Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1991/11.1BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:05/16/2024
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:IRS
LIQUIDAÇÃO ADICIONAL
AUDIÇÃO PRÉVIA
Sumário:I - A falta de audiência prévia à decisão administrativa, quando não seja legalmente dispensada, constitui preterição de formalidade essencial, conducente, em regra, à anulabilidade do ato (artigo 163/1 CPA).
II - A preterição do direito de audiência prévia, por via da aplicação do princípio do aproveitamento do ato administrativo, apenas é admissível quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insuscetível de influenciar a decisão final, o que acontece em geral nos casos em que se esteja perante uma situação legal evidente ou se trate de atividade administrativa vinculada.
III - A possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do ato deve ser apreciada casuisticamente pela análise das circunstâncias particulares do caso concreto, aferindo-se se a decisão do procedimento não poderia de forma alguma ser influenciada pela participação do contribuinte no procedimento.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO


A Autoridade Tributária e Aduaneira, veio recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por J… e mulher M…, na parte em que anulou o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) n.º 20115001836994, respeitante ao ano de 2008, no montante global de € 280.462,38.

Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente formula as seguintes conclusões:

A. «Vem o presente recurso reagir da douta sentença proferida em 2022-03-31, relativa ao processo n.º 1966/11.0BELRS, que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida pelo Senhor J…, com o NIF 1…, contra a liquidação adicional de IRS n.º 2011 5001836994, emitida em 2011-05-07, no valor de € 280.462,38 (duzentos e oitenta mil, quatrocentos e sessenta e dois euros e trinta e oito cêntimos), relativa aos rendimentos do ano de 2008, consubstanciada na nota de cobrança n.º 2011 283826, no valor de € 82.191,58 (oitenta e dois mil, cento e noventa e um euros e cinquenta e oito cêntimos).

B. A douta sentença recorrida concluiu que ocorreu vício de forma por preterição de formalidade legal essencial traduzida na omissão da concessão do direito de audição antes da prática do ato de liquidação controvertido, previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT. Mais entendeu que não é possível aplicar o princípio do aproveitamento do ato administrativo, pelo que julgou a impugnação procedente e determinou a anulação da liquidação adicional de IRS.

C. No presente recurso, pretende-se que seja apreciado o erro de julgamento de direito incorrido pela douta sentença ao concluir que o procedimento padece do vício de violação do direito de audição, e que este não se degrada em formalidade não essencial.

D. Entendeu o Tribunal a quo que ocorreu uma preterição de formalidade legal essencial traduzida na omissão da concessão do direito de audição antes da liquidação de imposto, e que “não é possível concluir que a decisão administrativa não poderia assumir outro conteúdo, uma vez que, caso a administração tributária tivesse notificado regularmente o Impugnante, na pessoa do seu mandatário, para exercer o seu direito de audiência prévia, não existem garantias que este não tivesse apresentado elementos tendentes a inverter o entendimento que a administração adotou na liquidação impugnada, nomeadamente, para o sentido que a própria administração assumiu no ofício datado de 26-03-2010.

Nesta conformidade, não se pode aplicar, in casu, o princípio do aproveitamento dos atos administrativos, na medida em que não estamos perante uma situação em que o cumprimento da formalidade preterida não tivesse a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada.”, cf. fls. 33 e 34 da douta sentença.

E. O propósito do exercício do direito de audição é permitir ao contribuinte fazer parte do procedimento de tomada de decisão, trazendo ao procedimento factos e a sua perspetiva do enquadramento jurídico-tributário da questão, por forma a influenciar a decisão tomada.

F. A dispensa de audição prévia, quando esta era devida, não determina, no entanto, a anulação da decisão do procedimento se o interessado não pudesse apresentar elementos novos nem tenha deixado de se pronunciar sobre as questões relevadas na decisão final.

G. De acordo com os factos provados constantes em 3) e 5) da douta sentença recorrida, resulta que o Recorrido e a esposa alienaram, em 2008-01-10, o direito de propriedade sobre os prédios inscritos na matriz sob os artigos 8….º, 1….º e 1….º, todos da freguesia da Luz, concelho de Lagos, bem como o prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 5….º, secção …, da freguesia da Luz, concelho de Lagos, pelo valor de € 1.400.000,00 (um milhão e quatrocentos mil euros), cf. fls. 6 e 7 da douta sentença recorrida.

H. Em 2008-06-01, o Recorrido e a esposa adquiriram o direito de propriedade sobre o prédio inscrito na matriz sob o artigo 1….º, fração …, da freguesia de Benfica, concelho de Lisboa, pelo valor de € 410.000,00 (quatrocentos e dez mil euros), cf. facto provado constante em 6) a fls. 7 da douta sentença recorrida.

I. Na declaração modelo 3 do IRS apresentada pelo Recorrido e esposa em 2009-04-29, relativa aos rendimentos do ano de 2008, foi declarado, no Anexo G, a alienação do direito de propriedade do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 5….º, secção S, da freguesia da Luz, concelho de Lagos, pelo valor de € 1.400.000,00 (um milhão e quatrocentos mil euros), bem como o reinvestimento do valor de realização de € 410.000,00 (quatrocentos e dez mil euros), na aquisição do prédio inscrito na matriz sob o artigo 1….º, da freguesia de Benfica , cf. facto provado constante em 8) a fls. 7 e 8 da douta sentença recorrida e fls. 63 a 66 do PAT que aí se deram por integralmente reproduzidas.

J. Em 2009-07-29, o Recorrido e esposa apresentaram uma declaração modelo 3 do IRS, relativa aos rendimentos auferidos no ano de 2008, em substituição da declaração apresentada em 2009-04-29, declarando, no Anexo G, a alienação do direito de propriedade dos prédios inscritos na matriz sob o artigo 1….º, 1….º e 8….º, todos da freguesia da Luz, na matriz predial rústica sob o artigo 5....º, secção S, da freguesia da Luz, pelo valor de € 1.400.000,00 (um milhão e quatrocentos mil euros), bem como o reinvestimento do valor de realização no valor de € 410.000,00 (quatrocentos e dez mil euros), na aquisição do prédio inscrito na matriz sob o artigo 1….º, da freguesia de Benfica, cf. facto provado constante em 10) a fls. 8 e 9 da douta sentença recorrida e fls. 69 a 72 do PAT que aí se deram por integralmente reproduzidas.

K. Era intenção do Recorrido e esposa que o reinvestimento de parte do valor de alienação do direito de propriedade dos prédios sitos na freguesia da Luz, concelho de Lagos, na aquisição do direito de propriedade do prédio sito na freguesia de Benfica, determinasse a exclusão de tributação em sede de IRS de parte da mais-valia realizada.

L. Para o efeito, é necessário, que o direito de propriedade transmitido incida sobre o prédio que corresponde à habitação própria e permanente do sujeito passivo e que o direito de propriedade adquirido incida sobre o prédio com o mesmo destino, nos termos do n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS.

M. De acordo com o facto provado constante em 1) da douta sentença recorrida, o Recorrido mudou o seu domicílio fiscal para a Rua I…, Lagos, em 2007-08-23, cf. fls. 5 da douta sentença recorrida.

N. De acordo com o facto provado constante em 2), o Recorrido mudou o seu domicílio fiscal para a Q…, em Lagos, em 2007-12-13, que integra os prédios inscritos na matriz sob os artigos 1….º, 1….º e 8….º, todos da freguesia da Luz, e na matriz predial rústica sob o artigo 5….º, secção S, da freguesia da Luz, cf. fls. 5 da douta sentença recorrida.

O. O domicílio fiscal do Recorrido foi alterado para a Q… 28 (vinte e oito) dias antes de celebrar o contrato de compra e venda do direito de propriedade do sítio, correspondente aos artigos matriciais 1….º, 1….º e 8….º, todos da freguesia da Luz, e na matriz predial rústica sob o artigo 5….º, secção S, da freguesia da Luz.

P. Recorda-se, ainda, de acordo com os factos provados que o Recorrido e a esposa declararam nas suas declarações modelo 3 de IRS relativas aos rendimentos dos anos de 2005 e 2006 que auferiram rendimentos prediais relativos ao arrendamento dos imóveis inscritos na matriz sob os artigos 8….º e 1….º, da freguesia da Luz, concelho de Lagos, integrantes da Q…, tendo, ainda, declarado, no ano de 2007, rendimentos prediais relativos ao arrendamento do prédio inscrito na matriz sob o artigo 8….º, da freguesia da Luz, prédio integrante da Q..., cf. facto provado constante em 4) a fls. 6 da douta sentença recorrida.

Q. Em virtude da existência de rendimentos prediais, é razoável concluir, segundo as regras da experiência, que o Recorrido e a esposa não tinham a sua habitação própria e permanente na Q… nos anos de 2005, 2006 e 2007.

R. Aliás, segundo as regras da experiência, é pouco comum alterar-se a habitação própria e permanente para um prédio que se vai vender em prazo inferior a 1 (um) mês.

S. As regras da experiência também ensinam que a decisão de vender um prédio não se toma de um dia para o outro e é expetável existir um certo desfasamento temporal entre a decisão de vender o direito de propriedade de um prédio e a outorga da escritura de compra e venda respetiva.

T. Por isso, quando o domicílio fiscal do Recorrido foi alterado para a Q…, em 2007-12-13, é razoável assumir que o Recorrido e a esposa já tinham a expetativa de vender os diversos prédios que integram a Q…, o que veio a ocorrer em 2008-01-10.

U. É, também, improvável que, sabendo que o direito de propriedade dos prédios vai ser vendido no curto prazo, o Recorrido e a esposa tivessem mudado efetivamente a sua residência para a Q…, passando pelo incómodo de duas mudanças de casa no espaço de m mês.

V. Resulta, por isso, das regras da experiência que não é credível que o Recorrido e a esposa tenham tido a sua habitação própria e permanente na Q… durante 28 (vinte e oito) dias.

W. Assim sendo, ao transmitir o direito de propriedade dos diversos prédios que integram a Q…, o Recorrido e a esposa não estavam a transmitir o direito de propriedade do prédio em que tinham a sua habitação própria e permanente, nos termos e para os efeitos do n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS, pelo que a liquidação controvertida não merece censura quanto ao enquadramento jurídico-tributário que reflete.

Sobre o exercício do direito de audição,

X. Em 2010-03-26, foi elaborado ofício pela Direção de Finanças de Faro, dirigido ao Recorrido, indicando a necessidade de retificar (i) o valor de realização, (ii) a quota-parte e que “Só é passível de reinvestimento o valor de realização respeitante ao prédio destinado a habitação, sito na Q…, inscrito na matriz sob o artigo urbano n.º 1…, da freguesia da Luz, do concelho de Lagos (conforme alteração do domicílio fiscal (…)” (sublinhado nosso), cf. facto provado constante em 12) a fls. 9 e 10 da douta sentença recorrida.

Y. O ofício indica que, por o domicílio fiscal do Recorrido ter sido alterado para a Q…, o reinvestimento do prédio correspondente a habitação na Q… (o artigo 1... .º, da freguesia da Luz) é suscetível de preencher a exclusão de tributação prevista no n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS. ou seja, os demais prédios que compõem a Q… não são elegíveis para efeitos do n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS.

Z. O prédio inscrito na matriz sob o artigo 1….º, da freguesia da Luz, é elegível para efeitos do n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS sendo, evidentemente, necessário, aferir do preenchimento dos respetivos pressupostos.

AA. A douta sentença recorrida afirma que “Ademais, conforme resulta do ponto 12) da fundamentação de facto, no primeiro ofício remetido ao Impugnante, datado de 26-03-2010, para proceder à correção da liquidação de substituição, a Administração Tributária transmitiu ao Impugnante que entendia que este apenas poderia colocar no quadro 5 do anexo G da sua declaração de IRS o valor de realização do imóvel inscrito na matriz sob o artigo 1…, por considerar que este era o seu domicílio fiscal, não colocando em causa que o mesmo era a sua habitação própria e permanente, não admitindo, no entanto que os demais prédios vendidos naquele ano e cujo valor o Impugnante havia inscrito no quadro 5 do anexo G da declaração de substituição [a que respeita o ponto 10) da fundamentação de facto] pudessem ser considerados sua habitação própria e permanente.” (sublinhado nosso), cf. fls. 29 da douta sentença recorrida.

BB. Muito respeitosamente, discordamos da douta sentença recorrida e não interpretamos o ofício como correspondendo a uma análise substantiva da questão.

CC. Interpretar dessa forma o ofício da Direção de Finanças de Faro, seria comprometer a AT com uma visão meramente formal da questão e impedir futuramente, até em sede de procedimento inspetivo, o apuramento dos factos relevantes para aferir da aplicação da norma constante do n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS.

DD. Note-se que, de facto, na data de transmissão dos prédios que integravam a Q…, o Recorrido tinha o seu domicílio fiscal na Q…, o que é diferente de concluir – como se apurou mais tarde – que isso significasse que a sua habitação própria e permanente se encontrava na Q….

EE. O oficio foi efetivamente recebido pelo Recorrido que, em 2010-04-15, respondeu, informando que os artigos formam um único prédio, que há mais de 30 (trinta) ou 40 (quarenta) anos constituía a habitação e residência familiar dos seus pais e posteriormente a sua, cf. facto provado constante em 14) a fls. 11 da douta sentença.

FF. Em 2010-05-11, mediante ofício elaborado pelo Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 5, foi enviado, por correio registado, ao Recorrido, requerendo que, no prazo de 10 (dez) dias, entregasse a declaração modelo 3 do IRS de substituição, cf. facto provado 15) constante a fls. 11 da douta sentença recorrida.

GG. Em 2010-05-19, o mandatário do Recorrido respondeu a informar que a declaração de substituição entregue pelo Recorrido em 2009-07-29 não carecia de substituição, cf. facto provado constante em 16) a fls. 11 e 12 da douta sentença recorrida.

HH. Mediante ofício de 2011-01-28, o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 5 informa o mandatário do Recorrido que irá ser elaborada uma declaração de substituição oficiosa, cf. facto provado constante em 18) a fls. 12 da douta sentença recorrida.

II. Assim, em 2011-02-25, o Recorrido foi notificado para exercer o direito de audição prévia, mediante ofício de 2011-02-23 do Serviço de Finanças de Lisboa 5, indicando-se que é proposto retirar do Anexo G o reinvestimento por não ser habitação própria e permanente, cf. facto provado constante em 19) e 20) a fls. 12 e 13 da douta sentença recorrida.

JJ. Sobre o teor destes ofícios, refere a douta sentença recorrida que “E, quando notificou, novamente, o Impugnante, em 11-05-2010, para proceder a tal correção não lhe comunicou qualquer fundamentação diferente da já exposta naquele ofício por força da qual se impusesse essa correção, limitando-se a referir que aquele ofício lhe havia sido remetido e insistindo na correção da aludida declaração de substituição – cfr. ponto 15) da fundamentação de facto.

De referir, ainda, que o ofício que tem como remetente o mandatário do Impugnante, datado de 28-01-2011, no qual se transmite que, pelo facto de o Impugnante não ter procedido à correção da aludida declaração de substituição se irá proceder à correção oficiosa da mesma, também não contém qualquer fundamentação distinta da já expressa nos dois ofícios anteriores, sendo certo que a administração tributária nem sequer demonstrou que a mesma havia, efetivamente sido remetida, não constando dos autos qualquer comprovativo de envio – cfr. ponto 18) da fundamentação de facto.

Por outro lado, quando notificou o Impugnante para exercer o seu direito de audiência prévia verifica-se que esta considerou que não podia ser considerado qualquer valor de realização dos imóveis que o Impugnante havia declarado pretender reinvestir no quadro 5 do anexo G da declaração de IRS de substituição que apresentou, por considerar que nenhum deles era habitação própria e permanente do Impugnante, tendo acabado por emitir uma liquidação de IRS exatamente com base nesses pressupostos, isto é, desconsiderando todos os valores de realização que o Impugnante havia declarado – cfr. pontos 19), 21) e 22) da fundamentação de facto.” (sublinhado nosso), cf. fls. 29 da douta sentença recorrida.

KK. A notificação para o exercício do direito de audição e a data da sua concretização são factos considerados provados na douta sentença recorrida, cf. factos provados 19) e 20).

LL. Antes da emissão da liquidação adicional, foi notificado o Recorrido para dizer o que tivesse por conveniente quanto a esse facto, para efeitos da alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT.

MM. É verdade que, nos termos do n.º 1 do artigo 40.º do CPPT, a notificação para o exercício do direito de audição deveria ter sido remetida ao mandatário do Recorrido e informado o Recorrido da possibilidade e do prazo para o exercício desse direito, o que não sucedeu.

NN. No entanto, não é idêntica a situação em que é omitida integralmente a audição prévia da situação nos autos, em que o Recorrido tem conhecimento que pode exercer o seu direito, tem conhecimento do prazo para o efeito, pode contactar o seu mandatário para exercer esse mesmo direito e determinar os termos do mesmo.

OO. Uma situação é o Recorrido desconhecer os termos em que iria ser praticado o ato de liquidação adicional, nada lhe ter sido comunicado pelo Serviço de Finanças e ser-se confrontado com o ato sem suspeitar da sua existência, como facto consumado.

PP. Outra situação, é a dos autos, em que o Recorrido recebeu dois ofícios (um da Direção de Finanças de Faro e outro do Serviço de Finanças de Lisboa 5) a solicitar a apresentação da declaração de substituição relativa ao IRS do ano de 2008, recebeu outro ofício (na pessoa do seu mandatário) a indicar que iria ser elaborada a declaração de substituição - não reagindo a este ofício – e foi, ainda, notificado para o exercício do direito de audição, nada dizendo nem fazendo perante esta notificação.

QQ. Em 2011-04-08, foi submetida a declaração oficiosa de IRS do Recorrido e esposa, relativa aos rendimentos do ano de 2008 na qual se consideraram todos os elementos constantes na declaração de substituição apresentada pelo Recorrido em 2009-07-29, excetuando o reinvestimento declarado no Quadro 5, cf. facto provado constante em 21) a fls. 13 a 15 da douta sentença recorrida.

RR. Na realidade, entre a concretização da notificação para o exercício do direito de audição prévia, em 2011-02-25, e a submissão da declaração de substituição em 2011-04-08, decorreram 41 (quarenta e um) dias, sem que o Recorrido nada dissesse nem fizesse no procedimento de liquidação.

SS. A título de curiosidade, note-se que o Recorrido teve mais tempo para exercer o direito de audição prévia no procedimento de liquidação do que o tempo em que alegadamente teve a sua habitação própria e permanente na Q…, entre a alteração do domicílio fiscal para o prédio e a sua venda.

TT. Atendendo às diversas comunicações emitidas pela AT ao Recorrido, relativas ao teor do Anexo G da declaração modelo 3 do IRS relativa aos rendimentos do ano de 2008 do Recorrido e esposa, e atendendo ao facto de que o Recorrido respondeu, primeiro por si, de seguida pelo seu mandatário, a informar que não iria submeter outra declaração modelo 3 do IRS de substituição, era expetável que uma declaração de substituição fosse submetida oficiosamente pela AT, que se encontra vinculada ao princípio da legalidade.

UU. Muito respeitosamente, considerar que ocorreu uma preterição de formalidade essencial antes da emissão da liquidação adicional de imposto, quando o Recorrido foi envolvido no procedimento de liquidação, quando foram reportados ao Recorrido todos os factos, e, após a notificação de 2011-02-23 – que o notifica formalmente para o exercício do direito de audição – por ele recebida em 2011-02-25, o Recorrido escolhe nada dizer nem fazer no procedimento de liquidação, afigura-se excessivo.

VV. Violou, a AT, a norma constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT quando expediu três ofícios e uma notificação para o direito de audição prévia todos relativos ao Anexo G da declaração modelo 3 do IRS dos rendimentos do ano de 2008 do Recorrido e esposa, porque o Recorrido escolheu não exercer o seu direito de audição? Não ficou na disponibilidade do Recorrido decidir intervir ou não no procedimento?

WW. Ainda que, em abstrato, se entendesse que a violação da norma constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT ocorreu pelo facto e o Recorrido ter escolhido não exercer o seu direito de audição, tem essa violação o mesmo grau de censura do que a exclusão do Recorrido do procedimento de liquidação, apresentando-se a liquidação adicional como facto consumado?

XX. Muito respeitosamente, discordamos do Tribunal a quo quando conclui “E determina o artigo 40.º, n.º 1, do CPPT, na redação aplicável, que as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário serão feitas na pessoa deste e no seu escritório.

Ora, por força do disposto no nº 1 do artigo 40.º do CPPT, a notificação para o exercício de audiência prévia deve ser feita na pessoa do mandatário quando este tenha sido constituído no âmbito do procedimento, sendo que “tal falta de notificação constitui preterição de formalidade procedimental prescrita por lei que impediu, in casu, o recorrente de apresentar a defesa” antes da emissão da liquidação em causa, não se podendo, portanto, considerar que tenha sido concedido o direito de audição prévia ao Impugnante – cfr., em sentido idêntico, o Acórdão do TCA Sul, de 15-06-2010, proferido no processo n.º 04070/10, cujo entendimento acompanhamos.”, cf. fls. 28 da douta sentença recorrida,

YY. Porquanto não resulta dos autos que o Recorrido tenha sido impedido de exercer o seu direito de audição, dado que foi considerado provado que o Recorrido rececionou, em 2011-02-25, o ofício que lhe comunicava os termos e o prazo para o exercício desse direito.

ZZ. Se é verdade que ocorre uma irregularidade – na estrita medida em que o mandatário não foi notificado para o exercício daquele direito, também é verdade que nada impediu o Recorrido de (a) contactar o seu mandatário e exercer, em conformidade o seu direito, (b) requerer a notificação do mandatário para o exercício do direito de audição, ou (c) requerer a prorrogação do prazo para suprir o lapso temporal decorrente do facto de o mandatário não ter sido notificado na mesma altura em que o Recorrido.

AAA. Afigura-se, à RFP, que a solução preconizada na douta sentença recorrida pode não ser a mais ajustada e proporcionada às circunstâncias do caso concreto.

BBB. Mais conclui a douta sentença recorrida que “Assim, a fundamentação em que assentou a liquidação impugnada não é coincidente com aquela que foi notificada através dos ofícios aludidos nos pontos 12), 15) e 18) da fundamentação de facto, não se podendo, portanto, considerar que tais ofícios e a resposta dada aos mesmos substituiu de alguma forma a efetiva oportunidade do exercício do direito de audição prévia, ou que por força dos mesmos o objetivo visado por essa formalidade foi atingido.”, cf. fls. 30 da douta sentença recorrida.

CCC. Muito respeitosamente, cremos que a correspondência anterior entre a AT e o Recorrido não seja irrelevante para os autos.

DDD. Em primeiro lugar, resulta dos ofícios anteriormente remetidos pela Direção de Finanças de Faro e pelo Serviço de Finanças de Lisboa 5 que o Recorrido estava ciente que a sua liquidação de IRS relativa ao ano de 2008 iria ser corrigida.

EEE. Em segundo lugar, resulta que o Recorrido tinha conhecimento dos fundamentos em que essa correção iria assentar.

FFF. Em terceiro lugar, demonstra que a comunicação expedida para o domicílio fiscal do Recorrido em Benfica era por este rececionada.

GGG. Ainda que se entenda que ocorreu uma preterição de formalidade do procedimento, não se afigura, pelas razões supra expostas que a formalidade preterida tenha sido uma formalidade essencial.

HHH. No entanto, ainda que assim se entenda, sempre resultaria que o ato tributário controvertido seria um ato de conteúdo igual ao ato tributário primeiro.

III. Considerando que a liquidação adicional de IRS veio tributar a parte da mais-valia excluída de tributação por reinvestimento na aquisição do prédio inscrito na matriz sob o artigo 1….º, fração …, da freguesia de Benfica, a questão controvertida reside em aferir se os prédios integrantes da Q… (em concreto, o prédio inscrito na matriz sob o artigo 1….º, da freguesia da Luz, concelho de Lagos) constituía a habitação própria e permanente do Recorrido e esposa.

JJJ. Ora, nada do que foi junto com a P.I. permite demonstrar, nem sequer inferir esse facto. Se, em sede de impugnação judicial – última instância para o efeito, nada se indica nem esclarece que permita concluir pela localização da habitação própria e permanente na Q…, como se pode crer que em sede de direito de audição – que não é a última instância para o efeito, o Recorrido teria feito essa demonstração?

KKK. Ora, sendo atingido o objetivo pretendido pela lei, tem entendido o Supremo Tribunal Administrativo que a preterição de formalidade essencial “degrada-se” em mera irregularidade, deixando de constituir fundamento para a anulação do ato.

LLL. Neste sentido, cf. os acórdãos proferidos nos processos n.º 10457, de 1991-06-26, n.º 17940, de 1994-05-18, n.º 21228, de 1997-06-11, n.º 16376, também de 1997-06-11, cujos sumários se encontram disponíveis em www.dgsi.pt.

MMM. Caso tivesse sido o mandatário do Recorrido notificado para exercer o direito de audição antes da emissão da liquidação adicional de IRS controvertida, o teor do ato teria sido exatamente igual.

NNN. Recordamos que tem sido entendimento do Supremo Tribunal Administrativo que, demonstrando-se que a decisão final no procedimento não poderia ser distinta, a preterição da formalidade de omissão de direito de audição é de considerar não essencial, aproveitando-se o ato praticado, cf. a título de exemplo, o acórdão proferido no processo n.º 1071/06, em 2007-02-15, no processo n.º 489/08, em 2008-09-24, e no processo n.º 671/10, em 2010-11-10, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

OOO. Nestes termos, a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento de direito quando, perante a factualidade considerada nos autos, entendeu que a preterição do direito de audição constituía uma violação de formalidade essencial, não sendo de aplicar o princípio do aproveitamento do ato.

PPP. Em face de todo o supra exposto, padecendo a douta sentença recorrida de erro de julgamento de Direito por não considerar a formalidade preterida não essencial, e não aplicar o princípio do aproveitamento do ato, não pode a mesma subsistir no ordenamento jurídico.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o presente recurso e revogada a douta sentença recorrida e, em conformidade, seja substituída por acórdão que julgue improcedente os presentes autos de impugnação judicial, como é de Direito e de Justiça.»

Os Recorridos não apresentaram contra-alegações.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Os autos foram com vista ao Ministério Público, que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II – Fundamentação

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme previsto nos artigos 635/4 e 639/1.2 do Código de Processo Civil (CPC), sendo as de sabe se sentença padece erro de julgamento na apreciação e valoração da matéria de facto e na aplicação do direito ao considerar procedente a impugnação, com fundamento preterição de uma formalidade essencial do procedimento tributário.

II.1- Dos Factos

O Tribunal recorrido considerou como provada a seguinte factualidade:

1) «Em 23-08-2007, os Impugnantes alteraram o seu domicílio fiscal para a Rua I… – cfr. documentos a fls. 293 do processo n.º 1991/11.1BELRS, 65 a 67 do PAT junto com o processo n.º 1966/11.0BELRS e 108 e 109 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

2) Em 13-12-2007, os Impugnantes alteraram o seu domicílio fiscal para a Q… – cfr. documento a fls. 294 do processo n.º 1991/11.1BELRS e 62 a 64 do PAT junto com o processo n.º 1966/11.0BELRS e 108 e 109 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

3) Desde, pelo menos, 1998 e até 10 de janeiro de 2008, os Impugnantes foram os proprietários da totalidade dos seguintes prédios:

a) Prédio urbano em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, com 4 divisões, à data, afeto a habitação, inscrito na matriz sob o n.º 8…, localizado em V…, 8600-210, na freguesia da Luz, concelho de Lagos, distrito de Faro, descrito na conservatória do registo predial de Lagos sob o n.º 4…;

b) Prédio urbano, destinado a habitação, inscrito na matriz sob o n.º 1…, localizado em V…, 8…-2…, na freguesia da Luz, concelho de Lagos, distrito de Faro;

c) Prédio urbano em propriedade total sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, com dois pisos, cuja tipologia corresponde a T2, destinado a habitação, inscrito na matriz sob o n.º 1…, localizado na Q…, 8…-1…, na freguesia da Luz, concelho de Lagos, distrito de Faro;

d) Prédio rústico, localizado na Q…, 8…-1…, na freguesia da Luz, concelho de Lagos, distrito de Faro, inscrito na secção … sob o artigo 5… - cfr. documentos a fls. 296 a 307 do processo n.º 1991/11.1BELRS e 102,103 e 105 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

4) Os Impugnantes declararam nas suas declarações modelo 3 de IRS relativas aos anos de 2005 e 2006 que auferiram rendimentos prediais relativos ao arrendamento dos imóveis inscritos na matriz sob os n.ºs 8… e 1… mencionados no ponto antecedente e na declaração respeitante ao ano de 2007 que auferiram rendimentos prediais relativos ao arrendamento do imóvel inscrito na matriz sob o n.º 8… - cfr. declarações modelo 3 de IRS a fls. 296 a 304 do processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dão aqui por integralmente reproduzidas;

5) Em 10-01-2008, os Impugnantes venderam à sociedade P… S.A. (Sucursal em Portugal) os imóveis mencionados no ponto 3) supra pelo valor total de 1.400.000 EUR - cfr. documentos a fls. 101 a 103 do processo n.º 1991/11.1BELRS;

6) Por escritura de compra e venda outorgada em 01-06-2008, os Impugnantes adquiriram, pelo preço de 410.000,00 EUR, a fração autónoma, designada pela letra “…”, que corresponde ao quarto andar A, e o direito a um sessenta e seis avos da fração autónoma designada pela letra “…”, que corresponde a ocupação de um lugar de parqueamento, fazendo estas frações parte do prédio urbano situado em Lisboa na Rua M…, n.ºs …, … a … e Rua M…, n.ºs …, …; …, … e …, freguesia de Benfica, descrito na Quinta Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número 8… da aludida freguesia - cfr. documentos a fls. 42 a 44 do processo n.º 1991/11.1BELRS;

7) Em 2-7-2008, os Impugnantes alteraram o seu domicílio fiscal para a Rua M…, n.º …, 1…-4… Lisboa – cfr. documento a fls 108 e 109 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

8) Em 29-04-2009, os Impugnantes apresentaram a 1ª declaração relativa ao ano de 2008 na qual declararam nos quadros 4 e 5 do Anexo G, relativo a Mais Valias e outros incrementos patrimoniais, o seguinte:


- cfr. documento a fls. 63 a 66 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dá aqui por integralmente reproduzido;

9) Em 1-7-2009, com base na declaração mencionada no ponto antecedente foi emitida a liquidação n.º 200954366278 com o valor a pagar de 293.637,16 EUR - cfr. documentos a fls. 62 e 67 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;

10) Em 29-07-2009, os Impugnantes apresentaram declaração de substituição relativa ao ano de 2008 na qual declararam nos quadros 4 e 5 do Anexo G, relativo a Mais Valias e outros incrementos patrimoniais, o seguinte:


- cfr. documento a fls. 69 a 72 do PAT do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dá aqui por integralmente reproduzido;

11) Em 30-9-2009, com base na declaração mencionada no ponto antecedente foi emitida a liquidação n.º 20095004894823, com o valor a pagar de 198.270,80 EUR- cfr. documentos a fls. 68 e 73 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;

12) Em 26-03-2010, foi elaborado ofício pela Direção de Finanças de Faro, dirigido ao Impugnante J…, para a morada Rua M…, n.º …, 1…-4… Lisboa, no qual consta o seguinte:


«Imagem em texto no original»


- cfr. documentos a fls. 98 e 99 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

13) O ofício mencionado no ponto antecedente foi enviado por correio registado com aviso de receção e entregue na morada ali mencionada no dia 30-03-2010 - cfr. aviso de receção a fls. 100 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

14) Em 15 de abril de 2010, em resposta ao ofício aludido no ponto 12) supra, o Impugnante J… apresentou requerimento com o seguinte teor:

“J…, tendo sido notificado para alterar a sua declaração de I.R.S. para liquidação de mais-valias relativas à venda do seu prédio sito na P…, Freguesia da Luz, Concelho de Lagos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagos sob o número q…, vem informar V. Exa, que se trata de um único prédio destinado a habitação e residência do requerente. Pois, apesar de ser constituído por vários artºs urbanos e um rústico, desde há mais de 30 e 40 anos que se destinava exclusivamente a habitação e residência familiar dos pais do requerente e, posteriormente do requerente.” - cfr. documento a fls. 110 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

15) Em 11-5-2010, foi enviado, por correio registado, o ofício elaborado pelo Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 5, dirigido ao Impugnante J…, para a morada Rua M…, n.º …, 1…-4… Lisboa, no qual consta o seguinte:




- cfr. documentos a fls. 94 e 95 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

16) Em 19-05-2010, na sequência da receção do ofício mencionado no ponto antecedente, o Impugnante através de mandatário, por este constituído junto da administração tributária, pronunciou-se relativamente ao aludido ofício defendendo que a declaração de substituição apresentada a que respeita o ponto 10) supra não carecia de ser corrigida - cfr. documento a fls. 93 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS e por acordo (cfr. artigos 16.º da p.i. apresentada no processo n.º 1966/11.0BELRS, e 30.º da contestação apresentada no processo n.º 1991/11.1BELRS);

17) Os prédios mencionados no ponto 3) supra com as inscrições matriciais aí indicadas, foram desativados em 06-05-2010 e 07-05-2010, tendo dado origem ao prédio, classificado como terreno para construção, inscrito na matriz sob o n.º 6…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagos, localizado em V…, 8…-2…, na freguesia da Luz, concelho de Lagos, distrito de Faro - cfr. documentos a fls. 45, 46, 48 do PAT junto com o processo n.º 1966/11.0BELRS e documentos a fls. 305 e 307 do processo n.º 1991/11.1BELRS;

18) Em 28-01-2011, foi elaborado ofício pelo Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 5, dirigido ao “Dr. J… na qualidade de mandatário” do Impugnante J…, para a morada Rua M…, … 8… Lagos, no qual consta o seguinte:


«Imagem em texto no original»


- cfr. documento a fls. 93 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

19) Em 23-02-2011, foi remetido ao Impugnante J…, através de correio registado, para a morada Rua M…, n.º …, 1…-4… Lisboa, ofício a este dirigido, para efeitos do exercício de audiência prévia, no qual consta o seguinte:


«Imagem em texto no original»


- cfr. documentos a fls. 91 e 92 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS;

20) O ofício mencionado no ponto antecedente foi entregue na morada ali referida em 25-02-2011 - cfr. documentos a fls. 49 a 50 do PAT junto com o processo n.º 1966/11.0BELRS;

21) Em 08-04-2011, a Administração Tributária elaborou declaração oficiosa de IRS dos Impugnantes, relativa ao ano de 2008 na qual, designadamente, apôs nos quadros 4 e 5 do Anexo G, relativo a Mais Valias e outros incrementos patrimoniais, o seguinte:


(…)





- cfr. documentos a fls. 75 a 79 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dá aqui por integralmente reproduzido;

22) Em 7-5-2011, com base na declaração mencionada no ponto antecedente foi emitida a liquidação n.º 20115001836994 com o valor a pagar de 280.462,38 EUR, nos seguintes termos:


«Imagem em texto no original»


- cfr. documentos a fls. 74 e 80 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;

23) Em 27-05-2011, foi enviada, por correio registado, a demonstração da Liquidação de IRS mencionada no ponto antecedente, dirigida aos Impugnantes, para a morada Rua M…, n.º …, 1…-4… Lisboa, com o seguinte teor:


«Imagem em texto no original»


- cfr. documento a fls. 325 e 329 do processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;

24) Em 09-09-2011, os Impugnantes, receberam, respetivamente, os ofícios intitulados “Citação”, respeitantes à dívida resultante da liquidação mencionada no ponto 22) supra, dos quais consta, designadamente, o seguinte teor:




- cfr. documentos a fls. 112 a 116 do PAT junto com o processo n.º 1991/11.1BELRS, que se dão aqui por integralmente reproduzidos;

25) Em 28-09-2011, a Impugnante M… apresentou a impugnação judicial que corre termos sob o n.º 1991/11.1BELRS neste Tribunal– cfr. registo do envio do fax no cabeçalho das páginas da p.i a fls. 9 a 15 do processo n.º 1991/11.1BELRS e a aludida p.i., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

26) Em 7-10-2011, o Impugnante J… apresentou a impugnação judicial que corre termos sob o n.º 1966/11.0BELRS neste Tribunal– cfr. registo do envio do fax no cabeçalho das páginas da p.i. a fls. 2 a 19 do processo n.º 1966/11.0BELRS, bem como o documento a fls. 1 do mesmo, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;



Quanto a factos não provados, a sentença exarou o seguinte:

«Nada mais se provou com interesse para a decisão da causa.»


E quanto à motivação da decisão de facto, consignou-se:

«A decisão da matéria de facto relevante para a decisão da causa, efetuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos, não impugnados, e dos PAT, bem como na posição assumida pelas partes nos respetivos articulados, conforme é especificado em cada um dos pontos da matéria de facto provada.»


II.2 Do Direito

Os ora Recorridos, M… e J… deduziram separadamente impugnações judiciais contra a liquidação de IRS n.º 201151836994, relativa aos rendimentos obtidos no ano de 2008, que correram termos sob os nº 1966/11.0BELRS e 1991/11.1BELRS, respetivamente.

Por despacho proferido em 2020.11.25, foi determinada a apensação do processo n.º 1966/11.0BELRS aos presentes autos.

E, em 2022.03.31, foi proferida a sentença recorrida, que julgou procedente a impugnação que correu termos sob o n.º 1966/11.0BELRS e, consequentemente, anulou a liquidação de IRS n.º 20115001836994 de 07-05-2011.

Nas conclusões das alegações de recurso, a Recorrente alega, em suma, que a sentença recorrida que julgou procedente a impugnação judicial, incorreu em erro de julgamento na interpretação dos factos e de direito, porquanto face aos elementos fornecidos e constantes do procedimento tributário, apesar de o mandatário dos Impugnantes não ter sido notificado o ato não foi completamente omitido porquanto os contribuintes foram notificados para exercer o direito de participação na modalidade de audição prévia, pugnado ainda que deveria prevalecer, no caso, a aplicação do princípio do aproveitamento do ato.

Termina pedindo a procedência do recurso e a revogação da sentença e a sua substituição por acórdão que declare a impugnação improcedente.

Com efeito, na impugnação apresentada e no que aqui interessa, alegaram os ora Recorridos a ilegalidade do ato de liquidação por preterição de formalidades legais essenciais, nomeadamente por não ter sido notificado o mandatário constituído notificado para o exercício do direito de audição prévia antes da liquidação, e a sentença recorrida deu-lhes razão.

Vejamos, então:

Importa desde já referir que nas alegações de recurso, a ora Recorrente não impugna a matéria de facto assente e supra transcrita.

E não nega que, no âmbito do procedimento tributário, o mandatário dos Impugnantes não foi notificado para o exercício do direito de participação [cf. conclusão MM) das alegações de recurso], defendendo logo de seguida que ainda assim, os Impugnantes e ora Recorridos foram notificados para exercer o direito de audição prévia e logo, que tiveram oportunidade de participar no mesmo [cf. conclusão NN) das alegações de recurso].

Preliminarmente, vejamos, ainda que de forma necessariamente sumária, alguma linhas sobre o direito de participação.

O direito de participação dos cidadãos na formação das decisões administrativas e deliberações que lhes digam respeito tem assento constitucional no artigo 267/5 da CRP.

Este direito foi concretizado também no Código de Procedimento Administrativo (CPA) na versão da Lei nº 6/96, de 31 de janeiro que o republicou, no artigo 8º, com a epígrafe princípio da participação, regulada a audiência dos interessados nos artigos 100º a 103º do mesmo Código.

A participação dos contribuintes nas decisões que lhes digam respeito encontra-se prevista no artigo 60/1.a) da Lei Geral Tributária (LGT), através de audição prévia, antes da liquidação.

Dizia o artigo 60.º da LGT, com a epígrafe Princípio da participação, com a redação coeva:

1- A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação;
b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;
c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;
d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
2- É dispensada a audição:
a) No caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe seja favorável;
b) No caso de a liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objectivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.
3- Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais se não tenha pronunciado.
4- O direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte.
5- Em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 1, para efeitos do exercício do direito de audição, deve a administração tributária comunicar ao sujeito passivo o projecto da decisão e sua fundamentação.
6- O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audição não pode ser inferior a 8 nem superior a 15 dias.
7- Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão.

Também o artigo 45/1 do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), reconhece aos contribuintes o direito de participação na formação da decisão.

Como ensinam Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (1-Aut Cit, LEI GERAL TRIBUTÁRIA: Anotada e Comentada, 4ª Ed., 2012, Ed. Encontro da Escrita, pág. 504), a audiência dos interessados deve ter lugar concluída a instrução e antes de ser tomada a decisão final (artigo 100/1 CPA, Id.).

Ora, a falta de audiência prévia, quando não seja legalmente dispensada, constitui preterição de formalidade essencial, que conduz, em regra, à anulabilidade do ato (artigo 163/1 CPA).

Nos termos do artigo 60/4 LGT, o direito de audiência deve ser exercido no prazo a fixar pela Autoridade Tributária, em carta registada a enviar para o domicílio fiscal do contribuinte.

Todavia, as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário são feitas na pessoa deste e no seu escritório (cf. nº 1 do artigo 40º do CPPT).

Vejamos agora o que se decidiu na sentença recorrida no segmento que aqui interessa:

(…)
Compulsados os pontos 19) e 20) da fundamentação de facto, verifica-se que foi remetido e entregue, em 25-02-2011, ofício para esse efeito dirigido ao Impugnante J…, através de correio registado, para a morada Rua M…, n.º …, 1…-4… Lisboa, no qual se afirma terem sido encontradas incorreções respeitantes à declaração de IRS de substituição a que respeita o ponto 10) da fundamentação de facto apresentada por ambos os Impugnantes.
(…)
Porém, verifica-se que o Impugnante J…, constituiu mandatário junto da Administração Tributária na sequência de, em 11-05-2010, ter sido interpelado, pela segunda vez, para proceder à correção da declaração de IRS de substituição a que respeita o ponto 10) da fundamentação de facto – cfr. pontos 16) e 18) da fundamentação de facto.
Ora, estabelece o artigo 40.º, n.º 1, do CPPT, na redação aplicável, que as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário serão feitas na pessoa deste e no seu escritório.
Assim, por força do disposto no nº 1 do artigo 40.º do CPPT, a notificação referida no ponto 19) da factualidade provada deveria ter sido feita na pessoa do mandatário constituído nos autos, sendo que “tal falta de notificação constitui preterição de formalidade procedimental prescrita por lei que impediu, in casu, o recorrente de apresentar a defesa”, não se podendo, portanto, considerar que tenha sido concedido o direito de audição prévia ao Impugnante – cfr., neste sentido, o Acórdão do TCA Sul, de 15-06-2010, proferido no processo n.º 04070/10.
Impõe-se, ainda, considerar que as duas notificações remetidas ao Impugnante, datadas de 26-03-2010 e 11-5-2010, para proceder à correção da mencionada declaração de substituição e subsequentes pronúncias deste não substituem a notificação para o exercício de audiência prévia nem permitem concluir que tal direito foi exercido [cfr. pontos 12) a 16) da fundamentação de facto].
Desde logo os momentos em que tais notificações foram emitidas não correspondem aos previstos nas alíneas b) a e) do n.º 1, do artigo 60.º da LGT.
Ademais, conforme resulta do ponto 12) da fundamentação de facto, no primeiro ofício remetido ao Impugnante, datado de 26-03-2010, para proceder à correção da liquidação de substituição, a Administração Tributária transmitiu ao Impugnante que entendia que este apenas poderia colocar no quadro 5 do anexo G da sua declaração de IRS o valor de realização do imóvel inscrito na matriz sob o artigo 1…, por considerar que este era o seu domicílio fiscal, não colocando em causa que o mesmo era a sua habitação própria e permanente, não admitindo, no entanto que os demais prédios vendidos naquele ano e cujo valor o Impugnante havia inscrito no quadro 5 do anexo G da declaração de substituição [a que respeita o ponto 10) da fundamentação de facto] pudessem ser considerados sua habitação própria e permanente.
E, quando notificou, novamente, o Impugnante, em 11-05-2010, para proceder a tal correção não lhe comunicou qualquer fundamentação diferente da já exposta naquele ofício por força da qual se impusesse essa correção, limitando-se a referir que aquele ofício lhe havia sido remetido e insistindo na correção da aludida declaração de substituição – cfr. ponto 15) da fundamentação de facto.
De referir, ainda, que o ofício que tem como remetente o mandatário do Impugnante, datado de 28-01-2011, no qual se transmite que, pelo facto de o Impugnante não ter procedido à correção da aludida declaração de substituição se irá proceder à correção oficiosa da mesma, também não contém qualquer fundamentação distinta da já expressa nos dois ofícios anteriores, sendo certo que a administração tributária nem sequer demonstrou que a mesma havia, efetivamente sido remetida, não constando dos autos qualquer comprovativo de envio – cfr. ponto 18) da fundamentação de facto.
Por outro lado, quando notificou o Impugnante para exercer o seu direito de audiência prévia verifica-se que esta considerou que não podia ser considerado qualquer valor de realização dos imóveis que o Impugnante havia declarado pretender reinvestir no quadro 5 do anexo G da declaração de IRS de substituição que apresentou, por considerar que nenhum deles era habitação própria e permanente do Impugnante, tendo acabado por emitir uma liquidação de IRS exatamente com base nesses pressupostos, isto é, desconsiderando todos os valores de realização que o Impugnante havia declarado – cfr. pontos 19), 21) e 22) da fundamentação de facto.
Assim, a fundamentação em que assentou a liquidação impugnada não é coincidente com aquela que foi notificada através dos ofícios aludidos nos pontos 12), 15) e 18) da fundamentação de facto, não se podendo, portanto, considerar que tais ofícios e a resposta dada aos mesmos substituiu de alguma forma a efetiva oportunidade do exercício do direito de audição prévia, ou que por força dos mesmos o objetivo visado por essa formalidade foi atingido.
(…)

Desde já diremos que a sentença recorrida que cita e segue a jurisprudência deste TCAS não merece a censura que lhe é feita pela Recorrente.

Atentemos nos factos.

Da matéria assente resulta que o Impugnante e ora Recorrido depois de entregar uma primeira declaração de rendimentos apresentou uma declaração de substituição na qual declarou ter reinvestido parcialmente o produto da venda dos imóveis e que seguidamente foi notificado duas vezes pela Autoridade Tributária e Aduaneira para proceder à alteração daquela declaração.

E do excerto da sentença recorrida supratranscrito resulta que para considerar que foi preterido o direito de participação na modalidade de audição prévia do contribuinte, foi ponderado que o Impugnante e ora Recorrido, após ser notificado pela segunda vez para corrigir a declaração apresentada, constituiu mandatário. Posteriormente foram os contribuintes notificados para o domicílio fiscal para exercerem o direito de audição prévia antes da liquidação, mas tal notificação não foi feita na pessoa do mandatário nem para o seu escritório. Sendo certo que a ora Recorrente não nega que o advogado constituído no procedimento não foi notificado.

Não merece, pois, censura o decidido na sentença recorrida quanto à falta de notificação válida para o exercício do direito de audição prévia mesmo perante as duas notificações a comunicar a necessidade de correção da declaração de rendimentos antes entregue, pelas razões nela expostas.

A sentença recorrida não merece, pois, a censura que lhe foi feita, improcedendo o recurso nesta parte.


Defende a Recorrente que ainda assim, a impugnação deveria improceder porquanto o ato de liquidação a praticar sempre seria o mesmo.


Defende pois a Autoridade Tributária e Aduaneira nas alegações e conclusões de recurso que mesmo que se conclua que os Impugnantes e ora Recorridos não foram validamente notificados para exercer o direito de audição prévia que a liquidação emitida deve ser mantida por aplicação do princípio do aproveitamento do ato.

Com efeito, por aplicação do princípio do aproveitamento dos atos, a respetiva irregularidade pode degradar-se em formalidade não essencial, tratando-se, como se trata de vício formal e procedimental.

O princípio do aproveitamento do ato administrativo, hoje consagrado no artigo 163/5 CPA, tem ínsito a demonstração, inequívoca, nas concretas circunstâncias do caso, que o vício de que padece não implicaria uma alteração do seu conteúdo essencial, ou seja, quando seja seguro afirmar que o novo ato a emitir, isento desse vício, não poderia deixar de ter o mesmo conteúdo decisório que tinha o ato impugnado.

Como tem sido jurisprudência frequente, da qual se cita o Ac STA de 2007.05.22, Proc. nº 0161/07, à face deste princípio não se justifica a anulação de um acto, (…), quando a existência desse vício não se veio a traduzir numa lesão em concreto para o interessado cuja proteção a norma visa, designadamente, no caso de um vício procedimental, quando a sua ocorrência não teve qualquer reflexo no procedimento administrativo”

Chamamos ainda à colação o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 2014.01.22, onde se decidiu: a audiência prévia dos interessados não é um mero rito procedimental, a formalidade em causa (essencial) só se podia degradar em não essencial (não invalidante da decisão) se essa audiência não tivesse a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada, e se se impusesse, por isso, o aproveitamento do ato – utile per inutile non viciatur.”

O que exige um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso.


Assim, quando num juízo de prognose póstuma, for possível e seguro afirmar que o novo ato, isento desse vício, não poderia deixar de ter o mesmo conteúdo decisório que tinha o ato impugnado, não se justificará a anulação do ato, por aplicação do princípio do aproveitamento dos atos.

Todavia, no caso concreto em análise, não se sabendo que argumentos seriam apresentados pelos Impugnantes e ora Recorridos, contrariamente ao que defende a Recorrente, não se pode extrair a conclusão de que os pressupostos em que assenta a liquidação seriam exatamente os mesmos acaso os Impugnantes e ora Recorridos tivesse exercido o direito de audição.


Tal como decidido, no caso em análise não é possível recorrer à teoria do aproveitamento do ato.


Improcedem, pois, todas as conclusões de recurso


Em face do exposto, é de julgar improcedente o recurso jurisdicional e, consequentemente, confirmar a sentença recorrida.



Sumário/Conclusões:

I - A falta de audiência prévia à decisão administrativa, quando não seja legalmente dispensada, constitui preterição de formalidade essencial, conducente, em regra, à anulabilidade do ato (artigo 163/1 CPA).
II - A preterição do direito de audiência prévia, por via da aplicação do princípio do aproveitamento do ato administrativo, apenas é admissível quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insuscetível de influenciar a decisão final, o que acontece em geral nos casos em que se esteja perante uma situação legal evidente ou se trate de atividade administrativa vinculada.
III - A possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do ato deve ser apreciada casuisticamente pela análise das circunstâncias particulares do caso concreto, aferindo-se se a decisão do procedimento não poderia de forma alguma ser influenciada pela participação do contribuinte no procedimento.


III – Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os Juízes da Subsecção Tributária Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente

Lisboa, 16 de maio de 2024

Susana Barreto

Maria Isabel Ferreira da Silva

Maria da Luz Cardoso