Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 641/11.0BELRS-R1 |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 05/16/2024 |
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Relator: | MARIA ISABEL FERREIRA DA SILVA |
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Descritores: | FIXAÇÃO DO VALOR DA CAUSA CPC- ARTIGO 306º E 641º CPPT- ARTIGO 97º-A LGT- ARTIGO 38º Nº 8 |
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Sumário: | I– Se o valor da causa não for fixado no despacho saneador ou na sentença, pode ser proferido em despacho anterior ao recurso (artigo 306º nº 3 e 641º do CPC ex vi artigo 2º al. e) do CPPT). II- Quando é impugnado um ato de liquidação, o valor do processo é apenas o da importância cuja anulação se pretende, que será o da própria liquidação, se for pedida a anulação total, ou o valor da parte impugnada, se se pretender uma anulação apenas parcial (artigo 97º-A al. a) do CPPT). III- Como valor da liquidação deverá considerar-se o dos juros compensatórios que eventualmente tiverem sido liquidados, se for pedida a respetiva anulação, pois, de harmonia com o disposto no artigo 38º, nº 8, da LGT, os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:
* A Recorrida não apresentou contra-alegações. * Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de negar provimento ao recurso e manter o despacho recorrido.
* Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.
* II -QUESTÕES A DECIDIR:
* III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
* IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO:A recorrente afronta o despacho recorrido na medida em que discorda do valor fixado pelo Tribunal a quo, que entende ser de € 68.336,79 (Vd conclusões III) a VII) do recurso), e pelo facto do valor da causa ter sido fixado após ser proferida a sentença. Refere ainda que a sentença é nula por omissão de pronúncia na medida em que não se pronunciou sobre o valor. Avançamos desde já, a este propósito, que a recorrente recorreu daquela sentença (Processo nº 641/11.0BELRS deste TCAS) onde imputa à mesma, também, a nulidade por omissão de pronúncia por não ter fixado o valor da ação. Assim, e porque em causa está o despacho de fixação do valor da causa e não a sentença, não nos cabe nesta sede analisar tal vício, mas apenas os assacados ao despacho alvo de recurso. Prosseguindo. (i)- Importa aferir primeiramente, se o valor fixado pelo Tribunal recorrido poderia ter lugar após a elaboração da decisão, e bem assim se o despacho recorrido afronta o vertido no artigo 306º do CPC (Vd. Conclusão IX) do recurso). Vejamos. Decorre, com efeito, do artigo 306º do CPC, ex vi artigo 2º al. e) do CPPT, que: 1- Compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever que impende sobre as partes. 2- O valor da causa é fixado no despacho saneador, salvo nos processos a que se refere o nº 4 do artigo 299º e naqueles em que não haja lugar a despacho saneador, sendo então fixado na sentença. 3- Se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho referido no artigo 641º. Como se vê do normativo transcrito, o valor deve ser fixado no despacho saneador, e inexistindo despacho saneador, como sucede nas impugnações judiciais (espécie processual aqui em causa), deve ser fixado na sentença. Porém, o nº 3 do artigo 306º do CPC estabelece uma cláusula de salvaguarda para as situações em que o valor da causa não foi fixado na sentença, devendo, nessas situações, o Tribunal de 1ª instância fixar o valor da ação antes do recurso para o Tribunal superior (cf. artigo 641º do CPC). A propósito do normativo transcrito, Salvador da Costa escreveu o seguinte: “O n.º 1 estabelece competir ao juiz a fixação do valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes. É uma soluço inspirada no relevo do valor processual da causa, quanto à forma do processo comum executivo para pagamento de quantia certa, à sua relação com a alçada do tribunal e à competência das secções de competência cível. No regime pretérito, o valor da causa era suscetível de ser relevantemente acordado, expressa ou tacitamente, pelas partes, salvo se o juiz, findos os articulados, entendendo que o acordo estava em flagrante oposição com a realidade, fixasse à causa o valor que considerasse adequado. Mas se o juiz, por qualquer motivo, não usasse esse poder, o valor processual da causa, proferido que fosse o despacho saneador ou a sentença, conforme os casos, considerava-se definitivamente fixado na quantia acordada. As partes indicavam frequentemente para a causa valor desconforme com a utilidade económica do pedido e a lei e, não raro, o juiz não proferia o respetivo despacho de fixação do valor da causa, desvirtuando-se, por via disso, o regime de admissibilidade dos recursos e a própria obrigação de pagamento da taxa de justiça. A referida alteração visou obstar, além do mais, às mencionadas consequências. Agora, independentemente da posição das partes relativamente ao valor da causa, o juiz tem de o fixar, podendo, para o efeito, nos termos dos artigos 308.º e 309.º, ordenar diligências. Assim, o acordo expresso ou tácito das partes quanto ao valor processual da causa já não releva com vista à sua fixação, impondo-se ao juiz a verificação da sua conformidade com os factos e a lei. (…)” – In, Os Incidentes da instância, 2016, 8ª edição, pág. 60 e seguintes. (O sublinhado é nosso). Também, em anotação ao art.º 306.º, do Código de Processo Civil, Abílio Neto ensina que: “ Embora as partes continuem obrigadas a indicar o valor da causa na petição inicial (art.º 552.º-1-f), sob pena de recusa do articulado (art.º 658.º-e), após o DL n.º 303/2007 o juiz passou a ter uma intervenção ativa muito mais acentuada na fixação desse valor, sobrepondo-se ao acordo das partes, o que fará, em regra, no despacho saneador, ou antes (se houver a admissão de recursos interpostos de decisões anteriores), ou na sentença, ou ainda no despacho de admissão do recurso (art. os 306.º e 641.º). O poder-dever atribuído ao juiz de fixar o valor da causa, mesmo quando o valor aceite pelas partes, tácita ou expressamente, não esteja “em flagrante oposição com a realidade” (anterior n.º 1 deste artigo), teve por objetivo declarado dificultar a interposição (artificial) de recursos. É nesta perspetiva que se compreende e explica a regra enunciada no nº 3 deste preceito” - In, Novo Código de Processo Civil, Anotado, 3.ª edição revista e ampliada, maio/2015, pág. 369-370. (O destaque é nosso). Assim, o valor da ação deve ser fixado na sentença, porém, pode ser fixado posteriormente, como sucedeu in casu, em que houve necessidade de obter informações com vista à sua fixação, o que tem eco na doutrina citada, no próprio artigo 306º e 641º do CPC e bem assim na Jurisprudência, de que são exemplos os acórdãos do STJ de 08.03.2018, tirado do Processo nº 4255/15.8T8VCT-A.G1.S1 e o acórdão do STA de 26.08.2015, proferido no processo n.º 1016/15. Tal como se disse no acórdão do STJ de 08.03.2018, Processo nº 4255/15.8T8VCT-A.G1.S1, diremos nós também que: “ Se o valor da causa não for fixado no despacho saneador, na sentença, ou em despacho proferido incidentalmente sobre o requerimento de interposição de recurso, deve a parte interessada arguir a nulidade, provocando despacho recorrível”. Já nos acórdãos do STA de 26.08.2015, processo n.º 1016/15 e de 03.05.2018, processo nº 0250/17, aquele alto Tribunal consignou que: “Não tendo o valor da causa sido fixado na sentença, deveria tê-lo sido quando do despacho que admitiu o recurso, atento o disposto no n.º 3 do referido art. 306.º do CPC”. Deste modo, uma vez que na sentença não foi fixado o valor por falta de elementos e se relegou para momento posterior a sua fixação, que veio a ocorrer antes de ser deduzido recurso da sentença, não padece o despacho que o fixou de qualquer erro de julgamento de direito. Improcede, por conseguinte, nesta parte, o recurso. (ii)- A segunda questão colocada prende-se com o inconformismo da recorrente no que tange ao montante do valor fixado pelo Tribunal a quo, defendendo que deveria ser fixado em € 68.336,79 em vez de € 125.320,76. Na situação trazida, os autos noticiam que, aquando da elaboração da sentença, o Mª Juiz a quo entendeu que não havia elementos suficientes nos autos com vista a fixar o valor da ação, tendo solicitado ao órgão de execução fiscal elementos com vista ao seu apuramento. Nesta medida, após terem sido fornecidas informações, o Tribunal fixou o valor da ação em € 125.320,76. A recorrente discorda deste valor por entender que o Tribunal ignorou que uma parte da dívida liquidada havia sido aceite pela recorrida, o que é referido no ofício informativo prestado pelo órgão de execução, pelo que deveria o valor da causa cifra-se em € 68.336,79. Como sabemos, o juiz na fixação do valor da causa deve nortear-se por critérios legais, designadamente pelo estabelecido no artigo 97º-A do CPPT. Apesar de estabelecer o artigo 306º nº 1 do CPC que as partes devem indicar o valor da causa, a verdade é que é o juiz que o deve fixar seguindo, nas situações como a trazida, o estabelecido no artigo 97º-A do CPPT. Estabelece a alínea a) do n.º 1 do citado artigo 97.º-A do CPPT (Disposição legal aditada ao CPPT pelo DL nº 35/2008, de 26 de fevereiro) que, o valor da causa, quando seja impugnada a liquidação, é “o da importância cuja anulação se pretende”. Em situações de cumulação de pedidos, como seja a anulação de liquidação do tributo e dos juros compensatórios, devem somar-se ambos valores liquidados para encontrar o valor da causa – Cf. artigo 297º nº 2 do CPC e artigo 32º nº 7 e 8 do CPTA, ex vi artigo 2º al. c) e) do CPPT. Refere Jorge Lopes de Sousa, que: “Em face da regra da alínea a) do nº 1 deste artigo 97º-A, tem de se concluir que, quando é impugnado um acto de liquidação, o valor do processo é apenas o da importância cuja anulação se pretende, que será o da própria liquidação, se for pedida a anulação total, ou o valor da parte impugnada, se se pretender uma anulação apenas parcial. Como valor da liquidação deverá considerar-se o dos juros compensatórios que eventualmente tiverem sido liquidados, se for pedida a respetiva anulação, pois, de harmonia com o disposto no art. 38º, nº 8, da LGT, “os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados. (…)” - in, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, II volume, anotação 3 b) ao art. 97.º-A. do CPPT, pág. 72. Consultando a PI que deu origem ao processo 641/11.0BERLS, dali se extrai que o recorrida, na sequência do indeferimento do recurso hierárquico, apresentou impugnação judicial visando a anulação, quer da decisão do recurso hierárquico, quer das liquidações de IVA de 2003 a 2006 no total de € 68.336,79 – Cf. PI. constante do SITAF no processo nº 641/11.0BERLS. Com efeito, revisitando novamente a PI, constatamos que, quer no intróito da PI, quer no pedido que formula, assim como no valor que atribuiu à ação, a impugnante pretende (mediatamente) a anulação das liquidações de IVA de 2003 a 2006, e respetivos juros compensatórios no montante global de € 68.336,79. Sendo assim, não se pode concordar com o despacho posto em crise quando fixou como valor da ação outro valor que não o correspondente às quantias impugnadas, tal como estabelece o artigo 97º-A, al. a), do CPPT. Nesta conformidade, terá de proceder o recurso. * No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo da parte vencida.* Contudo, a recorrida não tendo apresentado contra-alegações não é será responsável pelo pagamento da taxa de justiça – Cf. acórdão deste TCAS de 17.09.2020, Processo nº 1505/17.0BELRS, o qual faz referência ao sumariado no acórdão do STA de 13/12/2017, donde se extrai que: “I - As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (artigos 529.º n.º 1, do CPC, e 3º, nº 1, do RCP). II – A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente (artigos 529º, nº 2, e 6º, nº 1, do CPC) e apenas é devida no seu pagamento pela parte que demande (artigo 530.º n. 1, do CPC). III - O Recorrido que não contra-alegue não é, em caso algum, responsável pelo pagamento de taxa de justiça, o qual não lhe é exigível ainda que no recurso fique vencido (artigos 7º, nº 2, do RCP, e 37º, nº 4, da Portaria nº 419-A/2009, de 17 de Abril); IV – Se, porém, o Recorrido ficar vencido no recurso é, nos termos gerais, responsável pelo pagamento das custas (artigo 446º do CPC).” Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em: -Conceder provimento ao recurso; - Revogar o despacho recorrido, - Fixar o valor da ação em € 68.336,79. Custas pela Recorrida, que não é responsável pelo pagamento da taxa de justiça nesta instância porque não contra-alegou. * Lisboa, 16 de maio de 2024
Isabel Silva (Relatora) ___________________ Ana Cristina Carvalho (1ª adjunta) ___________________________ Mª Teresa Costa Alemão (2ª adjunta) _________________________________ |