Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 810/23.0BEALM |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 09/20/2024 |
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Relator: | LUÍS FERNANDO BORGES FREITAS |
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Descritores: | CONCURSO DE PESSOAL RECURSO HIERÁRQUICO NECESSÁRIO INIMPUGNABILIDADE DO ATO DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO |
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Sumário: | I - Não pode ser qualificado como necessário o recurso hierárquico que não seja denominado como tal, por força do disposto no artigo 185.º/2 do Código do Procedimento Administrativo. II - As incongruências do regulamento do concurso, da atuação do júri e dos próprios serviços da GNR constituíram um verdadeiro alçapão jurídico para a Autora, na procura da identificação do ato impugnável. III - Nesse circunstancialismo deve ser proferido despacho de aperfeiçoamento, no sentido de a Autora identificar corretamente o ato impugnável. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção SOCIAL |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul: Ampliação do âmbito do recurso: Notificada a Recorrente para, querendo, responder à matéria da ampliação do objeto do recurso, veio a mesma alegar que «o Recorrido não requer expressamente a sua pretensão de ampliação do âmbito do recurso ao abrigo da citada norma, pelo que, não o tendo o feito, não poderá beneficiar dessa possibilidade». Não lhe assiste razão. Como se disse no despacho de 17.7.2024, vistas as contra-alegações do Recorrido, constata-se que o mesmo vem defender que, ainda que se considerasse que o ato em causa é impugnável – o que conduziria à procedência do recurso -, «então obrigatoriamente teria de se considerar verificada a exceção da caducidade de direito, tal como invocado na contestação apresentada», ideia que desenvolveu e levou às respetivas conclusões. Ou seja, o Recorrido suscitou, sem dúvida, a ampliação do âmbito do recurso, nos termos do artigo 636.º/1 do Código de Processo Civil, ainda que não o tenha requerido expressamente. Ora, independente das palavras utilizadas pelo Recorrido, e do seu menor rigor, o tribunal está obrigado a considerar o instituto processual a que, substancialmente, a parte está efetivamente a apelar. Porque, como se sabe, iura novit curia (vd. o artigo 5.º/3 do Código de Processo Civil). Indefere-se, por isso, a requerida não admissão do pedido de ampliação do âmbito do recurso. * I R… interpôs recurso jurisdicional do saneador-sentença de 23.4.2024 do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que, julgando procedente a exceção de inimpugnabilidade do ato, absolveu da instância o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA. Concluiu as suas alegações de recurso nos seguintes termos, que se transcrevem: A) A Recorrente impugnou judicialmente a decisão final tomada pelo órgão competente da GNR por via da qual a mesma foi definitivamente considerada Não Apta e, por consequência, excluída do procedimento. * Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o Ministério Público não emitiu parecer. II Sabendo-se que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do apelante, a questão inicial que vem submetida à apreciação deste tribunal de apelação consiste em determinar se o saneador-sentença errou ao considerar procedente a exceção de inimpugnabilidade do ato impugnado. Em caso de resposta negativa, importa ainda apurar se deveria ter sido proferido despacho de aperfeiçoamento convidando a Autora, ora Recorrente, a identificar corretamente o ato impugnável. Em caso de procedência do recurso, e no âmbito do pedido de ampliação do objeto do recurso, haverá que apreciar se o saneador-sentença recorrido errou ao julgar improcedente a exceção de intempestividade da prática do ato processual. III O saneador-sentença recorrido deu como provados os seguintes factos: 1. Através do Despacho 22/23, de 12/04/2023, do Tenente-General, Comandante-Geral, foi determinada a abertura do procedimento concursal interno de admissão ao 43.º CFS, procedendo-se à nomeação do júri e dos elementos responsáveis pela aplicação dos métodos de seleção. 2. Em 18/08/2023, reuniu o Júri, que como ponto seis da ordem de trabalho, tinha como função aprovar a Lista de Classificação da Prova de Aptidão Psicológica (2ª fase) e da Inspeção Médica, e finalmente determinar a publicação do “projeto de lista de classificação final e ordenação dos candidatos, constando o mesmo do anexo H”, tendo a Autora sido classificada como “Não apto” na Prova de Aptidão Psicológica (segunda fase). 3. Através do Email n.º 20/23/RRC, de 18/08/2023 foi determinado que “nos termos do artigo 13.º do Regulamento do Concurso de Admissão ao CFS, as classificações da Prova de Aptidão Física e Prova de Avaliação Psicológica (1ª fase), da Prova de Avaliação Psicológica 2ª fase (PAP) e Inspeção Médica (IM) e Retificação da classificação da Prova de Conhecimentos” fossem publicadas em Ordem de Serviço das Unidades, em 18/08/2023, mais referindo que as mesmas se encontravam disponíveis na intranet/GNR. 4. Em 23/08/2023 a Autora enviou um pedido de esclarecimentos onde solicitava ser informada do motivo da classificação na prova de dinâmica de grupo. 5. Por determinação do Presidente do júri, através do Email de 28/08/2023 é comunicado à A. a resposta ao seu requerimento. 6. Através da Informação I460110-202310-DRH, de 30/10/2023, foram levadas à análise e ponderação do Tenente-General, Comandante-Geral, as atas n.ºs 8 e 9 das reuniões do júri e a proposta de Lista de Classificação Final e ordenação dos candidatos, retificada, tendo sido exarado despacho de concordância na referida informação, em 31/10/2023. 7. Em 13/11/2023, a presente ação deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada. * Ao abrigo da faculdade concedida pelo artigo 662.º/1 do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, adita-se aos factos provados os seguintes: 8. Em 2.6.2023 o júri procedeu à calendarização do concurso, nos termos que constam de páginas 33 e 34 do processo administrativo e cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 9. Em 4.9.2023 foi elaborada informação pelo Departamento de Recursos Humanos da GNR, a submeter ao Comandante-Geral da GNR, na qual se propôs o seguinte (documento n.º 26 do processo administrativo): «a. Sejam homologadas pelo Exmo. Comandante-geral, as Atas do concurso, com as deliberações do júri, em Anexo A (suporte em papel); b. Seja homologada pelo Exmo. Comandante-geral, a lista de classificação final e ordenação dos candidatos, em Anexo B (suporte em papel)». 10. Nessa sequência o Comandante do CARI exarou parecer no qual fez constar o seguinte (documento n.º 26 do processo administrativo): «Considerando os fundamentos constantes na presente Informação sou de parecer que as propostas apresentadas estão em condições de serem aprovadas». 11. O Comandante-Geral da GNR exarou o seguinte despacho (documento n.º 26 do processo administrativo): «Homologo e aprovo, nos termos propostos». 12. Da lista de classificação final homologada por despacho de 11.9.2023 bem como da lista de classificação final retificada homologada por despacho de 31.10.2023 não consta a indicação de candidatos reprovados (documentos n.ºs 16 e 27 do processo administrativo). IV 1. Na petição inicial a ora Recorrente, aí Autora, começou por referir que a ação tinha «como objeto a decisão do órgão da Guarda Nacional Republicana por via do qual se determinou a não admissão ou exclusão da Autora ao Curso de Sargentos [doravante CFS] da Guarda Nacional Republica [doravante GNR] (4.º CFS na Unidade Politécnica Militar 2023/25 /CFS/UPM), para o preenchimento de um total de 125 vagas do Quadro de Armas e Serviços, das quais 85 do quadro de Infantaria, consubstanciado na decisão e publicação do júri do respetivo procedimento, e eventual sua homologação, da classificação de “Não Apto” na Prova de Avaliação Psicológica – 2.ª fase, publicada na intranet da GNR e datada de 18 de agosto de 2023, nos termos que constam do documento que ao diante se junta e aqui dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos – Doc.º n.º 1» (destaque e sublinhado nossos). 2. Identificou, portanto, e de forma clara, o ato praticado pelo júri em 18.8.2023 e esclareceu que tal ato era o que constava do documento n.º 1 junto com a petição inicial. E esse documento é, precisamente, o anexo G da ata n.º 6, que contém a «Classificação da Prova de Avaliação Psicológica (PAP) – 2.ª fase e Inspeção Médica (IM)». 3. E é exatamente tendo como pressuposto que é aquele o ato impugnado que a Recorrente vem a defender, nos artigos 32.º a 40.º da petição inicial, a incompetência do júri para «decidir, validar e homologar os resultados das [provas de admissão]», competência essa que seria do Comandante-Geral da GNR. Mostra-se, por isso, totalmente inaceitável a posição, absolutamente contraditória, que veio a assumir na réplica. 4. De qualquer modo, o que agora releva é o facto de o saneador-sentença recorrido ter considerado, e bem, como ato impugnado aquele que a Recorrente identificou, nos termos anteriormente descritos. E considerou-o inimpugnável. O que se mostra acertado. 5. Na verdade, e de acordo com o disposto no artigo 193.º/1 do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 30/2017, de 22 de março, «[s]empre que o ato administrativo não tenha sido praticado pelo comandante-geral, o recurso hierárquico é necessário e deve ser dirigido ao comandante-geral, pelas vias hierárquicas, no prazo de 30 dias contados a partir da notificação efetuada nos termos do disposto no n.º 2 do artigo anterior». 6. Temos, portanto, como regra geral, que cabe recurso necessário para o comandante-geral de todos os atos administrativos que não tenham sido por ele praticados (no âmbito da respetiva hierarquia, naturalmente). Portanto, sendo esta a regra geral – constante de um decreto-lei -, natural será que o Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos – aprovado por despacho do Comandante-Geral da GNR – respeite tal regra e seja interpretado de acordo com a mesma. Recorde-se, para o efeito, que «[s]ão actos legislativos as leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais» (artigo 112.º/1 da Constituição) e que «[n]enhuma lei pode criar outras categorias de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos» (n.º 2 do mesmo artigo). 7. Assim sendo, e como já se havia antecipado, terá de concluir-se que o saneador-sentença recorrido julgou bem ao considerar que o ato impugnado estava sujeito à regra constante do artigo 193.º/1 do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana. 8. Subsidiariamente, a Recorrente defende que, a considerar-se o ato impugnado como inimpugnável, então deveria ter havido lugar ao respetivo despacho de aperfeiçoamento. Vejamos a questão, iniciando a apreciação pelo Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos. 9. Num primeiro momento – que não releva para o caso dos autos – temos a lista de candidatos admitidos e não admitidos. A ela se refere o artigo 5.º, competindo a sua aprovação ao júri. Dessa lista – diz-nos o artigo 5.º/4 - «podem os candidatos reclamar e ou recorrer nos termos dos artigos 14.° e 15.° do presente regulamento». 10. Segue-se a realização das provas de admissão, a saber (artigo 6.º/1): a) Prova de conhecimentos com duas componentes, uma de língua portuguesa e uma específica; b) Prova de aptidão física; c) Avaliação psicológica; d) Inspeção médica. Cada uma das provas de admissão tem caráter eliminatório, sendo excluído do concurso o candidato que tenha obtido uma valoração inferior a 9,50 valores ou a menção de Não Apto na prova precedente (artigo 6.º/2). No que especificamente se refere à avaliação psicológica, a mesma pode comportar uma ou mais das fases indicadas no regulamento, sendo que «[c]ada fase é eliminatória per si, considerando-se excluído do procedimento o candidato que obtenha menção de Não Apto em qualquer uma das fases» (artigo 9.º/3). De acordo com o disposto no artigo 13.º/2, «[d]os resultados publicados, tendo em vista a audiência de interessados, cabe reclamação e ou recurso nos termos dos artigos seguintes». 11. Por último, haverá lugar à lista de classificação final, aprovada pelo júri (artigo 17.º/1) e homologada pelo Comandante-Geral da GNR (artigo 13.º/1). Da homologação da lista de classificação final cabe reclamação e recurso nos termos do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana (artigo 17.º/3). 12. Estas são, portanto, as três grandes fases do concurso: admissão, realização das provas e lista de classificação final. 13. Vejamos agora com mais pormenor a fase das provas de admissão, relevando, para o efeito, o disposto no artigo 13.º, o qual tem o seguinte teor: «Artigo 13.° l - Após a aprovação pelo júri dos resultados de cada uma das provas previstas no artigo 6.°, será publicada pela Direção de Recursos Humanos, unicamente na página da intranet da GNR, a lista de classificação final, com os candidatos aprovados e reprovados, por ordem de classificação obtida na prova de conhecimentos, devidamente homologada pelo Comandante-Geral, que será acompanhada da grelha de respostas, sendo os candidatos considerados notificados a partir do primeiro dia útil a seguir à data da publicação.Publicação dos resultados das provas de admissão 2 - Dos resultados publicados, tendo em vista a audiência de interessados, cabe reclamação e ou recurso nos termos dos artigos seguintes, utilizando-se obrigatoriamente os endereços de correio eletrónico institucional do candidato e do júri do concurso, sob pena de indeferimento liminar». 14. Do normativo transcrito ressalta, desde logo, o facto se anunciar na epígrafe que a regulação se reporta à publicação dos resultados das provas de admissão, mas, logo no seu n.º 1, é enxertada matéria relativa à lista de classificação final homologada pelo Comandante-Geral da GNR, quando se sabe que a lista de classificação final tem tratamento no artigo 17.º, aqui sim, respeitando a óbvia lógica sistemática. 15. A não ser que se defenda que a lista de classificação final a que se refere o artigo 13.º/1 não é a mesma a que se reporta o artigo 17.º. É que a primeira dessas normas refere lista de classificação final, com os candidatos aprovados e reprovados. Ora, como se pode constatar dos elementos do concurso, a lista de classificação final não contém nenhum candidato reprovado. 16. Na verdade, na sua reunião de 18.8.2023 (a que corresponde a ata n.º 6) o júri do concurso deliberou «publicar o projeto de lista de classificação final e ordenação dos candidatos, constando o mesmo no Anexo H». Ora, esse anexo H contém, apenas, os candidatos aprovados. O que até se compreende, na via interpretativa de acordo com a qual os resultados de cada uma das provas de admissão são aprovados pelo júri (cf. o artigo 13.º/1), não havendo qualquer referência regulamentar à homologação desses resultados. Determinar o que está correto é absolutamente irrelevante neste contexto. O que importa evidenciar são as incoerências do Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos e da própria atuação do júri, ainda que motivadas pelas primeiras. 17. No entanto, os problemas não ficam por aqui. Recorde-se o n.º 2 do mesmo artigo 13.º: «2 - Dos resultados publicados, tendo em vista a audiência de interessados, cabe reclamação e ou recurso nos termos dos artigos seguintes, utilizando-se obrigatoriamente os endereços de correio eletrónico institucional do candidato e do júri do concurso, sob pena de indeferimento liminar». 18. Evidencie-se o seguinte trecho: Dos resultados publicados, tendo em vista a audiência de interessados, cabe reclamação e ou recurso. É manifesto o erro cometido pelo regulamento, com consequências para um caso como o dos presentes autos. 19. Na verdade, é premissa básica a de que ou bem que temos um projeto de ato administrativo, uma intenção de decisão – e sobre ela recairá uma pronúncia em sede de audiência dos interessados -, ou bem que temos um ato administrativo, impugnável administrativamente através de uma reclamação ou de um recurso. O que não poderemos ter é um mero projeto de decisão e dizer que sobre ele poderá recair uma reclamação ou um recurso. Isso é a negação da natureza do ato que se dá a conhecer tendo em vista – como diz o artigo 13.º/2 do Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos – a audiência de interessados. 20. Não por acaso, a confusão regulamentar estende-se ao júri logo na calendarização do concurso, ao fazê-lo nos seguintes termos, fazendo coincidir, no segundo período, duas realidades completamente diversas e como se fossem uma só – audiência de interessados e reclamações/recursos: · 02jun23 - Publicação do projeto da lista de candidatos admitidos e não admitidos, através da OS da Unidade · 02jun a 07jun23 - Prazo para audiência de interessados (apresentação de reclamação e/ou recurso) · 09jun23 - Publicação da lista de candidatos admitidos e não admitidos ao concurso 21. Curiosamente, quanto à primeira das provas de admissão – a prova de conhecimentos -, temos apenas o seguinte: · 26jun23 - Publicação dos resultados da PC, através da OS da Unidade · 27jun a 29jun23 — Prazo para audiência de interessados relativo aos resultados da PC 22. Ou seja, se temos uma audiência de interessados, deveríamos ter prevista a decisão final dos resultados da prova de conhecimentos. Mas não. Afinal a primeira publicação já parece ser a decisão final do júri quanto aos resultados, relativamente à qual se poderá reclamar ou recorrer e não, como o júri indicou, emitir pronúncia em sede de audiência dos interessados. 23. E o que o júri fez para a prova de conhecimentos fê-lo exatamente nos mesmos termos para as restantes provas de admissão: aptidão física, avaliação psicológica e inspeção médica. 24. Mas há mais, ainda no n.º 2 do artigo 13.º. Aí se diz, como se viu, que dos resultados publicados, tendo em vista a audiência de interessados, cabe reclamação e ou recurso nos termos dos artigos seguintes. Como se vê pela atuação do júri, inexistiu qualquer notificação dos resultados de cada uma das provas de admissão para efeitos de pronúncia em sede de audiência de interessados. Houve, sim, notificação desses resultados, relativamente aos quais se poderia reclamar ou recorrer. Ao contrário, aliás, do que sucedeu com a lista dos candidatos admitidos e não admitidos e com a lista de classificação final. Aí sim, existiu verdadeira audiência de interessados. 25. No primeiro caso tivemos i) a publicação do projeto da lista de candidatos admitidos e não admitidos, depois ii) uma efetiva audiência de interessados e por fim iii) a publicação da lista de candidatos admitidos e não admitidos. Tudo isto na terminologia do próprio júri. No segundo caso tivemos i) a publicação da lista provisória de classificação final, depois ii) a audiência de interessados e por fim iii) a homologação da lista de classificação final. 26. Portanto, o que efetivamente resulta do artigo 13.º/2 é que dos resultados publicados cabe reclamação e ou recurso nos termos dos artigos seguintes. E estes artigos dizem-nos o seguinte: «Artigo 14.° l - Os candidatos podem reclamar, de forma fundamentada, num prazo de até 3 (três) dias úteis, contados da data de publicação dos resultados, remetendo a reclamação para o endereço de correio eletrónico do júri do concurso, anunciado no documento de abertura do concurso, com conhecimento ao órgão de gestão de recursos humanos da unidade a que pertence.Reclamação 2 - A deliberação sobre a reclamação é notificada ao candidato, sendo transmitida para o seu endereço de correio eletrónico institucional, com conhecimento ao órgão de gestão de recursos humanos da unidade a que pertence e da mesma cabe recurso hierárquico nos termos do artigo seguinte. Artigo 15.° l - Os candidatos podem recorrer para o Comandante-Geral, num prazo de até 3 (três) dias úteis, após a data da notificação da decisão prevista no n. ° 2 do artigo anterior. Recurso (…)». 27. A Recorrente colocou a tónica no advérbio podem utilizado no artigo 14.º/1, igualmente constante do artigo 15.º/1. No entanto, desconsiderou o facto de, anteriormente, o regulamento afirmar que dos resultados obtidos cabe reclamação e ou recurso nos termos dos artigos seguintes. Ou seja, quando se referiu às impugnações administrativas utilizou uma fórmula que, antes do atual Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, era habitualmente interpretada como consagrando uma impugnação administrativa necessária. 28. Ou seja, este tribunal não tem dúvidas de que o Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos pretendeu atribuir natureza necessária às impugnações administrativas (sucessivas) ali previstas. Mas fê-lo em frontal violação do disposto no artigo 185.º/2.º do Código do Procedimento Administrativo, do qual resulta que as reclamações e os recursos apenas terão caráter necessário se a lei os denominar como tal. 29. De resto, bem sabemos a importância de que essa matéria se reveste para a segurança dos administrados, que poderão ver frustrados, por aí, os seus direitos, ao verem recusada, por questões formais, a tutela jurisdicional que poderiam merecer. Por isso mesmo, aliás, o artigo 3.º/1 do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, veio dispor que «[a]s impugnações administrativas existentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei só são necessárias quando previstas em lei que utilize uma das seguintes expressões: a) A impugnação administrativa em causa é «necessária»; b) Do ato em causa «existe sempre» reclamação ou recurso; c) A utilização de impugnação administrativa «suspende» ou «tem efeito suspensivo» dos efeitos do ato impugnado». 30. Por outro lado, o n.º 4 do mesmo artigo estabeleceu que «[s]ão revogadas as disposições incompatíveis com o disposto nos n.ºs 2 e 3». 31. Continuando. Aparentemente, resulta do Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos que quanto aos resultados das provas de admissão, exige-se apenas a aprovação do júri (vd. o proémio do artigo 13.º/1). O mesmo se diga quanto à precedente lista de candidatos admitidos e não admitidos (artigo 5.º/1). Apenas quanto à lista de classificação final é referida a homologação pelo Comandante-Geral (artigo 13.º/1). 32. No entanto, também não foi assim o entendido pelo Departamento de Recursos Humanos do Recorrido. Na verdade, em 4.9.2023 é elaborada informação, a submeter ao Comandante-Geral, na qual se propôs que: «a. Sejam homologadas pelo Exmo. Comandante-geral, as Atas do concurso, com as deliberações do júri, em Anexo A (suporte em papel); b. Seja homologada pelo Exmo. Comandante-geral, a lista de classificação final e ordenação dos candidatos, em Anexo B (suporte em papel)». 33. Nessa sequência o Comandante do CARI exara parecer no qual fez constar o seguinte: «Considerando os fundamentos constantes na presente Informação sou de parecer que as propostas apresentadas estão em condições de serem aprovadas». 34. Finalmente, o Comandante-Geral da GNR exara o seguinte despacho: «Homologo e aprovo, nos termos propostos». 35. Portanto, os primeiros propõem a homologação, o segundo propõe a aprovação e o decisor homologa e aprova. E no final nem se sabe exatamente a que documento se referem uma e outra. Isto no pressuposto de que relativamente a cada um dos documentos apenas haverá lugar a uma dessas figuras. 36. Em suma, somadas as incongruências do regulamento, a atuação do júri e dos próprios serviços da GNR, estamos perante um verdadeiro alçapão jurídico, nomeadamente para a Recorrente, na procura da identificação do ato impugnável. 37. Ora, uma coisa é segura, no circunstancialismo descrito: a posição da Recorrente terá de ser salvaguardada face ao caminho sinuoso que lhe foi imposto. E nessa medida considera-se que deveria ter havido lugar ao convite ao aperfeiçoamento (artigo 87.º/1/b) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), no sentido de a Recorrente, ali Autora, identificar corretamente o ato impugnável. E esse ato deve ser o despacho de 11.9.2023 do Comandante-Geral da GNR. 38. Isto porque foi esse o ato através do qual foi homologada, nomeadamente, a ata n.º 6, relativa à reunião do júri de 18.8.2023, na qual o mesmo deliberou «[a]provar e publicar as classificações obtidas na PAP (segunda fase) e IM, conforme constam em anexo G». 39. A esta conclusão não se opõe o Regulamento do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Sargentos, pois, como se disse anteriormente, a natureza pretensamente necessária das impugnações administrativas ali prevista não foi formulada nos termos legalmente exigidos para lhes conferir essa natureza. 40. Note-se, ainda, que o despacho do Comandante-Geral de 31.10.2023 é alheio ao assunto. Por um lado, porque o mesmo homologa a lista de classificação final e ordenação de candidatos (retificada), lista essa da qual não consta a Recorrente. Por outro lado, porque a homologação incidiu apenas nas atas n.ºs 8 e 9, sendo que, e como se viu, para os autos releva a ata n.º 6. 41. Em abono da possibilidade de substituição da petição inicial para o efeito de corrigir a indicação do ato impugnado, mediante prévio despacho de aperfeiçoamento, vd. os acórdãos de que dão conta Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 5.ª edição, 2021, p. 697: acórdão do STA (Pleno) de 3.5.2007 (processo n.º 46262) e do TCA Sul de 12.3.2009 (processo n.º 1489/06). 42. Vejamos, agora, a matéria relativa à ampliação do objeto do recurso. Nesse âmbito o Recorrido alegou que, ainda que se considerasse que o ato em causa é impugnável – o que conduziria à procedência do recurso -, «então obrigatoriamente teria de se considerar verificada a exceção da caducidade de direito, tal como invocado na contestação apresentada». 43. Julga-se, no entanto, que não lhe assiste razão. Pelo que ficou dito nos parágrafos anteriores há que considerar que o ato impugnado é o despacho do Comandante-Geral da GNR de 11.9.2023 que homologou a lista de classificação final e as atas nºs 1 a 7 (como se disse anteriormente, é irrelevante, para o efeito, o facto de a lista de classificação final ter vindo a ser retificada e homologada através de despacho de 31.10.2023, lista essa que não integra o nome da Recorrente). 44. Ora, é de presumir, com segurança, que o despacho homologatório de 11.9.2023 do Comandante-Geral da GNR não foi notificado à Recorrente. O que até se compreende, em face da lógica de atuação do júri, que viu apenas na deliberação de 18.8.2023 (a que corresponde a ata n.º 6) a decisão relevante para a Recorrente, independentemente da homologação que sobre ela veio a recair. 45. Mas essa homologação veio a ser produzida e, em coerência, é em função dela que a alegada intempestividade da prática do ato processual tem de ser apreciada. E por isso, e nesta parte, o saneador-sentença recorrido terá de ser confirmado, na medida em que «[o] acto administrativo não é oponível ao interessado quando a notificação ou a publicação, quando exigível, não deem a conhecer o sentido da decisão» (artigo 60.º/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos). V Em face do exposto, acordam os Juízes da Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogando o saneador sentença recorrido, na parte em que julgou procedente a exceção de inimpugnabilidade do ato impugnado, e determinando que seja proferido despacho a convidar a Autora, aqui Recorrente, a apresentar nova petição inicial que identifique como ato impugnado o despacho de 11.9.2023 do Comandante-Geral da GNR, através do qual homologou, nomeadamente, as atas n.ºs 1 a 7. Custas pelo Recorrido (artigo 527.º/1 e 2 do Código de Processo Civil). Lisboa, 20 de setembro de 2024. Luís Borges Freitas – relator Rui Fernando Belfo Pereira – 1.º adjunto Maria Julieta França – 2.ª adjunta |