Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 100/18.0BELSB-A |
![]() | ![]() |
Secção: | CA |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 09/24/2020 |
![]() | ![]() |
Relator: | ANA CELESTE CARVALHO |
![]() | ![]() |
Descritores: | INTEMPESTIVIDADE DA EXECUÇÃO DE JULGADO DE SENTENÇA EM MATÉRIA DE ASILO, OBRIGATORIEDADE DA SENTENÇA. |
![]() | ![]() |
Sumário: | I. Nos termos do artigo 175.º, n.º 1 do CPTA, o dever de executar deve ser integralmente cumprido, no máximo, no prazo procedimental de 90 dias. II. Segundo o artigo 176.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, quando a Administração não dê execução espontânea à sentença no prazo estabelecido no n.º 1 do artigo anterior, o interessado pode exigir o cumprimento do dever de execução no prazo de um ano, contado desde o termo do citado prazo. III. Não enferma a sentença recorrida do erro de julgamento de direito quanto à procedência da exceção dilatória de intempestividade do ato processual, segundo o disposto no artigo 89.º, n.º 4, k), do CPTA, anteriormente designada de caducidade do direito de ação, por a presente execução ter sido apresentada em juízo depois do prazo legal previsto. IV. Tal não constitui a violação do disposto no artigo 164.ºou do artigo 176.º do CPTA, por estar em causa uma norma imperativa sobre as condições de acesso aos tribunais, o qual não se faz de forma livre, nem incondicionada. V. Esta também a razão porque não se mostram violados os princípios constitucionais do Estado de Direito e da legalidade democrática, previstos nos artigos 2.º e 3.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição, porque a norma que prevê o prazo processual para a instauração da instância executiva não vedar o acesso à justiça e aos Tribunais, apenas regular os termos em que o Exequente o pode fazer. VI. A matéria de exceção dilatória é de conhecimento oficioso, nos termos do disposto no artigo 89.º, n.º 2 do CPTA, nos mesmos termos previstos no artigo 578.º do CPC. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Votação: | UNANIMIDADE |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I – RELATÓRIO N..............., devidamente identificado nos autos, no âmbito da presente execução de sentença instaurada contra o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 19/05/2020, que julgou procedente a exceção de intempestividade da presente execução, absolvendo o Executado da instância. * Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões, que infra e na íntegra se reproduzem: “1. Não existe qualquer caducidade do direito à execução, porquanto, antes de mais, o requerente tem direito a que seja proferida decisão sobre o seu pedido de concessão de proteção internacional, e a omissão da executada ofende o caso julgado decorrente da sentença exequenda, pelo que a douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 164 do CPTA o princípios constitucionais do Estado de Direito e da legalidade democrática - cf. artigos 2.° e 3.°, n.°s 2 e 3 da CRP. 2. Por outro lado, na douta sentença recorrida, não se entram em linha de conta para efeito de contagem de prazo de caducidade o prazo que a entidade administrativa teria para o cumprimento da douta sentença, pelo que, na pendencia do mesmo, não se contaria o prazo de caducidade nos termos do artigo 320º do Código Civil, por não poder ser interposta execução. 3. Acresce ainda que no caso vertente o incumprimento persistia à data, pelo que seria até continuado, pelo que tal prazo de um ano teria de se contar, quanto muito, sobre a data de cessação do incumprimento e não sobre a data de prolação da sentença. 4. Não tinha o Tribunal a quo poderes para conhecer oficiosamente da excepção de caducidade, porquanto a matéria em causa não é excluída da disponibilidade das partes -artigo 333º do Código Civil, norma que foi violada.”. Pede que seja revogada a sentença recorrida. * Notificado o ora Recorrido, o mesmo não contra-alegou o recurso, nada tendo dito ou requerido. * Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não foi emitido parecer. * O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento, considerando tratar-se de um processo urgente.
II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso. Segundo as conclusões do recurso, a questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento de direito no tocante à procedência da exceção de intempestividade da execução, em violação do artigo 164.º do CPTA e dos princípios constitucionais do Estado de Direito e da legalidade democrática, previstos nos artigos 2.º e 3.º, n.ºs 2 e 3 da CRP, por o prazo não se contar na pendência do prazo para a execução pela entidade administrativa e não ter o Tribunal poderes para conhecer oficiosamente da exceção de caducidade. III. FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “1 – Em 01.03.2018, foi proferida sentença de anulação de acto, pelo TAC de Lisboa, nos autos sob o n.º 100/18.0BELSB, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. autos sob o n.º 100/18.0BELSB, a que se encontra apensa a presente execução). 2 – A sentença supra identificada foi notificada em 02.03.2018 (cr. Autos sob o n.º 100/18.0BELSB, a que se encontra apensa a presente execução). 3 – O requerimento executivo relativo à sentença supra, deu entrada em juízo em 16.10.2019 (cfr. autos).”. DE DIREITO Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise do fundamento do presente recurso jurisdicional. Erro de julgamento de direito no tocante à procedência da exceção de intempestividade da execução, em violação do artigo 164.º do CPTA e dos princípios constitucionais do Estado de Direito e da legalidade democrática, previstos nos artigos 2.º e 3.º, n.ºs 2 e 3 da CRP, por o prazo não se contar na pendência do prazo para a execução pela entidade administrativa e não ter o Tribunal poderes para conhecer oficiosamente da exceção de caducidade Não se conformando com a sentença, vem o ora Recorrente dela recorrer, com fundamento no erro de julgamento de direito, invocando a violação do disposto no artigo 164.º do CPTA e dos princípios constitucionais do Estado de Direito e da legalidade democrática, previstos nos artigos 2.º e 3.º, n.ºs 2 e 3 da CRP, por o prazo não se contar na pendência do prazo para a execução pela entidade administrativa e não ter o Tribunal poderes para conhecer oficiosamente da exceção de caducidade. Defende não existir qualquer caducidade do direito à execução, tendo o Exequente direito a que seja proferida decisão sobre o pedido de concessão de proteção internacional. Entende que o entendimento que extraia do artigo 164.º do CPTA que o prazo de caducidade impede a execução do cumprimento da sentença exequenda constituiria uma violação dos princípios constitucionais do Estado de Direito e da legalidade democrática, previstos nos artigos 2.º e 3.º, n.ºs 2 e 3 da CRP, por a sentença ser obrigatória para todas as entidades. Além de dever ser considerado o prazo para o cumprimento voluntário da sentença, não podendo o Exequente na sua pendência interpor a execução. Por último invoca que a exceção de caducidade das partes só é de conhecimento oficioso tratando-se de matéria excluída da disponibilidade das partes, o que não é o caso. Vejamos. O Recorrente não vem impugnar o julgamento da matéria de facto, não dirigindo qualquer erro de facto à sentença recorrida, pelo que, o objeto do recurso terá de assentar na concreta factualidade apurada pelo Tribunal a quo. Segundo a matéria de facto julgada provada, tendo sido proferida a sentença exequenda em 01/03/2018 e notificada às partes em 02/03/2018, a presente execução de sentença foi apresentada em juízo em 16/10/2019. Nos termos do disposto no artigo 175.º, n.º 1 do CPTA, o dever de executar deve ser integralmente cumprido, no máximo, no prazo procedimental de 90 dias. Segundo o artigo 176.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, quando a Administração não dê execução espontânea à sentença no prazo estabelecido no n.º 1 do artigo anterior, o interessado pode exigir o cumprimento do dever de execução no prazo de um ano, contado desde o termo do citado prazo. Tendo a sentença sido notificada por ofício expedido em 02/03/2018, considera-se ocorrer a notificação no 3.º dia posterior, segundo o artigo 248.º do CPC, em 05/03/2018. Contado o prazo para a interposição de recurso em processo urgente, o qual é de 15 dias, nos termos do artigo 147.º, n.º 1 do CPTA, findo o mesmo, a sentença transitou em julgado, o que ocorreu em 20/03/2018. Iniciado no dia seguinte, em 21/03/2018, o prazo procedimental de 90 dias, para a execução espontânea, tal prazo terminou em 01/08/2018, nele se descontando os dias não úteis, incluindo feriados, segundo o disposto no artigo 87.º, c), do CPA. Iniciado a partir de então o prazo de um ano, é manifesto que o mesmo já havia decorrido e se encontrava esgotado na data de 16/10/2019, em que o Requerente deu entrada com o requerimento executivo. Por conseguinte, não enferma a sentença recorrida do invocado erro de julgamento de direito quanto à procedência da exceção dilatória de intempestividade do ato processual, segundo o disposto no artigo 89.º, n.º 4, k), do CPTA, anteriormente designada de caducidade do direito de ação, por a presente execução ter sido apresentada em juízo depois do prazo legal previsto. Tal julgamento de procedência de uma exceção dilatória é impeditiva do conhecimento do mérito da causa, segundo o disposto no artigo 89.º, n.º 2 do CPTA, implicando a absolvição do Executado da instância. O que significa que não estão verificadas as condições previstas na lei processual para o prosseguimento da causa, determinando que o juiz fique impedido de julgar do fundo da causa. Tal não constitui a violação do disposto no artigo 164.º do CPTA invocado pelo Recorrente, de resto, inaplicável ao presente processo executivo, por o mesmo não ter por objeto a prestação de factos ou de coisas, nem tão pouco do disposto no artigo 176.º do CPTA, no respeitante à execução de sentença de anulação, por estar em causa uma norma imperativa sobre as condições de acesso aos tribunais, o qual não se faz de forma livre, nem incondicionada. Esta também a razão porque não se mostram violados os princípios constitucionais invocados pelo Recorrente, do Estado de Direito e da legalidade democrática, previstos nos artigos 2.º e 3.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição, porque a norma que prevê o prazo processual para a instauração da instância executiva não vedar o acesso à justiça e aos Tribunais, apenas regular os termos em que o Exequente o pode fazer, o que no presente caso não foi respeitado. O desrespeito da norma processual sobre o prazo para a prática do ato processual da constituição da instância não constitui uma derrogação das normas ou princípios constitucionais invocados pelo Recorrente, pois que não impede o acesso à justiça, nem torna esse acesso excessivamente oneroso. O efeito jurídico decorrente da procedência da exceção de intempestividade da prática do ato processual, da absolvição do Executado da instância, constitui tão só a cominação para o desrespeito do ónus processual que recai sobre o Exequente de dar pontual cumprimento às disposições legais que regulam o acesso aos tribunais. Nem tais regras colidem com o disposto no artigo 158.º, n.º 1 do CPTA, no respeitante à obrigatoriedade das sentenças, além de não derrogarem o disposto no n.º 2 do citado preceito legal. A sentença não deixa de ser obrigatória pelo facto de não ser voluntariamente executada dentro do respetivo prazo legal. Por último, não tem o Recorrente razão ao invocar que o Tribunal a quo não podia conhecer oficiosamente da matéria da intempestividade do ato processual, pois estando em causa matéria configurada como de exceção dilatória, a mesma é de conhecimento oficioso nos termos do disposto no artigo 89.º, n.º 2, nos mesmos termos previstos no artigo 578.º do CPC. Nestes termos, forçoso se tem de concluir pela falta de fundamento do recurso e, em consequência, pela sua improcedência, por não provado. * Pelo que, em suma, em face de todo o exposto, será de negar provimento ao recurso e em manter a sentença recorrida, acrescida da fundamentação antecedente. * Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma: I. Nos termos do artigo 175.º, n.º 1 do CPTA, o dever de executar deve ser integralmente cumprido, no máximo, no prazo procedimental de 90 dias. II. Segundo o artigo 176.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, quando a Administração não dê execução espontânea à sentença no prazo estabelecido no n.º 1 do artigo anterior, o interessado pode exigir o cumprimento do dever de execução no prazo de um ano, contado desde o termo do citado prazo. III. Não enferma a sentença recorrida do erro de julgamento de direito quanto à procedência da exceção dilatória de intempestividade do ato processual, segundo o disposto no artigo 89.º, n.º 4, k), do CPTA, anteriormente designada de caducidade do direito de ação, por a presente execução ter sido apresentada em juízo depois do prazo legal previsto. IV. Tal não constitui a violação do disposto no artigo 164.ºou do artigo 176.º do CPTA, por estar em causa uma norma imperativa sobre as condições de acesso aos tribunais, o qual não se faz de forma livre, nem incondicionada. V. Esta também a razão porque não se mostram violados os princípios constitucionais do Estado de Direito e da legalidade democrática, previstos nos artigos 2.º e 3.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição, porque a norma que prevê o prazo processual para a instauração da instância executiva não vedar o acesso à justiça e aos Tribunais, apenas regular os termos em que o Exequente o pode fazer. VI. A matéria de exceção dilatória é de conhecimento oficioso, nos termos do disposto no artigo 89.º, n.º 2 do CPTA, nos mesmos termos previstos no artigo 578.º do CPC. * Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e em manter a sentença recorrida, com a presente fundamentação. Sem custas. Registe e Notifique. Nos termos e para os efeitos do artigo 15º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13/03, a Relatora atesta que os Juízes Adjuntos - Excelentíssimos Senhores Juízes Desembargadores PEDRO MARQUES e ALDA NUNES - têm voto de conformidade. (Ana Celeste Carvalho - Relatora) (Pedro Marques) (Alda Nunes) |