Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 222/25.1BEALM |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 11/06/2025 |
| Relator: | JOANA COSTA E NORA |
| Descritores: | LEGALIZAÇÃO FUMUS BONI IURIS PROVA DA PROPRIEDADE PRESUNÇÃO DO REGISTO |
| Sumário: | I - Sendo a pretensão material o reconhecimento do direito do requerente a continuar e a finalizar o processo de legalização, e assentando a mesma, logicamente, na ilegalidade do acto de indeferimento da legalização, a verificação do requisito do fumus boni iuris reconduz-se à probabilidade de invalidação desse acto na acção principal, pois que só com tal invalidação faz sentido admitir ou equacionar aquele reconhecimento. II - Embora a prova da propriedade não se baste com a demonstração da aquisição derivada da coisa, presume-se a propriedade a favor do beneficiário do direito registado, nos termos do artigo 7.º do Código do Registo Predial. |
| Votação: | Unanimidade |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Administrativa Comum |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO Acordam, em conferência, os juízes da subsecção comum da secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A… instaurou processo cautelar contra o MUNICÍPIO DE PALMELA, pedindo a suspensão da eficácia do despacho proferido pelo Vereador do Pelouro da Fiscalização da Câmara Municipal de Palmela, de 09.05.2022, que lhe determinou a cessação de utilização do anexo onde está instalada panificadora, bem como autorização provisória para prosseguir a sua actividade até à decisão final da acção principal. Pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada foi proferida sentença de indeferimento das providências cautelares requeridas por considerar não verificado o requisito do fumus boni iuris. O requerente interpôs o presente recurso de apelação, cujas alegações contêm as seguintes conclusões: “1. O Tribunal recorrido incorreu, desde logo e ao longo da motivação e no dispositivo, em erro de julgamento, errando precisamente na aplicação da norma do art. 161 .º do CPA, pois, ao desvalorizar, o facto do processo de licenciamento ter sido considerado indeferido como um acto válido e não nulo, nos termos da alínea d) do citado artigo, não teve em conta que esse acto proferido pela Sra. Vereadora da Câmara de Palmela por despacho de «25 de Julho de 2019» , foi um acto que ofendeu o conteúdo essencial de um direito fundamental, neste caso concreto, nomeadamente o direito de propriedade alargado que lhe foi conferido(ao recorrente bem entendido), concedido e autorizado pelo senhorio à data para erigir a dita fábrica panificadora há mais de trinta anos e usufruir da mesma na sua “nua” propriedade(além da habitação), tendo inclusivamente a mesma sido licenciada para a actividade à data pelo Ministério da Indústria, conforme documentos constantes dos sucessivos processos administrativos e o instrutor (I-2427/2024). 2. Errou ao concluir igualmente que «de acordo com a certidão de registo predial apresentada pelo Requerente no procedimento administrativo, o prédio urbano em que se insere o anexo está inscrito a favor de E… (cfr. ponto 8 da matéria de facto fixada)», quando esse Lote não é o lote onde se insere a dita edificação aqui em discussão, logo nunca teria de ter a autorização emanada de tal senhor E… que não é o proprietário do lote aqui em discussão. 3. Indo contra os factos notórios e extraindo dos factos apurados, presunções erradas que contrariando assim o disposto na lei e pelas regras da experiência, tendo por isso violado as regras da experiência. 4. Errou pois, também no plano da legitimidade da autorização que lhe fora concedida e conferida por procuração pela Cabeça-de-Casal[C...] (à data) ao arrendatário e nesse sentido é a decisão camarária violadora, pois, do direito do requerente, violando a douta sentença, o disposto no art.º 62 da CRP, por força da aplicação do citado art.º 161º , nº 2 al. d) do CPA. 5. O que nos reconduz por seu lado, ao nº 2 do art.º 162º , pois, «salvo disposição legal em contrário, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode, também a todo o tempo, ser conhecida por qualquer autoridade e declarada pelos tribunais administrativos ou pelos órgãos administrativos competentes para a anulação.» o que acontece no caso concreto. 6. Mais uma vez e nesse sentido, também é nosso entendimento que a sentença é violadora, do direito alegado pelo recorrente de acordo com do citado art.º 161º , nº 2 al. i do CPA, pois ofendem os casos julgados e contrariam o evidenciado pela sentença quando afirma que: «Como é evidente, nenhuma das questões suscitadas pelo Requerente se reconduz a uma ilegalidade a que seja aplicável o regime da nulidade dos atos administrativos (cfr. artigo 161.º do CPA).». 7. Não esqueçamos e em jeito de conclusão geral, que o que está verdadeiramente em causa não é o indeferimento pela Câmara Municipal de Palmela do pedido de legalização de obras «tout court» por falta de elementos (já lá existentes, vide projecto e declaração do Eng. Responsável acerca dos elementos pedidos), mas sim e fundamentalmente por FALTA DE RECONHECIMENTO DE LEGITIMIDADE POR PARTE DO ENTÃO REQUERENTE, ora recorrente. 8. Com todo o respeito, parece-nos que a douta sentença ora recorrida assentou em erro nos pressupostos de facto e de direito acima indicados. 9. Verificam-se preenchidos todos os critérios vertidos no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA. 10. Como tal deve ser entendido que é provável que a pretensão formulada pelo Requerente e recorrente nesse processo – e no que que corre termos sob o n.º 192/25.6BEALM – venha a ser julgada procedente (fumus boni iuris); que existe um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora). Por último, como ficou demonstrado e verificados, cumulativamente, os critérios vertidos no artigo 120.º n.º 1 do CPTA, devem ser ponderados os interesses em presença quanto aos danos que resultariam do decretamento da providência, nos termos do artigo 120.º n.º 2 do CPTA. 11. Ora Tal se deveu, estamos em crer pela aplicação de mero juízo perfunctório, pois, se o tribunal recorrido explana na sua análise que «Tal como resulta do requerimento inicial, o dissídio entre as partes centra-se na questão de saber se o Requerente possui legitimidade procedimental enquanto arrendatário para efetuar o pedido de licenciamento [rectius, legalização] da edificação anexa a moradia, na qual funciona a panificadora por si explorada (cfr. os pontos 1 e 2 da matéria de facto indiciariamente fixada). O Requerente discorda do entendimento da Entidade Requerida, no sentido de que o pedido de legalização deve ser subscrito pela totalidade dos herdeiros, ou por apenas parte destes, desde que esteja demonstrado o consentimento expresso dos restantes. Defende que detém legitimidade enquanto arrendatário, bem como que para tal está autorizado mediante procuração outorgada pela viúva do proprietário (C…); que a apreciação da titularidade do direito deve ser meramente formal; que qualquer dos comproprietários tem legitimidade para requerer licenças; que a legalização configuraria, sem prescindir, uma benfeitoria na propriedade.» 12. Nunca poderia concluir no sentido de que «Como é evidente, nenhuma das questões suscitadas pelo Requerente se reconduz a uma ilegalidade a que seja aplicável o regime da nulidade dos atos administrativos (cfr. artigo 161.º do CPA).» como resulta aqui bem claro das alegações e das sua conclusões acima esplanadas.(Estas novas) 13. «Nem evidentemente que o ato que indeferiu o pedido de licenciamento/legalização do anexo» tão pouco alega e insiste o recorrente nunca «sempre seria meramente anulável e, por conseguinte, a respetiva impugnação judicial sujeita ao prazo de 3 meses (cfr. artigo 58.º n.º 1 al. a) do CPTA).» como colncluiu o tribunal recorrido. 14. Porque ele tem efectivamente a derivação de um acto nulo, e por consequência com consequências aqui directas no processo cautelar e que levou ao encerramento do estabelecimento, seja pelo processo principal em que se indeferiu o pedido de licenciamento do A. requerente aqui recorrente, por força dos artigos abaixo indicado e violados na douta sentença recorrida. (vide art.º 133º/2 d) CPA e art.º 161 º, nº 2 al. d) do CPTA). 15. Contrariando em geral a posição dominante da jurisprudência sobre a interpretação do regime jurídico relativo à questão da legitimidade. 16. Termos em que se concluiu pela legislação violada, no que acima foi referido e nas indicadas disposições legais: art. 5º, 6º, 411º e 607º/4 do CPC, art. 161º, 162, do CPA, art.º 62º da CRP (na parte aplicável) e 120º 1 e 2 do CPTA. 17. Termos em que deve ser dever a sentença recorrida revogada em conformidade. 18. Manter-se a decisão de encerramento suspensa, até julgamento favorável da pretensão do Autor requerida no processo principal e que é tão simplesmente terminar o processo de legalização [que lhe foi ilegalmente vedado) com os fundamentos acima indicados, já iniciado e totalmente instruído desde 2014!!! 19. Ainda que não seja esse o entendimento total, o que não se concede, deverá manter-se pelo menos, o efeito suspensivo, já decretado nos termos do art.º 128º, nº 1 de CPTA, até que seja julgada a acção principal (que corre termos sob o processo n.º 192/25.6BEALM.) de que depende esta providência cautelar, com as legais consequências, só assim se fazendo JUSTIÇA!”” Notificado das alegações apresentadas, o requerido apresentou contra-alegações, contendo as seguintes conclusões: “i) Em sede de impugnação da matéria de facto, não observa minimamente o disposto no artigo 640.º do CPC, não enunciando os pontos que considera incorretamente julgados e o sentido em que deviam ser decididos, que alegadamente impunham uma decisão diferente; ii) Indicou os segmentos da decisão de facto que considera viciados por erro de julgamento, não tendo, contudo, fundamentado as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos que, no seu entender, implicavam uma decisão diversa; iii) Não enunciou a decisão que, em seu entender, deveria ter tido lugar relativamente à questão de facto impugnada, tendo também aqui se bastado com o seu entendimento em sentido contrário; iv) Não refere, minimamente, quais as normas jurídicas que, em seu entender, a douta sentença violou ao decidir no sentido da improcedência do pedido; v) Não invoca qualquer erro na determinação da norma jurídica aplicável e, consequentemente, não indica qual o sentido da aplicação do direito que, no seu entendimento, deveria ter sido adotado nem qual a norma que devia ter sido aplicada e que não o tenha sido; vi) As conclusões não indicam o sentido em que as normas, que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas; vii) As alegações não preenchem os requisitos fixados o que, obviamente, impossibilita qualquer contradição por parte do recorrido.” O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso. Sem vistos dos juízes-adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. n.º 2 do artigo 36.º do CPTA), importa apreciar e decidir. II – QUESTÕES A DECIDIR Face às conclusões das alegações de recurso – que delimitam o respectivo objecto, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC -, a questão que ao Tribunal cumpre solucionar é a de saber se a sentença padece de erro de julgamento de direito, ao considerar extemporânea a instauração da acção principal, considerando que foi invocada invalidade do acto geradora de nulidade, nos termos do artigo 161.º, n.º 2, alínea d), do CPA, e, portanto, impugnável a todo o tempo, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, do CPTA, alegação esta que afasta o incumprimento do n.º 2 do artigo 639.º do CPC, invocado pelo recorrido. III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Considerando que não foi impugnada, nem há lugar a qualquer alteração da matéria de facto, remete-se para os termos da decisão da 1.ª instância que decidiu aquela matéria, nos termos do n.º 6 do artigo 663.º, do CPC, mostrando-se, por isso, prejudicada a apreciação do cumprimento dos ónus impugnatórios previstos no artigo 640.º do CPC, conforme invocado pelo recorrido. IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Os pressupostos do decretamento das providências cautelares constam do artigo 120.º do CPTA, cujos n.ºs 1 e 2 estabelecem o seguinte: “1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente. 2 - Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.” Assim, a adopção de providências cautelares depende da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: (i) periculum in mora, ou seja, fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal; e (ii) fumus boni iuris, ou seja, probabilidade de procedência da pretensão formulada no processo principal. Todavia, ainda que verificados tais pressupostos, as providências cautelares são recusadas “quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.” Em suma, a não verificação do periculum in mora ou do fumus boni iuris determina o indeferimento da providência; caso se verifiquem cumulativamente tais pressupostos – e só apenas nesse caso -, importa proceder à referida ponderação de interesses públicos e privados em presença e, decorrendo da mesma que os danos que resultariam da concessão da providência se mostram superiores aos que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências, o Tribunal indefere a providência. A sentença recorrida julgou não verificado o pressuposto do fumus boni iuris para o decretamento das providências cautelares requeridas e, consequentemente, julgou improcedente o pedido. Considerou que não era provável a procedência da acção principal, da qual depende o processo cautelar, e na qual é pedido o reconhecimento do direito do autor a continuar e finalizar sem mais obstáculos o processo de legalização, pelas seguintes razões. Em primeiro lugar, porque a nenhuma das ilegalidades invocadas pelo requerente é aplicável o regime da nulidade dos actos administrativos (cfr. artigo 161.º do CPA), pelo que o acto impugnado (indeferimento do pedido de licenciamento/legalização do anexo) está sujeito a impugnação judicial no prazo de 3 meses (cfr. artigo 58.º, n.º 1, alínea a), do CPTA), tendo o requerente intentado a acção principal de impugnação de tais actos em 19.03.2025, ou seja, muito para lá daquele prazo. Em segundo lugar, porque a qualidade de arrendatário do requerente não lhe confere o direito a proceder ao licenciamento/legalização do edificado, carecendo, para o efeito, de autorização do proprietário, autorização que o requerente não tem, pois apresentou uma procuração emitida por C… quando, de acordo com a certidão de registo predial apresentada pelo mesmo no procedimento administrativo, o prédio urbano em que se insere o anexo está inscrito a favor de E…, sobrinho de C…, que foi casada com I…, neto de L… (o proprietário originário) e filho de J…. O recorrente reage contra a sentença recorrida por entender estar verificado o referido pressuposto, na medida em que é aplicável o regime da nulidade porque o acto impugnado, ao desvalorizar o despacho de «25 de Julho de 2019», ofendeu o conteúdo essencial do direito de propriedade “alargado” que lhe foi conferido, atenta a autorização do senhorio para erigir a fábrica panificadora há mais de trinta anos e usufruir da mesma na sua “nua” propriedade (além da habitação), tendo inclusivamente a mesma sido licenciada para a actividade. Mais alega que o prédio no qual se insere o anexo não é propriedade de E…, como se decidiu, pelo que não se impunha que tivesse a autorização do mesmo. Finalmente, pugna o recorrente pela manutenção da suspensão da decisão de encerramento, nos termos do n.º 1 do artigo 128.º do CPTA, até à decisão da acção principal, de modo a terminar o processo de legalização. Vejamos. Na acção principal de que depende o presente processo cautelar, o requerente pede o reconhecimento do seu direito a continuar e finalizar o processo de legalização e, consequentemente, a declaração de nulidade de todos os despachos desfavoráveis que impedem o licenciamento do prédio e que conduzam à concretização do despejo administrativo, por nulidade de acto administrativo que lhe deu origem. Assim, a sua pretensão material reconduz-se ao reconhecimento do direito do requerente a continuar e a finalizar o processo de legalização, a qual assenta, logicamente, na ilegalidade do acto de indeferimento da legalização (o despacho de 25.07.2019), pelo que a verificação do requisito do fumus boni iuris passa, antes de tudo, no caso em apreço, pela probabilidade de invalidação desse acto na acção principal, pois que só com tal invalidação faz sentido admitir ou equacionar o reconhecimento do direito do requerente a continuar e finalizar o processo de legalização. Ora, a invalidação do acto de indeferimento da legalização depende, antes de tudo, da tempestividade da sua impugnação. Como vimos, a sentença recorrida considerou que, não tendo sido invocada pelo requerente qualquer ilegalidade susceptível de gerar a nulidade do acto, está o mesmo sujeito a impugnação judicial no prazo de 3 meses, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA, pelo que a acção principal, tendo sido instaurada apenas em 19.03.2025, é extemporânea. Contrapõe o recorrente que é aplicável o regime da nulidade porque o acto impugnado, ao desvalorizar o despacho de «25 de Julho de 2019», ofendeu o conteúdo essencial do direito de propriedade “alargado” que lhe foi conferido, atenta a autorização do senhorio para erigir a fábrica panificadora há mais de trinta anos e usufruir da mesma na sua “nua” propriedade (além da habitação), tendo inclusivamente a mesma sido licenciada para a actividade. Mas não lhe assiste razão neste ponto. Em primeiro lugar, porque o acto impugnado, apesar da falta de clareza na sua identificação por parte do recorrente autor, é o acto de indeferimento da legalização (o despacho de 25.07.2019) - só a sua invalidação permitindo a legalização -, não fazendo qualquer sentido a alegação do recorrente quanto à desconformidade do “acto impugnado”, que não identifica, com tal despacho. Em segundo lugar, sendo o recorrente arrendatário do prédio, ainda que tenha autorização do senhorio para erigir a fábrica panificadora, tal autorização não lhe confere o direito de propriedade sobre o prédio. Com efeito, como dispõe o artigo 1316.º do Código Civil, “O direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei.”, não podendo adquirir-se com uma autorização do proprietário do prédio para construir um edifício, não se podendo, além do mais, falar num direito de propriedade “alargado”, sem qualquer base legal. Ora, não sendo o recorrente titular do direito de propriedade sobre o prédio, não se pode falar em violação do conteúdo de tal direito, o que afasta, sem margem para dúvidas, a ocorrência da nulidade nos termos em que o recorrente o pretende. Alega ainda o recorrente que o prédio no qual se insere o anexo não é propriedade de E…, como se decidiu, pelo que não se impunha que tivesse a autorização do mesmo. O que a sentença afirma é que “(…) a procuração apresentada pelo Requerente não foi outorgada por E… — que é a favor de quem o prédio urbano se encontra inscrito na conservatória —, nem pela pessoa com a qual este é/foi casado.”, afirmação esta que se mostra consentânea com o facto 8. do probatório (“Da certidão do registo predial então apresentada, o prédio urbano sito em S… ou S… Lote …, estava inscrito em nome de E…”), sem que o recorrente tenha posto em causa a matéria de facto provada. De resto, nesta sua alegação, o recorrente limita-se a concluir que o prédio não é propriedade de E…, mas sem justificar tal conclusão e sem alegar (nem demonstrar) quem seria então o proprietário. Enfim, embora a prova da propriedade não se baste com a demonstração da aquisição derivada da coisa, presume-se a propriedade a favor do beneficiário do direito registado, nos termos do artigo 7.º do Código do Registo Predial: “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.” Não tendo o recorrente logrado pôr em causa os fundamentos da sentença recorrida, cai por terra a sua pretensão de suspensão da eficácia do acto que determinou a cessação da utilização do edifício até à decisão da acção principal. Termos em que se impõe julgar o presente recurso improcedente e, em consequência, manter o indeferimento das providências cautelares requeridas. * Vencido, é o recorrente responsável pelo pagamento das custas, nos termos dos artigos 527.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.V – DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes da Subsecção comum da Secção administrativa do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso interposto. Custas pelo recorrente. Lisboa, 06 de Novembro de 2025 Joana Costa e Nora (Relatora) – a relatora atesta o voto de conformidade dos adjuntos Alda Nunes Mara de Magalhães Silveira (em substituição) |