 (dez) dias, para remeter aos aqui Requerentes, relativamente à sua candidatura ao programa ARI e respetivo pedido de reagrupamento familiar, os seguintes documentos/informações: a) Ponto de situação sobre o andamento do seu processo; b) Para quando estimam proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos; c) Eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir; d) Outras informações relevantes para que os Requerentes possam ter a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo.”
2. Em 27.06.2023, a Demandada apresentou a sua resposta alegando, em suma, que os Demandantes não compareceram no dia designado junto das instalações do SEF para proceder à recolha dos seus dados biométricos.
3. Ora, conforme mencionado no artigo 4º da pronúncia apresentada pelos Demandantes em 10.07.2023, “o curto período disponibilizado pela Entidade Demandada para os Requerentes se apresentarem nos serviços do SEF para recolha dos seus dados biométricos inviabilizou a necessária obtenção de vistos de entrada para o efeito, já que não existe representação diplomática portuguesa permanente na Domínica”.
4. Razão pela qual o não comparecimento dos Requerentes na data e hora designada para a recolha dos seus dados biométricos junto dos serviços da Demandada não lhes foi imputável.
5. Do acabado de expor, verifica-se que a factualidade supramencionada é insuscetível de consubstanciar uma resposta para qualquer dos pedidos concretamente formulados pelos Demandados. 6. Mantendo a presente lide total pertinência e oportunidade. II. Do ponto de situação sobre o andamento do processo e da estimativa de tempo para recolha de dados biométricos
7. Ao peticionado quanto ao ponto de situação sobre o andamento do processo e sobre a estimativa de tempo para a Entidade Demandada proceder à recolha dos dados biométricos dos Demandantes, respondeu a Requerida o seguinte: “Só após a entrega do pedido de ARI, com a entrega da documentação legalmente exigida no local de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) procede-se à recolha de dados biométricos que servirão para a (eventual) emissão do título ARI”.
8. Acrescentando ainda que: “Só após a documentação estar completa é que os agendamentos são feitos segundo a disponibilidade de vagas e para o local/data/hora selecionado pelo utilizador do portal, por ordem de entrada do seu registo inicial”, sendo que “atualmente, (…), a entidade demandada não consegue garantir uma proposta mais célere”.
9. Ora, tal pronuncia não configura – não pode configurar – uma resposta, ou a prestação de informação, à questão concretamente colocada, não facultando aos Requerentes uma ideia, ainda que aproximada, sobre o andamento do seu processo ou uma estimativa de tempo para o respetivo desfecho.
10. Pelo que a Requerente continua a furtar-se ao cumprimento da lei, recusando uma resposta que sabe ser-lhe devida.
11. Neste sentido, atente-se no recente acórdão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa de 24.05.2023 (Processo nº 1287/23.6BELSB), a respeito de um caso em tudo análogo ao presente processo, em que a resposta da Entidade Demandada foi idêntica à supramencionada, tendo o Douto Tribunal concluído pelo incumprimento do dever de resposta pela Demandada: “analisado o teor do pedido de informação por estes formulado e a resposta da entidade requerida, resulta em termos clarividentes que a entidade requerida não assegurou em termos cabais o direito à informação dos requerentes que, de resto, se lhe exigia. Com efeito, a informação disponibilizada e eminentemente genérica e incapaz de assegurar uma resposta / informar os requerentes quanto as questões suscitadas. Termos em que, é manifesto que a pretensão dos requerentes se encontra por cumprir”.
12. Pelo que, sem necessidade de considerações acessórias, conclui-se que a Requerida não deu cumprimento ao dispositivo legal que expressamente a obriga a responder ao Interessado sobre o andamento concreto do seu processo e especificamente às questões que lhe foram diretamente colocadas.
13. Concluindo-se, no demais, como no requerimento inicial. III. Das Eventuais Deficiências do processo
14. No que respeita ao pedido sobre eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir, a Entidade Demandada pura e simplesmente não se pronunciou.
15. Uma vez mais a requerida recusou fornecer qualquer elemento de resposta quanto ao concretamente peticionado pelos Demandantes.
16. Ora, estatui o artigo 13º, nº 1 do CPA que “Os órgãos da Administração Pública têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados e, nomeadamente, sobre os assuntos que aos interessados digam diretamente respeito, bem como sobre quaisquer petições, representações, reclamações ou queixas formuladas em defesa da Constituição, das leis ou do interesse público.”
17. Os órgãos Administrativos estão legalmente sujeitos ao dever de pronúncia relativamente a todos os pedidos que lhe sejam dirigidos nos termos dos artigos 13º, nº 1, 82º e 83º do CPA e 268º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP).
18. Consequentemente, a omissão de pronúncia da Requerida é censurável, não podendo a mesma ser objeto de valoração implícita ou tácita.
19. Neste sentido, pronunciou-se também o Supremo Tribunal Administrativo num Acórdão de 31.03.2004 (Processo nº 046256, disponível em www.dgsi.pt), onde se pode ler o seguinte: “Apesar da epígrafe deste artigo ser "O Princípio da decisão", todavia, o mesmo encerra dois princípios: o da pronúncia (contido no seu nº 1) e o da decisão (regulado no seu nº 2). O primeiro dever (o de pronúncia) obriga sempre a Administração a tomar posição perante qualquer petição formulada por um particular, correspondendo a tal dever o direito fundamental de petição, em matérias que lhes digam respeito ou à Constituição e às leis dos cidadãos (arts. 52º da CRP e 74º e ss. do CPA e Lei nº 43/90 de 10/8). Assim, o dever de pronúncia e, consequentemente, o direito de pronúncia, sendo um direito de cariz político-constitucional, e é aí que, essencialmente, se encontra o seu regime. Todavia, quando o destinatário de uma petição é a própria Administração Pública, e está em causa uma questão administrativa, a falta de pronuncia pode sancionar-se quer com uma acção para o reconhecimento de um direito, ou porventura, com uma intimação das previstas no artº 86º da LPTA.” (Negrito e sublinhado nosso).
20. De onde resulta que a falta de pronuncia deve ser sancionada nos termos legais, conforme requerido. IIII. Do Tempo Expectável para a Conclusão do Processo
21. Ao pedido sobre o tempo expectável para a conclusão do processo dos Demandantes, a Entidade Demandada respondeu o seguinte: “a marcação de data para agendamento da situação particular da ora requerente redundaria sempre na quebra do princípio da igualdade e da não discriminação uma vez que contenderia com os direitos e legítimos interesses de cidadãos, que estando nas mesmas condições continuam a aguardar a sua vez para satisfação do seu pedido”.
22. Sobre a supracitada resposta os Demandantes já tiveram oportunidade de se pronunciar, em 10.07.2023, referindo que “No presente caso, a Requerente jamais se poderia considerar beneficiada pela Entidade Demandada, após lhe ser concedida uma vaga para recolha dos seus dados biométricos, uma vez que o prazo legalmente estabelecido para o efeito já foi largamente ultrapassado”.
23. Tendo concluindo que: “a comparação da situação da Requerente com a de qualquer outro cidadão que adote uma postura de passividade perante a inércia da Entidade Demandada, é que consubstancia uma violação do princípio da igualdade.”
24. Assim, e à luz do expressamente peticionado, verifica-se que, mais uma vez, a Entidade Demandada não logrou responder.
25. Por todo o exposto, e à semelhança do afirmado quanto às restantes questões colocadas à Requerida, verifica-se que a resposta por esta fornecida não possui a virtualidade de esclarecer os Recorrentes sobre as informações por si concretamente solicitadas, devendo ser condenada a fazê-lo, nos termos legais, mantendo-se o pedido deduzido no requerimento inicial. IV. Da Inexistência de Inutilidade Superveniente
26. A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não pode subsistir, seja porque desapareceu o objeto do processo, seja porque foi, entretanto, satisfeita fora do esquema da providência pretendida.
27. Conforme entendeu o Supremo Tribunal da Justiça, em 22.06.2021, por acórdão proferido no âmbito do processo n.º 17731/18.1T8PRT.P1.S1 (consultável em www.dgsi.pt): “II- A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide pode ocorrer quando sobrevém uma circunstância na pendência da lide que impede a manutenção da pretensão formulada, quer por via do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou por encontrar satisfação fora do próprio processo, deixando de ter interesse a solução propugnada, dando lugar à extinção da instância, sem apreciação do mérito da causa.” (sublinhado nosso).
28. Ora, nenhum dos necessários pressupostos se verificou no caso concreto.
29. A resposta da Entidade Demandada ao pedido de informações dos Requerentes não determina – nem poderá determinar – a inutilidade superveniente da lide, por: 1) não ser uma circunstância superveniente; e por 2) não impedir a manutenção da pretensão formulada pelos Demandantes.
30. Conforme se disse, a resposta remetida pela Requerida não corresponde à prestação de qualquer informação, objetiva e diretamente relacionada com cada um dos pedidos que lhe foram concretamente dirigidos.
31. Pelo contrário, a Entidade Demandada limitou-se a enviar uma resposta vaga, apartada do caso concreto que não cuidou de analisar, fora do âmbito objetivo relativamente às informações solicitadas pelos Demandantes, e como tal, não esclarece, conforme se impunha, qualquer dos pedidos de informação formulados por aqueles.
32. Mantém-se, portanto, a utilidade da lide por manutenção da pretensão dos Demandantes, visto que, no essencial, a resposta da Entidade Demandada não vai além dos factos carreados para o processo pelos próprios Demandantes, que mantêm legítimas e fundadas dúvidas sobre o seu processo, mantendo-se, por isso, exatamente no ponto em que se encontravam antes da propositura da ação.
33. Neste sentido, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 27.01.2022, referente ao processo n.º 1066/21.6BALSB (consultável em www.dgsi.pt): “IV - A informação prestada pela Administração na sua resposta à Intimação, de que não há alterações sobre o ponto da situação “que não sejam o normal desenvolvimento dos trabalhos contratados” não é suscetível de, por si, ocasionar inutilidade superveniente da lide, uma vez que tal informação resulta insuficientemente detalhada e esclarecedora, já que o solicitado se referia, precisamente, ao concreto ponto da situação dos trabalhos contratados (ainda que dentro do seu “normal desenvolvimento”).” (Negrito e sublinhado nosso).
34. De tudo quanto se deixou exposto resulta claro que não se encontram reunidos os pressupostos para a verificação da “inutilidade superveniente da lide” pois não ocorreu qualquer facto posterior (superveniente) ao início da presente intimação, mas apenas e tão só a repetição de uma informação vaga e abstrata, apartada do caso concreto, igual a tantas outras dirigidas a tantos outros interessados nas mesmas circunstâncias dos Demandantes. Nestes termos, deverá o pedido dos Requerentes ser julgado procedente por provado e, em consequência, deve a Entidade Demandada ser intimada para, relativamente à candidatura dos Requerentes ao Programa ARI, e respetivo pedido de reagrupamento familiar, que corre termos com o n.º 02636/ARI/094/20, prestar as informações solicitadas. Devendo ainda o SEF tomar em consideração a necessidade de os Requerentes serem notificados da data do agendamento com uma antecedência mínima de três meses de forma a lhes permitir a obtenção do necessário visto de entrada em território português.
(…)

7. Em 17.08.2023, e antes da prolação da sentença recorrida, foi proferido, nos presentes autos, despacho com o seguinte teor – cfr. fls. 128 do SITAF:
“Requerimento SITAF a fls. 98-111 dos autos em paginação eletrónica
Notificados da contestação apresentada pela entidade requerida, os requerentes apresentaram réplica/resposta, onde se pronunciam sobre os factos alegados naquele articulado.
Decorre do artigo 85.º-A do CPTA que a réplica apenas é admissível (i) quando sejam suscitadas exceções na contestação ou na intervenção do Ministério Público, (ii) quando o demandado deduza reconvenção, e (iii) nas ações de simples apreciação negativa.
Revertendo ao caso concreto, contata-se que na contestação a entidade requerida não suscitou qualquer exceção, assim como não deduziu reconvenção, limitando-se a impugnar os factos alegados pelos requerentes, pelo que não há lugar a réplica, sendo certo – não se olvide – que o princípio do contraditório não tem o alcance de permitir às partes a apresentação de articulados que não caibam na tramitação processual legalmente prevista.
Termos em que, porque legalmente inadmissível, determino o desentranhamento da réplica/resposta apresentada pelos requerentes.
Custas do presente incidente a cargo dos requerentes, fixando a taxa de justiça em 0,5UC, ao abrigo do disposto no artigo 7.º n.º 4 e 8 do RCP e Tabela II – «Outros incidentes» a ele anexa.
Notifique.”

8. Em 17.08.2023, e antes da prolação da sentença recorrida, foi proferido, nos presentes autos, despacho com o seguinte teor – cfr. fls. 128 do SITAF:
“Requerimento SITAF a fls. 117-124 dos autos em paginação eletrónica
Estando em causa um pedido de informação quanto ao pedido/candidatura de concessão de autorização de residência para a atividade de investimento apresentado pelos requerentes, contata-se que na contestação a entidade requerida referiu que os requerentes devem continuar a encetar esforços no sentido de efetuar o agendamento através do Portal ARI - https://ari.sef.pt, mediante a disponibilidade de vagas que vão sendo publicitadas,
Notificados da contestação apresentada, e tendo sido determinada a notificação dos requerentes para que se pronunciassem, nos sobreditos termos, sobre a inutilidade superveniente da lide, sendo que se requereu ainda que caso não considerassem satisfeita integralmente a sua pretensão, deveriam os requerentes indicar, de forma especificada, qual a informação que ainda consideram em falta, os requerentes apresentaram réplica/resposta, onde se pronunciam sobre os factos alegados naquele articulado, o que – como vimos – não cabe na tramitação processual legalmente prevista.
Na verdade, impunha-se aos requerentes, em resposta ao referido Despacho, que referissem se a informação em falta tinha sido ou não prestada, (sim ou não), e, em caso negativo, que indicassem qual a informação que consideram em falta.
Apenas nos artigos 1.º a 6.º e 34.º do requerimento apresentado é que os requerentes respondem ao referido Despacho.
Termos em que, porque legalmente inadmissível, determino que se considerem não escritos os artigos 7.º a 33.º do requerimento apresentado pelos requerentes.
Custas do presente incidente a cargo dos requerentes, fixando a taxa de justiça em 0,5UC, ao abrigo do disposto no artigo 7.º n.º 4 e 8 do RCP e Tabela II – «Outros incidentes» a ele anexa.
Notifique, com a Sentença que se segue.”


IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO


A. Do erro de julgamento dos despachos que antecedem a sentença

Alegam os recorrentes que os despachos que antecedem a sentença, e que determinam o desentranhamento do requerimento apresentado pelos requerentes em 10.07.2023 e que se considerem não escritos os artigos 7º a 33º do requerimento apresentado pelos requerentes em 14.07.2023, violam os princípios do contraditório e da igualdade das partes.
Tais despachos assentam na circunstância de os recorrentes se terem pronunciado, nos requerimentos a que se reportam os despachos, sobre os factos alegados na resposta apresentada pela entidade demandada, sem que isso seja processualmente admissível, considerando que não foi invocada matéria de excepção nem deduzida reconvenção naquela mesma resposta.
Sucede que os requerimentos apresentados pelos recorrentes o foram na sequência e a coberto do despacho, datado de 10.07.2023, que, precisamente, determinou a notificação dos requerentes para que, “no exercício do contraditório”, se pronunciassem sobre o alegado na resposta da entidade demandada. Assim, foi o próprio despacho judicial que permitiu a pronúncia dos recorrentes em nome do princípio do contraditório, pelo que as posteriores determinações de consideração como não escrito e desentranhamento, constantes dos despachos em análise, redundam na violação desse mesmo princípio.
Já quanto à alegada violação do princípio da igualdade das partes, nem os recorrentes a consubstanciam, nem se descortina de que forma tal princípio sai beliscado com os despachos impugnados. É que, não fora o despacho antecedente a erigir o princípio do contraditório como fundamento para a pronúncia dos requerentes recorrentes, não teria a mesma cobertura legal, desde logo por não resultar da lei que, por uma questão de igualdade processual, o autor se pronuncia sobre o teor da resposta apresentada pela entidade demandada.
Ante o exposto, impõe-se julgar procedente, nesta parte, o recurso e, consequentemente, revogar os despachos que antecedem a sentença, datados de 17.08.2023, e que determinam o desentranhamento do requerimento apresentado pelos requerentes em 10.07.2023 e que se considerem não escritos os artigos 7º a 33º do requerimento apresentado pelos requerentes em 14.07.2023.


B. Do erro de julgamento da sentença

Os recorrentes alegam que a sentença recorrida padece de erro de julgamento por a resposta da entidade demandada – no sentido em que os recorrentes deverão “aguardar a notificação/abertura de vagas no Portal ARI” - não satisfazer a sua pretensão material, na medida em que não responde “às questões concreta e objetivamente colocadas pelos Recorrentes”, configurando “uma resposta vaga sobre a tramitação do pedido de autorização de residência para investimento”, anterior à instauração dos presentes autos, concluindo pela violação do seu direito à informação procedimental.

A sentença recorrida determinou a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, assentando na seguinte fundamentação fáctico-jurídica:
“(…)
No caso concreto dos presentes autos, estamos em presença do exercício do direito à informação procedimental (Cf. ponto (1) do probatório), sendo que se reconhece um interesse direto e legítimo na prestação e no conhecimento da informação solicitada por parte dos requerentes.
Aqui chegados, importa analisar se a pretensão dos requerentes obteve integralmente resposta.
Vejamos:
No âmbito do presente processo, os requerentes pedem que a entidade requerida seja intimada a prestar aos requerentes informação sobre o andamento do pedido/candidatura de concessão de ARI por si formulado junto da entidade requerida, ao qual foi atribuído o n.º 02636/ARI/094/20.
Em sede de contestação, veio a entidade requerida alegar, entre o mais, que só após a entrega do pedido de ARI, com entrega da documentação legalmente exigida no local de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é que se procede à recolha de dados biométricos que servirão para a (eventual) emissão do título ARI, que os agendamentos são feitos segundo a disponibilidade de vagas e para o local/data/hora selecionado pelo utilizador do portal, por ordem de entrada do seu registo inicial, e que no caso concreto, os ora requerentes, deve continuar a encetar esforços no sentido de efetuar o agendamento através do Portal ARI - https://ari.sef.pt, mediante a disponibilidade de vagas que vão sendo publicitadas, que atualmente encontram-se esgotadas, desconhecendo-se quando haverá mais vagas.
Ora:
Do probatório resulta que em 28.03.2023, a entidade requerida já havia informado os requerentes, e em resposta, de que «[d]everá aguardar a notificação / abertura de vagas no Portal ARI» (ponto (2) do probatório).
Com efeito, tendo em conta o regime previsto no Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 05/11, que veio regulamentar a Lei n.º 23/2007, de 04/07, bem como o teor do respetivo Manual de Procedimentos, previsto no artigo 65.º-J do aludido decreto regulamentar, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras dispõe de um sistema específico de receção dos requerimentos iniciais relativos aos procedimentos previstos na Lei n.º 23/2007, de 04/07 e no decreto que a regulamentou, aplicável, no que ora interessa, aos pedidos de ARI, que pressupõe, antes do interessado poder dar início ao seu procedimento e apresentar sua pretensão junto da Administração, um prévio agendamento junto dos serviços para essa finalidade, a ser efetuado através de uma plataforma on-line, a qual vai indicando aos interessados quais os postos de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e as respetivas disponibilidades (dia/hora).
Ou seja, atenta a tramitação legal necessária para a concessão da ARI, antes haveria que dar início ao procedimento, com o agendamento presencial do requerido para a entrega do pedido de ARI, do que o requerido foi, como vimos, informado.
O que significa que se provou que a entidade requerida satisfez integralmente a pretensão dos requerentes, no sentido de informar sobre o andamento do seu pedido/candidatura de concessão de ARI, referindo, e em concreto, «[d]everá aguardar a notificação / abertura de vagas no Portal ARI».
(…)”
Ou seja, entendeu-se na sentença recorrida que, reconduzindo-se a pretensão dos recorrentes à informação sobre o andamento do seu pedido de autorização de residência para investimento, foi a mesma satisfeita pela entidade demandada, não só na resposta que dirigiu aos recorrentes em 28.03.2023 – da qual consta que os mesmos deveriam «aguardar a notificação / abertura de vagas no Portal ARI» -, mas também na resposta que apresentou nos presentes autos, na qual refere que só após a entrega do pedido de ARI e da documentação legalmente exigida no local de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é que se procede à recolha de dados biométricos que servirão para a (eventual) emissão do título ARI, e que os agendamentos são feitos através do Portal ARI, segundo a disponibilidade de vagas que vão sendo publicitadas (mas que se encontram, actualmente, esgotadas, desconhecendo-se quando haverá mais vagas), por ordem de entrada do seu registo inicial, devendo os recorrentes continuar a encetar esforços no sentido de efectuar o agendamento.

Cumpre apreciar o invocado erro de julgamento.

Nos termos do n.º 1 do artigo 104.º do CPTA, “Quando não seja dada integral satisfação a pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a correspondente intimação, nos termos e com os efeitos previstos na presente secção.”
Não estando em causa a verificação dos pressupostos do pedido de intimação, e mostrando-se assente – como se reconhece na sentença recorrida e não é posto em causa no âmbito do presente recurso - que aos recorrentes assiste o direito à informação procedimental, consagrado no artigo 268.º da Constituição e concretizado nos artigos 82.º a 85.º do CPA - nos termos dos quais os interessados, relativamente aos procedimentos que lhes digam directamente respeito, têm, designadamente, o direito de ser informados pelo responsável pela direcção do procedimento, sempre que o requeiram, sobre o andamento do procedimento, bem como o direito de conhecer as resoluções definitivas que sobre ele forem tomadas -, cumpre aferir se a pretensão dos recorrentes se mostra satisfeita.

Nos presentes autos, os autores recorrentes pedem a condenação da entidade demandada a prestar as seguintes informações/esclarecimentos, no âmbito do procedimento administrativo que corre termos sob o n.º 02636/ARI/094/20, relativo aos pedidos de autorização de residência para investimento e reagrupamento familiar: “a) Ponto de situação sobre o andamento do seu processo; b) Estimativa de quando estimam proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos; c) Eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir; d) Outras informações relevantes para que os Requerentes possam ter a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo.”
Ora, nem a pronúncia da entidade demandada no sentido em que os recorrentes devem «aguardar a notificação / abertura de vagas no Portal ARI» e continuar a encetar esforços no sentido de efectuar o agendamento, nem a informação de que só após a entrega do pedido de ARI e da documentação legalmente exigida no local de atendimento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é que se procede à recolha de dados biométricos que servirão para a (eventual) emissão do título ARI, e de que os agendamentos são feitos através do Portal ARI, segundo a disponibilidade de vagas que vão sendo publicitadas (mas que se encontram, actualmente, esgotadas, desconhecendo-se quando haverá mais vagas), dão resposta ao pedido de informação deduzido pelos recorrentes. Com efeito, nada é dito sobre a) o estado em que se encontra o seu processo, b) a previsibilidade do agendamento da recolha dos dados biométricos, c) a existência de eventuais deficiências do procedimento que importe suprir, d) informações que possam dar aos recorrentes “a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo”, conforme requerido pelos recorrentes. Diferentemente, a entidade demandada limita-se a dar uma panorâmica geral e abstracta sobre o modus operandi dos procedimentos que tramita com vista à concessão de autorização de residência e a apelar à espera pela abertura de vagas para agendar a recolha de dados, não fornecendo qualquer informação concreta acerca do procedimento em que são interessados os recorrentes.
Assim, e ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, a pretensão de informação dos recorrentes não foi satisfeita, tendo a sentença recorrida errado ao determinar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, com o que se impõe julgar procedente o presente recurso, revogar a decisão recorrida e, em substituição, condenar a entidade demandada a prestar aos recorrentes as informações solicitadas no requerimento que lhe dirigiram e nos presentes autos requeridas.
Nos termos do artigo 82.º, n.º 3, do Código do Procedimento Administrativo, as informações procedimentais requeridas são fornecidas no prazo procedimental máximo de 10 dias.
Porém, não tendo o pedido de informação sido satisfeito dentro do referido prazo, e face ao lapso de tempo decorrido desde a sua apresentação (ocorrida em 24.03.2023), e nos termos do n.º 4 do artigo 95.º do CPTA, fixa-se um prazo procedimental de 5 (cinco) dias para cumprimento do ora determinado.
*
Vencida, é a entidade recorrida responsável pelo pagamento das custas, nos termos dos artigos 527.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.


V – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes da Subsecção comum da Secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar:
a) Os despachos que antecedem a sentença recorrida, datados de 17.08.2023, e que determinam o desentranhamento do requerimento apresentado pelos requerentes em 10.07.2023 e que se considerem não escritos os artigos 7º a 33º do requerimento apresentado pelos requerentes em 14.07.2023;
b) A sentença recorrida, condenando a entidade demandada a, no prazo procedimental de 5 (cinco) dias, prestar aos recorrentes as seguintes informações, no âmbito do procedimento administrativo que corre termos sob o n.º 02636/ARI/094/20, relativo aos pedidos de autorização de residência para investimento e reagrupamento familiar: “a) Ponto de situação sobre o andamento do seu processo; b) Estimativa de quando estimam proceder ao agendamento da recolha dos seus dados biométricos; c) Eventuais deficiências no procedimento que sejam necessárias suprir; d) Outras informações relevantes para que os Requerentes possam ter a exata noção do tempo expetável para a conclusão do processo.”

Custas pela entidade recorrida.

Lisboa, 09 de Maio de 2024

Joana Costa e Nora (Relatora)
Ricardo Ferreira Leite
Marcelo Mendonça