Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 149/24.4BEFUN |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 10/24/2024 |
| Relator: | LUÍSA SOARES |
| Descritores: | RECLAMAÇÃO DO ART. 276º DO CPPT REENVIO PREJUDICIAL SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA |
| Sumário: | Tendo sido suscitada no processo uma questão, relativamente à qual em outro processo se haja decidido o reenvio prejudicial para o TJUE, justifica-se que, ao abrigo do disposto nos artigos 269.º, n.º 1, alínea c), e 272.º, n.º 1, ambos do CPC, seja declarada a suspensão da instância, até admissão desse reenvio ou, admitido, proferida pronúncia por esse Tribunal de Justiça. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contra-Ordenacionais |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | I – RELATÓRIO Vem a O… – CONSULTADORIA ECONÓMICA E MARKETING, S.A (Zona Franca da Madeira) apresentar recurso jurisdicional dirigido ao Supremo Tribunal Administrativo contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, que julgou improcedente a reclamação judicial apresentada contra o ato de penhora efetuada no âmbito do processo de execução fiscal nº 2810202301166662 e apensos. Por decisão sumária datada de 06/09/2024, o Supremo Tribunal Administrativo declarou-se incompetente em razão da hierarquia, tendo remetido o processo a este tribunal, pelo que cumpre decidir. A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos: “I. Interpõe a Recorrente o presente Recurso contra a Sentença proferida no âmbito do processo de Reclamação Judicial que correu os seus termos, sob o n.º 149/24.4BEFUN, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, e que foi apresentada contra a penhora realizada pela Autoridade Tributária no âmbito do processo de execução fiscal n.º 281020230116662 e apensos, sobre o saldo da conta bancária, no montante de € 404.000,22, que a antecedeu; II. Subjacente à Sentença ora recorrida, está o seguinte entendimento do Tribunal a quo • “Os actos jurídicos da União em causa nos autos são o regulamento e a decisão. Segundo o disposto no art. 288.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, são actos jurídicos da União (actos de direito subordinado ou derivado): regulamentos, directivas, decisões, recomendações e pareceres. • O regulamento tem carácter geral. É obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-Membros. • A decisão é obrigatória em todos os seus elementos. Quando designa destinatários, só é obrigatória para estes. • Com relevância, refira-se, ainda, o disposto no art. 291.º, n.º 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia: • “1. Os Estados-Membros tomam todas as medidas de direito interno necessárias à execução dos actos juridicamente vinculativos da União.” • Em síntese, no caso dos autos, o cumprimento do direito da União que se impõe a Portugal resulta da Decisão de Recuperação - DECISÃO (UE) 2022/1414, de 04/12/de 2020 - e do Regulamento (UE) 2015/1589 do CONSELHO, e vincula Portugal: i) a uma obrigação de recuperação efectuada imediatamente segundo as formalidades do direito interno português; ii) a que estas formalidades de direito interno permitam uma execução imediata e efectiva da Decisão de Recuperação; iii) a que a recuperação do auxílio se concretize no prazo de 8 meses (a contar da notificação da decisão); iv) ao cumprimento de obrigações de carácter informativo perante a Comissão, nomeadamente, quanto ao grau de execução da Decisão de Recuperação, incluindo informação pormenorizada sobre os montantes dos auxílios e dos juros já recuperados junto dos beneficiários. Deste modo, a execução imediata e efectiva imposta a Portugal quanto à recuperação dos auxílios, não pode, legalmente, ficar sujeita à aplicação de regras processuais ou substantivas de direito interno do Estado Português das quais resulte uma dilação temporal ou fracionamento na recuperação desses auxílios, sob pena de violação do direito da União. • O que significa que as normas de direito interno não podem comprometer a recuperação imediata do auxílio estatal. • E, em caso de incompatibilidade de uma norma de direito interno com o direito da união, originário ou derivado, a consequência é a da desaplicação da norma de direito interno. Esta é uma das consequências do princípio do primado do direito da União Europeia sobre o direito interno. Com efeito, por forma a garantir a aplicação integral do primado, os tribunais nacionais e as autoridades administrativas estão vinculados à não aplicação do direito nacional incompatível com o direito da União. • Assim como estão os Estados-Membros vinculados a fazer respeitar as regras da União pelos seus nacionais. Cf. art. 4.º, n.º 3, do Tratado da União Europeia. • Por todo o exposto, concluo que as normas de direito interno que preveem a suspensão do processo de execução fiscal, mediante a prestação de garantia ou de isenção (ou dispensa) da mesma, são incompatíveis com o direito da União Europeia, designadamente, com a decisão da Comissão Europeia - DECISÃO (UE) 2022/1414, de 04/12/de 2020 - e com o Regulamento (UE) 2015/1589 do CONSELHO. • Neste sentido, importa ainda considerar a Comunicação da Comissão Europeia relativa à recuperação de auxílios estatais ilegais e incompatíveis (2019/C 247/01), publicada no JOUE de 23/07/2019, da qual resulta, no ponto 126. “Os diferimentos da recuperação ou os pagamentos em prestações após o prazo de recuperação implicariam que a obrigação de recuperação não é executada imediatamente e, por conseguinte, não são permitidos, mesmo que maximizem o retorno do Estado- Membro em causa.” • Pelo que, tais normas internas são desaplicadas no caso concreto, por força do princípio do primado do direito da União. • Assim, no caso concreto, se a prestação de garantia em processo de execução fiscal ou a dispensa da mesma, para suspensão do processo de execução fiscal, não são admissíveis face ao imperativo de devolução do auxílio de estado ilegal de forma efectiva e imediata, por maioria de razão o pedido efectuado para a dispensa de prestação de garantia não pode ter o efeito jurídico que a Recorrente lhe pretende atribuir – de suspensão da execução fiscal até à decisão sobre o pedido. Ou seja, não se pode atribuir um efeito jurídico suspensivo à tramitação da execução fiscal decorrente da apresentação do pedido de dispensa de prestação de garantia, se a própria prestação de garantia ou a sua dispensa não são admissíveis em face do direito da União. Nas situações referidas estaríamos sempre perante uma criação de um diferimento ou dilação na recuperação do auxílio de estado ilegal, uma vez que perante a falta de pagamento pelo executado após o prazo posterior à citação, a diligência de penhora teria que aguardar pela decisão do órgão de execução fiscal sobre a dispensa de prestação de garantia. • O que, diga-se, uma vez mais, não é compatível com o direito da União. • Em face da análise supra efectuada resta referir que a pretensão da Recorrente não pode obter provimento em virtude do disposto na Decisão de Recuperação e no Regulamento (UE) 2015/1589 do CONSELHO, devendo manter-se a penhora objecto da Reclamação, o que conduz à improcedência da Reclamação”; III. Ora, no que diz respeito à dispensa da prestação da garantia, importa deixar claro que porque assim entendeu o Estado português, na origem destes autos está a emissão de liquidações de IRC, cuja falta de pagamento dentro do prazo de pagamento voluntário deu origem à instauração de processos de execução fiscal contra a Recorrente; IV. Ficou demonstrado nos presentes autos que, na situação em apreço, se encontram reunidos todos os requisitos legais de que depende a dispensa de prestação de garantia, tendo a Recorrente logrado, inequivocamente, demonstrar que se encontram reunidos todos os pressupostos legais de que depende a dispensa de prestação de garantia; V. De acordo com o n.º 4, do artigo 52.º, da LGT, para que o Executado possa ser isentado da prestação de garantia é necessário que i) a prestação de garantia lhe cause prejuízo irreparável ou ii) que seja manifesta a sua falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido e, bem assim, que iii) a insuficiência / inexistência de bens não seja da sua responsabilidade; VI. Estes requisitos, exigidos pelo n.º 4 do artigo 52° da LGT, são requisitos alternativos, como nos indica a conjunção disjuntiva “ou”, o que significa que a lei se basta com a verificação de um dos requisitos aí previstos, desde que não seja apurada a responsabilidade do executado pela insuficiência ou inexistência de bens ou de rendimentos (cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, no Processo: 02029/07, de 09-10-2007, in www.dgsi.pt). VII. Ora, por a Recorrente não dispor de meios financeiros ou quaisquer bens imóveis que possa oferecer à penhora e que lhe permitam suspender este processo de execução fiscal, a ora Recorrente apresentou um pedido de dispensa; VIII. Em momento anterior havia já apresentado a respetiva Reclamação Graciosa, através da qual se encontra a contestar a sua legalidade, bem como a respetiva Oposição à Execução, através da qual se encontra a contestar a sua exigibilidade – ambas pendentes de apreciação e decisão na presente data; IX. Recentemente, foi notificada das decisões de indeferimento proferidas sobre os pedidos de dispensa e sobre os requerimentos de nulidade apresentados, tendo apresentado, tempestivamente, contra essas decisões as referidas Reclamações Judiciais; X. Sucede que, sem que os prazos para apresentação das referidas Reclamações estivessem esgotados e sem que a Autoridade Tributária se tivesse pronunciado sobre o pedido de dispensa apresentado, como impõe o n.º 8 do artigo 169.º do CPPT, a Autoridade Tributária promoveu diversas diligências de penhora, sendo uma delas objeto do presente Recurso; XI. De acordo com as informações obtidas junto do Millennium BCP, a penhora objeto da presente Reclamação foi enviada para o Banco em 19 de fevereiro de 2024, sendo que a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia também é datada do dia 19 de fevereiro de 2024; XII. Daqui resulta que a Autoridade Tributária efetuou penhoras mesmo antes de se pronunciar sobre o pedido de dispensa apresentado e, bem assim, antes de se esgotar o prazo para apresentação da respetiva Reclamação Judicial, atuação que é manifestamente ilegal e não respeita o princípio da tutela jurisdicional efetiva e as garantias de defesa legal e constitucionalmente previstas no artigo 268.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa; XIII. Como resulta do n.º 4, do artigo 52.º da LGT e 170.º, do CPPT, a prestação de garantia não é imprescindível para a obtenção do efeito suspensivo, podendo ser dispensada; XIV. De acordo com o artigo 52.º, n.º 4, da LGT, “A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.”; XV. Ou seja, para efeitos do disposto n.º 4, do artigo 52.º, da LGT, para que os Executados possam ser isentados da prestação de garantia é necessário que i) a prestação de garantia lhe cause prejuízo irreparável ou ii) que seja manifesta a sua falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido e, bem assim, que iii) a insuficiência / inexistência de bens não seja da sua responsabilidade. XVI. Considera, pois, a Recorrente que continua a reunir os pressupostos legais, previstos no artigo 52.º, n.º 4, da LGT, para que lhe seja deferido o pedido de isenção de garantia, nomeadamente no que diz respeito à falta de meios económicos revelados pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, que não lhe é imputável; XVII. Estes factos, porém, foram alegados em sede de pedido de dispensa de prestação de garantia, mas que, no entanto, não impediram que a Autoridade Tributária promovesse penhoras antes da sua apreciação, atuação que, que conforme adiante melhor se circunstanciará, é manifestamente ilegal; XVIII. Sobre este tema pronunciou-se, em síntese, o Supremo Tribunal Administrativo dizendo que “Fazendo nossa a fundamentação que antecede entende-se que a penhora ora questionada não pode deixar de ser sustada até haver pronúncia sobre o requerimento de prestação/dispensa de garantia uma vez que a sua prestação efectiva, a que se refere o disposto no artº 169º nº 5 do CPPT, está dependente da apreciação da idoneidade da mesma, como já se referiu supra, destacando-se que o respectivo pedido foi formulado depois de efectuada a penhora do vencimento do recorrente, mas antes deste ter tomado conhecimento do acto. Também é exacto que a mesma solução se imporia por força da própria existência do presente recurso e até trânsito em julgado da presente decisão”; XIX. De resto, tem a ora Recorrente conhecimento que num caso semelhante – ou seja, em que a AT RAM promoveu penhoras antes de ter apreciado o pedido de dispensa de prestação de garantia –, em no qual Exma. Senhora Diretora da AT RAM ordenou o levantamento das penhoras e a restituição dos montantes indevidamente penhorados por entender que a AT não poderia ordenar tais penhoras sem antes se pronunciar sobre o pedido de dispensa apresentado pela aí Requerente; XX. Utilizando o racional da mencionada decisão proferida pela Exma. Senhora Diretora Geral da AT RAM, o qual é integralmente aplicável ao caso em apreço, deverá ser aplicado o disposto no n.º 8, do artigo 169.º do CPPT segundo o qual: “Caso no prazo de 15 dias, a contar da apresentação de qualquer dos meios de reacção previstos neste artigo, não tenha sido apresentada garantia idónea ou requerida a sua dispensa, procede-se de imediato à penhora”; XXI. Mais recentemente, num processo em que a ora Recorrente também foi Recorrente, entendeu este Supremo Tribunal, entre ouras coisas igualmente relevantes, que: A dispensa ou não de garantia pode ser feita com uma margem muito diminuta, permitindo-se a ponderação apenas dos elementos que decorrem do artigo 53.º, n.º 4, da LGT, designadamente a suscetibilidade de surgir um prejuízo irreparável ou verificação manifesta da falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda, no pressuposto de que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado. Pelo que as limitações decorrentes da letra do preceito citado, não admitem espaço para considerar os imperativos que decorrem da Decisão da Comissão. Assim, por maioria de razão, se afastará que, logo à partida, seja recusada a suspensão do processo de execução fiscal com dispensa de prestação de garantia, só porque, supostamente, seria isso que resultaria dos instrumentos de Direito da União Europeia invocados, tal como o fez a AT. Sendo essa atuação ainda mais censurável por se apoiar, sobretudo, numa comunicação da Comissão - 2019/C 247/01 - (de onde são citadas várias partes), centrada unicamente na recuperação dos auxílios (sem considerar as especificidades do caso concreto no confronto com leis nacionais e respetivo enquadramento constitucional particular). Mesmo no plano dos princípios gerais da União dificilmente se conceberia uma discriminação dos executados em função da situação que esteve na origem do crédito fiscal a recuperar” XXII. Aqui chegados, não restam dúvidas que a penhora objeto do presente Recurso é manifestamente ilegal, por ter sido efetuada antes da apreciação do pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado e do seu trânsito, razão pela qual deve ser anulada – o que desde já se requer a V. Exa. XXIII. Ficou demonstrado nos presentes autos a imperatividade da lei interna na execução da Decisão proferida pela Comissão Europeia, não restando senão concluir que a Sentença proferida pelo Tribunal a quo deve ser anulada por este Tribunal por ter sido proferida em sentido contrário à legislação portuguesa aplicável, devendo ser determinada a baixa dos autos e condenado o Tribunal a quo a proferir uma Sentença que analise o mérito da pretensão da ora Recorrente, como legalmente se impõe. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO MERECER PROVIMENTO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUÍDA A MESMA POR UM ACÓRDÃO QUE DÊ TOTAL PROVIMENTO À PRETENSÃO DA RECORRENTE, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.”. * * A Recorrida apresentou contra-alegações, não tendo formulado conclusões, pedindo a final:“NESTES TERMOS, E NOS MELHORES DE DIREITO: I. O PRESENTE RECURSO DEVERÁ SER JULGADO TOTALMENTE IMPROCEDENTE, CONFIRMANDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA.II. ALÉM DISSO, DESDE JÁ SE REQUER A V.ªS EXAS., AO ABRIGO DO MECANISMO DO REENVIO PREJUDICIAL PREVISTO NO ARTIGO 267.º DO TFUE, SOLICITE AO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA QUE ESTE SE PRONUNCIE SOBRE A QUESTÃO VERTIDA NO PONTO B) DO PRESENTE ARTICULADO.III. MAIS SE REQUER, DESDE JÁ, A DISPENSA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA, NOS TERMOS DO ART.º 6.º, N.º 7 DO RCP.”.* * A Exmª. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal teve visto nos presentes autos, remetendo para o parecer emitido pelo Ministério Público junto do STA no qual defende seja concedido provimento ao recurso apresentado pela Recorrente.* * Com dispensa de vistos atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência para decisão. II – DO OBJECTO DO RECURSO O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente. Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao ter desaplicado as normas relativas à suspensão do processo de execução fiscal por considerar serem incompatíveis com o direito da União Europeia, tendo julgado improcedente a reclamação apresentada. Em sede de contra-alegações veio a Recorrida requerer o reenvio prejudicial para o TJUE, com vista a que seja esclarecida a interpretação de atos das instituições da União Europeia em causa no presente recurso, pedido que importa igualmente resolver. * * * III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTOO Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “1. A Comissão Europeia adoptou a DECISÃO (UE) 2022/1414, de 04/12/de 2020, relativa ao regime de auxílios SA.21259 (2018/C), aplicado por Portugal a favor da Zona Franca da Madeira – Regime III, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e da qual consta entre o mais, que: “Artigo 1.º O regime de auxílios «Zona Franca da Madeira (ZFM) – Regime III», na medida em que foi aplicado por Portugal em violação da Decisão C (2007) 3037 final da Comissão e da Decisão C(2013) 4043 final da Comissão, foi executado ilegalmente por Portugal em violação do artigo 108.º, n.º 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, e é incompatível com o mercado interno. (…). Artigo 5.º 1.A recuperação dos auxílios concedidos ao abrigo do regime previsto no artigo 1.º deve ser imediata e efectiva. 2.Portugal deve assegurar a execução da presente decisão no prazo de oito meses a contar da data da respectiva notificação. (…).” 2. A 30/08/2023, foi emitida a certidão de dívida 2023/2049536, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 2810202301166662 contra a Reclamante. 3. A 30/08/2023, foi emitida a certidão de dívida 2023/2049546, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 2810202301166670 contra a Reclamante. 4. A 30/08/2023, foi emitida a certidão de dívida 2023/2049545, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 2810202301166735 contra a Reclamante. 5. A 30/08/2023, foi emitida a certidão de dívida 2023/2049528, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 2810202301166840 contra a Reclamante. 6. A 27/09/2023, foi emitida a certidão de dívida 2023/2282257, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 2810202301186450 contra a Reclamante. 7. A 27/09/2023, foi emitida a certidão de dívida 2023/2282259, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 2810202301186477 contra a Reclamante. 8. A 29/09/2023, foi emitida a certidão de dívida 2023/2307758, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 2810202301188631 contra a Reclamante. 9. A Reclamante foi citada para os processos de execução fiscal n.ºs 2810202301166662, 2810202301166670, 2810202301166735, 2810202301166840, 2810202301186450, 28102023011864477 e 2810202301188631 nos seguintes termos: (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) 10. No âmbito do processo de execução fiscal n.º 2810202301166662 e apensos, aReclamante requereu ao Chefe do Serviço de Finanças do Funchal 1 a dispensa de prestação de garantia, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS) 11. Pelo ofício n.º 866, de 19-02-2024, da AT – RAM, a Reclamante foi notificada da decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia e de suspensão dos processos de execução fiscal, proferida por despacho de 08/02/2024, da Directora Regional da Autoridade Tributária e Assuntos Fiscais da Regiâo Autónoma da Madeira.12. A Reclamante foi notificada da penhora realizada no processo de execução fiscal n.º 2810202301166662 e apensos, nos seguintes termos: * FACTOS NÃO PROVADOSInexistem factos com relevância para a decisão a dar como não provados. * MOTIVAÇÃONos termos do art. 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o juiz deve indicar os motivos de facto e de direito que fundamentam a sua decisão, indicando e fazendo o exame crítico das provas que serviram para formar a sua convicção. A matéria de facto dada como provada nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. A formação da nossa convicção para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados como provados resultou do exame crítico dos documentos juntos aos autos a fls. 1 SITAF, e dos processos de execução fiscal, a fls. 115, 227, 338, 428 e 471 SITAF, assim como da posição assumida pelas partes nos respectivos articulados. O facto 1. foi considerado provado pela consulta ao Jornal Oficial da União Europeia, de 22/08/2022, disponível em https://eur-lex.europa.eu/oj/direct-access.html?locale=pt.”. * * IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITONo presente recurso jurisdicional importa decidir se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao ter desaplicado as normas relativas à suspensão do processo de execução fiscal por considerar serem incompatíveis com o direito da União Europeia, tendo julgado improcedente a reclamação apresentada. Dado que a Recorrida requereu nas respetivas contra-alegações, o reenvio prejudicial para o TJUE, com vista a que seja esclarecida a interpretação de atos das instituições da União Europeia em causa no presente recurso, importa desde já decidir esse pedido. Sobre o pedido de reenvio prejudicial para o TJUE, seguiremos de perto o entendimento vertido no Acórdão deste TCA Sul proferido em 09/10/2024 no processo nº 35/24.8BEFUN (subscrito pela ora relatora na qualidade de 1ª adjunta) que, por sua vez, seguiu o entendimento vertido no Acórdão do STA de 11/09/2024 no processo nº 148/24.6BEFUN e que passamos a transcrever: “(…) 3.2.5. Cumpre, então, agora, decidir. E, neste sentido, começamos por sublinhar que é de conhecimento oficial que estão pendentes neste Supremo Tribunal e no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal diversos processos cujos litígios tem por objecto a mesma questão de fundo que ora nos cumpre decidir. Sendo que, conforme informação prestada e documentalmente comprovada neste (e noutros processos), no âmbito do processo n.º 299/24.7BEFUN foi formulado ao TJUE pedido de reenvio prejudicial. O qual, segundo também documento constante dos autos, foi aí recebido, tendo-lhe sido atribuído o n.º C-545/24. Ora, como se disse no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Novembro de 2006, no processo n.º 1216/05 (integralmente disponível para consulta em www.dgsi.pt ), «Tendo sido suscitada no processo uma questão essencial, relativamente à qual em outro processo se haja decidido o reenvio prejudicial para o TJUE, não faz sentido um segundo reenvio em relação a essa questão essencialmente idêntica. 3.2.6. Assim, tendo em consideração a identidade da questão de mérito colocada em todos os processos mencionados e o pedido de reenvio prejudicial formulado, entende-se que é, por ora, e pelo menos até que o TJUE profira despacho de admissão do reenvio prejudicial que lhe foi submetido, de suspender a presente instância, nos termos do preceituado nos artigos 269.º, n.º 1, alínea c), e 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.(…)”. Atento o acima exposto e seguindo o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão parcialmente transcrito, entendemos ser de suspender a presente instância, pelo menos, até que o TJUE profira despacho de admissão do reenvio prejudicial que lhe foi submetido. * * V- DECISÃOFace ao exposto, acordam, em conferência, as Juízas da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em suspender esta instância de recurso, até que esteja decidida pelo TJUE a admissibilidade do reenvio ou julgado de mérito o reenvio prejudicial que lhe foi enviado no âmbito do processo n.º 299/24.7BEFUN. Notifique as partes e o Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCAS da presente decisão, mais se ordenando ao tribunal a quo que nos seja dado conhecimento de todas as comunicações que a partir da presente data lhe sejam realizadas pelo TJUE no âmbito do processo n.º 299/24.7BEFUN.”. Lisboa, 24 de outubro de 2024 Luisa Soares Susana Barreto (em substituição) Lurdes Toscano |